Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
CONDOMÍNIO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Sumário
Tendo os condóminos apenas sofrido desgaste e incómodos com a realização de reuniões extraordinárias convocadas pelo condomínio, não revestem aqueles danos não patrimoniais, gravidade objectiva que justifique a tutela do direito (artº 496º/1 do CC) em termos de ressarcimento indemnizatório. MJS
Texto Integral
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de LisboaI - RELATÓRIO
CONDOMÍNIO (...), instaurou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinária contra O, ADMINISTRAÇÃO, LDA., pedindo que o contrato de prestação de serviços de portaria seja declarado nulo, por falta de legitimidade da suposta representante da ré, e caso assim não se julgue, deve o referido contrato ser anulado, nos termos do art. 261º, n.º 1 do Código Civil, ou, por último, deve o referido contrato ser declarado ineficaz relativamente ao autor, e em qualquer caso, deve ainda a ré, ser condenada no pagamento da indemnização por danos não patrimoniais, de valor nunca inferior a € 14.500.
Alega, para tanto e em suma, que por acta da Assembleia do Condomínio autor de 30/01/2001, foi deliberada, a eleição da ré como administradora das partes comuns do edifício sito na Rua João de Freitas Branco, em Lisboa, que por acta da Assembleia do Condomínio autor de 31/01/2002 foi deliberada a renovação do mandato da ré, e em 06/05/2003, foi deliberado não proceder à reeleição da ré, cujas funções de administradora cessaram em 31/05/2003, em cuja Assembleia os condóminos do autor tomaram conhecimento que, em 27/06/2002, e sem prévia deliberação da Assembleia do Condomínio autor nesse sentido, a ré celebrou, em pretensa representação do autor, consigo mesma, um contrato de prestação de serviços de portaria, junto aos autos como doc. n.º 4.
Mais alega que na Assembleia do Condomínio autor de 24/06/2003, os condóminos manifestaram a sua indignação e repúdio pela celebração abusiva por parte da ré do referido contrato de prestações de serviços, tendo decidido por unanimidade tomar as medidas judiciais necessárias para assegurar os seus direitos, sendo manifesta a falta de poderes de representação da ré para a celebração de tal contrato em nome do autor, e ineficaz em relação ao autor.
Acresce a circunstância da suposta representante da ré, Z, não ser, à data da celebração do contrato de prestação de serviços, sócia da ré, nem titular de quaisquer poderes de representação que lhe permitissem celebrar, em nome daquela, qualquer negócio jurídico cujos efeitos se repercutissem na sua esfera jurídica, porquanto apenas se tornou sócia da ré em 26/09/2002, e apenas nessa data assumiu a gerência da mesma, consequentemente os actos por aquela praticados até à referida data carecem de legitimidade, não sendo passíveis de produzir quaisquer efeitos, e como tal é nulo o aludido contrato.
Alega ainda que, caso assim não se entenda, sempre se teria de entender que o contrato de prestação de serviços em causa estaria ferido de anulabilidade nos termos do n.º 1 do art. 261º do Código Civil, porquanto, a ré, em pretensa representação do autor, celebrou consigo mesma o contrato supra descrito, sem para tal estar contratualmente habilitada, pelo que, a conduta da ré, constitui um acto ilícito, praticado em clara violação do contrato de prestação de serviços celebrado com o autor, gerador de responsabilidade civil contratual, devendo ser a ré condenada no pagamento de indemnização pelos danos originados pela sua conduta, designadamente, a necessidade de terem sido realizadas inúmeras reuniões e contactos extraordinários com os condóminos que provocaram um desgaste e incómodo significativos.
A ré contestou, por excepção, invocando a ilegitimidade do autor, alegando que carece de autorização e poderes para representar o condomínio na presente lide, porquanto das várias actas juntas aos autos, não consta qualquer deliberação no sentido de atribuir poderes necessários ao administrador para interpor qualquer tipo de acção judicial contra a aqui ré, e por impugnação, alegando, em essência, que a ré ao realizar os contratos de serviços quer de portaria quer de limpeza com a autora limitou-se a exercer o poder que lhe tinha sido atribuído pela assembleia geral, prestando serviços de interesse comum, não se vislumbrando qualquer hipótese de o autor invocar o desconhecimento do contrato de prestação de serviços de portaria, tanto mais que todas as decisões da administração foram tomadas não pelo administrador, mas por imposição e orientação da comissão de acompanhamento da administração.
Mais alega que a ré só celebrou o contrato de prestação de portaria em benefício do autor, já que esta passou a poder prescindir do serviço prestado a título de administração do condomínio e optar por manter o contrato de prestação de serviços de portaria, passando a existir um contrato para cada tipo de serviço, e que a Dra. Z desde 03/05/2002 foi nomeada gerente da ré que com o sócio gerente, passaram a obrigar a sociedade em todos os seus actos e contratos, pelo que não é ferido de nulidade o aludido contrato de prestação de serviços de portaria, tanto mais que o autor ao aprovar os orçamentos de despesas anual e a rubrica de serviços de portaria orçamentada está tacitamente a aceitar a prestação de serviços de portaria exercida pela ré.
Alega ainda quanto à indemnização por danos não patrimoniais, admitindo-se a existência de um contrato celebrado consigo mesmo, que cessou os seus termos e efeitos desde a exoneração da administração da ré, não se verificou qualquer tipo de dano, e consequentemente, não há direito a indemnização.
Por fim pede a condenação do autor como litigante de má fé em indemnização não inferior a € 14.500, a reverter a favor da Associação de apoio a crianças portadoras do HIV, Associação Sol, porque o autor sem que lhe assista qualquer razão e autorização, vem a Tribunal exigir o que não pode nem deve.
No despacho saneador, foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade activa.
Prosseguiram os autos, tendo sido proferida sentença, na qual se julgou parcialmente procedente, por parcialmente provada, a presente acção e, consequentemente:
A) Declarou o contrato de prestação de serviços de portaria datado de 27 de Junho 2002, celebrado entre a R. e o representante da R. junto do A., como administrador deste último, ineficaz em relação ao A.;
B) Condenou a R. a pagar ao A., uma indemnização, a título de danos não patrimoniais, no valor de € 5.000,00 (cinco mil euros);
C) No mais absolveu a R. do pedido e,
D) Julgou não verificada a litigância de má-fé por parte do A.
Inconformada veio apelar a ré, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões:
I) O Mmº Juiz fez uma interpretação incorrecta das normas do CC, nomeadamente no que diz respeito ao tipo de danos não patrimoniais ressarcíveis.
II) Só se justifica o ressarcimento de danos que, para além dos demais requisitos da obrigação de indemnizar, sejam objectivamente graves, gravidade essa que é apreciada mediante um padrão objectivo, em função da tutela do direito.
III) Os danos alegadamente sofridos pelo condomínio apelado e pelos quais o Mmº Juiz a quo entendeu condenar a apelante, são danos irressarcíveis, pois, pese embora decorram de um contrato nulo, não revestem gravidade objectiva que justifique a tutela do direito em termos de ressarcimento indemnizatório.
IV) O Mmº Juiz violou na sentença as normas mais elementares do CPC e CC, nomeadamente no que diz respeito ao ónus de prova, ao montante dos danos e ainda por não relegar para execução de sentença a sua quantificação, devendo, por isso, ser revogada a sentença e julgado improcedente o pedido de indemnização por danos não patrimoniais formulado pelo autor.
Por seu turno, o autor/apelado apresentou as suas contra-alegações que rematou com as seguintes conclusões:
A) Não pode ser atendida a pretensão da Recorrente que refere que "os danos alegadamente sofridos pelo condomínio Apelado e pelos quais o Mmº Juiz do Tribunal a quo entendeu condenar a ora Apelante, são danos irresarcíveis, pois, pese embora decorram de um contrato nulo, não revestem gravidade objectiva que justifique a tutela do direito em termos de ressarcimento indemnizatório";
B) Esses danos, tal como resulta da factualidade provada no tribunal a quo são reais e não aparentes ou "alegados" como diz a Recorrente;
C) O dano foi provocado pela celebração de um contrato de vigilância com uma terceira entidade, à revelia do Recorrido, contrato esse que foi declarado ineficaz pelo tribunal a quo;
D) Como resulta da sentença do referido tribunal "os condóminos sofreram incómodos e desgaste, derivados de participarem em reuniões extraordinárias. Ou seja, os condóminos tiveram de sacrificar o seu direito ao descanso, bem como sofreram apreensão resultante da situação perante a qual se viram";
E) Ficou provada a existência de nexo de causalidade entre a celebração do contrato acima referido e o desgaste sofrido pelos condóminos do prédio;
F) Os bens jurídicos que foram postos em causa pela Recorrente são dignos de tutela e protecção jurídicas, por constituírem bens absolutos, do domínio físico e/ou emocional. Como é referido na sentença ora recorrida "não tivesse a R. celebrado sem o conhecimento dos condóminos o contrato em causa nos autos, dando-lhes apenas conhecimento do mesmo nas circunstâncias supra referidas, e jamais os condóminos teriam tido necessidade de realizar reuniões e contactos para além dos que se mostram necessários num período de transição de uma administração para outra, assim como também os condóminos nunca teriam sofrido o desgaste que sofreram".
G) Em consequência, não merece qualquer crítica a sentença pela qual foi a Recorrente condenada a pagar uma indemnização em dinheiro ao Recorrido, no valor de € 5.000 (cinco mil euros), valor calculado de acordo e tendo como referência os dados existentes nos autos e os artºs. 496° e 562° e seguintes do Código Civil.
Foram colhidos os vistos legais.
II – QUESTÕES A RESOLVER
Como se sabe, o âmbito objectivo do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (artºs 684º nº 3 e 690º nº 1 do CPC), importando, assim, decidir as questões nelas colocadas – e, bem assim, as que forem de conhecimento oficioso -, exceptuadas aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – artº 660º nº 2 também do CPC.
Assim, em face das conclusões apresentadas, é a seguinte a questãoa resolver por este Tribunal: -Os danos não patrimoniais provados revestem ou não gravidade objectiva que justifique a tutela do direito em termos de ressarcimento indemnizatório.
III – FUNDAMENTOS DE FACTO
Os factos a ter em consideração são os seguintes:
1) Nos termos que resultam da acta (n.º 17) da Assembleia do Condomínio autor, de 30/01/2001, cuja certidão consta de fls. 114 a 118 dos autos e cujo conteúdo aqui dá por integralmente reproduzido, foi deliberada, a eleição da ré como administradora das partes comuns do edifício sito na Rua João de Freitas Branco, em Lisboa, a quem passaram a competir as funções elencadas no artigo 1436° do Código Civil (alínea a) dos factos assentes);
2) Nos termos que resultam da acta (n.º 18) da Assembleia do Condomínio autor, de 31/01/2002, cuja certidão consta de fls. 119 a 126 dos autos e cujo conteúdo aqui dá por integralmente reproduzido, foi deliberada, a renovação do mandato da ré (alínea b) dos factos assentes);
3) Em 06/05/2003, a Assembleia do Condomínio autor deliberou não proceder à reeleição da ré, cujas funções de administradora cessaram em 31/05/2003, nos termos que resultam da acta (n.º 24) da Assembleia do Condomínio autor, de 31/01/2002, cuja certidão consta de fls. 127 a 137 dos autos e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido (alínea c) dos factos assentes);
4) Da acta referida em 3. consta, nomeadamente, o seguinte:
«(...) Após a votação entrou novamente na sala o representante da O, o qual foi de imediato informado pelo Sr. Presidente da Mesa da AG não ter sido esta empresa reeleita para administrar o Condomínio, cessando assim todas as funções de administração, tendo sido sugerido que tal acontecesse em 31 de Maio, dado que estamos no princípio do mês, ao que este concordou. Pedindo a palavra, o representante da Omniumgeste Dr. Nuno Afonso informou a Assembleia que os elementos da portaria e da limpeza têm contrato até final do ano, facto que era desconhecido de todos, bem como do elemento presente da comissão de acompanhamento. Interpelado sobre os alegados contratos e perante a estranheza de todos os presentes decidiu abandonar intempestivamente a sala sem qualquer explicação (...)» (alínea D) dos factos assentes);
5) De fls. 46 a 48 dos autos, consta um documento, intitulado «CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE PORTARIA», celebrado entre a ré, onde se menciona, designadamente, o seguinte:
«(...) ENTRE:
O, Administração, LDA., pessoa colectiva n.° (…), Lisboa, aqui representada pela sua sócia Z (…), adiante designada por primeira outorgante;
E,
Condomínio do Prédio sito na Rua João de Freitas Branco, 1500-359 Lisboa, pessoa colectiva n.º, aqui representado pela O, Administração, Lda., com escritório na Rua (…), Lisboa, aqui representada pelo sócio F (…), adiante designado como segundo outorgante, é celebrado o presente contrato, nos termos e com as cláusulas seguintes:
CLÁUSULA PRIMEIRA
A primeira outorgante obriga-se a prestar ao segundo outorgante, os serviços de Portaria Permanente de 24 horas, todos os dias do Ano (incluindo Sábados, Domingos e Feriados), incumbindo-lhe deste modo a execução de tarefas relacionadas com esta actividade, de acordo com o regulamento de portaria da Câmara Municipal de Lisboa, anexo a este contrato.
CLÁUSULA SEGUNDA
1º - Pela prestação ora acordada, o segundo outorgante pagará uma quantia mensal no montante de Euros: 2.886,37 (…), ao qual será acrescido o valor de IVA (…).
CLÁUSULA TERCEIRA
1º - O presente contrato tem o seu início no dia 27 de Junho de 2002, e terminus em 26 de Junho de 2003, podendo ser rescindido com 90 (noventa) dias antecedência relativamente ao termo do prazo do contrato ou da sua renovação e, será prorrogado, salvo denúncia por carta registada com aviso de recepção, renovando-se automaticamente por sucessivos períodos (...).
Lisboa, 27 de Junho de 2002 (…)» (alínea E) dos factos assentes);
6) À data da eleição da ré como administradora (31/01/2001), a proposta que a ré apresentou para o exercício de funções de administração do autor incluía, para além dos serviços de administração, a prestação de serviços de portaria (alínea F) dos factos assentes);
7) Na assembleia geral da sociedade ré, que teve lugar em 03 de Maio de 2002, foi deliberado, por unanimidade, «(…) nomear como gerente da sociedade, e a partir esta data, a Senhora Dra. Z, que, em conjunto com o sócio-gerente F, nos termos dos estatutos, obrigam a sociedade em todos os seus actos (…)», nos termos que constam do documento de fls. 87 a 89 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido (alínea G) dos factos assentes);
8) Na cópia da certidão do registo comercial relativo à sociedade ré, que consta de fls. 54 a 59 dos autos e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, consta, nomeadamente registada transmissão resultante de divisão (Ap. 45/020926 – cota n.º 10) nos seguintes termos: «QUOTA DIVIDIDA: 1.250,00 euros QUOTA TRANSMITIDA: 312,50 euros, a favor de Z (…), por cessão de J (…)» (alínea H) dos factos assentes);
9) Na cópia da certidão do registo comercial relativo à sociedade ré, que consta de fls. 54 a 59 dos autos e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, consta, nomeadamente registada alteração parcial do contrato (Ap. 47/020926 - cota n.º 11) nos seguintes temos: «ARTIGOS MODIFICADOS: 1º n.º 1, 3º e 6º n.º 2 TERMOS DA ALTERAÇÃO DE SEDE: (…), Lisboa CAPITAL: 5.000,00 euros SÓCIOS E QUOTAS: 1) F – 4.687,50 euros. 2) Z - 312,50 euros FORMA DE OBRIGAR: Com assinatura de um gerente (…)». (alínea I) dos factos assentes);
10) Só na Assembleia de Condóminos de 06/05/2003 é os condóminos tomaram conhecimento da existência do contrato referido em 5., na sequência de o representante da ré nessa Assembleia, após lhe ter sido comunicada a não reeleição da ré para administrar o autor, os ter informado da existência de tal contrato (resposta aos quesitos 1.º e 2.º);
11) (…) Após o que, interpelado o representante da ré na referida assembleia sobre o alegado contrato, o mesmo abandonou a sala onde a assembleia se realizava sem qualquer explicação (resposta ao quesito 3.°);
12) O contrato referido em 5. foi celebrado pela ré, sem prévia deliberação da assembleia do condomínio autor (resposta ao quesito 4.°);
13) O autor não consentiu na celebração do contrato referido em 5. (resposta ao quesito 5.º);
14) A ré definiu, unilateralmente, a remuneração fixada no documento referido em 5. e o seu início de vigência (resposta ao quesito 6.º);
15) Na sequência do conhecimento que tomou do contrato mencionado 5., o autor teve de realizar reuniões e contactos extraordinários (resposta ao quesito 7.º);
16) (…) O que causou desgaste e incómodos nos condóminos (resposta ao quesito 8.°);
17) Em razão do referido em 6., o autor transferiu para a ré as responsabilidades de contratação de pessoal para o desempenho da prestação dos serviços de administração e de portaria (resposta ao quesito 9.°);
18) A prestação dos serviços de portaria mencionada em 6. foi acordada verbalmente em 31/01/2001 (resposta ao quesito 10.º);
19) (…) Tendo ficado acordado entre autor e ré, que a mesma cessaria, quando cessassem as funções de administração por parte da ré no autor (resposta ao quesito 11.º);
20) Na data em que foi celebrado o contrato referido em 5. os serviços de portaria do autor já se encontravam assegurados, como referido em 18. e 19. (resposta ao quesito 12.º).
IV – FUNDAMENTOS DE DIREITO Na sentença recorrida foi condenada a ré a pagar ao A., uma indemnização, a título de danos não patrimoniais, no valor de € 5.000 (cinco mil euros).
A recorrente, porém, entende que os simples incómodos ou contrariedades não justificam a indemnização por danos não patrimoniais.
Relativamente à questão que nos interessa abordar, ficou provada a seguinte materialidade fáctica:
- Na sequência do conhecimento que tomou do contrato mencionado em 5., o autor teve de realizar reuniões e contactos extraordinários.
- (…) o que causou desgaste e incómodos nos condóminos.
Ultrapassada que se mostra a questão da legitimidade activa do A. como condomínio para peticionar indemnização por danos não patrimoniais dos condóminos, uma vez que essa questão ficou definitivamente julgada em sede de saneador, considerando o A. parte legítima (cfr. fls. 151 a 155), o problema está agora em saber se, dada a natureza dos danos, estes têm relevância suficiente para serem atendíveis para efeitos indemnizatórios.
Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, “pela sua gravidade mereçam a tutela do direito” – artº 496º nº 1 do CC.
Isto quer dizer que “em sede de compensação por danos não patrimoniais, por não se estar perante a lesão de interesses susceptíveis de avaliação pecuniária, o dano não corresponde a um prejuízo determinado ou materialmente determinável, reparável por reconstituição natural ou através de um sucedâneo em dinheiro, mas a uma lesão de ordem moral ou espiritual apenas indirectamente compensável através de utilidades que o dinheiro possa proporcionar, o requisito “dano” como pressuposto da obrigação de indemnizar não seja um qualquer prejuízo, mas apenas aquele que se apresente com um grau de gravidade tal que postule a atribuição de uma indemnização ao lesado”.(1)
Donde se essa gravidade não existir, não poderemos falar de dano não patrimonial passível de indemnização.
Ora, para que se possa falar de uma questão de responsabilidade civil é necessário que o lesado, titular do direito indemnizatório, tenha sofrido um dano, só interessando mesmo averiguar sobre os outros pressupostos se aquele preexistir.(2)
É, na realidade, o que se mostra reflectido nos artºs 483º nº 1 e 562º, ambos do CC, ao reportarem o dano como requisito da obrigação de indemnizar fundada em responsabilidade civil, contratual ou extracontratual.
Com efeito, os danos não patrimoniais podem traduzir-se em sofrimento ou dor, física ou moral, concretizados em dores físicas, desgostos por perda de capacidades físicas ou intelectuais, vexames, sentimentos de vergonha ou desgosto decorrentes de má imagem perante outrem, estados de angústia, etc.
Trata-se de danos cuja dimensão não obedece aos critérios correntes de avaliação.
A avaliação da gravidade daqueles danos tem de aferir-se segundo critérios objectivos e não subjectivos.(3)
O artº 496º nº 1 do CC, limita-se a fornecer um critério com alguma maleabilidade, mas inspirado numa razão objectiva, sobre a qual há-de assentar o juízo de equidade.
Nessa perspectiva, só são atendíveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Ora, no caso sub judice, o condomínio A. por causa da celebração de um contrato de prestação de serviços de portaria celebrado entre a ré e o representante da ré junto do A., como administrador deste último – o qual foi pela sentença recorrida declarado ineficaz em relação ao A. - teve de realizar reuniões e contactos extraordinários, com o que, os condóminos que naquelas reuniões compareceram, sofreram desgaste e incómodos.
Tem vindo a ser considerado que, o dano grave é, não apenas aquele que é “exorbitante ou excepcional”, mas também aquele que “sai da mediania, que ultrapassa as fronteiras da banalidade”. Um dano considerável que, no seu mínimo espelha a intensidade duma dor, duma angústia, dum desgosto, dum sofrimento moral que, segundo as regras da experiência e do bom senso, se torna inexigível em termos de resignação. (4)
Era ao A. que, como facto constitutivo do seu direito, incumbia demonstrar os pressupostos da obrigação de indemnizar, nos termos expressos no artº 342º nº 1 do CC.
Não o tendo feito, não poderá manter-se a indemnização fixada na sentença recorrida, uma vez que desgaste ou simples incómodos não revestem uma gravidade objectiva tal que possam ser enquadráveis no disposto no artº 496º nº 1 do CC.
V – DECISÃO
Nesta conformidade, julga-se procedente a apelação, revogando-se a sentença recorrida na parte que condenou a ré numa indemnização a título de danos não patrimoniais, deste modo a absolvendo.
Custas pelo apelado.
(Processado por computador e integralmente revisto pela Relatora)
Lisboa, 26 de Junho de 2007
(Maria José Simões)
(Azadinho Loureiro)
(Folque de Magalhães)
_______________________________________
1 Cfr. Ac. do STJ de 24/05/2007 (relator Alves Velho) consultável em www.dgsi.pt
2 Cfr. Ac. STJ citado supra.
3 Cfr. A. Varela, Obrigações em Geral, I, 9ª ed., pag. 628.
4 Cfr. Ac. STJ de 11/05/98, consultável na base de dados já indicada.