I – O objetivo da reclamação de créditos no processo especial de acordo de pagamento – em que não ocorre qualquer verificação, graduação ou reconhecimento dos créditos – é apenas o de definir a base de cálculo para o quórum de deliberação e da maioria exigida na aprovação do plano. Por isso, é indiferente a natureza dos créditos apresentados, desde que não sejam subordinados.
II – A oposição ao plano não equivale a um pedido de não homologação do acordo.
III – A diferenciação dos créditos da Segurança Social e da Autoridade Tributária – por ausência de moratória e de perdão de juros – está plenamente justificada, na medida em que estes créditos, de acordo com o estipulado na Lei Geral Tributária e no Código Contributivo, são indisponíveis.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Recorrente A..., S.A.
Recorridos AA e BB
Juiz Desembargador Relator: Anabela Marques Ferreira
Juízes Desembargadores Adjuntos:
Maria Fernanda Fernandes de Almeida
Maria João Areias
Sumário (da responsabilidade do Relator – artº 663º, nº 7, do Código de Processo Civil)
(…).
Acordam os juízes que nestes autos integram o coletivo da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:
Nestes autos de processo especial para acordo de pagamento, que corre termos no Juízo de Comércio do Fundão, em que são Requerentes AA e BB, foi proferida sentença, decidindo que:
Em face do exposto, homologa-se por sentença, nos termos do artigo 222.º-F n.ºs 5; 8 e 9 do CIRE, o acordo de pagamento dos devedores AA e BB.
O Credor A..., S.A. interpôs recurso de tal decisão, concluindo, nas suas alegações, que:
(…).
Os Recorridos apresentadas contra-alegações, concluindo:
(…).
II – Objeto do processo
Da conjugação do disposto nos artºs 635º, nºs 3 e 4, 637º, nº 1 e 639º, todos do Código de Processo Civil, resulta que são as conclusões do recurso que delimitam os termos do recurso (sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso - artº 608º, nº 2, ex vi artº 663º, nº2, ambos do mesmo diploma legal), não vinculando, porém, o Tribunal ad quem às soluções jurídicas preconizadas pelas partes (artº 5º, º 3, do Código de Processo Civil). Assim:
Questões a decidir:
- Da nulidade da decisão
- Da violação do princípio da igualdade dos credores
I. A douta sentença proferida a 9/07/2025 (referência Citius 38941557) apenas foi publicitada mas não foi notificada a todos os credores reconhecidos (ATA/Finanças/Direcção de Finanças ..., CC, Instituto de Segurança Social IP e, ao credor hipotecário, A..., S.A.), tendo apenas sido notificada ao Ministério Público (referência Citius 38947820), aos Ilustre Mandatário dos Devedores (referência Citius 38947844) e ao Ilustre Administrador de Insolvência (referência Citius 38947849) o que, salvo douto entendimento, padece de nulidade por preterição de formalidade essencial.
Responderem os recorridos que:
x. A portaria nº 267/2008 de 20 de setembro (entretanto alterada pela Portaria nº 93/2019, de 28 de março) e disponibilizada ao publico a Área de Serviços Digitais dos Tribunais acessível no endereço eletrónico https://tribunais.org.pt determina que as publicações previstas nos arts. 222º D, 222º E, 222ºF, 222ºG e 222ºI do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas devem ser efetuadas neste Portal (cfr. art. 13º da Portaria 267/2018, de 20 de setembro).
y. Deste modo e no que diz respeito à questão suscitada pelo requerente não lhe assiste qualquer razão uma vez que se encontra tudo publicado no referido Portal não existindo, por conseguinte, qualquer nulidade da douta sentença por preterição de formalidade essencial.
O Juiz a quo, como disposto no artº 617º, nº 1, do Código de Processo Civil, pronunciou-se nos seguintes termos:
Depois de analisadas as alegações de recurso do recorrente do presente processo especial, verifica-se que o mesmo sustenta que a decisão recorrida enferma de nulidade.
Sustenta, para o efeito e em suma, que a sentença proferida a 9/07/2025 com a referência Citius 38941557 não foi lhe notificada, nem a si enquanto credor hipotecário, nem a outros credores, tendo sido, contudo, notificada ao Ministério Público (referência Citius 38947820), aos Ilustre Mandatário dos Devedores (referência Citius 38947844) e ao Ilustre Administrador de Insolvência (referência Citius 38947849).
Considera, assim, que a sentença proferida a 9/07/2025 (referência Citius 38941557) é nula por preterição de formalidade essencial.
Apesar de se verificarem as premissas alegadas, a verdade é que não lhe assiste razão quanto à consequência jurídico-processual daí a extrair.
Vejamos.
A notificação da sentença homologatória do acordo de pagamentos é notificada nos termos do disposto no artigo 222.º-F, n.º 8 do CIRE, onde se lê que: «[a] decisão de homologação vincula o devedor e os credores, mesmo que não hajam reclamado os seus créditos ou participado nas negociações, relativamente aos créditos constituídos à data em que foi proferida a decisão prevista no n.º 4 do artigo 222.º-C, e é notificada, publicitada e registada pela secretaria do tribunal».
Esta norma replica o regime do PER, designadamente o n.º 11 do artigo 17.º-F, que na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 16/2012, de 20 de abril, que criou o processo de revitalização, dispunha no seu n.º 6 que «[a] decisão de homologação ou de recusa do plano de recuperação vincula os credores, mesmo os que não hajam participado nas negociações, e é notificada, publicitada e registada pela secretaria do tribunal nos termos dos artigos 37º e 38º».
O artigo 37.º previa e prevê a citação dos cinco maiores credores conhecidos por carta registada e a citação edital dos restantes, por edital, com prazo de dilação de cinco dias e por anúncio publicado no portal Citius.
A verdade é que o Decreto-Lei n.º 79/2017, de 30 de junho, suprimiu a parte final do aludido n.º 6, a qual nunca passou para o regime do PEAP, o que nos leva sustentar que a sentença deve ser notificada a todos os [efetivos] intervenientes nos referidos processos especiais – PER e PEAP.
Sucede que, não obstante a exigência da referida notificação, a disciplina processual dos referidos processos, não prescindiu da sua publicitação, o que nos remete, necessariamente, para o regime previsto no artigo 9.º do CIRE, designadamente o seu n.º 4, do qual resulta que «[c]om a publicação no local próprio, dos anúncios referidos neste Código, acompanhada da fixação de editais, se exigida, respeitantes a quaisquer atos, consideram-se citados ou notificados todos os credores, incluindo aqueles para os quais a lei exija formas diversas de comunicação e que não devam já haver-se por citados ou notificados em momento anterior, sem prejuízo do disposto para os créditos públicos».
Conforme decidido, entre outros, no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10.07.2024, referente ao processo n.º 2328/23.2T8LRA.C1, disponível in www.dgsi.pt, «ainda que a lei preveja outros meios complementares de notificação para alguns dos intervenientes, a data relevante para efeitos da contagem do prazo de recurso é a data da publicação dos anúncios, acompanhada dos editais […]
Existindo estas regras especiais no CIRE, que se afastam do regime geral contido nos artigos 248º e 249º do CPC – que determinam que o início de qualquer prazo é contado a partir da data da elaboração da notificação ou do recebimento da carta registada, presumindo-se a notificação no 3º dia posterior, ou no primeiro dia útil seguinte caso esse o não seja – teremos como líquido que, no âmbito do PER, a data relevante para efeitos de início da contagem do prazo de interposição do recurso da decisão sobre a homologação do plano de revitalização é a data da publicação do anúncio, data esta que vale para todos os credores independentemente de os mesmos terem sido dela notificados também por outras vias, única solução que se coaduna com o disposto no n.º 2 do artigo 14º do CIRE: “Em todos os recursos interpostos no processo ou em qualquer um dos apensos, o prazo para alegações é um para todos os recorrentes, correndo em seguida um outro para todos os recorridos».
No caso vertente, apesar de não individualmente notificado, o credor recorrente acabou por tomar conhecimento da aludida sentença através da publicidade efetuada, o que lhe permitiu interpor o competente recurso dentro do prazo legal e, nessa medida, a irregularidade invocada – e que se reconhece – acabou por não comportar qualquer consequência jurídico-processual na sua esfera de ação – que, aliás, não foi igualmente invocada pelo recorrente – não sendo, nessa medida, suscetível de produzir qualquer nulidade, em conformidade com o que dispõe o artigo 195.º do CPC.
Em face de todo o exposto, decide-se indeferir a arguição da nulidade invocada.
Consigna-se, contudo, que foi esta Secretaria alertada para proceder em conformidade com o regime de notificações supra exposto.
Vejamos.
Dispõe o artº 615º, nº 1, do Código de Processo Civil, que:
1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
Como vemos, a notificação da sentença unicamente no portal citius, e não individualmente a cada um dos credores, não está elencada neste preceito, pelo que não pode ser considerada como fundamento de nulidade da sentença.
E não poderia deixar de ser assim, uma vez que a notificação da sentença é um ato diferente e posterior à própria sentença, completamente independente em relação à mesma.
A haver nulidade – o que nem sequer foi invocado - seria da notificação, e não da sentença, aqui sim por preterição das formalidades essenciais, nos termos do disposto no artº 195º, nº 1, do Código de Processo Civil, o qual dispõe que:
1 - Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa. (sublinhado nosso)
Contudo, como bem se diz no despacho proferido em cumprimento do disposto no artº 617º, nº 1, do Código de Processo Civil:
No caso vertente, apesar de não individualmente notificado, o credor recorrente acabou por tomar conhecimento da aludida sentença através da publicidade efetuada, o que lhe permitiu interpor o competente recurso dentro do prazo legal e, nessa medida, a irregularidade invocada – e que se reconhece – acabou por não comportar qualquer consequência jurídico-processual na sua esfera de ação – que, aliás, não foi igualmente invocada pelo recorrente – não sendo, nessa medida, suscetível de produzir qualquer nulidade, em conformidade com o que dispõe o artigo 195.º do CPC.
Deste modo, a sentença recorrida na padece de qualquer nulidade, nem, tão pouco, da falta de notificação individual a cada um dos credores se podem extrair quaisquer consequências.
Historial do presente processo:
a) a 17.02.2025 os devedores AA e BB, melhor identificados nos autos, impulsionaram o presente processo especial, tendo em vista a aprovação de um acordo de pagamentos com os seus credores;
b) a 18.02.2025 foi proferido despacho liminar, o qual foi publicitado;
c) o Sr. Administrador Judicial Provisório apresentou a lista provisória de créditos, a qual foi publicitada 17.03.2025, cf. Apenso A;
d) a aludida lista não foi objeto de impugnações, tendo-se convertido em definitiva;
e) foi requerida a competente prorrogação de prazo das negociações, a qual foi devidamente publicitada no mesmo dia;
f) a 24.06.2025 foi apresentada proposta do acordo de pagamento dos devedores;
g) foi efetuada a publicidade a que alude o n.º 2 do artigo 222.º- F do CIRE;
h) a 07.07.2025 o Sr. Administrador juntou aos autos o resultado da votação do acordo e todos os elementos a que alude o artigo 222.º-F, n.º 4, do CIRE;
i) nenhum credor veio requerer a não homologação do plano.
B) De Direito
Da violação do princípio da igualdade dos credores
Em primeiro lugar, a Recorrente invocou a violação das regras de votação, uma vez que todos os votos foram considerados de igual forma, quando os créditos da Segurança Social são apenas parcialmente garantidos, sendo noutra parte créditos privilegiados.
Vejamos, então, se a contagem dos votos depende da categoria dos créditos votantes, o que, in casu, nos remete para o disposto na al. b), do nº 3, do artº 222º-F, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o qual dispõe que:
3 – (…) considera-se aprovado o acordo de pagamento que:
b) Recolha cumulativamente, não se considerando as abstenções:
i) O voto favorável de credores cujos créditos representem mais de 50 /prct. da totalidade dos créditos relacionados com direito de voto, contidos na lista de créditos a que se referem os n.os 3 e 4 do artigo 222.º-D;
ii) O voto favorável de mais de 50 /prct. dos votos emitidos correspondentes a créditos não subordinados relacionados com direito de voto contidos na lista de créditos a que se referem os n.os 3 e 4 do artigo 222.º-D.
Ora, tendo em conta que os créditos da Segurança Social e da Autoridade Tributária, que votaram favoravelmente o plano, correspondem a mais de 50% dos créditos relacionados, não sendo créditos subordinados, terá de se ter o plano por aprovado, uma vez que, para este efeito, a lei não faz outra distinção entre a natureza dos créditos.
Na verdade, o objetivo da reclamação de créditos no processo especial de acordo de pagamento - em que não ocorre qualquer verificação, graduação ou reconhecimento dos créditos - é apenas o de definir a base de cálculo para o quórum de deliberação e da maioria exigida na aprovação do plano. Por isso, é indiferente a natureza dos créditos apresentados, desde que não sejam subordinados.
A Recorrente veio invocar a violação do princípio da igualdade dos credores, na os créditos da Autoridade Tributária e da Segurança Social foram beneficiados com ausência de moratória e de perdão dos juros, sendo certo que parte dos créditos da segunda são apenas privilegiados e assim, sem justificação, surgem beneficiados perante um crédito garantido, o da Recorrente.
A este propósito, dispõem os artºs 215º e 216º, ex vi artº 222º-F, nº 5, todos do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, que:
Artigo 215.º Não homologação oficiosa
O juiz recusa oficiosamente a homologação do plano de insolvência aprovado em assembleia de credores no caso de violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, qualquer que seja a sua natureza (…).
Artigo 216.º Não homologação a solicitação dos interessados
1 - O juiz recusa ainda a homologação se tal lhe for solicitado pelo devedor, caso este não seja o proponente e tiver manifestado nos autos a sua oposição,
anteriormente à aprovação do plano de insolvência, ou por algum credor ou sócio, associado ou membro do devedor cuja oposição haja sido comunicada nos mesmos termos, contanto que o requerente demonstre em termos plausíveis, em alternativa, que:
a) A sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência de qualquer plano, designadamente face à situação
resultante de acordo já celebrado em procedimento extrajudicial de regularização de dívidas; (sublinhado nosso)
No caso em apreço, o Recorrente não requereu da não homologação do acordo, pelo que não é aqui aplicável o disposto no artº 216º, supratranscrito.
Como se diz no acórdão deste Tribunal da Relação de Coimbra de 10 de Julho de 2024, proferido no processo nº 2328/23.2T8LRA.C1, disponível em www.dgsi.pt:
II – O requerimento pelo qual o credor manifesta “a sua discordância e não aceitação do plano de revitalização do plano”, desacompanhada da alegação de qualquer motivo de discordância, integra um voto desfavorável ao plano, mas não vale como pedido de não homologação do plano.
Contudo, ainda que assim não fosse, verificamos igualmente que não demonstra que a existência de plano lhe é mais desfavorável do que a sua existência.
Aliás, parece confundir tal pressuposto com o facto de a existência de plano ser mais desfavorável do que o cumprimento da obrigação, quando diz:
Este plano de pagamentos sem ressarcimento de juros opera uma modificação substancial do crédito do identificado credor hipotecário pior do que se o crédito tivesse a ser cumprido, pois o contrato de mútuo prevê o pagamento, além do capital (sem período de carência) o pagamento de juros moratórios.
Ora, a existência de um plano de pagamentos é sempre mais desfavorável do que o cumprimento da obrigação, para todos os credores.
Contudo, do que se trata aqui é da recuperação de um devedor em dificuldades, importando saber se a alternativa, designadamente, a sua insolvência, seria ou não mais prejudicial ao credor; neste ponto, o Recorrente nada trouxe aos autos.
Analisemos, agora, se o plano de recuperação aprovado contende com o princípio da igualdade de tratamento dos credores, em face dos moldes em que os devedores se propõem regularizar o seu passivo.
Dispõe o artº 194º, nº 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aplicável ex vi artº 222º-F, nº 5, do mesmo código, que “o plano de insolvência obedece ao princípio da igualdade dos credores da insolvência, sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objetivas”. (sublinhado nosso)
Aqui, sim, poderia ter efetivamente interesse a consideração da natureza dos créditos – garantidos ou privilegiados – como alegada pelo Recorrente.
Contudo, no caso em apreço, a diferenciação – ausência de moratória e de perdão de juros - está plenamente justificada, na medida em que estes créditos, de acordo com o estipulado na Lei Geral Tributária e no Código Contributivo, são indisponíveis.
Pelo contrário, não admissível seria a restrição do conteúdo destes créditos, sem a autorização das referidas entidades.
A este propósito, veja-se acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Outubro de 2023, proferido no processo nº 2395/22.6T8STR.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt, onde se diz[1]:
I – Havendo o plano de revitalização, aprovado e judicialmente homologado, previsto o pagamento em prestações do crédito do Instituto de Segurança Social, bem como a suspensão das suas execuções contra a recuperanda, é inegável que o respectivo conteúdo traduz e consubstancia uma efectiva, real e substantiva restrição ao conteúdo desses mesmos créditos.
II – Ora, o plano de revitalização não pode produzir efeitos que se traduzam na modificação restritiva do conteúdo dos créditos titulados pelo Instituto da Segurança Social, contra a sua vontade, o que constitui violação negligenciável das normas aplicáveis ao seu conteúdo, nos termos e para os efeitos do artigo 215º do CIRE, extensivo ao processo especial de revitalização nos termos do artigo 17º-F, nº 7, do mesmo diploma legal.
III – Contudo, a imposição legal de proibição da modificação restritiva do conteúdo do crédito tributário não implica necessariamente a solução drástica de recusa da homologação judicial do plano de recuperação em processo especial de revitalização, nos termos do artigo 215º e 17º-F, nº 7, do CIRE, que o tornaria totalmente inaproveitável, com frustração dos interesses particulares envolvidos e acentuado prejuízo para a organização económica e empresarial que o sistema jurídico tende a salvaguardar até onde lhe for juridicamente possível.
IV - A solução mais equilibrada e curial, que permitirá harmonizar os interesses sociais e económicos que o legislador se propôs salvaguardar através da instituição do processo de revitalização, bem como os compromissos internacionalmente assumidos, com a intransigente defesa dos créditos tributários em geral, consiste em fixar a ineficácia relativa à homologação do plano de revitalização no que concerne aos créditos reclamados e de que é titular o Instituto da Segurança Social.
V - O plano de revitalização produzirá assim os seus efeitos aproveitando à recuperanda e seus credores na medida do acordado, com excepção daqueles que teriam reflexo na esfera jurídica do Instituto da Segurança Social, enquanto entidade titular do crédito de natureza tributária, ao qual não serão oponíveis, permanecendo intangíveis e imodificáveis no seu conteúdo.
Deste modo, cumpre julgar improcedente o presente recurso.
IV - Decisão
Nestes termos, acordam os Juízes Desembargadores da 1ª Secção deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso, mantendo a decisão recorrida.
Custas pela Apelante – artºs 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº 6 e 663º, nº 2, todos do Código de Processo Civil.
Coimbra, 14 de Outubro de 2025
Com assinatura digital:
Anabela Marques Ferreira
Maria Fernanda Fernandes de Almeida
Maria João Areias
[1] Ver também, na mesma base de dados, recentes acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de Maio de 2025, proferido no processo nº 22595/23.0T8LSB-A.L1.S1, e deste Tribunal da Relação de Coimbra, de 13 da Maio de 2025, proferido no processo nº 565/24.1T8FND.C1.