Sumário:
I – Nos termos do artigo 423.º do CPC, os documentos devem, em regra, ser apresentados com o articulado em que se alegam os factos que se pretendem provar (n.º 1), podendo ainda ser juntos até 20 dias antes da audiência de julgamento, com aplicação de multa, salvo justificação atendível (n.º 2); após este momento, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior (n.º 3).
II – A admissão de documentos apresentados nos termos do n.º 2 do artigo 423.º do CPC, está sujeita, para além da multa, à verificação da sua pertinência e necessidade, nos termos do artigo 443.º, n.º 1 do CPC.
III – A pertinência dos documentos mede-se pela sua relação direta com os temas da prova; a desnecessidade verifica-se quando o documento nada acresce à prova dos factos relevantes.
IV – Não tendo a parte identificado os temas da prova que visava provar com os documentos apresentados e verificando-se que os mesmos não relevam para a prova dos factos controvertidos enunciados nos temas da prova, não se justifica a sua admissão.
V – A invocação genérica de violação de princípios processuais e constitucionais, sem conexão concreta com o objeto da decisão recorrida, não é suficiente para infirmar a decisão judicial.
VI - O princípio do contraditório (artigo 3.º, n.º 3 do CPC) garante às partes o direito de se pronunciar sobre todas as questões relevantes do processo, mas não permite uma cadeia infindável de requerimentos e contra requerimentos a latere da tramitação legalmente prevista.
VII – O princípio da igualdade (artigos 4.º do CPC e 13.º da CRP) visa a igualdade substancial entre as partes de modo a atingir-se um equilíbrio global no processo.
VIII- Tendo o tribunal assegurado o contraditório e regulado corretamente a tramitação processual, recusando requerimentos impertinentes junção de documentos fora dos pressupostos legais, a par de promover a junção oficiosa de documentos essenciais à boa decisão da causa, não se verifica qualquer irregularidade ou violação do princípio da igualdade ou de outros princípios processuais civis.
Tribunal recorrido: TJ Comarca de Santarém, Juízo Local Cível de Torres Novas
Apelante: AA
Apelado: Condomínio do Edifício...
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Évora
I – RELATÓRIO
No Juízo Local de Torres Novas corre termos uma ação intentada por AA, advogada em causa própria, tendo seguido após o despacho saneador, como ação para anulação de deliberações da assembleia de Condomínio do Edifício..., sito na Rua ..., tomadas em 23-04-2023 (ata n.º 37), prosseguindo a ação apenas contra o Réu Condomínio do Edifício..., representado pela sua administradora Gescofati- Gestão de Condomínios de Fátima, Ld.ª.
Em 23-09-2024 (ref.ª 974776719) foi proferido despacho com vários segmentos decisórios, tendo a Autora interposto recurso do mesmo.
Não foi apresentada resposta ao recurso (nem ao aperfeiçoamento das Conclusões infra referido).
Admitido o recurso, emitida pronúncia negativa sobre a arguição de nulidades, como consta do despacho proferido em 06-01-2025 (ref.ª 98146100), e remetidos os autos a esta Relação de Évora, a Relatora proferiu o despacho de 25-03-2025 (ref.ª 9569266) a convidar a recorrente a aperfeiçoar as Conclusões do recurso.
Nesse seguimento foram apresentadas as seguintes Conclusões:
1. A autora apela para este Venerando Tribunal da Relação relativamente ao Douto Despacho refª 97477671 e os devidos segmentos abaixo designados em crise, que indeferiu um meio probatório, mormente, a junção de documentos e outros requeridos, o fez ao abrigo do disposto no art.º 423 n.º 2 CPC;
2. Entendeu a M Juiz com o Douto Despacho refª 97477671 em crise violar a lei processual e, bem assim, diversos princípios basilares do processo civil e constitucionalmente consagrado no art.º 20 CRP, princípio acolhido no art.º 413.º n.º 1, que é uma componente do direito geral à protecção jurídica, de acesso aos tribunais e da tutela jurisdicional efectiva;
3. Desse direito decorre, por um lado, o dever de o tribunal atender a todas as provas produzidas no processo, e que sejam licitas, independentemente da sua proveniência, e, por outro, a possibilidade de utilização pelas partes, em seu benefício, dos meios de prova que mais lhes convierem;
4. A recusa de qualquer meio de prova deve ser fundamentada na lei ou em princípio jurídico, não podendo o tribunal fazê-lo de modo discricionário;
5. Acresce, que o Douto despacho recorrido é de uma grande complexidade, ainda, com a agravante que foi rejeitada a pretensão da autora na PI e a não apreciação acta n.º 37, correspondente à referência 10983864 datado de 23.09.2024, com remissão para a referência 10892824, conteúdo, que deu azo à apresentação de documentos posteriormente, rejeitados, que se argui;
6. Deste modo, os segmentos do despacho que a ora apelante pretende impugnar e submetidos à apreciação do Tribunal Superior, são os seguintes:
a) Refª 10983864 de 23.9.2024, com remissão para a refª 10892824, que consiste na acta n.º 37 e os seus anexos, anexos que são componentes da acta e não anexos propriamente dito, lista de presenças, mais três declarações, datadas de 9 e 11.5.2023, documentos que divergem do solicitado requerida pela recorrente na PI articulado 75;
b) Quis o Tribunal a quo, sobre a refª 10963041 de 15-09-2024, dividir o supra requerimento em três partes, sendo SÓ a 2ª parte designada (2. Documentos juntos pela A.:) a, ser apreciado pelo Tribunal Superior, documentos estes que foram juntos pela autora e que têm uma conexão com os temas de prova, que constitui o objecto da lide, nomeadamente, a anulação das deliberações da assembleia de Condomínio do Edifício..., em 23.4.2023, respeitante acta 37;
c) Um outro segmento em crise reportam-se aos requerimentos com as refª 10983862 e 10983865 de 23.9.2024, também a serem apreciados pelo Tribunal Superior.
d) Os três segmentos em crise estão todos interligados e, todos os documentos foram rejeitados, que no fundo é tudo aquilo que a autora referiu nos articulados e requereu na PI;
e) Logo, as questões a decidir pelo Tribunal Superior, são: os documentos rejeitados, a multa processual e a violação ao P. da Igualdade das Partes.
7. É relevante para se aferir a anulação das deliberações da assembleia, se os documentos rejeitados e os requeridos e, a saber se estão reunidos os requisitos do art.º 1432 cc, nomeadamente, se a convocatória indicou, dia, hora local e ordem de trabalhos da reunião e a informar sobre os assuntos cujas deliberações só podem ser aprovadas por unanimidade dos votos e, caso não tenham comparecido os condóminos suficientes, se foi fixada outra data;
8. No caso em apreço, a respectiva convocatória consta como ponto da ordem de trabalhos: “outros assuntos de interesse geral”, sem minimamente e os concretizar, pois trata-se de um verdadeiro “saco sem fundo” onde se pode conceber e integrar qualquer assunto, à excepção dos que, segundo a lei, têm de ser, expressamente, referenciados na convocatória por carecerem de deliberação por unanimidade violando o art.º 1432.º CC.
9. Motivo pela qual a recorrente requereu ao Douto Tribunal através do requerimento ref 10963041 os comprovativos das convocatórias e das deliberações, uma vez que a assembleia não foi regularmente convocada nos termos do art.º 1432 cc, tendo sido vedada a documentação e informação à recorrente;
10. Nesta sequência, in casu, também as deliberações violam preceitos de natureza imperativa que têm por objecto assuntos que exorbitam da esfera de competência da assembleia dos condóminos, estando em apreço, conta bancária movimentada por quem não é condómino, proprietário, morador ou administrador, levantamentos bancários indevidos, incêndio simulado das partes comuns junto da seguradora, actas adulteradas com saldos e rúbricas transferidas para os anos seguintes, saldos estes manifestados na acta n.º 37, ocorrendo o abuso de direito;
11. Para melhor apreciação dos segmentos em causa, acresce referir que na acta n.º 37, é composta por quatro pontos a que se refere a ordem de trabalho e em cada ponto da ordem de trabalho corresponde um anexo, que é o conteúdo das rúbricas, despesas e receitas, discriminado. Estes anexos são parte integrante da acta 37, esta acta é composta por uma única folha frt e vrs, acompanhada por 4 anexos como parte integrante;
12. É de evidente constatação que a acta n.º 37 de 23.04.2023, foi presidida por quem não tem legitimidade, sendo, os sócios gerentes da Gescofati - Lda – BB administradora e CC, com a devida vénia o Tribunal a quo, no segmento referência 10983864, não quis ou não pretendeu aferir a legitimidade, focando “nada mais há a determinar”, logo negou o direito à justiça da recorrente deitando por terra todo o processo sobre a impugnação das deliberações;
13. Legitimidade - O que se verificou foi quem presidiu à reunião da assembleia assinou a acta, sem legitimidade, ainda assinou, em nome de outros condóminos sem representação para adquirir quórum suficiente do capital do prédio, vício que motivou a ora recorrente a solicitar com a PI as supra procurações, posteriormente, reforçou com a junção dos documentos rejeitados e em crise;
14. A acta n.º 37 é falsa! Não reproduz fielmente o que se passou em reunião, foi posteriormente, elaborada e assinada pela administradora e quem a presidio;
15. Por conseguinte, o Douto despacho em crise o qual rejeitou os documentos, refere “2. Documentos juntos pela A.:” que a autora não revelou qualquer conexão com os temas da prova, o que não é verdade salvo devido respeito por opinião contrária, pois na PI a recorrente requereu cópia dos documentos, sobre a acta 37, uma vez que a informação e os documentos foram desvalorizados, significa, que as funções do administrador foram violadas, mais uma omissão de pronúncia, que se argui;
16. Ademais, os documentos apresentados pela recorrente e rejeitados, pela M Juiz, ref(s) 10963041, 10963042, 10963043, 10983862, 10983865 e 10983864, embora estejam caracterizados sobre a sua natureza, e sem necessitarem de explicações, todos esses documentos tem o seu conteúdo e os seus valores interligados aos saldos da acta n.º 37 e correspondente ao tema da prova, que constitui o objecto da lide, que é a anulação das deliberações da assembleia ocorrida em 23.4.2023;
17. Lamentavelmente, à Meritíssima Juíza do Tribunal a quo compete-lhe conhecer todo o processo e se tivesse observado o abuso de direito por parte da administradora R. condomínio no exercício das suas funções judiciais, e conforme a contestação dos RR, que alegam que a autora sempre exige explicações e documentação, óbvio, se a Autora exige documentação é porque a administração viola o direito às informações e aos documentos que são do condomínio, violando as suas funções art.º 1436.º cc:
18. A autora tem o direito de individualmente obter informações relativas à situação e a administração das partes comuns. Todavia, tal direito à informação a autora sempre que se cingir à situação especifica dos interesses meramente pessoais do condómino, não se destinando a que este se possa substituir aos órgãos próprios do condomínio no exercício das suas competências, a este respeito é lapidar a doutrina do ac. Supremo Tribunal de Justiça de 29.9.2020 processo n.º 7092/17.1T8LRS.L1.S1.
19. Oportuno, referir que a Autora em 2013 instaurou uma providência cautelar, junto do Tribunal Judicial de Alcanena - Processo n.º 157/13.0TBACN, com a finalidade de obter documentação do condomínio e os seus recibos de quitação, acontece, que o R. condomínio desrespeitou a Douta decisão não tendo apresentado os documentos e recibos de quitação à autora até á presente data, DESMONSTRADO ESTÁ, o vício ocorrido em 2013 que se reflete no saldo bancário do condomínio e nas dívidas de condóminos, documento, caracterizado pela sua natureza que não necessita de fundamentação.
20. Saliento, que os três segmentos em causa, e a serem apreciados pelo Tribunal Superior estão ligados aos supra documentos apresentados pela autora existindo conexão com os saldos da acta n.º 37 e que fazem parte do tema da prova, sendo um dos motivos pela qual a autora, requereu ao Tribunal a quo, os documentos, para inquirir e confrontar as testemunhas com os ditos documentos sobre o SALDO e os elementos contabilísticos do exercício do ano 2022 e o corresponde saldo vindo de trás, nomeadamente, saldo bancário, dívidas a fornecedores e dívida de condóminos;
21. Salvo o devido respeito por opinião contrária, a Meritíssima Juíza deveria ter o mínimo conhecimento de todo o processo e o litígio em causa, invés, tornou despachos complexos e um processo anormal, eliminando a natureza dos documentos quando não é necessário alegar ou justificar a impossibilidade da recolha dos documentos em os obter, ou os que não pode obter;
22. Ademais o princípio do inquisitório deve ser interpretado como um poder-dever limitado, restringindo-se, em matéria probatória, na busca pelas provas dentro dos factos alegados pelas partes (factos essenciais), com vista à justa composição do litígio e ao apuramento da verdade;
23. Também, o princípio da cooperação deve ser conjugado com o princípio da auto-responsabilidade das partes, que não comporta o suprimento por iniciativa do juiz da omissão de articulação de factos estruturantes da causa no momento processualmente adequado;
24. A recusa dos meios de prova não se mostra conforme uma boa decisão do Direito e dos factos, como já se demonstrou, salvo o muito devido respeito por opinião contrária;
25. Vejamos, pois;
26. A utilização da faculdade do art. 423/3 do CPC pressupõe que a parte, que apresenta os documentos, alegue e arrole prova, no próprio requerimento (art. 293/1 do CPC) de que não o pôde fazer antes ou que a apresentação só se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior, deveria provar um dos pressupostos alternativos para o efeito;
27. Isto é, só podem ser admitidos os documentos relativamente aos quais o R. Condomínio que os apresente e alegue, e prove se necessário, que não os pôde apresentar antes ou que a sua apresentação só se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior. (art. 342/1 do CC e acs. Do TRL de 22/10/2014, 681/13.5TTLSB.L1-4; do TRC de 24/03/2015, 4398/11.7T2OVR-A.P1.C1; do TRC de 16/12/2015,1395/08.3TBLRA-B.C1; e do TRL de 11/01/2018, proc. 15688/15.0T8LSB-A;
28. O art.º 423º, nº1, do C.P.C., consagra o princípio geral de proposição dos meios de prova, constituendos e préconstituídos, com os articulados, ao dispor que os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes;
29. Na indagação da impossibilidade da prévia apresentação, a terminologia usada nos art.º 423º, n.º 3 e art.º 425º é “não ter sido possível”, implicando que o fundamento haja de ser apreciado segundo critérios objetivos e de acordo com padrões de normal diligência, isto é, a diligência de um bom de família em face das circunstâncias do caso (art.º 487, nº2, do CC):
30. Ora, se à autora lhe foi vedada a informação e a documentação pela administração, óbvio, que a mesma não poderia juntar com os articulados e, requereu a supra pretensão na sua PI, documentação essa em parte que respeita o relatório de contas de 2022, nomeadamente, despesas 6.606,51, dívidas por receber 12.141,60, saldo inicial 1.786,41, saldo do exercício 2.176,18 euros. Foi indeferido sem qualquer fundamentação;
31. Posteriormente, a autora com os temas da prova, requereu ao Tribunal a quo, a junção aos autos de dez documentos, correspondentes, ao saldo bancário e à conta corrente da autora, com o objetivo de se apurar como é credora e não devedora, e se a acta n.º 37 era fiel;
32. Ora, é inconcebível salvo melhor opinião a Meritíssima Juíza ter rejeitado liminar os documentos, nos termos do art.º 443 n.º 1 CPC, cita a Jurisprudência de Coimbra, quando a parte não apresenta o documento com o respectivo articulado, se a apresentação for feita dentro do limite temporal traçado no artigo 423.º, n.º 2, primeira parte do Código de Processo Civil e a parte nada disser quanto à razão por que não juntou os documentos com o articulado em que alegou os factos respectivos, nem provar que não os pôde oferecer com tal articulado, sujeita-se ao pagamento da multa ali prevista, mas os documentos são admitidos.
33. A recorrente, nada alegou quanto aos documentos juntos posteriormente, porque, muitos foram requeridos na PI, sendo rejeitada a sua pretensão pela M. Juiz e, existindo ligação com os apresentados, motivo pela qual os documentos em crise devem ser admitidos nos autos e não ser condenada a recorrente à multa processual que foi fixada em 2UC (cf. artigo 443.º n.º 1 do CPC e artigo 27.º n.º 1 RCP;
34. Em face do alegado existe uma violação ao princípio do dispositivo e do princípio inquisitório, sendo que a inobservância do inquisitório gera nulidade processual, nos termos gerais do n.º 1, do art.º 195.º do CPC, a qual se argui, porque, consiste na omissão de um acto que a lei prescreve e a irregularidade cometida pode influir na decisão da causa;
35. Ainda, quanto ao abrigo do art.º 423 n.º 2 CPC, salvo melhor opinião, os documentos em crise correspondentes aos três segmentos não necessitam de alegações ou justificações devido à sua natureza;
36. É oportuno referir que a autora apresentou a documentação a 15.9.2024, sendo o prazo de 20 dias previsto no n.º 2 do art. 423.º do CPC, é um «prazo regressivo» ou «com contagem regressiva», ou seja, um prazo que se conta para trás com referência a certa data (16.10.24) ou que tem como termo ad quem uma data futura, é inconcebível a rejeição nos termos 443 n.º1 CPC e sua condenação em multa, que se argui;
37. Quanto aos documentos rejeitados diz o no nº 3 deste preceito, estes documentos só são admitidos alegadas e demonstradas as circunstâncias excepcionais aí referidas;
38. Assim sendo, a junção de documentos após a fase prevista no nº1 e 2 do C.P.C., é admissível apenas quando a sua apresentação não tenha sido possível nos dois momentos anteriores, ou se tornem necessários apenas por virtude de ocorrência posterior, relembro que a ocorrência posterior, dá-se com a junção das três declarações e o seu conteúdo estrondoso que se remete para o segmento 10892824, e ainda indeferida a junção de documentos segmento 2. (Documentos junto pela A.), logo, salvo melhor opinião não há lugar a condenação em custas e os documentos devem ser admitidos; cfr Ac. Trib. Relação Coimbra processo n.º 3933/19.7T8LRAB.CL;
39. Ademais, com o documentos requeridos aferia-se que o R. condomínio nunca apresentou as procurações de condóminos ausentes e de terceiros, sendo imperioso conhecer se o R. condomínio violou o disposto no art.º 1432 n.º6 cc e se se verificou o quórum, questões, identificadas do objecto do litigio pelo Douto Tribunal a quo, e requeridas pela ora Autora/recorrente como as certidões de teor com as inscrições em vigor e os comprovativos das convocatórias e das deliberações, indispensáveis, para se aferir a legitimidade dos condóminos, sendo, indeferido;
40. Não há palavras para adjectivar, quando o requerido pela Autora corresponde ao objecto do litígio e temas da prova, sendo o mesmo indeferido, porque, assiste às partes alterarem os seus requerimentos probatórios requerendo a audiência prévia, mas não abrange a prova documental, recusando a Meritíssima Juíza no exercício das suas funções judiciais o princípio inquisitório nos termos do art.º 411CPC;
41. O art. 411 do CPC não pode nem deve servir para afastar as regras processuais que disciplinam a produção de prova, impondo prazos, ónus e preclusões à actividade das partes para se vir a obter um resultado probatório formalmente válido da verdade das alegações de facto que as partes fizeram, a responsabilidade probatória do juiz” tem “uma natureza meramente complementar ou acessória” e a respectiva “actividade” não pode ter lugar com prejuízo para o sistema de ónus e preclusões previstos no código;
42. Quanto ao segmento refª. 10892824, tratando – se de documentos indevidamente recebidos ou tardiamente apresentado pelo R. Condomínio, por parte da Meritíssima Juíza não houve rejeição liminar dos documentos, nos termos do art.º 443.º, n.º 1 CPC, nem condenou o R. condomínio ao pagamento de multa, art.º 27.º n.º1 do RCP, violando, o Tribunal a quo o princípio de igualdade das partes;
43. Porém, pelo Tribunal a quo, nem foi atestado a violação ao dever de BOA – FÉ PROCESSUAL, (cf disposto no artigo n.º 8 CPC), visto que, a notificação ao R. Condomínio é cristalina, cito:” juntar cópia da acta 37 da Assembleia de Condóminos que conste do respectivo livro de actas, devidamente assinada pelos condóminos;
44. Tais documentos indeferidos, pela Meritíssima Juíza, são essenciais e imprescindíveis para demonstrar que a autora é credora do condomínio, que os saldos das contas são falsos, que as deliberações e convocatórias violam o art.º 1432 cc, que as certidões exigidas demonstram existir condóminos sem legitimidade e que a acta n.º 37 não foi discutida nem votada;
45. O princípio do inquisitório, a operar no domínio da instrução do processo, consagrado no art. 411º, do CPC, é um poder vinculado que impõe ao juiz, o dever jurídico de determinar, oficiosamente, as diligências probatórias complementares necessárias à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, independentemente, pois, de solicitação das partes;
46. Tal imposição é independente e autónoma da posição que as partes tenham tomado quanto à seleção de meios de prova e da possibilidade, que tenha havido, de indicação do concreto meio em causa, bastando que objetivamente se revele necessário à realização dos referidos fins, óbvio, com a devida vénia a Meritíssima juíza não invocou expressamente este princípio do inquisitório denegando a justiça;
47. Salvo o devido respeito, consideram-se violados os preceitos legais sucessivamente invocados.
Nestes temos e nos demais de direito doutamente supríveis por Vs. Exas, devem:
a) Ser revogado o Douto Despacho recorrido, e substituído por um outro que julgue o despacho inteiramente procedente, admitindo todos os documentos e pretensões respeitante aos segmentos ou despacho em crise, requeridos pela autora;
b) Não ser a autora condenada em multa processual, fixada em 2 UC, cf. artigo 443.º n.º 1, do CPC e art. 27.º 1 RCP;
c) Que seja aferida a violação ao princípio de igualdades das partes, quando não rejeitou os documentos ao R. Condomínio, nos termos do art.º 443 n.º 1 CPC nem condenando em multa processual nos termos do art.º 27 n.º 1 RCP.
II- FUNDAMENTAÇÃO
A. Objeto do Recurso
Considerando as conclusões das alegações, as quais delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC), não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do CPC), no caso, impõe-se apreciar se os segmentos do despacho impugnado devem ser revogados nos termos propugnados pela Apelante.
B- De Facto
Os factos e ocorrências processuais relevantes para apreciação do recurso constam do antecedente Relatório, sem prejuízo do que demais se acrescentará infra em relação ao teor dos segmentos da decisão impugnada.
Por ser relevante para a apreciação do recurso, passa-se a reproduzir o que consta do despacho saneador quanto à identificação do objeto do litígio e aos temas da prova:
«1. IDENTIFICAÇÃO DO OBJETO DO LITÍGIO
Na presente ação é objeto do litígio:
a) saber se a convocatória para a assembleia de condóminos do R. de dia 23-04-2023 violou o disposto no artigo 1432.º, n.º 6, do Código de Processo Civil;
b) saber se a discussão e votação dos quatro pontos da ordem de trabalhos da assembleia de condóminos do R. de dia 23-04-2023 que constam da respetiva ata efetivamente ocorreram, ou se, pelo contrário, não houve qualquer votação, sendo as deliberações aí plasmadas juridicamente inexistentes;
c) saber se, quanto aos pontos efetivamente votados, se verificou o quórum legalmente exigido para a tomada da respetiva deliberação.
2. ENUNCIAÇÃO DOS TEMAS DA PROVA
Depois de compulsada a factualidade invocada pelas partes e a posição assumida sobre a mesma nos respetivos articulados, e considerando que o único pedido a apreciar nesta ação é a peticionada anulação das deliberações da assembleia de condóminos do R. de dia 23-04-2023, enunciam-se os seguintes temas de prova:
1. Da procuração apresentada pela A. na assembleia de condóminos do R. de dia 23-04-2023 para representar DD
(cf. artigos 18.º e 34.º da petição inicial e 13.º da contestação)
2. Da efetiva apresentação do relatório de contas da administração do R. Condomínio relativo ao ano de 2022, na assembleia de 23-04-2022, dos termos em que decorreu a discussão desta matéria; condóminos que votaram o mesmo, sentido dos votos emitidos e sua conformidade com o que consta da respetiva ata;
(cf. artigos 42.º a 47.º e 67.º da petição inicial e 20.º e 21.º da contestação)
3. Da efetiva discussão e votação, na assembleia de condóminos de 23-04-2022, da eleição da administração do R. Condomínio para o exercício de 2023 e dos honorários a pagar à sociedade administradora; dos termos em que decorreu a discussão desta matéria; condóminos que votaram a mesma, sentido dos votos emitidos e sua conformidade com o que consta da respetiva ata;
(cf. artigos 53.º da petição inicial e 28.º a 33.º da contestação)
4. Da efetiva discussão e votação, na assembleia de condóminos de 23-04-2022, do orçamento do R. Condomínio para o exercício de 2023; dos termos em que decorreu a discussão desta matéria; condóminos que votaram a mesma, sentido dos votos emitidos e sua conformidade com o que consta da respetiva ata;
(cf. artigo 54.º da petição inicial)
5. Da efetiva discussão e votação, na assembleia de condóminos de 23-04-2022, dos temas incluídos no ponto 4 da respetiva ata; dos termos em que decorreu a discussão destas matérias; condóminos que votaram as mesmas, sentido dos votos emitidos e sua conformidade com o que consta da respetiva ata.
(cf. artigo 55.º da petição inicial)»
C. Do Conhecimento das questões suscitadas no recurso
1. Questões prévias
1. Apesar da Apelante ter sido convidada a aperfeiçoar as Conclusões, verifica-se que o aperfeiçoamento ficou muito aquém do que é exigível em face do disposto no artigo 639.º do CPC, porquanto as mesmas correspondem a partir do n.º 7 e seguintes a uma amálgama de argumentos indiferenciada em relação aos segmentos dos despachos impugnados (não tendo sido seguida a sugestão de apresentação de Conclusões em relação a cada segmento impugnado – cfr. ponto 13 do despacho da Relatora de 25-03-2025).
Ainda assim, verifica-se que na Conclusão 6, a Apelante concretizou os segmentos do despacho que impugna, pelo que se entende que não existe fundamento legal para rejeitar as Conclusões aperfeiçoadas (cfr. n.º 3 do artigo 639.º do CPC).
Nessa senda, apreciar-se-ão os argumentos aduzidos na medida do que for compreensível, adequado e lógico em relação a cada um deles ou o que fizer sentido aplicar-se a todos nos seu conjunto.
1.2. Uma menção para deixar sublinhado que o objeto do recurso é apenas e tão só a reapreciação da decisão que não admitiu a junção aos autos dos documentos que a ora Apelante pretendeu juntar, bem como a não admissão de determinados requerimentos apresentados pela Autora ou a irrelevância de outro para a tramitação da causa, não incidindo o objeto do recurso sobre o conhecimento da pretensão da Autora de anulação das deliberações da assembleia de condóminos realizada em 23-0-4-2025, decisão que cabe ao tribunal a quo.
Verificando-se, contudo, que a Apelante centra a sua crítica à decisão recorrida nesta última perspetiva, a qual não poderá ser apreciada.
O que está em causa, repete-se, é tão só e apenas a admissibilidade dos documentos que a Autora pretendeu juntar (ref.ªs Referências 10963041, 10963042 e 10963043, de 15-09-2024), a admissibilidade dos requerimentos apresentados em 23-09-2023 (ref.ªs 10983662 e 10983865, de 23-09-2024) e se o requerimento apresentado também nesse dia 23-04-2023 (ref.ª 10983864) tinha alguma razão de ser em face da junção pelo Réu, em momento anterior, da ata n.º 37 e anexos.
3. Finalmente, mais uma nota para referir que a análise da necessidade e pertinência da requerida junção de prova documental tem de ser ponderada, por um lado, em face do momento temporal em que é apresentada e, por outro lado, em face do que se visa provar com a junção, o que nos remete, necessariamente, para os temas da prova (cfr. artigos 423.º, 443.º e 410.º do CPC).
Sendo que, em face do princípio da aquisição processual (artigo 413.º do CPC), todos os documentos juntos aos autos, independentemente de quem os junta, são meios de prova a levar em conta pelo tribunal, sendo um ato inútil a repetição da junção (cfr. artigo 130.º do CPC).
1. Do objeto do Recurso
1. Sem prejuízo do que infra melhor se apreciará, neste momento e feita uma leitura perfunctória das Conclusões de recurso, analisando o teor dos segmentos do despacho que se encontram impugnados, percebe-se que a Recorrente reage contra a decisão do tribunal a quo que não admitiu a junção de documentos aos autos por não serem pertinentes e necessários em face dos temas da prova (artigo 410.º do CPC), que lhe aplicou uma multa processual ao abrigo do 433.º, n.º 1, do CPC e 27.º, n.º 1, do RCP, tendo também rejeitado dois requerimentos por não serem legalmente admissíveis (artigos 3.º, n.º 3, e 415.º, n.º 1 e 2, a contrario, do CPC) e decidido que nada mais havia a decidir em relação à junção da ata n.º 36 e anexos.
Defendendo a Recorrente, em suma, que os documentos são essenciais à decisão a tomar por estarem todos relacionados com os temas da prova, que foram inicialmente requeridos ou tornaram-se posteriormente necessários, e que o decidido viola vários princípios e regras processuais civis, incluindo as relacionadas com a aquisição probatória e sua valoração.
2. Importa, agora, de forma pormenorizada analisar os segmentos do despacho proferido em 23-09-2024 que se encontram impugnados.
De acordo com a Conclusão 6 (após aperfeiçoamento), a Apelante veio identificar os concretos segmentos dos despachos que impugna e que se encontram inseridos no despacho proferido em 23-09-2024.
Que passamos a apreciar pela ordem da sua prolação e inserção no referido despacho de 23-09-2024, transcrevendo os três segmentos decisórios impugnados e o correspondente teor da Conclusão 6.
2.3. Decidiu o tribunal a quo do seguinte modo:
«Referências 10963041, 10963042 e 10963043, de 15-09-2024:
(…)
2. Documentos juntos pela A.:
Nos termos do disposto no artigo 410.º do Código de Processo Civil, a instrução tem por objeto os temas da prova enunciados ou, quando não tenha de haver lugar a esta enunciação, os factos necessitados de prova.
Visando os documentos (apenas agora) juntos pela A. provar factos que não revelam qualquer conexão com os temas de prova fixados no despacho saneador, e não se alcançando (nem sendo justificado) minimamente o interesse dos mesmos para provar matéria de facto que consubstancie causa de pedir do único pedido que, após o saneamento dos autos, constitui o objeto da lide (o de anulação das deliberações da assembleia de Condomínio do Edifício... e 23-04-2023) determina-se o seu desentranhamento por impertinência e desnecessidade, condenando-se a apresentante em multa processual, que se fixa em 2 UC (cf. artigo 443.º, n.º 1, do Código de Processo Civil e 27.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais).»
Refere a Apelante quanto a esta questão na Conclusão 6, alínea b):
«b) Quis o Tribunal a quo, sobre a refª 10963041 de 15-09-2024, dividir o supra requerimento em três partes, sendo SÓ a 2ª parte designada (2. Documentos juntos pela A.:) a, ser apreciado pelo Tribunal Superior, documentos estes que foram juntos pela autora e que têm uma conexão com os temas de prova, que constitui o objecto da lide, nomeadamente, a anulação das deliberações da assembleia de Condomínio do Edifício..., em 23.4.2023, respeitante acta 37;».
Visualizados os referidos documentos no Citius, verifica-se que no requerimento da Autora apresentado em 15-09-2024, sob a ref-ª 10963041, a mesma alegou:
«Mais se requer
A junção aos autos pelas razões já adiantadas ao longo deste processo, tais documentos, como:
I. Avisos de débito da Autora (Elaborada pela Gescofati);
II. Recibos e os comprovativos das transferências efectuadas pela autora:
III. Recibo Eletrónico, transferência efectuada pela autora no valor de €816,00, (oitocentos e dezasseis euros) NUNCA, devolvido nem recibo eletrónico passado; Isenta do pagamento;
IV. Documento remetido à Gescofati - Lda, justificando ser a nova proprietária (07.03.2006);
V. Resumo histórico de todos os pagamentos efectuados pela autora desde da aquisição da fração, recibos por corrigir e com saldo positivo;
VI. Extratos bancários da CGD-Fátima do condomínio, com valores entregues pela autora e sem recibo.
VII. Seguro;
VIII. Acta 31 de 2017 convocatória:
IX. Acta 30 de 2016:
X. Título executivo.»
Os requerimentos sob as ref.ªs 10963042 e 10963043 correspondem a aditamentos ao requerimento referido em 1.º lugar, apresentados por os documentos excederem a capacidade do Citius para cada formulário.
Como decorre do teor do despacho em causa, a não admissão dos documentos baseou-se, em suma, no seguinte: (i) não revelam conexão com os temas da prova fixados no despacho saneador e, consequentemente, apresentam-se como impertinentes e desnecessários para aferir do objeto da lide – anulação das deliberações da assembleia de condóminos de 23-04-2023; (ii) consequente condenação em multa (2 ucs) ao abrigo do artigo 443.º, n.º 1, do CPC e artigo 27.º, n.º 1, do RCP.
A Apelante defende, em suma, e mormente nas Conclusões 7, 9, 10, 13, 14, 16, 20, 30, 31, 32, 33, 35 a 46, que os documentos foram indevidamente recusados por estarem conexionados com os temas da prova (que não identifica em concreto) e com os saldos da ata n.º 37 (leia-se relatório de contas de 2022), defendendo que a informação ali constante não corresponde à realidade porque não é devedora, mas credora do condomínio, alegando, ademais, vícios formais no quórum por falsificação ou ausência de procurações e representação dos condóminos, contesta a validade do relatório de contas de 2022 dizendo que os saldos são falsos e que os documentos relevantes foram indevidamente recusados; contesta a legitimidade de quem presidiu à assembleia de condóminos, defende que a eleição da administração é nula; que a aprovação dos pontos da ordem do dia não foi precedida de debate, não sendo válidas as votações, que o ponto 4 da ordem do dia é vago («saco sem fundo») ferindo o disposto no artigo 1432.º do CC; invocando, ainda, má prática por parte da administração do condomínio, seja na convocação e realização da assembleia, seja quanto ao teor do relatório de contas e elaboração e teor da ata n.º 37.
Vejamos, então, se lhe assiste razão.
Os documentos em causa foram apresentados em 15-09-2024, após a prolação do despacho saneador que tem data de 02-08-2024. Nesse despacho foi designado o dia 16-10-2024 para realização da audiência de discussão e julgamento.
Os documentos são meios de prova, a par de outros previsto no CPC – cfr. artigos 423.º e ss e visam fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa.
Do teor do artigo 423.º do CPC decorre que a lei, em regra, admite três momentos para a apresentação deste meio de prova: com o articulado onde se aleguem os factos correspondentes (n.º 1); até 20 dias antes da data da realização da audiência de discussão e julgamento, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pode oferecer com o articulado (n.º 2); após o limite temporal previsto no n.º 2, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento, bem com o aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior (n.º 3).
Por sua vez, por via do artigo 443.º do CPC, após a junção de documentos e cumprido que esteja o princípio do contraditório, se os documentos juntos não tiverem provindo de ordem do juiz, este verifica se «os documentos são impertinentes ou desnecessários», e se tal suceder, ainda que se enquadrem no momento temporal previsto no n.º 2 do artigo 423.º, do CPC, manda retirá-los do processo e restitui-los ao apresentante, condenando-o no pagamento de multa nos termos do Regulamento das Custas Processuais (n.º 1). Caso se verifique a situação do n.º 2 do artigo 423.º do CPC, a parte é condenada no pagamento de uma única multa (n.º 3).
No caso, os documentos juntos com os requerimento supra identificados nos segmento do despacho recorrido em análise, não foram juntos com a p.i. como deviam em face do n.º 1 do artigo 423.º do CPC, mas foram juntos nos 20 dias antes da data designada para a audiência de julgamento (primeira data, aquela que deve ser atendida para o efeito), ou seja, nos termos previstos no artigo 423.º, n.º 2, do CPC. A sua junção, em termos de tempestividade, sempre estaria sujeita à multa prevista neste preceito legal, uma vez que a Autora nada alegou no sentido de justificar a exceção prevista na parte final do preceito que a isentaria, se fosse atendida, do pagamento da multa ali prevista.
Mas, para além das regras supra referidas, a admissão de documentos juntos tardiamente como refere a lei, está sujeita ao escrutínio judicial enunciado no artigo 443.º, n.º 1, do CPC. Dito de outro modo, só são admitidos os documentos que não sejam impertinentes ou desnecessários para a decisão a proferir considerando os termos do litígio já antes enunciado e temas da prova submetidos à produção de prova, uma vez que os documentos enquanto meios de prova destinam-se à instrução da causa.
A razão de ser dos artigos 423.º, n.ºs 2 e 3, e 433.º, n.º 1, do CPC, é simples e decorre da necessidade de restringir perturbações resultantes da apresentação extemporânea de documentos, correspondendo, aliás, a uma manifestação do princípio da autorresponsabilização das partes.
A impertinência da junção afere-se em função da sua relevância para o apuramento dos factos em discussão enunciados nos temas da prova; a desnecessidade reporta-se à circunstância de, em face do estado da causa, nada acrescentar em termos probatórios aos elementos já existentes e que se repercuta no desfecho da lide.1
Por outras palavra e como se refere no sumário do Acórdão da Relação de Coimbra de 27-04-20212:
«II- Os documentos serão impertinentes quando se destinarem a provar factos estranhos/alheios à matéria da causa.
III- Os documentos são desnecessários quando se destinarem a provar factos sem qualquer interesse ou relevância para a decisão da causa.»
Ora, no caso em apreço, ainda que os documentos em causa tenham sido juntos dentro do período temporal previsto no n.º 2, 2.ª parte, do artigo 423.º do CPC, a sua admissão, mesmo com pagamento de multa, dependia do juízo que o tribunal a quo fizesse sobre a pertinência e necessidade da junção.
Nessa aferição, era absolutamente relevante que a parte mencionasse o tema ou temas da prova que pretendia provar com tais documentos e que o tribunal, em face do estado dos autos e da justificação apresentada, assentisse na pertinência ou necessidade da junção.
Nada tendo a ora Apelante alegado aquando do pedido de junção destes documentos qual ou quais os temas da prova que visava provar com a sua junção, e analisado o teor dos documentos, bem como a identificação do objeto do litígio e dos temas de prova, e verificando-se que os documentos não relevam para a prova dos factos controvertidos enunciados nos temas da prova, visando, antes, demonstrar que a Autora não é devedora do condomínio em relação ao exercício de 2022, e não sendo esse o objeto destes autos, pois, como já supra referido, o que está em causa é a anulação das deliberações tomadas pelo condomínio pela razões aduzidas para fundamentar o respetivo pedido, não se justifica a sua admissão.
Efetivamente, o que está em apreciação na lide, e como decorre dos temas da prova, reporta-se ao seguinte: (i) a Autora estava munida de procuração para representar a condómina DD?; (ii) apresentação e votação do relatório de contas do ano de 2022, e termos em que decorreu a discussão, a votação e sentido de voto em conformidade com o que consta da respetiva ata n.º 37; (iii) eleição da administração para 2023 e aprovação de honorários, e termos em que decorreu a discussão, a votação e sentido de voto em conformidade com o que consta da respetiva ata n.º 37; (iv) discussão e votação do orçamento para 2023, e termos em que decorreu a discussão, a votação e sentido de voto em conformidade com o que consta da respetiva ata n.º 37; (v) discussão e votação do ponto 4 da ata n.º 37 (estando o ponto 4 submetido à rúbrica «outros assuntos de interesse geral»).
Neste ponto 4, e como consta da ata n.º 37, foi aprovada por maioria simples deliberações sobre assuntos relacionados com o valor da rubrica «extintores», necessidade de obtenção de outros orçamentos, forma de pagamento com o excedente da conta corrente e não por via de uma quota extra; orçamento para reparação do sistema de intercomunicações e necessidade de obtenção de outros orçamentos depois do administrador solicitar outros orçamentos.
Não descortinamos nos documentos apresentados (cfr. o acima referido quanto à identificação do teor dos mesmos pela Autora aquando da apresentação dos requerimentos em que os juntou) que visem provar qualquer dos factos controvertidos enunciados nos temas da prova, tal como eles se apresentam e que decorrem do modo como foi apresentada a causa de pedir e pedidos formulados na ação (considerando a tramitação processual que consta do processo- cfr. despacho saneador).
A invocação genérica quanto à existência de uma conexão dos documentos com os temas da prova, não é de todo suficiente para daí se extrair a pertinência e a necessidade da junção destes documentos aos autos na fase em que o forem, sendo, aliás, préexistentes à data da p.i. por via da qual a Autora questionou as deliberações tomadas na referida assembleia de condóminos, não se descortinando sequer de que modo podem ser tidos como demonstrativos de ocorrências posteriores à alegação inicial.
Deste modo, o juízo judicativo do tribunal a quo ao não admitir a junção dos documentos em causa e em condenar a Autora na multa prevista no artigo 443.º, n.º 2, do CPC, nenhuma censura nos merece.
Acrescentando-se que todo o argumentário da Apelante no que concerne à invocação de vícios relacionados com a violação do direito à prova (artigo 20.º da CRP), violação de princípios processuais (dispositivo, inquisitório, cooperação, igualdade das partes, boa fé-processual, omissão de pronúncia, nulidades processuais, etc.) e não atendibilidade do que foi invocado quanto a anteriores comportamentos da Ré (v.g., processo cautelar de 2013 intentado pela mesma por o condomínio não lhe ter apresentado documentação), abuso de direito por parte da administração do condomínio, falsidade da ata, do relatório de contas, movimentações financeiras irregulares, incumprimento das obrigações do condomínio, etc., corresponde a um argumentário genérico e desconexionado do que efetivamente está em apreciação nesta sede, que, como inicialmente se mencionou e se reitera, é apenas a questão da (in)admissibilidade de determinados documentos com base nos pressupostos legais previstos na lei para a sua junção.
Tendo o tribunal cumprido o princípio do contraditório (artigo 3.º, n.º 3, do CPC) e decidido de forma fundamentada a decisão que tomou, considerando que, nesse momento, apenas estava em causa a manutenção ou não no processo dos documentos pretendidos juntar (artigo 152.º, n.º 1, 154.º, n.º 1, do CPC e artigos 20.º e 205.º, n.º 1, da CRP), não se verificou qualquer nulidade processual ou outra, ou violação de qualquer regra ou princípio processual civil ou constitucional mencionado pela Apelante, ou qualquer outro, que justifique a revogação pretendida pela Apelante.
Improcede, assim, este segmento da apelação.
Passemos, agora à análise, do segundo segmento do despacho recorrido:
«Requerimentos juntos sob as referências 10983862 e 10983865, de 23-09-2024 (após abertura de conclusão):
Visando os requerimento em epígrafe responder a requerimentos do R. onde se limitou a exercer o contraditório acerca dos anteriores requerimentos da A. de 11-09-2024 e de 15-09-2024, são os mesmos legalmente inadmissíveis (cf. artigos 3.º, n.º 3 e 415.º, n.ºs 1 e 2, a contraio, do Código de Processo Civil), pelo que se determina o desentranhamento dos requerimentos da A. referidos em epígrafe.»
Em relação a este segmento do despacho recorrido, reporta-se a Apelante na Conclusão 6, alínea c), escrevendo:
«c) Um outro segmento em crise reportam-se aos requerimentos com as refª 10983862 e 10983865 de 23.9».
Não se descortina ao longo das Conclusões uma menção específica e autónoma em relação a este segmento do despacho recorrido. A Recorrente refere, aliás, nas alíneas d) e e) da Conclusão 6:
«d) Os três segmentos em crise estão todos interligados e, todos os documentos foram rejeitados, que no fundo é tudo aquilo que a autora referiu nos articulados e requereu na PI;
e) Logo, as questões a decidir pelo Tribunal Superior, são: os documentos os rejeitados, a multa processual e a violação ao P. da Igualdade das Partes.»
Deste modo, a Recorrente interliga a impugnação em relação a este segmento do despacho recorrido com a não admissão dos documentos referidos no segmento do despacho anteriormente analisado, sustentando, no fundo, a falta de fundamento da decisão recorrida, a par da violação do princípio da igualdade.
Como decorre da consulta do Citius, o Réu pronunciou-se, ao abrigo do princípio contraditório (artigo 3.º, n.º 3, do CPC), sobre os requerimentos da Autora datados de 11-09-2024 (ref.ª 10954843 e 10954843 relacionados com a junção da procuração de DD) e de 15-09-2024 (ref.ªs 10963041, 10963042 e 10963043, já acima referidos).
A Autora, por sua vez, nos requerimentos com as ref.ªs 10983862 e 10983865, de 23-09-2024, veio pronunciar-se sobre a pronúncia do Réu (perdoe-se a redundância), mas fora do quadro legal do princípio do contraditório, que não pode ser visto como uma sucessão infindável de requerimentos e contra requerimentos a latere da tramitação legalmente prevista.
A essência deste princípio é a de garantir que ninguém seja prejudicado por uma decisão sem lhe ser concedido o exercício do direito de se defender e apresentar suas razões sobre as questões interlocutórias, processuais ou substantivas, de facto ou de direito, em discussão nos autos. Correspondendo, dessa feita, a um instrumento para garantir a justiça e a imparcialidade do processo.
Efetivamente, tendo a Autora já exercido o seu direito de contraditório em relação aos requerimentos apresentados pelo Réu, nos termos que bem entendeu, esgotou o seu direito de pronúncia. Não sendo os requerimentos ordenados desentranhar suportados por preceito legal que permita a sua admissão, não merece qualquer censura o decidido pelo tribunal a quo.
Improcede também este segmento do recurso.
Finalmente, quanto ao terceiro e último segmento do despacho recorrido:
«Referência 10983864, de 23-09-2024 (após abertura de conclusão).:
Uma vez que a ata n.º 37 e anexos foi já junta pelo R. em 12-08-2024 (referência 10892824), nada mais há a determinar.»
Refere a Apelante quanto a esta questão na Conclusão 6, alínea a):
«a) Refª 10983864 de 23.9.2024, com remissão para a refª 10892824, que consiste na acta n.º 37 e os seus anexos, anexos que são componentes da acta e não anexos propriamente dito, lista de presenças, mais três declarações, datadas de 9 e 11.5.2023, documentos que divergem do solicitado requerida pela recorrente na PI articulado 75».
Nas Conclusões 5, 6, alínea a), 12 e 16, a Apelante refere-se a este segmento do despacho, alegando, em suma, que o tribunal a quo não quis aferir da legitimidade de quem presidiu à assembleia de condóminos de 23-04-2023 e recusou de forma injustificada a prova documental essencial à anulação das deliberações sociais, reiterando a ligação desta questão com a apresentação dos documentos juntos e mencionados aquando da apreciação do primeiro segmento do despacho impugnado.
Vejamos.
No despacho saneador foi proferido o seguinte despacho:
«Uma vez que tal documento se revela essencial para a boa decisão da causa, notifique o R. Condomínio para, em 10 dias, juntar cópia da ata n.º 37 da Assembleia de Condóminos que conste do respetivo livro de atas, devidamente assinada pelos condóminos, e todos os documentos anexos à mesma.»
A Réu em 12-08-2024 (ref.ª 10892824) apresentou um requerimento onde consta o seguinte:
«(…) Condomínio do Edifício..., réu nos autos à margem melhor id., vem na sequência do despacho Saneador com a ref.ª 97253044 de 06/08/2024 juntar aos autos, conforme solicitado, a ata número 37 e os documentos anexos à mesma.
De referir que:
1. segundo a lista de presenças da referida ata contem 84,35 presentes do valor total do prédio.
2. A proprietária das frações AI – Garagem 14 e L – 3º Esq não esteve presente na assembleia. A Autora dos presentes autos disse que tinha a procuração da dita
proprietária no telemóvel, mas que não conseguia enviar para o email da administração. O presidente da mesa, com a ratificação dos presentes, autorizou que a aqui autora assinasse a lista de presenças no nome daquela proprietária (DD) uma vez que prometeu entregar posteriormente a dita procuração à administração. Até à data nunca o fez.
3. Junto à ata constam as subscrições da Ata no total de 29,21% dos presentes, de
acordo com o n.º 7 artigo º do Dec-Lei n.º 268/94, de 25 de outubro, sendo que se presume como aceitação o silêncio dos restantes condóminos, incluída a aqui Autora.»
Com este requerimento juntou os seguintes documentos: (i) Ata n.º 37; (ii) Anexo 1 – Registo de presenças da assembleia de 23-04-2023; (iii) Anexo 2 - Relatório de Contas; (iv) Anexo 3 – Valores por liquidar por entidade; (v) Anexo 4 – Orçamento 2023; (vi) Anexo 5 – Encargos do orçamento de 2023; (vii) Registo de presenças; (viii) Declarações de 3 condóminos a concordarem com o teor da ata referente à assembleia de 23-04-2023, duas com data de 09-05-2023 e outra com data de 11-05-2023.
A Autora no requerimento de 23-09-2024 (ref.ª 10983864) veio dizer, para além do mais, que o Réu não apresentou os documentos solicitados. Concluindo que, por culpa do Réu, não estavam reunidos os requisitos para a realização da audiência de julgamento.
Quanto à falta de junção dos documentos, o alegado pela Autora nesse requerimento não encontra respaldo no processado supra referido.
No recurso vem dizer que os anexos são «componentes da ata» e «não anexos propriamente ditos» e que divergem do solicitado na p.i no artigo 75.º.
Para além de ser impercetível a distinção que aparenta fazer entre o que sejam «anexos componentes da ata» e «anexos propriamente ditos», também no artigo 75.º da p.i. não existe qualquer menção à necessidade de junção aos autos da ata e seus anexos. Nesse artigo da p.i., a Autora manifesta-se contra a inércia dos outros condóminos em aceitarem as contas do relatório de 2022, discriminando várias verbas, insurgindo-se também contra a falta de informação por parte da administração do condomínio. Nada refere quanto à necessidade de junção da ata n.º 37 e anexos.
Por conseguinte, bem se compreende que no segmento do despacho recorrido em apreciação, conste que o Réu já tinha junto aos autos a ata e anexos em conformidade com o que lhe foi ordenado no despacho saneador.
Tendo o Réu cumprido o ordenado, os documentos foram, naturalmente, incorporados nos autos, sem sancionamento da parte que acatou o que lhe foi ordenado, não existindo qualquer violação do princípio da igualdade aludido na Conclusão 42 por as situações serem totalmente diversas, pois o tribunal não ordenou a junção dos documentos que a Autora motu proprio quis juntar, nos tempo e nos moldes em que o fez.
Aliás, a alegação da violação do princípio da igualdade previsto no artigo 4.º do CPC, como emanação da sua consagração constitucional do artigo 13.º da CRP, não pode ser feita de forma genérica e descontextualizada em relação a atos processuais que as partes vão praticando nos autos em conformidade (ou não) com a tramitação processual para a respetiva espécie processual.
O princípio da igualdade, como refere o artigo 4.º do CPC, impõe ao tribunal que assegure que as partes, ao longo de todo o processo, tenham um estatuto de «igualdade substancial», designadamente no «exercício de faculdades, uso de meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais».
A paridade das partes subjacente a este princípio implica que às mesmas sejam dadas idênticas oportunidades e meios de defesa para exporem as suas razões e convencerem o tribunal a proferir uma decisão que lhes seja favorável, ficando sujeitas a ónus e cominações idênticos.
Sem prejuízo das particularidades das respetivas espécies processuais e da posição das partes nas mesmas, o termo «igualdade substancial» o que visa é sublinhar que a igualdade formal, absoluta, é inatingível, procurando-se, outrossim, que a igualdade seja «garantida no plano do equilíbrio global do processo», ou seja, que ambas litigiem com «igualdade de armas».3
Na situação dos autos, e tendo em conta a impugnação apresentada, a sua fundamentação e a que consta dos segmentos dos despachos recorridos, bem como o escorreito acatamento do princípio do contraditório ao longo da tramitação processual (artigo 3.º, n.º 3, do CPC), não descortinamos que o tribunal a quo ao regular a tramitação processual como é seu dever, promovendo oficiosamente a junção aos autos de determinados documentos essenciais à apreciação da lide e recusando o que se lhe afigurou impertinente (artigo 6.º do CPC) tenha atuado de forma contrária ao acima exposto.
Ou seja, não se verifica a alegada violação do princípio da igualdade.
Nestes termos, também improcede a Apelação em relação a este segmento do despacho recorrido.
Deste modo, improcede totalmente a Apelação.
2. Dado o decaimento, as custas ficam a cargo da Apelante (artigo 527.º do CPC), sendo a taxa de justiça do recurso fixada pela tabela referida no n.º 2 do artigo 6.º do RCP, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário na modalidade concedida.
III- DECISÃO
Nos termos e pelas razões expostas, acordam em julgar improcedente a Apelação, mantendo os segmentos do despacho recorrido.
Custas nos termos sobreditos.
Évora, 25-06-2025
Maria Adelaide Domingos (Relatora)
Fernando Marques da Silva (1.º Adjunto)
Francisco Xavier (2.º Adjunto)
________________________________________
1. Neste sentido, veja-se ABRANTES GERALDES et al., Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2018, p. 511-512 (2 e 3).↩︎
2. Proferido no proc. n.º 2141/18.9T8CTB-A.C1, em www.dgsi.pt↩︎
3. Neste sentido, LEBRE DE FREITAS et al., Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1.º, Coimbra Editora, 3.ª ed., pp. 11-12 (1 e 2).↩︎