Ø Para que uma obrigação parental seja modificável, com base na alteração das circunstâncias, aquele que pretende a alteração deve alegar as circunstâncias existentes no momento em que aquela obrigação foi contraída e as circunstâncias presentes no momento em que requer a modificação dessa mesma obrigação.
Ø Se o juízo de relação mostrar uma variação de contexto, então deve autorizar-se a alteração da obrigação.
Ø No caso contrário, a alteração deve, naturalmente, recusar-se.
Não se conformando com a decisão proferida veio a requerente A instaurar o presente recurso, nele formulando as seguintes conclusões:
1ª A sentença recorrida - que julgou o pedido manifestamente infundado, determinando o arquivamento dos autos - foi precedida de parecer do Ministério Público, contrariando, apenas em parte o pedido da recorrente, mas que não foi notificado à recorrente para que esta, querendo, exercesse o contraditório, o que implica a comissão de uma nulidade por o tribunal ter decidido antes desse contraditório eventual, ou seja, ter logo conhecido da questão de que não podia ainda tomar conhecimento (artº. 615º nº 1, d) do Código de Processo Civil) de onde resulta a consequência de dever agora ser conhecida essa nulidade
determinando-se a nulidade da sentença para posterior cumprimento do ónus da notificação omitida.
2ª- Sem prescindir, a sentença recorrida posta ante um pedido de actualização de uma prestação alimentar que fora fixada por sentença de 22/03/2004, ou seja, de há 13 anos, julgou o pedido manifestamente infundado porque "em Março de 2016 a requerente progenitora desistiu do pedido que formulara no processo de alteração das responsabilidades parentais apenso" o que significa que aceitou "concomitantemente a manutenção do valor da mesma prestação alimentícia" - para mais deduzindo um pedido que não se fundamenta "em circunstâncias supervenientes a Março de 2016".
3ª- A decisão é manifestamente errada por mais do que uma razão, pelo que não pode manter-se, porquanto:
a) A recorrente, ao contrário do assim suposto (e do que o Tribunal, de resto, tomou consciência, ao elencar a matéria de facto - factos 4, 5 e 6), não propôs qualquer processo de alteração das responsabilidades parentais e a referência da sentença é a uma peça por si apresentada em que apresentou alegações relativamente a um pedido dessa natureza, sim, mas requerido pelo progenitor, e não por ela, pelo que não fez qualquer pedido de que pudesse "desistir";
b) Qualquer "pedido" da recorrente no âmbito desse anterior processo que não propôs apenas seria configurável no âmbito de um pedido reconvencional, processualmente inadmissível, sendo certo, para mais, que nessa peça a recorrente embora alegando a necessidade de correcção do valor afirmou expressamente que "o regime então fixado adequa-se perfeitamente aos interesses da menor, não carecendo de ser alterado" (artº. 6.º) e "é manifesto que, atentos esses interesses da MV, não pode ser alterado o regime das responsabilidades parentais" (…)";
c) Por outro lado, qualquer acto da progenitora que pudesse interpretar-se como renúncia a alimentos ou desistência sempre seria manifestamente nulo por o direito a alimentos ser um direito indisponível e, como tal, subtraído à vontade das partes por ser irrenunciável (cfr. Ac. Rel. Porto de 26/01/1968 in Col. Jur. III, 9178, Tomo I, pág. 138, Castro Mendes, Direito Processo Civil, 1967, pág. 255 e Mário Brito, CC Anotado, 1º, pág. 83/84) para além de o tribunal estar vinculado sempre ao poder - dever de avaliar as razões apresentadas, nos termos do disposto no artº. 968.º n.º 2 e 987.º do Código de Processo Civil, pois tem o dever de investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar inquéritos e recolher informações, decidindo sem sujeição a regras de legalidade estrita, devendo em cada caso adaptar a solução mais conveniente e oportuna, o que tudo devia sobrepor-se a qualquer consideração sobre se havia ou não "causas supervenientes" que justificassem o pedido.
4ª- De resto, a "superveniência" de que a lei fala no art.º. 22.º do RGPTC não é superveniência em relação à data da pretensa desistência (10/03/2016) mas sim em relação à data dos factos que "justificaram" o pedido" dito objecto de desistência (6/12/2010) - cfr. por ex. o Ac. Rel. Coimbra de 6/10/2015 in Proc. 1009/11.4TBFIG-AC1 in www.dgsi.pt - mas ainda que assim não fosse, foram alegados factos posteriores à data da pretensa desistência que o tribunal sempre teria de considerar (a petição entrou em 24/10/2016 e vêm alegadas carências ao nível de um tratamento dentário que só foram do conhecimento da recorrente em 20 de Fevereiro de 2017).
Termos em que na procedência do recurso deve declarar-se nula a sentença recorrida e sempre a decisão infundada, para ser ordenado o prosseguimento do processo, assim se fazendo JUSTIÇA.
1- Conforme acordo alcançado entre requerente A e requerido M, em sede de audiência de julgamento realizada a 22 de Março de 2004, no processo principal de regulação das responsabilidades parentais apenso, homologado por decisão proferida na mesma data, fixou-se, de entre outras coisas, que a menor MV, nascida a 05.07.2003, ficaria à guarda e cuidados de sua mãe, aqui requerente, que sobre a menor exercerá o poder paternal; e o pai, aqui requerido, obrigado a contribuir, a título de alimentos devidos à sua indicada filha menor, com a quantia mensal de € 180,00; actualizável anualmente, a partir de Janeiro de 2005, de acordo com os índices de inflação, com exclusão da habitação, a publicar pelo INE (cfr. fls. 85 e 86 do processo principal de regulação do poder paternal apenso);
2- Na ocasião, apenas foi fixado um regime de visitas do pai à menor genérico ou livre, com a possibilidade de o pai visitar e ter consigo a sua filha MV sempre que quiser, mediante prévio aviso à mãe, sendo que, a partir dos 2 anos de idade, o pai poderia ter a menor consigo, em período de visita a acordar entre os progenitores;
3- Mercê das sucessivas actualizações anuais, a referida prestação alimentícia a cargo do requerido fixa-se actualmente em € 232,00 (cfr. alegações da requerente e declarações do requerido na acta de fls. 105 e 108);
4- Em Novembro de 2010, o requerido progenitor instaurou contra a requerente progenitora processo de alteração da regulação das responsabilidades parentais relativas à indicada filha menor MV, mediante a qual pretendia que as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância da vida da menor, fossem exercidas, em comum, por ambos os progenitores, fixando-se ainda um regime de visitas mais pormenorizado do pai junto da menor, designadamente à Quarta-feira, ao fim de semana, quinzenalmente, e durante as férias escolares da menor (cfr. fls. 2 a 9 do processo apenso A);
5- Em 06.12.2010, a progenitora apresentou alegações, tendo concluído pela manutenção da guarda da menor e do exercício das responsabilidades parentais exclusivamente a cargo da progenitora, fixando-se o mesmo regime de visitas genérico já previsto do pai em relação à menor, pretendendo ainda um aumento da prestação alimentícia fixada para o valor de € 500,00 mensais, actualizável anualmente de acordo com os índices de inflação publicados pelo INE (cfr. fls. 19 a 27 do apenso A);
6- Nestas alegações, a progenitora, para efeitos daquele pretendido aumento da prestação alimentícia a cargo do progenitor, invocou um conjunto de despesas que possuía com a menor, designadamente com o colégio privado frequentado pela menor; aulas de música e natação; e despesas com alimentação, medicamentos, vestuário, calçado e livros;
7- Em sede de conferência de pais realizada, a 24.01.2011, no âmbito do mesmo processo apenso, na falta de acordo, foram tomadas declarações aos progenitores, tendo sido proferida decisão provisória, atribuindo-se designadamente um regime de visitas do pai junto da menor, aos fins de semana, quinzenalmente (cfr. fls. 46 a 49 do apenso A);
8- Na sequência, os progenitores foram notificados para apresentar as suas alegações e meios de prova, sendo que a progenitora reiterou, no essencial, as alegações já anteriormente apresentadas (cfr. fls. 67 a 77, do processo apenso A);
9- Em 10 de Março de 2016, ainda no âmbito do identificado processo de alteração da regulação das responsabilidades parentais apenso (apenso A), foi realizada uma nova conferência de pais, sendo que os progenitores declararam estarem acordados em desistir, mútua e reciprocamente, dos pedidos formulados no mesmo processo, o que não mereceu oposição por parte do Ministério Público, tendo a aludida desistência dos pedidos formulados pelos progenitores sido devidamente homologada por sentença proferida na mesma data, a qual transitou em julgado, encontrando-se o respectivo processo já findo (cfr. fls. 607 e 608 do apenso A);
10- A requerente alega que vinha exercendo a actividade de professora do ensino secundário, na qual auferia um vencimento mensal de cerca de € 1.100,00, sendo que actualmente encontra-se a trabalhar para uma empresa familiar, auferindo o salário mensal de € 3.050,00; sendo que anteriormente efectuava elevadas despesas com viagens semanais de e para o seu anterior local de trabalho (estabelecimento de ensino), sito em Odemira (cfr. arts. 10 e 11º do requerimento inicial e doc. de fls. 44);
11- Desde sensivelmente meados de 2011, que o progenitor não mais estabeleceu qualquer contacto pessoal com a menor, sendo que esta também rejeita esse mesmo contacto com o progenitor, inexistindo igualmente qualquer diálogo entre os progenitores (cfr. relatório de fls. 530 a 539 do apenso A).
Como resulta do disposto nos arts.º 608.º, n.º 2, ex vi do art.º 663.º, n.º 2, 635.º, n.º 4, 639.º, n.os 1 a 3, 641.º, n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil, sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem das conclusões que definem, assim, o âmbito e objecto do recurso.
Deste modo, e tendo em consideração as conclusões acima transcritas cumpre apurar se, por violação do princípio do contraditório, a decisão proferida padece da nulidade arguida, e, subsequentemente, sendo o caso, se a mesma deve ser revogada ou mantida.
*
Vejamos.
O principio do contraditório e da ampla defesa, enquanto princípio jurídico fundamental do processo judicial, exprime, regra geral, a garantia de que ninguém pode sofrer os efeitos de uma sentença sem ter tido a possibilidade de ser parte do processo do qual esta provém, ou seja, sem ter tido a possibilidade de uma efectiva participação na formação da decisão judicial (direito de defesa). O princípio é derivado da frase latina audi alteram partem (ou audiatur et altera pars), que significa "ouvir o outro lado", ou "deixar o outro lado ser ouvido bem".
Implica a necessidade de uma dualidade de partes que sustentam posições jurídicas opostas entre si, de modo que o tribunal encarregado de instruir o caso e proferir a sentença não assume nenhuma posição no litígio, limitando-se a julgar de maneira imparcial segundo as pretensões e alegações das partes.
Pelo facto do processo civil ser um processo de partes e ser na esfera jurídica dos pleiteantes que se irão repercutir as consequências ou efeitos das decisões judiciais., tal constitui uma das razões de ser da necessidade de observância do princípio do contraditório, pretendendo-se que as partes sejam ouvidas antes da tomada de qualquer decisão, que lhes seja conferida a possibilidade de explicitarem as suas razões, os argumentos de facto e de direito em defesa da tese que sustentam no processo ou que possam influenciar a tomada de qualquer decisão, ainda que intercalar, tal como se mostra plasmado no art. 3.º, n.º 3, do actual CPC, ao consagrar que “o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito e de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem”, por forma a obstar-se à prolação de decisões surpresa.
Por sua vez, como decorre do disposto no art. 195.º, n.º 1, 2.ª parte, do Cód. Proc. Civil, a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
Assim, inutilizado o processo como um todo, a nulidade da relação processual projecta-se, como tal, sobre a sentença.
Acontece que o Ministério Público é o órgão do sistema judicial nacional encarregado de defender os interesses da menor e não dos respectivos progenitores que litigam entre si nestes autos.
Assim, o seu parecer, apresentado nestes autos em defesa da menor, não tinha de ser notificado às partes.
Entre as partes, como expressamente o refere o citado art. 3.º, n.º 3, do Cód. Proc. Civil, o princípio do contraditório foi observado, pelo que inexistindo qualquer omissão de acto prescrito na lei que não tivesse sido observado, tem a arguição de nulidade de improceder, tanto mais que também nunca seria susceptível de consubstanciar a nulidade plasmada no art. 615.º, n.º 1, al. d), do mesmo diploma, porquanto, essa omissão, a existir, não se traduziria em omissão de pronúncia quanto às questões a apreciar ou excesso de pronúncia sobre elas, por se reportar a um vício que, a ocorrer, se verifica antes da decisão e não no próprio acto decisório.
Assim sendo, importa passar para o segundo patamar de análise quanto à questão subsequente que se coloca fruto da improcedência da nulidade arguida.
Dispõe o artigo 42.º do RGPTC, com a epígrafe «Alteração de regime» que:
1 - Quando o acordo ou a decisão final não sejam cumpridos por ambos os pais, ou por terceira pessoa a quem a criança haja sido confiada, ou quando circunstâncias supervenientes tornem necessário alterar o que estiver estabelecido, qualquer um daqueles ou o Ministério Público podem requerer ao tribunal, que no momento for territorialmente competente, nova regulação do exercício das responsabilidades parentais.(…).
4 - Junta a alegação ou findo o prazo para a sua apresentação, o juiz, se considerar o pedido infundado, ou desnecessária a alteração, manda arquivar o processo, condenando em custas o requerente.
5 - Caso contrário, o juiz ordena o prosseguimento dos autos, observando-se, na parte aplicável, o disposto nos artigos 35.º a 40.º.
6 - Antes de mandar arquivar os autos ou de ordenar o seu prosseguimento, pode o juiz determinar a realização das diligências que considere necessárias.».
As responsabilidades parentais apresentam-se como um efeito da filiação (art.1877.º e segs. do CC), sendo concebidas como um conjunto de direitos e deveres (poderes funcionais) que competem aos pais relativamente à pessoa e bens dos filhos.
É fundamento da alteração da regulação das responsabilidades parentais, nos termos do artigo 42.º, n.º 1, do RGPTC o incumprimento da decisão final relativa à regulação do exercício das responsabilidades parentais ou a existência de circunstâncias supervenientes que tornem necessário alterar o que estiver estabelecido.
Tratando-se de um processo de jurisdição voluntária, tem aqui aplicação o critério estabelecido no artigo 988.º, n.º 1 do CPC: «dizem-se supervenientes tanto as circunstâncias ocorridas posteriormente à decisão, como as anteriores que não tenham sido alegadas por ignorância ou outro motivo ponderoso».
Consagra-se tanto a superveniência objectiva (factos ocorridos posteriormente à decisão), como a subjectiva (factos anteriores não alegados por ignorância ou outro motivo ponderoso).
Ora, in casu, o quantum da obrigação alimentar foi fixado por acordo devidamente homologado da requerente e do requerido, no âmbito da regulação das responsabilidades parentais relativas à filha menor, desde logo aí se tendo contemplado a actualização do montante fixado, por forma a evitar futuros pedidos nesse sentido, visando-se, assim, também diminuir focos de conflitualidade entre os progenitores.
Tal acordo, relativo ao exercício das responsabilidades parentais, mais não é do que a expressão da autonomia privada dos pais, que produz directamente efeitos processuais, portanto, um acto jurídico de carácter negocial que constitui, modifica ou extingue uma situação processual.
O mesmo se passa quando, por vontade das partes, as mesmas manifestam a sua vontade de pôr termo a um litígio, por via da desistência das posições por si assumidas nos autos.
Só que, enquanto, pela transacção, as partes põem fim ao diferendo, conformando os seus interesses através de um consenso resultante de concessões e cedências mútuas, pela desistência do pedido extingue-se o direito que se pretendia fazer valer – art. 285.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil.
Não deixa, no entanto, enquanto negócio jurídico unilateral, de ser um acto de composição da lide, exercendo a mesma função que a sentença de mérito, na medida em que põe também termo à causa, enquanto obra das próprias partes – cfr. Alberto dos Reis, in Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 3º, Coimbra, 1946, p. 464.
Assim, tais manifestações de vontade, por via da decisão homologatória transitada em julgado, tornam-se, em regra, imodificáveis (artº 628.º, do CPC).
Contudo, como a decisão se reporta à situação de facto existente no momento do encerramento da discussão, não lhe pode ser indiferente uma alteração ocorrida posteriormente (art.º 611.º, n.º 1, do CPC).
O caso julgado encontra-se, assim, também submetido ao princípio rebus sic stantibus e, por isso, deixa de valer quando se alteram os condicionalismos de facto em que a decisão foi proferida. O caso julgado pode, assim, perder a sua autoridade e eficácia, designadamente por substituição da decisão transitada.
É o que sucede com a prestação de alimentos ou outras prestações dependentes de circunstâncias especiais quanto à sua medida e duração.
Pois, a obrigação alimentícia é uma obrigação duradoura que assenta em dois parâmetros fundamentais - as necessidades económicas do alimentando e as disponibilidades financeiras do devedor (artº 2004 do Código Civil). Qualquer destes dois factores pode alterar-se. Não surpreende, por isso, que a lei permita que o quantitativo da prestação se adapte, a cada momento, à necessidade de quem recebe os alimentos e aos meios de quem tem de prestá-los (artº 2012 do Código Civil).
A prestação alimentícia, como qualquer outra prestação duradoura dependente de circunstâncias especiais, uma vez fixada, não é imutável; desde que mudem as circunstâncias a que se atendeu para a fixação, a decisão pode ser alterada: pode a prestação ser modificada, para mais ou para menos, e pode até cessar. Quer dizer, ao caso julgado falta, nesta hipótese, a característica da estabilidade ou da imutabilidade.
Contudo, tal modificação só é admissível em função de circunstâncias supervenientes ao seu trânsito em julgado, quer dizer, se tiver ocorrido uma alteração superveniente dos condicionalismos de facto.
A ocorrência de uma alteração de circunstâncias exige um juízo de comparação entre o circunstancialismo vigente num dado momento e o contexto existente num momento posterior. Dito doutro modo: para que assente numa modificação superveniente de circunstâncias é indispensável conhecer essas circunstâncias em momentos temporalmente diferenciados.
Assim, para que uma obrigação parental seja modificável, com base na alteração das circunstâncias, aquele que pretende a alteração deve alegar as circunstâncias existentes no momento em que aquela obrigação foi contraída e as circunstâncias presentes no momento em que requer a modificação dessa mesma obrigação. Se o juízo de relação mostrar uma variação de contexto, então deve autorizar-se a alteração da obrigação. No caso contrário, a alteração deve, naturalmente, recusar-se.
No caso concreto, como resulta da factualidade a ter em conta, aquando da pendência do processo instaurado pelo aqui recorrido, em que pedia a alteração da regulação das responsabilidades quanto ao regime fixado para as visitas, a progenitora peticionou um aumento da prestação alimentícia fixada para o valor de € 500,00 mensais, actualizável anualmente de acordo com os índices de inflação publicados pelo INE (cfr. fls. 19 a 27 do apenso A), invocando, para o efeito, um conjunto de despesas que possuía com a menor, designadamente com o colégio privado por ela frequentado, aulas de música e natação, e despesas com alimentação, medicamentos, vestuário, calçado e livros.
No entanto, aquando da conferência de pais, em 10 de Março de 2016, os progenitores desistiram, mútua e reciprocamente, dos pedidos formulados no referido processo, tendo essa desistência dos pedidos sido devidamente homologada por sentença proferida na mesma data, a qual transitou em julgado.
Como tal, o direito que pretendiam fazer valer extinguiu-se, pela desistência do pedido devidamente homologada por sentença transitada em julgado, tornando-se, por isso, imodificável, a não ser que a situação de facto existente nesse momento se venha a alterar posteriormente.
Não é que ocorra uma renúncia ao direito, apenas uma definição do direito em determinado momento em conformidade com certas e determinadas circunstâncias, apenas susceptível de ser alterado caso se verifique uma modificação posterior, sob pena de total indefinição e incerteza não pretendida legalmente.
Ora, tendo em conta que a requerente/recorrente não alegou qualquer situação que não se verificasse já antes, sempre o pedido teria de ser, como o foi, considerado infundado.
Por outro lado, mesmo que assim não se entendesse, o facto é que as despesas que refere ter com a sua filha menor, se reportam a valores que em muito extravasam as normais despesas com o sustento e educação de uma adolescente, designadamente as de compensação com as despesas com o salário de uma empregada doméstica, aulas de natação e de inglês, explicações, viagens, férias e divertimentos referentes à menor.
É que a opção da progenitora, de recorrer a serviços educativos, de saúde, médicos e outros particulares, que não públicos, não pode ser imposta ao outro progenitor.
Apesar de, podendo e querendo, proporcionar à sua filha todas essas vantagens, por mais benéficas que possam ser para a menor, não pode é, depois, vincular o recorrido a aceitar tal processo educativo não consensualmente aceite.
Acresce, ainda, por último, que mesmo tendo em conta as despesas normais que se prendem com alimentação, com médicos, medicamentos, com material e livros escolares, vestuário e outros relacionados, que, segundo refere a recorrente, perfazem a quantia de cerca de 700,00€, pagando o recorrido a importância actual de 230,00€, não se mostra de todo desproporcional e desajustada, se se atentar no facto da recorrente ter passado a dispor do triplo do rendimento que auferia.
Contudo, cingindo-nos nós apenas ao cerne da questão, o facto é que não se verificando a alegação adequada de qualquer alteração – objectiva ou simplesmente subjectiva – das circunstâncias, após a posição assumida pela requerente/recorrente, a 10.3.2016, de desistência do pedido por si formulado de alteração da prestação alimentícia, tem, pois de se considerar que o pedido de modificação de tal decisão é infundado e, portanto, que a decisão recorrida é, neste plano, juridicamente exacta.
Em síntese, face ao exposto, mantêm-se a decisão proferida.
_________________________________
Maria dos Anjos S. Melo Nogueira
_________________________________
Desembargador José Carlos Dias Cravo
________________________________
Desembargador António Manuel A. Figueiredo de Almeida