I-O Instituto da Segurança Social, no exercício das suas atribuições estatutárias de cobrança das prestações sociais, não goza de isenção de custas ao abrigo do artigo 4º, nº 1, alínea g), do Regulamento das Custas Processuais.
II-Com as alterações introduzidas no Regulamento das Custas Processuais pela Lei n.º7/2012, nos termos do artº 15º, nº 2, as partes dispensadas do pagamento prévio de taxa de justiça devem ser notificadas, conjuntamente com a decisão que decida a causa principal, para efetuar o pagamento dessa taxa no prazo de 10 dias, pagamento que agora é devido independentemente de condenação a final e do facto de a decisão ser susceptível de recurso.
III-Contudo, aos processos pendentes é aplicável a versão do Regulamento das Custas Processuais na redacção anterior à introduzida pela Lei nº 7/2012, se o dispensado não for condenado a final no pagamento das custas. Deve entender-se que o consagrado no nº 9, do artigo 8º desta lei vale apenas para as situações em que em processos pendentes o dispensado do pagamento prévio da taxa de justiça foi condenado a final no pagamento das custas, já não quando por elas não é responsável.
(sumário elaborado por Conceição Gonçalves)
I – Relatório
1. No processo comum com o n.º 826/09.0TDLSB, do 3.º Juízo Criminal de Lisboa, o Instituto da Segurança Social, IP, deduziu pedido de indemnização civil contra os arguidos, na qualidade de demandados, peticionando a sua condenação solidária a pagar-lhe a quantia de €87.789,79, a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, calculados de acordo com a legislação especial de que beneficia a Segurança Social (artigo 3.º, n.º1, do Decreto-Lei n.º 73/99, de 16 de Março), até integral pagamento.
Realizado o julgamento foi proferida sentença que julgou a acusação procedente por provada, condenando os arguidos pela prática do crime de abuso de confiança contra a segurança social imputado, tendo-se julgado, igualmente, procedente o pedido de indemnização civil (ainda que fixando-se os juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa civil supletiva legal, diferentemente do que tinha sido peticionado), com custas pelos demandados.
Posteriormente, foi o Instituto da Segurança Social, IP, notificado para nos termos do disposto no artigo 15.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais, proceder, no prazo de dez dias, à autoliquidação da taxa de justiça devida pelo pedido de indemnização civil formulado nos autos.
2. Tendo apresentado reclamação que foi indeferida, veio o Instituto da Segurança Social, IP, interpor recurso desse despacho, finalizando com as seguintes conclusões (transcrição):
“(...)”
3. O Ministério Público junto da 1.ª instância apresentou resposta, concluindo (transcrição das conclusões):
“(...)”
4. Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta apôs o seu visto.
5. Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.
II – Fundamentação
1. Constitui entendimento constante e pacífico que o âmbito dos recursos é definido pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, que delimitam as questões que o tribunal ad quem tem de apreciar, sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso (cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, 2.ª ed. 2000, p. 335; Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª ed., 2007, p. 103; entre muitos, os Acs. do S.T.J., de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242; de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271; de 28.04.1999, CJ/STJ, Ano VII, Tomo II, p. 196).
O recorrente questiona a notificação que lhe foi feita para proceder ao pagamento da taxa de justiça devida por dedução do pedido de indemnização civil, nos termos e para os efeitos do n.º 2 do artigo 15.º do Regulamento das Custas Processuais, na redacção da Lei n.º7/2012, de 13 de Fevereiro, discutindo-se:
- se o ISS, IP está isento de custas quando deduz pedido de indemnização em processo penal, relativo a crime de abuso de confiança contra a segurança social, com vista a receber as contribuições que lhe dão devidas e não lhe foram entregues;
- se, em caso negativo, o ISS, IP está legalmente obrigado a autoliquidar a taxa de justiça inicial pela dedução de pedido de indemnização civil quando, como é o caso, este é igual ou excede 20 UC;
- se tendo sido o pedido civil, deduzido em 10 de Agosto de 2010, julgado procedente com custas pelos demandados, havia lugar à notificação do ISS, IP, nos termos do n.º2 do artigo 15.º do Regulamento das Custas Processuais, na redacção da Lei n.º7/2012.
2. O despacho recorrido
O despacho recorrido tem o seguinte teor (transcrição):
«O INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP, demandante, notificado nos autos para proceder à autoliquidação da taxa de justiça devida pela dedução do pedido de indemnização civil, veio requerer seja dada sem efeito a obrigação de pagamento daquela taxa, por entender encontrar-se isento do pagamento de custas processuais à luz da alínea g) do artigo 4.º do Regulamento das Custas Processuais por se tratar de uma entidade pública e actuar exclusivamente no âmbito das suas funções para defesa de direitos fundamentais dos cidadãos.
Argumenta que, nos termos da Lei, o Instituto da Segurança Social é um instituto público integrado na Administração indirecta do Estado, dotado de autonomia administrativa e financeira e património próprio, com vista a prosseguir as atribuições do Ministério da Solidariedade e da Segurança Social, sob superintendência e tutela do respectivo Ministro; o artigo 97.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro, prescreve que as instituições de Segurança Social gozam das isenções reconhecidas por Lei ao Estado, devendo considerar-se que o demandante beneficia desta isenção; ao formular o pedido de indemnização civil no processo penal, relativamente a créditos da Segurança Social, o Instituto da Segurança Social actua no exclusivo âmbito das suas atribuições de defesa do direito fundamental dos cidadãos à Segurança Social, previsto no artigo 63.º, n.º 1, da Constituição da República; por outro lado, o pedido de indemnização civil deduzido foi considerado totalmente procedente, pelo que não há fundamento legal para proceder ao pagamento de qualquer taxa, nos termos e para os efeitos do artigo 15.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais; para além disso, em processo penal, o pedido civil - independentemente do respectivo valor ser igual ou superior a 20 UC e das excepções previstas no Regulamento das Custas Processuais e no artigo 14.º, n.º 3, da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de Abril - não está sujeito a autoliquidação ou a pagamento prévio de taxa de justiça.
O Sr. Funcionário Contador lavrou informação nos termos da qual justificou a notificação em causa com base no artigo 15.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais.
O Ministério Público, por seu turno, pronunciou-se no sentido de ser indeferida a promoção do demandante.
A esta posição se adere e por isso, com a devida vénia, passa a seguir-se de muito perto aquela douta promoção.
Na verdade, decidiu-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14 de Maio de 2013 (processo n.º 10317/05.2 TDLSB) a propósito da questão da autoliquidação da taxa de justiça:
“(…) O argumento histórico não tem razão de ser, sabido que o Regulamento das Custas Processuais quis impor uma grande reforma ao prescrito nos anteriores Código das Custas Judiciais, como se pode ler no seu preâmbulo: «Partindo do alerta, realizado pelos referidos estudos, para alguns problemas concretos na aplicação do Código das Custas Judiciais e para alguns aspectos disfuncionais do respectivo regime, partiu-se para uma reforma mais ampla, subordinada ao objectivo central de simplificação que se insere no plano do Governo de combate à complexidade dos processos e de redução do volume dos documentos e da rigidez das práticas administrativas, cujas linhas de orientação foram, fundamentalmente, as seguintes: a) Repartição mais justa e adequada dos custos da justiça; b) Moralização e racionalização do recurso aos tribunais, com o tratamento diferenciado dos litigantes em massa; c) Adopção de critérios de tributação mais claros e objectivos; d) Reavaliação do sistema de isenção de custas; e) Simplificação da estrutura jurídica do sistema de custas processuais e unificação da respectiva regulamentação; f) Redução do número de execuções por custas. No âmbito dos objectivos de uniformização e simplificação do sistema de custas processuais, a presente reforma procurou concentrar todas as regras quantitativas e de procedimento sobre custas devidas em qualquer processo, independentemente da natureza judicial, administrativa ou fiscal num só diploma - o novo Regulamento das Custas Processuais - mantendo algumas regras fundamentais, de carácter substantivo, nas leis de processo. Assim, as normas centrais relativas à responsabilidade pelo pagamento de custas podem encontrar-se no Código de Processo Civil e no Código de Processo Penal, os quais serão aplicáveis, a título subsidiário, aos processos administrativos e fiscais e aos processos contra-ordenacionais, respectivamente. Em contrapartida, para todos estes processos, os operadores judiciais poderão encontrar regras simples e uniformes no Regulamento das Custas Processuais, no que respeita à quantificação da taxa de justiça, ao modo de pagamento das custas ou processamento da correspectiva conta. (...) Esta reforma, mais do que aperfeiçoar o sistema vigente, pretende instituir todo um novo sistema de concepção e funcionamento das custas processuais.»”
Por outro lado, o pedido de indemnização civil deduzido em processo penal é tratado como uma verdadeira “acção cível ” paralela à “acção penal”, ganhando mesmo autonomia em certos casos de extinção precoce do procedimento criminal, justificando-se a tributação em custas calculadas com o critério da utilidade económica do pedido, como sucede no processo civil. Aliás, em matéria de custas processuais, o artigo 523.º determina que “à responsabilidade por custas relativas ao pedido de indemnização civil são aplicáveis as normas do processo civil”.
É aparente a contradição entre o disposto no artigo 8.º, por um lado, e o prescrito nos artigos 13.º e 15.º, por outro lado, do Regulamento das Custas Processuais. O artigo 8.º do Regulamento das Custas Processuais, refere-se expressamente à “Taxa de justiça em processo penal e contra-ordenacional”, não sendo lícito dele retirar a interpretação segundo a qual, por se omitir a referência à autoliquidação prévia da taxa de justiça, esta não tem cabimento no domínio do pedido de indemnização civil. Pelo contrário, esta resulta do disposto nos artigos 13.º e 15.º do Regulamento e da aplicação da Tabela própria, aludindo o artigo 8.º somente a certos casos eventualmente duvidosos em matéria de determinação do quantitativo de taxa de justiça a fixar.
Ou seja, a taxa de justiça relativa ao pedido de indemnização civil deduzido em processo penal decorre unicamente da aplicação da Tabela I-A anexa ao Regulamento das Custas Processuais.
Assim, uma leitura integrada do preceituado no n.º 1 do artigo 13.º do Regulamento das Custas Processuais permite concluir que é exigível o pagamento prévio da taxa de justiça nos termos ali determinados.
A circunstância de o demandante não ser, a final, condenado no pagamento de custas processuais civis, não o dispensa do pagamento da taxa de justiça, pois o n.º 2 do artigo 15.º do Regulamento das Custas Processuais é claro ao estabelecer que as partes “independentemente de condenação a final, devem ser notificadas”.
Por outro lado, de acordo com a Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro, que alterou o Regulamento das Custas Processuais aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, o regime jurídico dela emergente aplica-se a todos os processos, incluindo os pendentes (§6.º do Preâmbulo) e não apenas aos que deram entrada depois da sua entrada em vigor.
Adite-se, por fim, que a Jurisprudência tem unanimemente decidido que o Instituto da Segurança Social, na vigência do Regulamento das Custas Processuais, não beneficia de isenção de custas.
Assim, indefere-se ao requerido.
Notifique.»
3. O recorrente questiona a notificação para proceder ao pagamento da taxa de justiça devida pela dedução do pedido de indemnização civil, nos termos e para os efeitos do n.º 2 do artigo 15.º do Regulamento das Custas Processuais, na redacção da Lei n.º7/2012, de 13 de Fevereiro.
3.1. Alega o recorrente, em primeiro lugar, que beneficia da isenção do pagamento de custas prevista no artigo 4.º, n.º1, alínea g), do Regulamento das Custas Processuais, além de que goza, nos termos do artigo 97.º, n.º1, da Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro, das isenções reconhecidas por lei ao Estado.
Estabelece o artigo 4º, n.º 1, alínea g), do Regulamento das Custas Processuais, que estão isentas de custas as entidades públicas «quando actuem exclusivamente no âmbito das suas atribuições para defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos ou de interesses difusos que lhe estão especialmente conferidos pelo respetivo estatuto, e a quem a lei especialmente atribua legitimidade processual nestas matérias».
Não se questiona que o Instituto de Segurança Social é uma entidade pública, que o Decreto-Lei n.º 214/2007, de 29 de Maio define como um instituto público integrado na administração indirecta do Estado, dotado de autonomia administrativa e financeira e património próprio, com vista a prosseguir as atribuições do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, sob superintendência e tutela do respectivo ministro (artigo 1.º).
Tem, além de outras atribuições enunciadas no artigo 3.º do referido diploma, a de reclamar os créditos da segurança social em sede de processos de insolvência e de execução de índole fiscal, cível e laboral, bem como requerer, na qualidade de credor, a declaração de insolvência [alínea e)].
Duvidoso será, porém, que, ao formular um pedido de indemnização civil no processo penal, relativamente a créditos da segurança social, esteja o referido instituto a actuar em exclusivo «no âmbito das suas especiais atribuições para defesa de direitos fundamentais dos cidadãos ou de interesses difusos que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto».
É certo que a Constituição da República Portuguesa consagra, no seu artigo 63.º, n.º 1, o direito fundamental dos cidadãos à segurança social. Este diploma consagra, na sua Parte I, relativa aos direitos e deveres fundamentais, como uma categoria que nestes se integra, a dos direitos e deveres económicos, sociais e culturais (Título III dessa Parte) e é nestes que se integra, como direito social (Capítulo II desse Título III), o direito à segurança social.
Porém, ao deduzir pedido de indemnização civil em processo penal com vista a receber as quantias respeitantes a contribuições recebidas e não entregues, o instituto da Segurança Social actua no exercício das suas atribuições estatutárias sw cobrança das prestações sociais e não no âmbito das suas especiais atribuições “para defesa de direitos fundamentais dos cidadãos ou de interesses difusos”.
Não se trata de uma actuação, directa e imediata, de defesa de direitos fundamentais, mas antes da cobrança pelo Instituto de Segurança Social de contribuições que asseguram a prossecução dos seus objectivos, pelo que tal actuação não cabe na previsão do artigo 4.º, n.º 1, alínea g), do Regulamento das Custas Processuais
É o que se diz no acórdão da Relação do Porto, de 18 de Maio de 2011 (processo 4887/09.3TAVNG-A.P1, relatado por Joaquim Gomes, disponível em www.dgsi.pt, como todos os que sejam citados sem outra indicação):
«(…) quando o ISS está a formular um pedido de indemnização cível cuja causa de pedir é a prática de um crime de fraude ou de abuso de confiança em relação à segurança social [106.º e 107.º RGIT], o mesmo está essencialmente no exercício das suas atribuições estatutárias de cobrança das prestações sociais, impondo o cumprimento de um dever constitucional e legal de contribuição para a segurança social [3.º, al. b), c), x) do Dec.-Lei n.º 214/2007, de 29/Mai.].
Nesta conformidade e partindo do pressuposto de que o direito à segurança social é um direito fundamental, nunca está o ISS com a dedução deste pedido de indemnização cível a promover esse direito, mas antes a exigir o cumprimento do dever fundamental de pagamento de contribuições para a segurança social, não estando, por isso, a actuar “exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições para defesa de direitos fundamentais dos cidadãos”.»
Importa recordar que, entre nós, vigorou a regra da isenção de custas a favor do Estado. Assim o determinava, a propósito das isenções de natureza subjetiva, o artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do Código das Custas Judiciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de Novembro, tal como se previa no artigo 3.º, n.º 1, alínea a), do anterior regime de custas contido no Código das Custas Judiciais de 1962, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44329, de 8 de Maio de 1962.
O Código de Processo dos Tribunais Administrativos, aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de Fevereiro, aboliu essa isenção na jurisdição administrativa, instituindo no seu artigo 189.º, n.º 1, o princípio da sujeição do Estado e das demais entidades públicas ao pagamento de custas.
Por seu lado, o Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro, mediante alterações introduzidas no Código das Custas Judiciais, eliminou a isenção subjectiva de custas relativa ao Estado e seus organismos autónomos, às regiões autónomas, às autarquias locais e às associações e federações de municípios, estendendo aos processos de natureza cível o princípio geral de sujeição do Estado e das demais entidades públicas ao pagamento das custas judiciais, a exemplo do que resultava da lei quanto aos processos do foro administrativo.
Quer isto dizer que desde 1 de Janeiro de 2004, data em que entraram em vigor o referido Código de Processo dos Tribunais Administrativos (cfr. artigo 7.º da Lei n.º 4-A/2003, de 19 de Fevereiro) e a alteração do Código das Custas Judiciais por força do Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro, que o Estado passou a ficar sujeito ao pagamento de custas nos processos em que seja parte.
Assim, não pode dizer-se, como faz o recorrente, que o Instituto de Segurança Social estaria isento de custas ao abrigo do disposto no artigo 97.º, n.º 1, da Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro (Lei de Bases Gerais do Sistema de Segurança Social). É que este preceito apenas estatui que tal Instituto goza das isenções de custas do Estado previstas noutras leis e não tinha, por conseguinte, a virtualidade de alterar o que, a este respeito, decorria do referido Decreto-Lei n.º 324/2003.
Como se refere no acórdão da Relação do Porto, de 26 de Setembro de 2012 (processo 1764/10.9TAVNG-B.P1, relatado por Pedro Vaz Pato):
«Com a aprovação do Regulamento das Custas Processuais, aplicável à situação ora em apreço, foi intenção do legislador diminuir ainda mais o campo das isenções de custas subjectivas, pois, como se afirma na exposição de motivos respetiva, «procurou ainda proceder-se a uma drástica redução de isenções, identificando-se os vários casos de normas dispersas que atribuem o benefício da isenção de custas para, mediante uma rigorosa avaliação da necessidade de manutenção do mesmo, passar a regular-se de modo unificado todos os casos de isenção.»
Ora, considerar que o Instituto de Segurança Social, ao reclamar o pagamento de contribuições devidas à Segurança Social, exerce funções de defesa do direito fundamental dos cidadão à segurança social e goza, por isso, de isenção de custas ao abrigo do citado artigo 4º, nº 1, g), do Regulamento das Custas Processuais, é atribuir a este artigo uma interpretação tão ampla que não se compadece com o claro propósito legislativo de redução das isenções subjetivas de custas. Se assim se considerasse, em coerência, deveria também considerar-se que quase sempre as entidades públicas atuam, de forma mediata e indireta, em defesa de direitos fundamentais (à saúde, ao ensino, ao ambiente, etc.). E muitas entidades públicas (o Instituto de Segurança Social e outras) passariam a beneficiar, ao abrigo do disposto no citado artigo 4º, nº 1, g), de uma isenção de custas de que tinham deixado de beneficiar ao abrigo do anterior regime, depois da alteração operada pelo referido Decreto-Lei nº 324/2003, de 27 de Dezembro. E essa alteração não se compreenderia à luz do claro propósito do legislador de redução das isenções subjetivas de custas.
(…)
Deve considerar-se que não cabe na previsão do artigo 4º, nº 1, g), do Regulamento das Custas Processuais, porque não se trata de uma atuação, direta e imediata, de defesa de direitos fundamentais, a cobrança pelo Instituto de Segurança Social de contribuições que asseguram a prossecução dos seus objetivos.
Por outro lado, se a isenção de custas das instituições de segurança social decorresse do referido artigo 4.º, nº 1, g), seria desnecessária a isenção de custas do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, «nos processos em que intervenha na defesa dos direitos dos trabalhadores, dos contribuintes e do património do Fundo», que decorre da alínea p) do mesmo n.º 1 desse artigo 4.º (alínea q), depois da alteração efetuada pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro).
Dir-se-á, como faz o recorrente, que não se compreende, então, que não gozem de isenção de custas entidades públicas quando, nos termos da alínea f) do mesmo artigo 4º, dessa isenção gozam pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos, quando atuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respetivo estatuto. Pode acusar-se o legislador de alguma incoerência a este respeito, mas não há dúvida de que não foi seu propósito, contra o que já havia sido definido no anterior Decreto-Lei 324/2003, conferir às entidades públicas uma isenção de custas generalizada.»
Atente-se que o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social goza dessa isenção “nos processos em que intervenha na defesa dos trabalhadores, dos contribuintes e do património do Fundo” [cfr. art. 4.º, n.º 1, alínea p), do DL n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, que se mantém na redacção da Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro, agora na alínea q)], o que reforça a ideia de que o legislador soube especificar as exactas situações em que entendeu que aquele beneficio deveria ser mantido.
No sentido de o Instituto de Segurança Social, em situações como a presente, não gozar de isenção de custas, pronunciaram-se, além dos citados acórdãos da Relação do Porto, de 18 de Maio de 2011 e de 26 de Setembro de 2012, os seguintes acórdãos, entre outros: da Relação do Porto, de 28 de Setembro de 2011 (processo 1008/09.6TAPRD-A.P1, relatado por Airisa Caldinho), de 20 de Dezembro de 2011 (processo 339/10.7TASTS-A.P1, relatado por Lígia Figueiredo), de 6 de Junho de 2012 (processo 1316/09.6TASTS-A.P1, relatado por Maria Leonor Esteves), de 20 de Junho de 2012 (processo 1038/10.5TASTS-B.P1, relatado por Artur Oliveira) e de 21 de Novembro de 2012 (processo 1319/10.8TASTS-A.P1, relatado por Francisco Marcolino); da Relação de Coimbra, de 1 de Fevereiro de 2012 (processo 2297/10.9TACBR-A.C1, relatado por Alice Santos; da Relação de Lisboa, de 3 de Abril de 2013 (processo 2359/08.2TAVFX-A.L1-3, relatado por Jorge Langweg), de 7 de Maio de 2013 (processo 1838/11.9TDLSB.L1-5, relatado por Luís Gominho) e de 10 de Maio de 2013 (processo 10317/05.2 TDLSB-A.L1, relatado por Alda Casimiro, este não publicado).
No mesmo sentido também se pronuncia Salvador da Costa (Regulamento das custas processuais anotado, 5.ª edição, p. 161), ao dizer, em anotação ao mencionado artigo 4.º, n.º1, alínea g):
«Dado o elemento literal deste normativo e o seu fim, esta isenção não abrange o Instituto de Segurança Social, IP, relativamente a pedidos cíveis enxertados na acção penal com vista à realização de direitos de crédito da titularidade da segurança social».
Pelos motivos expostos, também nós entendemos que o recorrente não está isento de custas.
3.2. Alega o recorrente que nos casos de dedução de pedido de indemnização civil em processo criminal não há lugar à autoliquidação da taxa de justiça, sendo esta fixada pelo juiz e paga a final, pelo que, à luz do regime do Regulamento das Custas Processuais, na versão anterior às alterações introduzidas pela Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro, a parte vencedora – como é o seu caso -, por não ser condenada em custas, não tem de proceder, a final, à liquidação da taxa de justiça de cujo pagamento fora dispensada.
É sabido que uma parte significativa da jurisprudência tem sustentado, à luz do Regulamento das Custas Processuais, na redacção anterior à Lei n.º 7/2012, que a dedução de pedido cível no âmbito do processo penal não está sujeita ao prévio pagamento de taxa de justiça.
Segundo este entendimento, no âmbito do processo penal seria aplicável o artigo 8.º do Regulamento das Custas Processuais, que estabelece a regra geral do pagamento da taxa de justiça a final, com as únicas excepções dos n.º 1 e 2 (constituição de assistente e requerimento de abertura de instrução pelo assistente). As regras do processo civil só seriam supletivamente aplicáveis se estivéssemos perante matéria não especificamente regulada no processo penal, o que não se verifica.
Nesta perspectiva, argumenta-se que a formulação do pedido civil no processo penal não obedece aos requisitos mais exigentes previstos no Código de Processo Civil para a petição inicial; o acto processual que consiste na dedução do pedido cível não é uma acção autónoma, nem pode ser equiparado à petição inicial na acção cível e o sistema adoptado a nível da responsabilidade civil no processo penal foi o da «interdependência» e não o «sistema da identidade» ou o «sistema de absoluta independência». Argumenta-se, ainda, que no domínio do anterior Código das Custas Judiciais a dedução de pedido cível (e mesmo a contestação a tal pedido) em processo penal nunca esteve dependente do prévio pagamento de taxa de justiça (apesar de antes da entrada em vigor do Regulamento das Custas Processuais já no processo civil existir essa exigência quanto à petição inicial e quanto à contestação), sendo o cálculo das custas efectuado a final. Se o legislador pretendesse que no processo penal fosse auto-liquidada taxa de justiça, assim o teria dito expressamente no Código Processo Penal, uma vez que o mesmo tem normas próprias que regulamentam a prática de tais actos processuais, ou então teria consagrado norma expressa nesse sentido no próprio Regulamento das Custas Processuais.
Pronunciaram-se, neste sentido, os seguintes acórdãos, entre outros: da Relação do Porto, de 6 de Abril de 2011 (nos processos 4515/09.7TAMTS-B.P1, 1838/09.9TAVLG, ambos relatados por Maria do Carmo Silva Dias), de 18 de Maio de 2011 (processo 4887/09.3TAVNG-A.P1, relatado por Joaquim Gomes), de 28 de Setembro de 2011 (processo 1008/09.6TAPRD-A.P1, relatado por Airisa Caldinho), de 20 de Junho de 2012 (processo 1038/10.5TASTS-B.P1, relatado por Artur Oliveira), de 26 de Setembro de 2012 (processo 1764/10.9TAVNG-B.P1, relatado por Pedro Vaz Pato) e de 21 de Novembro de 2012 (processo 1319/10.8TASTS-A.P1, relatado por Francisco Marcolino); da Relação de Coimbra, de 1 de Fevereiro de 2012 (processo 2297/10.9TACBR-A.C1, relatado por Alice Santos) e de 10 de Outubro de 2012 (processo 146/10.7TACDN-A.C1, relatado por Isabel Valongo); da Relação de Guimarães, de 12 de Setembro de 2011 (processo 176/10.9TAGMR-A.G1, relatado por Maria Luísa Arantes); da Relação de Lisboa, de 3 de Abril de 2013 (processo 2359/08.2TAVFX-A.L1-3, relatado por Jorge Langweg) e de 7 de Maio de 2013 (processo 1838/11.9TDLSB.L1-5, relatado por Luís Gominho).
No acórdão desta Relação de Lisboa, de 3 de Abril de 2013, diz-se, até, que se alguma norma do Regulamento das Custas Processuais eliminasse o benefício da dispensa de pagamento prévio da taxa de justiça, em processo penal, a mesma sofreria do vício de inconstitucionalidade orgânica, por contrariar norma expressa da respectiva lei de autorização legislativa - Lei n.º 26/2007, de 23 de Julho.
Salvo melhor opinião, este último argumento não leva em conta a circunstância da matéria relativa a custas processuais não se incluir no domínio da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República. A apresentação de proposta de lei de autorização legislativa perante a Assembleia da República quebrou a tradição de regular a matéria das custas através de Decreto-Lei, por se entender (segundo justificou o Governo) que a matéria em causa (que incluía, note-se, alterações ao Código de Processo Penal) tinha implicações ao nível dos direitos, liberdades e garantias. Tratou-se, essencialmente, de uma iniciativa cautelar. Porém, certo é que a jurisprudência constitucional tem, reiterada e expressamente, atribuído a natureza de taxa à taxa de justiça, nunca tendo entendido que a matéria estivesse submetida à reserva parlamentar nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea i) da Constituição, reconhecendo-se que o legislador dispõe de uma larga margem de liberdade de conformação nessa matéria, naturalmente limitada por regras constitucionais como a da proporcionalidade ou a da tutela do direito de acesso à justiça (cfr. acórdãos n.º 412/89, 377/94, 379/94 e 382/94, publicados no Diário da República, 2.ª Série de, respectivamente,15 de Setembro de 1989, 7 de Setembro de 1994 e 8 de Setembro de 1994; acórdão n.º 349/2002, Diário da República, 2.ª série, de 15 de Novembro de 2002; acórdão n.º 151/2011, disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
É por isso que, afastada a inconstitucionalidade orgânica, as questões de constitucionalidade (material) que se têm colocado ao Tribunal Constitucional, a propósito do regime das custas, seja relativamente ao antigo Código das Custas Judiciais, seja em relação ao Regulamento das Custas Processuais, respeitam ao princípio da proporcionalidade, ao princípio da igualdade e ao direito de acesso à justiça e aos tribunais.
Outro sector da jurisprudência, diversamente, sustenta que face ao Regulamento das Custas Processuais, na redacção anterior à Lei n.º7/2012, sempre que o valor do pedido de indemnização cível deduzido em processo penal fosse igual ou superior a 20 UC [tendo em vista a alínea m) do artigo 4.º, n.º1, a que corresponde a actual alínea n)], era devido o pagamento prévio de taxa de justiça.
Segundo esta perspectiva, o facto de o pedido de indemnização civil deduzido em processo criminal estar subordinado ao princípio da adesão e ter regras próprias, mais simplificadas que as previstas no Código de Processo Civil, não obsta a que esse pedido de indemnização seja visto pelo legislador como uma verdadeira “acção”, susceptível de prosseguir ainda que se extinga a responsabilidade criminal, como nos casos de prescrição do procedimento criminal ou de amnistia. Salienta-se que o facto do Código de Processo Penal não prever a autoliquidação prévia da taxa de justiça não constitui um argumento efectivo, já que esse diploma, em sede de regulação adjectiva, remete para o Código de Processo Civil e para o Regulamento das Custas Processuais – cfr. o disposto nos artigos 510.º e 524.º -, estabelecendo o artigo 523.º, expressamente, que “à responsabilidade por custas relativas ao pedido de indemnização civil são aplicáveis as normas do processo civil”.
Também se realça que o Regulamento das Custas Processuais, na sua versão anterior à Lei n.º7/2012, não continha norma similar ao artigo 29.º, n.º3, alínea f), do Código das Custas Judiciais, que expressamente estabelecia não haver lugar ao pagamento prévio de taxa de justiça inicial nas acções cíveis processadas conjuntamente com a acção penal.
Lê-se no acórdão da Relação do Porto, de 10 de Dezembro de 2011 (processo 339/10.7TASTS-A.P1, relatado por Lígia Figueiredo):
«Na verdade e mais uma vez com todo o respeito pela posição contrária, afigura-se que o legislador expressando-se de forma clara consagrou os casos de dispensa de pagamento prévio de taxa de justiça no artº 15º do RCP. E diferentemente do que acontecia no artº 29º nº3 f) do CCJ não se encontram aí previstas as acções cíveis declarativas processadas conjuntamente com a acção penal.
E tanto assim é, que expressamente no artº 14º nº2 da Portaria nº419-A/2009 de 17 de Abril, aplicável nos autos, se excluem expressamente da penalização prevista no nº3 do artº 13º os pedidos cíveis deduzidos em processo penal, ao se dispor que «Os pedidos deduzidos em processo penal não são contabilizados nem agravados para efeitos da penalização do nº3 do artº 13º do RCP».
Para além de que no artº 22º do do RCP se prever no seu nº1 que “Os valores devidos a título de taxa de justiça, quando pagos previamente, são convertidos em pagamento antecipado de encargos, nos termos dos números seguintes.” estipulando-se na alínea m) do nº3 que é convertido metade do valor pago a título de taxa de justiça “Nos recursos que subam conjuntamente com a acção penal”.
Ora, os recursos de natureza não penal que sobem juntamente com a acção penal, são precisamente os recursos interpostos do pedido cível.
O legislador expressa o seu pensamento de forma clara e não teria de regulamentar sobre o pedido cível processado com a acção penal no que concerne ao processamento da taxa de justiça, se em algum momento fosse sua intenção que o tal pedido ficasse isento do pagamento prévio.
Por outro lado, não se afigura que se possa retirar um argumento contrário do artº 8º nº5 do RCP quando aí se prevêem os montantes de taxa de justiça a auto liquidar em processo penal e contra-ordenacional, e se estipula que “Nos restantes casos a taxa de justiça é paga a final, sendo fixada pelo juiz tendo em vista a complexidade da causa dentro dos limites fixados pela tabela III”.
Isto, porque uma coisa são os casos de isenção de dispensa de pagamento prévio que o legislador à semelhança da técnica legislativa utilizada no CCJ previu no artº 15º do RCP. Outra coisa é a fixação dos montantes devidos no auto liquidação bastando ler a tabela III para logo se retirar não se encontrar aí prevista qualquer referência ao pedido cível deduzido em processo penal. Na verdade no caso do pedido cível o montante da taxa de justiça devida é fixado de acordo com a tabela I conforme decorre do disposto no artº 6º nº1 do RCP onde se dispõe que “A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente regulamento aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela 1-A, que faz parte integrante do presente Regulamento”.»
Pronunciaram-se, neste sentido, os seguintes acórdãos, entre outros para além do já citado: acórdãos da Relação do Porto, de 2 de Novembro de 2011 (processo 1173/10.0GBMR.G1, relatado por Fernando Monterroso) e de 6 de Junho de 2012 (processo 1316/09.6TASTS-A.P1, relatado por Maria Leonor Esteves); acórdãos da Relação de Guimarães, de 22 de Fevereiro de 2011 (processo 104/10.1GAEPS-A.G1, relatado por Paulo Fernandes da Silva) e de 11 de Abril de 2011 (processo 1907/09.5PBGMR.G1, relatado por Filipe Melo, publicado na C.J., Ano XXXVI, tomo II, p. 307); acórdão da Relação de Lisboa, de 10 de Maio de 2013 (processo 10317/05.2 TDLSB-A.L1, relatado por Alda Casimiro, este não publicado).
Temos, assim, dois entendimentos diversos quanto à mencionada questão: saber se, face ao Regulamento das Custas Processuais, na redacção anterior à Lei n.º 7/2012, era devido o pagamento prévio de taxa de justiça no pedido civil, de valor igual ou superior a 20 UC, deduzido no processo penal.
Independentemente de aderirmos à posição enunciada em segundo lugar – que é a perfilhada por Salvador da Costa, ob. cit., p. 275 -, certo é que, a nosso ver, salvo melhor opinião, a discussão da questão, neste momento, mostra-se descabida.
O pedido de indemnização civil foi deduzido nos autos em 10 de Agosto de 2010 (cfr. fls. 328 e seguintes).
O demandante civil, ora recorrente, no momento da dedução do pedido civil, não procedeu à autoliquidação de qualquer taxa de justiça, o que não mereceu qualquer reparo, fosse de quem fosse.
O processo seguiu os seus trâmites, culminando com a prolação de sentença em 28 de Fevereiro de 2012, depositada em 27 de Março de 2012 (quando ainda não estava em vigor a Lei n.º7/2012), que transitou em julgado sem que alguma vez tenha sido suscitada a questão da falta daquele pagamento prévio da taxa de justiça.
O que é legítimo inferir dos autos é que o tribunal seguiu o entendimento de não haver lugar ao pagamento prévio de taxa de justiça nos pedidos civis deduzidos em processo penal, no que estava respaldado, como já se viu, num significativo e largo sector da jurisprudência.
Por conseguinte, afigura-se-nos não fazer sentido que no despacho recorrido, proferido em 23 de Setembro de 2013, quando há muito estava transitada em julgado a sentença, se venha a colocar a questão de saber se havia ou não lugar àquele pagamento prévio: o que se infere é que o tribunal, na altura própria, entendeu que não.
Aliás, o que o ISS, IP questiona é a notificação que lhe foi feita ao abrigo do artigo 15.º, n.º2, do Regulamento das Custas Processuais, na redacção da Lei n.º 7/2012, que pressupõe, precisamente, que o notificado esteja dispensado do pagamento prévio de taxa de justiça.
Em suma: temos como adquirido que nunca foi questionado nos autos, fosse por quem fosse, que o ora recorrente estava dispensado do pagamento prévio de taxa de justiça pela dedução do pedido de indemnização civil, não sendo, agora, oportuno colocar essa questão.
Assim, o que importa é saber se o disposto no artigo 15.º, n.º2, do Regulamento das Custas Processuais, na sua nova redacção, é aplicável ao recorrente.
É o que trataremos de seguida.
3.3. Estabelece o artigo 15.º do Regulamento das Custas Processuais, na redacção da Lei n.º 7/2007, de 13 de Fevereiro:
«Artigo 15.º
Dispensa de pagamento prévio
1 – Ficam dispensados do pagamento prévio da taxa de justiça:
a) O Estado, incluindo os seus serviços e organismos ainda que personalizados, as Regiões Autónomas e as autarquias locais, quando demandem ou sejam demandados nos tribunais administrativos ou tributários, salvo em matéria administrativa contratual e pré-contratual e relativas às relações laborais com os funcionários, agentes e trabalhadores do Estado;
b) (Revogada)
c) (Revogada)
d) O demandante e o arguido demandado, no pedido de indemnização civil apresentado em processo penal, quando o respetivo valor seja igual ou superior a 20 UC;
e) As partes nas ações sobre o estado das pessoas;
f) As partes nos processos de jurisdição de menores.
2 – As partes dispensadas do pagamento prévio de taxa de justiça, independentemente de condenação a final, devem ser notificadas, com a decisão que decida a causa principal, ainda que suscetível de recurso, para efetuar o seu pagamento no prazo de 10 dias.»
Deste artigo resulta que quando o pedido civil deduzido em processo penal seja de valor igual ou superior a 20 UC, os demandantes civis e os arguidos demandados gozam de dispensa do pagamento prévio de taxa de justiça. Nas situações em que o demandado não seja arguido – v.g. uma seguradora -, está obrigado a proceder à liquidação e pagamento da taxa de justiça devida, desde que conteste o pedido de indemnização civil e independentemente do valor do pedido ser inferior ou superior a 20 UC [cfr. artigo 4.º, n.º1, alínea n)].
Lê-se no Parecer n.º 40/2011, do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 113, de 12 de Junho de 2012, a propósito da dispensa do pagamento prévio de taxa de justiça antes da Lei n.º 7/2012:
«A dispensa do pagamento prévio não desonera o sujeito processual beneficiário da liquidação da taxa devida pela utilização e prestação do serviço judiciário, constituindo tão-somente um diferimento ou protelamento do pagamento. A taxa de justiça, enquanto contrapartida relativa ao custo do serviço judiciário prestado, há de ser exigível e paga oportunamente.
A questão é saber a quem deverá ser exigido a final o pagamento da taxa previamente dispensado. Ao sujeito processual que litigou com essa dispensa? À parte contrária?
(…)
Uma vez que a dispensa do pagamento prévio da taxa de justiça não se traduz em qualquer forma de isenção, mas antes num mero adiamento do momento em que a parte será obrigada a liquidá-la, não oferece dúvida alguma de que a parte que tenha litigado com esse benefício, caso tenha ficado vencida, total ou parcialmente, deverá proceder, no final da ação, após a elaboração da conta, ao pagamento da sua própria taxa, ou seja, daquela que deveria ter liquidado previamente.
Nesta situação, a taxa de justiça que a parte vencedora oportunamente pagou ser-lhe-á reembolsada pela parte vencida a título de custas de parte.
Vejamos agora a situação da parte que, tendo beneficiado da dispensa do pagamento da taxa de justiça, obteve vencimento na ação ou procedimento. Trata-se da situação que está contemplada no pedido de consulta.
Tendo presente a natureza da taxa de justiça, dir-se-á que a parte vencedora na causa, por ter usufruído da prestação de um serviço, deverá pagar a correspondente taxa, embora, como já se disse, lhe assista o direito à devolução, a título de custas de parte, dos valores pagos.
No entanto, à luz do regime jurídico das custas constante do Regulamento das Custas Processuais, na versão anterior às alterações introduzidas pela Lei n.º 7/2012, a parte vencedora, enquanto tal, não é condenada nas custas que abrangem, como se disse, a taxa de justiça. Assim, seria incongruente exigir-se à parte que venha a pagar taxa de justiça quando, por ter obtido vencimento na ação, está livre das custas já que estas ficaram a cargo da parte vencida.
Na situação exposta, e como já sucedia no regime anterior ao RCP, «sempre que (…) exista dispensa do pagamento prévio de taxa de justiça, caberá à parte vencida suportar, a final e na medida do seu decaimento, a totalidade da taxa de justiça do processo, ou seja, a sua taxa de justiça de parte e a taxa de justiça da parte contra quem litigou». A taxa de justiça que a parte vencedora deveria pagar passará a figurar na conta de custas para ser paga pela parte vencida.
Merece, pois, a nossa concordância o entendimento expresso no parecer da Auditora Jurídica, segundo o qual, “tendo a parte vencedora beneficiado da dispensa do pagamento prévio inexistem quantias por ela efetivamente pagas a título de taxa de justiça a reivindicar em sede de custas de parte e sendo o pagamento das custas imputado, na totalidade, à parte vencida, ficou determinada a responsabilidade pelo seu pagamento, não havendo que notificar a parte vencedora para efetuar o pagamento de quantias que, por decisão judicial transitada em julgado, não tem que suportar”.»(sublinhado a negrito da nossa responsabilidade)
Com as alterações introduzidas pela Lei n.º7/2012, temos agora, face ao citado artigo 15.º, n.º 2, que as partes dispensadas do pagamento prévio de taxa de justiça devem ser notificadas, conjuntamente com a decisão que decida a causa principal, para efetuar o pagamento dessa taxa no prazo de 10 dias. E, como resulta da disposição supra transcrita, este pagamento é agora devido independentemente de condenação a final e do facto de a decisão ser susceptível de recurso.
Retomando-se o referido Parecer:
«Desconhecemos as razões que determinaram esta alteração, sendo que a exposição de motivos da Proposta de Lei que esteve na base do diploma não as referenciam. Os debates parlamentares e os pareceres emitidos no decurso do procedimento legislativo também são omissos quanto a tais razões.
Admitimos, no entanto, que a solução legislativa tenha que ver com a necessidade de se garantir e obter, com um maior grau de eficácia, o pagamento das taxas de justiça devidas pela utilização da máquina judiciária.
No regime anterior à apontada alteração, podia suceder que o sujeito processual condenado nas custas, onde, como se disse, se deveriam incluir tanto a sua própria taxa de justiça, como a taxa relativa à outra parte (vencedora), que fora dispensada do seu pagamento prévio, não procedesse ao seu pagamento voluntário, havendo necessidade da sua cobrança coerciva, através do Ministério Público. Nesta situação poderia acontecer que não se conseguisse arrecadar qualquer importância por inexistência de bens penhoráveis do devedor/executado. O risco do não pagamento da taxa de justiça relativa à parte vencedora que fora dispensada do seu prévio pagamento, era assumido, em exclusivo, pela entidade pública credora das custas.
De certa forma, deparamo-nos com uma situação que apresenta alguma semelhança com a que se descreve no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 324/2003, a que já se aludiu, para justificar o abandono do sistema da restituição da taxa de justiça.
Também na situação agora em apreço pode suceder que não se consiga, no final do processo arrecadar «qualquer quantia a título de taxa de justiça, bastando, para esse efeito, que a parte vencida não proceda a qualquer pagamento no decurso da ação e que não possua bens penhoráveis. Ora, sendo certo que o processo existiu, correu os seus termos e teve um custo efetivo, tal significa que foi a comunidade, globalmente considerada, quem o suportou, em detrimento de quem motivou o recurso ao tribunal».
Não obstante a efetiva prestação do serviço público de justiça, sucede, nesta situação, que nem a parte que dele beneficiou o paga, nem o pagamento se consegue obter do sujeito processual vencido e, enquanto tal, condenado nas custas.
Agora, nos termos do n.º 2 do artigo 15.º do RCP, a parte dispensada do seu prévio pagamento, ainda que obtenha ganho de causa, passa a ter de liquidar a taxa de justiça que, nos termos legais, corresponda à ação, procedimento ou incidente, assim se manifestando, em toda a sua plenitude, a regra, já enunciada, da não gratuitidade da atividade judiciária, segundo a qual, «as custas correspondem às despesas ou encargos judiciais causados com a obtenção em juízo, seja qual for o processo, da declaração de um direito ou da verificação de determinada situação fáctica». Nesta perspetiva, compreende-se a revogação da alínea b) do citado artigo 15.º, relativa às partes que beneficiarem do apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento prévio da taxa de justiça. Neste caso, mantendo-se o apoio judiciário em tal modalidade, não faria sentido impor-se à parte beneficiária o pagamento da taxa, nos termos do n.º 2 do preceito, agora aditado.»
Já anteriormente, o oficio-circular n.º 39/2001, de 6 de Junho de 2011, da Direcção-Geral da Administração da Justiça, seguido pela generalidade dos Tribunais Tributários, indicava:
«Quando haja lugar ao pagamento da taxa de justiça pela Fazenda Pública ou qualquer entidade dispensada a que se refere a al. a) do art.º 15º do RCP, nos casos de vencimento da acção e no sentido de compatibilização do momento de pagamento da taxa com o prazo de exercício do direito de recebimento de custas de parte, deve a secretaria com a notificação da sentença, fazê-lo também para o pagamento da taxa devida enviando o respectivo Documento Único de Cobrança, para o efeito.»
Foi essa doutrina que o novo artigo 15.º, n.º2, consagrou para todos os casos de dispensa do prévio pagamento.
Sendo indiscutível que este novo regime é aplicável a todos os processos iniciados a partir de 29 de Março de 2012, data da entrada em vigor do Regulamento das Custas Processuais, na redação dada pela Lei n.º 7/2012, conforme prescreve o artigo 8.º, n.º 1, deste diploma, questiona-se a sua aplicação aos processos pendentes – como é o caso -, tendo em vista o n.º9, onde se dispõe:
«Nos processos em que, por virtude da legislação aplicável, houve lugar à dispensa do pagamento prévio da taxa de justiça, essa dispensa mantém-se, sendo o pagamento dos montantes que a parte teria de ter pago caso não estivesse dispensada devidos apenas a final, ainda que a aplicação da redacção que é dada ao Regulamento das Custas Processuais pela presente lei determinasse solução diferente.»
Não se ignora que o Supremo Tribunal Administrativo, na Secção do Contencioso Tributário, a propósito de situações de dispensa do prévio pagamento previstas no artigo 15.º, n.º1, alínea a), do Regulamento das Custas Processuais, tem vindo a entender, reiteradamente, que a referida regra do n.º2 do artigo 15.º aplica-se não só aos processos iniciados após a entrada em vigor da Lei n.º7/2012, como a todos os processos pendentes nessa data. Argumenta-se, em defesa desse entendimento, que o citado n.º9 do artigo 8.º da Lei não obsta a essa aplicação aos processos pendentes, pois apenas se destina a obviar a que aqueles que haviam beneficiado do diferimento do pagamento da taxa de justiça e que, por força do novo regime, deixaram de beneficiar, fossem compelidos, após a entrada em vigor desta Lei n.º7/2012, ao pagamento de imediato da taxa de justiça (neste sentido, entre vários, os acórdãos do S.T.A. de 17 de Outubro de 2012, processo 0759/12, relatado pelo Conselheiro Ascensão Lopes, e de 16 de Outubro de 2013, processo 01154/13, relatado pelo Conselheiro Pedro Delgado. Também no sentido da aplicação aos processos pendentes, Salvador da Costa, ob. cit., p. 39).
Em sentido diverso, decidiu esta Relação de Lisboa, em acórdão de 1 de Outubro de 2013 (processo 3289/04.2tdlsb-R.L1, relatado por Artur Vargues, que o relator do presente subscreveu como adjunto).
Estava em causa a notificação de um arguido/demandado civil, absolvido criminal e civilmente e, por isso, não condenado em custas, para efectuar o pagamento em 10 dias, ao abrigo do disposto no artigo 15.º, n.º2, do Regulamento das Custas Processuais, da quantia de 15.708,00 € a título de taxa de justiça de cujo pagamento prévio estava dispensado.
Diz-se nesse aresto:
«Em causa está, nos presentes autos de recurso, o pagamento de taxa de justiça alegadamente devida a final pelo arguido contra quem foi deduzido pedido de indemnização civil, apresentou contestação e que do mesmo veio a ser absolvido.
O pedido de indemnização, fundado na prática de crimes e que deduzido foi em processo penal, deu entrada nos Serviços do Ministério Público aos 9 de Novembro de 2010, ou seja, a instância cível teve início nesta data – cfr. artigo 267º, nº 1, do CPC, na versão então em vigor.
Estabelece-se no artigo 523º, do CPP, na redacção do Decreto-Lei nº 34/2008, entrado em vigor em 20/04/2009, que “à responsabilidade por custas relativas ao pedido de indemnização civil são aplicáveis as normas do processo civil” e, no artigo 524º, do mesmo Código, consigna-se que “é subsidiariamente aplicável o disposto no Regulamento das Custas Processuais”.
Por seu turno, consagrava-se no Código de Processo Civil, na versão então vigente:
“Artigo 446º
Regra geral em matéria de custas
1 – A decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condenará em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.
2 – Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
3 – No caso de condenação por obrigação solidária, a solidariedade estende-se às custas”.
E no artigo 447º;
“1 – As custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte.
2 – A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixado em função do valor e complexidade da causa, nos termos do Regulamento das Custas Processuais.
3 – São encargos do processo todas as despesas resultantes da condução do mesmo, requeridas pelas partes ou ordenadas pelo juiz da causa.
4 – As custas de parte compreendem o que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada em virtude da condenação da parte contrária, nos termos do Regulamento das Custas Processuais”.
Ainda neste Código cumpre atender ao nº 1, do artigo 477º-A, segundo o qual “a taxa de justiça é paga apenas pela parte que demande na qualidade de autor ou réu, exequente ou executado, requerente ou requerido, recorrente e recorrido, nos termos do disposto no Regulamento das Custas Processuais” e bem assim ao disposto no artigo 477º-D, que reza: “as custas da parte vencedora são suportadas pela parte vencida, na proporção do seu decaimento e nos termos previsto no Regulamento das Custas Processuais”.
Face à data de interposição do pedido de indemnização civil é aplicável ao caso o Regulamento das Custas Processuais e não o Código das Custas Judiciais, como primacialmente almeja o recorrente. A problemática está se será na sua versão originária ou na introduzida pela Lei nº 7/2012, de 13/02, que entrou em vigor em 29/03/2012, como entendeu o tribunal a quo.
Conforme estabelecido no artigo 8º, nº 1, da aludida Lei nº 7/2012, o regime por ela introduzido é aplicável a todos os processos iniciados após a sua entrada em vigor e, sem prejuízo do disposto nos números seguintes, aos processos pendentes nessa data.
Ora, na redacção anterior à introduzida por esta Lei, vigente à data da dedução do pedido de indemnização civil e também da contestação apresentada pelo recorrente – que o foi aos 29/02/2012 - consignava-se no artigo 15º, do Regulamento das Custas Processuais:
“Ficam dispensados do pagamento do pagamento prévio da taxa de justiça:
(…)
c) Os arguidos nos processos criminais (…)”.
Com a alteração introduzida pela Lei nº 7/2012, passou o mesmo normativo a conter a seguinte redacção:
“1 – Ficam dispensados do pagamento prévio da taxa de justiça:
(…)
d) O demandante e o arguido demandado, no pedido de indemnização civil apresentado em processo penal, quando o respectivo valor seja igual ou superior a 20 UC;
2 – As partes dispensadas do pagamento prévio de taxa de justiça, independentemente de condenação a final, devem ser notificadas, com a decisão que decida a causa principal, ainda que susceptível de recurso, para efectuar o seu pagamento no prazo de 10 dias”.
Só que, lê-se no nº 9, do mencionado artigo 8º, da Lei nº 7/2012, que: “nos processos em que, em virtude da legislação aplicável, houve lugar à dispensa do pagamento prévio da taxa de justiça, essa dispensa mantém-se, sendo o pagamento dos montantes que a parte teria de ter pago caso não estivesse dispensada devidos apenas a final, ainda que a aplicação da redacção que é dada ao Regulamento das Custas Processuais pela presente lei determinasse solução diferente”.
Este dispositivo aplica-se aos processos pendentes à data da entrada em vigor desta Lei – que ocorreu 45 dias após a data da sua publicação, conforme estabelecido no artigo 9º - e, em nosso entender, tem de ser interpretado com o sentido de o montante da taxa de justiça cujo pagamento se encontrava previamente dispensado será devido a final, caso o fosse efectivamente neste momento.
Explicando cabalmente.
Nos termos da alínea a), do nº 3, do artigo 26º, do Regulamento das Custas Processuais, na versão anterior à Lei nº 7/2012, conjugada com o estabelecido nos aludidos normativos do CPC relativos às regras gerais em matéria de custas, só a parte vencida é condenada, nos termos previstos no Código de Processo Civil, ao pagamento, a título de custas de parte, dos valores de taxa de justiça pagos pela parte vencedora.
Já a parte vencedora, posto que não é condenada em custas, não tem de proceder, a final, à liquidação da taxa de justiça de cujo pagamento estava dispensada.
E, na verdade, o recorrente/arguido/demandado não foi condenado em custas relativas ao pedido de indemnização civil contra si formulado, antes se pode ler no acórdão respectivo lavrado na 1ª instância que condenado foi “a Assistente/Demandante nas custas do pedido de indemnização civil”.
Assim, aplicável no caso em apreço é a versão do Regulamento das Custas Processuais na redacção anterior à introduzida pela Lei nº 7/2012, sendo que o consagrado no nº 9, do artigo 8º desta vale apenas para as situações em que em processos pendentes o dispensado do pagamento prévio da taxa de justiça foi condenado a final no pagamento das custas, já não quando por elas não é responsável, designadamente por ter sido absolvido do pedido de indemnização civil e a condenação nas custas é da parte vencida.
Outra interpretação seria manifestamente atentatória do princípio da segurança jurídica, na sua vertente material da confiança, pois no momento em que o recorrente se determinou a contestar o pedido de indemnização civil – em que se impetra o pagamento da quantia de 1.400.813,78 euros – não poderia prever o custo que teria que suportar a final sendo absolvido – in casu, no montante de 15.708,00 euros - por força da alteração súbita e imprevisível no modelo jurídico que disciplinava as consequências em matéria de tributação desse seu concreto acto processual, passando a consagrar-se o pagamento “independentemente de condenação a final” (conforme a nova redacção do nº 2, do artigo 15º) da taxa de justiça de que estava dispensado.
Nestes termos, não tinha o recorrente de ser notificado para o pagamento a final da quantia relativa à taxa de justiça de que previamente se encontrava dispensado, por não ser ela devida.»
Salvaguardado o respeito pela posição contrária que o S.T.A. tem sustentado, não vemos razões para alterar o entendimento explanado no citado acórdão de 1 de Outubro de 2013, que subscrevemos, com as necessárias adaptações ao caso em apreço (estamos agora perante um demandante civil e não um demandado).
Do que se conclui que, embora não se convindo na alegada isenção de custas do recorrente, ainda assim deve o mesmo ser exonerado do pagamento que lhe foi exigido.
III – Dispositivo
Nos termos e fundamentos expostos, acordam os Juízes da (5.ª) Secção Criminal desta Relação em conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo Instituto da Segurança Social, IP, revogando-se o despacho recorrido, que deverá ser substituído por outro a determinar que fique sem efeito a notificação do recorrente nos termos e efeitos do artigo 15.º, n.º2, do Regulamento das Custas Processuais, por não ser devido o pagamento da taxa de justiça que lhe foi exigida nessa notificação.
Custas do recurso, pelo decaimento parcial, a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.
Lisboa, 17 de Dezembro de 2013
(o presente acórdão, integrado por vinte e oito páginas com os versos em branco, foi elaborado e integralmente revisto pelo relator, seu primeiro signatário – artigo 94.º, n.º2, do C.P.P.)
Jorge Gonçalves
Carlos Espírito Santo