COMISSÃO
TAXA
AGÊNCIA
Sumário

I - A taxa de serviço de passageiros constitui uma “taxa” em sentido técnico, assentando na prestação concreta de um serviço público.
II -Ao contrário das demais taxas de tráfego, na taxa de serviço de passageiros o tributo é devido por cada passageiro embarcado – o sujeito passivo é o passageiro –, sendo o Agente um mero cobrador de tal imposto.
III - A sua diferente natureza, implicará que a mesma não constitua um custo operacional das companhias, que surgem como meras intermediárias na respectiva cobrança e entrega ao Estado (ANA).
IV - Como tal, não existirá fundamento para que a referida taxa de serviços de passageiros seja contabilizada para efeitos de cálculo da comissão dos agentes de viagens.
(Sumário da Relatora)

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa (7ª Secção):~

I. RELATÓRIO

A A (…) intenta a presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra S (…),
alegando, em síntese:
a A. é uma associação empresarial representativa dos interesses de 511 agências de viagens e turismo com sede em Portugal, sendo a Ré uma companhia aérea, membro da International Air Transport Association (IATA);
cerca de 302 agências de viagens associadas da Autora estão acreditadas junto da IATA, tendo subscrito um contrato de adesão, pelo qual aceitaram o bloco de normas que esta entidade emite, relativas à emissão e venda de bilhetes das companhias aéreas associadas da IATA;
de acordo com as resoluções n.º 824 e 814 da IATA, cada companhia aérea deve retribuir o agente de viagens pela venda de bilhetes e serviços prestados, mediante uma comissão calculada sobre a tarifa aplicável para o transporte aéreo de pessoas pago ao membro, recebido pelo agente, com exclusão de taxas por excesso de bagagem ou de valor de bagagem, impostos e outros encargos cobrados pelo agente;
pelo menos até ao final do ano de 1993, as companhias aéreas como a Ré apresentavam uma tarifa única no título de transporte e autonomizavam uma taxa única, pagando aos agentes de viagens uma comissão, correspondente a uma percentagem, em vigor em cada momento, sobre a tarifa;
a partir de Janeiro de 1994, a Ré passou a discriminar nos bilhetes uma série de caixas, com a tarifa, a taxa de segurança (“security charge”) e uma taxa de serviço a passageiros (“passenger service charge”), com o propósito de excluir da comissão paga aos agentes de viagens o montante referente às taxas supra referidas;
a taxa de serviço a passageiros não é mais do que um montante que o aeroporto cobra à companhia aérea pela utilização e movimentação de clientes dessa companhia naquelas instalações, pelo que é mais uma parcela dos seus custos operacionais, como o combustível o pessoal ou a alimentação dos passageiros;
a “passenger service charge” integra a prestação de serviços fornecida pela companhia aérea aos seus clientes, fazendo parte integrante da tarifa, pelo que deve ser elegível para o comissionamento a efectuar a quem agencia a venda dos bilhetes;
a Ré alterou, assim, a comissão paga aos agentes pela venda dos seus bilhetes, a partir de 1/01/1994, sem que tivesse sido alterado o quadro regulamentar existente sobre esta matéria, o que importou numa diminuição de receita para as associadas da Autora.
Conclui, pedindo:
a) a condenação da Ré a pagar-lhe os montantes correspondentes à comissão incidente sobre o “passenger service charge”, desde 1 de Janeiro de 1994, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde os sucessivos dias 15 do mês seguinte à das prestações de serviço a que dizem respeito, sendo de € 176.137,83 o montante global correspondente aos anos de 1998 a 2000.
b) que seja reconhecido o direito das representadas da Autora a receber comissões, à taxa vigente em cada momento, sobre os montantes relativos à “passenger service charge”.
A Ré contestou, invocando a ineptidão da petição inicial, a ilegitimidade da Autora e a prescrição dos juros vencidos há mais de cinco anos.
Houve réplica, pela qual a Autora contraditou as excepções, concluindo como na petição inicial.
Foi proferido despacho saneador, no qual foram indeferidas as excepções dilatórias de ineptidão da petição inicial e de ilegitimidade activa, tendo sido julgada procedente a excepção de prescrição dos juros vencidos há mais de cinco anos.
Não se conformando com tal despacho, na parte em que julgou improcedente a excepção de legitimidade activa, a Ré dele interpôs recurso, que foi admitido como agravo, com subida diferida.
Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, tendo sido proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu a Ré do pedido.
Inconformada com tal decisão, a Autora dela interpôs recurso de apelação, concluindo a respectiva motivação, com as seguintes conclusões:
1. Discute-se em sede da presente acção, se as agências de viagens associadas da A., ora Recorrente e acreditadas na IATA, têm direito a receber da R., ora Recorrida, os montantes correspondentes a comissões incidentes sobre a PSC e, se a R., ora Recorrida, tem o dever de pagar tais comissões.
2. A resolução da questão sub judice, decorre de seis elementos fundamentais:
- Da matéria fáctica que ficou provada;
- Da correcta qualificação jurídica da PSC;
- Da correcta interpretação das normas emanadas pela IATA - artigo 9º da Resolução nº 824 da IATA, intitulada “Passengers Sales Agency Agreement”, de 15.12.1993, e artigo 9.4., da Resolução nº 814 da IATA, intitulada “Passengers Sales Agency Rules”, de 17.01.1990;
- Do previsto nos artºs 1º e 3º a 19º do Decreto Regulamentar nº 24/2009 de 04 de Setembro, o qual revogou o Decreto Regulamentar nº 12/99 de 30 de Julho, alterado pelo Decreto Regulamentar 5-A/02, de 8 de Fevereiro (anteriormente disposto nos artºs 1º, 3º a 10º e 13º a 25º do Decreto Regulamentar nº 12/99, de 30 de Julho);
- Do disposto nos artºs 16º e 17º do Decreto-Lei nº 102/90, de 21 de Março, alterado pelo Decreto-Lei nº 280/99, de 26 de Julho, pelo Decreto-Lei nº 268/2007 de 26 de Julho e pelo Decreto-Lei nº 216/2009, de 4 de Setembro; e
- Do disposto no nº 10 da Directiva 2009/12/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Março de 2009, relativa às taxas aeroportuárias.
A este respeito, verifica-se que a sentença recorrida violou estas normas, o que levou a que considerasse erradamente que a PSC não faz parte da tarifa e que a mesma não é passível de ser incluída no montante da comissão a pagar pela Recorrida aos agentes de viagens. Vejamos:
3. Provou-se que:
- “A R. é a Maio companhia aérea de França” e “é membro efectivo da International Air Transport Association (IATA), associação representativa dos interesses das companhias aéreas” (cfr. nºs 1) e 2) dos factos provados).
- A maioria dos bilhetes vendidos em Portugal é-o através das agências de viagens acreditadas pela IATA (cfr. nº 3) dos factos provados).
- “As agências de viagens acreditadas junto da IATA subscreveram o contrato-tipo de agência (Passenger Sales Agency Agreement), do qual fazem parte as Resoluções nº 824, de 15.12.1993 e nº 814, de 17.01.1990 juntas como docs. de fls. 66 a 69 e 510 e 511, redigidos em língua inglesa, que aqui se dão por reproduzidos” (cfr. nºs 4) dos factos provados), (cit. relatório pericial da tradução do artº 9.4.2. da Resolução nº 814 da IATA, a fls. 829 e 830).
4. As citadas Resoluções da IATA que consubstanciam, elas próprias, o contrato tipo de agência celebrado entre cada agente de viagem e cada companhia aérea, contemplam as regras ditadas pela International Air Transport Association (doravante IATA), que vinculam os seus membros (as agências de viagens e as companhias aéreas).
Por sua vez, estas regras (designadamente o artº 9º da Resolução da IATA e o artº 9º da Resolução 824 da IATA) prevêem, entre outras matérias, o dever das companhias aéreas pagarem uma remuneração/comissão às agências de viagens, pela venda, por parte destas, dos seus bilhetes de avião, bem como o modo do cálculo desta remuneração/comissão – questão, esta, o objecto principal do presente litígio -.
5. Como é sabido, e conforme já ficou decidido em diversas instâncias a passenger service charge (doravante PSC) é o montante que o aeroporto cobra à companhia aérea pela utilização e movimentação de passageiros, clientes dessa companhia, naquelas instalações, constituindo exclusivamente um custo das empresas que usufruem dos serviços prestados pelo aeroporto – as companhias aéreas - entre os quais se conta, o embarque de passageiros.
6. A PSC destina-se a compensar a entidade exploradora das instalações aeroportuárias pelas despesas em que incorre com a prestação de serviços essenciais para o transporte aéreo, destinando-se a pagar o custo que representa para a transportadora, da utilização, por parte dos seus clientes, das estruturas aeroportuárias, sendo que são as empresas que usufruem dos serviços prestados pelo aeroporto (enquanto estrutura orgânica), quem efectivamente está obrigado ao pagamento da PSC.
7. É a própria lei que assim o determina (artºs 1º e 3º a 19º do Decreto Regulamentar nº 24/2009 de 04 de Setembro, o qual revogou o Decreto Regulamentar nº 12/99 de 30 de Julho, alterado pelo Decreto Regulamentar 5-A/02, de 8 de Fevereiro (note-se que já anteriormente, o Decreto Regulamentar nº 12/99, de 30 de Julho, dispunha esta matéria nos artºs 1º, 3º a 10º e 13º a 25º do) e artºs 16º e 17º do Decreto-Lei nº 102/90, de 21 de Março, alterado pelo Decreto-Lei nº 280/99, de 26 de Julho, pelo Decreto-Lei nº 268/2007 de 26 de Julho e pelo Decreto-Lei nº 216/2009, de 4 de Setembro).
Sem esquecer a Directiva 2009/12/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Março de 2009, relativa às taxas aeroportuárias, que prevê no nº 10º que “O Conselho da OACI considerou que uma taxa aeroportuária é uma contrapartida financeira concebida e aplicada especificamente para recuperar o custo da disponibilização de instalações e da prestação de serviços à aviação civil …” (o sublinhado é nosso).
8. A legislação e as regras regulamentares, estatutárias e contratuais aplicáveis ao caso em análise não sofreram qualquer alteração, conforme, aliás, a douta sentença recorrida admite, sendo que o clausulado no contrato-tipo de agência celebrado entre as agências de viagens com a IATA desde 01/01/1994, é presentemente exactamente o mesmo que vigorava até esta data.
9. A PSC faz parte da tarifa, e as companhias aéreas – incluindo a Recorrida - devem pagar às agências de viagem comissões sobre a PSC.
10. A Recorrida está legal e contratualmente obrigada a pagar comissões sobre a PSC às agências de viagens. Tanto mais, porque não existiu qualquer alteração legislativa ou contratual, que permitisse ou justificasse à Recorrida, acabar com aquele seu anterior procedimento.
11. O artigo 9º da Resolução nº 824 da IATA e o artigo 9.4., da Resolução nº 814 da IATA, definem e regulamentam os termos da remuneração aos agentes de viagem por parte das companhias aéreas e as condições para o pagamento das comissões aos mesmos.
12. Nos termos definidos pelas citadas Resoluções 814 e 824, a Recorrida é obrigada a remunerar as agências de viagem pela venda de bilhetes de avião e pelos serviços adicionais que estas prestaram, sendo que esta retribuição representa o pagamento integral dos serviços que foram prestados à Recorrida.
13. Em relação ao pagamento da comissão por parte das companhias aéreas (e, naturalmente, por parte da R.) às agências de viagem, prevê a mencionada Resolução 814 que a comissão ao agente deverá ser calculada sobre a tarifa aplicável para o transporte aéreo de passageiros.
14. A tarifa, para efeitos de comissionamento, é definida nos termos do artº 9.4.2. da Resolução 814. Este artigo prevê que, “As tarifas aplicáveis são as tarifas (incluindo as sobretaxas tarifárias) do transporte, em conformidade com as tarifas do Membro, e excluem quaisquer taxas pelo excesso de bagagem ou cobertura adicional de bagagem de valores declarados superiores ao da limitação de responsabilidade (“execess valuation of baggage”), bem como todos os impostos e outros encargos cobrados pelo Agente” (vd. Doc.s 3 e 4 juntos na p.i., bem como o relatório pericial junto a fls. 829 e 830 dos autos).
15. Esta norma é significativa e é o ponto fulcral para a compreensão devida de toda a presente questão, porquanto tudo passa por saber se a PSC faz parte da tarifa, averiguando se a mesma é ou não passível de ser enquadrada, por exemplo, numa taxa, num imposto, ou num encargo, nos precisos termos definidos na Resolução 814.
16. Ou seja, quanto ao comissionamento em discussão, há que atender ao artº 9.4.2 da Resolução 814, analisando devidamente a norma de exclusão aí prevista. Isto porque, como se referiu, a tarifa para efeitos da Resolução 814, não inclui as importâncias cobradas pelo agente que tenham a natureza de impostos e encargos.
17. Analisando a ratio daquela norma, verificamos que, o que a mesma visa, é que não sejam considerados para efeitos de comissionamento, os custos que não tenham que ver com a prestação do serviço transporte aéreo e nos quais a companhia aérea incorre.
18. O elemento teleológico da norma de exclusão prevista no artº 9.4.2 da Resolução 814 da IATA, consiste, por um lado, na remuneração do agente pela intermediação efectuada no serviço de transporte aéreo, e por outro lado, que as companhias áreas não pagassem comissões sobre um montante que a elas nada beneficiasse para a cabal execução dos serviços que se propõem fornecer.
19. Ora, a PSC faz parte dos custos que as companhias aéreas têm de suportar para transportar os passageiros que procuram os seus serviços, ou seja, pela utilização e movimentação de passageiros, clientes dessa companhia, nas instalações aeroportuárias, sendo que os serviços que constituem fundamento para o pagamento da PSC, fazem parte integrante da prestação de serviços fornecida pelas companhias aéreas aos seus clientes e, consequentemente, parte integrante da tarifa.
20. Como tal, só podemos concluir que a tarifa consiste na retribuição dos serviços prestados pelas companhias aéreas (o transporte de um passageiro e a sua bagagem permitida), devendo a mesma incluir todos os custos associados a esse transporte, incluindo o custo que as companhias aéreas tem de pagar pela respectiva utilização do aeroporto, por parte dos seus passageiros – ou seja, a PSC - acrescida da margem de lucro que a companhia aérea tem.
21. É também necessário ater-se ao que dispõem o Decreto-Lei 102/90, de 21 de Março, alterado pelos Decretos-Lei nºs 280/99, 268/2007, e 216/2009, e o Decreto Regulamentar nº 24/2009, de 4 de Setembro (que revogou o Decreto Regulamentar 12/99, de 30 de Julho, alterado pelo Decreto Regulamentar 5-A/2002) (que especificamente elenca as taxas em causa) os quais a sentença recorrida interpreta de forma incorrecta, distorcendo, até, o que neles está previsto.
22. Todas as taxas anteriormente descritas no Decreto Regulamentar 12/99, de 30 de Julho (incluindo a PSC) bem como as actualmente descritas no Decreto Regulamentar nº 24/2009, de 4 de Setembro, são cobradas pelo aeroporto à companhia aérea, por um só factor: a utilização por parte das companhias aéreas das infra-estruturas aeroportuárias e do respectivo espaço, porquanto, sem estes, a companhia nunca poderia prestar o serviço aos seus passageiros.
23. O Decreto-Lei 102/99, alterado pelos Decretos-Lei 280/99, 268/2007 e 216/2009, prevê nos artºs 16º e 17º, o pagamento de taxas pelo exercício de qualquer actividade na área dos aeroportos e aeródromos públicos, discriminando as seguintes: taxas de tráfego; taxas de assistência em escala; taxas de ocupação; e outras de natureza comercial.
Por seu turno, o Decreto Regulamentar supra citado, estabelece o elenco das taxas aeroportuárias existentes e os regimes da respectiva fixação, enumerando todas as taxas em causa, a saber: como taxas de tráfego: a taxa de aterragem e descolagem, a taxa de controlo terminal, a taxa de estacionamento, a taxa de abrigo, a taxa de serviços a passageiros e taxa de abertura de aeródromo; como taxas de assistência em escala: a taxa de assistência administrativa em terra e supervisão, a taxa de assistência a passageiros e a taxa de infra-estruturas centralizadas; como taxa de ocupação: a taxa de ocupação; e como outras taxas de natureza comercial: A taxa de equipamento, a taxa de prestação de serviços, a taxa de consumo, a taxa de manuseamento de carga, a taxa de armazenagem, a taxa de depósito de bagagem, a taxa de fotografia e filmagem, a taxa de acesso, a taxa de exploração, a taxa de estacionamento de viaturas e a taxa de publicidade.
24. Como se pode verificar, não existe nenhuma destrinça jurídica quanto às diversas taxas de tráfego, sendo que é o próprio citado Decreto Regulamentar que elenca e classifica a PSC, entre outras, como uma taxa de tráfego.
25. Ou seja, a PSC é juridicamente idêntica às demais taxas de tráfego previstas e enumeradas no citado Decreto Regulamentar, as quais fazem todas parte da tarifa e, não estão diferenciadas no bilhete de avião.
26. À semelhança da PSC, a taxa para abastecimento de combustível, a taxa de catering, as taxas de tráfego (taxa de aterragem e descolagem, taxa de controlo terminal, taxa de estacionamento, taxa de abrigo, taxa de serviços a passageiros, taxa de abertura de aeródromo), as taxas de assistência em escala (taxa de assistência administrativa em terra e supervisão, a taxa de assistência a passageiros, taxa de infra-estruturas centralizadas) as taxas de ocupação e outras de natureza comercial - todas elas, definidas no artº 17º do DL 102/90 - são um custo da Recorrida, e fazem todas parte da tarifa.
27. Todas estas taxas (incluindo a PSC) não estão diferenciadas no bilhete de avião, porque fazem parte da estrutura de custos das companhias aéreas, e porque são essenciais à prestação do serviço de transporte aéreo.
28. Por outro lado, a PSC é uma prestação coactivamente imposta pela entidade gestora das estruturas aeroportuárias que pretende retribuir a utilização feita pelos passageiros dos espaços aeroportuários. Tal permite aferir que não se encontra preenchido o núcleo essencial do conceito de imposto, o qual é caracterizado pela natureza unilateral e coactiva exigida pelo Estado com vista à realização de fins públicos.
29. A prestação em causa – PSC - tem uma natureza completamente diferente, a qual é assente na bilateralidade, existindo uma correspectividade entre a prestação pecuniária e a prestação de um serviço por parte de entidades públicas.
30. Este tipo de natureza permite classificar e definir a PSC como uma mera taxa, à semelhança das demais descritas no Decreto Regulamentar 12/99, de 30 de Julho (como, aliás, vem unanimemente entendendo a nossa jurisprudência (vd. acórdão da Relação de Lisboa, de 08/05/2008, publicado in www.dgsi.pt - processo 823/08-8; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15/04/2010, publicado in www.dgsi.pt - processo nº 08A3944; e acórdão da Relação de Lisboa de 21/05/2009, publicado in www.dgsi.pt - processo 9812/03.2TVLSB.L1-8)).
31. A PSC é, assim, uma taxa, e não, um imposto ou um encargo.
32. Como tal, só podemos concluir pela total improcedência da confusa tese apresentada no acórdão recorrido, de que a PSC é um encargo, e de que a comissão a pagar às agências de viagens não deve incidir sobre os montantes cobrados pela Recorrida a este título - de PSC -.
33. Há que salientar que, contrariamente à PSC, a taxa de segurança (ST) é considerada como um custo que não é essencial para a prestação do serviço de transporte aéreo, não sendo um custo das empresas que usufruem dos serviços prestados pelo aeroporto. Por esse motivo é que essa taxa é excluída da comissão paga às Agências de Viagens.
34. A PSC, diferentemente da taxa de segurança, constitui exclusivamente um custo das empresas que usufruem dos serviços prestados pelo aeroporto, entre os quais se conta, o embarque de passageiros. Tanto assim é, que a taxa de segurança não está prevista no Decreto Regulamentar já citado, não se podendo qualificar ou considerar a mesma, como uma taxa de tráfego, ou como uma taxa aeronáutica. Esta taxa foi sempre separada nas “boxes” do bilhete de avião (aliás, já antes de 01/01/1994), nada tendo que ver com as taxas de tráfego ou aeronáuticas - conforme resulta da lei.
35. Deste modo, essa taxa é excluída da comissão paga às agências de viagens e, é por isso, que a Recorrida nunca pagou às agências de viagem qualquer comissão sobre os montantes de taxa de segurança.
36. Não se pode qualificar a PSC diferentemente das outras taxas de tráfego e das demais taxas elencadas no citado Decreto Regulamentar (que fazem todas parte da tarifa), quando o próprio diploma não as distingue.
37. Além do mais, quanto a todas as taxas enumeradas no dito Decreto Regulamentar nº 24/2009 (incluindo a PSC), o artº 19º do mesmo diploma, prevê que “o valor das taxas previstas neste decreto regulamentar não pode ser facturado nem cobrado separadamente aos clientes das entidades sujeitas ao seu pagamento” (note-se que o anterior Decreto Regulamentar nº 12/99, também previa no artº 25º, que “o valor das taxas previstas neste diploma não poderá ser facturado nem cobrado separadamente aos clientes das entidades sujeitas ao seu pagamento aos aeroportos ou aeródromos”).
38. A propósito da venda de bilhetes por parte das agências de viagem, salienta-se o art.º 3.1, da Resolução 824, que dispõe que “o Agente está autorizado a vender transporte aéreo de passageiros prestado pelo Transportador (...) A venda de transporte aéreo de passageiros compreende todas as actividades necessárias a assegurar ao passageiro um contrato de transporte válido, incluindo, mas não limitado, à emissão de um bilhete válido e à consequente cobrança de receitas.”.
39. Resulta deste preceito que todos os custos que a companhia aérea tenha que suportar – relativos à prestação de serviços que respeitem, principal ou/e acessoriamente, ao contrato celebrado – são considerados no âmbito desse mesmo contrato.
40. Deste modo, se a PSC mais não é do que um montante que o aeroporto cobra à companhia aérea pela utilização e movimentação de passageiros, clientes dessa companhia, naquelas instalações, ter-se-á de concluir que os serviços que constituem fundamento para o pagamento da PSC, têm de fazer parte integrante da prestação de serviços fornecida pelas companhias aéreas aos seus clientes e, consequentemente, parte integrante da tarifa, devendo, por isso, a mesma ser considerada como elegível para o comissionamento a efectuar a quem agencia a venda desses serviços.
41. Todas as taxas descritas no Decreto Regulamentar 12/99, de 30 de Julho, alterado pelo Decreto Regulamentar 5-A/02 (incluindo a PSC), são cobradas pelo aeroporto à companhia aérea, por um só factor (o qual já se descreveu supra): a utilização por parte das companhias aéreas das infra-estruturas aeroportuárias e do respectivo espaço, porquanto, sem estes, a companhia nunca poderia prestar o serviço aos seus passageiros.
42. O argumento da decisão recorrida de que só a PSC incide sobre passageiro não procede, porque a lei qualifica-a a par das outras taxas aeroportuárias, como uma taxa de tráfego.
Todas as taxas aeroportuárias (onde se inclui a PSC) têm que ver com a utilização do espaço aeroportuário por parte das companhias aéreas, para efeitos de assegurar o transporte aéreo dos passageiros. Tal ocorre relativamente a todas as taxas aeroportuárias que a lei identifica, não existindo excepções para nenhuma delas.
43. À semelhança das restantes taxas que integram a tarifa (que são cobradas pela Recorrida) e entregues à autoridade exploradora da estrutura aeroportuária (e que a Recorrida não tem dúvidas em incluir na tarifa), também a PSC deverá aí ser incluída.
44. A PSC não pode ser concebida como um “encargo”, na palavra utilizada no artº 9.4.2. da Resolução 814 da IATA.
45. A expressão “outros encargos”, prevista no citado artº 9.4.2 consiste em prestações de natureza análoga às dos impostos ou estranhas aos elementos essenciais do transporte aéreo.
46. Ora, a PSC não é estranha a estes elementos essenciais do transporte aéreo, sendo juridicamente qualificada como uma taxa de tráfego (aliás, nenhuma das outras taxas de tráfego são consideradas encargos na acepção do supra referido artº 9.4.2., não existindo qualquer motivo (muito pelo contrário) para considerar a PSC como tal).
47. Como decidiu o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15/04/2010, publicado in www.dgsi.pt - processo nº 08A3944 “a expressão em causa (“outros encargos cobrados pelo agente”)” (do artº 9.4.2. da Resolução 814 da IATA) “deve ser relacionada com a primeira parte da exclusão (“taxas pelo excesso de bagagem ou excesso de valor de bagagem”), significando “encargos extra”, “encargos adicionais” ou “encargos suplementares”. Trata-se de quantias que, à semelhança das denominadas “taxa pelo excesso de bagagem ou excesso de valor de bagagem” – as quais não constituem nenhuma taxa propriamente dita (12) - devem ser pagas por serviços especiais relacionados com o transporte do passageiro ou da bagagem. É, por exemplo, o caso dos pedidos de refeições especiais, da reserva de um lugar favorito ou do acompanhamento de menores, que são serviços extra prestados mediante o pagamento de uma verba extra, adicional ou suplementar”.
48. Face a todo o exposto, podemos concluir que a PSC por não se tratar nem de uma taxa pelo excesso de bagagem ou cobertura adicional de bagagem de valores declarados superiores ao da limitação de responsabilidade (“execess valuation of baggage”), nem de um imposto (sendo apenas uma taxa técnica), nem um encargo (não integrando o conceito de “impostos e encargos” prevista no artº 9.4.2. da Resolução 814 da IATA), não integra a exclusão ou a delimitação negativa da base de incidência aí prevista.
49. Pelo que, sendo uma taxa, faz necessariamente faz parte da tarifa, cabendo, por isso, dentro do montante passível de comissionamento a favor das agências de viagens - conforme, de resto, decidiu unanimemente toda a nossa jurisprudência (vd. acórdãos mencionados supra) -.
50. Tendo em conta o disposto no artº 9º da Resolução 824 da IATA, e o artº 9.4.1. da Resolução 814 da IATA, facilmente concluímos que as companhias aéreas – a Recorrida – devem remunerar as agências de viagens nos exactos termos aí previstos.
51. Esta norma não define nem permite às companhias aéreas alterar a base de incidência da comissão a pagar às agências de viagens (vd., entre outros, o Acórdão do STJ de 14/05/2009, processo 3944/08-01).
52. A única interpretação possível do artº 9º da Resolução 824 da IATA, é entender-se que a Companhia Aérea tem de retribuir o Agente, pela venda de bilhetes de avião e serviços adicionais prestados pelo Agente, sendo que tal retribuição representa o pagamento integral dos serviços que foram prestados à Companhia Aérea, devendo a comissão ser calculada de forma proporcionada sobre o valor correspondente à tarifa.
53. A companhia aérea apenas comunica periodicamente às agências de viagens o percentual do total da comissão, mas a comissão em si, o que faz parte da mesma, e a forma como deve ser calculada não pode ser fixada, determinada ou alterada pela companhia aérea. Ou seja, a companhia aérea não pode fixar nem determinar a base de incidência para o cálculo da comissão que deve obrigatoriamente pagar às agências de viagens.
54. A tarifa está definida e regrada no artº 9º da Resolução 814, e não pode ser alvo de qualquer modificação por parte das companhias aéreas. A comissão a pagar pelas companhias aéreas às agências de viagem e as regras atinentes à determinação da mesma, estão imperativamente estatuídas no artº 9º da Resolução 814, devendo as companhias aéreas cumprir o que aí está determinado, não o podendo alterar.
55. Em relação ao pagamento da comissão por parte das companhias aéreas (e, naturalmente, por parte da R., ora Recorrida) às agências de viagem, prevê a mencionada Resolução 814 que a comissão ao agente deverá ser calculada sobre a tarifa aplicável para o transporte aéreo de passageiros.
56. A tarifa, para efeitos de comissionamento, é definida nos termos do artº 9.4.2. da Resolução 814 como as tarifas (incluindo sobretaxas de tarifa) para o transporte, excluindo quaisquer taxas pelo excesso de bagagem ou excesso de valor de bagagem, bem como todos os impostos e outros encargos cobrados pelo agente – vd. Doc.s 3 e 4 juntos na p.i., bem como a respectiva tradução pericial.
57. Esta norma é significativa e é o ponto fulcral para a compreensão devida de toda a presente questão, porquanto tudo passa por saber se a PSC faz parte da tarifa, averiguando se a mesma é ou não passível de ser enquadrada num imposto, ou num encargo, nos precisos termos definidos na Resolução 814.
58. O elemento teleológico e a ratio da norma de exclusão prevista no artº 9.4.2 da Resolução 814 da IATA, consiste, por um lado, na remuneração do agente pela intermediação efectuada no serviço de transporte aéreo, e por outro lado, que as companhias áreas não pagassem comissões sobre um montante que a elas nada beneficiasse nem contribuísse para a cabal execução dos serviços que se propõem fornecer.
59. A tarifa consiste, pois, na retribuição dos serviços prestados pelas companhias aéreas (o transporte de um passageiro e a sua bagagem permitida), devendo a mesma incluir todos os custos associados a esse transporte, incluindo o custo que as companhias aéreas tem de pagar pela respectiva utilização do aeroporto, por parte dos seus passageiros – ou seja, a PSC- acrescida da margem de lucro que a companhia aérea tem.
60. Como ficou demonstrado, a PSC é juridicamente idêntica às demais taxas de tráfego elencadas pelo citado Decreto Regulamentar 24/2009, de 04 de Setembro (anterior Decreto Regulamentar 12/99, de 30 de Julho), bem como a todas as outras taxas enumeradas neste Decreto Regulamentar, as quais fazem parte da tarifa, e não estão diferenciadas no bilhete de avião porque são essenciais à prestação do serviço de transporte aéreo.
61. Como também já ficou demonstrado, a PSC não se trata nem de uma taxa pelo excesso de bagagem, nem de uma taxa pelo excesso de bagagem ou cobertura adicional de bagagem de valores declarados superiores ao da limitação de responsabilidade (“execess valuation of baggage”), nem de um imposto, nem de um encargo, não integrando o conceito de “impostos e encargos” prevista no ponto 9.4.2. da Resolução 814 da IATA, não integrando, por conseguinte, a exclusão ou a delimitação negativa da base de incidência aí prevista.
62. Pelo que necessariamente faz parte da tarifa, cabendo, por isso, dentro do montante passível de comissionamento a favor das agências de viagens.
63. Face a todo o exposto, verificamos que a sentença recorrida errou na interpretação que fez do disposto no artº 9 da Resolução nº 824 de 15.12.1993 da IATA, do previsto no artº 9.4.1. e 9.4.2. da Resolução nº 814, da IATA, do disposto nos artºs 1º e 3º a 19º do Decreto Regulamentar nº 24/2009 de 04 de Setembro, o qual revogou o Decreto Regulamentar nº 12/99 de 30 de Julho, alterado pelo Decreto Regulamentar 5-A/02, de 8 de Fevereiro (anteriormente disposto nos artºs 1º, 3º a 10º e 13º a 25º do Decreto Regulamentar nº 12/99, de 30 de Julho) e do disposto nos artºs 16º e 17º do Decreto-Lei nº 102/90, de 21 de Março, alterado pelo Decreto-Lei nº 280/99, de 26 de Julho, pelo Decreto-Lei nº 268/2007 de 26 de Julho e pelo Decreto-Lei nº 216/2009, de 4 de Setembro, tendo violado o que estas normas prevêem, o que inquinou todo o seu raciocínio, levando a que considerasse erradamente, que “a taxa de serviço a passageiros é um verdadeiro encargo imputável ao passageiro que acresce à tarifa”, pelo que, deve ser excluída da “definição da tarifa sujeita a comissionamento”, sendo que “não estão verificados os pressupostos de que dependeria o reconhecimento dos direitos dos agentes de viagens associados da Autora a serem remunerados pelo valor da taxa de serviço a passageiros incluída nos bilhetes, pelo que a acção deve ser julgada improcedente” (cit. sentença recorrida), tendo a a sentença recorrida violado o disposto nestas normas legais e contratuais.
64. Relativamente à segunda questão analisada, isto é, de saber se a Recorrida deve ser condenada ao pagamento das quantias correspondentes à comissão incidente sobre a PSC, desde 01/01/1009, também a sentença recorrida errou na sua fundamentação e decisão, violando o disposto no artº 9 da Resolução nº 824 de 15.12.1993 da IATA, do previsto no artº 9.4.1. e 9.4.2. da Resolução nº 814, da IATA, do disposto nos artºs 1º e 3º a 19º do Decreto Regulamentar nº 24/2009 de 04 de Setembro, o qual revogou o Decreto Regulamentar nº 12/99 de 30 de Julho, alterado pelo Decreto Regulamentar 5-A/02, de 8 de Fevereiro (anteriormente disposto nos artºs 1º, 3º a 10º e 13º a 25º do Decreto Regulamentar nº 12/99, de 30 de Julho) e do disposto nos artºs 16º e 17º do Decreto-Lei nº 102/90, de 21 de Março, alterado pelo Decreto-Lei nº 280/99, de 26 de Julho, pelo Decreto-Lei nº 268/2007 de 26 de Julho e pelo Decreto-Lei nº 216/2009, de 4 de Setembro.
65. Com efeito, partindo da (errada) decisão quanto ao não reconhecimento do direito das agências de viagens associadas da A., ora Recorrente, a receberem comissões sobre a PSC, a sentença recorrida julgou (erradamente), como improcedente, o pedido de condenação da Recorrida ao pagamento das quantias correspondentes à comissão incidente sobre a PSC.
66. Ora, procedendo o primeiro pedido acima apreciado (“Ser declarada a existência do direito das representadas da A..a receber comissões, à taxa vigente em cada momento, sobre os montantes relativos à passenger service charge”), como se demonstrou que procede, terá, também, o segundo (a condenação da R. “a pagar os montantes correspondentes à comissão incidente sobre o passenger service charge, desde 1 de Janeiro de 1994 até final, bem como juros desde a data do respectivo vencimento – sucessivos dias 15 do mês seguinte a que as prestações de serviços que dizem respeito e em que eram pagos os montantes de comissão às Agências de Viagens – até integral pagamento, calculados às taxas legais em vigor em cada momento”) que proceder.
67. Acresce que, esqueceu-se a sentença recorrida, que a matéria da representação da A… para a cobrança dos citados créditos, já havia sido resolvida e decida no despacho saneador proferido nos autos.
68. Não podia a sentença recorrida apreciar novamente a questão da pretensa falta, insuficiência ou irregularidade de representação da A., uma vez que esta questão já havia sido apreciada nos autos, não sendo possível proceder-se a um novo julgamento da mesma.
69. Assim, sentença recorrida violou, nesta parte, o disposto no artº 672º do CPC, sendo, ainda – caso assim não se entenda -, nula ao abrigo da 2ª parte da alínea d) do nº 1 do artº 668º do CPC.
70. Acresce que, face ao exposto, e uma vez que o despacho saneador julgou que a A… tem “poderes de representação das agências associadas”, decorrendo tais poderes dos Estatutos da mesma - artº 3º, nº 1, al. x) - e “da acta da assembleia geral da A., realizada a 18.07.2001, junta a fls. 187 e ss.” onde “consta a aprovação da deliberação de serem intentadas pela A. acções judicias contra as companhias aéreas, para recebimento das comissões das taxas de serviço aos passageiros” e que “actuando como representante, na acção, é também como representante - e não em nome próprio - que formula os pedidos”, é sempre necessário concluir-se que a A… tem poderes de representação que legitimam a cobrança de créditos da titularidade dos agentes de viagens seus associados, referentes à comissão incidente sobre a PSC, desde 01/01/1994, podendo a mesma exigir à R. o pagamento das quantias pecuniárias peticionadas,
71. Esta decisão proferida no despacho saneador é importante para se concluir pela existência dos poderes de representação que a A… tem para pedir a condenação da R., ora Recorrida, nos termos em que o fez na presente acção, bem como para o pedido de ser declarado o direito das agências de viagens associadas da A… e acreditadas junto da IATA, receberem da R. comissões para pagamento dos serviços de intermediação destas na venda de bilhetes de transporte aéreo, incidentes sobre os montantes relativos à passenger service charge, calculadas à taxa vigente em cada momento, desde 1 de Janeiro de 1994.
72. Importa ainda referir que, como não podia deixar de ser, a deliberação tomada na referida Assembleia-Geral da A…, tornou-se vinculativa para as agências de viagens associadas da A…, incluindo as que não estavam presentes na referida assembleia.
73. Também, como já se mencionou supra, resulta da acta Assembleia-Geral de 18/07/2001, a forma de distribuição da comissão às agências de viagens: “cada uma delas iria receber a comissão proporcionalmente às vendas realizadas nos últimos anos”, o que sempre dispensaria a necessidade de peticionar a condenação no pagamento às agências de viagens das quantias devidas a cada uma delas.
74. Deste modo, a preocupação expressa na sentença recorrida quanto ao facto da A… peticionar que a S… seja condenada a pagar a ela, Recorrente, e não às suas representadas, os montantes que lhe são devidos, não faz o menor sentido, sendo certo, ainda, que a S… sabe que os montantes que a A… receber, por via desta acção, serão distribuídos pelos seus Associados, como aliás foi discutido na Assembleia-Geral de 18/07/2001.
75. Como já foi decidido nestes autos, em sede do despacho saneador, o modus faciendi dessa distribuição não deve ser alvo de qualquer preocupação, já que este cabe exclusivamente no domínio das relações entre a A… e as agências de viagens suas associadas.
76. Podemos, pois, concluir que as agências de viagens associadas da A…concederam poderes de representação a esta para intentar a presente acção nos precisos termos em que foi deduzida, incluindo o recebimento e a cobrança das quantias que foram reclamadas.
77. Assim, actuando a A… como representante, na acção, é como representante – e não em nome próprio - que pede a condenação da ré a pagar-lhe determinadas quantias.
78. E, sem prejuízo do exposto, há que dizer que os citados poderes de representação da A…, resultam de per si da al. x), do art.º 3º, nº 1, dos seus Estatutos que, dispõe que “entre as suas atribuições conta a de representar em Juízo os seus associados, sempre que estejam em causa interesses que respeitem ao sector das agências de viagens”.
79. Ora, como é óbvio, e como se concluiu nestes autos, a matéria sub judice consubstancia um manifesto interesse do “sector” e, consequentemente, respeita aos interesses de cada um dos Associados da A…. Como tal, dentro da competência da A…, de defesa dos interesses dos seus Associados, a mesma tem os necessários poderes e legitimidade para propor a presente acção.
80. Termos em que, não existe qualquer falta de poderes de representação da Recorrente, não se verificando qualquer falta, insuficiência ou irregularidade de representação da mesma.
81. Acresce que, contrariamente ao que a sentença recorrida refere, há que mencionar que relativamente ao pedido de ser decretado o direito das agências de viagens associadas da A… e acreditadas junto da IATA, receberem da R. comissões para pagamento dos serviços de intermediação destas na venda de bilhetes de transporte aéreo, incidentes sobre os montantes relativos à PSC, calculadas à taxa vigente em cada momento, desde 1 de Janeiro de 1994, toda a jurisprudência foi unânime em considerar que não só a A… é parte legítima, como tem os respectivos poderes de representação por parte das agências de viagens suas associadas.
82. Tendo ficado provado nestes autos que a A… tem poderes de representação das agências de viagens suas associadas para a cobrança das quantias que reclama, podendo-se concluir que tais agências são efectivamente credoras das quantias que são reclamadas, só podia a sentença recorrida ter reconhecido o direito das representadas da A… a receber comissões, à taxa vigente em cada momento, sobre os montantes relativos à taxa de serviço a passageiros (PSC) e ter condenado a ré a pagar à autora a quantia que se apurar em execução de sentença, referente à comissão devida sobre a PSC no período de 1 de Janeiro de 1994 até hoje.
83. Não o tendo feito, violou o disposto na al. x), do artº 3º, nº 1, dos Estatutos da A…, bem como o previsto nos artºs 258º e 262º do C. Civil.
84. Como se demonstrou supra, a APAVT tem legitimidade e poderes para demandar a S…, e para formular o pedido de condenação desta no pagamento dos montantes correspondentes à comissão incidente sobre a PSC, bem como para formular o pedido de ser declarada a existência do direito das representadas da A… a receber comissões, à taxa vigente em cada momento, sobre os montantes relativos à PSC.
85. E como é evidente, se a A…, pode peticionar o que peticionou, na forma em que peticionou (além do mais, com o aval das agências de viagens suas associadas), então e, como é evidente, tem os necessários poderes e está autorizada a cobrar a quantia que o Tribunal vier a ordenar pagar.
86. Mais uma vez se conclui que a sentença recorrida violou o disposto no artº 672º do CPC, sendo, ainda – caso assim não se entenda -, nula ao abrigo da 2ª parte da alínea d) do nº 1 do artº 668º do CPC.
87. No que diz respeito à terceira questão de direito a apreciar, mencionada na sentença recorrida, respeitante à alegada existência de abuso de direito, também esta decidiu erradamente.
88. Com efeito, tendo em conta que os dois pedidos deduzidos pela A…T são integralmente procedentes, é necessário concluir pela inexistência de abuso de direito.
89. Nos presentes autos, não provou o nº 6 da b.i., ou seja, que “só em finais de 2003, a A. comunicou à R. que entendia que deveriam ser pagas comissões sobre a taxa de serviços a passageiros”; facto, este, essencial para se apurar a alegada excepção de abuso de direito invocada pela R., ora Recorrida.
90. Não tendo a R. provado este facto, conforme lhe competia, é necessário concluir-se pela total improcedência desta excepção.
91. Não tendo assim decidido, a sentença recorrida violou o disposto no artº 334º do C. Civil, bem como o previsto no artº 659º, nº 3, do CPC.
92. E mesmo que assim não se concluísse, o que só se concede por mera hipótese de raciocínio, teríamos de concluir que a sentença recorrida é, nesta parte, nula, nos termos da alínea d), do nº 1 do artº 668º do CPC, porquanto o tribunal recorrido devia ter-se pronunciado sobre esta questão (julgando-a improcedente), atento o facto de não se ter provado a matéria do nº 6 da base instrutória.
93. Pelo que a decisão recorrida deve ser julgada improcedente e, consequentemente, revogada, substituindo-se a mesma por outra que julgue a presente acção totalmente procedente por provada.
Os AA./recorridos apresentaram contra alegações.
Dispensados que foram os vistos legais, ao abrigo do disposto no nº2 do art. 707º, do CPC, há que decidir.

II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO.

Considerando que as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste tribunal, as questões levantadas pela apelante são as seguintes:
1. Se as associadas da autora creditadas na IATA têm direito a comissões sobre a “taxa de serviço de passageiros”.
2. Condenação da Ré no pagamento à autora dos montantes correspondentes à comissão incidente sobre a taxa de serviço de passageiros – nulidade da sentença nos termos da 2ª parte, da al. d), do nº1 do art. 668º do CPC.
3. Abuso de direito.

III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO.

 A. Matéria de facto.
São os seguintes os factos dados como provados na decisão recorrida:
1. A R. é a maior companhia aérea de ….
2. A R. é membro efectivo da International Air Transport Association (IATA), associação representativa dos interesses das companhias aéreas.
3. A maioria dos bilhetes vendidos em Portugal é-o através das agências de viagens acreditadas pela IATA.
 4. As agências de viagens acreditadas junto da IATA subscreveram o contrato-tipo de agência (Passenger Sales Agency Agreement), do qual fazem parte as Resoluções n.º 824, de 15.12.1993 e n.º 814, de 17.01.1990 juntas como docs. de fls. 66 a 69 e 510 e 511, redigidos em língua inglesa, que aqui se dão por reproduzidos.
5. No que concerne à venda de bilhetes das companhias aéreas pelas agências de viagens, dispõe o artigo 9º da Resolução n.º 824 da IATA: “A companhia aérea retribui ao agente, no quadro deste contrato, a venda de bilhetes de avião e serviços adicionais prestados pelo agente, com a importância periodicamente fixada e comunicada ao Agente pela companhia aérea. Esta retribuição representa o pagamento integral dos serviços que foram prestados à companhia aérea”.
6. De acordo com o artigo 9.4.1, da Resolução nº 814 da IATA: “Havendo lugar ao pagamento de comissão ao Agente deverá a mesma ser calculada sobre a tarifa aplicável para o transporte aéreo de pessoas (...) pago ao Membro (...) e recebido pelo Agente (...).”
7. Até 31.12.1993 as companhias aéreas, nomeadamente a R., apresentavam uma tarifa única no título de transporte (adiante designado bilhete) e autonomizavam uma taxa única (a taxa de segurança), pagando aos Agentes de Viagens uma comissão, correspondente a uma percentagem, em vigor em cada momento, sobre a tarifa.
8. Até 31.12.1993 a taxa de serviço de passageiros era cobrada juntamente com o preço do bilhete e o respectivo valor não se encontrava autonomizado.
9. A partir de 01.01.1994, as companhias aéreas, nomeadamente a R., passaram a apresentar, no título de transporte, uma série de caixas (boxes), a saber:
a) PTE – Tarifa;
b) PT – correspondente à taxa de segurança (security charge);
c) YP – correspondente à taxa de serviço de passageiros (passenger service charge) em Portugal.
10. A R. cobrou nos anos de 1994 e seguintes um determinado montante a título de taxa de serviço de passageiros.
11. As comissões em vigor entre 01.01.1994 e 31.03.2001 correspondiam a 9% do valor da venda do dos bilhetes.
12. (…) Entre 01.04.2001 e 31.03.2003 a taxa mencionada desceu para os 7%.
13. (…) E desde 01.04.2003 até, pelo menos, Novembro de 2003 aquela taxa situou-se nos 6%.
14. As comissões são pagas aos agentes de viagens no dia 15 do mês seguinte à prestação dos serviços de intermediação.
15. Desde 01.01.1994 que as agências de viagens não receberam da R. montantes referentes a comissões sobre a taxa de serviço de passageiros.
16. A Autora é uma associação empresarial representativa dos interesses de cerca de 500 agências de viagens e turismo, com sede em Portugal, as quais representam mais de 1000 pontos de venda.
17. Das agências de viagens associadas da Autora, cerca de 300 das identificadas nos documentos de fls. 14 a 25 estão associadas junto da IATA.
18) A título de passenger service charge, a Ré cobrou, nos anos de 1998, 1999 e 2000 quantias de montante não concretamente apurado.
19. As taxas de serviço a passageiros cobradas pela Ré são depositadas por esta numa conta de “taxas”, por forma a serem, posteriormente, entregues às entidades públicas respectivas.
20. Pelo menos 5% dos bilhetes vendidos anualmente são vendidos directamente pela Ré.
21. O “Travel Agent's Handbook” junto como documento de fls. 70 a 73, redigido em língua inglesa, que aqui se dá por reproduzido, é entregue a todos os agentes da IATA no momento da celebração do contrato.
B. Subsunção do direito aos factos.
1. Inclusão (ou não) da “Passenger service charge” na base de cálculo das comissões a que têm direito as agências de viagem.
A questão em apreço, suscitada em diversas acções interpostas contra diferentes companhias aéreas, tem vindo a ser objecto de decisões divergentes, quer por parte da 1ª instância, quer por parte desta relação, quer pelo Supremo Tribunal de Justiça, pronunciando-se umas no sentido de que a referida taxa deverá ser contabilizada para efeitos da comissão a pagar às associadas da autora e outras em sentido contrário.
Nos presentes autos, a 1ª instância pronunciou-se pela não contabilização de tal taxa para efeitos de fixação da comissão a pagar às associadas da autora.
As divergências na jurisprudência incidem essencialmente sobre a interpretação a dar ao art. 9º da Resolução nº 824, e art. 9º da Resolução 814, da IATA, e sobre a natureza da referida “passenger service charge”.
No que concerne à venda de bilhetes das companhias aéreas pelas agências de viagens, dispõe o citado art. 9º da Resolução nº 824 da IATA:
A companhia aérea retribui ao agente, no quadro deste contrato, a venda de bilhetes de avião e serviços adicionais prestados pelo agente, com a importância periodicamente fixada e comunicada ao Agente pela companhia aérea. Esta retribuição representa o pagamento integral dos serviços que foram prestados à companhia aérea[1]”.
Nas decisões que têm vindo a ser proferidas parece haver algum consenso quanto ao significado de tal cláusula, nomeadamente quanto ao facto de aí apenas se estabelecer que pela prestação de serviços de venda de bilhetes de avião, a companhia aérea retribuirá o agente com a “importância periodicamente fixada e comunicada ao agente pela companhia aérea”:
“Trata-se, portanto, do pagamento de uma comissão a calcular de acordo com a percentagem fixada pela companhia aérea, que tem assim a liberdade de alterar o montante dessa percentagem[2]”.
É certo que, como se afirma no Acórdão do STJ de 14.05.2009, o facto de serem livres de reduzir essa percentagem não significa obviamente, que sejam livres de alterar a base incidência dessa percentagem.
Assim, e quanto à base de cálculo da comissão, dispõe o artigo 9.4., da Resolução nº 814 da IATA:
9.4. “Conditions for paying Comission:
9.4.1. “Where commission is payable to an Agent it shall be calculated on the amout off ares applicable to the air passenger transportation or charter price paid over to de member, or the Cleaning Bank Setlement Plan, and collected by the Agent; provided that this shall not prevent commisson being paid where such sal eis made”.
9.4.2. The fares applicable are the taxes (incluing fare surcharges) for the transportation in accordance with the Member’s tariffs and shall exclude any charges for excess baggage ou excess valuation of baggage as well as all taxes and other charges collected by the agent”.
Tais cláusulas obtiveram a seguinte tradução pelo perito do tribunal:
9.4. Condições de pagamento da comissão:
9.4.1. Havendo lugar ao pagamento de comissão ao Agente deverá a mesma ser calculada sobre a tarifa aplicável para o transporte aéreo de passageiros (...) pago ao Membro (...) e recebido pelo Agente (...).”
9.4.2. As tarifas aplicáveis são as tarifas (incluindo sobretaxas de tarifa) do transporte, em conformidade com as tarifas do Membro, e excluem quaisquer taxas pelo excesso de bagagem ou cobertura adicional de bagagem de valores declarados superiores ao da limitação de responsabilidade, bem como todos os impostos e outros encargos cobrados pelo Agente.
Constata-se, desde logo, a existência de divergências entre a tradução efectuada pelo perito do tribunal e a tradução dada ao parágrafo 9.4.2 noutras decisões[3]:
A expressão “any charges for excess baggage ou excess valuation of baggage as well as all taxes and other charges collected by the agent”, foi traduzida pelo perito do tribunal, atribuindo a “any charges” o sentido de “quaisquer taxas” e “all taxes and other charges” por “todos os impostos e outros encargos”.
Ora, enquanto que a expressão “any charges” foi traduzida por “quaisquer taxas”, mais adiante “other charges” foi traduzida por “outros encargos”, quando nada justifica que à mesma palavra e na mesma frase sejam dados dois significados distintos – num primeiro momento, taxas, e num segundo momento encargos.
Assim, teremos por mais adequada a seguinte tradução[4]:
“As tarifas aplicáveis são as tarifas (incluindo sobretaxas de tarifa) para o transporte, de acordo com as tarifas dos Membros e excluem quaisquer taxas pelo excesso de bagagem ou excesso de valor de bagagem, bem como todos os impostos e outras taxas cobradas pelo Agente[5]”.
De qualquer modo, excluindo da base de cálculo da comissão “charges for excess baggage or excess valuation of baggage” e ainda “other charges collected by de Agent”, uma interpretação literal de tal parágrafo levar-nos-ia a considerar que a referida “passenger service charge” recairia no âmbito de “other charges”.
Assim, segundo o Parecer emitido por Mota Pinto e que se mostra junto aos autos, a citada clausula esclarece que as tarifas correspondem apenas ao preço do transporte e, consequentemente, exclui da base de cálculo da comissão uma série de valores que não constituem contrapartida do transporte: a taxa por excesso de bagagem ou valor de bagagem, os impostos e outras taxas (ou encargos) cobradas pelo agente[6].
Passamos agora a analisar a natureza da citada “passenger service charge”.
A matéria das taxas aeroportuárias encontra-se regulamentada no DL nº 102/99 de 21.03, e no Decreto Regulamentar nº 12/99, de 30/07[7] que define as taxas devidas pelas ocupações de terrenos, edificações e outras instalações, bem como pelo exercício de quaisquer actividades na área dos aeroportos e aeródromos públicos ou pela sua utilização ou dos seus respectivos serviços e equipamentos.
O art. 17º do Dec. Lei nº 102/99, divide as várias taxas aí previstas em quatro grupos: taxas de tráfego, taxas de assistência em escala, taxas de ocupação e outras taxas de natureza comercial.
As taxas de tráfego são devidas pela utilização da infra-estrutura aeroportuária, assentando na utilização de um bem do domínio público do Estado[8], incluindo, para além da taxa de serviço de passageiros (art. 8º do DR nº 12/99), a taxa de aterragem e descolagem (art. 4º), a taxa de controlo terminal (art. 5º), a taxa de estacionamento (art. 6º), a taxa de abrigo (art. 7º), e a taxa de abertura de aeródromos (art. 9º).
Dispõe o art. 8º do DR nº 12/99:
Taxa de serviço de passageiros:
1 - A taxa de serviço a passageiros é devida por cada passageiro embarcado e pode ser diferenciada segundo o destino do passageiro.
2. A taxa de serviços a passageiros é debitada aos transportadores, não podendo a respectiva importância ser cobrada em separado do acto de emissão do bilhete ou da cobrança do preço deste.
3. Estão isentos do pagamento da taxa de serviço a passageiros (…).
(…).
A competência para a fixação da taxa de serviço de passageiros, assim como das restantes taxas de tráfego recai sobre o Ministro responsável pelo sector dos transportes, após parecer do Instituto Nacional da Aviação Civil.
Assim, e segundo o Parecer de Xavier Bastos, junto aos autos pela Ré, a taxa de serviço de passageiros é, pois, em sentido técnico uma taxa, o preço de um bem ou serviço público – é um tributo, para efeitos do nº2 do art. 3º da Lei Geral Tributária, mas não é um imposto, porque não assenta na capacidade retributiva, mas antes na prestação concreta de um serviço público.
De qualquer modo, as decisões já proferidas por esta Relação e pelo Supremo quanto a esta questão são concordantes na qualificação da taxa e serviço de passageiros como uma taxa[9], divergindo tão só quanto ao facto de a mesma se incluir (ou não) no conceito de “other charges collected by the Agent” – “taxas (“outros encargos”, conforme a tradução que se fizer) cobrados pelo agente”.
O Acórdão do STJ de 14.05.209, considera a “passenger service charge”, juntamente com as demais taxas de tráfego (anteriormente taxas aeronáuticas) um custo de actividade desenvolvida pelas companhias aéreas de transporte de passageiros por meio de serviços aéreos, constituindo um custo geral da operação de transporte.
Contudo, não é essa a perspectiva dada por António Moura Portugal e Maria José Viegas, que distinguem a taxa de serviço de passageiros das demais taxas de tráfego, quer quanto à base de incidência objectiva quer quanto à base de incidência subjectiva.
Afirmam assim, quanto à base de incidência objectiva de tais taxas:
“O elenco das taxas de tráfego compreende taxas de natureza distinta, existindo, desde logo, uma diferença evidente quanto à natureza da taxa de serviço a passageiros e demais taxas de tráfego. É essa diferença de natureza que explica, como veremos adiante, que esta taxa seja separável da tarifa de transporte aéreo, ao contrário das demais.
As taxas de tráfego, em geral, são devidas pela operação geral de transporte aéreo e não se proporcionam ao número de passageiros transportados. Constituem custos gerais das transportadoras aéreas e não poderiam nunca ser individualizados e imputados a cada bilhete vendido[10]”.
E, quanto à base de incidência subjectiva de tal taxa, afirmam tais autores:
“A taxa de serviço a passageiros é a única taxa de tráfego que é proporcional ao número de passageiros transportados, constituindo um encargo de natureza tributária separável dos custos suportados pelos transportadores e separada na tarifa por não corresponder a factores de produção utilizados pelas companhias aéreas para a realização do serviço de transporte[11]”.
Ou seja, segundo tais autores, enquanto nas demais taxas de tráfego o sujeito passivo será aquele que realiza a operação, e nesta medida utiliza o domínio público aeroportuário e beneficia da prestação concreta do serviço público (pessoa singular ou colectiva que efectua o transporte aéreo comercial ou não comercial), na taxa de serviço de passageiros o tributo é devido por cada passageiro embarcado – o sujeito passivo é o passageiro –, sendo o Agente um mero cobrador de tal imposto[12].
“Trata-se afinal de um encargo tributário – uma taxa fixada autoritariamente – que as companhias cobram para a ANA, S.A., em que estas actuam simplesmente como agentes cobradores, limitando-se a repercutir individualizadamente em cada bilhete vendido a respectiva quantia, não podendo cobrá-la em separado do acto de emissão do bilhete ou da cobrança do preço[13].”.
E, a reforçar a natureza do encargo – uma taxa devida pelos passageiros e não pelas transportadoras – apontam ainda o facto de, independentemente da cobrança do preço ou não (na livre disponibilidade do transportador), haver sempre lugar ao pagamento da taxa pelo passageiro e à respectiva entrega à ANA[14].
Esta taxa – que constitui uma receita pública, fixada e exigida por lei aos passageiros e que tem por base ou sinalagma o serviço prestado a esses mesmos passageiros – não será, assim, ao contrário das demais taxas, um custo operacional das companhias, que são meras intermediárias na respectiva cobrança e entrega ao Estado (ANA).
 Concorda-se, assim, com a posição sustentada na 1ª instância de que não existirá fundamento para calcular a comissão dos agentes de viagens sobre outro valor que não o da própria tarifa, dela excluindo a taxa de serviços de passageiros.
A decisão proferida quanto à primeira das questões colocadas pela Autora, prejudica as demais questões por si suscitadas nas suas alegações de recurso – art. 660º, nº2, por força do art. 716º, ambos do CPC.
A sentença recorrida será de manter na íntegra.
Agravo
Quanto ao agravo interposto pela ré/apelada, tendo esta obtido total vencimento na acção e sendo confirmada a sentença, não será de conhecer do mesmo – nº1 do art. 710º do CPC.


IV – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, mantendo-se a decisão recorrida.

Custas pela apelante, quanto ao recurso de agravo[15] e quanto ao recurso de apelação.

Lisboa, 10 de Maio de 2011

Maria João Areias
Luís Lameiras
Roque Nogueira
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[1] O teor de tal cláusula, traduzida para português, consta da base instrutória, não tendo sido na presente acção (ao contrário do que ocorreu noutras) contestada pelas partes, pelo que não a discutiremos.
[2] Cfr., Acórdão do STJ de 14.05.2009, relatado por Garcia Calejo, e que acaba por concluir no sentido da inclusão da taxa em apreço, e Acórdão da Relação de Lisboa de 19.05.2009, relatado por Betencourt de Faria (este, no sentido da não inclusão), disponíveis in http://www.dgsi.pt.
[3] No processo 9810/03.6TVLSB.S1, que deu origem aos Acórdãos do TRL de 19.05.2009, e do STJ de 15.04.2010 (disponíveis in http://www.dgsi.pt), que decidiram pela inclusão na tarifa da “passenger service charge”, é dada uma tradução diferente ao parágrafo 9.4.2.:
“As tarifas aplicáveis são as tarifas (incluindo sobretaxas de tarifa) para o transporte, de acordo com as tarifas do Membro e excluem quaisquer encargos pelo excesso de bagagem ou excesso de valor de bagagem, bem como todas as taxas ou impostos e outros encargos cobrados pelo Agente.”
Quanto ao Acórdão do STJ de 14.05.2009, relatado por Garcia Calejo, sustenta que a palavra em inglês “charges” tanto pode significar “taxas” como “encargos”.
[4] Como se afirma no Acórdão do STJ de 15.04.2010, em sede de indagação de factos, o julgador, que para tanto se considere habilitado, pode fixar o conteúdo da tradução de um documento redigido em língua estrangeira, salvo se o conteúdo daquela estiver autenticado pelo agente consular competente.
[5] Tradução esta igualmente adoptada pelo Parecer do Prof. Mota Pinto junto aos autos pela Ré.
[6] Cfr., pag. 83 do Parecer junto aos autos.
[7] Tal decreto foi revogado pelo DR 24/2009, de 4 de Setembro, sem que tenham sido introduzidas alterações significativas nas normas que interessam ao caso em apreço.
[8] Cfr., António Moura Portugal e Maria José Viegas, “As Taxas de Regulação Económica no Sector dos Aeroportos”, estudo publicado in “As Taxas de Regulamentação Económica Em Portugal”, coordenação de Sérgio Vasques, Almedina, 2008, pag. 69.
[9] Cfr., neste sentido, Acórdãos do TRL de 19.05.2009, do STJ de 15.04.2010 e do STJ de 14.05.2009.
[10] Cfr., estudo e obra citada, pag. 73.
[11] Cfr. estudo e obra citada, pag. 75.
[12] Cfr., estudo e obra citada, pag. 74.
[13] Cfr., “Taxas de Regulação Económica no Sector dos Aeroportos” (…), pag. 75.
[14] Cfr., estudo citado, pag. 76, nota 23.
[15] Extinguindo-se a instância quanto ao recurso de agravo por inutilidade superveniente da lide, tais custas deverão ficar a cargo do apelante, nos termos do art. 447º do CPC – cfr., neste sentido, Salvador da Costa, “Código das Custas Judiciais, Anotado e Comentado”, Almedina, 7ª ed., 2004, pag. 183.