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DIVÓRCIO
ACORDO
OBRIGAÇÃO ALIMENTAR
HOMOLOGAÇÃO
INTERESSE DA CRIANÇA
DESPESA EXTRAORDINARIA
Sumário
1. Em caso de divórcio, os alimentos devidos aos filhos e a forma de os prestar são regulados por acordo dos pais, sujeito a homologação, a qual será recusada se o acordo não corresponder ao interesse do menor. 2. Não estando os pais de acordo sobre o sentido de uma das cláusulas do acordo, a sua interpretação deverá ter em conta o disposto nos arts. 236º a 239º do CC, nunca perdendo, porém, de vista o interesse dos menores e a salvaguarda do mesmo, tendo em conta a natureza do acordo em causa. 3. Despesa extraordinária é aquela que excede a despesa que é com um, para o comum das pessoas, no caso, dos pais de filhos menores. (Sumário da Relatora)
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
RELATÓRIO.
Carla deduziu contra António incidente de incumprimento da prestação de alimentos, pedindo que se condene o requerido a pagar à requerente a) € 1.700,00 devidos por prestações de alimentos aos menores relativas aos meses de Agosto de 2006, Março de 2007, Agosto de 2008, metade do mês de Agosto de 2010, Agosto de 2011, e Março a Junho de 2012; b) € 4.144,98 referente a metade do valor das despesas com saúde (médicas e medicamentosas) e escolares, devendo ordenar-se o desconto no vencimento do requerido das prestações vincendas, bem como das prestações em atraso, a remeter à requerente através de depósito ou transferência para a sua conta bancária.
A fundamentar o peticionado, alegou, em síntese:
Por acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais relativamente aos menores Estela e Tiago, filhos de ambos, homologado em 16.06.2005, ficou o requerido obrigado a contribuir mensalmente com a quantia de 100€ para cada um dos menores, quantia que deveria ser actualizada anualmente.
Mais ficou acordado que as despesas médicas e medicamentosas extraordinárias e as despesas escolares com material, livros e matrícula no início de cada ano, devidamente comprovadas, eram pagas em partes iguais por ambos os pais.
O requerido não tem liquidado a prestação de alimentos devida aos menores estando em dívida as relativas aos meses de Agosto de 2006, Março de 2007, Agosto de 2008, metade do mês de Agosto de 2010, Agosto de 2011, e Março a Junho de 2012.
O requerido recusa-se a pagar, na proporção de metade, despesas médicas, medicamentosas e escolares comprovadas que ascendem a € 8.289,97.
Notificado, o requerido alegou, em síntese, que reconhece, em parte, o incumprimento alegado, o qual será pago em prestações a partir de Setembro de 2012, conjuntamente com a pensão de alimentos no montante de € 225,00 mensais;
As despesas médicas, medicamentosas e escolares peticionadas, nunca foram apresentadas ao requerido para pagamento, nem nunca lhe foram pedidas.
Relativamente às despesas médicas e medicamentosas peticionadas, as mesmas não são devidas porquanto:
- As relativas a consultas e sessões de apoio psicopedagógico não revestem a natureza de despesas médicas, considerando-se incluídas no conceito de alimentos;
- As relativas às lentes para os óculos do filho, não são despesas extraordinárias, não foi o requerido consultado sobre a necessidade de incorrerem nestas despesas e a mesma está coberta pelo seguro de saúde que o requerido tem e que abrange os filhos;
- As relativas a medicamentos não revestem carácter excepcional;
- As médico dentárias, por não ter o requerido sido consultado sobre a sua necessidade e estarem as mesmas abrangidas pelo seguro de saúde;
O requerido efectuou o pagamento integral de despesas dentárias do menor Tiago no total de € 140,00, sem que tivesse peticionado à requerente qualquer valor, pelo que, caso o tribunal considere que o requerido é devedor de alguma quantia a título de despesas de saúde, este valor deve ser tido em conta para efeitos de compensação do pagamento.
Relativamente às despesas escolares peticionadas:
- Só são devidas as efectuadas no início de cada ano escolar, o que não acontece com algumas das peticionadas;
- Só são devidas as despesas escolares com material, livros e matrícula, pelo que todas as que sejam além destas estão englobadas na pensão de alimentos;
- Reconhece como devido o pagamento de metade das despesas dos documentos nºs 65, 70, 72 (parte).
Termina pedindo que o incidente seja desatendido.
Em resposta às alegações do requerido, veio a requerente dizer, para além do mais:
- A menor Estela sofre de trissomia 21, sofrendo de problemas nos ouvidos, oftalmológicos, cutâneos, nos joelhos, dentários, cardíacos e falta de ar;
- Embora se mostrem pagas pensões em atraso, continuam em atraso outras, num total de € 2.130,00;
- A requerente sempre informou o requerido da evolução dos filhos, dando-lhe a conhecer as consultas, cirurgias, etc., efectuadas e as despesas realizadas que, reiteradamente, pediu ao requerido verbalmente;
- O acordo de regulação das responsabilidades parentais foi feito na Conservatória com a minuta base que esta faculta, sendo que o acordo era no sentido de serem pagas metade de todas as despesas médicas e medicamentosas dos menores, ainda mais sabendo o requerido de todos os problemas de saúde que a menor padece.
Termina pedindo a condenação do requerido como litigante de má fé.
O requerido respondeu propugnando pela sua absolvição da litigância de má fé.
Realizada conferência, acordaram os pais em alterar a cláusula XII do acordo sobre as responsabilidades parentais [1], bem como acordaram no pagamento das pensões em dívida, que fixaram em € 1.130,00, em prestações mensais de € 75, acordo que foi homologado, tendo-se ordenado a notificação das partes para indicarem o valor que entendiam estar em dívida a título de comparticipação pelo requerido em despesas medicamentosas e de saúde.
Na sequência da referida notificação, o requerido manteve nada dever, a requerente rectificou, em parte, o requerimento inicial, concluindo ascenderem as despesas a € 8.255,78, estando em dívida o montante de € 4.127,89.
Dada vista ao MP, pronunciou-se no sentido de ser indeferido o requerido pela requerente.
Foi proferida sentença que julgou “não verificado o incumprimento pelo requerido na parte respeitante a despesas médicas e medicamentosas”.
Não se conformando com a decisão, apelou a Requerente, tendo no final das respectivas alegações formulado as seguintes conclusões, que se reproduzem:
(QUANTO AO PONTO I – DA MATÉRIA DE FACTO QUE NÃO FOI CONSIDERADA )
• Que o Tribunal a quo não teve em consideração o facto da menor ser portadora de Trissonomia 21.
• Não verificou ainda, despesa a despesa, aquela que era considerada extraordinária, ou não, nem porquê, limitando-se a considerar que tais despesas não eram devidas, fazendo um juízo genérico pela (palavras nossas) injustiça da decisão!
• Quanto às despesas escolares o Tribunal a quo “esquece-se” totalmente destas, não se pronunciando, como deveria, quanto às mesmas!
(QUANTO AO PONTO II - VIOLAÇÃO DOS ARTS. 1409º e seguintes do CPC)
• Porque se trata de um processo de jurisdição voluntária, não está sujeito a critérios de decisão fundados na legalidade estrita, podendo adoptar em cada caso, a decisão e/ou solução que lhe pareça mais justa, mais conveniente e oportuna, devendo prosseguir na busca da verdade com vista à satisfação do interesse da criança, o que não foi feito pelo Tribunal a quo.
• Assim sendo, mais justa seria a comparticipação do pai nestas despesas que foram única e exclusivamente feitas no interesse dos filhos menores, especialmente da filha portadora de Trissonomia 21, com vista a tentar que esta adquira capacidades quer locomotoras, quer cognitivas...
• Ou seja, no interesse superior da menor!
Termina pedindo que a sentença recorrida seja revogada e substituída por outra na qual se condene o apelado ao pagamento da quantia de 4.144,98 €, referente a metade do valor das despesas com saúde (médicas e medicamentosas extraordinárias) e escolares.
O requerido contra-alegou, propugnando pela manutenção da decisão recorrida.
QUESTÕES A DECIDIR.
Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões da recorrente (art. 684º, n.º 3 e 690º, n.º 1 do CPC) a única questão a apreciar é a do mérito do peticionado, tendo em conta matéria de facto não correctamente considerada pelo tribunal recorrido.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
O tribunal recorrido não elencou os factos que considerava provados.
Nos termos do disposto nos arts. 607º, nº 3 e 663º, nº 2 do CPC, têm-se por relevantes os seguintes factos:
1. Do acordo de regulação do exercício do poder paternal celebrado entre requerente e requerido relativo aos filhos Estela, registada em 1999, e Tiago, registado em 2002, homologado por decisão de ….06.2005, constam, para além de outras, as seguintes cláusulas:
“X- O Pai pagará a título de alimentos para os menores a quantia mensal de €200,00 (…), sendo €100,00 (…) para cada um dos menores, …
XI- A quantia referida no número anterior será actualizada anualmente, segundo o índice de inflação publicado pelo INE.
XII – As despesas médicas e medicamentosas extraordinárias e as despesas escolares com material, livros e matrícula no início de cada ano, devidamente comprovadas, serão pagas em partes iguais por ambos os pais” (fls. 124 a 128).
2. Nos anos de 2009 a 2012, a requerente suportou com os filhos as seguintes despesas:
- consultas de apoio psicopedagógico da menor Estela – €135 + €67.50 (doc. 1), €101,25 + €135 (doc. 2 ), €135 + €303,75 + €33,75 (doc. 3), €64 + €224 (doc. 4), €67,50 (doc. 9), € 236,25 + 101,25 (doc. 10), €67,50 (doc. 11), €101,25 (doc. 12), €67,50 + €135 (doc. 13), €168,75 (doc. 14), €357,73 (doc. 15), €101,25 + €236,25 (doc. 16), €135 + €101,25 (doc. 17), €67,50 + €101,25 (doc. 18), €168,75 (doc. 20), €135 + €67,50 (doc. 21), e 168,75 (doc. 22), num total de € 3.784,48 (fls. 11 a 14, 20, 21, 25 a 30, 43, 44, 46 a 48, que aqui se têm por integralmente reproduzidas);
- consultas de pediatria de ambos os filhos – € 70 (doc. 1), €70 (doc. 5), €70 (doc. 14), e €70 + €70 (doc. 19), num total de € 350 (fls. 11, 15, 28 e 45, que aqui se têm por integralmente reproduzidas);
- sessões de terapia da fala da menor Estela – €105 + € 175 (doc. 6), € 70 + € 140 (doc. 7), €140 (doc. 8), €67,50 (doc. 9), €33,75 (doc. 11), €67,50 + €101,25 (doc. 12), €32 (doc. 15), num total de €932 (fls.16 a 20, 25, 26 e 29, que aqui se têm por integralmente reproduzidas);
- com lentes para os óculos do filho Tiago – €80 (doc. 23), e €72 (doc. 24) num total de € 152 (fls. 49, 50 e 66, que aqui se têm por integralmente reproduzidas);
- com medicamentos - € 28,35 (doc. 25), €9,04 (doc. 26), €18,67 + € 100,35 (doc. 27 [2]), €1,33 + 37,47 (doc. 28 [3]), €31,74 (doc. 29), €24,35 (doc. 30 [4]), €17,53 + €64,59 (doc. 31), €23,25 + €4,14 (doc. 32), €6,24 + €96,74 (doc. 33), €17,46 (doc. 34), €15,89 + €27,87 + €1,99 (doc. 35), €10,77 + €0,85 (doc. 36), €2,50 + €34,33 (doc. 37), e €5,46 + €26,06, num total de €606,97 (fls. 67 a 73, 54 a 60, que aqui se têm por integralmente reproduzidas);
- despesas médico-dentárias de ambos os filhos - €26 (doc. 39), €34 (doc. 40), €50 (doc. 41), €50 (doc. 42) [5], €21 (doc. 44), €40 (doc. 45), €10 (doc. 46), €5 (doc. 47), €50 (doc. 48), €5 (doc. 49), €50 (doc. 50), €50 (doc. 52), €277 (doc. 53) [6], €5 (doc. 54), €5 (doc. 55), €5 (doc. 56), €5 (doc. 57), €15 (doc. 58), €15 (doc. 59), e €5 (doc. 60), num total de €723,00 (respectivamente, fls. 61 a 63, 103, 105 a 111, 113 a 118 e 87 a 89, que aqui se têm por integralmente reproduzidas);
- despesas escolares de ambos os filhos - €8,50 (doc. 61), €299,44 (doc. 62), €21,26 (doc. 63), €9,05 (doc. 64), €6,21 (doc. 65, €129,78 (doc. 66), €63,66 (doc. 67), €11,20 (doc. 68), €252,43 (doc. 69), €56,59 + €11,65 (doc.70), €47,94 (doc. 71), €49,98 + €6 (doc. 72), e €8,57 + €25,43 (doc. 73), num total de €1.007,69 (respectivamente, fls. 90 a 99, e 77 a 79, que aqui se têm por integralmente reproduzidas).
- despesas ortopédicas com a menor Estela - €65 (doc. 74 a fls. 80 e 81).
3. Desde 1.10.2009 que o requerido e os filhos, são beneficiários do seguro de saúde M, do qual é tomadora a entidade patronal do requerido, com as condições gerais, especiais e particulares constantes de fls. 136 a 159, alteradas a partir de 1.10.2011, conforme fls. 133 a 135, documentos que aqui se têm por integralmente reproduzidos.
4. A filha Estela sofre de trissomia 21 (por acordo).
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
Como decorre das conclusões de recurso (e se confirma da leitura das alegações), propugna a apelante pela revogação da sentença recorrida e sua substituição por outra que condene o apelado como requerido, por incumprimento das responsabilidades parentais, sustentando que a sentença recorrida não julgou conforme a equidade, como o tipo de processo em causa impõe, não ponderou toda a factualidade constante dos autos, e não se pronunciou sobre um dos pedidos.
Começar-se-á por dizer que assiste, em parte, razão à apelante.
Efectivamente, o tribunal recorrido não analisou, como devia, cada uma das despesas apresentadas pela requerente, limitando-se a uma apreciação genérica da questão, e nem sequer se pronunciou sobre as despesas escolares cujo pagamento (proporcional) foi, também, peticionado, fazendo tábua rasa do alegado, nesta matéria, pelo requerido que reconheceu dever metade do valor de 3 dos documentos apresentados.
Vejamos, então.
Aos pais compete prover pelo sustento dos filhos, velar pela segurança e saúde destes (art. 1878º, nº 1 do CC).
Por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao seu sustento, habitação, vestuário, e, sendo menores, instrução e educação (art. 2003º do CC).
Em caso de divórcio, os alimentos devidos aos filhos e a forma de os prestar são regulados por acordo dos pais, sujeito a homologação, a qual será recusada se o acordo não corresponder ao interesse do menor (art. 1905º do CC).
Os alimentos devem ser proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los (art. 2004º, nº 1 do CC).
In casu, requerente e requerido acordaram na forma deste prestar alimentos aos filhos na sequência do divórcio daqueles, estabelecendo um valor mensal da pensão alimentícia (€100 para cada filho), bem como a obrigação de pagar metade das despesas de saúde e escolares dos filhos.
E é quanto a esta última obrigação, e ao seu eventual incumprimento, que as divergências surgiram.
Acordaram os pais que “as despesas médicas e medicamentosas extraordinárias e as despesas escolares com material, livros e matrícula no início de cada ano, devidamente comprovadas, serão pagas em partes iguais por ambos os pais”.
Quanto às despesas médicas e medicamentosas, sustenta a apelante que o que estava em causa quando foi feito o acordo eram todas as despesas médicas e medicamentosas, só assim tendo concordado em estabelecer um montante tão baixo da pensão de alimentos, tendo em vista o distúrbio genético de que a filha padece e todos os problemas associados ao mesmo.
Sustenta o apelante que o que se estipulou foi a comparticipação nas despesas médicas e medicamentosas extraordinárias, que serão aquelas “que assumem um carácter excepcional, imprevisto, invulgar, fora do comum”.
Em causa está a interpretação da referida cláusula “negocial”, que deverá ter em conta o disposto nos arts. 236º a 239º do CC, mas nunca perdendo de vista o interesse dos menores e a salvaguarda do mesmo, tendo em conta a natureza do acordo em causa.
Assim sendo, afigura-se-nos que, efectivamente, não se poderá entender, como pretende a apelante, que na referida cláusula se visou integrar toda e qualquer despesa médica e medicamentosa, uma vez que tal pretensão vai contra os termos da mesma.
Mas também se nos afigura que não se pode entender que aí apenas se quis integrar as despesas médicas e medicamentosas que “assumam um carácter excepcional, imprevisto, invulgar, fora do comum”.
Por um lado, porque despesa extraordinária é aquela que excede a despesa que é comum, para o comum das pessoas, por outro, porque era do conhecimento de ambos os progenitores o distúrbio genético de que a menor Estela padecia e os cuidados “especiais” que tal implicava [7], em termos, nomeadamente, de despesas extras.
É despesa comum dos pais com os menores aquela que é tendencialmente igual para a generalidade dos menores.
Assim:
É despesa médica comum a despesa com o pediatra [8], algumas eventuais consultas no dentista, ou no oftalmologista.
Assim sendo, afigura-se-nos que as quantias peticionadas dispendidas com o pediatra (documentos 1, 5, 14 e 19, num total de € 350) não se poderão enquadrar na cláusula em questão.
Já assumirá natureza de despesa extraordinária (que excede a comum) a relativa a consultas da especialidade, quando a situação concreta do menor obrigue a um acompanhamento especial, e que ultrapassa o acompanhamento médico normal dos menores.
Salvo o devido respeito por opinião contrária, o distúrbio genético de que padece a menor Estela (trissomia 21) obriga a despesas médicas (ou equiparáveis) que não são as comuns da generalidade dos menores, ao contrário do que entendeu o tribunal recorrido, e que são essenciais para a saúde e desenvolvimento físico, educacional e social salutar da menor, assumindo, em consequência, a natureza de despesas extraordinárias.
Nessas despesas médicas extraordinárias enquadram-se, por equiparáveis [9], as despesas com a terapia da fala [10] - documentos 6, 7, 8, 9, 11, 12 e 15, num total de €932 - [11], bem como as despesas com as sessões de apoio psicopedagógico [12] - documentos 1, 2, 3,4, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 20, 21 e 22, num total de € 3.784,48.
Também a despesa com a colocação de aparelhos ortodônticos não é uma despesa normal – nem todos os menores necessitam de corrigir a dentição.
Necessitando, está em causa uma despesa médica que excede a despesa normal, e que, como tal, reveste natureza extraordinária.
Assim, afigura-se-nos inquestionável que se integram nas despesas médicas extraordinárias as relativas à colocação e acompanhamento dos aparelhos ortodônticos (docs. 39 a 42, 44 a 50, 52 a 60, num total de € 723).
Alegou o requerido que não deu a sua autorização para tal despesa, pelo que não estaria obrigado a comparticipar na mesma.
Contudo, também alegou que acompanhou o menor Tiago em consulta, pagou o respectivo custo, juntando documento comprovativo, e pediu, ainda, a respectiva compensação (arts. 66º e 67º), pelo que nenhum sentido tem dizer que não deu o seu consentimento à despesa em causa.
Alegou, também, que os menores beneficiam de seguro de saúde e que se a requerente não o utilizou foi porque não quis, não podendo, agora, pretender que o requerido pague.
Também aqui carece de razão porquanto da simples análise dos documentos juntos pela requerente se constata que o seguro (M…) foi utilizado, tendo havido comparticipação nos termos contratados, que, ao contrário do alegado, não cobre integralmente as despesas, como resulta das condições gerais e especiais juntas aos autos pelo requerido.
Nenhuma razão existe, pois, para que o requerido não pague metade das despesas médico-dentárias efectuadas.
É despesa medicamentosa comum a que é realizada com a aquisição de medicamentos e afins usualmente utilizados na infância e na adolescência, tais como xaropes, pomadas, vacinas, comprimidos, cremes, etc.
Percorrendo as facturas da farmácia que a requerente juntou aos autos, não se encontra qualquer despesa que revista natureza extraordinária, havendo uma maior incidência na aquisição de pomadas ou soluções oftalmológicas, e anti-inflamatórias para a menor Estela, e de anti-alérgicos para o menor Tiago, mas que não ultrapassam o comum das despesas nas idades em causa, pelo que não podem ser enquadradas na cláusula em questão.
Embora se pudesse entender que a despesa com a vacina Prevenar 13 (doc. 33, em nome da Estela, e doc. 27, em nome do Tiago) consubstancia uma despesa extraordinária, por estar fora do plano de vacinação e importar um custo elevado, no caso temos dúvidas que as mesmas se tenham destinado aos menores, atentas as datas das facturas (2010 e 2009, respectivamente) e as idades dos menores naquelas datas (respectivamente 10/11 e 6/7 anos), sendo certo que em causa está uma vacina (contra a infecção comum por streptococcus pneumoniae) administrada entre os 2 meses e os 5 anos, de acordo com o simposium terapêutico do site do infarmed.
Em conclusão, as despesas documentadas de fls. 54 a 60 e 67 a 73 não revestem natureza extraordinária, pelo que não se enquadram na cláusula em questão.
Dentro das despesas medicamentosas extraordinárias enquadra-se, porém, a relativa às palmilhas adquiridas para a menor Estela (doc. 74, fls. 80 e 81), quer por as mesmas terem propriedades medicinais, de correcção, tendo sido receitadas por ortopedista, quer porque não constitui uma despesa normal e característica de todas as crianças com idades iguais à da menor, ao contrário do entendido pelo tribunal recorrido.
E que dizer das lentes para os óculos do menor Tiago ?
Mais uma vez se nos afigura que as despesas em causa se integram nas despesas medicamentosas extraordinárias.
Contudo, conforme resulta das condições especiais do seguro juntas aos autos, as despesas em causa eram susceptíveis de beneficiar de comparticipação daquele.
Não tendo a requerente optado por essa via, ainda que a comparticipação fosse parcial, afigura-se-nos que não pode vir reclamar o pagamento da despesa efectuada do requerido.
Resta analisar se o requerido está obrigado a pagar metade das despesas escolares efectuadas pela requerente com os menores.
Nesta matéria estabelecia a cláusula XII do acordo que “… as despesas escolares com material, livros e matrícula no início de cada ano, devidamente comprovadas, serão pagas em partes iguais por ambos os pais”.
Em primeiro lugar só ficou acordado o pagamento em partes iguais pelos pais das despesas com material escolar, livros e matrícula no inicio de cada ano.
Outras despesas, ainda que escolares, não se mostram abrangidas.
Estão nesta situação as despesas documentadas a fls. 78 (€6 como donativo para fins escolares), 91, 95, 96 e 98 (declaração da Câmara Municipal de … declarando ter recebido pagamentos relativos ao “utente” Tiago e Estela, desconhecendo-se a natureza dos serviços prestados).
Relativamente às despesas documentadas a fls. 90 e 97, terão de ser desconsideradas uma vez que as quantias pagas respeitam a “refeições e material escolar”, sem que se discriminem os respectivos valores.
Quanto às restantes despesas documentadas com material escolar e livros apenas poderão ser consideradas as documentadas a fls. 77 (€47,94), 78 (€49,98), 79 (€8,57 + €25,43), 92 (€21,26), 94 (€6,21) e 99 (€56,59), num total de €215,98.
As restantes documentadas a fls. 78 (€44,02), 93 e 99 (€11,65), não poderão ser consideradas porquanto as facturas foram emitidas sem nome, desconhecendo-se se respeitam a livros ou material escolar adquiridos para os menores.
Em conclusão, as despesas médicas e medicamentosas extraordinárias com terapia da fala (no total de € 932), sessões de psicopedagogia (no total de € 3.784,48), médico-dentárias (no total de € 723) e palmilhas ortopédicas (€65), bem como as despesas escolares supra referidas (no total de €215,98), enquadram-se na cláusula XII do acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais celebrado entre requerente e requerido relativamente aos seus filhos menores Estela e Tiago, pelo que estava o requerido obrigado a pagar metade das referidas despesas no montante de €2.860,23 (€5.720,46:2), e não o tendo feito incumpriu o acordado.
Procede, pois, parcialmente a apelação, devendo a sentença ser revogada e substituída por outra que condene o apelado a pagar à apelante a quantia referida.
DECISÃO.
Pelo exposto, acorda-se em conceder parcial provimento ao recurso, julgando-se verificado o incumprimento pelo requerido, na parte respeitante a despesas médicas, medicamentosas extraordinárias e escolares, cujo valor, a cargo deste, se fixa em € 2.860,23 (dois mil, oitocentos e sessenta euros e vinte e três cêntimos).
Custas da apelação e da acção pela apelante e apelado, em partes iguais.
*
Lisboa, 2014.05.06
Cristina Coelho
Roque Nogueira
Pimentel Marcos
[1] Que passou a ter a seguinte redacção: XII – Ponto nº 1º - As despesas de saúde (incluindo apoio psico-pedagógico e terapia da fala) e medicamentosas, devidamente comprovadas por técnico, serão suportadas por ambos os progenitores na proporção de metade na parte não comparticipada pelos seguros de saúde ou pelo serviço nacional de saúde. Ponto nº 2º - As despesas escolares com material, livros e matrícula no início de cada ano, devidamente comprovadas, serão pagas em partes iguais por ambos os pais. Ponto nº 3ª – A mãe obriga-se a socorrer-se de consultas e a adquirir medicamentos que estejam abrangidos pelos seguros de saúde ou pelo sistema nacional de saúde”. [2] Ver rectificação a fls. 232. [3] Ver rectificação a fls. 232. [4] Ver fls. 232. [5] Os pagamentos comprovados pelos documentos 41 e 42 respeitam à amortização parcial do valor de €247,00 que ficou em dívida na factura nº 12011-00030 (doc. 43), como se pode comprovar dos respectivos teores, pelo que o valor deste último documento não pode ser considerado, sob pena de duplicação de valores pagos, e, no restante, por não ter sido junto documento comprovativo do pagamento. [6] Os pagamentos comprovados pelos documentos 52 e 53 respeitam à amortização total do valor de €327,00 que ficou em dívida na factura nº 12011-00108 (doc. 51), como se pode comprovar dos respectivos teores, pelo que o valor deste último documento não pode ser considerado, sob pena de duplicação de valores pagos. [7] À data do acordo a menor teria à volta dos 6 anos de idade. [8] Com consultas muitos regulares nos primeiros anos de vida, espaçando-se com o tempo. [9] E porque têm em vista o tratamento das limitações/debilidades da menor resultantes do distúrbio genético de que padece. [10] O Terapeuta da Fala é o profissional, licenciado na área da saúde, responsável pela prevenção, avaliação, diagnóstico, tratamento e estudo científico da comunicação humana e perturbações relacionadas ao nível da fala e da linguagem bem como alterações relacionadas com as funções auditiva, visual, cognitiva, oro-muscular, respiração, deglutição e voz – ver site da APTF (Associação Portuguesa de Terapeutas da Fala). [11] Às quais o requerido/apelado nunca se referiu. [12] Afigurando-se-nos não ser o caso em apreço comparável à situação equacionada no Ac. da RL de 25.09.2008 a que o apelado faz referência.