PRISÃO PREVENTIVA
REEXAME DOS PRESSUPOSTOS
Sumário


1. Na impugnação de despacho proferido à luz do artigo 213.º, n.º 1, al. a), do CPP, o âmbito do recurso circunscreve-se ao conhecimento das repercussões de eventuais vicissitudes processualmente relevantes e eventualmente ocorridas após prolação do despacho inicial que determinou a medida de coação que agora se manteve.

2. No recurso do despacho que procede ao reexame trimestral dos pressupostos da prisão preventiva não está em causa a rediscussão dos fundamentos da prisão preventiva decretada anteriormente no processo, mas tão só a aferição da permanência e subsistência das exigências cautelares que então se reconheceram como verificadas.

Texto Integral


Acordam na Secção Criminal:

1. No processo n.º 23/13.0GBSTR da Comarca de Santarém, o arguido A. interpôs recurso do despacho que, em decisão trimestral oficiosa, lhe manteve a prisão preventiva anteriormente aplicada e mantida nos autos.

Apresentou as seguintes conclusões:

“1 – O presente recurso vai interposto do despacho de 27.08.2015, notificado ao arguido em 28.08.2015, na parte em que manteve a medida de coacção de prisão preventiva – cf. primeiro e terceiro a sétimo parágrafos –, que se entende não ser conforme à Lei e ao Direito.

2 – Em síntese, o douto tribunal recorrido entendeu que “Após análise dos autos, verifica-se que se mostra desnecessária a audição dos arguidos (incluindo o Recorrente) para o presente reexame, porquanto se mostram inalterados os fundamentos de facto e de direito que determinaram a imposição da medida de coacção de prisão preventiva, verificando que ainda não se encontra excedido o prazo máximo de prisão preventiva…”.

3 – O douto despacho recorrido não fundamenta a existência dos pressupostos do artigo 204º do Código de Processo Penal, sendo certo que os mesmos não se verificam.

4 – Com efeito, o tribunal recorrido limitou-se a uma remessa lacónica, sem justificação ou actualização algumas, para o primitivo “despacho judicial datado de 18 de Junho de 2014, no qual foi determinado que os arguidos José Henrique Tavares Carvalho e outro, aguardassem os ulteriores termos do processo sujeitos a medida de coacção (de) prisão preventiva (cfr. fls. 1179-1208) …”.

5 – Nesse primitivo despacho judicial datado de 18 de Junho de 2014, o Mº JIC fundamentou a aplicação desta medida de coacção por entender “existir perigo de perturbação do decurso do inquérito…também perigo de continuação da actividade criminosa… (e ainda) de igual modo perigo de perturbação grave da ordem pública” (cf. fls. 1204, 1205 e 1206 dos autos).

6 – É manifestamente inconcebível, nesta fase processual já bem posterior, em que já foi proferido acórdão condenatório e inclusivamente interposto recurso deste, defender que se mantém o alegado perigo de perturbação do decurso do inquérito.

7 – Também se afigura, salvo o devido respeito e melhor opinião, de todo absurdo defender que se mantém o perigo de continuação da actividade criminosa, quando esta não existe, rectius, não foi sequer dada como provada – por definição, não se pode continuar o que nem sequer se começou!

8 – Com efeito, “não se provou /não foi dado como provado pelo tribunal, um único facto directa ou indirectamente respeitante ao agora Recorrente, relativo ao alegado tráfico de cocaína (crime de tráfico de estupefacientes…com referência à Tabela I-B)”, como se disse na Conclusão 9 do recurso interposto do acórdão condenatório.

9 – Sendo agora irrelevante, a nosso ver, o entendimento do tribunal – cf. despacho de 15.07.2015 (Refª 68461279) – de que houve mero lapso na indicação da norma, pois, como se disse no requerimento de alargamento do âmbito do recurso, uma alteração “a posteriori” da qualificação jurídica configura nulidade de sentença (art. 379º, nº 1, alínea b), do CPP) e, além disso, leva, como sucedeu “in casu”, a um encurtamento inadmissível das garantias de defesa do arguido (art. 32º, nºs 1 e 5, da CRP).

10 – Quanto ao erro nos pressupostos de aplicação da medida de coacção por inverificação do alegado perigo de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas, só releva quando conectado com o restabelecimento da paz comunitária, o que se irá aferir pela personalidade do arguido e pelas circunstâncias concretas do crime – ora, esta aferição está totalmente ausente e nada dos autos consta em desabono da personalidade do arguido, antes pelo contrário: vd. nomeadamente, Factos Provados 122 a 152 do douto acórdão.

11 – Acresce que o douto despacho recorrido deu ao artigo 204º do Código de Processo Penal uma interpretação que raia a inconstitucional incaucionabilidade.

12 – Em conclusão, o douto despacho recorrido não fundamenta a existência dos pressupostos do artigo 204º do Código de Processo Penal, sendo certo que os mesmos agora não se verificam.

13 – Tendo deixado de subsistir as circunstâncias que justificaram a sua aplicação, deve a medida de coacção de prisão preventiva aplicada ao arguido ora recorrente ser imediatamente revogada e o mesmo restituído à liberdade (art. 212º, nº 1, alínea b), do CPP).

14 – A referida falta de fundamentação configura uma irregularidade que contende com direitos fundamentais, designadamente o direito à liberdade, que neste caso não pode ser sanada com a devolução do processo ao tribunal recorrido para este suprir tal lacuna grave, sob pena de violação do disposto art. 213º, nº 1, alínea a), do CPP, pois, na prática, o tribunal estará a proceder ao reexame para lá dos três meses a que alude a norma.

15 – Por conseguinte, a medida de coacção de prisão preventiva deve ser imediatamente revogada, uma vez que aplicada “fora das hipóteses ou das condições previstas na lei” – art. 212º, nº 1, alínea a) do CPP.

16 – Ainda que assim não se entenda, na esteira da jurisprudência fixada pelo douto Acórdão do STJ de 24-01-1996 (Proc. 047781, Relator: Pedro Marçal, DR IS-A de 14.03.1996, pág. 510 a 512 – BMJ), no sentido de que a prisão preventiva deve ser revogada ou substituída por outra medida de coacção, logo que se verifiquem circunstâncias que tal justifiquem, e sendo estas agora evidentes, ainda que não deva ser libertado, sempre deve ser aplicada ao recorrente medida de coacção menos gravosa.

17 – Tendo por base o artigo 32º, nº 2 da Constituição da República, segundo o qual todo o Arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação e atendendo ao normativo penal vigente é forçoso sublinhar o caracter excepcional da medida de coacção mais gravosa prevista na lei: a prisão preventiva. Efectivamente, na senda da presunção de inocência se situam as disposições do artigo 27º e do artigo 28º da CRP e o Código de Processo Penal em vigor.

18 – Foram violados os artigos 97º, nº 5, 204º, alíneas b) e c), 212º, nº 1, alíneas a) e b), e 213º, nº 1, alínea a), todos do Código de Processo Penal, e 18°, n° 2, 27º, 28°, n° 2, 32º, nºs 1, 2 e 5, 205º, nº 1, da Constituição da Republica.”

O Ministério Público respondeu ao recurso pugnando pela manutenção do despacho recorrido e concluindo por seu turno:

“1. Aquando da realização de 1º interrogatório judicial de arguido detido, por despacho datado de 18 de Junho de 2014, foi aplicada ao recorrente a medida de coacção de prisão preventiva por se ter entendido que estava fortemente indiciada a prática de um crime de tráfico de produtos estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.01, por referência às tabelas I-A e I-C anexas a esse diploma, existir perigo de perturbação no decurso do inquérito, perigo de continuação da actividade criminosa, pela gravidade do ilícito, da qualidade e quantidade das substâncias apreendidas sendo que, quanto ao arguido A. tal perigo se verifica ainda tendo em conta que afirmou que a sua situação económica é precária pois os seus estabelecimentos estão à beira do prejuízo. O facto de ter um restaurante aberto ao público “potencia enormemente” a sua capacidade de proceder à venda destes produtos servindo-se desse espaço.

2. Existindo de igual modo perigo de perturbação grave da ordem e tranquilidades públicas sendo certo que este ilícito causa naturais repercussões nas comunidades onde é praticado não só pelos seus efeitos nefastos na saúde das suas vítimas directas mas também porque potencia outros crimes contra as pessoas e o património que afectam a generalidade dos cidadãos na sua segurança pessoal.

3. Bem como perigo de fuga.

4. Por acórdão datado de 5 de Junho de 2015, ainda não transitado em julgado devido aos recursos interpostos, o recorrente foi condenado na pena única de seis (6) anos e três (3) meses de prisão pela prática em autoria material e na forma consumada, de:

• Um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22.01, com referência à Tabela I-A anexa ao referido diploma, na pena de seis (6) anos de prisão;

• Um crime de descaminho, p. e p. pelo art.º 355.º, n.º 1 do CP, na pena de dez (10) meses de prisão;

• De um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. c), com referência ao art.º 2.º, n.º 1, al. s) e no art.º 3.º, n.º 6, al. c), todos do Regime Jurídico das Armas e suas Munições, na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, o que perfaz o montante de € 1.500,00.

5. Estando em causa o reexame dos pressupostos de aplicação da medida, esta deve ser alterada se se verificaram uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a sua aplicação – art.º 212º CPP -, pelo que em conformidade com tais normativos a fundamentação resumir-se-á á apreciação da existência ou não de factos novos/ alteração das circunstancias que determinem uma atenuação das exigências cautelares.

6. Ora, não ocorrendo tais factos novos ou uma alteração das circunstâncias, a fundamentação de uma decisão que mantém a medida de coacção aplicada, necessariamente tem apenas de mencionar tais factos – a não ocorrência de tais factos novos que se repercutam nas exigências cautelares, atenuando-as.

7. Sendo que da análise dos elementos constantes dos autos, não resulta que se tivessem alterado os pressupostos de facto e de direito, nomeadamente as concretas exigências de natureza cautelar, que determinaram a aplicação ao arguido da medida de prisão preventiva.

8. Além de que a medida de prisão preventiva se mostra como a única capaz de acautelar os perigos considerados então, de forma adequada, necessária e proporcional, nos termos do disposto nos artigos 193.º, n.º 1 e n.º 2, 202.º, n.º 1, alínea a), 204.º, alínea c), e 212.º, todos do Código de Processo Penal, sem que se mostrem violados os requisitos legais enunciados em tais normas ou as normas de garantia dos artigos 27.º, 32.º, n.º 2, e 18.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa.

9. Pelo que bem andou o Mmº Juiz a quo quando decidiu que o arguido ora recorrente continuasse a aguardar os ulteriores termos do processo sujeito à medida de coacção da prisão preventiva que lhe foi aplicada.”

A Sra. Procuradora-geral Adjunta pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso e o arguido nada respondeu.

Colheram-se os Vistos e teve lugar a Conferência.

2. O despacho recorrido é do seguinte teor:

“Por despacho judicial datado de 18 de Junho de 2014, foi determinado que os arguidos A. e B. aguardassem os ulteriores termos do processo sujeitos à medida de coacção prisão preventiva (cfr. fls. 1179-1208), cujos pressupostos foram judicialmente revistos nos despachos proferidos subsequentemente nos autos.

Por despacho judicial datado de 10 de Julho de 2014, foi determinado que o arguido C aguardasse os ulteriores termos do processo sujeito à medida de coacção prisão preventiva (cfr. fls. 1451-1470), cujos pressupostos foram judicialmente revistos nos despachos proferidos subsequentemente nos autos.

Cumpre proceder ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva aplicada aos referidos arguidos.

O Ministério Público veio promover que os arguidos continuem a aguardar os ulteriores termos do processo sujeitos à medida de coacção de prisão preventiva.

Após análise dos autos, verifica-se que, se mostra desnecessária a audição dos arguidos para o presente reexame, porquanto, se mostram inalterados os fundamentos de facto e de direito que determinaram a imposição aos arguidos, da medida de coacção de prisão preventiva, verificando-se ainda que não se encontra excedido o prazo máximo da medida de coacção de prisão preventiva, por força do disposto no artigo 215. º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

Ora, cremos que até à presente data não foram carreados para os autos quaisquer elementos que nos permitam concluir pela atenuação das exigências cautelares que o caso impõe, afigurando-se-nos que se mantêm, em concreto, os perigos que estiveram subjacentes à aplicação aos arguidos da prisão preventiva.

Pelo que, determino que os arguidos A. B. e C. continuem a aguardar os ulteriores trâmites processuais na situação de prisão preventiva em que se encontram, nos termos do disposto nos artigos 191.º, 193.º, 196.º, 202º, n.º 1, alíneas a) e c), 204.° e 213.°, n.º 1, aI. a), todos do CPP.”

3. Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, a questão a decidir restringe-se à verificação da manutenção dos pressupostos que fundamentaram a prisão preventiva, inicialmente aplicada ao arguido em despacho proferido na fase de inquérito.

A prisão preventiva foi sendo sucessivamente mantida.

O arguido encontra-se, neste momento, condenado na pena única de 6 anos e 3 meses de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes do art.º 21.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22.01 (pena de 6 anos de prisão), um crime de descaminho do art.º 355.º, n.º 1 do CP (pena de 10 meses de prisão) e um crime de detenção de arma proibida do art.º 86.º, n.º 1, al. c), com referência ao art.º 2.º, n.º 1, al. s) e no art.º 3.º, n.º 6, al. c), todos do RJAM (pena de 150 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, o que perfaz o montante de € 1.500,00).

O despacho recorrido foi proferido após leitura do acórdão condenatório datado de 5.06.2015, o qual foi objecto de recurso.

Começa por precisar-se que, tratando-se de uma impugnação de despacho proferido à luz do art. 213º, nº 1, alínea a) do CPP – que cura do reexame trimestral oficioso dos pressupostos da prisão preventiva –, o âmbito do recurso circunscreve-se ao conhecimento das repercussões de eventuais vicissitudes processualmente relevantes ocorridas após prolação do despacho que determinou a medida de coacção que agora se mantém.

Ou seja, não está em causa rediscutir os fundamentos da prisão preventiva decretada (e já mantida) anteriormente no processo, mas tão só apreciar da persistência das exigências cautelares que então se reconheceram como verificadas.

Na decisão em análise procede-se à averiguação oficiosa da subsistência das circunstâncias que justificaram a prisão, de forma a assegurar a substituição da medida de coacção máxima se se verificar uma atenuação das exigências cautelares (art. 212º, nºs 1 e 3 do Código de Processo Penal).

Fora desta hipótese, ou seja, mantendo-se inalteradas as circunstâncias que determinaram a prisão preventiva, esta será de manter. Pois o conhecimento dos pressupostos da prisão preventiva que se definam aquém dos limites das eventuais alterações de circunstâncias extravasa os poderes de cognição do tribunal e está abrangido pelo caso julgado formal.

Como ensina Eduardo Correia, “o fundamento central do caso julgado radica-se numa concessão prática às necessidades de garantir a certeza e a segurança do direito. Ainda mesmo com possível sacrifício da justiça material, quer-se assegurar através dele aos cidadãos a sua paz jurídica, quer-se afastar definitivamente o perigo de decisões contraditórias.” (A Teoria do Concurso em Direito Criminal, I – Unidade e Pluralidade de Infracções, II – Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz, 1983, p.301/2).

Quanto ao valor do caso julgado formal de determinadas decisões interlocutórias, como sucede com as decisões que aplicam medidas de coacção, resulta expressamente da lei que se trata de um caso julgado rebus sic stantibus.

Em suma, no despacho proferido à luz do art. 213º, nº 1, alínea a) do CPP, não é de um repensar de decisão que se trata, estando as medidas de coacção sujeitas à cláusula rebus sic stantibus.

Neste quadro assim definido, o recorrente não pode pretender rediscutir os fundamentos das decisões anteriores, que foram já, ou podiam ter sido, objecto de um recurso próprio. Não pode também pretender sindicar o juízo sobre a suficiência dos indícios relativos aos factos que integram os crimes, pois está já condenado em primeira instância por eles. Esses indícios, como indícios, consolidaram-se no processo ao nível máximo. E se não podem ser discutidos como factos “prováveis” (altamente prováveis, ou seja, fortemente indiciados), também não podem ser questionados como factos “provados”, aqui. Pois essa discussão está a ser feita no recurso próprio, ou seja, no que se encontra interposto do acórdão e pendente no processo principal.

Circunscrito, assim, o objecto do recurso à matéria cognoscível, cumprirá tão só aferir da adequação e proporcionalidade da prisão preventiva, na parte referente aos pericula libertatis tendo em conta eventuais alterações de circunstâncias suscitadas em recurso.

Os pericula libertatis identificados no primeiro despacho que determinou a prisão preventiva do arguido foram o perigo de perturbação do decurso do inquérito, o perigo de perturbação da ordem pública e o perigo de continuação da actividade criminosa.

Dos questionamentos agora colocados pelo recorrente, apenas um respeita a alterações de circunstâncias ou a factos novos. Referimo-nos à alegação do facto processual novo “julgamento”, que, como o recorrente refere, entretanto ocorreu. No mais, repete-se, nenhuma alteração de circunstâncias é trazida ao recurso. Ou seja, na parte restante, o recorrente limita-se a pretender rediscutir anteriores despachos ou até a matéria de facto do acórdão condenatório (veja-se, por exemplo, a conclusão “7 – Também se afigura, salvo o devido respeito e melhor opinião, de todo absurdo defender que se mantém o perigo de continuação da actividade criminosa, quando esta não existe, rectius, não foi sequer dada como provada – por definição, não se pode continuar o que nem sequer se começou!”).

O recorrente tem razão quando refere que a (única) circunstância nova que traz ao recurso deveria ter sido valorada pelo tribunal aquando da prolação do despacho sobre as medidas de coacção.

Na verdade, não se trataria nunca de um acto meramente rotineiro ou tabelar, mas de uma decisão judicial que cuida da restrição a um direito fundamental. Por mais simples que possa ser a respectiva fundamentação, o juiz tem de atentar nas alterações de circunstâncias que se repercutam na medida já fixada no sentido da atenuação, máxime naquelas circunstâncias de que tem conhecimento oficioso.

Tem, pois, razão o arguido quando diz que “6 – É manifestamente inconcebível, nesta fase processual já bem posterior, em que já foi proferido acórdão condenatório e inclusivamente interposto recurso deste, defender que se mantém o alegado perigo de perturbação do decurso do inquérito.”

Mesmo que se defenda que o “perigo para a conservação da prova” só é totalmente eliminado com o trânsito em julgado da sentença (pois, o julgamento sempre poderia ser anulado e repetido), estando as medidas de coacção sujeitas a um princípio da proporcionalidade o “perigo” nunca subsistiria em grau suficientemente elevado que justificasse a prisão preventiva.

Assim, in casu, o perigo de perturbação da prova já não justificaria a medida de coacção máxima quando o despacho recorrido foi proferido e, neste ponto, este é censurável.

No entanto, a prisão preventiva é claramente de manter. A única “alteração de circunstâncias” pertinentemente trazida ao recurso não tem qualquer reflexo nos outros perigos anteriormente diagnosticados e declarados, mormente, no perigo de continuação da actividade criminosa.

Nessa parte, não se exigiria maior fundamentação do despacho de reapreciação da prisão preventiva. E na ausência de constatação de uma alteração de circunstâncias (nada de novo tendo ocorrido no processo no sentido da atenuação das exigências cautelares), será sempre suficiente a remessa para os fundamentos de decisão anterior (esta, exaustivamente fundamentada).

Não ocorre, assim nenhuma invalidade por deficiência de fundamentação.

Em suma, as razões do recorrente não põem em causa o despacho recorrido e a medida de coacção de prisão preventiva é de considerar como continuando a mostrar-se adequada às exigências cautelares que o caso requer e proporcional à gravidade dos crimes e sanções aplicadas, não se mostrando violado qualquer norma legal e preceito ou princípio constitucional.

3. Em face do exposto, nega-se provimento ao recurso, e confirma-se a decisão recorrida

Condena-se o recorrente em 4 UCC de taxa de justiça.

Évora, 12.04.2016

(Ana Maria Barata de Brito)

(Leonor Vasconcelos Esteves)