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PROVEITO COMUM DO CASAL
CASAMENTO
PROVA DOCUMENTAL
Sumário
I - A confissão a que respeita o artº 484º nº 1 do Código de Processo Civil (cominatório semipleno), tem por objecto apenas os factos e é inoperante quanto aos factos constitutivos da causa de pedir, para cuja prova a lei exija documento, mesmo tratando-se de situação jurídica que está no âmbito da disponibilidade das partes. II - A questão da indisponibilidade do direito a que o facto respeita tem uma abrangência maior, por não admitir a confissão mesmo em relação a factos que fora de tais casos admitem a prova testemunhal. III - A estas duas situações, autonomizadas correspondem duas alíneas do artº 485º do CPC alínea c) e alínea d). IV - Se o facto, constitutivo, (modificativo ou extintivo) só admite prova documental, porque existe lei expressa nesse sentido, então seja qual for a acção, ,cabe na previsão da alínea d) e não se submete ao cominatório. Em tal caso a confissão será ineficaz, por insuficiente. V - O casamento é exactamente um desses factos insusceptível de confissão, artº 1º nº 1 d); 4º e 211º todos do CRCivil. VI - A alegação «o veículo dos autos foi utilizado em proveito comum e para benefício do casal» é conclusiva, contendo conceitos de direito e juízos de valor, pelo que se transcrita na matéria de facto tida como provada na sentença, deve ter-se por não escrita, (artº 646º nº 4 do CPC), não podendo como tal basear-se nesta a aplicação do direito e consequentemente a fase decisória. (I.A.C.)
Texto Integral
Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:
T, S.A., intentou acção ordinária de condenação demandando JOSÉ e mulher, requerendo a condenação destes Réus:
- No pagamento solidário, entre si, da quantia de € 4.447,85 acrescida dos juros vencidos e vincendos à taxa legal e dos valores mensais idênticos ao dobro de cada aluguer que, à razão de € 599,58 desde 10 de Novembro de 2005, inclusive, até efectiva restituição de veículo automóvel, dos autos acrescida esta de juros, à taxa legal, desde a data dos respectivos vencimentos até integral pagamento,
- Indemnização a liquidar em execução de sentença,
- Na restituição à A. o veículo automóvel dos autos cujo valor é de € 14.604,80,
- No pagamento de sanção pecuniária compulsória, da quantia de € 50,00 por dia, isto durante os primeiros trinta dias subsequentes ao dito trânsito em julgado, quantitativo a passar a ser de € 100,00, por dia, nos trinta dias seguintes e a € 150,00 por dia daí em diante e, até integral cumprimento da respectiva condenação, ou no montante que vier a ser fixado na sentença a proferir, bem como no pagamento das custas, procuradoria e mais legal.
Fundamenta-se a demanda no que ao réu respeita:
Em contrato de ALD celebrado com Réu José Sousa por um período de sessenta meses referente a veiculo automóvel mediante contrapartida do réu de efectuar valor mensal de prestações acordadas.
O réu deixou de pagar as prestações contratadas razão pela qual a autora accionou a resolução do contrato com as consequentes indemnizações ao abrigo de clausula contratual acordada.
Quanto à ré pretende a autora assentar a sua responsabilidade na invocação feita na p.i. de ser esta casada com aquele e no «proveito comum do casal».
Os Réus regularmente citados não deduziram qualquer oposição, razão pela qual foram julgados todos os factos constantes da petição inicial, susceptíveis de confissão, no termos do disposto nos artigos 484 e 485º do Código de Processo Civil.
Foi proferida sentença que transcreveu como fundamentação de facto o que vai adiante
(…)
C) Na sequência do que lhe foi solicitado pela dita P, LDA., por ela e em nome do dito José, a A. adquiriu, com destino a dar de aluguer ao dito R., o referido veículo automóvel.
D) Por contrato particular, ao diante junto em fotocópia e que aqui se dá por inteiramente reproduzido, datado de 30/05/2001 a A. deu de aluguer ao José o dito veículo.
E) O prazo de aluguer foi de 60 meses, sendo mensal a periodicidade dos alugueres acordados, num total de sessenta, inicialmente do montante de Esc. 58.138$00 (ao presente € 289,99) cada, incluindo já o prémio do seguro de vida, bem como o IVA respectivo à taxa de 17%, posteriormente, após Maio de 2002, do montante de € 294,89 cada, incluindo o IVA respectivo à taxa então de 19% e, finalmente, após Junho de 2005, do montante de € 299,79 cada, incluindo o IVA respectivo à taxa já de 21%.
(…)
H) De harmonia com o acordado, a importância de cada um dos referidos alugueres mensais deveria ser paga pelo ora R. marido à A. até ao dia 10 do mês a que respeitasse, por meio de transferência bancária.
I) Após a celebração do referido contrato o dito R. marido recebeu o veículo referido, que passou a utilizar, veículo que para o efeito a A. propositadamente adquirira.
J) O R. marido… não pagou os alugueres mensais acordados a partir do 39º aluguer, inclusive, a pagar em 10 de Setembro de 2004.
L) … num total correspondente a € 3.848,27 - valor este que inclui já os prémios dos seguros de vida referidos, bem como o IVA à taxa de 19% quanto aos alugueres vencidos entre 10/09/2004 e 10/06/2005 e à taxa de 21% quanto aos restantes, tal como não pagou o valor mensal idêntico ao dobro de cada aluguer vencido desde a data da resolução do contrato até ao presente - 02/11/2005 -, ou seja mais o equivalente a € 599,58 - tudo num total de € 4.447,85.
M) O valor do veículo automóvel referido - que o R. marido está obrigada a restituir à A. - é de € 14.604,80.
N) O contrato de aluguer dos autos foi celebrado pelo R. marido tendo em vista o proveito comum dos casal dos RR., e o veículo dos autos foi utilizado em proveito comum e para benefício do casal dos ditos RR, pelo que a R. C é solidariamente responsável por estes débitos do R. JOSÉ, seu marido, para com a Autora.
Na fundamentação de direito o tribunal recorrido absolveu a ré porquanto não tendo esta sido parte no contrato e não estando nos autos a prova documental do casamento, inexistir prova sobre aquele facto
Inconformada,
A autora recorreu pedindo a revogação da sentença na parte em que absolveu a ré do pedido.
Nas alegações de recurso lavrou as seguintes
CONCLUSÕES
Na sentença recorrida o Senhor Juiz a quo errou ao julgar a presente acção improcedente e não provada quanto à R. mulher, ora recorrida, com fundamento na falta de demonstração do casamento dos RR. ora recorridos, atento a A. não ter juntado aos autos prova do casamento dos mesmos;
1. Os RR., ora recorridos, apesar de terem sido pessoal e regularmente citados, não apresentaram contestação pelo que, não impugnaram que fossem casados entre si, pelo que o casamento dos recorridos deveria ter sido considerado provado;
2. Acresce que, na presente acção não se está perante direitos indisponíveis, pelo que a vontade das partes é plenamente eficaz para produzir os efeitos jurídicos que pela acção se pretendem obter, sem necessidade da junção de certidão para prova do casamento dos mesmos, razão pela qual a R. mulher, ora recorrida, deveria ter sido condenado, solidariamente com o R. seu marido e também recorrido, no pedido;
3. “O documento autêntico só é mesmo necessário para a prova do casamento nas acções de estado e não naquelas em que o casamento não representa propriamente o «thema decidendum», desde que não haja disputa das partes sobre a sua existência.”;
4. É, pois, legalmente admissível a prova do casamento dos RR. por confissão, nos termos e de harmonia com o disposto nos artigos 1º, n.º 1, alínea d), 4º e 211º do Código do Registo Civil, e do artigo 784º do Código de Processo Civil;
5. Na sentença recorrida o Senhor Juiz a quo ao absolver do pedido a recorrida mulher, com fundamento na não demonstração do casamento dos RR, ora recorridos, violou o disposto nos artigos 463º, n.º 1, 484º n.º 1 e 784º do Código de Processo Civil, e no artigo 1691º, n.º 1, alínea c) do Código Civil;
6. Acresce, ainda que, foi dada como provada nos autos, na alínea N) da matéria de facto, que, O contrato de aluguer dos autos foi celebrado pelo R. marido tendo em vista o proveito comum dos casal dos RR., e o veículo foi utilizado em proveito comum e para beneficio do casal dos ditos RR., pelo que a R. C é solidariamente responsável por estes débitos, do R. JOSÉ, seu marido, para com a A.
7. Termos em que deve ser dado inteiro provimento ao presente recurso, e, por via dele, revogar-se a sentença recorrida, substituindo-a por acórdão que considere provado o casamento dos RR. – como afinal o està já -, por confissão, e que condene, a R. mulher, ora recorrida, solidariamente com o R. seu marido, julgando, assim, consequentemente, a acção inteiramente procedente e provada, condenando-se ambos os RR. em 1ª instância, ora recorridos, solidariamente entre si, no pedido, assim se fazendo
Inexistiram contra alegações.
Colhidos os vistos cumpre decidir.
Objecto do Recurso:
È pelas conclusões que se determina o âmbito da competência deste tribunal (artº 690º nº 1 do CPC)
Daí que todas as demais questões de mérito que tenham sido objecto da sentença recorrida e que não tenham sido abordadas nas conclusões da alegação do recorrente estão excluídas ao conhecimento deste tribunal, que das mesmas por isso não pode conhecer.
Isto posto,
São duas as questões colocadas neste recurso:
1ª questão:
A transcrição na fundamentação da sentença recorrida do constante da alínea n) da mesma impõe a decisão de condenação da ré como pretende a recorrente?
2ª questão:
Sendo a acção por divida, do marido também intentada contra a ré mulher dispensa a prova documental no que se refere ao casamento?
No que à 1º das questões respeita:
Assenta esta, no teor da alínea “N” da fundamentação de facto da sentença recorrida a qual é como se segue:
« O contrato de aluguer dos autos foi celebrado pelo R. marido tendo em vista o proveito comum dos casal dos RR., e o veículo dos autos foi utilizado em proveito comum e para benefício do casal dos ditos RR, pelo que a R. C é solidariamente responsável por estes débitos do R. JOSÉ, seu marido, para com a .autora.»
Cumpre referir como nota prévia que no nosso sistema processual civil o objecto da acção que constitui o objecto da própria sentença reside na pretensão do autor que se identifica através do pedido visto na perspectiva do direito que lhe assiste.
Este direito por sua vez enquanto objecto da acção e da sentença individualiza-se através do seu próprio conteúdo e através do acto ou facto jurídico que se pretenda ter-lhe dado origem (causa de pedir) Vale para nós a chamada teoria da substanciação que exige sempre a indicação do titulo em que se funda o direito afirmado (artº 193º nº 1 e 2 e artº 467º d) ambos do CPC)
Inexistem duvidas sobre tal assunto.
Por vezes, não poucas, estas surgem mas relativamente ao que pode ser num caso concreto entendido, como facto, direito ou simples juízo conclusivo.
A distinção não é de modo algum simples e desperta quase sempre no plano concreto múltiplas dificuldades. “Fleming James Jr Civil Precedure 1992 p 1489 e seguintes afirma que só um esquizofrénico pode manter a distinção entre factos e direito; efectivamente a linguagem não é um instrumento neutro desde logo a denominação implica uma conceptualização ( “o mesmo evento exprime-se de forma muito diferente pelo físico pelo biólogo pelo psicólogo…Raymond Martin La régle de droit adéquate dans le procès civi 1990 pg 164.).
Abandona-se pois a teses, do facto naturalisticamente, entendido, por impossíveis de realizar na prática, vde Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil 1996 pg 56; e Miguel Teixeira de Sousa “Estudo sobre a Funcionalidade Processual pg 103, que escreve:”Um facto é sempre algo de construído a partir da realidade através de um certo critério: por meio de um critério natural delimitam-se os factos naturais; através dos elementos das previsões normativas definem-se os factos jurídicos”
Ou por outras palavras “o que existe é a facticidade é o acontecer constante sem cortes nem descontinuidades …os factos são simples recortes artificiais do tecido da realidade. São pedaços da realidade que foram dela artificialmente recortados com o molde da previsão da norma” Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil vol I 1999 pg 152;
Contrapõe-se ao facto o juízo de valor ou questão de direito em que este corresponde a um juízo cognitivo enquanto juízo de validade puramente teorética .
Esta brevíssima resenha a propósito de uma questão tão delicada e dificil como é a do facto e a «questão de facto» importa reflexão face ao teor da alínea n) da sentença recorrida; considerando ainda o que posteriormente veio a ser decidido.
Na verdade, não obstante tal conteúdo da sentença, veio o tribunal a final a decidir como se pode ler na sentença recorrida que:
« Peticionou também a Autora a condenação da Ré C… na quantia peticionada, contudo, não logrou obter prova do casamento, mas apenas do proveito comum do casal (única matéria passível de prova por confissão e caso não se entenda que o proveito comum é um conceito de direito que carece de ser factualmente integrado), razão pela qual não se vislumbra possível obter a condenação da Ré no pedido. Na verdade, a Ré não é parte contraente e mesmo que tenha sido beneficiária do veículo, certo é que não estando provado o facto jurídico “ casamento” não se vislumbra que possa ser condenada no pedido. (quanto ao “proveito comum” leia-se Ac. do TR de Lisboa de 07.05.2005, in ww.dgsi.pt) »
Ou seja fez tábua rasa do que antes escrevera na sua própria sentença dando uma decisão que não tem em conta tais afirmações descritas na alínea “N” da respectiva fundamentação
Pode fazê-lo de forma legal e válida?
Só se tal afirmação não respeitar a factos.
Efectivamente, o tribunal deve considerar não escritas as respostas sobre questões de direito, (*artº 646º nº 4 do CPC), não podendo como tal basear-se nestas a aplicação do direito e consequentemente a fase decisória.
Ao que acresce que a confissão a que respeita o artº 484º nº 1 do CPC tem por objecto apenas os factos.
A redacção dada à alinea “N” é como resulta do atrás sucintamente exposto quanto às diversas teorias do facto, não contempla questões de facto.
Nem serão precisas muitas palavras para o demonstrar decompondo o teor deste apsso da sentença encontramos: a- O contrato de aluguer dos autos foi celebrado pelo R. marido b- tendo em vista o proveito comum dos casal dos RR., c- e o veículo dos autos foi utilizado em proveito comum e para benefício do casal dos ditos RR, d-pelo que a R. C é solidariamente responsável por estes débitos do R. JOSÉ, seu marido, para com a .autora
A redacção supra designadamente das alíneas b) a d) mas também a da alínea a) é conclusiva, contendo conceitos de direito pejada de juízos de valor ao que acresce até a própria definição do direito aplicável como consta da alínea d) em que agora está decomposto a afirmação em discussão.
Não se vislumbra um único facto em tal redacção.
Só se compreende que a mesma (como aliás outras alíneas) constantes da fundamentação de facto, façam parte da sentença recorrida; se admitirmos que se terá tratado de uma transcrição por modo informático do que consta no articulado da petição inicial cuja revisão se terá processado de modo assaz desatento.
Daí que, se deva ter por não escrita aquela alínea “N” e como tal não deva esta fazer parte das razões de direito encontradas na sentença apelada.
Teve-o de forma implícita a primeira instancia e nesta Relação se tem tal alínea por anulada ao abrigo do disposto no nº 4 do artº 712º do CPC.
Sucede ainda que por nada mais ter sido alegado na petição inicial (a alínea “N” supra é o decalque do artº 21º da petição inicial, nada mais há que considerar tendo em conta a pretensão da autora.
Conclui-se pois nesta parte que:
O teor da alinea “N” da matéria assente na sentença recorrida se tem por anulado nesta Relação porquanto, versa exclusivamente conceitos de direito e conclusões sendo desprovido de factos.
No Tribunal recorrido a não ponderação daquela matéria na parte decisória não constitui vicio algum porquanto a mesma já ali se deveria , ter por não escrita considerando-se que assim foi mesmo que apenas de forma implícita.
Logo, improcede por aqui a conclusão da recorrente. 6ª do recorrente.
A 2ª questão colocada pelo recorrente prende-se com os efeitos e alcance da cominação do artº 484º do CPC ou mais propriamente com o alcance das excepções àquele efeito.
Dispõem os citados normativos:
ARTIGO 484.º
(Efeitos da revelia)
1. Se o réu não contestar, tendo sido ou devendo considerar-se citado regularmente na sua própria pessoa ou tendo juntado procuração a mandatário judicial no prazo da contestação, consideram-se confessados os factos articulados pelo autor.
2. …
ARTIGO 485.º
(Excepções)
Não se aplica o disposto no artigo anterior:
a)…
b)…
c) Quando a vontade das partes for ineficaz para produzir o efeito jurídico que pela acção se pretende obter;
d) Quando se trate de factos para cuja prova se exija documento escrito.
Em causa estará a interpretação da alínea d) do artº 485º (CPC) (1)
Esta norma prende-se com os efeitos atribuídos à revelia do réu.
Revelia em sentido próprio significa ausência de contestação, esta entendida como atitude definitiva.
Em processo civil a situação de revel não traduz a violação de um dever.
Como sustenta Jauerning “Zivilprosessrecht” in 18ª ed 219, “, é possível conceber dois sistemas para a revelia.
Segundo um, nem sequer é um ónus o réu não comparece, não sofre com isso qualquer inconveniente o autor continua a ter de provar todos os factos que alegou; ( foi o sistema comum no código de processo civil de 1876 e no nosso direito actual os casos consagrados de excepções ao artº 484º do CPC); e segundo o outro sistema a comparência em juízo é um ónus acarreta desvantagens para o réu designadamente no domínio da prova; antes poderá traduzir um ónus da parte cujo não cumprimento acarreta determinados inconvenientes.
O segundo sistema foi adoptado na lei prussiana de 1793; na ZPO alemã (1877) no Code Procédure Civil francês de 1806 e no código de 1939.(a partir do DL nº 3 de 29.05.1907 (processo sumário); artº 4º das reformas de 1926 e 1932.(2)
Para os Romanos pelo menos na época clássica em caso de revelia era atribuído ao autor através duma “missio in possessionem” a posse dos bens dos réus “quid non defenduntur siquidem litent” Ulpiano, digesto 4,6-, 21.2
Por outro lado a cominação dirigir-se ao pedido (cominação plena) isto é ao direito reclamado e como tal o tribunal em tal caso fica dispensado de apreciar os factos limitando-se a proferir a sentença condenatória; (era este o regime que vigorava no cpc de 1939, e de 1961) para os processos sumário e sumaríssimo (artº 784º e 793º e 796ºdo cpc de 1961)
Ou ser dirigida apenas aos factos caso em que o tribunal tem necessariamente de apreciar o valor desta confissão ficta enquanto meio de prova admissível por suficiente cominação semiplena (antes vigorava para o processo ordinário. (cpc de 1961 artº 484º nº 1 e artº 489º do cpc de 1939).
Hoje em dia o regime é o da cominação semiplena
Daí que não tenha razão o recorrente na sua conclusão 3ª da sua alegação.
Aliás para o processo ordinário mesmo no código de 1939 o cominatório era semipleno. (ver artº 489 do cod 1939.)
Podemos desde já concluir que por um lado o efeito cominatório visa factos (não se aplica a conceitos de direito ou quaisquer juízos de valor), e por outro lado só é operante quanto aos factos para cuja prova a lei não exija documento.
Defende o recorrente que sendo o casamento facto que só admite prova documental tal prova não é porém exigível nos casos em que como nestes autos se está perante direitos disponíveis.
Que dizer?
Entende-se, que não lhe assiste razão.
Uma situação, é a que resulta da discussão versar direito disponível e consequente o facto poder ser abrangido por tal natureza.
Outra situação, distinta desta é aquela em que a relação jurídica está no âmbito da disponibilidade das partes mas a lei exige que o facto que lhe deu causa se prove por documento.
A estas duas situações, autonomizadas correspondem duas alíneas do artº 485º do CPC alínea c) e alínea d).
A questão da indisponibilidade do direito a que o facto respeita para além de expressamente salvaguardada na alínea c) tem uma abrangência maior , por não admitir a confissão mesmo em relação a factos que fora de tais casos admitem a prova testemunhal.
Quer dizer, enquanto numa acção de divórcio o facto de o réu desferir um murro na face a autora, por ser facto constitutivo de direito indisponível não admite a confissão; já numa acção de indemnização por responsabilidade civil extracontratual tal facto admitirá a confissão, por ser sobre ele admissível prova testemunhal.
O raciocínio é pois o contrário do que vem sustentado.
Se o facto admite qualquer meio de prova então é-lhe aplicável a cominação, se a acção não versa direitos indisponíveis; e não é, no caso contrario por exceptuado pela alínea c) do artº 484º
Se o facto, só admite prova documental, porque existe lei expressa nesse sentido, então seja qual for a acção, tratando-se de facto constitutivo da causa de pedir, independentemente de qual seja ela, então cabe na previsão da alínea d) e não se submete ao cominatório.
Em tal caso a confissão será ineficaz, por insuficiente, o que subsiste em todos os casos em que a lei expressamente declara que o facto só pode ser provado por documento.
O casamento é exactamente um desses factos.artº 1º nº 1 d); 4º e 211º todos do CRCivil.
Neste mesmo sentido Ac desta Relação de 21.05.05, relatado pelo desembargador Pereira Rodrigues in WWW dgsi.pt onde pode ler-se “…casado não é quem tem a aparência de o ser mas quem goza do registo de tal estado a seu favor e o pode demonstrar por documento. no âmbito dos negócios jurídicos importa saber quem é casado com quem em determinado ciclo temporal sabendo-se que o cônjuge ao tempo de determinado evento pode não ser o cônjuge ao tempo da acção… e isso só através da certidão de registo se pode provar…aliás o próprio regime de bens no casamento pode ser relevante para responsabilizar ou não o cônjuge, o que exige a certidão de casamento… pelo que só esta deve ser admitida para fazer prova de determinado casamento …se a prova do casamento constituir uma condição de procedência de determinada acção , contra o cônjuge do demandado.(3)
De todo o modo, fora de duvida é que o casamento é nestes autos constitui facto essencial à pretensão da autora contra a ré já que esta não outorgou ou por qualquer modo teve intervenção no contrato discutido.
Daí que seja de aplicar a excepção do artº 485 d) do CPC declarando a confissão insuficiente.
Improcedem pois as conclusões 2ª 3ª 4ªdas alegações da recorrente.
Finalmente sempre se dirá que a jurisprudência citada ao longo das alegações de recurso pelo recorrente tendo sido proferida nos anos de 1988, 1982, 1984, 1985, 1975, e toda reportada ao processo sumário não tem já aplicação porquanto como acima se escreveu antes da reforma de 1995 o principio no processo sumario e sumaríssimo era o do cominatório pleno pelo que se entendia que a não contestação implicava a confissão do pedido, o que dispensava o tribunal da indagação sobre os factos que vinha articulados.
Decisão
Acordam os Juízes desta Relação em negar provimento ao recurso de Apelação confirmando a decisão da sentença recorrida.
Lisboa, 31/10/2006
Isoleta Almeida Costa
Eurico Reis
Ana Grácio
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1 O Prof A Reis falando do código de processo civil de 1876 in breve estudo sobre a reforma do processo civil e comercial 2ª ed pg 118 escreveu: “Pelo código de processo a falta de oposição ao pedido não dispensava, em regra o autor de fazer a prova das suas alegações. Exceptuados os processos especiais de natureza cominatória a falta de impugnação não importava confissão nem dos factos nem do direito”
2 Para os Romanos pelo menos na época clássica em caso de revelia era atribuído ao autor através duma “missio in possessionem” a posse dos bens dos réus “quid non defenduntur siquidem litent” Ulpiano, digesto 4,6. 21. .2. Este era também o nosso regime antigo. Lei de D Afonso II livro das leis e das posturas 24 “ se a demanda em lugar de revelia for deitado por juízo daqauilo sobre que lhe fazem e demanda e entregada à outra parte …pedirá que lhe julguem por revel o citado e por sua revelia quwe o meta em possessão de coisa demandada …”31.
Foi com D Fernando, Afonsinas III 27 que o regime da revelia se veio a aproximar do actual cominatório pleno.
3 Neste sentido veja-se ainda Ac desta Relação de 12.10.2000 proferido no processo 0064576 relatado pela Desembargadora Fernanda Isabel, de 2.6.006 proferido no processo4652/06 relatado pela Desembargadora Rosa Coelho; Ac proferido no processo 7488.06 relatado Desembargador Rui Torres Vouga de 10.10.06; o Prof A Reis em anot ao artº 489º do CPC de 1939 «a confissão Tácita admitida pelo artº 488º é inoperante quando diga respeito a facto que só possa ser provado por documento autentico ou autenticado, vol III CPC anot 3ª ed pg 16.
Em sentido menos rigoroso porquanto admite a prova por confissão de tais factos no processo quando estes não constituam objecto directo da acção vde AC do STJ de 14.01.2003 Relatado pelo Consº Afonso de Melo procº 02ª4346 e Ac do StJ de 6.2.03 proferido no processo 02B4731 relatado pelo Consº Sousa Inês, ambos estes in WWW dgsi.pt