PRAZO DE RECLAMAÇÃO CONTRA A SELECÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Sumário


É de 15 dias o prazo para apresentar reclamação contra a selecção da matéria de facto.

Texto Integral


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA

Na acção declarativa de condenação com processo sumário que “A” e outros movem contra “B” e outros, findos os articulados, foi, em 27 de Novembro de 2006, proferido o despacho saneador, após o que se procedeu ao estabelecimento dos factos assentes e à organização da base instrutória.
Tal despacho foi notificado às partes por cartas registadas em 30.11.06.
Apresentada pela Ré reclamação da referida peça processual, por carta datada de 19.12.2006, a mesma veio, porém a ser indeferida por extemporânea.
Inconformada, interpôs a Ré o presente recurso de agravo em cuja alegação formula as seguintes conclusões:
1 - Antes da entrada em vigor do DL nº 38/2003, de 8.03, a reclamação da base instrutória operava-se no início da audiência [mal (quando não havia realização de audiência preliminar), nos termos do n° 2 do art° 508°-B do C.P.C, redacção do DL n° 180/96 de 25.09.
2 - Após a entrada em vigor do supra aludido diploma, foi eliminada a referência ao momento da apresentação da reclamação da base instrutória, não se devendo, com isso, entender que passou a imperar o prazo geral do CPC (art° 153°) para apresentação das reclamações.
3 - O mesmo diploma que eliminou a referência ao momento da apresentação das reclamações da base instrutória ( DL 38/2003), conferiu nova redacção ao nº 2 do art° 512, passando então a dispor que “2. Findo o prazo a que alude o número anterior sem que haja reclamações contra a selecção da matéria de facto, ou decididas estas, o juiz designa logo dia para audiência final, ponderada a duração provável das diligências de instrução a realizar antes dela"
4 - E o prazo a que o n° 1 deste citado art° 512° faz referência é de 15 dias, "Quando o processo houver de prosseguir e se não tiver realizado a audiência preliminar, a secretaria notifica as partes do despacho saneador para, em 15 dias apresentarem (. . .) "
5 - A substituição do prazo/momento para a apresentação da reclamação a que alude o n° 2 do art° 508-B do CPC, na redacção anterior ao DL. N° 38/2003, fazia referência, parece ter sido feita com base na redacção introduzida por este último diploma no n° 2 do art° 512° do CPC.
6 - O n° 2 do art° 512° do CPC, ao referir-se, única e exclusivamente às reclamações e não fazendo qualquer referência ao requerimento probatório, não será lícito considerar que o prazo aplicável seja o do disposto no art° 153 do CPC, ou seja, que para a matéria das reclamações não existe disposição especial quanto a prazo.
7 - O nº 2 do art° 512° do CPC é claro e inequívoco ao determinar que o prazo para reclamar, quando não se realize a audiência preliminar é de 15 dias.
8 - Assim, não há lugar à aplicação da regra geral dos prazos plasmada no art° 153° do CPC, dado que, no que concerne à aplicação do art° 511 ° do CPC, a reclamação é apresentada na audiência preliminar ou no prazo que venha a ser fixado pelo Juiz e, no caso de não haver realização da audiência preliminar, o n° 2 do art° 512 do CPC determina que o prazo são 15 dias.
9 - Acresce que, nos termos da al. f) do art° 650° do CPC, pode sempre providenciar-se, antes do encerramento da discussão pela ampliação da base instrutória da causa, nos termos do disposto no art° 264°.
10- Não se concebe a decisão do douto tribunal a quo dado que a matéria invocada na reclamação apresentada, poderá sempre oficiosamente ser aditada à base instrutória.

Considerando violados os art°s 508-B, 511° e 512° do CPC, termina pedindo a revogação do despacho recorrido e que seja admitida a reclamação.

Não foi oferecida contra-alegação e o Mm° Juiz sustentou o decidido.
Dispensados os vistos com acordo dos Ex.mos Desembargadores Adjuntos, cumpre apreciar e decidir.
Como resulta do precedente relatório, a questão a resolver é, de saber qual o prazo de reclamação da selecção da matéria de facto, no caso de não ter sido realizada audiência preliminar e prende-se com a interpretação dos artigos 511°, n° 2 e 512° nº 2 do C.P.Civil.
Fixada a base instrutória nos termos do n° 1 do art° 511°, dispõe o n° 2 que as partes podem reclamar contra a selecção da matéria de facto nela incluída ou considerada como assente, com fundamento em deficiência, excesso ou obscuridade.
Por sua vez, notificadas as partes, nos termos do n° 1 do art° 512°, do despacho saneador e para, em 15 dias, apresentarem o rol de testemunhas ou requererem outras provas, dispõe o seu n° 2 que, findo esse prazo, "sem que haja reclamações contra a selecção da matéria de facto, ou decididas estas" o juiz designa logo dia para a audiência final.
Perante esta realidade, não fixando o n° 2 do art° 511 ° qualquer prazo para a reclamação, a entender-se que a questão se devesse resolver nesta sede, o prazo a ter em conta seria, o de dez dias, por força do disposto no nº 1 do art° 153° do mesmo diploma, enquanto a entender-se dever aplicar-se o n° 2 do art° 512°, tal prazo seria o de 15 dias.
Assim, tendo em conta a data da carta para notificação da fixação da base instrutória, a mesma deve ter-se como realizada em 4 de Dezembro seguinte, pelo que, sendo o prazo de dez dias, o mesmo terminaria em 14 e, sendo o de 15, terminaria em 19 de Dezembro do mesmo mês.
Adianta-se, desde já o entendimento de que, no caso, é aplicável o prazo de 15 dias.
Na verdade, a não fixação de prazo no nº 2 do art° 511º, não pode ser entendida como remissão automática para o de 10 dias que resulta do art° 153° do mesmo diploma, quando se afigura evidente que essa omissão só se pode justificar por desnecessidade, face ao prazo do n° 2 do art° 512°.
É que, a nosso ver, não se compreenderia que, incluindo a notificação prevista no nº 1 do art° 512° o próprio despacho saneador (aqui nitidamente encarado como peça processual que engloba a própria base instrutória), passassem a correr, a partir dela, dois prazos, e que o previsto no nº 2 se aplicasse apenas ao oferecimento dos meios de prova, quando é, depois de decorrido este, que, havendo-as, se manda decidir das reclamações.
Por isso quando a lei manda decidir as reclamações, refere-se necessariamente às que deram entrada até ao momento a partir do qual deve ser proferida essa decisão.
Assim, apresentada em 19 de Dezembro de 2006, a reclamação foi tempestiva.

Por todo o exposto e sem necessidade de mais considerandos e concedendo procedência ao agravo, revogam a decisão recorrida para ser substituída por outra que considere tempestiva reclamação contra a selecção da matéria de facto, com as legais consequências.
Sem custas.
Évora, 16.09.09