Sumário:
1. Estando a parte presente na audiência em que invoca ter sido cometida a falta de redução a escrito da declaração confessória, essa nulidade apenas poderia ser arguida enquanto esse acto não terminasse.
2. Conclusões que impliquem uma tomada de posição sobre ou a partir de outros factos e respectivo enquadramento na legislação aplicável não podem ter cabimento no elenco dos factos provados.
3. Um contrato de estágio profissional promovido pelo IEFP junto de uma empresa, visando o desenvolvimento de uma experiência prática em contexto de trabalho com o objectivo de promover a inserção de jovens no mercado de trabalho ou reconversão profissional de desempregados, não pode ser qualificado como um contrato de trabalho.
4. A caducidade desse contrato de estágio é a extinção do vínculo contratual em consequência de um evento a que se atribui o efeito extintivo e não decorre de qualquer decisão do IEFP nesse sentido.
5. As normas que, na sequência da declaração do estado de emergência durante a pandemia pela doença Covid-19, decretaram o encerramento de estabelecimentos de educação pré-escolar, como o da ré e entidade promotora do estágio, prevalecem sobre os prazos de suspensão máxima do estágio por encerramento do estabelecimento previstas na regulamentação do estágio profissional.
6. Para que a relação entre entidade promotora e estagiário se passe a considerar um contrato de trabalho será necessária a prova de um acordo nesse sentido.
7. Não basta dizer-se que se presume a existência de um contrato de trabalho quando os factos relevantes para se fazer funcionar a presunção do artigo 12.º do Código do Trabalho já se verificavam, sem alteração, no decurso do estágio profissional.
(Secção Social)
Relator: Filipe Aveiro Marques
1.ª Adjunta: Emília Ramos Costa
2.ª Adjunta: Paula do Paço
***
*
I. RELATÓRIO:
I.A.
“AA, UNIPESSOAL, LDA.”, ré na acção comum que contra ela foi intentada por BB, veio interpor recurso da sentença proferida pelo Juízo do Trabalho de Setúbal – Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, que terminou com o seguinte dispositivo:
“Face ao exposto, julgando a procedência da acção:
1. declaro que entre A. e R. existiu um contrato de trabalho desde 9 de Dezembro de 2020 até 15 de março de 2021;
2. declaro a licitude da resolução do contrato de trabalho pela A. no dia 16 de março de 2021;
3. condeno a R. a pagar à A.:
a) a retribuição correspondente ao mês de Fevereiro de 2021, no montante de 570,45€;
b) a retribuição correspondente aos primeiros 15 dias do mês de março de 2021, no montante de 282,22€;
c) os proporcionais do subsídio de férias no montante de 115,65€;
d) os proporcionais do subsídio de Natal no montante de 115,65€;
e) a compensação no valor de 237,40€, pela resolução do contrato de trabalho com fundamento em justa causa;
f) os juros de mora, à taxa supletiva legal, sobre as importâncias em dívida, vencidos e vincendos, sendo os juros de mora já vencidos no montante de 40,11€.
4. não considero a A. como litigante de má fé, pelo que a não a condeno em multa e em indemnização a arbitrar em benefício da parte contrária.
*
Custas da acção a cargo da R.”.
Na sua petição inicial a autora tinha invocado ter celebrado contrato de trabalho com a ré (após ter cessado estágio profissional do IEFP) e ter resolvido o mesmo por falta de pagamento de retribuições.
Contestou a ré, muito em suma, dizendo que foi a autora, sempre e exclusivamente, que colocou à Ré a sua vontade máxima em regressar e que se deveria tentar tudo para reverter a situação da decisão do IEFP de terminar o estágio e pediu à ré para continuar o estágio até conseguir reverter a decisão daquele instituto.
Termina a sua contestação defendendo a improcedência do pedido da autora, que seja declarada inexistente qualquer relação contratual e, se assim não se entender, deve ser o IEFP condenado a liquidar à ré os valores por si adiantados até à data do abandono do estágio e pede, ainda, a condenação da autora como litigante de má fé.
Foi determinada a intervenção principal provocada do Instituto de Emprego e Formação Profissional como réu, que deduziu contestação invocando a sua ilegitimidade e defendendo a improcedência dos pedidos contra si dirigidos.
Foi saneado o processo, realizado julgamento e proferida a sentença recorrida.
I.B.
A ré/apelante apresentou alegações que terminam com as seguintes conclusões:
“1.
O presente recurso tem como objeto a reapreciação da matéria de facto provada e não provada, concretamente os factos identificados como “Factos Provados” sob os n.º 5,6, 8 a 12 e 31 a 33 e os factos considerados como “Factos Não Provados” identificados sob as alíneas A, B, C, e D.
2.
Para a correta apreciação da prova que foi produzida no âmbito dos autos, a decisão recorrida deveria ter-se atido de forma mais vincada à vontade das partes e suas acções escritas e deveria ter-se distanciado mais da credibilidade que os depoimentos das técnicas do IEFP CC e DD, mereciam, tudo pelas razões aduzidas nas presentes alegações de recurso.
3.
Na verdade, os depoimentos das citadas técnicas, bem como as informações internas administrativas, na forma como foram produzidos e porque foram expressamente infirmados por outros meios de prova, não eram aptos a sustentar, por si só como sucedeu, toda a matéria de facto em sentido desfavorável à ora recorrente.
4.
Ate porque são contraditórias dos factos e da realidade, como se verificou em sede de julgamento!
5.
As conclusões extraídas dos depoimentos testemunhais apresentados pela R. (todos idóneos) foram sempre no sentido da sua descontextualização, chegando mesmo a ser postos em causa por uma acintosa argumentação descabida e desrespeitosa, imposta pelo juiz a quo.
6.
Tendo em conta os fins visados pelo regulamento de Estágios, não nos parece que o tribunal, até no âmbito da visão do CITE, tenha valorado o processo da trabalhadora A., visada no cumprimento do seu estágio, cujo interesse privado a Lei também visou acautelar a par do interesse público.
7.
Pelos fundamentos melhor explanados nos pontos da presente motivação, a recorrente entende que os direitos tutelados pela Lei são de natureza indisponível, desde logo nos termos das disposições aludida ao Código do Trabalho.
8.
Neste sentido, aliás, têm entendido inúmeras decisões dos tribunais superiores, seguindo o perfilhado pela presente alegação de recurso, ou seja o da violação da Lei geral do CT em última instância.
9.
E tendo em conta o conteúdo confessório dos cumulativos depoimentos de parte e dos cabais documentos junto aos autos e da autoria da A., a ele devendo conformar a matéria de facto considerada provada e não provada, em atenção à total identidade da confissão com a posição assumida pelo R. no seu articulado de contestação!
10.
O Tribunal de primeira instância, em cumprimento com a sua própria determinação inicial, Ao não determinar deste modo, violou, também os normativos dos artigos 463.º, n.º 1, praticando omissão apta a influenciar a decisão da causa, constituindo, portanto uma nulidade nos mesmos termos já acima indicados e que levará à nulidade da sentença, por ser um ato subsequente afetado pela omissão (artigo 195.º, n.º 1 e 2, do CPC).
11.
E violou, ainda, o tribunal a quo, as normas contidas nos artigos 352.º, 355.º, n.º 1, 356.º, 357.º, n.º 1 e 358.º, n.º 1, todos do Código Civil e os artigos 52.º, 53.º (conforme justificado nos pontos, da presente alegação).
12.
Mas ainda que assim se não entendesse, parece-nos desajustado das regras gerais que balizam a apreciação da prova, designadamente as regras da experiência a que alude o artigo 607.º, n.º 4, in fine, do CPC, ao desvalorizar os factos admitidos por escrito pela A., quando a pessoa a quem esse depoimento é imputado confirma de forma contundente e com veemência as afirmações que lhe são atribuídas nos documentos escritos (email´s).
13.
O tribunal a quo não poderia ter considerado provada a matéria constante dos pontos correspondentes da matéria de facto considerada provada, e, deveria ter considerado como provada a matéria constante do ponto A. a D., da matéria de facto considerada não provada, desde logo porque a A., ainda que condicionada, confessou esta matéria (conforme se fundamentou nos pontos anteriores desta alegação).
14.
Outrossim e perante os depoimentos mencionados da parte da aqui recorrente, o tribunal deviria ter considerado provado, em substituição do facto identificado sob o ponto 5., 6. e 12. da matéria de facto provada, o seguinte:
O IEFP errou na sua análise dos factos afectos à condição de estagiária, pelo que A. confessou indubitavelmente em audiência, bem como pela ocorrência dos seus escritos no decorrer da situação vigente. A própria A., apesar de saber da decisão inicial do IEFP sobre o seu estágio e da provável decisão da R., pediu à mesma R. que a ajudasse também a reverter essa situação injusta e que por tudo, lhe fosse dada a oportunidade de continuar no regime de estagiária, apesar do IEFP ter apontado em situação inversa (caducidade do estágio). Foi sempre a A. que pretendeu continuar no estabelecimento na certeza de que com a ajuda da sua entidade patronal a situação iria ser revertida. Foi sempre a A. que quis continuar na condição de estagiária, até que a questão da caducidade do seu estágio fosse revista. Foi nessa senda que a entidade patronal, patrocinou a sua vontade tentando através de outros meios e instituições fazer reverter a situação da A.
Mais deveria o tribunal a quo, com os mesmos fundamentos, ter considerados provados estes factos da matéria de facto não provada.
15.
E pelos motivos indicados, o tribunal de primeira instância, também não deveria ter considerado provados os factos identificados como 4, 5, 6 a 10., da matéria de facto considerada provada.
16.
Ainda que assim se não entendesse, o tribunal a quo não poderia ter qualificado como sendo de trabalho o acordo celebrado, quando de facto essa não foi sequer a vontade das partes, mas sim um estratagema montado pela A. para «caçar dois coelhos de uma só cajadada»!!
17.
A não ser assim, violar-se-ia o princípio da segurança jurídica e o princípio da confiança (artigo 2.º, da Constituição da República Portuguesa) e uma tal interpretação do disposto no artigo 65º, do Código do Trabalho, por referência aos dispositivos regulamentares entretanto alterados por força do COVID 19., dos diplomas legais aqui bem enfatizados e que resultaria numa interpretação materialmente inconstitucional daquele primeiro normativo, por violação dos artigos, 47.º e 53º da Constituição República Portuguesa.
Nestes termos e nos melhores de direito, deverá o presente recurso ser julgado procedente por provado, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-a por outra que julgue a ação improcedente ou o IEFP responsabilizado na qualidade de co-RR.´, em conformidade com o proposto na anterior contestação e presente alegação, ordenar a baixa do processo para a decisão devida das questões de facto e de direito invocadas, com todos os efeitos legais daí advenientes, para que assim seja feita a mais sã, serena, objetiva e verdadeira
JUSTIÇA !”
I.C.
A autora, patrocinada pelo Ministério Público, respondeu às alegações e defendeu que deve negar-se provimento ao recurso e manter-se a decisão recorrida.
O Instituto do Emprego e da Formação Profissional, I.P. também respondeu às alegações, onde pugnou pela manutenção, na íntegra, da sentença recorrida.
I.D.
O recurso foi devidamente recebido pelo tribunal a quo.
Após os vistos, cumpre decidir.
As conclusões das alegações de recurso delimitam o respetivo objecto de acordo com o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha, mas não haverá lugar à apreciação de questões cuja análise se torne irrelevante por força do tratamento empreendido no acórdão (artigos 608.º, n.º 2 e 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).
No caso, impõe-se apreciar:
a. Nulidade processual decorrente da falta de redução a escrito de confissão em depoimento de parte;
b. Impugnação da matéria de facto;
c. Eventual erro de julgamento quanto à ligação da autora à ré como sendo um contrato de trabalho.
III.A. Nulidade processual:
Invoca a ré/recorrente que existiu declaração confessória por parte da autora no depoimento de parte que esta prestou em audiência. Como essa declaração confessória não ficou reduzida a escrito (o que se confirma pela simples consulta da acta que documenta a audiência de julgamento realizada em 30/01/2024), diz a recorrente que foi violado o artigo 463.º do Código de Processo Civil e, como tal, será nulo o processado subsequente, designadamente a sentença proferida e de que recorreu.
Decorre, efectivamente, do artigo 463.º do Código de Processo Civil que terá de haver redução a escrito do depoimento na parte em que houver confissão do depoente (ou seja, quando exista o reconhecimento por parte do depoente da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária, conforme se dispõe no artigo 352.º do Código Civil) ou quando o depoente narre factos ou circunstâncias que impliquem indivisibilidade da declaração confessória (ou seja, quando o depoente reconhece a realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária, mas tal declaração é acompanhada da narração de outros factos ou circunstâncias tendentes a infirmar a eficácia do facto confessado ou a modificar ou extinguir os seus efeitos, conforme se dispõe no artigo 360.º do Código Civil),
É que só com a redução a escrito do depoimento se alcançará a força probatória plena contra o confitente, como decorre do artigo 358.º, n.º 1, do Código Civil.
Daí que se venha a considerar que quando (eventualmente) exista declaração confessória em depoimento de parte e falte a redução a escrito desses segmentos na acta que documenta a audiência (apesar da gravação) existirá uma nulidade por omissão de um acto prescrito por lei e cuja falta poderá influir na decisão da causa, como decorre do artigo 195.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Porém, não se trata de nulidade que possa ser conhecida oficiosamente, por não constar do elenco do artigo 196.º do Código de Processo Civil.
Trata-se, por isso, de uma nulidade que só pode ser invocada pelo interessado na observância da formalidade (no caso, pela ré interessada em prevalecer-se de uma confissão da parte contrária), como decorre do artigo 197.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
E, como se impõe no artigo 199.º do Código de Processo Civil (já que a nulidade em causa não vem referida no artigo 198.º desse diploma), estando a parte presente na audiência em que invoca ter sido cometida a falta de redução a escrito da declaração confessória (como foi o caso), a nulidade apenas poderia ser arguida enquanto esse acto não terminasse (neste sentido ver Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa[1]) e, entre outros, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 02/10/2003, processo n.º 03B1909[2] e de 25/02/2025, processo n.º 22017/18.9T8SNT-D.L1.S1[3]).
Ora, como não foi arguida nenhuma nulidade até ao encerramento da audiência de julgamento, sempre a mesma (a existir) se teria por sanada e, por isso e sem necessidade de se analisar se existiu qualquer declaração confessória da autora[4], improcede esta questão invocada pela recorrente.
III.B.1 Impugnação da matéria de facto:
A recorrente cumpriu minimamente os requisitos do artigo 640.º do Código de Processo Civil, pelo que se impõe a análise das questões suscitadas na sua impugnação da matéria de facto.
Na verdade, como se sumariou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27/02/2024 (processo n.º 2351/21.1T8PDL.L1.S1[5]): “Para o cumprimento do ónus de especificação do art. 640.º, n.º 1, do CPC, os concretos pontos de facto impugnados devem ser feitos nas respectivas conclusões, porque delimitadoras do âmbito do recurso e constituírem o fundamento da alteração da decisão. Já quanto à especificação dos meios probatórios e à exigência da decisão alternativa, a lei não impõe que seja feita nas conclusões, podendo sê-lo no corpo da motivação”.
Assim, conforme o disposto no artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, esta Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento (mesmo superveniente) impuserem decisão diversa.
O Tribunal de recurso, sem embargo da atendibilidade da prova plena que resulte dos autos, deve considerar o que emergir da apreciação crítica e livre dos demais elementos probatórios e usar, se for o caso, as presunções judiciais que as circunstâncias justificarem, designadamente a partir dos factos instrumentais, como decorre do n.º 4, do artigo 607.º e da alínea a), do n.º 2, do artigo 5.º, ambos do Código de Processo Civil.
Como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10/07/2024 (processo n.º 99/22.9T8GDM.P1[6]), “O Tribunal da Relação para reapreciar a decisão de facto impugnada tem de, por um lado, analisar os fundamentos da motivação que conduziu a primeira instância a julgar um facto como provado ou como não provado e, por outro, averiguar, em função da sua própria e autónoma convicção, formada através da análise crítica dos meios de prova disponíveis e à luz das mesmas regras de direito probatório, se na elaboração dessa decisão e na sua motivação ocorre, por exemplo, alguma contradição, uma desconsideração de qualquer um dos meios de prova ou uma violação das regras da experiência comum, da lógica ou da ciência – elaboração, diga-se, que deve ser feita à luz de um cidadão de normal formação e capacidade intelectual, de um cidadão comum na sociedade em questão – sem prejuízo de, independentemente do antes dito, poder chegar a uma decisão de facto diferente em função da valoração concretamente efetuada em sede de recurso”.
*
a) Em primeiro lugar, na sentença recorrida deu-se como provado, nos seus pontos 3 e 4 que:
“3. Tal contrato de estágio cessou, por motivo de caducidade, em 27/11/2020.
4. A A. e a R. foram informadas da cessação da relação que mantinham ao abrigo da referida medida.”
Importa ter presente que o chamado contrato de estágio se encontrava regulado na lei (como se verá) e a sua cessação (especialmente como tendo ocorrido na data em causa) estava a ser discutida nos autos (é, na verdade, tese central da ré de que esse contrato não estava caducado nessa data).
Assim, dizer-se que o contrato cessou por caducidade (como se diz no ponto 3 dos factos provados da sentença) ou que as partes foram informadas da cessação da relação que mantinham (como se diz no ponto 4 dos factos provados da sentença) são meras conclusões, pois implicam uma tomada de posição sobre ou a partir de outros factos e seu respectivo enquadramento na legislação aplicável (e nas cláusulas do contrato celebrado entre as partes), que não podem ter cabimento no elenco dos factos provados (mas na análise jurídica da causa).
Como se decidiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/01/2016 (processo n.º 1391/13.9TTCBR.C1.S1[7]) “o Juiz não deve incluir no elenco dos factos provados conceitos de direito ou conclusões normativas que possuam virtualidades para condicionar o destino da acção e que definam, por essa via, a aplicação do direito”.
Assim, esses dois pontos (3 e 4) devem eliminar-se do elenco dos factos provados.
b) Defende a ré/recorrente que o ponto 5 da matéria de facto não deve ser considerado provado.
Nesse ponto 5 a sentença recorrida deu como provado que: “5. O Centro de Emprego e Formação profissional de Setúbal não tinha conhecimento da continuidade da A. (Ex-estagiária) ao serviço da R. a partir de 09/12/2020”.
O Tribunal não deve pronunciar-se e decidir sobre factos que são absolutamente inócuos para a decisão sobre a causa, considerando as várias soluções plausíveis da questão de direito. É o que decorre do princípio geral da economia processual, consagrado no artigo 130.º do Código de Processo Civil (aplicável ao caso dos autos por força do artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho) e que impõe que o resultado processual seja atingido com a maior economia de meios. Este princípio é plenamente aplicável em fase de recurso (e de reapreciação da prova).
Assim, saber-se se uma entidade terceira em relação à autora e à ré sabia da continuação da primeira ao serviço da segunda é inócuo relativamente à qualificação da relação jurídica do contrato (o que se manifesta, desde logo, por não ter sido abordado na apreciação jurídica da causa na sentença recorrida) e, como tal (sob pena de se estarem a praticar atos inúteis) não deverá ser considerado/apreciado na decisão sobre a matéria de facto.
Como tal, também não se deve considerar esse ponto (5) no elenco dos factos provados.
c) A ré/recorrente insurge-se contra a redacção do ponto 6 dos factos provados e, nas suas alegações, indica uma redacção alternativa (em suma, no sentido de que não houve novo acordo entre as partes).
Nesse ponto 6 dos factos provados a sentença recorrida deu como provado que: “6. No dia 09/12/2020, por acordo entre A. e R., a A. passou a desempenhar as funções de Auxiliar de Acção Educativa, como anteriormente tinha ocorrido quando frequentou o estágio profissional do CEFP de Setúbal, sendo que tratava da higiene das crianças, preparava as refeições e ajudava na alimentação das mesmas; estabelecia rotinas de sono (hora da sesta), ajudava no reforço das aprendizagens, participava nas actividades de animação desenvolvidas e apoiava os elementos da equipa educativa”.
Para fundamentar a redacção desse ponto 6, referiu-se na sentença recorrida que: “Os factos provados 6) a 9) resultam dos depoimentos das testemunhas arroladas pela R. que sabiam que a A. antes de ter iniciado a sua baixa/licença de maternidade, estava a prestar serviço na R. enquanto auxiliar da acção educativa ao abrigo de um contrato de estágio, e que, quando regressou à R., continuou a fazer o mesmo que fazia antes da ausência, com o mesmo horário. Todas as testemunhas, com excepção de EE, declararam não saber a que título a mesma se encontrava a prestar a sua actividade na R., após o regresso em dezembro, embora supusessem que fosse enquanto estagiária, pois quando se ausentou tinha essa qualidade. Desconheciam a questão da caducidade do contrato de estágio”. Passa, de seguida, a elencar-se o teor dos depoimentos de FF, EE, GG, HH, mas em nenhuma parte se refere a existência de qualquer novo acordo entre autora e ré. E, na verdade, nem das declarações da autora resulta que a mesma tenha declarado a existência de um novo acordo.
Ou seja, embora o facto de a Autora ter continuado a desempenhar as mesmas funções a partir de 09/12/2020 tenha sido dito pela autora e confirmado pelas testemunhas, nenhuma delas referiu a existência de um novo acordo (ou qualquer novo título sob o qual a Autora estava a trabalhar), todas assumindo que seria ainda como estagiária. A parte do “acordo” no facto 6 parece ser uma inferência apenas baseada na continuidade da prestação de actividade após uma comunicação de caducidade do estágio e não resultante da existência de um novo acordo verbal explícito (que ninguém referiu).
Como tal, deve alterar-se esse ponto 6 (expurgando da matéria o que não resultou da prova e deixando uma eventual conclusão para a discussão jurídica da causa) para passar a ter a seguinte redacção:
“A partir de 9/12/2020 a autora continuou junto da ré, como anteriormente, a realizar as mesmas tarefas, sendo que tratava da higiene das crianças, preparava as refeições e ajudava na alimentação das mesmas; estabelecia rotinas de sono (hora da sesta), ajudava no reforço das aprendizagens, participava nas actividades de animação desenvolvidas e apoiava os elementos da equipa de forma a contribuir para o bom funcionamento do estabelecimento”.
d) Insurge-se a ré, igualmente, quanto aos pontos 8 a 12 dos factos provados da sentença.
Nesses pontos a sentença recorrida deu como provado que:
“8. A A. observada um horário de entrada e de saída, sendo o seu período normal de trabalho de 2ª a 6ª feira, entre as 10:00 e às 12h30 e das 14h30 às 18h30 (pois tinha direito a redução de horário por estar a amamentar o seu bebé), com folga no sábado e no domingo.
9. Como contrapartida da actividade prestada, a A. auferia ultimamente a quantia mensal de 570,45 €, com subsídio de alimentação fornecido em espécie por cada dia útil de trabalho.
10. No dia 16 de Março de 2021, a A. comunicou à R. a resolução do contrato por falta de pagamento de salários, nos seguintes termos: (transcrevendo-se o documento)
11. O contrato de Estágio Profissional promovido pelo IEFP tinha a duração de nove meses.
12. Este contrato de Estágio Profissional que deveria ter o seu termo a 20/8/2020, prolongou-se no tempo, devido aos encerramentos obrigatórios destes estabelecimentos emanados pelo Governo, durante os confinamentos resultantes do estado de emergência por força da pandemia Covid-19.”
No entanto, neste particular, a recorrente não invoca qualquer elemento de prova que pudesse apontar em sentido contrário, antes se limitando a um exercício de discordância jurídica.
Do depoimento das testemunhas (na sequência, de resto, do que já resultava do ponto 6) e documentos juntos (recibos), resultou sem margem para qualquer dúvida que a autora continuou a auferir a mesma quantia mensal (daí a resposta ao ponto 9 dos factos provados) e que dá credibilidade à versão relatada pela autora quanto ao ponto 8 (e que não foi posta em causa) e que, como tal, se devem manter (apenas se corrigindo o mero lapso de escrita no início do ponto 8 para nele constar a palavra “observava”).
O ponto 10 limita-se a transcrever o documento (não impugnado) enviado pela autora e, daí, também se deve manter.
O ponto 11 resulta do teor do contrato de estágio que está junto aos autos.
O ponto 12 também resulta, sem margem para grandes dúvidas, dos documentos (emanados da ré e juntos pelo IEFP) juntos aos autos e dos quais resulta a existência de pedidos de prolongamento.
Improcede, nesta parte, a impugnação.
e) A recorrente (ver a sua conclusão n.º 1) pretende, ainda, impugnar os pontos 31 a 33 dos factos provados.
“31. Foi exarado despacho datado de 23 de outubro de 2020, nos seguintes termos:
“(…) De 01/06/2020 a 08/07/2020 - certificado de incapacidade temporária para o trabalho - 38 dias;
De 09/07/2020 a 27/11/2020 - licença de parentalidade - 142 dias;
(…)”
32. Mais se informou que a estagiária não poderia concluir o estágio que se encontrava a realizar pelo motivo de ter excedido o período de suspensão previsto em sede de Regulamento da Medida e que, decorridos 15 meses após o início do estágio, incluindo-se neste prazo os períodos de suspensão previstos na al. a) do Ponto 13.2, o contrato cessa por caducidade, conforme resulta do Ponto 13.3 do Regulamento.
33. A entidade promotora foi informada em 22/10/2020 que a caducidade do estágio ocorreria em 27/11/2020.”
Também neste particular (ver pág. 38 e 39 das alegações de recurso) a recorrente não indica elementos probatórios que afastem a prova de que tais factos ocorreram e apenas se insurge contra a ilegalidade da decisão do IEFP quando comunicou a caducidade do contrato de estágio.
Como acima se disse, uma coisa será dar-se como provado o que aconteceu (o IFEP comunicou essa sua conclusão e a própria contestação da ré o admite) e outra, bem diferente, é a legalidade ou acerto dessa actuação do IEFP (que é conclusão que deve estar arredada da matéria de facto).
Assim, improcede esta parte da impugnação da matéria de facto.
f) Finalmente, pretende a ré (conclusões 1 e 13) que as alíneas A) a D) dos factos não provados da sentença sejam considerados provados.
Nessas alíneas dos factos não provados o Tribunal a quo fez constar a seguinte matéria:
“a. A própria A., apesar de saber da decisão inicial do IEFP sobre o seu estágio e da provável decisão da R., pediu à mesma R. que a ajudasse também a reverter essa situação injusta e que por tudo, lhe fosse dada a oportunidade de continuar no regime de estagiária, apesar do IEFP ter apontado em situação inversa (caducidade do estágio).
b. Foi sempre a A. que pretendeu continuar no estabelecimento na certeza de que com a ajuda da sua entidade patronal a situação iria ser revertida.
c. Foi sempre a A. que quis continuar na condição de estagiária, até que a questão da caducidade do seu estágio fosse revista.
d. Foi nessa senda que a entidade patronal, patrocinou a sua vontade tentando através de outros meios e instituições fazer reverter a situação da A.”
Para a impugnação desses factos a recorrente invoca uma confissão da autora (que, como se viu, não existe formalmente) e os depoimentos das testemunhas (sem indicar ou transcrever os concretos depoimentos nas partes relevantes).
Sempre se adiantará que, analisado o depoimento da autora, não se vislumbra que tenha ocorrido qualquer confissão destes factos. E perante este depoimento, não é possível atribuir mais valor ou credibilidade ao depoimento de EE (única – e claramente interessada – para além da autora que falou sobre isso), pelo que, na falta de outra prova segura, só pode considerar-se que a dúvida sobre os factos deve ser resolvida contra quem os mesmos aproveitam (cf. artigo 414.º do Código de Processo Civil).
Improcede, por isso, também esta parte da impugnação.
Considera-se, por isso, provado o seguinte:
1. A sociedade R. dedica-se à Educação pré-escolar, com a CAE Principal 85100‑R3.
2. Em 16 de outubro de 2019, na qualidade de entidade promotora, AA Unipessoal Lda., submeteu eletronicamente uma candidatura à medida estágios profissionais.
3. A referida candidatura, a qual foi atribuído o n.º ...65/ET/19, destinava-se a integrar dois estagiários de nível 4, na área de Auxiliar de Cuidados de Crianças.
4. Por despacho da Senhora Delegada Regional da Delegação Regional de Lisboa e Vale do Tejo, do IEFP, de 4 de novembro de 2019, foi aprovada a candidatura, com o custo total de 8.675,28 €.
5. Os dois estágios objeto da candidatura tiveram o seu início em 21 de novembro de 2019, tendo sido integradas as seguintes estagiárias: BB e FF.
6. A A. integrou um estágio profissional no Centro de Emprego e Formação Profissional de setúbal, em 21/11/2019, na R.
7. Em 26 de novembro de 2019, estando reunidas as condições expressas no Regulamento de Medida de Estágios Profissionais, foi autorizado o pagamento à entidade promotora da 1ª prestação, a título de adiantamento, correspondente a 30% do total do apoio aprovado, no de 2.062,58 €.
8. O contrato de Estágio Profissional promovido pelo IEFP tinha a duração de nove meses.
9. Este contrato de Estágio Profissional que deveria ter o seu termo a 20/8/2020, prolongou-se no tempo, devido aos encerramentos obrigatórios destes estabelecimentos emanados pelo Governo, durante os confinamentos resultantes do estado de emergência por força da pandemia Covid-19.
10. Em 12/04/2020, a entidade promotora comunica ao IEFP que as suas instalações estão encerradas desde 16/03/2020, por determinação do Governo, em face da situação epidemiológica SARS-COV 2 e solicita a suspensão dos estágios, designadamente o da A.
11. Com base nos despachos de 19 de março e de 10 de abril, dos Gabinetes dos Secretários de Estado Adjunto e do Trabalho e da Formação Profissional e da Segurança Social, foi determinada a suspensão do estágio da A., no período compreendido entre 16 de março e 31 de maio de 2020 (77 dias).
12. Em 29 de abril de 2020, após verificação da conformidade documental, foi autorizado o pagamento à entidade promotora, sob a forma de reembolso da 2ª prestação, até ao valor de 30% do apoio aprovado, no montante de 2.602,58 €.
13. Durante o período de suspensão, por motivo Covid19, foi concedido mensalmente à entidade promotora o valor igual à comparticipação do IEFP, que estava decidida para o estágio em apreço.
14. Deste valor, a entidade promotora podia reter a rúbrica referente ao seguro de acidentes de trabalho, e o restante pagava, por meio de transferência bancária, à estagiária.
15. A A. em virtude da sua gravidez de risco, veio a apresentar atestado enquanto tal que a impediu de regressar no final do 1º confinamento, ou seja, em 01/06/2020, tendo o IEFP sido informado disso.
16. Em 18/06/2020, é enviado ao Serviço de Emprego de Setúbal, por email, o certificado de incapacidade temporária para o trabalho da estagiária aqui A., para o período de 01/06/2020 a 14/07/2020 (44 dias), procedendo-se à suspensão do estágio.
17. Além de que a A., como estava na fase final da sua gravidez, tendo atestado até 14/07/2020, veio efectivamente a parir em 09.07.2020.
18. A partir dessa data, a A. iniciou o gozo de licença de maternidade, cujo termo final ocorreria a 05.12.2020.
19. Em 21 de outubro de 2020, a entidade promotora informa que a estagiária A. se encontrava de licença de parentalidade com início a 9 de julho de 2020 e fim a 5 de dezembro de 2020 (150 dias) e remete o comprovativo em 21 de outubro de 2020.
20. Foi exarado despacho datado de 23 de outubro de 2020, nos seguintes termos:
“(…) De 01/06/2020 a 08/07/2020 - certificado de incapacidade temporária para o trabalho - 38 dias;
De 09/07/2020 a 27/11/2020 - licença de parentalidade - 142 dias;
(…)”
21. Mais se informou que a estagiária não poderia concluir o estágio que se encontrava a realizar pelo motivo de ter excedido o período de suspensão previsto em sede de Regulamento da Medida e que, decorridos 15 meses após o início do estágio, incluindo-se neste prazo os períodos de suspensão previstos na al. a) do Ponto 13.2, o contrato cessa por caducidade, conforme resulta do Ponto 13.3 do Regulamento.
22. A entidade promotora foi informada em 22/10/2020 que a caducidade do estágio ocorreria em 27/11/2020.
23. A A. face comunicação de decisão do IEFP que anuncia a caducidade do contrato de estágio a 27/11/2020, pede esclarecimento ao IEFP através de email datado de 09/11/2020, com o seguinte teor:
24. Em 20 de Novembro, a A. volta a insistir com o Director do IEFP, dando conta de eventual lapso que aí enuncia, solicitando, uma vez mais, esclarecimento quanto à caducidade do seu contrato de estágio a 27/11/2020.
25. O IEFP manteve a decisão da caducidade do contrato de estágio da A. a partir de 27/11/2020, quer na resposta que deu à A., quer no email de 16/11/2020.
26. A partir de 9/12/2020 a autora continuou junto da ré, como anteriormente, a realizar as mesmas tarefas, sendo que tratava da higiene das crianças, preparava as refeições e ajudava na alimentação das mesmas; estabelecia rotinas de sono (hora da sesta), ajudava no reforço das aprendizagens, participava nas actividades de animação desenvolvidas e apoiava os elementos da equipa de forma a contribuir para o bom funcionamento do estabelecimento.
27. A A. realizava aquelas tarefas mediante ordens e instruções que lhe eram dadas pela R.
28. A A. observava um horário de entrada e de saída, sendo o seu período normal de trabalho de 2ª a 6ª feira, entre as 10:00 e às 12h30 e das 14h30 às 18h30 (pois tinha direito a redução de horário por estar a amamentar o seu bebé), com folga no sábado e no domingo.
29. Como contrapartida da actividade prestada, a A. auferia ultimamente a quantia mensal de 570,45 €, com subsídio de alimentação fornecido em espécie por cada dia útil de trabalho.
30. No dia 16 de Março de 2021, a A. comunicou à R. a resolução do contrato por falta de pagamento de salários, nos seguintes termos:
Do elenco dos factos continua a constar que não se provou, com relevo para a decisão da causa, que:
a. A própria A., apesar de saber da decisão inicial do IEFP sobre o seu estágio e da provável decisão da R., pediu à mesma R. que a ajudasse também a reverter essa situação injusta e que por tudo, lhe fosse dada a oportunidade de continuar no regime de estagiária, apesar do IEFP ter apontado em situação inversa (caducidade do estágio).
b. Foi sempre a A. que pretendeu continuar no estabelecimento na certeza de que com a ajuda da sua entidade patronal a situação iria ser revertida.
c. Foi sempre a A. que quis continuar na condição de estagiária, até que a questão da caducidade do seu estágio fosse revista.
d. Foi nessa senda que a entidade patronal, patrocinou a sua vontade tentando através de outros meios e instituições fazer reverter a situação da A.
e. O único meio de subsistência da A. provinha da quantia que auferia ao serviço da R.
A. Em primeiro lugar, importa considerar que na data em causa – em 16/10/2019 ver ponto 2 dos factos provados – o contrato de estágio se encontrava regulado no artigo 6.º da Portaria n.º 131/2017, de 7 de Abril, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 15/2017, de 27 de Abril e alterada e republicada pela Portaria n.º 70/2019, de 27 de Fevereiro (tendo essa regulamentação o artigo 14.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 13/2015, de 26 de Janeiro como norma habilitante).
Como decorre da conjugação dessas normas, o contrato de estágio é celebrado entre a entidade promotora (no caso a ré) e a destinatária da medida (a autora). O IEFP não é parte desse contrato.
E as causas pelas quais tal contrato de estágio pode cessar estão definidas nessa norma (n.º 4, do citado artigo 6.º) e entre elas não está qualquer decisão do IEFP, já que a essa entidade não está atribuída essa competência – apenas lhe cabe acompanhar, analisar as candidaturas (artigos 19.º e 20.º dessa Portaria), verificar e auditar a realização do estágio (artigo 22.º da indicada Portaria), comparticipar o custo com a bolsa de estágio (artigo 15.º da citada Portaria) e, em caso de incumprimento, cessar o apoio financeiro e exigir a restituição dos montantes entregues e recebidos (artigo 21.º da mesma Portaria).
Daí que importe, em primeiro lugar, qualificar esse contrato de estágio e, por outro lado, saber se o mesmo cessou os seus efeitos na data considerada na sentença recorrida.
B. O contrato de estágio promovido pelo IEFP não se encontra regulado no Código do Trabalho, mas nas referidas normas do Decreto-Lei n.º 13/2015 e Portaria n.º 131/2017.
A promoção da celebração desse tipo de contratos por parte deste serviço do Estado (ver também o regime da Portaria n.º 204-B/2013, de 18 de Junho, alterada pelas Portarias n.º 375/2013, de 27 de Dezembro, n.º 20-A/2014, de 30 de Janeiro, e n.º 149‑B/2014, de 24 de Julho; o regime da Portaria n.º 86/2015, de 20 de Março; e, já depois da referida Portaria n.º 131/2017, o regime da Portaria n.º 206/2020, de 27 de Agosto) visa o desenvolvimento de uma experiência prática em contexto de trabalho com o objectivo de promover a inserção de jovens no mercado de trabalho ou reconversão profissional de desempregados e não pode consistir na ocupação de postos de trabalho (ver o artigo 1.º, n.ºs 1 e 2, de cada uma das indicadas Portarias).
Dizer-se que com esse contrato não se visa ocupar um posto de trabalho já é uma forte indicação de que o mesmo não tem natureza laboral.
E a outra indicação de que o contrato de estágio não é um contrato de trabalho encontra-se no artigo 112.º, n.ºs 4 e 6, do Código do Trabalho: onde se estabelece que a existência de estágio profissional apenas tem relevância para a duração (ou mesmo exclusão) do período experimental do contrato de trabalho que se celebre para a mesma actividade.
Assim, embora à luz de anterior legislação, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18/03/1998 (processo n.º 98S020[9]) decidiu que: “O contrato de estágio profissional não pode ser qualificado como contrato de trabalho ou de aprendizagem nem a bolsa de formação paga ao aprendiz se confunde com o conceito de retribuição.”
Assente que esse tipo de contrato, que foi o que foi celebrado entre autora e ré, não é um contrato de trabalho, importa verificar se o mesmo cessou na data considerada na sentença recorrida para se saber como qualificar a relação entre as partes a partir daí.
C. Nos termos do n.º 4, do artigo 6.º da Portaria n.º 131/2017, de 7 de Abril (rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 15/2017, de 27 de Abril e alterada e republicada pela Portaria n.º 70/2019, de 27 de Fevereiro), “O contrato de estágio cessa por caducidade, por acordo das partes ou por denúncia de uma das partes, nos termos e condições definidos no contrato”.
E, quanto à caducidade, estabelece o n.º 5, desse mesmo artigo, que:
“o contrato de estágio caduca quando se verifique uma das seguintes situações:
a) O seu termo;
b) Impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva, de o estagiário poder frequentar o estágio ou de a entidade promotora lho poder proporcionar;
c) O estagiário atinja o número de cinco faltas injustificadas, seguidas ou interpoladas;
d) O estagiário, ainda que justificadamente, atinja o número de 15 dias de faltas seguidos ou interpolados, não relevando o período de suspensão do estágio previsto na alínea b) do n.º 3 deste artigo;
e) Decorrido o prazo de duração do estágio acrescido de seis meses, nele se incluindo os períodos de tempo de suspensão a que se refere o n.º 3”.
Em regra, a caducidade de um contrato é usada para definir a extinção do vínculo contratual em consequência de um evento a que se atribui o efeito extintivo. A cessação do contrato advém de um facto jurídico não dependente de uma declaração de vontade e, por isso, o vínculo contratual não cessa por força de declaração de vontade emitida com essa finalidade, mas ipso facto e por força da lei (como ensina Pedro Romano Martinez[10]).
Normalmente, a caducidade está associada ao decurso de um prazo (legal ou contratualmente fixado) que determina a extinção automática do vínculo aquando da verificação do termo.
Mas um contrato também pode estar sujeito a um termo final incerto (em que a extinção do vínculo ocorre no momento em que ocorre o facto, apesar de ser incerta a data) ou a uma condição resolutiva (em que o vínculo se extinguirá automaticamente pela ocorrência de um facto futuro e incerto – como será o caso quando se prevê que a existência de certo número de faltas, justificadas e/ou injustificadas, poderá levar à caducidade).
No caso do contrato de estágio, numa leitura mais apressada, poder-se-ia dizer que o termo aposto no mesmo geraria, automaticamente, a cessação do vínculo.
No entanto, o n.º 3 do referido artigo 6.º da Portaria em causa, possibilita à entidade promotora (neste caso a aqui ré/recorrente) a faculdade de, mediante autorização do IEFP, suspender o estágio e adiar, dessa forma, a data do seu termo.
Ou seja, o que seria, à partida, um termo certo para cessar o contrato terá de ser visto como um termo incerto (sabe-se que o facto vai ocorrer, mas não se sabe quando, já que no decurso da execução do contrato de estágio pode haver uma suspensão do mesmo – por razões ligadas à entidade promotora ou ao estagiário – e, por isso, estender o termo para outra data que não se sabe qual é no momento em que se celebra o contrato).
Nesse n.º 3 do artigo 6.º da Portaria n.º 131/2017 prevê-se a possibilidade de a entidade promotora suspender o estágio (sempre com autorização do IEFP) nas seguintes situações:
a. encerramento temporário do estabelecimento, por período não superior a 1 mês; ou
b. doença ou gozo de licença por parentalidade do estagiário, durante um período não superior a 6 meses.
Acontece que outras normas posteriores à referida Portaria n.º 131/2017 vieram, forçosamente, alterar esse período máximo de suspensão por encerramento do estabelecimento: de acordo com o artigo 9.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março (que estabeleceu medidas excecionais e temporárias relativas à situação epidemiológica do novo Coronavírus – COVID 19), em 16 de Março de 2020 suspendeu‑se a actividade prosseguida pela ré (educação pré-escolar), com reabertura faseada a partir de Maio de 2020 (com o Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio).
Assim, sabe-se que por força dessas normas do “confinamento” (na sequência, relembre-se, de declaração do estado de emergência nos termos constitucionalmente definidos[11]) a ré (com autorização do IEFP) suspendeu o contrato de estágio entre 16 de Março de 2020 e 31 de Maio de 2020 (ver, também, o ponto 11 dos factos provados deste Acórdão), ou seja, por 77 dias (mais, portanto, que os 30 dias previstos como possibilidade de suspensão por razões ligadas à entidade promotora).
Sobretudo, deve considerar-se que essas normas que, na sequência da declaração do estado de emergência durante a pandemia pela doença Covid-19, decretaram o encerramento de estabelecimentos de educação pré-escolar, como o da ré e entidade promotora do estágio, prevalecem sobre os prazos de suspensão máxima do estágio previstas no contrato e na indicada Portaria que regulamento o contrato de estágio.
Depois disso, a ré procedeu à suspensão do estágio por mais 44 dias (ver ponto 16 dos factos provados) por doença da autora e a partir de 1/06/2020.
E, depois ainda, a ré procedeu à suspensão do estágio por 150 dias (ponto 19 dos factos provados deste acórdão) pelo gozo da licença de parentalidade da ora autora que, entretanto, tinha dado à luz em 9/07/2020 e a partir desta data.
A suspensão do estágio preconizada pela ora ré seria, ao todo, de 271 dias, a significar que o contrato de estágio com a duração inicial de 9 meses (ponto 8 dos factos provados) e com início em 21/11/2019 (ver pontos 5 e 6 dos factos provados) teria o seu termo não em 21/08/2020, mas mais aqueles 271 dias, ou seja, em 19/05/2021 (isto sem contar com o novo período de suspensão das actividades lectivas definidas Decreto n.º 3‑C/2021, de 22 de Janeiro).
A questão central neste domínio é que o IEFP (a quem cabia, como se viu, autorizar a suspensão do estágio nos termos do artigo 6.º, n.º 3, da indicada Portaria) autorizou a suspensão do estágio (para além dos 77 dias de encerramento do estabelecimento por via da “legislação Covid” – ver ponto 11 dos factos provados), em 38 dias por doença e 142 dias por licença de parentalidade, conforme resulta do ponto 20 dos factos provados.
Estranhamente, porém, em vez de contar todos esses dias (ao todo 257 dias, acrescentando os referidos no despacho de 23/10/2020 – ponto 20 dos factos provados – aos dias a que aludiu nos seus despachos de 19/03/2020 e 10/04/2020 – conforme ponto 11 dos factos provados, ou seja, à suspensão anteriormente comunicada) o IEFP comunicou às partes do contrato (a aqui autora e ora ré/recorrente) que a caducidade do estágio ocorreria em 27/11/2020.
Ora, considerando que o termo inicial do contrato de estágio (ou seja, 9 meses contados desde o seu início em 21/11/2019) era a 21/08/2020 e que o contrato já tinha sido suspenso por 77 dias (conforme autorização do IEFP e a que se refere o ponto 11 dos factos provados), significa que, mesmo que não se contasse com o período de doença e gozo de licença de parentalidade da autora, o termo do contrato seria a 6/11/2020 (ou seja, mais 77 dias a contar de 21/08/2020).
Mas acontece que, conforme resulta do ponto 16 dos factos provados, se procedeu à suspensão do estágio por mais 44 dias (pela apresentação de certificado de incapacidade temporária), o que determina que o termo do contrato de estágio passou para 20/12/2020 (ou seja, mais 44 dias após 6/11/2020).
Depois disso, a ora ré/recorrente informa o IEFP, ainda, que a autora/estagiária estava a gozar licença de parentalidade com início a 9/07/2020 (o que, igualmente, poderia levar à suspensão do estágio).
Mesmo que não se contasse integralmente os períodos de doença (44) e de licença de parentalidade (150 dias), mas apenas um período único de 6 meses por esses dois motivos (doença e licença de parentalidade), o termo do contrato ocorreria a 6/05/2021 (ou seja, mais 6 meses após o termo do contrato a 6/11/2020, este termo fixado por força da suspensão anterior – e já autorizada – decretada na sequência de medidas governamentais de encerramento de 77 dias).
Se se contasse apenas o período de duração inicial do estágio (9 meses) acrescido de 6 meses (como resulta da alínea e), do n.º 5, do referido artigo 6.º da Portaria n.º 131/2017, ou seja, o período máximo de 15 meses, o termo do contrato seria em 21/02/2021.
De notar, ainda, que por força do n.º 5, do artigo 26.º da Portaria n.º 206/2020, de 27 de Agosto (que, entretanto, entrou em vigor em 28/08/2020) os projetos de estágio realizados ao abrigo da Portaria n.º 131/2017 e que se encontrassem em execução à data de entrada em vigor dessa nova portaria (como era aqui o caso) e cuja duração total aprovada cessasse até 31/12/2020 poderiam ter sido prorrogados por três meses adicionais, mediante requerimento a apresentar junto do IEFP pela entidade promotora, pelo que bem poderia ter sido prorrogado o estágio ao abrigo desta norma.
Não tendo sido prorrogado ao abrigo desta norma, terá de se considerar, sem margem para quaisquer dúvidas, que, por via das suspensões pedidas pela ora ré/recorrente e autorizadas pelo IEFP (pelo menos 77 mais 44 dias), mesmo sem contar com a suspensão pelo gozo da licença de parentalidade, o contrato de estágio não tinha caducado em 27/11/2020 (como comunicado pelo IEFP) nem em 9/12/2020 (quando a autora regressou ao estabelecimento).
Como se disse, a caducidade é uma forma de cessação de um vínculo contratual que não depende da declaração de uma das partes à outra, pois o contrato caduca (ou cessa) independentemente dessa comunicação. E, sobretudo, a caducidade não ocorre por decisão do IEFP (que apenas pode autorizar a suspensão do estágio, não tendo qualquer poder para decretar a caducidade de contratos), mas quando ocorre o facto a que a lei atribui o efeito extintivo (neste caso, o termo).
Não pode, por isso, dizer-se que a caducidade do contrato de estágio ocorreu em 27/11/2020 (data que, de resto, não tem qualquer adesão a qualquer contagem) já que, nessa data, não ocorreu qualquer facto extintivo (como o termo do prazo de duração do estágio).
Diga-se que o erro do IEFP ao comunicar uma caducidade inexistente teve graves consequências para o desenvolvimento da relação entre as partes.
D. Verifica-se, por isso e ao contrário do considerado na sentença recorrida, que no dia 9/12/2020, quando a autora regressa ao estabelecimento da ré e continua a desenvolver a actividade como vinha fazendo anteriormente, ainda vigorava e estava em execução o contrato de estágio profissional (que, como já se viu, não tem a natureza de contrato de trabalho).
À luz de anterior legislação, decidiu-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08/06/2011 (processo n.º 2924/06.2TTLSB.L1-4[12]) que: “Uma vez terminado o prazo inicialmente acordado para o estágio profissional, mas continuando o recorrente a exercer as mesma funções e do mesmo modo, recebendo o mesmo subsídio mensal, ter‑se‑á de concluir que aquele acordo de estágio se prolongou, dado que da factualidade apurada não resulta que a vontade das partes tenha sido no sentido de acordarem um contrato de trabalho, sendo, também, a interpretação da vontade das partes relevante para a respectiva qualificação. Nunca os contratos de formação profissional ou de estágio geram relações de trabalho subordinado”.
Sobretudo esta última afirmação não poderá manter-se perante os regimes subsequentes que passaram a regular o contrato de estágio. Na verdade, decorre do artigo 17.º da indicada Portaria n.º 131/2017, de 7 de Abril, na redacção dada pela Portaria n.º 70/2019, de 27 de Fevereiro (sendo certo que esse mesmo regime se encontra no artigo 17.º da Portaria n.º 206/2020, de 27 de Agosto) que se incentiva a celebração de contrato de trabalho sem termo entre a entidade promotora e o estagiário após o estágio (através da concessão de prémios). No regime actual (ver artigo 7.º, n.º 7 da Portaria n.º 221/2024/1, de 23 de Setembro) a celebração de um contrato de trabalho subsequente ao estágio será, até, a regra.
O que parece claro, no entanto, é que o fim do contrato de estágio não acarreta, sem mais, que a relação entre entidade promotora e estagiário se passe a considerar um contrato de trabalho. É que podem as partes (como se decidiu, de resto, no indicado Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa) manter um estágio fora da alçada do IEFP (com a única consequência de, naturalmente, não poder a empresa/entidade promotora contar com os apoios públicos ao nível de ajudas no pagamento da bolsa).
Para que possa existir um contrato de trabalho subsequente ao fim do estágio, será necessário um acordo nesse sentido entre as duas partes (sujeito a liberdade de forma, com é regra do direito do trabalho, sendo que, para interesse da entidade promotora e se esta quiser ter acesso a benefícios, terá interesse em formalizá‑lo por escrito).
No caso dos autos, não só não se provou a existência desse acordo adicional como, na data em que a autora alegou ter o mesmo ocorrido, ainda vigorava (como se viu) o contrato de estágio.
Não existindo contrato de trabalho desde 9/12/2020, também não resulta dos factos provados que em algum momento a partir daí tenha existido um acordo entre as partes no sentido de se constituir entre elas um contrato de trabalho (ou uma nova relação que não a de estágio).
Não basta dizer-se que se presume a existência de um contrato de trabalho, porque os factos que se consideraram relevantes para se fazer funcionar a presunção do artigo 12.º do Código do Trabalho já se verificavam, sem alteração, no decurso do estágio profissional (decorria este nas instalações da ré, com horário de trabalho e com uso dos materiais da ré) e nem por isso se pode dizer que existia um contrato de trabalho desde a celebração do contrato de estágio.
Nas palavras do citado Acórdão da Relação de Lisboa, também nos regimes jurídicos do estágio profissional se configuram relações que se ajustam ao exercício dos poderes de dar ordens, orientações e fiscalização por parte das entidades formadoras, sem que deles resulte a subordinação jurídica.
Não pode, por isso, manter-se o decidido no ponto 1 do dispositivo da sentença recorrida.
E, consequentemente, inexistindo contrato de trabalho, também não pode manter‑se o decidido no ponto 2 do dispositivo da sentença recorrida relacionado com a licitude da resolução de um contrato de trabalho (que não se provou existir).
Nessa parte deve ser procedente a apelação.
E. Desde logo, não se tendo provado a existência de um contrato de trabalho, não poderá manter-se a condenação da ré a pagar a compensação pela sua resolução, pelo que igualmente não poderá manter-se a condenação do ponto 3, alínea e), do dispositivo da sentença.
Nos termos do artigo 11.º e 12.º da indicada Portaria n.º 131/2017 (na redacção dada pela Portaria n.º 70/2019, de 27 de Fevereiro), o estagiário tem direito a bolsa mensal de estágio e a refeição ou subsídio de refeição. Não tem direito a subsídios de férias e Natal.
Pelo que ficou dito (pela falta de prova da existência de um contrato de trabalho) a autora também não tinha direito a receber uma retribuição, mas uma bolsa de estágio (e esta não é devida, conforme se dispõe no artigo 11.º, n.º 5, da citada Portaria n.º 131/2017, nas situações de suspensão do estágio – e decorre do teor do documento transcrito no agora ponto 30 dos factos provados que a autora não prestou actividade desde 22/01/2021).
Assim, também não poderá manter-se a condenação da ré a pagar proporcionais do subsídio de férias e Natal (ponto 3, alíneas c) e d) do dispositivo da sentença recorrida) nem a sua condenação no pagamento de qualquer retribuição (ponto 3, alíneas a) e b), desse dispositivo).
Procede, também neste ponto, a apelação e, consequentemente, deve ser revogada a sentença recorrida.
F. Finalmente, dir-se-á que a questão relativa ao pedido de condenação do IEFP não vem invocada nas conclusões do recurso, apesar de vir referida nas alegações.
Entende-se, porém, que não se deverá aguardar por eventual aperfeiçoamento das conclusões, com dedução de convite para o efeito (por deficiência das mesmas), já que tal operação redundaria num acto inútil: é que o conhecimento dessa questão, face à procedência da pretensão recursiva da ré/recorrente no tocante a todos os pedidos da autora, sempre estaria prejudicada (já que este pedido – embora de difícil concretização – apenas foi deduzido pela ré para o caso de proceder o pedido da autora).
Conforme estabelecido no artigo 527.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a regra geral na condenação em custas é a de condenar a parte vencida. E havendo uma parte vencida não se passa ao critério subsidiário que é o da condenação em custas de quem tira proveito do recurso.
No caso, haverá que atender ao decaimento total da autora neste recurso.
Em face do exposto, decide-se julgar procedente a apelação e, em conformidade, revoga-se a sentença recorrida.
Custas do recurso pela autora/recorrida, sem prejuízo da sua isenção.
Notifique-se.
Évora, 25 de Junho de 2025
Filipe Aveiro Marques
Emília Ramos Costa
Paula do Paço
_____________________________________________
1. Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2.ª Edição, Almedina, pág. 547.↩︎
2. Acessível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/-/A80105ECED558B2F80256DEC002F647F.↩︎
3. Acessível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/2c71a32839f649da80258c3e003ee3ef.↩︎
4. E que, a existir, passaria a ser livremente apreciada.↩︎
5. Acessível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/1007b672c0f9ed2980258ad6005cfad7.↩︎
6. Acessível em https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/5c62d7680bfd396180258b8500342396.↩︎
7. Acessível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/39a593fc42b2e59d80257f3b003627d1.↩︎
8. Neste sentido ver António Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7.ª Edição, Almedina, pág. 369.↩︎
9. Acessível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/-/4EDA69A9DF22FDB28025695E0052F25C.↩︎
10. Da Cessação do Contrato, Almedina, pág. 41.↩︎
11. Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18 de Março.↩︎
12. Acessível em https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/e6e1f17fa82712ff80257583004e3ddc/62cff77d83df5947802578c60055e154.↩︎