RECURSO PER SALTUM
LENOCÍNIO
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
NULIDADE DE ACÓRDÃO
INCONSTITUCIONALIDADE
INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO
CÚMULO JURÍDICO
PENA PARCELAR
PREVENÇÃO ESPECIAL
PREVENÇÃO GERAL
PENA ÚNICA
Sumário


I. É jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça que, com a fixação da pena conjunta, pretende-se sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, em termos gerais, mas também, especialmente, pelo seu conjunto, enquanto revelador da dimensão e gravidade global do seu comportamento.
II. Inexiste falta de fundamentação da decisão, nas situações de concurso em que, após a ponderação das circunstâncias que determinam a escolha das penas parcelares e respectiva fundamentação, o Tribunal, em relação à  escolha da pena única, refere que tendo em conta «os factos e a personalidade do arguido, nos termos supra expostos», concluindo pela pena única. Nestas situações não faz sentido que seja necessário repetir todos os elementos que, igualmente, momentos antes, analisaram a personalidade demonstrada pelo arguido.
III. O direito penal do bem jurídico como princípio constitucional, uma vez que o bem jurídico é político-criminalmente tutelável quando e onde encontre reflexo “(…) num valor jurídico constitucionalmente reconhecido em nome do sistema social e que, deste modo, se pode afirmar que “preexiste” ao ordenamento jurídico-penal”.
IV. As condutas descritas no artigo 169º, nº1, do Código Penal não respeitam o princípio da dignidade humana – valor constitucional que representa um dos corolários de um Estado de Direito –, pois este princípio repudia a instrumentalização da pessoa, tratando-a como mero instrumento de prestação sexual, muito mais se justifica a incriminação quando a vítima é forçada à prática dos atos em questão,  aproveitando-se o agente da vulnerabilidade da prostituta para obter, à sua custa, ganhos ilegítimos.
V. Desde a decisão do Tribunal Constitucional de 10 de Março de 2004, no Acórdão n.º 144/2004, pela constitucionalidade do artigo 169.º, n.º 1 do Código Penal, este tribunal tem reiterado essa posição nos vários Acórdãos, entretanto proferidos, sendo dos mais recentes os Acórdãos nº 230/2024, 143/2025 e 145/2025.
Assim, o artigo 169.º, n.º 1 do Código Penal, não padece de qualquer inconstitucionalidade.

Texto Integral

Acordam, em Conferência, na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça.

1. Relatório

1. Nos presentes autos de processo comum, com intervenção de Tribunal Coletivo, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Beja, Juízo Central Cível e Criminal de Beja foi, por acórdão13 de Maio de 2025, o arguido AA condenado, no que a este acórdão interessa, nos seguintes termos:

- pela prática, como autor material, de um crime de lenocínio agravado, p. e p. pelo art.º 169º, nºs 1 e 2, alíneas a) e c), do Código Penal, na pena de três anos de prisão;

- pela prática, como autor material e em concurso efectivo, de um crime de violência doméstica agravada, p. e p. pelo art.º 152.º, n.º 1, alínea b), n.º 2, alínea a) do Código Penal, na pena de três anos e seis meses de prisão, e na pena acessória de proibição de contactos, com afastamento da residência/local de trabalho de BB, pelo período máximo de cinco anos, que será fiscalizada por meios de controlo à distância assim que o arguido for colocado em liberdade, ficando também sujeito à obrigação de frequência de programa específico de prevenção da violência doméstica;

- Em cúmulo jurídico de penas, condenar o arguido AA na pena única de cinco anos e quatro meses de prisão e na pena acessória de proibição de contactos, com afastamento da residência/local de trabalho de BB, pelo período máximo de cinco anos, que será fiscalizada por meios de controlo à distância assim que o arguido for colocado em liberdade, ficando também sujeito à obrigação de frequência de programa específico de prevenção da violência doméstica;

- Não condenar o arguido na pena acessória de expulsão do território nacional, por não estarem verificados os pressupostos previstos no nº. 3 do art. 151º nº.1 da Lei 23/2007, de 04 de Julho;

2. Inconformado, com esta decisão, o arguido, dela interpõe recurso dirigido ao Tribunal da Relação de Évora, mas admitido directamente para este Supremo Tribunal de Justiça, por despacho de 18 de Junho de 2025, formulando, a final, as seguintes “Conclusões

I. Antes de mais, o presente recurso vem interposto do acórdão proferido pelo Juízo Central Cível e Criminal de Beja – Juiz 3, pertencente ao Tribunal Judicial da Comarca de Beja, datado de 13/05/2025, que decidiu condenar o Recorrente pela prática, em concurso efectivo e como autor material, de um crime de lenocínio agravado, p. e p. pelo artigo 169.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e c) e de um crime de violência doméstica agravada, p. ep. Pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, alínea a), ambos do Código Penal, na pena única de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de prisão e na pena acessória de proibição de contactos com a Ofendida, com afastamento da residência e local de trabalho da mesma, pelo período máximo de 5 (cinco) anos.

II. Tendo o Tribunal a quo entendido que se considera adequada a condenação do Arguido nas penas parcelares de prisão de 3(três) anos pela prática do crime de lenocínio agravado e de 3 (três) anos e 6 (seis) meses pela prática do crime de violência doméstica, aplicando ao mesmo, em cúmulo jurídico de penas, a pena única de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de prisão, por ter sido entendido que tal pena se deveria situar num patamar médio superior.

III. Porém, salvo o devido respeito por opinião contrária, por tal entendimento improceder quer de facto, quer de Direito, não pode o mesmo merecer o acompanhamento e o aplauso do Recorrente em qualquer medida.

IV. Por conseguinte, na determinação da medida da pena conjunta, além dos critérios consagrados no artigo 71.º do C.P., o Tribunal tem que ter também em consideração o comando do artigo 77.º, n.º1 do mesmo Código, o qual determina que, na medida da pena, sejam considerados em conjunto os factos e personalidade do agente.

V. Efectivamente, afigura-se ao Recorrente que a pena única que lhe foi aplicada peca por exagero, considerando, por um lado, as medidas concretas dos crimes em que foi condenado e, por outro lado, aprova produzida em sede de audiência de julgamento, bem como toda a demais que foi carreada para os autos, se mostrar manifestamente insuficiente.

VI. Na realidade, como bem salienta o Conselheiro Rodrigues da Costa, no seu estudo “O Cúmulo Jurídico na Doutrina e na Jurisprudência do STJ”, acessível in www.stj.pt, “(…) as penas fixadas em cúmulos jurídicos nas instâncias, são frequentemente desproporcionadas, atingindo muitas vezes o limite legal permitido.”

VII. Salvo o devido respeito por opinião contrária, o Tribunal recorrido, considerando as necessidades de prevenção, quer geral, quer especial, entendeu fixar a pena única conjunta num ponto mais elevado, que se situa num patamar médio mais superior.

VIII.Porém, ao fazê-lo, afastou-se irremediavelmente do critério que deveria ter seguido para determinar o quantum das penas parcelares, verificando-se uma discrepância entre o resultado da avaliação feita relativamente às penas singulares e aquela a que procedeu para a determinação da pena única.

IX. Na realidade, não se compreende, nem se vislumbra qual o critério norteador do Tribunal recorrido para a aplicação de pena tão dura e severa, face à imposição legal da graduação da pena pelos critérios estabelecidos pelos artigos 40.º, 71.º e 77.º, todos do C.P.

X. Ora, tal como sucede com os crimes singulares, também relativamente à pena única é possível estabelecer “(…) a medida óptima da tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias (…) ponto abaixo do qual outros existem em que aquela tutela é ainda efectiva e consistente.” (Cfr. Figueiredo Dias in “Direito Penal Português– II Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 229).

XI. Em bom rigor, face a toda prova carreada para os autos e a toda aquela valorada e produzida em sede de julgamento, nada permite justificar, em termos de adequação, ponderação, necessidade e equilíbrio, o juízo de condenação formulado pelo doutro Tribunal a quo, portanto, sempre deveria aquele Tribunal ter condenado o Arguido numa pena única com uma moldura concreta mais reduzida.

XII. Na linha de pensamento do Prof, Figueiredo Dias, fundamental na formação da pena conjunta é a visão de conjunto, a eventual conexão dos factos entre si e a relação de “bocado de vida criminosa com a personalidade”, devendo a pena conjunta formar-se mediante uma valoração conjunta e completa da pessoa do autor e das diversas penas parcelares.

XIII. Ademais, por força do preceituado no artigo 18.º, n.º 2, da Lei Fundamental, sempre haveria pena menos gravosa que se adequasse melhor à situação social, familiar e laboral do Recorrente, na perspectiva da mínima restrição possível (ou da restrição apenas indispensável) dos Direitos Fundamentais.

XIV. Como se decidiu no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 28/09/2010, referente ao Proc. n.º 514/09.7JELSB.L1-5, sempre se dirá que: “(…) para além da função repressiva, medida pela culpabilidade, a pena deverá também cumprir finalidades preventivas, de protecção de bens jurídicos e de reintegração do agente na sociedade. A pena deverá assim, desencorajar ou intimidar aqueles que pretendem dedicar-se à prática delituosa, por uma parte, e ressocializar o delinquente, por outra.”

XV. Vertendo ao caso concreto, não pode o Recorrente discordar da pena que lhe foi aplicada, considerando-a excessiva e desproporcionada, afigurando-se-nos, salvo o devido respeito por opinião contrária, que o Tribunal a quo não procedeu criteriosamente à avaliação das circunstâncias do caso concreto.

XVI. Efectivamente, sempre o Tribunal a quo devia ter valorado a medida da necessidade da tutela de bens jurídicos e da reintegração da Recorrente de forma mais adequada e harmoniosa, causando-lhe só o mal necessário, em homenagem ao princípio da subsidiariedade do direito penal, funcionando sempre a culpa como limite máximo da pena, dentro da moldura penal encontrada.

XVII. Por outro lado, não foi ainda valorado na devida conta pelo Tribunal a quo o lapso de tempo já decorrido após a prática dos factos em apreço no âmbito do Proc. n.º 1496/15.1T9SNT, do qual resultou sua condenação numa pena de 1 ano e 4 meses, factos datados de 2015, tendo decorridos praticamente nove anos com os factos em apreço nos presentes autos, fazendo-se assim sentir as razões de prevenção geral e especial com muito menor acuidade.

XVIII. Deste modo, não merece acolhimento a dosimetria da pena única aplicada ao Recorrente, pugnando-se, por isso, pela aplicação ao mesmo de uma pena mais adequada e proporcional aos critérios que o caso concreto reclama, tendo o douto Tribunal de 1.ª Instância violado o preceituado nos artigos 40.º, 70.º, 71.º e 77.º, todos da Lei Substantiva Penal.

XIX. Por sua vez, não se pode descurar que a decisão judicial que aplique uma pena conjunta carece sempre de uma especial fundamentação, especificando os motivos de facto e de Direito da respectiva decisão.

XX. Na realidade, segundo a doutrina do Prof. Figueiredo Dias, a concepção da pena conjunta obriga a que do teor da sentença ou acórdão conste uma especial fundamentação, em função de um tal critério, “(…) só assim se evitando que a medida da pena do concurso surja como fruto de um acto intuitivo – da «arte» do juiz … - ou puramente mecânico e portanto arbitrário.”

XXI. No mesmo sentido, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a considerar impor-se um especial dever de fundamentação na elaboração da pena conjunta, a qual não pode reconduzir-se à vacuidade de formas tabelares e desprovidas das razões do facto concreto.

XXII. Nesta conformidade, quanto aos actos decisórios, no artigo 379.º, n.º 1 alínea a) do C.P.P., é legalmente cominado com a nulidade a falta ou insuficiência da fundamentação no que diz respeito às sentenças ou acórdãos.

XXIII. Assim sendo, tendo presente as exigências de fundamentação do acórdão previstas no artigo 374.º, n.º 2 do C.P.P., o que determina que igualmente lhe sejam aplicadas as consequências da violação de tais exigências, constantes do artigo 379.º do mesmo diploma, que sanciona com a nulidade a omissão das menções referidas no n.º 2 daquele preceito legal.

XXIV. Em bom rigor, a fundamentação da decisão em termos mínimos, seja de facto, seja de Direito, deve permitir ao Arguido e ao Tribunal ad quem uma avaliação cabal e segura das razões subjacentes à mesma e ao processo lógico, racional e dedutivo que lhe serviu de suporte.

XXV. Deste modo, tal exigência legal de uma especial fundamentação ou de uma fundamentação minimamente suficiente, quer dos factos, quer do Direito, a que alude o artigo 374.º, n.º 2 do C.P.P. não foi cumprida no acórdão recorrido, razão pela qual resta concluir que o mesmo padece do vício de nulidade de fundamentação insuficiente contemplado no artigo 379.º, n.º 1, alínea a) daquele diploma legal. Sem conceder, caso seja do entendimento de V.Exas. a aplicação de uma moldura concreta inferior ou igual a 5 anos de prisão,

XXVI. Por seu turno, a suspensão da execução da pena não depende de um qualquer modelo de discricionariedade, mas, antes, do exercício de um poder-dever vinculado, devendo ser decretada, na modalidade que se mostrar mais conveniente, sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos.

XXVII. Nesta medida, caso seja aplicada ao Arguido pena inferior a 5 (cinco) anos de prisão, resulta preenchido o pressuposto formal estabelecido pelo artigo 50.º, n.º 1, do C.P., para que o Tribunal deva equacionar a suspensão da respectiva execução.

XXVIII. De facto, ainda que tenham densidade desigual, concorrendo favoravelmente em determinado caso concreto, e verificado como está o pressuposto formal, não deve o Tribunal recusar a pena de substituição, sendo indiferente que a pena de prisão aplicada ao Arguido diga respeito a um só crime ou a um concurso de crimes.

XXIX. Assim, impõe-se, por isso, averiguar se está preenchido o pressuposto material, isto é, averiguar se o Tribunal pode prognosticar que a pena de substituição é adequada e suficiente para assegurar as finalidades da punição e prevenir a reincidência.

XXX. No que respeita ao pressuposto material, refere o Prof. Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português. As Consequências Jurídicas do Crime”, 1993, § 518, que o mesmo encontra-se observado quando o Tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do delinquente: que a simples censura do facto e a ameaça da pena de prisão, acompanhada ou não da imposição de deveres e/ou regras de conduta “(…) bastarão para afastar o delinquente da criminalidade.”

XXXI. Por seu turno, como defende o Prof. Figueiredo Dias a este respeito, in “Direito Penal Português. As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 344: “(…) na formulação do aludido prognóstico, o tribunal reporta-se ao momento da decisão, não ao momento da prática do facto. (…) Como positivamente a podem influenciar circunstâncias posteriores ao facto, ainda mesmo quando elas tenham sido já tomadas em consideração em sede de medida da pena.”

XXXII. Em bom rigor, na sua fundamentação, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo fundou-se mais em considerações ou juízos de culpa e nos antecedentes criminais do Arguido do que nas razões ou fundamentos que presidem à formulação de um juízo de prognose sobre o seu comportamento futuro.

XXXIII. Assim, uma vez que a função da culpa se esgotou no momento da medida concreta da pena, o juízo de prognose para eventual aplicação de uma pena de substituição (designadamente da suspensão da execução), depende em exclusivo de considerações de prevenção especial de socialização e de prevenção geral positiva.

XXXIV. De facto, não se pode descurar que a reclusão (como decidido pelo Tribunal recorrido) não contribui para a reinserção do Recorrente, nem o vai reabilitar para o mundo laboral e para a convivência em sociedade, razão pela qual as exigências de prevenção geral e de prevenção especial são ainda asseguradas com a aplicação ao mesmo de uma pena não privativa da liberdade.

XXXV. Do que vem dito, a censura do facto e a ameaça da pena latentes numa pena de prisão suspensa na sua execução, já serão suficientes e bastantes para afastar o Arguido da criminalidade e satisfazer as necessidades que se podem fazer sentir de reprovação e prevenção da prática de novos crimes.

XXXVI. Em bom rigor, a medida da pena única em que foi condenado e a própria opção por aplicação de uma pena privativa da liberdade, opção do Tribunal Colectivo, não contribuem para a almejada reinserção social do Recorrente, visto o mesmo já ter sido experimentado a reclusão e ter sentido o efeito estigmatizante que lhe é associado, a que não são alheios os seus efeitos negativos, nos níveis social, laboral, familiar e pessoal.

XXXVII. Efectivamente, a aplicação ao Arguido de uma pena suspensa na sua execução, acompanhada de regime de prova, revela-se adequada e suficiente para garantir a tutela dos bens jurídicos e a reinserção do agente na sociedade, enquanto perspectiva que o condenado não volte a delinquir no futuro.

XXXVIII. Formulando-se, assim, um juízo de prognose no sentido de que a pena única o Recorrente foi condenado, de 5 (cinco) anos de prisão, complementada com regime de prova, seja adequada e suficiente para prevenir qualquer tipo de reincidência, assentando tal regime num plano individual de readaptação social a delinear e a ser fiscalizado pela Direcção Geral de Reinserção Social.

XXXIX. Por outra banda, nos presentes autos o Recorrente foi condenado, como autor material, de um crime de lenocínio agravado, p. e p. pelo artigo 169.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e c) do C.P., tendo-lhe sido aplicada relativamente a este crime a pena parcelar de 3 (três) anos de prisão.

XL. De facto, não obstante o Tribunal a quo tenha feito aplicação da norma do artigo 169.º, n.ºs 1 e 2 do C.P., não pode olvidar que a doutrina e a jurisprudência do Tribunal Constitucional se têm debruçado sobre a inconstitucionalidade material desta norma por violação do princípio constitucional do direito penal do bem jurídico e da necessidade da pena.

XLI. Nesta medida, a problemática diz respeito ao direito penal do bem jurídico como princípio constitucional, uma vez que o bem jurídico encontra o seu fundamento no princípio da subsidiariedade do direito penal e do princípio da intervenção mínima do direito penal, enquanto princípio político-criminal da pena como última ratio da política social e da política jurídica.

XLII. Na verdade, como salienta o Prof. Figueiredo Dias, na obra supra indicada, pág. 126, será inconstitucional a incriminação, por decisão do Legislador ordinário, de um comportamento do qual não se pode com razoável segurança afirmar que se destina a proteger um bem jurídico-penal.

XLIII. De acordo com o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 641/2016, não existe dever constitucional de incriminar as condutas previstas no artigo 169.º, n.º 1 do C.P., tendo tal incriminação sido uma opção de política criminal justificada pela normal associação entre as condutas que são designadas como lenocínio e a exploração da necessidade económica e social das pessoas que se dedicam à prostituição, fazendo desta um modo de subsistência.

XLIV. Desta feita, salvo o devido respeito por melhor opinião, a norma do artigo 169.º do C.P. não satisfaz as exigências de que a Lei Fundamental faz depender a legitimação material da criminalização.

XLV. Aqui chegados, a norma do artigo 169.º, n.ºs 1 e 2 do C.P. padece de inconstitucionalidade material, por violação do princípio da proporcionalidade, na vertente da necessidade, consagrado no artigo 18.º, n.º 2 do C.R.P., o que determina a revogação do acórdão recorrido e absolvição do Recorrente no que respeita à prática do crime de lenocínio agravado, em face da recusa de aplicação de uma norma incriminatória que deve ser julgada inconstitucional.

1. Ao recurso respondeu a Senhora Procuradora da República no Juízo Central Criminal de Beja, concluindo do seguinte modo:

1. O recorrente foi condenado pela prática, como autor material e em concurso efetivo, de um crime de lenocínio agravado, previsto e punível pelo artigo 169º/1 e 2, al. a) e c), do Código Penal, na pena de 03 anos de prisão, e, pela prática, como autor material, de um crime de violência doméstica agravada, previsto e punível pelo artigo 152º/1, al. b), n.º 2, al. a) do Código Penal, na pena de 03 anos e 06 meses de prisão, em cumulo jurídico, O recorrente foi condenado pela prática, como autor material e em concurso efetivo, de um crime de lenocínio agravado, previsto e punível pelo artigo 169º/1 e 2, al. a) e c), do Código Penal, na pena de 03 anos de prisão, e, pela prática, como autor material, de um crime de violência doméstica agravada, previsto e punível pelo artigo 152º/1, al. b), n.º 2, al. a) do Código Penal, na pena de 03 anos e 06 meses de prisão, em cumulo jurídico, na pena única de 05 anos e 04 meses de prisão, e na pena acessória de proibição de contactos, com afastamento da residência/local de trabalho de BB, pelo período máximo de cinco anos, que será fiscalizada por meios de controlo à distância assim que o arguido for colocado em liberdade, ficando também sujeito à obrigação de frequência de programa específico de prevenção da violência doméstica;

2. Inconformado com a determinação da pena única, o arguido interpôs recurso do acórdão, pugnando por uma pena única, inferior a 05 anos e suspensa na sua execução. O recorrente considera a pena determinada excessiva e desproporcional, alegando que o Tribunal ao quo não avaliou as circunstâncias do caso concreto, mais considera que o Tribunal a quo não fundamentou suficientemente de facto e de direito a elaboração da pena.

3. Cremos, salvo o devido respeito, que não assiste razão ao recorrente, não merecendo censura o Douto Acórdão e, consequentemente, o recurso está condenado à improcedência.

4. Antes de mais, só em caso de desproporcionalidade na sua fixação ou necessidade de correção dos critérios de determinação da pena concreta, atentos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso, deverá intervir o Tribunal de 2ª Instância alterando o quantum da pena concreta. Caso contrário, isto é, mostrando-se respeitados todos os princípios e normas legais aplicáveis e respeitado o limite da culpa, não deverá o Tribunal de 2ª Instância intervir corrigindo/alterando o que não padece de qualquer vício.

5. In casu, a pena fixada ao recorrente não merece qualquer reparo.

6. Na determinação concreta da pena, as finalidades de aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela dos bens jurídicos e na possível reinserção do agente na comunidade. A pena não pode ultrapassar a medida da culpa. Tal ensinamento tem consagração legal expressa nos artigos 40º/2 e 71º/1, ambos do Código Penal.

Depois, impõe-se a valoração dos concretos fatores de determinação de medida da pena previstos no artigo 71º/2 do Código Penal.

7. Fatores esses que o Coletivo de Juízes a quo fundamentou no processo de determinação da medida concreta da pena aplicada, especificando-os e valorando-os corretamente.

8. O Coletivo de Juízes a quo asseverou das exigências de prevenção geral que são elevadíssimas, porquanto os crimes em apreço inserem-se no conceito generalizado de violência de género, que continua a marcar a sociedade portuguesa e onde ainda são elevadas as cifras negras, constituindo um verdadeiro flagelo nacional;

9. Considerou que o arguido agiu sempre com dolo direto, no qual persistiu face à reiteração dos seus comportamentos;

10. Situou a ilicitude num plano elevado em ambos os crimes, atendendo ao grau de violência física e psíquica infligida, ao tempo por que perdurou esse seu comportamento, e as respetivas motivações, ou seja, a exploração económica da vítima, quer através da sua sujeição à prostituição, quer através da apropriação dos rendimentos que a mesma gerava licitamente através da sua força de trabalho;

11. Ponderou os antecedentes criminais do recorrente, nomeadamente a sua condenação pela prática de outro crime de lenocínio, tendo cumprido pena de prisão efetiva por factos ocorridos em 2015, o que não o demoveu de voltar a repetir factos semelhantes,

12. Aquilatou das suas condições socioeconómicas e de saúde, e,

13. Verificou ainda a total ausência de qualquer manifestação de arrependimento, ou sequer de interiorização do desvalor das suas condutas.

14. Assim, tem que se considerarem adequadas as penas parcelares determinadas pelo Coletivo de Juízes a quo de 03 anos quanto ao crime de lenocínio e de 03 anos e 06 meses quanto ao crime de violência doméstica.

15. Chegado aqui, considerando os factos e a personalidade do recorrente, o Coletivo de Juízes a quo determinou a pena única em 05 anos e 04 meses de prisão, pena que se situa no patamar médio superior entre a pena de 03 anos e 06 meses (pena maior) e 06 anos e 06 meses (soma das penas parcelares).

16. Pena única que não merece qualquer reparo, smo.

17. Com efeito, a determinação da medida concreta da pena única deve atender aos critérios gerais da prevenção e da culpa, nos termos do disposto no artigo 71º do Código Penal, e ainda ao critério especial previsto pelo artigo 77º/1 do Código Penal: a consideração conjunta dos factos e da personalidade do agente, na sua relação mútua.

18. Ao tribunal impõe-se uma apreciação global dos factos, tomados como conjunto, e não enquanto somatório de factos desligados, na sua relação com a personalidade do agente.

19. O comportamento do recorrente que perdurou pelo menos por 10 anos, os graus de violência física e psíquica infligidos à vítima, que eram de tal tamanho, visíveis a terceiros que lidavam com a vítima, a exploração económica da vítima pelo recorrente, através da sujeição da vítima à prostituição e apropriação dos seus rendimentos obtidos pelo seu trabalho no supermercado, a personalidade violenta do recorrente, incapaz de respeitar a vitima, sua companheira/esposa, não verbalizando nem demonstrando qualquer arrependimento, mostrando-se completamente indiferente aos valores que o direito protege invalidam qualquer demonstração de atenuação da necessidade da pena, sendo elevadíssimas em nosso entender, as necessidades de prevenção geral e de prevenção especial.

20. Nestes termos, entendemos que a pena única de 05 anos e 04 meses de prisão não se mostra excessiva, pelo que bem decidiu o Coletivo de Juízes a quo.

21. Estando condenado em pena de prisão superior a cinco anos, não se apreciará o aludido pedido de suspensão da pena de prisão cominada.

1. Por sua vez, ao abrigo do artigo 416.º do CPP, veio o Senhor Procurador-Geral Adjunto junto do Supremo Tribunal de Justiça emitir parecer, tendo concluído pela improcedência do recurso, uma vez que:

1. Quanto à determinação da medida da pena, “não se vê que as penas – parcelares e única – aplicadas ao recorrente mostrem necessidade de qualquer correção, pois que, atenta toda a fundamentação utilizada para as fixar, não se justificariam ser reduzidas, como pede o recorrente”;

2. Quanto à invocada nulidade por falta de fundamentação da pena única aplicada em cúmulo jurídico das duas penas parcelares, entendeu pela “suficiente fundamentação do acórdão recorrido quanto à pena única ali achada”, tendo transcrito diversos excertos do acórdão do tribunal a quo, de onde consta essa fundamentação;

3. Quanto à invocada inconstitucionalidade do crime de lenocínio, concluiu que “desde a decisão do Tribunal Constitucional pela constitucionalidade do artigo 169.º, n.º 1 do CP no Acórdão n.º 144/2004, este tribunal tem reiterado essa posição nos vários Acórdãos, entretanto proferidos, sendo um dos mais recentes o Acórdão nº 230/2024 que, mais uma vez, veio reafirmar aquela posição anterior deste tribunal”. Esta necessidade de punição deste tipo de comportamentos seria ainda mais evidente em casos como os dos presentes autos, em que “a vítima é forçada à prática dos atos em questão, aproveitando-se o agente da vulnerabilidade da prostituta para obter, à sua custa, ganhos ilegítimos”.

1. Notificado deste parecer, nos termos e para efeitos do n.º 2 do artigo 417.º do Código de Processo Penal, o Recorrente respondeu, tendo concluído no mesmo sentido das alegações de recurso supra referidas e a reafirmando as suas posições.

2. Colhidos os vistos e não tendo sido requerida audiência, o recurso foi à conferência – arts. 411.º, n.º 5, e 419.º, n.º 3, al. c), do CPP.

Decidindo,

2. Fundamentação

1. Factos provados

1. AA e a ofendida BB, mantêm um relacionamento amoroso, como de marido e mulher, desde o final de Julho de 2013, tendo passado a viver juntos ao fim de 10 dias de namoro.

2. Conheceram-se em Portugal e sempre viveram em ..., à excepção de cerca dois meses, em que estiveram em ... na apanha da azeitona, no início do relacionamento.

3. Cerca de 5 meses depois de começarem a viver juntos e até há cerca de 3 anos, o arguido constrangeu a ofendida a prostituir-se, usando, para tanto, o argumento de que era preciso fazer dinheiro.

4. O arguido obrigava aquela a manter relações sexuais com diversos homens, que aquele arranjava e lhe encaminhava, a troco de € 50,00 a € 60,00 por cada homem e acto.

5. A ofendida era obrigada a prostituir-se sempre que o arguido lhe mandava clientes, em dias e horas que apenas o próprio decidia, o que acontecia, às vezes, 2/3 vezes por dia, outras vezes, 2/3 vezes semana, a frequência dependia de quando os clientes tinham dinheiro.

6. Quando o cliente saía, o arguido entrava no quarto onde a ofendida estava e recolhia o dinheiro, que guardava consigo sem dar àquela qualquer parte, e usava-o em benefício próprio exclusivo.

7. O arguido não tinha, à altura, qualquer tipo de rendimento de trabalho.

8. De todas as vezes que manteve relações sexuais com terceiros, à ordem do arguido, a ofendida fê-lo contra a sua vontade e condicionada não só pelas agressões físicas de que foi alvo, quando recusava, mas também pelas ameaças que o arguido lhe dirigiu.

9. Sempre que a ofendida disse que não queria e que não o faria, o arguido bateu-lhe com chapadas, mas maioritariamente com socos, acabando por ficar com o corpo marcado e com dores.

10. Em face da recusa da ofendida, o arguido chegou a dizer-lhe que se não o fizesse, “fodia a mãe dela” e que depois “a matava-a a ela”, ofendida.

11. Ao longo do relacionamento, por muitas vezes, em datas não apuradas, o arguido desferiu socos e chapadas onde quer que calhasse no corpo da ofendida e quando, em consequência, caiu no chão, o que aconteceu por mais do que uma vez, o arguido continuou a desferir-lhe pontapés contra o corpo.

12. O arguido bateu-lhe sempre que ela não fez algo que ele queria, pelo que, por medo, a ofendida acabava por ceder muitas vezes aos seus caprichos.

13. E quase sempre que lhe bateu, o arguido cuspiu-lhe para cima.

14. Desde o início do relacionamento que o arguido apodou a ofendida de “egoísta”, “puta” e disse-lhe que “é um lixo”, que “não vale dois cêntimos” e que “não presta para nada”.

15. Em data não apurada, mas em Janeiro ou Fevereiro de 2024, o arguido desferiu vários pontapés que, entre o mais, acertaram na perna da ofendida, a qual ficou com perna toda negra, o que sucedeu porque o arguido queria que aquela continuasse a prostituir-se, mas ela negou porque já não aguentava mais e já tinha outro trabalho num supermercado.

16. Foi a ofendida que pagou todas as despesas da casa que habitavam, incluindo a renda, cujo contrato está em nome do arguido.

17. Em 30.03.2024 o arguido desferiu um número não apurado de murros, que atingiram várias partes do corpo da ofendida e disse que a matava.

18. Em 06.04.2024, depois de ter efetuado a queixa-crime contra o arguido, a ofendida estava a jantar, aquele chegou a casa e exaltou-se por não gostar da comida.

19. Acto contínuo, perguntou à ofendida se tinha pago a renda da casa, ela disse que não porque o contrato estava em nome dele, o que gerou uma raiva tal no arguido que, de imediato, desferiu socos e pontapés no corpo da ofendida, em número não apurado, e deu-lhe até ao dia seguinte, ao meio dia, para pagar senão metia-a na rua.

20. Disse-lhe ainda que era “puta”, “egoísta”, que “era uma mulher que não valia dois cêntimos” e que “sem ele ela seria o maior lixo de ...”.

21. A ofendida sentiu-se triste e chorou.

22. Todos os factos descritos, incluindo os actos de relações sexuais com terceiros, à ordem do arguido, ocorreram na residência de ambos, sita em Rua 1, ....

23. A ofendida não pode sair de casa que habitava com o arguido porque não há casas para arrendar na região, pelo que, se saísse, não tinha onde viver.

24. Assim como não aceitou ir para casa abrigo para não perder o seu trabalho no supermercado.

25. Não obstante, todos os dias sentiu medo de estar com ele na mesma casa.

26. A ofendida não tem mais ninguém em Portugal, ninguém em quem possa confiar, está cá sozinha.

27. A ofendida detesta a sua vida, sente-se desesperada, tem vergonha de olhar para os olhos das pessoas e sente-se humilhada, triste e com medo do que lhe possa acontecer.

28. Em razão do desespero que sentiu e ainda sente em consequência das condutas do arguido, a ofendida tinha e tem ideias suicidas.

29. O arguido age regido por impulsos de raiva que não controla e faz só o que lhe apetece.

30. Declarados, o arguido apenas aufere os rendimentos sociais de reinserção e de inclusão, no valor de € 553,58.

31. Ao agir do modo supra descrito, o Arguido quis maltratar física e psicologicamente a ofendida, ao longo de todo período em que se relacionaram, como efectivamente maltratou, bem como pretendeu amedrontá-la, com as expressões e condutas que usou e lhe dirigiu, o que conseguiu, originando-lhe um medo constante das suas reacções, como medo daquilo que pudesse vir a fazer no futuro, contra a sua integridade física ou a sua vida.

32. O arguido, com fim lucrativo, visou e conseguiu sujeitar a ofendida, através de ameaças e agressões físicas caso recusasse, a manter relações sexuais com terceiros, a troco de dinheiro com o qual ficou na totalidade para seu uso exclusivo, bem sabendo que agia contra a vontade daquela e em manifesta violação da sua liberdade e autodeterminação pessoal e sexual.

33. O que fez, bem sabendo que, ao ameaçá-la a ela e à mãe de morte, ou de que a colocava a viver na rua, ou mesmo através de ofensas à integridade física, mais facilmente aquela se subjugaria a essa sua vontade, como aconteceu.

34. O arguido com as suas condutas, visou ainda humilhar a ofendida e feri-la na sua honra, consideração e valor enquanto mulher e ser humano, o que conseguiu.

35. O Arguido agiu consciente, voluntária, livre e deliberadamente, bem sabendo serem as suas condutas proibidas por lei e que tinha a liberdade necessária para se determinar de acordo com essa avaliação.

Mais se provou que

36. O arguido é titular de autorização de residência permanente nº. ...95.

37. O arguido foi condenado:

- em pena de multa, entretanto convertida em dias de prisão subsidiária, pela prática, em 2012, de crime de condução sem habilitação legal, já extinta pelo cumprimento – Proc. 337/12.6GBODM;

- na pena de um ano e quatro meses de prisão efectiva pela prática, em 2015, dos crimes de lenocínio e detenção de arma proibida, transitada em julgado em Maio de 2018 e já extinta pelo cumprimento – Proc. 1496/15.1T9SNT.

38. AA encontra-se afecto ao Estabelecimento Prisional de ..., no qual deu entrada em 19 de Junho do ano transacto, em cumprimento da medida de coação de prisão preventiva, aplicada nos presentes autos. O arguido apresenta um comportamento institucional adaptado às regras e normas que regem o universo penitenciário. Sem familiares em Portugal e sem poder beneficiar da visita da companheira, BB, face à determinação judicial de proibição de contactos, AA não tem visitas. Cidadão de nacionalidade búlgara, de 56 anos de idade, o arguido acedeu a Portugal há cerca de 15 anos, altura em que não tinha trabalho no seu país e se encontravam amigos em Portugal, situação que o determinou a emigrar. Trabalhou na agricultura, nas estufas e na construção civil, área de actividade que desenvolveu também no seu país. Posteriormente trabalhou numa refinaria e numa loja de electrodomésticos. Problemas de saúde ao nível da coluna vertebral, que se têm agravado, impossibilitaram AA de manter trabalho em que necessitasse de efectuar esforços físicos, pelo que, e para complementar a pensão que lhe foi concedida pela incapacidade de 65% que lhe foi atribuída, ocupou-se como motorista, durante os dois meses que antecederam a sua prisão, para um bar em ..., efectuando o transporte de raparigas que aí trabalhavam. Beneficiou anteriormente da concessão de RSI – Rendimento Social de Inserção. AA conheceu a companheira em Portugal, mantendo com esta união de facto de mais de uma década. Na sua perspectiva o relacionamento era afectivamente compensador, persistindo, no entanto, algumas divergências, nomeadamente quanto a consumos de bebidas alcoólicas que considerava excessivos, efectuados pela companheira. O arguido cresceu numa família numerosa e carenciada, composta pelos pais e sete descendentes, dos quais o arguido se constitui o terceiro, por ordem de nascimento. O pai trabalhava como ajudante numa fábrica e a mãe ocupava-se em limpezas. Os progenitores já faleceram, assim como uma das irmãs. Frequentou o ensino durante 10 anos, sem reprovações. Deixou a frequência escolar aos 18 anos. Iniciou a sua actividade laboral na área da construção civil, na qual trabalhou enquanto permaneceu na Bulgária. AA tem quatro filhos, adultos, fruto de dois relacionamentos, o último dos quais perdurou até cerca de um ano antes de emigrar. O filho mais velho está emigrado na Holanda. Ao longo da permanência em Portugal o arguido visitou a família, em férias, por 5-6 vezes.

2. De Direito

1. É pelas conclusões que se afere o objeto do recurso (cfr. artigos. 402.º, 403.º, 410.º e 412.º do Código de Processo Penal), sem prejuízo, dos poderes de conhecimento oficioso (artigos. 410.º, n.ºs 2 e 3 e 379.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, e AFJ n.º 7/95, DR-I, de 28-12-1995, publicado na 1ª Série, de 28-12-1995).

Assim, o seu âmbito é limitado ao reexame de matéria de direito, da competência, efetivamente, do Supremo Tribunal de Justiça - cfr. artigos 432.º, n.ºs 1, al. c) e 2 e 434.º, do Código de Processo Penal) -, sem prejuízo de se poder recorrer com os fundamentos previstos nos n.ºs 2 e 3 do artigo 410.º do Código de Processo Penal - artigo 432.º, n.º 1, al. c), parte final, (na redação dada pela Lei n.º 94/2021, de 21-12).

Deverá, assim, o Supremo Tribunal de Justiça conhecer e decidir:

i. da medida da pena única aplicada, uma vez que considera o Recorrente que o cúmulo se mostra manifestamente desfavorável, pelo que, deverá ser aplicada uma combinação de penas que se traduza na aplicação de uma pena mais favorável ao mesmo;

ii. da nulidade do acórdão por insuficiência da fundamentação, nos termos do disposto no artigo 379.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Penal;

iii. da possível suspensão da execução da pena única aplicada ao Recorrente, nos termos do artigo 50.º do Código Penal;

iv. da inconstitucionalidade material da norma do artigo 169.º, n.º 1 e 2 do Código Penal, por eventual violação do princípio da proporcionalidade, na vertente da necessidade, consagrado no artigo 18.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, o que determinaria a revogação do acórdão recorrido e absolvição do Recorrente no que respeita à prática do crime de lenocínio agravado

2. Da medida da pena única aplicada

Quanto à determinação da medida da pena, dispõe o artigo 71. ° do Código Penal que:

1 - A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.

2 - Na determinação concreta da pena o Tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando, nomeadamente:

a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;

b) A intensidade do dolo ou da negligência;

c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;

d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;

e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime:

f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.

3 - Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena”.

Por seu turno, determina o art.º 77º, n.º 1 do CP, que quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.

E, dispondo sobre o conhecimento superveniente do concurso, diz o art.º 78º, n.º 1 do CP que se, depois de uma condenação transitada em julgado, se mostrar que o agente praticou, anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, são aplicáveis as regras do artigo anterior, sendo a pena que já tiver sido cumprida descontada no cumprimento da pena única aplicada ao concurso de crimes. Acrescentando o n.º 2 que o disposto no número anterior só é aplicável relativamente aos crimes cuja condenação transitou em julgado.

A moldura penal do concurso é obtida a partir das penas parcelares, que, por sua vez, são obtidas seguindo o procedimento normal de determinação e escolha das penas.

Em caso de conhecimento superveniente, o que não acontece nos autos, o processo está encerrado, quanto às penas parcelares, com o trânsito em julgado da decisão relativamente a cada uma delas, nos processos em que foram aplicadas1.

A pena única referida no artigo 77.º, n.º 1, do CPP, corresponde, assim, a uma pena conjunta que tem por base as correspondentes aos crimes em concurso, procedendo-se não ao cúmulo material, mas jurídico.

A pena aplicável aos crimes em concurso tem, como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e, como limite máximo, a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, sem ultrapassar 25 anos, tratando-se de pena de prisão, e 900 dias, tratando-se de pena de multa - artigo 77.º, n.º 2, do CP.

No âmbito das molduras legais predeterminadas pelo legislador, cabe ao juiz encontrar a medida da pena de acordo com os critérios legais, ou seja, de forma “juridicamente vinculada”. “Hoje não se aceita que o procedimento de determinação da pena seja atribuído à discricionariedade não vinculada do juiz ou à sua “arte de julgar”2, sem que, porém, se chegue com precisão matemática à determinação de um quantum exato de pena3.

Assim, em termos gerais, obtida a moldura penal, há a considerar no processo de determinação da medida concreta da pena as finalidades da punição, constantes do artigo 40.º do CP, e os comandos para determinação da medida concreta da pena dentro dos limites da lei, a que se refere o artigo 71º do CPP.

“Como critério especial, rege o artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, sobre as regras da punição do concurso de crimes (artigo 30.º, n.º 1), dispondo que, quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena, formada a partir da moldura do concurso, para cuja determinação, seguindo-se os critérios da culpa e da prevenção atrás mencionados (artigo 71.º), são considerados, em conjunto, e como critério especial, os factos e a personalidade do agente (n.º 1 do artigo 77.º, in fine), com respeito pelo princípio da proibição da dupla valoração.

Aqui se incluem, designadamente, as condições económicas, familiares e sociais, como a sua inserção na sociedade na comunidade em que reside e a situação laboral, reveladoras das necessidades de socialização, a receptividade das penas, a capacidade de mudança em consequência, a suscetibilidade de por elas ser influenciado e as qualidades da personalidade manifestadas no facto, nomeadamente a falta de preparação para manter uma conduta lícita”4.

Vem sendo jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça que, com a fixação da pena conjunta, pretende-se sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, em termos gerais, mas também, especialmente, pelo seu conjunto, enquanto revelador da dimensão e gravidade global do seu comportamento.

Como se escreveu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de maio de 2011,“Na determinação da pena única a aplicar, há que fazer uma nova reflexão sobre os factos em conjunto com a personalidade do arguido, pois só dessa forma se abandonará um caminho puramente aritmético da medida da pena para se procurar antes, adequá-la à personalidade unitária que nos factos se revelou5.

A pena conjunta tenderá a ser uma pena voltada para ajustar a sanção – dentro da moldura legal – à unidade relacional de ilícito e de culpa, fundada na conexão auctoris causa própria do concurso de crimes6.

Em tudo devem ainda considerar-se “os princípios da proporcionalidade, da adequação e proibição do excesso7, que deve presidir à fixação da pena conjunta8.

Na verdade, como ensina o Prof. Figueiredo Dias, “Tudo se deve passar como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma “carreira”) criminosa, ou tão só, uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)”.9

As conexões ou ligações fundamentais, na avaliação da gravidade do ilícito global, são as que emergem do tipo e número de crimes; da maior ou menor autonomia e frequência da comissão dos delitos; da igualdade ou diversidade de bens jurídicos protegidos violados; da motivação subjacente; do modo de execução, homogéneo ou diferenciado; das suas consequências e da distância temporal entre os factos – tudo analisado na perspetiva da interconexão entre todos os factos praticados e a personalidade global de quem os cometeu, de modo a destrinçar se o mesmo tem propensão para o crime, ou se, na realidade, estamos perante um conjunto de eventos criminosos episódicos, devendo a pena conjunta refletir essas singularidades da personalidade do agente10.

A pena deve, ainda, servir finalidades exclusivamente de prevenção geral e especial, assumindo a culpa um papel meramente limitador da pena, não podendo ultrapassá-la”11.

E, para além dos factos praticados, importa, ainda, ponderar as condições pessoais e económicas do agente, a sua recetividade à pena e a suscetibilidade de ser por ela influenciado, elementos particularmente relevantes para apuramento das exigências de prevenção12.

Dito isto, na decisão a quo, teve-se em consideração as condenações passadas do arguido, que assumem relevância.

Tudo visto, analisados os factos globalmente, bem como a personalidade do arguido, o Tribunal a quo fixou as seguintes penas únicas:

a) pela prática, como autor material, de um crime de lenocínio agravado, p. e p. pelo artigo 169.º, nºs 1 e 2, alíneas a) e c), do CP, a pena de três anos de prisão;

b) pela prática, como autor material e em concurso efectivo, de um crime de violência doméstica agravada, p. e p. pelo art.º 152.º, n.º 1, alínea b), n.º 2, alínea a) do CP, na pena de três anos e seis meses de prisão, e na pena acessória de proibição de contactos, com afastamento da residência/local de trabalho de BB, pelo período máximo de cinco anos, que será fiscalizada por meios de controlo à distância assim que o arguido for colocado em liberdade, ficando também sujeito à obrigação de frequência de programa específico de prevenção da violência doméstica.

Estabelecida a forma como se relacionam a culpa e a prevenção, quer geral quer especial, no processo de determinação concreta da pena impõe-se a valoração dos concretos fatores de determinação de medida da pena previstos no artigo 71º, n.º 2 do CP.

Factores esses que o Coletivo de Juízes a quo fundamentou no processo de determinação da medida concreta da pena aplicada, especificando-os e valorando-os corretamente.

No respeitante ao crime de lenocínio agravado, o Coletivo de Juízes referiu que: “ao nível objectivo resultou demonstrado que o arguido obrigava a vítima, sua companheira, através de agressões e sob ameaça contra a sua vida, a prostituir-se a troco de dinheiro, dinheiro esse que era integralmente recolhido pelo arguido para seu próprio e exclusivo proveito. (…)

O arguido agiu com dolo directo, uma vez que se aproveitou do relacionamento marital e do ascendente físico e psíquico que tinha sobre a vítima para a constranger a prostituir-se, e assim obter o correspondente benefício económico, bem sabendo que agia contra a vontade daquela e em manifesta violação da sua liberdade e autodeterminação pessoal e sexual.”

No respeitante ao crime de violência doméstica agravada, referiu que: “em suma provou-se que, numa actuação reiterada durante uma relação que perdurou por mais de 10 anos, o arguido agrediu frequentemente a vítima, com murros e pontapés por todo o corpo, injuriou-a e ameaçou-a de morte, obrigava-a a pagar todas as despesas da casa , ficando lhe com o dinheiro do ordenado. A vítima vivia num clima de constante medo e sobressalto, temendo pela sua integridade física e pela própria vida, chegando a equacionar o suicídio, sendo que os factos ocorreram no interior da residência comum. Ao nível subjectivo, o arguido agiu com dolo directo, uma vez que quis maltratar física e psicologicamente a ofendida, ao longo de todo período em que se relacionam, como efectivamente maltratou, bem como pretendeu amedrontá-la, com as expressões e condutas que usou e lhe dirigiu, o que conseguiu visando ainda humilhá-la e feri-la na sua honra, consideração e valor enquanto mulher e ser humano, o que conseguiu”.

Pelo que o Coletivo de Juízes asseverou das exigências de prevenção geral que são elevadíssimas, porquanto os crimes em apreço inserem-se no conceito generalizado de violência de género, que continua a marcar a sociedade portuguesa e onde ainda são elevadas as cifras negras, constituindo um verdadeiro flagelo nacional.

Considerou que o arguido agiu sempre com dolo direto, no qual persistiu face à reiteração dos seus comportamentos;

Situou a ilicitude num plano elevado em ambos os crimes, atendendo ao grau de violência física e psíquica infligida, ao tempo por que perdurou esse seu comportamento, e as respetivas motivações, ou seja, a exploração económica da vítima, quer através da sua sujeição à prostituição, quer através da apropriação dos rendimentos que a mesma gerava licitamente através da sua força de trabalho;

Ponderou os antecedentes criminais do recorrente, nomeadamente a sua condenação pela prática de outro crime de lenocínio, tendo cumprido pena de prisão efetiva por factos ocorridos em 2015, o que não o demoveu de voltar a repetir factos semelhantes,

Aquilatou das suas condições socioeconómicas e de saúde, e, verificou ainda a total ausência de qualquer manifestação de arrependimento, ou sequer de interiorização do desvalor das suas condutas – o Recorrente não prestou declarações em sede de audiência de julgamento.

Assim, têm de se considerar adequadas as penas parcelares determinadas pelo Coletivo de Juízes a quo de 3 anos quanto ao crime de lenocínio e de 3 anos e 6 meses quanto ao crime de violência doméstica.

Chegado aqui, considerando os factos e a personalidade do Recorrente, o Coletivo de Juízes a quo determinou a pena única em 5 anos e 4 meses de prisão, pena que se situa no patamar médio superior entre a pena de 3 anos e 6 meses (pena maior) e 6 anos e 6 meses (soma das penas parcelares).

Pena única que não merece qualquer reparo.

Com efeito, a determinação da medida concreta da pena única deve atender aos critérios gerais da prevenção e da culpa, nos termos do disposto no artigo 71º do Código Penal, e ainda ao critério especial previsto pelo n.º 1 do artigo 77º do Código Penal: a consideração conjunta dos factos e da personalidade do agente, na sua relação mútua.

Ao tribunal impõe-se uma apreciação global dos factos, tomados como conjunto, e não enquanto somatório de factos desligados, na sua relação com a personalidade do agente.

Essa apreciação deverá indagar se a pluralidade de factos delituosos corresponde a uma tendência da personalidade do agente, ou antes a uma mera pluriocasionalidade, de carácter fortuito ou acidental, não imputável a essa personalidade.

A determinação da pena única, quer pela sua sujeição aos critérios gerais da prevenção e da culpa, quer pela necessidade de proceder à avaliação global dos factos na ligação com a personalidade, não é compatível com a utilização de critérios rígidos ou com fórmulas matemáticas ou abstratas de fixação da sua medida.

O comportamento do recorrente que perdurou pelo menos por 10 anos, os graus de violência física e psíquica infligidos à vítima, que eram de tal tamanho, visíveis a terceiros que lidavam com a vítima, a exploração económica da vítima pelo recorrente, através da sujeição da vítima à prostituição e apropriação dos seus rendimentos obtidos pelo seu trabalho no supermercado, a personalidade violenta do recorrente, incapaz de respeitar a vitima, sua companheira/esposa, não verbalizando nem demonstrando qualquer arrependimento, mostrando-se completamente indiferente aos valores que o direito protege invalidam qualquer demonstração de atenuação da necessidade da pena, sendo elevadíssimas em nosso entender, as necessidades de prevenção geral e de prevenção especial.

Note-se, aliás, que na sua douta motivação de recurso, apenas uma (e só uma) circunstância concreta é invocada (a final da 10ª folha), consistente na antiguidade do antecedente criminal do arguido no âmbito do processo 1496/15.1T9SNT.

Ora, isso não pode relevar a favor do arguido, antes releva precisamente em termos agravativos – estamos perante uma condenação pela prática do mesmo tipo de crime (lenocínio) anteriormente sofrida pelo arguido e, como tal, bem demonstrativa do desvalor da sua personalidade ao insistir na prática de novo crime da mesma natureza.

Nestes termos, e tendo em conta que a intervenção do tribunal superior, em matéria de medida da pena, assume um carácter essencial de “remédio jurídico”, tendo como pressuposto de intervenção a verificação de incorrecções, erros, violação das normas legais aplicáveis ou violação dos princípios constitucionais, nomeadamente o da proporcionalidade nas várias dimensões em que o mesmo se desdobra, entendemos que a pena única de 5 anos e 4 meses de prisão não se mostra excessiva, pelo que bem decidiu o Coletivo de Juízes a quo.

3. Da insuficiente fundamentação do acórdão recorrido e sua nulidade

Como uniformemente tem sido entendido neste Supremo Tribunal, “do dever de fundamentação das decisões judiciais decorre, como tem sido salientado (cfr., por exemplo, o acórdão do Tribunal Constitucional de 23.2.2007, DR 2.ª Série de 23.02.2007, que se segue e transcreve, bem como o acórdão deste STJ de 16.3.2005, no processo 5P662, relator Cons. Henriques Gaspar, em www.dgsi.pt), que, nas decisões sobre matéria de facto, é obrigatória a indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, com a explicitação das razões dessa decisão, em termos de habilitar o seu destinatário a, ciente dessas razões, se conformar com a decisão ou a impugná-la de forma eficiente. É o exame crítico das provas que credibiliza a decisão, viabiliza o recurso e permite revelar o raciocínio lógico do tribunal relativamente à própria decisão, os motivos que levaram a dar como provados certos factos e não outros, tendo em conta que o princípio geral em matéria de avaliação das provas é o da livre apreciação pelo julgador (artigo 127.º do CPP). 13.

Contudo, somos de entender, como referido supra, que o Acórdão recorrido não violou quaisquer normas e tão pouco está ferido de qualquer nulidade.

Vejamos.

A propósito das consequências da falta ou insuficiente fundamentação das decisões judiciais, a doutrina e jurisprudência maioritárias têm perfilhado o entendimento de que a falta ou insuficiência da sua fundamentação constitui uma nulidade por força do disposto no artigo 379.º do Código de Processo Penal.

Desta feita, tendo presente as exigências de fundamentação da sentença previstas no artigo 374.º, n.º 2 do CPP, o que determina que igualmente lhe sejam aplicadas as consequências da violação de tais exigências, constantes do artigo 379.º do mesmo diploma, que sanciona com a nulidade a omissão das menções referidas no n.º 2 daquele preceito legal.

Com efeito, o Tribunal a quo optou por estruturar a decisão recorrida nos moldes previstos no artigo 374.º do CPP para as sentenças, fazendo da mesma constar um relatório, factos assentes e sua fundamentação, tendo cumprido com as exigências legalmente previstas para os actos decisórios, afigurando-se-nos que a mesma é claramente suficiente no que respeita à sua fundamentação de direito.

Com efeito, no acórdão recorrido, no capítulo da escolha das penas, é referido o seguinte (reproduz-se):

«Medida da Pena:

A determinação da medida concreta da pena faz-se em função da culpa do agente e das exigências da prevenção, tendo em conta todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o arguido (art. 71º do CP). Sendo que, em caso algum, a medida da pena pode ultrapassar a medida da culpa (art. 40º, n. 2, do CP).

Dispõe, ainda, o art.º 40.º, do CP, que “a aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” (n.º 1). Acrescenta o art.º 71.º, n.º 1: «A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção».

Em suma, a culpa e a prevenção constituem os dois termos do binómio que importa ter em conta para encontrar a medida correcta da pena (neste sentido, acórdão do STJ de 17-03-1999, Proc. n.º 1135/98 - 3.ª Secção).

É, pois, à luz de tais princípios, que terá de ser encontrada a pena adequada ao caso concreto.

O crime de violência doméstica agravado é punido com pena de prisão de dois a cinco anos.

O crime de lenocínio agravado é punido com pena de prisão de um a oito anos.

Assim, há a considerar: - as fortíssimas exigências de prevenção geral que suscitam os crimes em apreço, que integram no leque de condutas abarcadas pelo conceito generalizado de violência de género, que continua a marcar a sociedade portuguesa e onde ainda são elevadas as cifras negras, constituindo um verdadeiro flagelo nacional;

- o arguido agiu sempre com dolo, e na sua modalidade mais gravosa (dolo directo), no qual persistiu face à reiteração dos seus comportamentos;

- quanto ao grau de ilicitude, situa-se num plano elevado em ambos os crimes, atendendo ao grau de violência física e psíquica infligida, ao tempo por que perdurou esse seu comportamento, e as respectivas motivações, ou seja, a exploração económica da vítima, quer através da sua sujeição à prostituição, quer através da apropriação dos rendimentos que a mesma gerava licitamente através da sua força de trabalho;

- Os antecedentes criminais pela prática de outro crime de lenocínio, tendo cumprido pena de prisão efectiva, o que não o demoveu;

- As suas condições socioeconómicas e de saúde, nos termos dados como provados;

- A ausência de qualquer manifestação de arrependimento, ou sequer de interiorização do desvalor das suas condutas.»

E é depois desta formulação que são impostas as penas parcelares, após o que, já aquando da escolha da pena única, é referido que esta tem em conta «os factos e a personalidade do arguido, nos termos supra expostos».

Ora, as exigências que o Recorrente aponta e que considera não terem sido preenchidas no caso concreto são referidas unanimemente pela jurisprudência, mas apenas em casos de cúmulos supervenientes14,15 não em casos de ‘simples’ cúmulo de penas ‘acabadas’ de achar no próprio processo em que é efetuado o cúmulo.

Parece-nos óbvio que numa situação destas não faz qualquer sentido exigir-se, por exemplo, que na parte em que se aplica a pena única se faça novamente referência (quer através da sua reprodução, quer mesmo através do seu resumo) aos factos que, parágrafos antes, ficaram referidos como provados e que sustentaram a escolha das penas parcelares. Também não faz sentido que seja necessário repetir todos os elementos que, igualmente momentos antes, analisaram a personalidade demonstrada pelo arguido.

A este propósito, num caso semelhante, escreveu-se no acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Abril de 202516, “[…] apreciando a totalidade do acórdão recorrido, e tendo em conta, em especial, a continuidade da apreciação relativa às penas parcelares e única, não faz sentido exigir quanto a esta a apreciação de novo daquelas circunstâncias individualizando-as pois elas não podem deixar de estar presentes na mente de quem lê o acórdão, e na parte relativa à pena única, para além da remissão expressa para a norma legal, o acórdão recorrido acentua quanto a esta o modo de cometimento e efeitos dos crimes praticados (na mesma ocasião) e a personalidade do arguido, em especial face ao seu comportamento, que acabara de classificar de agressivo, em audiência. Acresce que a especial fundamentação autónoma da pena única, faz inequívoco sentido, em casos de conhecimento superveniente de concurso (artº78º CP), - o que não é o caso - porquanto o tribunal que vai proceder à fixação da pena única, não está a julgar pela totalidade dos crimes em concurso e muitas das vezes (por nenhum crime) mas apenas a fixar a pena única, o que implica a necessidade não apenas de conhecer os factos (e daí a necessidade da sua descrição, mesmo que por súmula), como a sua interligação / conexão e por isso na sua globalidade e a personalidade que o arguido revela, em vista de averiguar se estamos perante uma carreira criminosa ou uma mera pluriocasionalidade.

Como a fundamentação deve ser adequada a cada caso, em vista deste, procedendo ao colectivo ao julgamento da totalidade dos crimes em concurso punidos com a pena de prisão, sem hiato temporal entre eles, a fundamentação é a necessária e suficiente pois os factos estão descritos, as circunstâncias estão determinadas, as exigências de prevenção estão apuradas, e a personalidade do arguido ponderada, para se perceber e compreender o porquê da pena única […]”.

Assim sendo, e pelo que ficou exposto, entendemos adequada e suficiente a fundamentação do acórdão recorrido quanto à pena única ali achada, pena que, conforme já atrás se referiu, entendemos não necessitar de qualquer correção por parte deste Supremo Tribunal de Justiça.

4. Da possível suspensão da execução da pena de prisão

Considera o Recorrente que “com o sancionamento do Arguido através da substituição da pena aplicada ao Recorrente pela suspensão da sua execução, acompanhada da observância de regras e deveres, bem como regime de prova, a comunidade consideraria reposta a confiança na validade da norma violada. De facto, não se pode descurar que a reclusão (como decidido pelo Tribunal recorrido) não contribui para a reinserção do Recorrente, nem o vai reabilitar para o mundo laboral e para a convivência em sociedade, razão pela qual as exigências de prevenção geral e de prevenção especial são ainda asseguradas com a aplicação ao mesmo de uma pena não privativa da liberdade”.

Por outro lado, alega ainda que as suas condições pessoais de vida “revelam que o mesmo tem uma personalidade ainda recuperável, sendo de valorar positivamente o seu esforço no sentido de mudar de vida e de se reintegrar pessoal, laboral e socialmente. Também não se pode esquecer que o Recorrente é um adulto, o que, associado ao seu empenho no sentido da sua recuperação, facilita e torna mais provável o êxito na sua reinserção social, desde que acompanhado pelos serviços de reinserção social.”

Mais acrescenta que “as necessidades de prevenção especial positiva e de reintegração do agente na sociedade, por via de regra, são melhor servidas mediante a aplicação de uma pena não privativa da liberdade, salvo situações de extremo desenquadramento social, o que não sucede no caso concreto do Arguido”.

Quanto à não suspensão da execução da pena ora aplicada ao aqui Recorrente, temos que o artigo 50º, n.º1, do Código Penal realça que haverá que lugar à suspensão da execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir-se que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

Ainda que se considere que ao Recorrente deveria ser aplicada pena de prisão inferior a 5 anos – o que se afasta, como referido supra – consideramos também que o pressuposto material não se encontra preenchido.

No entendimento do Prof. Figueiredo Dias, a suspensão da execução da prisão não deverá ser decretada, mesmo em caso de conclusão do Tribunal por um prognóstico favorável (à luz de considerações exclusivas de prevenção especial de socialização), se a ela se opuserem as finalidades da punição (artigos 50.º, n.º 1 e 40. °, n.º 1 do Código Penal), nomeadamente considerações de prevenção geral sob a forma de exigência mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico.

Assim, “deve atender-se essencialmente aos mesmos elementos que são tomados em consideração para a formulação de um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do delinquente – personalidade do agente, condições de vida, conduta anterior e posterior ao crime e circunstâncias deste”.17

Como se salienta no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06/02/2008,18pressuposto material básico do instituto da suspensão da execução da pena é a expectativa, objectivamente fundada, de que a simples censura do facto e a ameaça da pena de prisão bastarão para afastar o condenado da criminalidade. Refere Jescheck que a suspensão da pena pressupõe um prognóstico favorável, consubstanciado na esperança de que o condenado não voltará a delinquir, prognóstico que requer uma valoração global de todas as circunstâncias que possibilitem a formulação de uma conclusão sobre o comportamento futuro do condenado, aí se incluindo a personalidade (inteligência e carácter), a vida anterior (condenações anteriores), as circunstâncias do crime (motivos e fins), a conduta posterior ao crime (arrependimento, reparação do dano) e as circunstâncias pessoais (profissão, família, condição social), e que terá de ser feito tendo em vista exclusivamente considerações de prevenção especial, pondo de parte considerações de prevenção geral”.

Não obstante, conforme preceituado no artigo 50º, nº 1, do CP (que manda atender às finalidades da punição, a saber, segundo o artigo 40º, nº 1, do CP, a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade), “com aquele pressuposto material básico coexistem considerações de prevenção geral” pelo que “para aplicação desta pena de substituição é necessário, em primeiro lugar, que o julgador se convença, face à personalidade do condenado, suas condições de vida, comportamento global, natureza do crime e sua adequação a essa personalidade, de que o facto cometido não está de acordo com esta e foi simples acidente de percurso esporádico e de que a ameaça da pena, como medida de reflexos sobre o seu comportamento futuro, evitará a repetição de comportamentos delituosos, sendo necessário, em segundo lugar, que a pena de suspensão de execução da prisão não coloque irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias, ou seja, o sentimento de reprovação social do crime ou sentimento jurídico da comunidade19.

Assim, nenhum dos factos dados como provados demonstram um comportamento diferente no futuro por parte do Arguido. Até pelo contrário, uma vez que o Arguido já tinha sofrido pena privativa de liberdade pelo crime de lenocínio e voltou a cometer o mesmo tipo legal.

Pelo que, bem andou o Tribunal a quo ao concluir que, na pena aplicada no cúmulo, não estavam verificados os pressupostos para a suspensão da execução da pena de prisão em que o Recorrente foi condenado e, em consequência, determinou que o arguido fosse condenado, em cúmulo jurídico e para cumprimento sucessivo das penas, nas penas de prisão efetivas.

5. Da inconstitucionalidade material da norma do artigo 169.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal

Nos presentes autos, o Recorrente foi condenado, como autor material, de um crime de lenocínio agravado, p.e p. pelo artigo 169.º, n.ºs 1e 2, alíneas a) e c) do CP, tendo-lhe sido aplicada relativamente a este crime a pena parcelar de 3 anos de prisão.

Assim, não obstante o Tribunal a quo tenha feito aplicação da norma do artigo 169.º, n.ºs 1 e 2 do CP, não pode olvidar que a doutrina e a jurisprudência do Tribunal Constitucional se têm debruçado sobre a inconstitucionalidade material desta norma por violação do princípio constitucional do direito penal do bem jurídico e da necessidade da pena.

Com efeito, a problemática diz respeito ao direito penal do bem jurídico como princípio constitucional, uma vez que o bem jurídico é político-criminalmente tutelável quando e onde encontre reflexo “(…) num valor jurídico constitucionalmente reconhecido em nome do sistema social e que, deste modo, se pode afirmar que “preexiste” ao ordenamento jurídico-penal”, em conformidade com a posição do Prof. Figueiredo Dias.20

Sendo inegável que as condutas descritas no artigo 169º, nº1, do CP não respeitam o princípio da dignidade humana – valor constitucional que representa um dos corolários de um Estado de Direito como o nosso –, pois este princípio repudia a instrumentalização da pessoa, tratando-a como mero instrumento de prestação sexual, muito mais se justifica a incriminação quando – como é o caso dos presentes autos – a vítima é forçada à prática dos atos em questão, aproveitando-se o agente da vulnerabilidade da prostituta para obter, à sua custa, ganhos ilegítimos.

Desde a decisão do Tribunal Constitucional pela constitucionalidade do artigo 169.º, n.º 1 do Código Penal no Acórdão n.º 144/2004, este tribunal tem reiterado essa posição nos vários Acórdãos, entretanto proferidos, sendo dos mais recentes os Acórdãos nº 230/2024, 143/2025 e 145/202521 que, mais uma vez, veio reafirmar aquela posição anterior deste tribunal.

Com o devido respeito, não deverá o Supremo Tribunal de Justiça alterar este entendimento e substituir-se ao legislador, que manteve a incriminação penal no Código Penal.

Por conseguinte, o artigo 169.º, n.º 1 não padece de qualquer inconstitucionalidade.

3. Decisão

Pelo exposto, o Supremo Tribunal de Justiça, 3ª Secção Criminal, acorda em negar provimento ao recurso do arguido, AA e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 5 (cinco) UC’s - artigo 513.º, n. º1 do Código de Processo Penal e artigo 8º n.º 9 e tabela III anexa ao Regulamento das Custas Processuais).

Supremo Tribunal de Justiça, 01 de Outubro de 2025.

Antero Luís (Relator)

António Augusto Manso (1º Adjunto)

Lopes da Mota (2º Adjunto)

__________

1. Ac. do STJ de 14.12.2023, proferido no processo n.º 130/18.2JAPTM.2.S1, in www.dgsi.pt↩︎

2. FD, Direito Penal Português - As Consequências jurídicas do crime, Editorial Noticias, 1993, p. 194 e segs., citado no Ac. do STJ de 14.12.2023, proc. 130/18.2JAPTM.2.S1, in, www.dgsi.pt.↩︎

3. Ac. do STJ de 14.12.2023, proferido no processo n.º 130/18.2JAPTM.2.S1, in www.dgsi.pt↩︎

4. Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, 3.ª reimp., 2011, p. 248 e segs, e o acórdão de 8.6.2022, Proc. 430/21.4PBPDL.L1.S, e de 16.2.2022, Proc.160/20.4GAMGL.S1, www.dgsi.pt, citados no ac. do STJ de 21.02.2024, proc. 1553/22.8PBPDL.L1.S1.↩︎

5. Ac. do STJ de 19.05.2021, proc. n.º 36/20.5GCTND.C1.S1, www.dgsi.pt↩︎

6. Ac. do STJ de 31.03.2011, proc. n.º 169/09.9SYLSB.S1, www.dgsi.pt↩︎

7. Ac. do STJ de 31.03.2011, proc. n.º 169/09.9SYLSB.S1, www.dgsi.pt↩︎

8. Neste sentido, podem ver-se aplicações concretas nos acórdãos de 21-11-2006, processo n.º 3126/06-3.ª, CJSTJ 2006, tomo 3, pág. 228, de 14-05-2009, no processo n.º 170/04.9PBVCT.S1-3.ª; de 10-09-2009, no processo n.º 26/05. 8SOLSB-A.S1, como se lê no ac. do STJ de 14.12.2023, proferido no processo n.º 130/18.2JAPTM.2.S1, in www.dgsi.pt, citando o ac. do STJ de 31.03.2011, proc. n.º 169/09.9SYLSB.S1.↩︎

9. Citado no Ac. do STJ de 25.09.2024, proferido no proc. 3109/24.1T8PRT, 3ª secção, e v. ainda, o acórdão de 25.10.2023, Proc. 3761/20.7T9LSB.S1, em www.dgsi.pt, e jurisprudência nele mencionada.↩︎

10. Ac. do STJ de 14.12.2023, proferido no processo n.º 130/18.2JAPTM.2.S1, in www.dgsi.pt↩︎

11. Ac. do STJ de 06.01.2021, proferido no proc. n.º 634/15.9PAOLH.S2, in www.dgsi.pt↩︎

12. Ac. do STJ de 14.12.2023, proferido no processo n.º 130/18.2JAPTM.2.S1, in www.dgsi.pt↩︎

13. Ac. do STJ de 12/07/2018, Proc. nº1289/08.2PHLRS.L1.S1, consultável em www.dgsi.pt↩︎

14. De referir que, aliás, foi a propósito de cúmulos supervenientes que se pronunciou a decisão invocada na motivação de recurso, datada de 01.07.2015 (proferida no processo 389/04.2GDSTB.S1).

  [Já os demais acórdãos referidos na motivação terão sido proferidos em processos reportados a situações de concessão de liberdade condicional, ao que resulta do acórdão de 24.01.2023 da Relação de Évora, no processo 572/19.6TXEVR-H.E1,onde são referenciados pelo aí recorrente. E de referir que no site www.dgsi.pt não se conseguiu localizar o acórdão invocado, proferido no processo de 13.09.2022].↩︎

15. Vejam-se os acórdãos deste Supremo Tribunal, de 20.11.2023, proferido no processo 206/16.0PALGS.S2 e no processo 471/11.0GAVNF.P1.S1, de 06.05.2015.↩︎

16. Processo 739/23.2GCALM.S1, disponível em www.dgsi.pt↩︎

17. Ac. do STJ de 29/11/2006, Proc. nº 06P3121, disponível em www.dgsi.pt↩︎

18. Proc. nº 08P101, consultável em www.dgsi.pt,↩︎

19. Ac. do STJ de 24/10/2007, Proc. nº 07P3317, consultável em www.dgsi.pt↩︎

20. In “Direito Penal. Parte Geral”, Tomo I, 2.ª edição, pág. 114.↩︎

21. Todos disponíveis em https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/.html↩︎