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INCOMPETÊNCIA RELATIVA
TRIBUNAL COMPETENTE
TÍTULO EXECUTIVO
Sumário
I – A execução do terceiro devedor instaurada nos termos do art° 860° nº 3 do CPC, tem natureza acessória (não autónoma) da execução a que se refere o n° 3 do art° 860° do CPC
II – Ordenada a penhora em salários de um trabalhador e notificada a entidade patronal para proceder aos descontos, mantém-se válida tal ordem se a designação da entidade patronal passou a ser outra. Por isso será executada a “nova firma”, caso deixe de efectuar os descontos e respectivos depósitos.
Texto Integral
* PROCESSO Nº 2706/06 – 3
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA
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A “A”, instaurou contra “B”, a presente execução para pagamento da quantia de € 13.464,94 apresentando como título executivo uma certidão da execução ordinária n° 6921/1995 do 1° Juízo Cível de …, em que figuram como exequente a própria “A” e como executados “C” e “D”, na qual foi ordenada a penhora de 1/3 dos salários auferidos por estes, trabalhadores da executada, até ao montante de € 14.964,94.
A executada, devidamente notificada do referido despacho em 24/09/2003, limitou-se a depositar à ordem dos autos a quantia de € 1.500,00 em 03/01/2005, tendo posteriormente, em 30/06/2006 informado os autos que os referidos trabalhadores deixaram de prestar trabalho na empresa a partir de Junho de 2006.
Pretende, assim, o pagamento dos descontos em falta no referido valor.
Juntou certidão do processo de execução supra referido, da qual consta o despacho que ordenou a penhora nos vencimentos dos executados e a data da notificação da respectiva entidade patronal e ainda certidão da C.R. Comercial da mesma da qual consta a alteração do contrato de sociedade no que respeita à denominação da firma que passou de “E” para “B”.
Convidada, a fls. 19 dos autos para esclarecer o título executivo que serve de base à execução, veio a exequente informar a fls. 23 "que pretende fazer funcionar o disposto no artO 8600 n° 3 do CPC na medida em que a executada não acatou a ordem judicial, deixando de efectuar os descontos no vencimento dos seus trabalhadores durante o período em que estes se encontraram ao seu serviço, sendo, portanto, responsável pela prestação nos termos da apontada disposição legal".
Foi, então, proferido o despacho de fls. 24/26 no qual o Exmo Juiz, com base no disposto no art° 812° n° 2 al. a) do CPC indeferiu liminar e totalmente a presente execução por manifesta falta de título executivo.
Inconformada, alegou a exequente, alegando e formulando as seguintes conclusões:
1 - Foi anexa ao requerimento executivo certidão de teor da matrícula e todas as inscrições em vigor da executada, de onde facilmente se extrai que a “E”, alterou a sua denominação para “B”, tratando-se, portanto, da mesma sociedade.
2 - Foi ainda junta aos autos certidão que identifica claramente a entidade patronal que, de resto, não é confundível com qualquer outra firma, bem como as partes no processo e, bem assim, o montante da dívida.
3 - Com a entrada em vigor da Lei 14/2006 de 26/04, a competência em matéria de execuções é do tribunal do domicílio do executado (art° 94° do CPC).
4 - A melhor interpretação do art° 90° do CPC, na sua actual redacção, conjugada com os princípios da economia processual e do desbloqueamento da reforma da acção executiva exclui a sua aplicação às certidões para efeitos do disposto no art° 860° nº 3 do CPC.
5 - Decidindo conforme decidiu, violou o Mmo Juiz a quo o disposto nos art°s 94°,860° n° 3 e 812° do CPC.
Citada a executada para os termos do recurso e da causa, não apresentou contra-alegações.
O Exmo Juiz sustentou a sua decisão nos termos de fls. 46 onde, "à excepção da alteração da denominação da exequente" entendeu que "continuam válidas as razões apresentadas" considerando que "a presente execução deveria ter sido instaurada por apenso ao proc.º nº 6921/1995 do 1º Juizo Civel de … atentas as regras processuais aplicáveis ao caso em matéria de competência"
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Delimitando-se o âmbito do recurso pelas conclusões da alegação do recorrente, abrangendo apenas as questões aí contidas (art°s 684° nº 3 e 690° n° 1 do CPC), verifica-se que a única questão a decidir é saber se a exequente detém título executivo contra a executada, sendo certo que foi este o fundamento do indeferimento liminar da presente execução.
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Os factos a considerar são os que constam já do relatório supra.
Conforme se verifica da decisão recorrida o Exmº Juiz a quo indeferiu "liminar e totalmente a presente execução por manifesta falta de título executivo". Assim, é esta a decisão que cumpre apreciar em sede de recurso.
Porém, como se vê da decisão recorrida, o Exmo Juiz aflora, também, na respectiva fundamentação, a questão da competência do tribunal dizendo que "a competência para a execução a instaurar sempre estaria atribuída ao 1º Juízo Cível de … onde se mostra pendente a acção principal, à qual esta deveria correr por apenso".
Contudo, esta referência não constitui fundamento da decisão proferida, ora recorrida, pois tal fundamento nunca importaria o indeferimento liminar da execução mas sim, a verificar-se a incompetência relativa do tribunal (excepção dilatória de conhecimento oficioso (art°s 494° al. a) e 110° n° 1 al. a) do CPC), a remessa do processo para o tribunal competente (art° 111 ° n° 3 do CPC).
Não obstante e já que a referida questão da competência foi abordada nos fundamentos da decisão recorrida (e também no presente recurso) sempre se dirá que, não sendo líquida e sendo discutida na doutrina e na jurisprudência, a questão de se saber como se processa a execução do terceiro devedor instaurada nos termos do art° 860° nº 3 do CPC, designadamente, se se processa autonomamente ou se deverá ser deduzida na primitiva execução, propendemos a acolher a tese da natureza acessória (não autónoma) da execução a que se refere o n° 3 do art° 860° do CPC, na linha do defendido no recente Ac. da R. C. de 20/11/2007 acessível in www.dgsi.pt. o qual inteiramente se subscreve (cfr. Teixeira de Sousa, Acção Executiva Comum, p. 274; Prof. Castro Mendes, Acção Executiva, pág. 113; Assento do STJ de 25/11/93, BMJ 431, pág. 25 e ainda Acs. do STJ de 4/10/2007 e da R. C. de 6/12/2005, in www.dgsi.pt.)
Com efeito, a partir do momento em que o devedor do crédito não cumpre, dirigindo-se contra ele a execução com base num título que é o despacho que ordenou a penhora e a sua notificação àquele, inicia-se um processo executivo incidental, instrumental da execução principal, que está funcional e estritamente conexo com a execução principal, cuja finalidade é a de garantir a efectiva satisfação do crédito do exequente.
Esta estrita conexão manifesta-se em vários aspectos, como por exemplo, se o exequente desistir da execução principal ou se nesta o executado fizer o pagamento voluntário, tais actos implicam a extinção da execução acessória o que demonstra a sua não autonomia.
O referido carácter funcional e acessório decorre também da própria formação do título, designado por título judicial impróprio, dado que ele emerge em consequência da posição processual desenvolvida no processo principal pelo terceiro devedor.
Como refere Lebre de Freitas em anotação ao art° 860° do CPC Anotado (vol. III, pág. 459) "Quando vencida a obrigação, o terceiro devedor não cumpra, a quantia ou coisa em dívida pode ser exigida em execução contra ele movida pelo exequente ou pelo adquirente do crédito em substituição processual do executado. Esta execução tem por base um título executivo judicial impróprio constituído nos termos do nº 3".
A lei permite, neste caso, que o exequente, no mesmo processo executivo se substitua ao executado (substituição processual) por passar a dispor de um direito de crédito que não é seu (mas afecto à execução por força da penhora). Embora se trate de um título executivo diferente, tal circunstância não obsta à qualificação de incidente executivo pois também, por exemplo, no caso previsto no art° 828° nº 2 do CPC, pode o exequente requerer no mesmo processo a execução contra o devedor principal e no caso do art° 854° nº 2, a lei possibilita a execução, no próprio processo, do depositário que não cumpre o dever de apresentação dos bens pelo que, por maioria de razão, se deve entender tal procedimento para o terceiro devedor.
Assim sendo e nos termos expostos sempre se dirá que, a nosso ver, a execução a que se refere o art° 860° nº 3 do CPC não tem natureza autónoma mas sim a acessória da execução principal.
Contudo, como se referiu, esta questão não constitui fundamento do recurso, mas sim saber se existe fundamento para o indeferimento liminar da execução por manifesta falta de título - art° 812° n° 2 al. a) do CPC.
Está em causa o título executivo a que ser refere o art° 860° n° 3 do CPC (in casu, na redacção anterior à alteração introduzida pelo D.L. 38/2003 de 8/03 em face do disposto no seu art° 21 ° e da data da instauração do processo (1995) onde foi proferido o despacho), nos termos do qual "Não sendo cumprida a obrigação, pode o exequente (. . .) exigir a prestação servindo de título executivo o despacho que ordenou a penhora (. . .)"
Conforme se verifica dos autos, a exequente juntou com o requerimento executivo, certidão do despacho que no processo de execução nº 6921/1995 do 1º Juízo Cível da Comarca de …, ordenou a penhora em 1/3 dos vencimentos dos ali executados “C” e “D”, certificando-se ainda o montante exequendo e a data da notificação por carta registada com A/R à entidade patronal daqueles, ali identificada como “E”.
Mais juntou, como supra se referiu, certidão da Conservatória do Registo Predial/Comercial de … do teor de matrícula e todas as inscrições em vigor, respeitante à sociedade anónima aqui executada – “B” da qual resulta ser esta a actual denominação da sociedade “E”, indicada na referida na certidão do Tribunal de Sintra, como entidade patronal dos ali executados.
Assim sendo, não assiste razão ao Exmº Juiz a quo ao concluir que "a exequente não dispõe nestes autos de título com força executiva para impor o pagamento de qualquer quantia a cargo da aqui executada “B”
Falta de razão essa que, de resto, o Exmº Juiz acabou por reconhecer no seu despacho de sustentação sem, contudo, reparar o agravo, como se impunha e em seguida decidir da questão da competência para a tramitação da execução em
apreço.
Em face de todo o exposto, procedem, no que se refere à existência de título, as conclusões da alegação da agravante, impondo-se a revogação da decisão recorrida.
DECISÃO
Nesta conformidade, acordam os Juízes desta Relação em conceder provimento ao agravo e, em consequência, revogar a decisão recorrida.
Custas pela agravante.
Évora, 2007/12/13