INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
AMPLIAÇÃO DO PEDIDO
VALOR DA CAUSA
Sumário

1. Numa acção em que o autor pretende a declaração de ineficácia ou, subsidiariamente, a anulação do negócio de subscrição de unidades de participação de um produto financeiro, o facto de, na pendência da acção, ter pedido o resgate das mesmas não determina a inutilidade superveniente da lide em relação ao pedido de indemnização também formulado.
2. É admissível a ampliação do pedido depois da réplica, no sentido de ao pedido de indemnização ser acrescentado o pedido de pagamento da quantia correspondente à diferença entre o preço pago e a quantia restituída com o resgate.
3. A inutilidade superveniente da lide parcial não determina a redução do valor da causa, pois este valor determina-se com referência ao momento da propositura da acção.
4. Não é aplicável a isenção de custas prevista na Lei 7/2012 de 13/2 à inutilidade superveniente parcial da lide, não havendo desistência do pedido ou da instância.

Texto Integral

Acordam do Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO.

Mário intentou acção declarativa com processo ordinário contra Banco Espírito Santo, SA e Espírito Santo Fundos de Investimento Imobiliário, SA e, após ser convidado a aperfeiçoar a petição inicial, apresentou novo articulado também contra Fundo de Pensões do Banco Espírito Santo, alegando, em síntese, que é cliente do réu Banco Espírito Santo (BES), que a ré Espírito Santo Fundos de Investimento SA (ESAF) é uma sociedade do Grupo Espírito Santo, gestora do Fundo de Investimento Imobiliário Fechado denominado “Espírito Santo Reconversão Urbana II (FRU II)” e que a ré Fundo de Pensões do Banco Espírito Santo constitui um património autónomo tendo como entidade gestora a ré ESAF e como seu único associado o réu BES e, tendo o autor subscrito 500 unidades de participação no referido Fundo de Investimento Imobiliário Fechado denominado “Espírito Santo Reconversão Urbana II (FRU II)”, que pagou através de cheque de 500 000,00 euros sacado de uma sua conta doutro banco, só depois de muita insistência conseguiu que lhe fossem entregues o Regulamento de Gestão e o Relatório de Gestão, de cuja análise ficou ciente da necessidade de convocação de uma Assembleia de Participantes, mas, perante a recusa da ré ESAF de fazer tal convocação, o autor participou à CMVM, que instaurou um processo, no âmbito do qual o autor veio a ter conhecimento de que a ré ESAF procedeu à aquisição de 500 unidades de participação no FRU II à ré Fundo de Pensões do BES, em nome e por conta do autor em mercado secundário, sem o conhecimento deste, desconhecendo o autor o procedimento e condições da aquisição e que se os conhecesse não teria aderido ao produto e nunca tendo dado uma ordem de compra e venda de participação, mas sim uma ordem de subscrição, tendo a real situação do FRU II sido ocultada ao autor pelo réu BES, havendo assim a realização de uma transacção sem os necessários poderes, que deve ser considerada ineficaz ou deve ser anulada, devendo ainda o autor ser compensado pela não rentabilização da quantia despendida em valor que já ascende a 80 000,00 euros.      

Concluiu pedindo:

- A declaração de ineficácia da compra das unidades de participação e as rés ESAF e Fundo de Pensões condenadas a pagar ao autor, contra a restituição das 500 unidades de participação, a quantia de 580 000,00 euros, sendo a quantia de 500 000,00 euros despendida na compra das unidades de participação e a quantia de 80 000,00 euros a título de lucros cessantes, atenta a impossibilidade da sua rentabilização.

- Caso assim não se entenda, declarada a anulação da compra e venda das unidades de participação e a condenação das rés a pagar ao autor a título de indemnização a quantia de 580 000,00 euros, sendo a quantia de 500 000,00 euros despendida na compra das unidades de participação e a quantia de 80 000,00 euros a título de lucros cessantes, atenta a impossibilidade da sua rentabilização.

- Em qualquer dos casos, a condenação das rés a pagar juros de mora contados a partir da citação. 

Os réus Banco Espírito Santo, SA e Espírito Santo Fundos de Investimento Imobiliário, SA contestaram arguindo as excepções de ineptidão da petição inicial, da ilegitimidade passiva e da prescrição e impugnando o alegado na petição, concluindo com o pedido de procedência das excepções e da improcedência da acção e pedindo ainda a condenação do autor como litigante de má fé.   

O autor replicou opondo-se às excepções e ao pedido de condenação por litigância de má fé.

Posteriormente, veio o autor apresentar requerimento, alegando que em Assembleia Geral de Participantes e com o voto contra do autor, foi prorrogado o prazo de duração do Fundo, pelo que o autor pediu e obteve o resgate das unidades de participação em causa, tendo a ré ESAF procedido à respectiva liquidação com o depósito na conta do autor da quantia de 491 117,20 euros, tendo assim o autor um prejuízo de 8 882,80 euros a acrescer ao prejuízo já invocado na petição inicial.

Concluiu requerendo:

- Desistência da instância relativamente ao pedido deduzido contra o Fundo de Pensões do BES, na qualidade de entidade vendedora das 500 unidades de participação.

- Extinção parcial da instância, com fundamento na inutilidade superveniente da lide quanto aos pedidos de declaração de ineficácia e anulação do negócio jurídico, atento o resgate das 500 unidades de participação detidas pelo autor e sua consequente liquidação.

- Ampliação do pedido de indemnização, no sentido de contemplar a diferença entre o valor da aquisição e o valor da liquidação do resgate, no montante de 8 882,80 euros.

- Redução do valor da acção, que deverá ser subtraído do montante de 491 117,20 euros, correspondente ao valor pago no âmbito da liquidação do resgate e adicionado com o valor de 8 882,80 euros nos termos sobreditos.

Os réus apresentaram requerimento opondo-se ao do autor e pedindo:

- A absolvição da instância do Fundo de Pensões do Banco Espírito Santo, por ainda não ter sido citado nem ter tido oportunidade de oferecer contestação.

- A absolvição da instância das rés face à inutilidade superveniente da lide relativamente aos únicos pedidos por este formulado.

- O indeferimento da ampliação do pedido, por o mesmo não ser consequência nem resultar do desenvolvimento do pedido primitivo.

- Caso não sejam as rés absolvidas da instância, ser o autor notificado para esclarecer se pretende a redução do pedido ou a mera redução do valor da acção.

Sobre estes requerimentos recaiu despacho que decidiu:

- Não ter qualquer valor a desistência da instância contra o Fundo de Pensões do Banco Espírito Santo porque este não é parte na acção, uma vez que, após o convite para aperfeiçoamento da petição inicial, o autor nunca deduziu o respectivo incidente de intervenção principal provocada.

- Indeferir a ampliação do pedido por o mesmo não ter que ver com o pedido primitivo.

- Indeferir a redução do valor da acção por falta de fundamento legal.

- Julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, nos seguintes termos: (…) o autor, ao pedir o resgate das unidades de participação na pendência da presente acção, acaba por sanar os eventuais vícios da compra e venda das unidades de participação (cfr. arts. 268º, 269º e 288º do CC (…).

- Fixar as custas a cargo do autor. 

Inconformado, o autor interpôs recurso deste despacho e alegou, formulando as seguintes conclusões:

I – Compulsada a sentença recorrida, a fundamentação apresenta teor ou carácter residual e conclusivo, pecando ainda por escassa e contraditória, omitindo a selecção da matéria de facto provada, o que determina a sua nulidade atenta a violação do disposto nos artigos 659º e 686º nº1 al. b) do CPC.

II – Da leitura dos artigos 62º e 71º da petição inicial, conclui-se que o pedido indemnizatório deduzido pelo autor, ora recorrente, tem como fundamento o artigo 304º do CVM e artigo 562º do CC e não apenas os efeitos da declaração de ineficácia e anulação, previstos, respectivamente, nos artigos 268º, nº1 e 289º do CC.

III – Portanto, documentalmente provado que o autor sofreu um prejuízo de 8 882,80 euros, constituído pela diferença despendida na subscrição das Unidades de Participação e pelo valor obtido na liquidação do resgate, é pacífico que tal prejuízo constitui uma consequência ou desenvolvimento do pedido de condenação em indemnização ao abrigo do artigo 304º do CVM e 562º do CC, questão que não foi objecto de pronúncia.

IV – Quanto à questão da redução do valor da causa, ao invés do decidido, formulado, fundamentalmente, pedido de redução, nada obsta à pretendida redução, que aliás sempre poderia (deveria) ser determinada, oficiosamente, nos termos do artigo 315º nº2 do CPC (cfr. Ac. do STJ de 11.07.1969, BMJ 189-226).

V – Quanto à extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, importa sublinhar que ainda que o recorrente se abstivesse ou se tivesse limitado à dedução da sua pretensão indemnizatória com base num arrazoado de facto, que entendesse serem suficientes para fundar o seu pedido, o Tribunal, ainda assim, não estava inibido de aplicar as normas jurídicas ajustadas aos factos apurados, atenta a sua integral liberdade na indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, independentemente da contribuição, ou posição das partes (artigo 664º do Código de Processo Civil).

VI – Todavia, conforme supra demonstrado, o requerente limitou-se a requerer a extinção parcial da instância, na sequência do pedido de resgate das unidades de participação e da sua consequente liquidação e pagamento, mantendo o pedido de condenação dos réus, em indemnização, que aliás ampliou.

VII – Tal pedido de indemnização encontra suporte no artigo 304º A, nº1 do CVM, invocado e transcrito sob o artigo 62º da petição inicial e nos artigos 562º e segs e do Códigos Civil, também expressamente invocado, quer no artigo 71º da PI, quer no pedido, sendo pacífica a possibilidade de cumulação da responsabilidade contratual com a responsabilidade extracontratual (cfr. Ac. do STJ de 10.01.2013, disponível em www.dgsi.pt e Ac. da Relação do Porto de 03 de Julho de 2008, in www.dgsi.pt).   

VIII – Contudo, o Tribunal parece equiparar o pedido de resgate das unidades de participação à ratificação do negócio ou à sua confirmação, daí a referência aos artigos 268º, 269º e 288º do Código Civil, porém, do teor dos artigos citados decorre que os efeitos aí previstos vão muito além da ratificação ou confirmação dos negócios jurídicos ineficazes ou anuláveis, prescrevendo inclusive determinadas condições para que tal possa ocorrer.

IX – Porém, quanto às razões concretas que fundamentam a sua decisão, a sentença é absolutamente omissa, pelo que a decisão de declaração de extinção da instância como fundamento no facto de (…) o autor, ao pedir o resgate das unidades de participação na pendência da presente acção, acaba por sanar os eventuais vícios de compra e venda das unidades de participação (cfr. arts 268º, 269º e 288º do CC), é nula, nos termos do artigo 668º, nº1 al b) do CPC, ou quando assim não se entenda, anulável, com fundamento em erro de julgamento da matéria de facto e de direito.

X – Ainda que fosse mantida a douta sentença recorrida, o que apenas por mera hipótese se admite, ainda assim a condenação em custas padeceria de nulidade, atenta a violação do disposto no artigo 5º da Lei 7/2012, o que impõe a sua reforma.

Os recorridos contra-alegaram pugnando pela manutenção da decisão recorrida,

Foi proferido despacho que admitiu o recurso como apelação com subida imediata, nos autos e efeito devolutivo e que indeferiu a nulidade arguida, bem como a reforma da decisão quanto a custas.

As questões a decidir são:

I) Nulidade do despacho recorrido.

II) Inutilidade superveniente da lide.

III) Ampliação do pedido

III) Redução do valor da causa.

IV) Reforma da decisão quanto a custas.

FACTOS.

Os factos a atender são os que constam no relatório do presente acórdão.

ENQUADRAMENTO JURÍDICO.

I) Nulidade do despacho recorrido.

O apelante arguiu a nulidade do despacho recorrido por falta de fundamentação de facto e de direito e por omissão de pronúncia 

Estabelece o artigo 668º nº1 do CPC que a sentença é nula se não especificar os fundamentos de facto e de direito (alínea b)) e se o juiz não se pronunciar sobre questões que devesse apreciar (alínea d)), vícios estes cujo regime se aplica aos despachos, nos termos do artigo 666 nº3 do mesmo código.

Contudo, não se verificam as apontadas nulidades, pois o despacho recorrido pronunciou-se sobre todas as questões em apreço, não consignou factos provados por estarem em causa decisões processuais que não dependiam da prova de factos e expendeu fundamentação de direito sintética, mas suficiente para ser apreendida.

Improcedem, pois, as invocadas nulidades.

II) Inutilidade superveniente da lide.

Ao intentar a presente acção, o autor, ora apelante, pretendia obter uma decisão judicial que o colocasse na situação em que estaria se não tivesse subscrito 500 unidades de participação de um produto financeiro.

Para tal, pretendia o autor, por um lado, destruir os efeitos do negócio jurídico em causa, pedindo que mesmo fosse considerado ineficaz, ou, assim não se entendendo, fosse anulado, com a consequente restituição do preço pago.

Por outro lado, pretendia o autor ser ressarcido de prejuízos que invoca ter sofrido com a celebração deste negócio e que não teria sofrido se não o tivesse celebrado, computando-os, na petição inicial, em 80 000,00 euros.

Assim, para além de, claramente, se opor à manutenção do negócio jurídico celebrado e dos seus efeitos com o consequente pedido de restituição do preço que pagou, o autor reclama ainda uma indemnização fundada em responsabilidade civil decorrente não só da celebração do contrato em si, mas resultante também da relação de clientela que mantém com as rés apeladas no âmbito da qual o banco funcionou como intermediário financeiro, nos termos do artigo 293º do Código dos Valores Mobiliários (CMV) aprovado pelo DL 486/99 de 13/11, aplicável aos autos, prestando-lhe serviços de aconselhamento e execução de investimentos, tal como vêm definidos nos artigos 289º e seguintes do mesmo código.

Deste modo (e tendo em atenção a versão da petição inicial), a responsabilidade do banco resultaria quer das regras gerais relativas ao cumprimento e incumprimento das obrigações contidas no código civil, quer ainda do disposto no nº1 do artigo 304º-A, por força do qual “os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação dos deveres respeitantes à organização e ao exercício da sua actividade, que lhe sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública”, contendo, por seu lado, o artigo 304º do mesmo código os princípios e deveres impostos aos intermediários financeiros.

Estes diferentes pedidos contidos na petição inicial, independentemente de se considerar que foram formulados com maior ou menor clareza ou de se apurar se são ou não procedentes, apresentam-se, ao contrário do defendido pelos apelados, como perfeitamente inteligíveis.

Com o requerimento sobre o qual recaiu a decisão ora recorrida, o autor veio informar que se verificou uma alteração superveniente nos factos relevantes para a decisão da causa e que consiste no facto de entretanto ter pedido o resgate das unidades de participação em causa, em consequência do que lhe foi liquidada e devolvida parte da respectiva prestação.

Estabelece o artigo 287º alínea e) do CPC que a instância se extingue com a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide.

Os factos supervenientes alegados pelo autor (e aceites pelos réus) determinam a inutilidade da lide relativamente ao pedido de ineficácia do negócio jurídico ou da sua anulação, bem como da restituição da parte do preço entretanto devolvido com o resgate, como aliás já foi pacificamente considerado pelo despacho de que se recorre.

A questão coloca-se em relação ao pedido de indemnização, que a decisão recorrida entendeu estar abrangido pela inutilidade da lide, não se conformando o apelante com este entendimento.

Ora, como acima se expôs, o pedido de indemnização constitui um pedido distinto do pedido de destruição do negócio jurídico e dos seus efeitos e funda-se em responsabilidade civil prevista no CVM que ultrapassa a mera responsabilidade civil contratual, pelo que não pode considerar-se abrangido pela inutilidade superveniente da lide.

Nem poderá considerar-se, como fez a decisão recorrida, que o pedido de resgate equivale a uma aceitação pelo autor da conduta das apeladas no âmbito da relação de intermediação financeira, integrando uma ratificação do negócio prevista nos artigos 268º e 269º do CC (no caso de se tratar de um negócio ineficaz) ou uma confirmação do mesmo nos termos do artigo 288º do mesmo código (no caso de se tratar de um negócio anulável).

Na verdade, mesmo que se entenda que o pedido de resgate implica uma aceitação de que o negócio jurídico impugnado produziu efeitos e não é ineficaz ou inválido, parece evidente que o autor não se conforma com esses efeitos jurídicos e mantém o alegado no que diz respeito à conduta das rés que considera fundamento de responsabilidade civil no âmbito da actividade de intermediação financeira destas e ao abrigo dos artigos 304º e 304º-A do CVM.

Precisamente por não se conformar com os efeitos do negócio é que o autor pediu o resgate quando, contra a sua vontade, foi prorrogado o prazo do Fundo e, pela mesma razão, vem agora pedir o valor da diferença entre o que pagou e o que lhe foi restituído.

Conclui-se, assim, que se mantém a utilidade do pedido de indemnização, sem prejuízo de, oportunamente e em sede própria, ser apreciada a procedência ou improcedência deste pedido.

Procedem, portanto, as alegações do apelante, nesta parte, devendo a inutilidade da lide abranger apenas o pedido de ineficácia do negócio ou de anulação do mesmo e o pedido de restituição do preço e devendo a acção prosseguir para conhecimento do pedido de indemnização.  

III) Ampliação do pedido.

No mesmo requerimento em que informou que pediu o resgate das unidades de participação, o autor, ora apelante, veio requerer a ampliação do pedido, no valor de 8 882,80 euros, correspondente à diferença entre o montante de 500 000,00 euros que pagou com a celebração do negócio e a quantia de 491 117,20 euros que lhe foi restituída com o resgate.

O despacho recorrido não admitiu a ampliação do pedido com o fundamento de que esta nada tem que ver com o pedido inicial.

O artigo 273º nº2 do CPC estabelece que “o pedido pode também ser alterado ou ampliado na réplica; pode, além disso, o autor, em qualquer altura, reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em 1ª instância se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo”. 

Como ensina Alberto dos Reis em Comentário ao Código de Processo Civil, volume 3º, páginas 93 e segs, para além da limitação temporal, os limites legais para a ampliação do pedido são de quantidade (desenvolvimento do pedido) e de nexo (consequência do pedido), explicando este autor que “a ampliação pressupõe que, dentro da mesma causa de pedir, a pretensão primitiva se modifica para mais …”.

No presente caso, embora a ampliação do pedido resulte de um facto superveniente e, como tal, não está alegado na petição inicial – que é o resgate do investimento – é manifesto que cabe dentro da mesma causa de pedir, tendo em atenção que, de acordo com a versão da petição inicial, este pedido de 8 882,80 euros é a consequência da diferença entre o valor de 500 000,00 euros pago aquando da celebração do negócio e o valor da restituição do investimento, quando, ainda de acordo com a versão da petição inicial e causa de pedir aí apresentada, o autor não teria adquirido este produto se outro tivesse sido o comportamento das rés.

Sendo assim, o valor em discussão é um desenvolvimento do pedido primitivo, constituindo um prejuízo resultante da causa de pedir já apresentada. 

Aliás, rigorosamente, este valor estava contido no próprio pedido, uma vez que logo na petição inicial o autor reclamava a quantia de 500 000,00 euros a título de restituição do preço pago e agora continua a reclamar o valor do preço pago que não lhe foi restituído, já que entretanto só lhe foi devolvido o montante de 491 117,20 euros.

Procedem, também nesta parte, as alegações do apelante, devendo ser admitida a ampliação do pedido, pelo que, havendo inutilidade superveniente da lide relativamente ao pedido de restituição do preço, que foi liquidado em 491 117,20 euros, o pedido de indemnização abrange o pedido primitivo de 80 000,00 euros, agora ampliado com o pedido de 8 882,80 euros.  

IV) Redução do valor da causa.

Pretende também o apelante que seja considerada a redução do valor da acção, tendo em atenção a inutilidade superveniente parcial.

Os artigos 305º e 315º do CPC dispõem, respectivamente, que o valor da causa representa a utilidade económica do pedido e que compete ao juiz fixá-lo sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes, estatuindo o artigo 319º as consequências de se apurar que, da decisão do incidente do valor da causa, o tribunal singular é incompetente ou resulte ser outra a forma de processo correspondente à acção.

Estabelece, porém, o artigo 308º do CPC nº1 que “na determinação do valor da causa deve atender-se ao momento em que a acção é proposta, excepto quando haja reconvenção ou intervenção principal”, estabelecendo o seu nº 4 que “nos processos de liquidação ou noutros em que, analogamente, a utilidade económica do pedido só se define na sequência a acção, o valor inicialmente aceite será corrigido logo que o processo forneça os elementos necessários”.

Destas disposições legais se vê que, mesmo que, por decisão do juiz ou por via de incidente de fixação do valor, seja atribuído à causa um valor que não era o inicialmente o indicado, com as consequências previstas no artigo 319º, o momento relevante para a determinação do valor da causa é sempre o da data propositura da acção, com excepção dos casos em que foi deduzida reconvenção ou intervenção principal e nos casos em que a utilidade económica da causa só se define na sequência da acção.

No presente caso, a redução do valor da causa pretendida pelo apelante resultaria da operação de resgate, que é posterior ao momento da propositura da acção, razão pela qual, nos termos do artigo 308º do CPC, não pode ser atendida.

Improcedem, assim, as alegações, nesta parte, não havendo lugar à redução do valor da causa.

IV) Reforma da decisão quanto a custas.

Finalmente, alega o apelante que a decisão recorrida, ao fixar custas da sua responsabilidade, violou o disposto no artigo 5º nº1 da Lei 7/2012 de 13/2, cuja redacção é a seguinte: “Nos processos que tenham dado entrada no tribunal até à data da publicação da presente lei, ou que resultem da apresentação à distribuição de providências de injunção requeridas até à mesma data, e venham a terminar por extinção da instância em razão de desistência do pedido, desistência da instância, confissão do pedido ou transacção apresentadas até um ano após a data de entrada em vigor do presente diploma, há dispensa do pagamento das taxas de justiça e dos encargos devidos pela parte ou partes que praticaram o acto que conduziu à extinção a instância, não havendo lugar à restituição do que já houver sido pago a título de custas nem, salvo motivo justificado, à elaboração da respectiva conta”.

Esta disposição, que tem como objectivo o incentivo ao descongestionamento dos tribunais, não é aplicável ao caso vertente.

Isto porque, desde logo, a acção não terminou, uma vez que, como o próprio apelante defende, a inutilidade superveniente da lide é parcial.

Por outro lado, a extinção da instância parcial ocorre por facto superveniente, mas não por nenhuma das causas enumeradas no artigo acima transcrito, já que foi entendido pelo despacho recorrido não valorizar a “desistência da instância” formulada pelo autor contra a ré Fundo de Pensões do BES por esta nunca ter sido admitida como parte, nunca tendo sido chamada a intervir pelos meios próprios. 

Improcedem, pois, as alegações nesta parte, sem prejuízo da alteração da repartição de custas a operar como consequência do decidido no presente acórdão.

DECISÃO.

Pelo exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação e, consequentemente, se decide:

a) Revogar a decisão recorrida na parte em que julgou extinta a instância por inutilidade da lide quanto ao pedido de indemnização formulado pelo autor e determinar o prosseguimento dos autos para conhecimento deste pedido.

b) Revogar a decisão recorrida na parte em que não admitiu a ampliação do pedido e admitir a ampliação no valor de 8 882,80 euros (oito mil oitocentos e oitenta e dois euros e oitenta cêntimos).

c) Manter a decisão recorrida na parte restante.        

Custas em ambas as instâncias por ambas as partes na proporção de ¼ para o autor apelante e ¾ para as rés apeladas.

Lisboa, 3 de Outubro de 2013

Maria Teresa Pardal

Carlos Marinho  

Anabela Calafate