AÇÃO EXECUTIVA
EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA
SUJEITO PASSIVO
PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL DE REGULARIZAÇÃO DE SITUAÇÕES DE INCUMPRIMENTO (PERSI)
MORA
DEVER DE INFORMAÇÃO
INCUMPRIMENTO
BANCO
MATÉRIA DE FACTO
MEIOS DE PROVA
ERRO DE JULGAMENTO
FUNDAMENTAÇÃO
LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
Sumário


Atenta a definição legal de “suporte duradouro” contida na al. h), do art.º 3.º, do Dec. Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, a expressão “suporte duradouro” constante nos art.ºs 14.º, n.º 4, 17.º, n.º 3 e 20.º, n.º 1, desse diploma só poderá reportar-se aos sistemas de informação e arquivo em uso na atividade bancária, genericamente, de natureza informática/electrónica e eventualmente em papel.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


1. RELATÓRIO.

No âmbito da execução requerida por Panorama Jubilante, S.A., o executado AA, depois de ter deduzido embargos de executado que foram julgados improcedentes, apresentou requerimento arguindo a exceção dilatória da inobservância do regime PERSI antes da interposição da execução, requerendo o indeferimento do requerimento executivo.

Notificadas, respondeu a exequente arguindo, além do mais, a extemporaneidade do requerimento por terem já sido decididos os embargos e respondeu também a executada BB, requerendo também o indeferimento do requerido por manifesta extemporaneidade.

Após as vicissitudes documentadas nos autos, foi realizada audiência de julgamento e decidido o incidente, julgando improcedente a exceção.

Inconformado, o executado interpôs recurso, recebido como apelação, que foi julgado improcedente por acórdão do Tribunal da Relação, votado por maioria, com declaração de voto de vencido.


*


De novo inconformado, o executado interpôs recurso de revista, com fundamento, além do mais, em que:

- O acórdão de que se recorre encontra-se em contradição com outros, já transitados em julgado, proferidos nomeadamente pelo Supremo Tribunal de Justiça, pela Relação do Porto e de Coimbra;

- Padece de violação de lei substantiva e lei do processo aplicável ao caso (nomeadamente erro de interpretação e de aplicação do disposto no DL 227/2012 de 25/10;

- Padece de erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa, denotando-se grave ofensa de disposições expressas na lei, que exigem certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixam a força de determinado meio de prova;

- Está em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito,

mais dizendo que nos termos do disposto nos artigos 629º nº2 d), 671º nº1, e 672 nº1 a) e c), 673º, 674 nº1 a) c) e nº3, é admissível recurso de revista, uma vez que a decisão recorrida preenche, também, os requisitos da alçada e sucumbência enunciados no nº 1 do artigo 629º do CPC e formulando as seguintes conclusões:

1. O Recorrente não se pode conformar com o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto datado de 25/03/2025, que julgou improcedente o recurso apresentado e confirmou, com um voto vencido, a sentença recorrida, já que:

2. Além de estar em contradição com inúmeros acórdãos anteriores no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito;

3. Padece, também, de ilegalidade, já que viola a lei substantiva e de lei do processo

aplicável ao caso, contraria manifestamente o espírito da lei, não tendo feito uma boa aplicação do direito;

4. E padece, ainda, de erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa, denotando-se grave ofensa de disposições expressas na lei, mormente nos artigos mormente as previstas nos artigos 8º, 9º, 342º, 344º,346º, 351º, 362º, 368º, 373º, 374º, 376º nº2 e 378º, do Código Civil, bem como 12º, 13º, 14º nº 1 e 4, 15º, 17º, 18º, 20º, 21º, 39º do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro, que exigem determinado tipo de prova para a existência do facto ou que fixam a força da mesma,

5. Estando em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito,

6. Assim, pelos motivos que infra se aduzirá, impõem-se que o acórdão em causa seja revogado.

7. De facto, pelo facto de ser absolutamente incorrecta a apreciação e valoração da

prova, foi promovida declaração de Voto vencido, por parte da Exmª Srª Juíza Desembargadora Márcia Portela: “Voto vencida por que entendo que, do mero envio de uma carta simples, não se pode presumir o recebimento sem mais.

Entendo ser exigível que existam elementos objetivos que permitam inferir, com um mínimo de segurança, o recebimento da missiva (v.g., confissão; contacto com o banco). Não entendo que se possa aligeirar a exigência de prova, com a alegação de que se trata de prova diabólica. Com efeito, sabido que a carta incorpora uma declaração reptícia, e que o ónus da prova cabe ao Banco, cabia a este precaver se das dificuldades de prova, que, no caso, poderia ser feito através do correio registado. Não se afigura que se trate de procedimento excessivamente oneroso ou desproporcionado para uma entidade bancária. Neste sentido, o acórdão da Relação do Porto, de 08.06.2022, Eugénia Cunha, www.dgsi.jtrp.pt , proc. n.º 204 /20.1T8MAI A.P1, e da Relação de Coimbra, de 28.11.2018, Alberto Ruço, www.dgsi.jtrc.pt ., proc. n.º 494/14.7TBFIG A.C1.”

8. Pelo que é evidente, o Recorrente não pode deixar de concordar, na íntegra, com a posição do Voto vencido, no entanto a situação em apreço carece de uma análise mais profunda, que até à data não foi realizada pelo tribunal.

9. Já que, o acórdão recorrido assim como todo o processado está inquinado com a

interpretação errada das minutas das cartas a enviar, que sem mais transforma em “…cópias dos exemplares que afirma ter remetido a esse propósito…”

10. É ostensivo o erro já que as minutas de cartas a enviar (juntas em formato digital) não são cópias dos “exemplares de cartas” ou “cartas bancárias” e não existe qualquer outro elemento probatório complementar no processo que permita interpretar e valorizar como “copias dos exemplares” das cartas.

11. De facto, o acórdão recorrido refere ainda que “Os documentos juntos pela exequente são constituídos por quatro cartas bancárias (com o formato usualmente utilizado na correspondência entre bancos e clientes…”.

12. No entanto, se analisarmos os documentos juntos pela Exequente verificamos que não são cópias de cartas remetidas, mas apenas documentos em formato digital, que podem nem ter sido alguma vez impressos ou remetido via ctt ou por e mail.

13. Pelo que nunca se podiam considerar como cópias de cartas remetidas!

14. E é a partir deste elemento probatório (a cópia das cartas) que não existe no processo, que o acórdão recorrido parte para discutir a prova do envio e da receção, quando legalmente estava impedido de o fazer, já que não se pode discutir a prova do envio e receção do que não existe!

15. E é esta má apreciação da prova que inquina todo o processo!!

16. De facto, é à Exequente que cabe o ónus de alegar e provar a existência, o envio e a receção, pelo devedor, das comunicações exigidas no âmbito do PERSI, prova que não produziu nos presentes autos,

17. Já que a Exequente apenas trouxe ao processo cópias das minutas de cartas a enviar aos clientes, e não “cópias dos exemplares enviados” ou “cópias de cartas bancárias” como refere erradamente o acórdão recorrido.

18. E é evidente que as minutas das cartas a enviar não detém qualquer tipo de força probatória, já que são insuficientes para demonstrar, por si só, a sua existência, já que não são capazes de demonstrar que alguma vez foram impressas ou enviadas por via ctt ou e-mail, e até podem ter sido elaboradas só após a referida

impugnação, e tão pouco poderão provar o envio e a recepção pelos aqui Executados.

19. Além de mais o Recorrente não põe em causa que a alegada comunicação teria

obrigatoriamente de ser remetida por carta registada, mas pelo menos tem que existir uma cópia de uma carta a ou evidência de um e-mail remetido.

20. E não existe no processo nem uma coisa nem outra, somente as tais minutas em

formato digital de cartas a enviar!

21. Assim, e tal como defendeu a Exma. Juíza Desembargadora Márcia Portela, apesar de a lei não prever obrigatoriamente que a comunicação seja feita por carta registada, sendo certo que “a carta incorpora uma declaração reptícia, e que o ónus da prova cabe ao Banco, cabia a este precaver se das dificuldades de prova, que, no caso, poderia ser feito através do correio registado. Não se afigura que se trate de procedimento excessivamente oneroso ou desproporcionado para uma entidade bancária.”

22. Pelo que, também, não se pode concordar, sobretudo por falta do supra referido

documento, com a tese defendida pelo tribunal a quo a que aderiu o acórdão recorrido, que mesmo que tivesse sido enviada carta registada pelo credor originário a prova da recepção por parte dos Executados ”seria também quase impossível”, a qual contraria inúmeros Acórdãos proferidos anteriormente sobre a mesma matéria e legislação, nomeadamente o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto (processo nº 4204/20.1T8MAI-A.P1) de 08-06-2022 (disponível em www.dgsi.pt), e o voto vencido no acórdão de que se recorre.

23. E foi pelo facto de a prova produzida pela Exequente ser absolutamente insuficiente para se dar como provado de que as comunicações existiram, foram remetidas e muito recebidas pelos Executados,

24. Bem como pelo facto de que o prazo previsto de 5 anos, no art. 20º nº 2 do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro, em que os bancos tem o dever de conservar as comunicações entre as partes e demais documentos relevantes no âmbito do PERSI

em suporte duradouro, há muito que se mostrava ultrapassado, o que infra se esclarecerá se deve a culpa exclusiva do credor originário e actual Exequente, 25. Que o tribunal da relação defendeu ser de admitir que a prova da integração em PERSI e a comunicação de extinção do procedimento, que consubstanciam a condição de admissibilidade da acção, seja feita através de documentos em suporte duradouro conjugado com outros meios probatórios, que convençam o tribunal que o mesmo foi observado.

26. O problema é que neste caso não existe nem uma coisa nem outra!

27. Desde logo porque não foram juntos documentos em suporte duradouro pela Exequente, foi por culpa exclusiva da mesma (e credor originário) que foi ultrapassado o prazo de 5 anos previsto no art. 20º nº 2 do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro e porque não foi produzido qualquer outro meio de prova suficiente para demonstrar o cumprimento das comunicações do PERSI!

I –DA ABSOLUTAFALTA DE DOCUMENTOS, E EM SUPORTE DURADOURO:

28. Antes de mais importa esclarecer que, in casu, a Exequente não juntou ao processo documentos em suporte duradouro,

29. Sendo indiscutível o que a lei e a jurisprudência entendem por documento em suporte duradouro, para o qual seria necessário a sua representação através de um

instrumento que possibilitasse a reprodução integral e inalterada, e, portanto, reconduzível à noção de documento constante do art. 362.º do CC, o que não se sucedeu neste processo!

30. Aliás, como é que um documento tipo minuta em suporte digital, que não é uma reprodução mecânica, possibilita a reprodução de forma integral e inalterada sem qualquer outra prova??

31. De facto, é do conhecimento oficioso que os “documentos” juntos pela Exequente não passam de meras minutas de “cartas a enviar” em formato digital, não se encontrando sequer assinadas por qualquer funcionário, nem tem qualquer tipo de marca (nomeadamente furos ou agrafos) que pudesse demonstrar que se trata realmente de uma reprodução mecânica de um alegado documento original, não continha qualquer documento do correio ou demonstrativo do seu envio, nem foi enviado por email.

32. Pelo que na falta deste documento em suporte duradouro, não existe qualquer raciocínio de verosimilhança que permita transformar a “minuta de carta a enviar” em carta enviada e recebida pelos Executados.

33. Veja-se, que a este propósito, a Exequente não se dignou, sequer, a esclarecer como destruiu todo o arquivo físico e manteve em arquivo digital, 8 anos após o incumprimento por parte dos executados, as minutas de quatro cartas a enviar, nem o tribunal se interessou por saber.

34. Aliás e como não proveu por demonstrar de forma inequívoca, ao processo, a origem do arquivo, a data do arquivamento, o que os arquivos digitais permitem com tanta facilidade!

35. E também não juntou ao processo uma única testemunha, nomeadamente funcionários bancários.

36. E esclareça-se que só o Tribunal proveu por prova complementar, especificadamente com o objetivo de obter a confissão dos executados, o que, de facto, esclareça-se não se sucedeu!

37. A lei e a jurisprudência, nestes últimos dez anos, são unânimes e não deixam margem para dúvidas ou sequer interpretações, tão pouco presuntivas, relativamente à exigência da prova por parte da Exequente da carta/comunicação da integração do PERSI em suporte duradouro, ie, e-mail remetido ou cópia da carta enviada! E não minuta digital da carta a enviar!

38. Pelo que na falta desse elemento essencial, não podem existir factos indiciários sobre o seu envio, muito menos da sua recepção pelos Executados, porque não existe sequer prova da sua existência!

39. Com efeito, o douto tribunal violou claramente a legislação ao ultrapassar esta barreira, de facto intransponível, validando como prova suficiente a minuta da “carta a enviar” como se de uma carta enviada se tratasse.

40. E no caso concreto só as cópias das cartas poderiam ser consideradas como princípio de prova do envio, podendo nesse caso o credor/exequente fazer prova do facto-indiciário do respetivo envio por meio de testemunhas (o que, esclareça-se, nunca se sucedeu), para provar, desse modo, o envio das cartas, é só aí seria de presumir a sua receção pelo devedor, ainda assim, sem prejuízo destes ilidirem tal presunção.

41. Com efeito, além da violação grosseira da lei, o acórdão recorrido entra em contradição com inúmeros acórdãos proferidos anteriormente sobre a mesma matéria, nomeadamente, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (processo 1141/21.6T8LLE-B.E1.S1), datado de 02-02-2023, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto (processo nº 4204/20.1T8MAI-A.P1) de 08-06-2022, e o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra (processo 494/14.7TBFIG-A.C1), datado de 28-11-2018, todos disponíveis em www.dgsi.pt

42. Além do mais cumpre denotar que, in casu, é do conhecimento oficioso que estamos perante um contrato de mútuo onde interviu como Fiadora (CC – cfr. contrato de mútuo junto com o requerimento executivo),

43. Pelo que, nos termos do artigo 21.º do DL nº 227/2012, de 25 de Outubro, estava a entidade bancária obrigada a proceder a diversas comunicações à Fiadora no âmbito do PERSI, o que de facto, esclareça-se, nunca se sucedeu!

44. Contudo certo é, que nem o tribunal solicitou a audição da Fiadora nem a Exequente procedeu à junção de qualquer comunicação remetida àquela, claramente porque não existem, até porque a Fiadora nunca recebeu qualquer tipo de comunicação por parte do credor originário!

45. E sobre esta matéria, exigência da aplicação do regime legal previsto no artigo 21.º do DL nº 227/2012, de 25 de Outubro, não se pronunciou o Tribunal da Relação do Porto.

46. De facto, não tendo sido cumprida também esta exigência legal, imposta no artigo 21.º, torna-se mais uma vez evidente a falta de integração dos Executados no PERSI.

47. E não se pode esquecer este Tribunal que o ónus da prova cabe à Exequente e no decorrer do processo também não alegou e provou que estas comunicações obrigatórias para a Fiadora se realizaram.

48. Cumpre, ainda, chamar atenção para o facto que a Exequente só após a arguição da referida nulidade, é que junta aos presentes autos (requerimento de 18/10/23, com a ref. ......49) as meras minutas de “cartas a enviar”, às quais o tribunal da

relação do Porto denomina arbitrariamente e ilegalmente de 4 cópias de cartas enviadas, alegadamente da autoria do credor originário, sem proceder à junção de qualquer prova adicional que demonstrasse a existência e o envio, pelo que os documentos juntos no referido requerimento não têm qualquer valor probatório já que podem, inclusivamente, ter sido apenas elaborados após arguição da referida nulidade.

49. Além do mais denote-se que, in casu, nem sequer foi ouvido o credor originário Montepio, pelo que nunca sequer foi confirmado se de facto aqueles “documentos” são da sua autoria.

50. De facto, tudo aponta até para que as minutas das cartas a enviar, em formato digital, ora juntas pela Exequente se tratem de documentos falsos, ou seja não correspondem a documentos que tenham sido elaborados e remetidos no ano de 2013, o que, reforce-se, o tribunal a quo e o tribunal da Relação não podiam ignorar, até porque é o próprio tribunal a quo que conclui que os mesmos (minutas de cartas) podem ter sido elaborados em datas distintas às que nelas se encontram assinaladas: “até porque, na verdade, podem existir diversas comunicações entre as partes no mesmo período temporal e, em tese, nada obsta que se crie agora um qualquer texto e se alegue o seu envio anterior. (cfr. página 12 da sentença proferida a 12-06-24).

51. Até porque não se pode ignorar que a Exequente nunca referiu a existência das alegadas cartas antes do aqui Recorrente ter arguido a presente excepção inominada de conhecimento oficioso, nem sequer no seu requerimento executivo, onde era obrigatório demonstrar a integração e extinção dos Executados no PERSI, condição sine qua non para que os presentes autos executivos fossem liminarmente admitidos.

52. Cumpre também denotar que, apesar de decorrida toda esta tinta nos presentes autos, e apesar de diversas vezes suscitado pelo Recorrente, a verdade é que até à presente data, a Exequente nunca sequer demonstrou qual a data do incumprimento definitivo e, consequentemente, data da resolução do contrato de mútuo aqui em causa, questões relevantíssimas sobre as quais o douto tribunal se omitiu de pronunciar.

53. Além do mais não pode ser ignorado por este tribunal que a Exequente, quando apresentou o requerimento executivo (14/04/2021) juntou diversos documentos: o contrato de cessão do crédito; contrato de mútuo; e a certidão permanente do prédio em questão.

54. Pelo que questiona o Recorrente, como deveria ter questionado o douto tribunal de que se recorre, porque motivo terá a Exequente se omitido à junção das alegadas “cartas”, as quais somente veio a juntar após a arguição da nulidade (requerimento de 18/10/23 ref. ......49), sendo que as mesmas eram só a condição de admissibilidade da própria acção executiva?!

55. E não pode ignorar este tribunal que a Exequente, cujo o objecto social é a compra de créditos, com muita experiência neste tipo de processos, que o facto de não ter junto as alegadas cartas com o requerimento executivo, só pode indiciar que não existiam, porque se existissem, obviamente, as tinha junto ao processo!

56. De facto, legalmente impunha-se que a Exequente no próprio requerimento executivo alegasse e comprovasse que o credor originário integrou os executados no PERSI e posteriormente que tal PERSI foi extinto e não o fez!

57. Não existindo nenhum outro motivo para essas informações serem omitidas pela Exequente que não seja, como é obvio, o facto de não existirem!

58. E como é de conhecimento oficioso, está em causa um contrato de mútuo (crédito para habitação) celebrado do ano de 2006, resolvido presumidamente, no ano de 2013, pelo que tinha que cumprir o conjugadamente o disposto nos artigos 12.º, 13.º, 14.º, 15.º, 16.º, 17.º, 18.º, 20.º, 21.º, todos do DL 227/2012 de 25/10, o que não se sucedeu! 59. Por esse motivo, os presentes autos encontram-se inquinados ab initio por falta de condição de admissibilidade da acção por força da excepção dilatória decorrente do regime plasmado no artigo 18º nº1 b) do DL 227/2012 de 25/10.

60. Reforce-se, também, que no requerimento executivo a Exequente apenas refere que pelo motivo da falta de pagamento “das prestações que se venceram a partir de agosto de 2013” considerou o contrato resolvido e o crédito vencido (omitindo, no entanto, em que data é que efectivamente ocorreu a resolução do contrato e em que se venceu o crédito), e também não alegou qualquer outra causa de incumprimento contratual.

61. E só agora, após a arguição da presente nulidade, é que a Exequente alega pela Integração dos Executados no PERSI e apenas apresenta como único meio de prova “as minutas das cartas a enviar” em formato digital, não tendo prestado esclarecimentos sequer ou demonstrado por via documental de que forma obteve as referidas “cartas” e/ou as arquivou.

62. Tão pouco a Exequente apresentou qualquer outra prova adicional, motivo pelo qual é totalmente injustificada a interpretação levada a cabo pelo Tribunal recorrido, o qual além de ter interpretado de forma errada a prova, “as minutas de cartas a enviar” como se de cópias de cartas enviadas se tratasse, também se omitiu de valorar a omissão da Exequente na prestação de esclarecimentos adicionais que seriam fulcrais para a decisão aqui em causa, nomeadamente que explicasse e demonstrassem a existência das “minutas das cartas a enviar”.

63. E o Tribunal, também, não podia deixar de valorar que se trata de uma Exequente que faz da aquisição deste tipo de créditos modo de vida e como é evidente deveria ser fácil à Exequente demonstrar que em 2019, aquando da aquisição do presente crédito, aqueles “documentos” também lhe foram cedidos, se existissem naquela data!

64. No entanto, a Exequente não carreou para o processo qualquer documento que permitisse com alguma segurança (suporte duradouro) demonstrar que aquelas minutas de cartas sequer foram elaboradas na pretensa data.

65. E não se trata, ainda, de discutir se cartas simples (não registadas) foram remetidas, mas da Exequente não ter demonstrado sequer que existiram, isto porque uma “minuta de carta a enviar” não é, nem nunca poderá ser, uma cópia de carta enviada!

66. E não existe absolutamente nenhum elemento no processo que permita esta interpretação da prova, ou seja que permita que as “minutas das cartas a enviar” passem a ser “…exemplares…” de “4 cópias das cartas enviadas…”!

67. E pasme-se que acrescentar a tudo isto, não nos podemos sequer esquecer que era à Exequente a quem cabia o ónus probatório!

68. E ainda assim o douto acórdão decide “beneficiar” a Exequente, o que se traduz na infração das mais elementares normas de direito e ultrapassa todos os limites do racional.

69. De facto, ao decidir como decidiu o acórdão recorrido, além da violação grosseira da lei, contraria inúmeros acórdãos proferidos anteriormente, nomeadamente o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 08-06-2022 (Processo: 4204/20.1T8MAI-A.P1, Relator: EUGÉNIA CUNHA, bem como o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 28-11-2018 (Processo: 494/14.7TBFIG-A.C1, Relator: ALBERTO RUÇO) ambos disponíveis em www.dgsi.pt).

70. Denotar que no caso em apreço no acórdão da Relação de Coimbra supra descriminado, ao contrário dos presentes autos (que só existem minutas de cartas a enviar em formato digital), foi, também, produzida prova testemunhal por funcionária do banco no sentido de que teriam sido remetidas cartas simples para a integração e extinção dos interessados, o que não se assistiu nos presentes autos, tendo por isso sido considerado como provado de que, naquele caso, “o Banco exequente expediu carta a comunicar ao embargante que tinha sido incluído no procedimento denominado PERSI.”, no entanto, e mesmo assim o douto tribunal considerou não ser suficiente para provar que os Executados teriam recebido tais comunicações, posição que se transcreve por uma questão de economia e celeridade processual, com a qual concorda o Recorrente:

“Mas não resulta dos factos provados que o embargante tenha recebido a carta em questão.

É esta a questão fundamental do recurso.

Como se disse, a lei impôs aos bancos a obrigação de contatar o cliente.

Tal contato exige que haja contato efetivo ou presumido como tal pela lei.

Se a questão acerca de ter existido esse contacto se torna duvidosa, como é o caso dos autos, porque o executado contesta que tenha sido contatado, então incumbe ao banco provar o contato, porque a lei lhe impõe que faça esse contato.

Não se prova tal contato provando apenas que foi expedida uma simples carta.

A própria lei nos dá disso exemplo, quando determina que a citação é feita mediante «Entrega ao citando de carta registada com aviso de receção, seu depósito, nos termos do n.º 5 do artigo 229.º, ou certificação da recusa de recebimento, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo» - al. b) do n.º 2, do artigo 225 do CPC.

Com efeito, uma carta remetida pode extraviar-se e embora os casos de extravio sejam pouco frequentes eles ocorrem e qualquer caso pode ser um caso desses, salvo se se mostrar que não foi o caso.

Bastava um conhecimento potencial, nos termos do n.º 1 do artigo 224.º do Código Civil, onde se refere que «A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida;…».

No caso dos autos, não foi feita prova de que a carta chegou ao conhecimento do embargado.

4. Verificando-se, por conseguinte, que o Banco estava obrigado a dar início ao PERSI, sob pena de não poder demandar judicialmente o cliente devedor em mora, e não tendo o banco exequente provado que deu conhecimento ao embargante da inclusão deste em tal procedimento, resulta que estava impedido de instaurar a presente ação executiva.”

81. Por tudo quanto foi dito é evidente que não existe, sequer, in casu qualquer documento em suporte duradouro!

II - DO (IRRELEVANTE) DECURSO DE PRAZO DE 5 ANOS

71. Também é totalmente inadmissível que acórdão recorrido aligeirasse a prova por conta do decurso do prazo previsto no art. 20º nº 2 do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro ter sido ultrapassado, já que tal se deve à culpa exclusiva do credor originário e actual Exequente,

72. De facto, não pode passar despercebido, já que é do conhecimento oficioso, que estamos perante um contrato de crédito à habitação celebrado no ano de 2006, tal contrato foi, alegadamente, resolvido no ano de 2013 por falta de pagamento de prestações “a partir de Agosto de 2013”, como alega a Exequente no requerimento executivo,

73. E que, conforme se pode verificar nos presentes autos, apenas no ano de 2019 (12/07/2019), foi celebrado o contrato de cessão entre o credor originário e a actual Exequente,

74. E apenas no ano de 2021 (07/04/2021) resolveu a Exequente apresentar o requerimento executivo!

75. Ou seja, claramente o credor original esteve aguardar pelo decurso daquele prazo, no qual é obrigatório a conservação da prova do cumprimento do PERSI, que como é evidente não existia, para ceder o crédito a um terceiro.

76. E durante esse prazo não deu entrada da presente ação executiva!

77. Pelo que o acórdão recorrido não poderia admitir sequer aligeirar a exigência de prova, devido à alegada dificuldade que só à Exequente (e/ou credor originário) se deve.

78. E muito menos no caso dos presentes autos, já que implica beneficiar a Exequente (e, consequentemente, credor originário), que claramente aguardou pelo decurso do prazo da obrigação de arquivamento dos documentos que efetivamente indiciariam, se existissem, a integração e extinguirão dos executados no PERSI, para interporem a presente ação executiva, para que, dessa forma, não fosse obrigada a cumprir as exigências legais, ou que as mesmas fossem aligeiradas, como ocorreu in casu!

79. Com efeito, a “alegada dificuldade” da existência da prova deve-se exclusivamente à entidade bancária, porque não cumpre com os procedimentos legais e não comunica sequer com os Executados, ou alegadamente não regista as cartas enviadas, e/ou não arquiva os documentos comprovativos,

80. E diga-se que nem sequer é racional aceitar como válido o facto de uma instituição financeira destruir o arquivo de processos que entraram em incumprimento definitivo e muito menos beneficiarem desta total falta de zelo!

81. E que aguardam 8 anos para interpor a acção executiva, precisamente quando já tinha ultrapassado o prazo legalmente obrigatório para o seu arquivamento, e não conservam a prova, que é a condição de admissibilidade e procedibilidade da presente acção!

82. Além de mais não pode ter qualquer acolhimento, que o credor originário e Exequente tenham arquivado as minutas de cartas a enviar, agora juntos pela Exequente, e não tenham arquivado, aliás como exige a lei (20º da sobredita legislação), todos os documentos em suporte duradouro, para que realmente pudesse ser demonstrado que se encontravam preenchidos os pressupostos de procedibilidade da acção executiva.

83. Não pode o Recorrente aceitar que todos estes indícios tenham sido ignorados pelo douto tribunal e muito menos que sejam utilizados em benefício do próprio incumpridor, permitindo-se aligeirar a prova.

84. Por tudo quanto foi dito, o acórdão não pode considerar de maneira alguma que estarmos perante um caso de prova diabólica, como refere,

85. E esclareça-se, o que só à Exequente se deve e a mesma beneficia!

III - A FALTA DE PRODUÇÃO DE OUTRO MEIO DE PROVA SUFICIENTE PARA INDICIAR AS ALEGADAS CARTAS:

86. É a Exequente que cabe o ónus probatório de demonstrar as condições de procedibilidade da presente acção executiva, e a mesma não junta ao processo quaisquer documentos em suporte duradouro, mas apenas minutas das “cartas a enviar” em suporte digital, pelo que não existe sequer facto indiciário, pelo que não podia tribunal avançar com qualquer tipo de presunção sobre os alegados envios e tão pouco com a recepção por parte dos executados, que a existir de facto, só seria possível avançar em conjugação com outros meios probatórios, como a confissão, o depoimento dos funcionários do banco…

87. De facto, impõe-se denotar que não foi produzida qualquer outra prova suficiente para dar como provado que as minutas de cartas a enviar em formato digital, juntas pela Exequente, alguma vez existiram sequer, foram efectivamente remetidas pela Exequente e recepcionadas pelos Executados, nem por estes foi confessada a sua recepção!

88. Com efeito, as alegadas minutas de cartas de comunicação da alegada integração e extinção dos executados no PERSI juntas pela Exequente aos autos no requerimento datado de 18/10/23 não servem como princípio de prova da sua existência, quanto mais do envio e recepção pelos Executados daquelas cartas!

89. E, como se não bastasse, também ficou claro pelos depoimentos prestados pelos Executados que nunca as receberam!

90. É gritante a má interpretação da prova, agravada pelo facto de ter sido exigida uma contraprova aos Executados, de facto, que contraprova se poderia exigir aos executados, como pretendeu o tribunal a quo, com o qual concordou o acórdão recorrido?

91. É evidente que a exigência de qualquer contraprova aos Executados terá que ser entendida como uma forma de inversão do ónus da prova, ilegal, com a qual o acórdão de que se recorre não se podia ter conformado!

92. Contudo, certo é que o acórdão de que se recorre não se pronunciou sequer sobre esta questão, levantada pelo Recorrente, a qual se traduz inequivocamente na inversão do ónus da prova, o que é absolutamente inadmissível!

93. Efectivamente poderá utilizar-se a expressão prova diabólica, mas relativamente aos Executados, pois que isso significaria a exigência da prova de um fato negativo, tarefa excessivamente onerosa ou até mesmo impossível para os Executados.

94. A contrário, cabia, sim, à Exequente juntar elementos para provar, a existência daqueles documentos na data do incumprimento, o que também não se sucedeu!

95. Daí que nestes casos o ónus da prova recai sobre a entidade bancária e não sobre o cliente bancário!

96. Contudo, andou muito mal o tribunal da relação ao concordar com o tribunal a quo e dessa forma ao admitir que minutas de cartas a enviar, em formato digital, juntas ao processo pelo Executado se considerassem como cópias das cartas remetidas e dar como provado que as mesmas foram enviadas pela Exequente e recebidos pelos Executados, sendo evidente a má interpretação prova carreada para o processo e a ilegal inversão do ónus da prova, interpretação ferida de falta de racionalidade, ilegalidade e até inconstitucional, já que viola o princípio da proibição de indefesa, o princípio da certeza e segurança jurídica.

97. Além do mais sempre se dirá que, ao contrário do que defende o tribunal a quo, confirmado no acórdão que se recorre ( com voto vencido), a integração dos clientes bancários no PERSI não é nem deve ser um procedimento automático, pelo contrário, nos termos do conjugadamente previsto nos artigos 11-A, 11ºC, 12º, 13º, 14º, 15º, 16º, e que decorre do próprio espírito da lei, é um procedimento personalizado e específico para cada cliente, com formalismos específicos, cujo cumprimento não foi minimamente demonstrado pela aqui Exequente.

98. E dir-se-á que todo o automatismo defendido pelo douto tribunal é contrário ao espírito da lei, sendo patente o erro de julgamento, totalmente inaceitável, atendendo ao supra exposto, que se beneficie a Exequente permitindo-lhe uma prova, sem prova, e até menos exigente do que aquela que a lei determina.

99. Até porque, reforce-se, a integração e extinção dos Executados no PERSI só se efectiva com a receção das comunicações por parte daqueles, porque existem limites que são intransponíveis, para assegurar o Estado de Direito e proteger a parte que considerou, a lei, ser a mais desprotegida, os clientes bancários, in casu, aqui Executados.

100. E é ostensivo que na apreciação da prova levado a cabo pelo douto Tribunal a quo, ao qual aderiu o acórdão recorrido, foi provido um enorme esforço para dar como provado que as minutas de “cartas a enviar” eram exemplares de cartas enviadas, até rececionadas, fazendo-se, consequentemente, tábua rasa da exigência do documento em suporte duradouro, criando incerteza, insegurança jurídica e obstaculizando o acessoà justiça, desprezando o bem jurídico que o legislador quis proteger.

101. Por outro lado, está também desprovida de racionalidade a fundamentação e conclusões levadas a cabo no acórdão recorrido, quanto ao do facto do Recorrente ter informado, no seu depoimento, que após ter sido incumprido o pagamento das prestações bancárias se recorda que chegou ainda a pagar mais uma prestação –cfr. transcrição do depoimento do aqui Recorrente nos minutos 00:03:18 a 00:03:37 – (o que terá ocorrido antes da insolvência das duas empresas em que trabalhava e era sócio), refere o acórdão que demonstra compatibilidade com os “documentos” juntos pela Exequente, já que conforme supra se demonstrou não se poderá conferir qualquer força probatória às minutas de cartas a enviar em suporte digital juntas pela Exequente.

102. Além de mais, tal como supra referido, ficou por saber quando é que efetivamente foi paga a última prestação, informação, esta sim, imprescindível à descoberta da verdade material, a qual não foi prestada pela Exequente no requerimento executivo, conforme se impunha, não foi questionada pelo douto tribunal aquando da prestação dos depoimentos de parte, e também nem sequer consta do teor das “cartas a enviar” juntas pela Exequente.

103. Contudo e efectivamente o acórdão recorrido, tal e qual como o tribunal a quo, apoia-se na situação de após o atraso no pagamento da primeira prestação ter sido paga mais uma prestação para concluir pela credibilidade e dar força probatória às minutas de cartas a enviar em formato digital juntas pela Exequente (às quais, conforme supra referido, não pode ser atribuído qualquer valor probatório) e, assim, dar como provado que os Executados foram integrados num 1º PERSI, o que é ilógico e falacioso, sem demonstrar a data desse pagamento!

104. Com efeito, a conclusão levada a cabo pelo tribunal a quo à qual aderiu o acórdão recorrido, parte de pressupostos falaciosos, sem qualquer sustentação, que se traduz num erro ostensivo na apreciação da prova, quando sustenta que as minutas das cartas a enviar em formato digital juntas pela Exequente são um documento em suporte duradouro e que foram recepcionadas pelos Executados, em clara violação da lei!

IV - A CESSÃO DO CRÉDITO, QUE BENIFICIA O EXEQUENTE

105.É um atentado à lei, à certeza e segurança jurídica a diminuição das exigências probatórias defendida, também, pelo acórdão de que se recorre, pelo facto de a Exequente ter adquirido o presente crédito a um terceiro (Banco Montepio), 106. De facto, não se pode aceitar que a cessão do crédito influa com valoração e graduação da prova, já que a cedência do crédito é naturalmente realizada nos mesmos termos e condições e, portanto, a cedência não pode nem prejudicar nem beneficiar a posição da actual Exequente e/ou dos Executados.

107. Caso contrário, deixaria até de ter qualquer utilidade a previsão normativa da legislação de 25 de Outubro, além de que se correria o risco de isto permitir a criação de um negócio altamente lucrativo entre as instituições financeiras, pois que cada vez que fosse cedido um crédito a sua cobrança teria menos riscos já que o tribunal seria, nesta tese defendida pelo acórdão recorrido com a qual não se pode concordar, menos exigente na produção de prova, o que seria inconcebível porque conduziria a decisões absolutamente injustas e ilegais.

108. Além de mais, o douto tribunal tem que considerar que quando a Exequente negociou/adquiriu este (e outros créditos como estes), conhece perfeitamente que se tratam de créditos de risco de cobrança, que já há muito foi ultrapassado o prazo de 5 anos desde o incumprimento/resolução do contrato e, por esse motivo, adquiriu-os por um valor residual, e não faz sentido que sejam beneficiadas com diminuições de exigências probatórias, em detrimento da lei, da certeza e segurança jurídica e das expectativas e interesses dos clientes bancários, aqui Executados, que a legislação em vigor quis proteger!

109. De facto, o aqui Recorrente não pode concordar com essa posição, a qual contraria também o Acórdão proferido pelo douto Supremo Tribunal de Justiça datado de 02-02-2023, Processo 1141/21.6T8LLE-B.E1.S1, Relator: FERNANDO BAPTISTA, cuja consulta se encontra disponível em www.dgsi.pt.

110. E se, de facto, a Exequente quando adquiriu o presente crédito no ano de 2019 (12/07/2019) não proveu pela análise devida dos documentos que lhe instruíam, só a ela se pode imputar essa falta de diligência, e se mesmo assim resolve interpor a presente acção executiva, é a ela que cabe demonstrar que estavam preenchidos os pressupostos de procedibilidade o que não se sucedeu ab initio (repare-se no teor do requerimento executivo!), tudo do conhecimento oficioso do tribunal!

111. Reforce-se que a Exequente, além da junção das minutas das cartas a enviar em suporte digital, não requereu qualquer tipo de produção de prova (aliás quem requereu o depoimento dos executados foi o douto tribunal, claramente em busca da confissão pelos executados da recepção das minutas das “cartas a enviar”, o que não se sucedeu), nomeadamente não requereu a prestação de prova testemunhal de qualquer funcionário do credor originário, que atestasse que de facto chegou a remeter aquelas minutas de cartas a enviar.

112. Já aos Executados é que é impossível provar que não receberam, daí as regras acerca do ónus da prova estarem bem definidas neste tipo de casos!

113. De facto, a interpretação das sobreditas normas e provas, carreadas para o processo, levada a cabo pelo tribunal a quo e confirmadas em parte pelo acórdão de que se recorre, vai de tal forma contra o espírito da lei que pode até estar em causa a violação do princípio da separação de poderes constitucionalmente consagrado.

114. Na verdade, o tribunal a quo com o qual o acórdão recorrido concordou, apoiando-se no argumento de que o sistema bancário/financeiro podia colapsar, viola gravemente as normas previstas nos artigos 8º, 9º, 342º, 344º,346º, 351º, 362º, 368º, 373º, 374º, 376º nº2 e 378º, do Código Civil, bem como 12º, 13º, 14º nº 1 e 4, 15º, 17º, 18.º, 20º, 21º, 39º do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro, entre outros, 115.Além de mais tal preocupação padece de qualquer racionalidade, já que para evitar o alegado colapso bastaria que o exequente ou o credor originário, cumprisse a lei e de imediato avançasse com a presente ação executiva e não apenas 8 anos mais tarde!

116. E não se compreende, por isso, qual o colapso que o Tribunal a quo pretende evitar?

Até porque atendendo as suas palavras o colapso há muito, e por exclusiva responsabilidade da Exequente e/ou credor originário, já teria ocorrido!

117. E através de um juízo de verosimilhança e de probabilidade, como se existisse um facto indiciário, que não existe, o acórdão de que se recorre, dá como provado que as reproduções mecânicas juntas pela Exequente, das minutas das “cartas a enviar” em suporte digital, existiram de facto, foram remetidas pela Exequente e recebidas pelos Executados, sem qualquer meio de prova capaz de sustentar tal decisão!

118. Opondo-se, reforce-se, às exigências de prova legalmente exigidas.

119. Com efeito, independentemente dos depoimentos prestados e do valor probatório que o tribunal atribuiu aos mesmos, cumpre denotar que a confissão de recepção das “cartas a enviar” nunca se sucedeu por parte de nenhum dos aqui Executados.

120. Além de mais e ao contrário do que prevê o despacho recorrido ao qual o acórdão de que se recorre aderiu, o aqui Recorrente não obtém qualquer tipo de ganho com a invocação de uma nulidade que, diga-se, o tribunal oficiosamente devia ter desde logo verificado ab initio, nem pode tal arguição, como pretendeu o tribunal a quo ser considerado como abuso de direito,

121. Está, sim, em causa o cumprimento da lei que o tribunal teima em ignorar, nesse sentido veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto (processo nº 4204/20.1T8MAI-A.P1) de 08-06-2022 (disponível em www.dgsi.pt), “na falta de factos indiciadores de má-fé, a invocação pelo devedor das normas jurídicas do regime jurídico do PERSI a seu favor não constitui qualquer abuso do direito[8]. Na falta de factos indiciadores de má-fé, a invocação pelo cliente-bancário das normas jurídicas do regime jurídico do PERSI a seu favor constitui o normal exercício de um direito, sendo que estamos perante uma relação jurídica caraterizada por uma acentuada assimetria informativa, em que alei inculca uma especial responsabilidade nas instituições bancárias considerando o cliente bancário-consumidor como a parte mais fraca.”

122.De facto, ao aderir à interpretação levada a cabo pelo tribunal a quo, o acórdão de que se recorre, faz uma interpretação absolutamente errada do depoimento prestado pelo aqui Recorrente, ignorando por completo as informações prestadas (conferir gravação do depoimento do Recorrente nos minutos: 00:01:20 a 00:03:01, 00:03:18 a 00:03:50, 00:06:06 a 06:06:44, 00:07:00 a 00:07:10, 00:08:13 a 00:08:28).

123. Nas quais refere reiteradamente nunca ter recebido quaisquer comunicações à cerca de integração e extinção dos Executados no PERSI.

124. Com efeito, ignorou o acórdão recorrido, o que foi dito pelo Recorrente no seu depoimento, que naquele período foram recebidas cartas de bancos mas relativamente a outras obrigações/dívidas, nomeadamente as relacionadas com as funções de gerente, sócio, e na qualidade de avalista e fiador em diversas obrigações assumidas pelas sociedades em que interviu (sociedade M..., Lda e sociedade A..., Lda), o que também foi expressamente assumido pela Executada BB no seu depoimento (crf. Transcrição do Recorrente 00:03:01 a 00:04:21) e trata-se de informação pública, facilmente comprovada pela consulta das certidões permanentes das sociedades com os respectivos códigos ............16 e ............68 – as quais se juntam e se reproduzem para os devidos e legais efeitos.

125. Não se pode ignorar que o depoimento prestado pelos Executados é absolutamente irrelevante para a boa decisão da causa, ainda assim, e dado que foram entendidos, pelo o Tribunal ad quo, como reforço probatório relevante quanto ao envio e receção das minutas das “cartas a enviar”, importa esclarecer que nenhum dos Executados confessou que as recepcionou!

126. E esclareça-se, como é evidente pelo depoimento do aqui Recorrente que quando refere que nunca tinha recebido nenhuma carta do Montepio, pretendia dizer que nunca recebeu qualquer carta do montepio relacionada com a integração do PERSI, mas que recebeu, porém, correspondência como sócio, gerente e avalista das sociedades A..., Lda e M..., Lda, que se encontravam com inúmeras dificuldades financeiras, as quais acabaram por falir, o que, e apesar da evidente quezília entre ambos os Executados, a Executada BB também assume e confessa (conferir depoimento da Executada BB nos minutos 00:03:01 a 00:04:33 – transcrição junta pelo Recorrente).

127. Ainda relativamente a este tema, cumpre denotar que não faz qualquer tipo de sentido a questão colocada pelo Advogado da Executada BB (minutos 13:12 a 13:38 do depoimento da Executada BB) quando “impende o esforço” no sentido de esclarecer que a sede das empresas que o Recorrente representava não se situavam no local da casa de morada de família (residência pessoal), dado que as cartas que este recebeu por conta das dívidas das empresas lhe foram remetidas na qualidade de Gerente, sócio e Avalista e, por isso, sempre foram dirigidas à sua morada da sua residência pessoal, como não podia deixar de ser, sendo totalmente irrelevante o local da sede das empresas.

128. Por outro lado, não se compreende a relevância atribuída pelo acórdão recorrido ao facto da Exequente BB ter referido de que se recorda de conversar possivelmente com o marido sobre o alargamento do prazo do empréstimo à habitação: “Com relevância ainda referiu que chegou a conversar com o marido, nessa altura (antes da separação que ocorreu em Junho de 2014) acerca do alargamento do prazo do empréstimo à habitação, o que se mostra compatível com o teor das cartas datadas de 2.6.2013 e de 2.9.2013 juntas pelo exequente, face ao segundo PERSI, já que não conseguiram resolver a situação que originou o primeiro.”

129. Desde logo, porque conforme ficou demonstrado no processo não ocorreu qualquer alargamento do prazo do contrato de mútuo em questão.

130. Além de mais, porque o depoimento da Exequente BB, que se encontra de relações cortadas com o Recorrente, está repleto de contradições flagrantes – cfr. prestação de depoimento da Executada BB nos minutos 00:06:52 a 00:08:06, 00:04:37 a 00:06:52, 00:11:49 a 00:12:09 e 00:12:26 a 00:13:09 - sendo que relativamente a esta matéria inicialmente recorda-se de ter falado sobre isso, mas nem tem a certeza se foi com o seu marido, como a seguir já indica que só teve conhecimento de tudo posteriormente porque tudo era tratado pelo ex-marido.

131. De facto, perante tais depoimentos e o já supra descrito relativamente às minutas de cartas a enviar em formato digital juntas pela Exequente, nunca se poderia ter dado como provado o envio muito menos a recepção por parte dos Executados das comunicações obrigatórias de integração e extinção do PERSI, pelo que o acórdão recorrido ultrapassou todos os limites da valoração, graduação e interpretação dos meios de prova produzidos, com grave ofensa de disposições expressas na lei, mormente as previstas nos artigos 8º, 9º, 342º, 344º,346º, 351º, 362º, 368º, 373º, 374º, 376º nº2 e 378º, do Código Civil, bem como 12º, 13º, 14º nº 1 e 4, 15º, 17º, 20º, 21º, 39º do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro, que exigem certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixam a força de determinado meio de prova, impondo-se a revogação do acórdão datado de 25/03/2025.

V - A DOAÇÃO E A ALEGADA NÃO OBRIGATORIEDADE DO PERSI:

132. Por outro lado, cumpre também denotar que é absurdo, pelo que não se pode aceitar o vertido no acórdão recorrido que se passa a transcrever:

“Nas conclusões de recurso 131 e ss, diz o Apelante que pelo teor do requerimento executivo, consta que a causa de resolução do contrato de mútuo foi a falta de pagamento das prestações mensais, pelo que não pode vir agora o douto Tribunal se sobrepor à parte, num contrato que é bilateral, resolvendo o com um fundamento diferente daquele invocado pela parte/Exequente .

Que o tribunal ao afirmar que os clientes bancários, aqui Executados, praticaram atos suscetíveis de pôr em causa as garantias da instituição de crédito, ao doarem a terceiros, sem o conhecimento ou consentimento desta, o imóvel que, por via da hipoteca, garantia o pagamento do crédito.

O Tribunal não pode condenar mais do que o inicialmente peticionado pela Exequente, ao fazê lo, está a ultrapassar o objeto do processo, sendo absolutamente proibido o excesso de pronúncia.

Conclui que, nesta sequência, estamos relativamente a esta matéria perante uma clara situação de excesso de pronúncia, cuja consequência é a nulidade do despacho recorrido, o que se requer com todas as consequências legais.

Claramente não se verifica a nulidade invocada, uma vez que a decisão proferida limita se a julgar não verificada a exceção dilatória inominada que o tribunal foi chamado a apreciar e nada mais do que isso.

Na sentença, na parte final, o tribunal faz referência ao facto de no seu entender, apesar de ter sido observado o PERSI, “a situação dos autos nem sequer implicaria a aplicação deste procedimento, o que, por si só, atenta a argumentação jurídica acima exposta, é suscetível de afastar a verificação da apontada exceção dilatória, dizendo que, para este efeito, cumpre atentar que os executados clientes bancários praticaram atos suscetíveis de pôr em causa as garantias da instituição de crédito, ao doarem a terceiros, sem o conhecimento ou consentimento desta, o imóvel que, por via da hipoteca, garantia o pagamento do crédito.”

Ora, a questão da doação feita sem conhecimento do banco credor, foi alegada pela exequente, no requerimento de 4.11.2024, ao exercer o seu direito de contraditório e em resposta à arguição da exceção dilatória inominada pelo executado, sendo pois legitimo ao tribunal tirar as devidas consequências jurídicas dessa alegação.”

133. De facto, “a decisão proferida limita-se a julgar não verificada a exceção dilatória inominada que o tribunal foi chamado a apreciar e nada mais do que isso”, o problema é que para julgar não verificada a excepção dilatória o tribunal utilizou como fundamento o facto de que neste caso, nem existiria a obrigatoriedade de os Executados serem integrados no PERSI, pois que defende que existe outra causa de incumprimento do contrato de mútuo pelo qual a Exequente poderia ter resolvido o contrato em causa!

134. Mesmo que se aceitasse esta tese, importa esclarecer que mesmo que o credor originário pudesse ter resolvido o contrato de mútuo celebrado entre as partes (o que, conforme infra se demonstrará, não podia fazer), a verdade é que o mesmo nunca resolveu o contrato por força desse alegado incumprimento (o que é por mais evidente pelo teor do requerimento executivo, no qual consta que a causa de resolução do contrato de mútuo é apenas a falta de pagamento das prestações mensais “a partir de Agosto de 2013”, bem como pelo teor do requerimento apresentado pela Exequente no dia 18/10/23 (ref. ......49), os quais o douto tribunal não pode ignorar.

135. Com efeito, o Recorrente é da opinião que não pode o Tribunal se sobrepor à parte, num contrato que é bilateral, resolvendo-o com um fundamento diferente daquele invocado pela parte/Exequente.

136. Além do mais, a doacção, no caso concreto, não fez de maneira alguma diminuir a garantia do banco, entrando, por isso, em contradição no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (processo 1141/21.6T8LLE-B.E1.S1), datado de 02-02-2023 (disponível em www.dgsi.pt), que é claro sobre esta matéria,

137. Pelo que in casu não estamos perante nenhuma das situações previstas para extinção automática do PERSI,

138. O que aliás foi confirmado pela própria Exequente, em sede de contraditório, através do requerimento datado de18/10/2023 (ref. ......49), onde, no seu artigo 6º, reconhece taxativamente que se encontravam preenchidos todos os pressupostos legais para integração dos executados no PERSI e que alegadamente o credor originário optou e realizou pela integração e extinção dos Executados no PERSI.

139. Com efeito, e de acordo com o citado Acórdão do STJ, a doação pelo devedores/mutuários, mesmo que sem autorização ou conhecimento da entidade mutuante, do imóvel sobre que incidem as hipotecas a favor da mutuante, não constitui uma causa de extinção imediata do PERSI, até porque a mesma não desonera os devedores do pagamento da dívida, nem desonera a instituição bancária das suas obrigações de integração dos executados em PERSI, e de informação/comunicação da extinção do mesmo.

140. Além de mais sendo a garantia do crédito uma hipoteca, que, porque goza de sequela (artigo 686º do Código Civil), acompanha a coisa em todas as suas vicissitudes – cfr. certidão permanente do imóvel com o código PP-........50- ...........86 (consulta disponível em https://www.predialonline.pt/PredialOnline/FRM005RPOLCP_input.action que se junta e na qual se pode verificar que o registo das penhoras posteriores à “doação” foram todas recusadas – pelo que não pode aceitar-se a posição que esteja em perigo a garantia, pois o credor pode fazer-se pagar pelo valor da coisa onde quer que ela se encontre.

141. Por tudo quanto foi dito, e por estar em causa os princípios da certeza e da segurança jurídica, estamos claramente perante uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é nitidamente necessária por parte do Supremo Tribunal de Justiça para uma melhor aplicação do direito.

142. Com efeito, apesar de ter alegado pela integração do PERSI, a verdade é que a Exequente se absteve de provar que chegou ao conhecimento dos clientes bancários, ora executados, a sua integração e extinção no PERSI, nos termos do conjugadamente previsto nos artigos 14º, 17º, 18º, 21º e 39º do referido decreto-lei, nem sequer foi confessada a sua recepção por parte dos Executados, motivo pelo qual não pode o douto tribunal dar como provado os factos i), j) k), l), m), n).

143. Ora, como supra assinalado, a falta de cumprimento da obrigação de integração do devedor mutuário no PERSI constitui uma exceção dilatória insuprível, de conhecimento oficioso (cfr. artigo 726.º, n.º 2, alínea b) do CPC), in casu o bem penhorado ainda não foi objecto de transmissão, pelo que não pode deixar o tribunal de a conhecer e decretar, tudo com as demais consequências legais.

144. Com efeito, e dado que a Exequente não comprovou a integração dos Executados e a sua extinção no PERSI antes da instauração da presente execução, sendo sobre ela que recai o ónus de comprovar o preenchimento das condições de procedibilidade da presente acção executiva, nos termos do conjugadamente previsto nos artigos 576º, n.ºs 1 e 2, 578.º, 726.º, 734º n.º 1 do Código de Processo Civil, deverá o acórdão recorrido ser revogado e extinta a presente instância

Nestes termos e nos mais de Direito que Vossas Excelências não deixarão de suprir proficientemente deve o presente recurso de Revista ser julgado procedente por provado e em consequência revogado o Acórdão recorrido e, em consequência, a presente instância executiva ser extinta. E assim será feita JUSTIÇA!


*


Não foram apresentadas contra-alegações.

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2. FUNDAMENTAÇÃO.

A) OS FACTOS.

O acórdão recorrido julgou:

A.1. Provados os seguintes factos:

a) A exequente deduziu execução hipotecária para pagamento de quantia certa contra AA, BB e outros, nos termos que constam do requerimento executivo datado de 07.04.2021, com o teor que se dá por reproduzido,

b) Apresentando, como título executivo, a escritura pública de “Compra e venda e mútuo com hipoteca e fiança”, junta como documento 4 do requerimento executivo, datada de 20.01.2006, com o teor que aqui se dá por reproduzido.

c) A fração autónoma designada pelas letras “AP” do prédio descrito na C. R. Predial de ... sob o n.º ..86/20050302-AP, contém os seguintes registos relevantes:

a. Hipoteca voluntária sob a ap. 6 de 21.12.2005, a favor do cedente do crédito exequendo,

b. Com ampliação sob a ap. 42, de 06.03.2006;

c. Aquisição, por doação, sob a ap. .84, de 07.04.2011, a favor de DD e de EE;

d. Direito de habitação, em reserva em doação, pela ap. .84, de 07.04.2011, a favor dos executados AA e BB.

d) Por escritura pública de 17.03.2011, os executados AA e BB declararam doar a fração autónoma acima referida aos seus filhos, conforme escritura junta com o requerimento de 09.05.2024, com o teor que se dá por reproduzido,

e) Sem que tenham obtido o acordo do credor hipotecário para tal doação.

f) Ou lhe tenham dado conhecimento da mesma.

g) A Caixa Económica Montepio Geral, na qualidade de cedente, e a exequente, na qualidade de cessionária, outorgaram, em 12.07.2019, a escritura pública de Cessão de Créditos junta como documento 1 e 2 do requerimento executivo, com o teor que se dá por reproduzido.

h) A fração autónoma referida foi penhorada na presente execução, vindo o agente de execução a proferir decisão de aceitação da proposta de compra efetuada por terceiro, nos termos da decisão de 01.06.2022 que aqui se dá por reproduzida.

i) O credor cedente do crédito exequendo (Montepio) remeteu, por correio simples, ao executado AA, para a morada sita na Rua ..., ..., o escrito datado 02.03.2013 junto como documento 1 do requerimento de 13.05.2024, com o teor que se dá por reproduzido, constando do mesmo o seguinte:


j) O credor cedente do crédito exequendo (Montepio) remeteu, por correio simples, ao executado AA, para a morada sita na Rua ..., ..., o escrito datado 03.04.2013 junto como documento 4 do requerimento de 13.05.2024, com o teor que se dá por reproduzido, constando do mesmo o seguinte:

“Em conformidade com o estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 227/2012…informamos que em virtude de regularização foi extinto o seu enquadramento no…(PERSI).”.

k) O credor cedente do crédito exequendo (Montepio) remeteu, por correio simples, ao executado AA, para a morada sita na Rua ...,..., o escrito datado 02.06.2013 junto como documento 2 do requerimento de 13.05.2024, com o teor que se dá por reproduzido, constando do mesmo o seguinte:

“(…)


Contrato nº ...........13-1 Data do último vencimento; 01-03-2013

Valores em dívida;

Capital 1.704,78

Juros 0,00

Encargos associados à mora 0,00

Total 1.704,78

Data de integração no PERSI; 02-06-2013

(…)”.

l) O credor cedente do crédito exequendo (Montepio) remeteu, por correio simples, ao executado AA, para a morada sita na Rua ..., ..., o escrito datado 02.09.2013 junto como documento 3 do requerimento de 13.05.2024, com o teor que se dá por reproduzido, constando do mesmo o seguinte:

“Em conformidade com o estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 227/2012…informamos que em virtude de Expiração foi extinto o seu enquadramento no…(PERSI).”.

m) O credor cedente do crédito exequendo (Montepio) remeteu, por correio simples, à executada BB, para a morada sita na Rua ... ..., os escritos datados de 02.03.2013, 03.04.2013, 02.06.2013 e 02.09.2013 juntos como documentos 5 a 8 do requerimento de 13.05.2024, com o teor que se dá por reproduzido, com o mesmo teor dos escritos acima referidos como dirigidos ao executado AA,

n) As cartas acima referidas como dirigidas pelo cedente do crédito exequendo aos executados AA e BB foram recebidas na caixa postal da morada de destino.

o) Os executados AA e BB tinham, em 2013, o seu domicílio na morada sita na Rua ..., ....


*


B) O DIREITO APLICÁVEL.

O conhecimento deste Supremo Tribunal, quanto à matéria dos autos e quanto ao objecto da revista, é delimitado pelas conclusões das alegações do Recorrente como, aliás, dispõem os art.ºs 635.º, n.º 2, 639.º 1 e 2, do C. P. Civil, sem prejuízo do disposto no art.º 608.º, n.º 2, do C. P. Civil (questões cujo conhecimento fique prejudicado pela solução dada a outras e questões de conhecimento oficioso), observando, em especial, o estabelecido nos art.ºs 682.º a 684.º, do C. P. Civil.

Atentas as conclusões da revista, acima descritas, a questão submetida ao conhecimento deste Tribunal pela Recorrente consiste, tão só, em saber se os titulares passivos do crédito exequendo foram integrados no regime legal do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) aprovado pelo Dec. Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, como decidiu o acórdão recorrido, ou se tal não aconteceu, devendo em consequência ser revogado o acórdão, julgada procedente a exceção inominada e declarada extinta a execução, como pretende o Recorrente.

Conhecendo.

Dispõe o n.º 1, do art.º 39.º do Dec. Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, que “1 - São automaticamente integrados no PERSI e sujeitos às disposições do presente diploma os clientes bancários que, à data de entrada em vigor do presente diploma, se encontrem em mora relativamente ao cumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito que permaneçam em vigor, desde que o vencimento das obrigações em causa tenha ocorrido há mais de 30 dias”.

Nos termos do disposto no art.º 40.º, do mesmo diploma, o regime legal nele estabelecido entrou em vigor em 1 de janeiro de 2013 e a execução que constitui o processo principal foi instaurada em data posterior, pelo que lhe é aplicável o regime legal do PERSI.

Como é jurisprudência unívoca deste Supremo Tribunal de Justiça, o incumprimento pelas instituições bancárias do dever de integração dos seus clientes em mora no PERSI tem a natureza jurídico processual de exceção inominada, cuja ocorrência determina a extinção da instância executiva1.

No caso sub judice, como consta sob as alíneas i. j, k e l da matéria de facto pertinente declarada provada pelas instâncias, no que respeita a mora no cumprimento da obrigação fonte do crédito exequendo, o Recorrente foi integrado no PERSI uma primeira vez (facto sob a al. i)), que terminou por “regularização” (factos sob a al. j)) e uma segunda vez que veio a ser declarada extinta (als. k e l), sendo que uma e outra dessas integrações foram comunicadas aos executados, que as receberam, como consta dos factos declarados provados sob as als. m) e n) da matéria de facto da sentença, confirmada pelo acórdão recorrido.

O Recorrente discorda longamente de tais factos, mas essa discordância só pode ser objeto de sindicância por este Supremo Tribunal de Justiça nos limites decorrentes do disposto nos n.ºs 2 e 3, do art.º 682.º e na segunda parte do n.º 3, do art.º 674.º, do C. P. Civil.

Pretende o Recorrente que os factos sob as als. i) a n) não podiam ser declarados provados, tendo as instâncias incorrido em erro de julgamento, reconduzindo a sua pretensão de revogação do acórdão recorrido ao disposto na segunda parte do n.º 3, do art.º 674.º, do C. P. Civil, que admite a revista em matéria de facto “…havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova”, sem todavia concretizar o meio de prova que se impunha e alicerçando a sua pretensão na mera discordância com a convicção expressa pelas instâncias na fundamentação das suas decisões.

Não lhe assiste razão nessa discordância.

Com efeito, em relação aos factos de que discorda nem existe disposição legal expressa que exija certa espécie de prova, nem disposição legal que a fixe a força de determinado meio de prova, para além do “suporte duradouro” a que reportam os art.ºs 3.º, al. f), 20.º, n.º 1, 14.º, n.º 4 e 17.º, n.º 3, do Dec. Lei, n.º 227/2012, de 25 de Outubro.

Do disposto no n.º 4 do art.º 14.º e no n.º 3, do art.º 17.º, decorre que a informação ao cliente bancário da sua integração no PERSI e da extinção do PERSI deve ser feita através de comunicação em suporte duradouro.

Nos termos do disposto no n.º 1, do art.º 20.º, do Dec. Lei, n.º 227/2012, “1 - As instituições de crédito devem criar, em suporte duradouro, processos individuais para os clientes bancários abrangidos pelos procedimentos previstos no PERSI, os quais devem conter todos os elementos relevantes, nomeadamente as comunicações entre as partes, o relatório de avaliação da capacidade financeira desses clientes e, quando aplicável, as propostas apresentadas aos mesmos, bem como o registo das razões que conduziram à não apresentação de propostas, e ainda a avaliação relativa à eficácia das soluções acordadas.”.

O que seja o “suporte duradouro» é definido pela al. h), do art.º 3.º, do mesmo diploma como “h) «Suporte duradouro» qualquer instrumento que permita armazenar informações durante um período de tempo adequado aos fins a que as informações se destinam e que possibilite a reprodução integral e inalterada das informações armazenadas”.

Atenta esta definição legal, esse “suporte duradouro” só poderá reportar-se aos sistemas de informação e arquivo em uso na atividade bancária, genericamente, de natureza informática/electrónica e eventualmente, ainda, em papel.

Esta imposição legal de informação e respetivo arquivo, especifica para o PERSI instituído pelo Dec. Lei n.º 227/2012 e a par com outras disposições legais relativas à atividade bancária em si mesma, tem a duração de cinco anos, estabelecida pelo n.º 2 do art.º 20.º e a sua violação constitui contraordenação estabelecida pelo n.º 1, do art.º 36.º.

Como decorre do próprio conteúdo dos factos sob as als. i) a m) a entidade bancária informou o Recorrente em suporte duradouro e organizou o respetivo arquivo, que manteve para além dos cinco anos a que se reporta o n.º 2, do art.º 20.º.

O Recorrente insurge-se, em especial quanto ao facto declarado provado sob a al. n), a que também se reporta o voto de vencido da Exm.ª Juíza Desembargadora Adjunta, nos termos do qual “As cartas acima referidas como dirigidas pelo cedente do crédito exequendo aos executados AA e BB foram recebidas na caixa postal da morada de destino”, mas o certo é que, tanto o voto de vencido como a leitura que dele faz o Recorrente, mostrando-se cumprida a exigência legal de “suporte duradouro”, se situam já no domínio do principio da livre apreciação da prova pelas instâncias, que não é sindicável por este Supremo Tribunal por inexistência de norma processual habilitante para o efeito.

Não obstante, não podemos deixar de salientar que, nos termos da fundamentação das instâncias, a prova do facto sob a al. n) se estruturou com base nos documentos citados em confronto com as declarações do Recorrente e da co-executada com ele convivente, tidas como inconsistentes as do Recorrente e coerentes as da co-executada, como pormenorizada e longamente é explanado nessa fundamentação.

Estando, pois, provado nos autos que foi dado cumprimento ao disposto no n.º 1, do art.º 39.º do Dec. Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, não ocorre a exceção inominada de incumprimento da obrigação legal de integração no PERSI, que não pode deixar de improceder, com ela improcedendo a questão única da revista e a própria revista.

Pelo exposto, não poderá deixar de ser negada a revista, confirmando-se o acórdão recorrido.


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3. DECISÃO.

Pelo exposto, acordam os juízes neste Supremo Tribunal de Justiça em negar a revista, confirmando o acórdão recorrido

Custas pelo Recorrente, que lhes deu causa, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2, do art.º 527.º, do C. P. Civil.

Lisboa, 03-07-2025

Orlando Nascimento (relator)


Carlos Portela


Isabel Salgado


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1. Cfr, entre outros, os acórdãos de 19/05/2020, proferido no P.º 6023/15.8T8OER-A.L1.S1), 13/04/2021 proferido no P.º 1311/19.7T8ENT-B.E1.S1, 16/11/2021, proferido no P.º 21827/17.9T8SNT-A.L1.L1.S1, 09/12/2021, proferido no P.º 4734/18.5T8MAI-A.P1.S1, 02/02/2023, proferido no P.º 1141/21.6T8LLE-B.E1.S1, todos publicados in dgsi.pt.