I - Entre as diversas espécies de títulos executivos, contam-se os “documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva” (artigo 46.º, número1, alínea d) do Código de Processo Civil), estipulando o artigo 101.º, número 1 do RAU que “o contrato celebrado nos termos do artigo 98º, em conjunto com a certidão de notificação judicial avulsa requerida pelo senhorio, nos termos do artigo 100º, constitui título executivo para efeitos de despejo do local arrendado”, devendo o despejo aí referido ser obtido através da execução ordinária para entrega de coisa certa (número 2 do mesmo dispositivo legal).
II - Com a entrega voluntária por parte da executada SOCIEDADE, LDA do imóvel arrendado, traduzida na mudança das suas fechaduras, na retirada do seu interior de diversos bens móveis ali existentes e do investimento dos exequentes na posse efectiva do espaço correspondente, o objecto da execução, conforme se acha delineado pelo título executivo (limites, fins e partes) esgotou-se, tendo o tribunal recorrido bem andado ao indeferir as demais diligências requeridas pelos recorrentes.
III - As pessoas que utilizam a outra parte do imóvel dos autos são terceiros relativamente ao título executivo que suporta a presente execução, não tendo os Exequentes legitimidade material ou formal para, com base naqueles dois documentos conjugados – contrato de arrendamento e notificação judicial avulsa – obterem o despejo (porque é essa a finalidade visada na presente execução) de pessoas que não figuram nos mesmos (idêntico raciocínio deve ser desenvolvido para uma situação de ocupação sem título legítimo por parte desses indivíduos, pois o título executivo aqui em causa ainda sustenta menos tal actuação, dado esta, caso exista uma recusa em proceder voluntariamente a tal desocupação e não nos movamos dentro dos pressupostos da acção directa ou num quadro de natureza penal, impõe a procedência de uma prévia acção de reivindicação e subsequente execução coerciva da mesma – artigo 1311.º e seguintes do Código Civil).
IV - Tal utilização parcial do prédio por terceiros poderia ter radicado a suspensão da execução ou das diligências executórias, nos termos e para os efeitos do artigo 930.º-B, números 1 e 2, do Código de Processo Civil, mas, por um lado, não foi desencadeada qualquer oposição à execução, deduzidos embargos de terceiro ou accionado o procedimento legalmente previsto para a suspensão da entrega do imóvel, como, por outro, atendendo aos elementos constantes dos autos e ao enquadramento jurídico efectuado, não haveria fundamento legal para o Sr. Solicitador de Execução actuar dessa forma, com a elaboração da certidão das ocorrências, advertência aos detentores (terceiros) e pedido por parte destes da confirmação da suspensão (cf. alíneas a) e b) do número 2 e número 4 da disposição legal em questão) (JES)
JOSÉ, devidamente identificado a fls. 2 e MARIA, identificada a fls. 3 dos autos, intentaram, em 3/04/2006, uma acção executiva para entrega de coisa certa, sob a forma de processo comum contra SOCIEDADE, LDA, igualmente identificada a fls. 3, tendo pedido, no respectivo Requerimento Inicial, a entrega do o prédio urbano sito na Quinta…, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 777.º, por contrato celebrado a 31.7.2000 e designado o Solicitador de Execução Luís, conforme cópia dessa peça processual que se encontra junta a fls. 2 e seguintes e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
Fundaram tal pedido executivo nos seguintes factos:
1) Os Exequentes deram de arrendamento, para comércio ou indústria, à Executada, o prédio urbano sito na Quinta, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.° e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 777.º, por contrato celebrado a 31.7.2000, que se junta e cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
2) O referido contrato é válido desde 1.8.2000 - data a que as partes fizeram reportar o início dos respectivos efeitos - por um período de cinco anos, até 31.7.2005, findo o qual seria automaticamente renovado por um período de um ano;
3) Podendo ser denunciado com sessenta dias de antecedência sobre o fim do período contratual de 5 anos (cf. cláusula 3.ª);
4) Pretendendo denunciar o contrato de arrendamento mencionado, os Exequentes requereram a notificação judicial da Executada, em 16.5.2005, tendo esta sido efectuada na pessoa da sua sócia gerente Margarida, conforme certidão judicial que se junta e cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
5) Pelo exposto deverá a Executada entregar o imóvel supra identificado aos Exequentes livre de pessoas e bens;
6) O contrato de arrendamento em conjunto com a certidão de notificação judicial juntos constituem título executivo nos termos dos artigos 46.º n.° 1 alínea d) do Código de Processo Civil e 101.º do Regime do Arrendamento Urbano.
O Sr. Solicitador de Execução juntou aos autos, em 17/07/2006, ofício, acompanhado de um Termo de Entrega, onde vinha informar que já tinha concretizado a entrega do imóvel objecto da presente execução, conforme ressalta de fls. 56 a 65.
Verifica-se do teor de tal Termo de Entrega que, no dia 15/07/2006, o Sr. Solicitador de Execução se deslocou à Quinta, Lisboa afim de proceder à entrega do imóvel dos autos, encontrando-se presentes os mandatários das partes, o gerente da Executada, Sr. Joaquim, três agentes policiais e três ocupantes dos espaços J11, D10, D11 e H1-2, tendo-se procedido à substituição de fechaduras e as chaves respectivas sido entregues ao mandatário dos Exequentes, vindo estes últimos a remover bens ali existentes e que fazem parte de uma lista anexa ao Termo.
Os Exequentes vieram, em 29/09/2006, apresentar um requerimento do seguinte teor:
1 - Consta do termo de entrega de fls. 57 e segs. que "foi então efectuada e substituição de fechaduras, tendo as chaves respectivas sido entregues ao mandatário dos exequentes, que, de como as recebeu, vai também assinar".
2 - E, com efeito, assim aconteceu. Porém,
3 - Dentro do imóvel despejando encontravam-se terceiros, que se recusaram a abandonar o imóvel, ameaçando, inclusivamente, recorrer à força física para ali se manterem.
4 - E, nessa altura, já não se encontrava presente no local qualquer Agente da autoridade.
5 - Por outro lado, o Sr. Solicitador de Execução não suspendeu as diligências executórias nos termos do n.° 2 do artigo 930.°-B do Código de Processo Civil.
6 - E, de facto, nem tinha que o fazer, já que não se verificaram as circunstâncias previstas no referido preceito legal.
7 - De resto, nenhum dos detentores do imóvel solicitou a V. Exa. a confirmação da suspensão da execução (n.°s 3 a 5 do art.° 930.°-B do Cód. Proc. Civil).
8 - Assim, não teve lugar qualquer suspensão da execução; e, obviamente, não foi requerida a confirmação judicial da suspensão.
9 - Mas a verdade é que os exequentes continuam a não ter o imóvel livre e devoluto de pessoas e bens.
10 - Para melhor se perceber a situação, esclarecer-se-á que o imóvel despejando consiste num conjunto de pequenos edifícios, integrados em recinto fechado, cujo acesso se faz através de dois portões, sendo um para veículos automóveis e pessoas e o outro simplesmente pedonal.
11 - Dentro do aludido recinto, há ainda pequenos arruamentos, sendo certo que em partes de alguns dos edifícios continuam os aludidos terceiros.
12 - Isto significa que a execução do despejo do imóvel dos autos, não está completa e cumpre que o esteja.
13 - Como muito bem se refere em "A Acção Executiva para Entrega de Imóvel Arrendado", de Maria Olinda Garcia (Faculdade de Direito de Coimbra), "Na execução para entrega de coisa imóvel arrendada, não basta que o agente de execução invista o exequente na posse do imóvel, entregando-lhe as chaves e que advirta o detentor para que reconheça o direito do exequente, lavrando auto dessa ocorrência", que foi simplesmente o que fez o Sr. Solicitador de execução (cfr. fls. 57 e 58). "Tem de haver efectiva desocupação do local. O exequente pretende que o imóvel lhe seja entregue devoluto, ou seja, livre de pessoas e bens, como devia ter acontecido voluntariamente à data da extinção do arrendamento". E, mais adiante, acrescenta-se: "Na execução para entrega de coisa imóvel arrendada a apreensão e entrega do imóvel ao exequente são uma única operação".
14 - Ora, foi essa operação que, pelos motivos atrás expostos, não ficou completa.
15 -Assim, requer-se:
a) Que seja notificado o Sr. Solicitador de execução de que deverá efectuar nova deslocação ao imóvel dos autos para proceder à desocupação efectiva do mesmo por parte de quem eventualmente o detenha.
b) Que antes da execução dessa diligência se requisite a intervenção da Polícia de Segurança Publica para acompanhar na mesma o Sr. Solicitador de execução, assegurando a ordem, protegendo a integridade física deste e de auxiliares seus e garantindo que desta feita a execução seja integralmente consumada, como é de lei.”
- Conforme referido no termo de Entrega, encontravam-se presentes na data designada para entrega o Sr. Joaquim, legal representante da executada, o Sr. Dr. Cunha, Advogado da executada e o Sr. Dr. Carlos, mandatário da exequente.
- Assim, veio a executada voluntariamente fazer a entrega do imóvel objecto dos presentes autos, tendo pelo exequente sido efectuada a substituição da fechadura e as chaves ficado na sua posse, tendo-se assim consumado a entrega pelo próprio executado ao exequente.
- Não obstante, sempre se dirá que efectivamente, pôde o aqui agente de execução constatar que o espaço objecto de entrega é constituído por vários edifícios autónomos, na sua maioria devolutos, mas existindo alguns que se encontram efectivamente ocupados por terceiros.
- Terceiros estes que invocaram perante o exequente uma decisão proferida no âmbito de uma providência cautelar, para continuarem no local, entendendo que lhes subsiste o direito de ali permanecerem, tendo efectivamente recusado abandonar o local e ameaçado recorrer à força para ali se manterem.
- Não efectuou o agente de execução quaisquer outras diligências, em virtude de no âmbito da presente execução, ter o executado entregue voluntariamente ao exequente o imóvel objecto da presente execução, tendo assim entendido estar esgotada a sua acção no âmbito dos presentes autos.
Assim, e perante o exposto pelo exequente, requer-se a V. Exa. se digne pronunciar quanto à desocupação dos terceiros que ainda ali efectivamente se encontrem, solicitando desde já a V. Exa. se digne autorizar o auxílio da força policial, caso seja entendimento de V. Exa. proceder-se à desocupação, devendo também nesse caso o exequente tomar desde logo todas as medidas definitivas que se encontrem ao seu alcance no intuito de impedir o acesso ao local, uma vez que, tendo o mesmo vários acessos abertos, fácil se torna para qualquer pessoa entrar no local e ocupar o que quer que seja.
O facto de este se encontrar ocupado (parcialmente) por terceiros, que não a executada, é facto estranho a estes autos, não cumprindo nem tendo este tribunal competência, no âmbito dos mesmos, para proceder nos termos requeridos a fls. 61-63.
Assim, por falta de cabimento legal, indefere-se ao requerido.
Notifique”;
O juiz do processo admitiu, a fls. 76, o recurso de agravo interposto, tendo determinado a sua subida imediata, nos próprios autos e fixado o efeito suspensivo.
(…)
II – OS FACTOS
1) JOSÉ e MARIA, intentaram, em 3/04/2006, uma acção executiva para entrega de coisa certa, sob a forma de processo comum contra SOCIEDADE, LDA, pedindo, no respectivo Requerimento Inicial, a entrega do o prédio urbano sito na Quinta, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 2380 e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 777.º, por contrato celebrado a 31.7.2000 e designado o Solicitador de Execução Luís;
2) Fundaram tal pedido executivo num contrato de arrendamento para comércio ou indústria, celebrado entre as partes, do prédio urbano identificado na alínea anterior, válido desde 1.8.2000 e por um período de cinco anos, até 31.7.2005, findo o qual seria automaticamente renovado por um período de um ano;
3) Tal contrato de arrendamento podia ser denunciado com sessenta dias de antecedência sobre o fim do período contratual de 5 anos (cf. cláusula 3.ª);
4) Pretendendo denunciar o contrato de arrendamento mencionado, os Exequentes requereram a notificação judicial da Executada, em 16.5.2005, tendo esta sido efectuada na pessoa da sua sócia gerente Margarida, com domicílio na Rua…, Lisboa;
5) O contrato de arrendamento em conjunto com a certidão de notificação judicial juntos constituem título executivo nos termos dos artigos 46.º n.° 1 alínea d) do Código de Processo Civil e 101.º do Regime do Arrendamento Urbano.
6) Feita a citação da Executada, veio o Sr. Solicitador de Execução juntar aos autos, em 17/07/2006, ofício, acompanhado de um Termo de Entrega, onde vinha informar que já tinha concretizado a entrega do imóvel objecto da presente execução, conforme ressalta de fls. 56 a 65;
7) Verifica-se do teor de tal Termo de Entrega que, no dia 15/07/2006, o Sr. Solicitador de Execução se deslocou à Quinta, Lisboa a fim de proceder à entrega do imóvel dos autos, encontrando-se presentes os mandatários das partes, o gerente da Executada, Sr. Joaquim, três agentes policiais e três ocupantes dos espaços J11, D10, D11 e H1-2, tendo-se procedido à substituição de fechaduras e as chaves respectivas sido entregues ao mandatário dos Exequentes, vindo estes últimos a remover bens ali existentes e que fazem parte de uma lista anexa ao Termo;
8) Os Exequentes vieram, em 29/09/2006, apresentar o requerimento que se mostra junto a fls. 61 e 62 e onde, por entenderem que a entrega do dito imóvel ainda não se mostra concluída, por aquele se achar ocupado parcialmente por terceiros, que se recusam a entregar as partes que ocupam, formulam as seguintes pretensões:
a) Que seja notificado o Sr. Solicitador de execução de que deverá efectuar nova deslocação ao imóvel dos autos para proceder à desocupação efectiva do mesmo por parte de quem eventualmente o detenha.
b) Que antes da execução dessa diligência se requisite a intervenção da Polícia de Segurança Publica para acompanhar na mesma o Sr. Solicitador de execução, assegurando a ordem, protegendo a integridade física deste e de auxiliares seus e garantindo que desta feita a execução seja integralmente consumada, como é de lei.”;
9) O Agente da Execução foi notificado a fls. 64 do teor do requerimento dos Exequentes, tendo vindo a pronunciar-se sobre o mesmo nos seguintes moldes:
“- Conforme referido no termo de Entrega, encontravam-se presentes na data designada para entrega o Sr. Joaquim, legal representante da executada, o Sr. Dr. Cunha, Advogado da executada e o Sr. Dr. Carlos, mandatário da exequente.
- Assim, veio a executada voluntariamente fazer a entrega do imóvel objecto dos presentes autos, tendo pelo exequente sido efectuada a substituição da fechadura e as chaves ficado na sua posse, tendo-se assim consumado a entrega pelo próprio executado ao exequente.
- Não obstante, sempre se dirá que efectivamente, pôde o aqui agente de execução constatar que o espaço objecto de entrega é constituído por vários edifícios autónomos, na sua maioria devolutos, mas existindo alguns que se encontram efectivamente ocupados por terceiros.
- Terceiros estes que invocaram perante o exequente uma decisão proferida no âmbito de uma providência cautelar, para continuarem no local, entendendo que lhes subsiste o direito de ali permanecerem, tendo efectivamente recusado abandonar o local e ameaçado recorrer à força para ali se manterem.
- Não efectuou o agente de execução quaisquer outras diligências, em virtude de no âmbito da presente execução, ter o executado entregue voluntariamente ao exequente o imóvel objecto da presente execução, tendo assim entendido estar esgotada a sua acção no âmbito dos presentes autos.
Assim, e perante o exposto pelo exequente, requer-se a V. Exa. se digne pronunciar quanto à desocupação dos terceiros que ainda ali efectivamente se encontrem, solicitando desde já a V. Exa. se digne autorizar o auxílio da força policial, caso seja entendimento de V. Exa. proceder-se à desocupação, devendo também nesse caso o exequente tomar desde logo todas as medidas definitivas que se encontrem ao seu alcance no intuito de impedir o acesso ao local, uma vez que, tendo o mesmo vários acessos abertos, fácil se torna para qualquer pessoa entrar no local e ocupar o que quer que seja”;
10) O juiz titular do processo proferiu o despacho datado de 21/11/2006 e constante de fls. 69, do teor seguinte: “Conforme resulta do termo de fls. 57-58, a pretensão deduzida e objecto do presente processo mostra-se satisfeita, uma vez que a executada procedeu à entrega do imóvel e das respectivas chaves.
O facto de este se encontrar ocupado (parcialmente) por terceiros, que não a executada, é facto estranho a estes autos, não cumprindo nem tendo este tribunal competência, no âmbito dos mesmos, para proceder nos termos requeridos a fls. 61-63.
Assim, por falta de cabimento legal, indefere-se ao requerido.
Notifique”;
11) Os Exequentes vieram, a fls. 74 e em 7/12/2006, interpor recurso de agravo desse despacho judicial, considerando que o recurso em causa deveria subir imediatamente e nos próprios autos.
III – O DIREITO
(…)
A única questão suscitada no âmbito do presente recursos de agravo é, tão-somente, a seguinte: o tribunal recorrido, perante a utilização parcial do prédio que havia sido arrendado à Executada e pertencente aos Exequentes, deveria ter determinado ao Sr. Solicitador da Execução que procedesse à desocupação dessas partes do imóvel, assim o entregando, totalmente livre e devoluto, aos recorrentes?
Pensamos que a resposta tem de ser necessariamente negativa, pelas razões que iremos passar a expor.
Os artigos 45.º a 52.º do Código de Processo Civil estatuem acerca dos documentos que podem ser qualificados como títulos executivos e que, nessa medida, são susceptíveis de fundar uma acção executiva, sendo certo que, de acordo com o número 1 do artigo 45.º, número 1, “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva”.
Entre as diversas espécies de títulos executivos, contam-se os “documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva” (artigo 46.º, número1, alínea d) do Código de Processo Civil), estipulando o artigo 101.º, número 1 do RAU que “o contrato celebrado nos termos do artigo 98º, em conjunto com a certidão de notificação judicial avulsa requerida pelo senhorio, nos termos do artigo 100º, constitui título executivo para efeitos de despejo do local arrendado”, devendo o despejo aí referido ser obtido através da execução ordinária para entrega de coisa certa (número 2 do mesmo dispositivo legal).
Ora, do confronto entre o contrato de arrendamento junto a fls. 14 e seguintes e o disposto no artigo 98.º do RAU, que constitui a primeira disposição da Subsecção referente aos “contratos de duração limitada” e que trata da “estipulação de prazo efectivo”, não restam dúvidas de que nos achamos face a uma negócio de locação dessa natureza e que o mesmo, conjuntamente com a Notificação Judicial avulsa que procedeu à sua denúncia (artigo 100.º, número 4 do RAU), constitui título executivo.
Chegados aqui, importa atentar, finalmente, no que estipula o artigo 55.º, número 1, do Código de Processo Civil, com referência à legitimidade do exequente e do executado: “A execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor.”
Sendo este o quadro legal que importa considerar, é óbvio que, com a entrega voluntária por parte da executada SOCIEDADE, LDA do imóvel arrendado, traduzida na mudança das suas fechaduras, na retirada do seu interior de diversos bens móveis ali existentes e do investimento dos exequentes na posse efectiva do espaço correspondente, o objecto da presente execução, conforme se acha delineado pelo título executivo (limites, fins e partes) se esgotou, tendo o tribunal recorrido bem andado ao indeferir as demais diligências requeridas pelos recorrentes.
Verifica-se que as pessoas que utilizam a outra parte do imóvel dos autos são terceiros relativamente ao título executivo que suporta a presente execução, não tendo os Exequentes legitimidade material ou formal para, com base naqueles dois documentos conjugados – contrato de arrendamento e notificação judicial avulsa – obterem o despejo (porque é essa a finalidade visada na presente execução) de pessoas que não figuram nos mesmos (idêntico raciocínio deve ser desenvolvido para uma situação de ocupação sem título legítimo por parte desses indivíduos, pois o título executivo aqui em causa ainda sustenta menos tal actuação, dado esta, caso exista uma recusa em proceder voluntariamente a tal desocupação e não nos movamos dentro dos pressupostos da acção directa ou num quadro de natureza penal, impõe a procedência de uma prévia acção de reivindicação e subsequente execução coerciva da mesma – artigo 1311.º e seguintes do Código Civil).
Os Exequentes, nas suas alegações, sustentam, nomeadamente, a sua tese na obra "A acção Executiva para Entrega de Imóvel Arrendado", págs. 95 e 57 e 58, de Maria Olinda Garcia (Faculdade de Direito de Coimbra), onde se afirma:"Na execução para entrega de coisa imóvel arrendada, não basta que o agente de execução invista o exequente na posse do imóvel, entregando-lhe as chaves e que advirta o detentor para que reconheça o direito do exequente, lavrando auto dessa ocorrência (…) Tem de haver efectiva desocupação do local. O exequente pretende que o imóvel lhe seja entregue devoluto, ou seja, livre de pessoas e bens, como devia ter acontecido voluntariamente à data da extinção do arrendamento " (…) Na execução para entrega de coisa imóvel arrendada a apreensão e entrega do imóvel ao exequente são uma única operação".
Ora, salvo melhor opinião, essa autora, nos excertos acima transcritos, só se refere à situação clássica e habitual de despejo/entrega do imóvel, em que, somente, estão envolvidos o senhorio/ dono/exequente e o inquilino/detentor/executado e já não a casos como o dos autos, em que intervêm terceiros, com ou sem título legítimo para ocuparem parte ou a totalidade do prédio.
Também não ressalta dos autos que tais terceiros utilizam parte do prédio despejado e anteriormente arrendado à aqui executada a mando e/ou por indicação desta última ou por mera tolerância da mesma, só para dificultar a entrega e criar problemas aos donos daquele, de forma a equacionar-se a extensão, ainda que prudente e avisada, do regime constante dos artigos 930.º e seguintes do Código de Processo Civil a tal situação irregular.
Finalmente, de acordo com o Sr. Solicitador de Execução, esses terceiros invocaram, perante o exequente, uma decisão judicial proferida nuns Autos de Providência Cautelar como justificação para a presença e utilização parcial do dito imóvel, o que, ao suscitar fundadas dúvidas quanto à legalidade da desocupação perseguida pelos Exequentes, imporia ao julgador uma actuação prudente e avisada, de indeferimento do correspondente pedido.
Tal utilização parcial do prédio por terceiros poderia ter radicado a suspensão da execução ou das diligências executórias, nos termos e para os efeitos do artigo 930.º-B, números 1 e 2, do Código de Processo Civil, conforme é referido pelos exequentes, mas, por um lado, não foi desencadeada qualquer oposição à execução, deduzidos embargos de terceiro ou accionado o procedimento legalmente previsto para a suspensão da entrega do imóvel, como, por outro, atendendo aos elementos constantes dos autos e ao enquadramento jurídico que deles fizemos, não haveria fundamento legal para o Sr. Solicitador de Execução actuar dessa forma, com a elaboração da certidão das ocorrências, advertência aos detentores (terceiros) e pedido por parte destes da confirmação da suspensão (cf. alíneas a) e b) do número 2 e número 4 da disposição legal em questão).
Sendo assim, pelas razões expostas, bem andou o tribunal recorrido ao indeferir o requerimento dos Exequentes de fls. 61 a 63.
IV – DECISÃO
Por todo o exposto, nos termos do artigo 713.º do Código de Processo Civil, acorda-se neste Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao presente recurso de agravo interposto pelos agravantes JOSÉ e MARIA e, nessa medida, confirmar o despacho recorrido.
Custas do recurso a cargo dos Agravantes.
Registe e notifique.
Lisboa, 14 de Junho de 2007
(José Eduardo Sapateiro)
(Carlos Valverde)
(Granja da Fonseca)