É jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal de Justiça que, tanto no despedimento coletivo, como no despedimento por extinção do posto de trabalho, “o Tribunal deve respeitar os critérios de gestão da empresa, na medida em que sejam razoáveis e consequentes. Não compete ao Tribunal apreciar se o despedimento era a única medida possível ou se se revelou eficaz para o fim pretendido, designadamente a superação dos desequilíbrios económico-financeiros. Mas deve sindicar a veracidade dos motivos invocados, bem como a existência de uma correspondência entre esses motivos e o despedimento, de modo a verificar se a redução de pessoal através deste despedimento coletivo se mostra justificada”.
Acordam na Formação prevista no artigo 672.º, n.º 3 do Código do Processo Civil junto da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça,
1. Relatório
AA intentou ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, prevista nos artigos 98.º-B e ss. do Código de Processo de Trabalho, contra Ordem dos Médicos Dentistas.
Não tendo sido possível a conciliação, a Ré apresentou articulado a fundamentar o despedimento.
A Autora contestou e deduziu reconvenção, formulando os seguintes pedidos:
“Nestes termos, e nos mais de direito que V. Exa. doutamente suprirá, deve:
a) ser julgada procedente, por provada, a presente ação de impugnação da regularidade e licitude do despedimento e, consequentemente;
(i) ser declarada a ilicitude do despedimento da Trabalhadora;
(ii) ser condenada o Empregador. a reintegrar o Trabalhador., sem prejuízo da sua categoria profissional e antiguidade nos termos do artigo 389.º n.º 1 alínea b) do CT, sem prejuízo da opção pela indemnização por parte da Autora, nos termos do artigo 391.º, n.º 1 do CT;
(iii) ser condenado o Empregador a pagar à Trabalhadora as retribuições que deixou de auferir desde 1 de abril de 2021 até ao trânsito em julgado da sentença, sem prejuízo do disposto no art. 98º-N, nºs 1 a 3, do CPT acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal, contados da data de vencimento de cada uma das prestações e até ao efetivo e integral pagamento, a liquidar em execução de sentença;
(iv) Ser condenado o Empregador pagar a Autora todas as quantias pecuniárias que se vencerem na pendência da ação relativas a férias, subsídio de férias e de Natal, acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal, contados da data de vencimento de cada uma das prestações e até ao efetivo e integral pagamento, a liquidar em execução de sentença;
b) Ser considerada por não provada e improcedente a oposição do empregador à reintegração;
c) Ou subsidiariamente em relação ao pedido formulado em b), o empregador ser condenado no pagamento da quantia correspondente a 60 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade ou fração a título de indemnização em substituição de reintegração a pedido do empregador;
Ser o pedido reconvencional julgado procedente, por provado, e em consequência:
d) Ser condenado o Empregador a pagar à Trabalhadora o montante de € 25.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Caso assim não se entenda e seja considerado lícito o despedimento, o que por mero dever de patrocínio se admite, deve o empregador subsidiariamente no caso de improcedência dos pedidos formulados em a) b) c) e d):
a) Declarar a validade e eficácia da Adenda contratual de 25 de outubro de 2019 na parte em que foi acordada um valor sujeito a termo suspensivo inicial e dependente da extinção da relação de trabalho;
b) Pagar à Trabalhadora a quantia de 241.093,20 (duzentos e quarenta e um mil, noventa e três euros e vinte cêntimos) correspondente ao valor acordado nos termos da Adenda Contratual de 25 de outubro de 2019 que se encontrava sujeito a termo suspensivo inicial de extinção da relação de trabalho;
c) Pagar à Trabalhadora as quantias devolvidas por esta no dia 05 de abril de 2021 no montante líquido de € 65.587,97 (sessenta e cinco mil quinhentos e oitenta e sete euros e nove e sete cêntimos) acrescido de juros vencidos e vincendos à taxa legal desde a data da citação do empregador para a presente ação”.
A Ré respondeu ao articulado da Autora, propugnando pela sua absolvição.
Foi proferido despacho saneador e realizada a audiência de julgamento.
Em 11.01.2024, foi proferida sentença, que julgou a ação de impugnação de despedimento improcedente e “a reconvenção apenas procedente quanto ao pedido de condenação da R “ORDEM DOS MÉDICOS DENTISTAS.” a pagar à trabalhadora AA as quantias devolvidas por esta no dia 05 de abril de 2021 no montante líquido de € 65.587,97 (sessenta e cinco mil quinhentos e oitenta e sete euros e nove e sete cêntimos), absolvendo a R de todos os demais pedidos contra si formulados, quantia esta acrescida de juros, contados à taxa supletiva legal desde o eventual trânsito em julgado desta decisão”.
Na sentença foi fixado o valor da causa em € 331.681,17.
A Autora interpôs recurso de apelação.
Por acórdão de 24.02.2025, os Juízes do Tribunal da Relação acordaram em julgar o recurso parcialmente procedente e, em consequência, revogar a decisão relativa ao valor da ação, fixando-se o mesmo em € 185.141,38, e em manter no mais a sentença recorrida.
A Autora veio interpor recurso de revista.
O recurso é interposto como Revista Excecional e subsidiariamente como revista nos termos gerais, quanto à fixação do valor da ação pelo Tribunal da Relação.
O recurso excecional é interposto com fundamento no disposto no artigo 672.º, n.º 1, alíneas a) e c) do Código de Processo Civil (questão com relevância jurídica e contradição de acórdãos1).
A Ré contra-alegou.
Relativamente ao recurso de revista excecional o recurso apresenta as seguintes Conclusões (negrito no original):
1. A admissão do presente Recurso de Revista Excecional justifica-se ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC por se verificar que o Acórdão proferido nestes autos se encontra em contradição com o Acórdão proferido pelo STJ de 11-12-2019, proc. n.º 7031/16.7T8FNC.L1.S1 (António Leones Dantas), quanto à aplicação do teste de proporcionalidade e racionalidade na adoção da medida de despedimento.
2. Em ambos os casos o núcleo factual relevante assenta na redução do número de trabalhadores ao serviço do empregador através do despedimento com justa causa objetiva (sendo para o efeito irrelevante – atenta a identidade nos fundamentos, decorrente do artigo 367.º, n.º 2, do CT – a circunstância de estar em causa um despedimento coletivo ou por extinção de posto de trabalho), assente na redução de receitas.
3. A contradição resulta da circunstância de, no Acórdão Recorrido, diferentemente do que sucede no Acórdão fundamento (Acórdão proferido pelo STJ de 11-12-2019, proc. n.º 7031/16.7T8FNC.L1.S1 (António Leones Dantas)), não se ter procedido a uma efetiva valoração da situação económica do empregador, apurando se esta assumia uma gravidade proporcional ao despedimento.
4. Caso o Acórdão Recorrido tivesse acompanhado a interpretação do Acórdão fundamento (Acórdão proferido pelo STJ a 11-12-2019, proc. n.º 7031/16.7T8FNC.L1.S1 (António Leones Dantas)), ter-se-ia de concluir pela ilicitude do despedimento, na medida em que não bastaria falar em redução das receitas para se concluir pela licitude da cessação contratual, importando também demonstrar que essa redução causava um prejuízo significativo à OMD e punha em causa de forma relevante o equilíbrio do negócio.
5. É clara a contradição, na medida em que: no Acórdão fundamento (Acórdão proferido pelo STJ de 11-12-2019, proc. n.º 7031/16.7T8FNC.L1.S1 (António Leones Dantas)) não basta uma mera redução de custos motivada na redução de vendas para constituir motivo de extinção de postos de trabalho; no Acórdão Recorrido um desequilíbrio conjuntural constitui motivo suficiente.
6. A admissão do presente recurso de revista excecional justifica-se, também, ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC, por se verificar que o Acórdão proferido nestes autos se encontra em contradição com o Acórdão proferido pelo STJ de 13-12-2023, proc. n.º 19328/16.1T8PRT.L1.S1 (Ramalho Pinto), quanto ao nexo causal entre a medida de despedimento e a situação-base que fundamentou a sua adoção.
7. Em ambos os casos o núcleo factual relevante assentava na redução do número de trabalhadores ao serviço do empregador através do despedimento com justa causa objetiva (sendo para o efeito irrelevante – atenta a identidade nos fundamentos, decorrente do artigo 367.º, n.º 2, do CT – a circunstância de estar em causa um despedimento coletivo ou por extinção de posto de trabalho), motivada pela alegada necessidade de redução da despesa com pessoal, sendo que, em ambos os casos, no momento em que se profere a decisão de despedimento já haviam sido assegurados (ou estavam praticamente assegurados) os objetivos visados pelo despedimento.
8. A contradição entre os Acórdãos (Acórdão Recorrido e Acórdão proferido pelo STJ de 13-12-2023, proc. n.º 19328/16.1T8PRT.L1.S1 (Ramalho Pinto)) resulta da circunstância de, na apreciação do nexo causal entre a medida de despedimento e a situação-base, não se ter em consideração a circunstância de, no Acórdão fundamento se ter sustentado que não há nexo causal quando, no momento do despedimento, o empregador já assegurou o objetivo que, alegadamente, seria concretizado com o despedimento, e, no Acórdão recorrido, se ter sustentado estar presente tal nexo causal muito embora, no momento em que foi decidido o despedimento, já não se verificar a realização do objetivo alegadamente prosseguido pela OMD.
9. Caso o Acórdão Recorrido tivesse acompanhado a interpretação do Acórdão fundamento (Acórdão proferido pelo STJ de 13-12-2023, (Ramalho Pinto)) ter-se-ia de concluir pela ilicitude do despedimento, por falta de nexo causal entre o motivo invocado para o despedimento e o despedimento, pois tendo o empregador invocado, como fundamento do despedimento, o objetivo de “desagravar os resultados negativos registados e recuperar de forma estável o equilíbrio económico-financeiro”, já havia assegurado esse objetivo no momento em que foi efetuado o despedimento, porquanto os elementos que haviam gerado os resultados negativos já tinham sido eliminados, o que se refletia na significativa recuperação verificada (de forma estável) nos últimos seis meses de 2020 – tudo cfr. pontos 12, 17, 34, 61 e 62 dos factos provados.
10. Ambos os Acórdão fundamento (Acórdão proferido pelo STJ de 11-12-2019, proc. n.º 7031/16.7T8FNC.L1.S1 (António Leones Dantas);Acórdão proferido pelo STJ de 13-12-2023, proc. n.º 19328/16.1T8PRT.L1.S1 (Ramalho Pinto)) foram proferidos ao abrigo do mesmo enquadramento normativo, estando em causa a interpretação do artigo 359.º do CT (ex vi artigo 367.º, n.º 2, do CT quando à extinção do posto de trabalho).
11. A decisão presente no Acórdão Recorrido quanto às questões de direito identificadas, e em relação às quais se considera haver contradição de julgados, não resultou da adesão a qualquer acórdão de uniformização sobre a questão em causa.
12. O Acórdão Recorrido está em contradição com os Acórdãos fundamento (Acórdão proferido pelo STJ de 11-12-2019, proc. n.º 7031/16.7T8FNC.L1.S1 (António Leones Dantas); Acórdão proferido pelo STJ de 13-12-2023, (Ramalho Pinto)),já transitados em julgado, proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, razão pela qual devem ser admitidos para efeitos do disposto no artigo 672.º, n.º 1, al. c) do CPC.
13. A admissão do presente recurso de revista excecional justifica-se, também, nos termos do disposto no artigo 672.º, n.º 1, al. a) do CPC, sendo claramente necessária para uma melhor aplicação do direito a apreciação, pela sua relevância jurídica, da questão de saber se pode um motivo meramente conjuntural, mais concretamente um “desequilíbrio conjuntural” relacionado com aspetos externos à organização (empresa ou outra estrutura), transitório e pontual, ser considerado como fundamento do despedimento por extinção de posto de trabalho e qual o impacto da sua valoração para efeitos de verificação dos requisitos de licitude do despedimento coletivo e por extinção do posto de trabalho.
14. A delimitação dos motivos que podem, licitamente, fundamentar a decisão de despedimento é matéria de especial complexidade, atenta a evolução jurisprudencial e legal que se tem verificado nessa matéria, sendo que a alusão a um novo conjunto de “motivos” de despedimento – os conjunturais – vem contribuir para uma maior complexidade no controlo dos fundamentos do despedimento e, ainda, para um incremento da incerteza jurídica quanto à valoração de prejuízos ocasionais e de cariz marcadamente transitório como fundamento para um despedimento (naturalmente, definitivo) de trabalhadores.
15. A resposta à questão colocada assume uma irrefutável dimensão paradigmática para casos futuros, onde a resposta a dar pelo STJ poderá ser utilizada como um referente.
16. O entendimento expresso pelo Acórdão Recorrido tem carater inovador no âmbito do Código do Trabalho (versão de 2003e 2009); a questão é de interesse prático (as empresas e os empregadores têm interesse em saber se variações temporárias de receitas só por si podem fundar uma decisão de extinção de postos de trabalho); a resposta sobre se o controlo da decisão do empregador quanto à extinção de posto de trabalho pelos tribunais em casos equivalentes pode dispensar um nexo de causalidade com a situação concreta da empresa ou do empregador.
17. O Acórdão Recorrido traz uma inovação com especial interesse para a aplicação do direito. A decisão recorrida torna lícito reduzir postos de trabalho pela mera circunstância de haver uma variação negativa na situação econômica financeira sem que isso tenha efeitos sobre a situação da empresa ou apenas porque um trabalhador é caro numa organização.
18. A decisão recorrida anda a arrepio da construção jurisprudencial e doutrinária em torno da questão do controlo jurisdicional dos fundamentos de supressão de postos de trabalho e contende com o princípio constitucional da segurança no emprego consagrado no artigo 53.º da Lei Fundamental.
Nas instâncias deu-se como provada a seguinte matéria de facto (transcreve-se apenas o segmento relevante para a apreciação das questões suscitadas nesta revista excecional):
11. Em Conselho Diretivo da OMD em 15 de dezembro de 2020 foi deliberado o seguinte:
“1. Reestruturação do Departamento Jurídico da OMD: No âmbito da redefinição da estratégia gestionária da OMD, foi apresentada a proposta de reestruturação dos serviços jurídicos da OMD, tendo em conta os resultados e a situação económico-financeira da OMD, bem como a estrutura atualmente existente. A atual estrutura do Departamento Jurídico comporta excessivos custos para a OMD e não responde às necessidades desta que requer uma assessoria mais polivalente e otimizada. O... do Conselho Diretivo informou que manteve já contactos com a ... do Departamento Jurídico nesse sentido, no entanto, os mesmos revelaram-se infrutíferos. Obtido o necessário aconselhamento legal, a reestruturação, nesta fase, passaria por extinguir o posto de trabalho da ... do Departamento Jurídico da OMD (Dr.ª BB), bem como denunciar o contrato de prestação de serviços, em regime de avença, de um outro colaborador da OMD (Dr. CC). Obtidos os esclarecimentos que os membros do Conselho Diretivo consideraram necessários junto da A..., SP RL, entre outros, relativamente aos atos associados ao procedimento de extinção, aos valores de indemnização aplicáveis, à morosidade de um eventual processo judicial e à possibilidade de fazer cessar o contrato por acordo contra o pagamento de uma indemnização, foi aprovado por unanimidade dos membros presentes o despedimento por extinção do posto de trabalho da ... do Departamento Jurídico da OMD, Dra. BB, bem como a denúncia do contrato de prestação de serviços, em regime de avença, do Dr. CC, tendo ficado mandatado o ... do Conselho Diretivo para executar as deliberações aprovadas, designadamente para estabelecer os necessários contactos com os visados, para negociar condições e termos de saída, apresentar propostas e manter em geral a negociação com vista à obtenção daquele fim”.
12. A ré remeteu à autora uma carta datada de 21/12/2020 comunicando-lhe que, nos termos dos artigos 367.º e seguintes do Código de Trabalho, tinha a intenção de proceder ao despedimento por extinção do seu posto de trabalho nos termos seguintes:
“A. Da necessidade de extinguir o posto de trabalho, motivos justificativos e seção ou unidade equivalente a que respeita:
A Ordem dos Médicos Dentistas (doravante designada apenas por “Ordem” ou “OMD”) é uma associação pública profissional representativa dos que (…) exercem a profissão de médico dentista, tendo por finalidade regular e supervisionar o acesso à profissão de médico dentista e o seu exercício (…)
O surto do novo Coronavírus (COVID-19) disseminou-se de forma rápida e globalmente, encontrando-se já há vários meses em território português, constituindo uma situação de calamidade ou emergência pública. (...)
Temos, por isso, enfrentado um período em que as atividades económicas e os vários intervenientes no seu desenvolvimento sofreram e continuam a sofrer o impacto do atual contexto a par da necessidade de enfrentarem as demais dificuldades com que já se vinham deparando.
No caso da OMD, constata-se que em 30 de junho de 2020, os prejuízos apresentados em balancete ascendiam a €630.623,57, registando nesse período de resultados acumulados negativos de €664.144,69.
Apesar de algumas oscilações de melhoria sempre em contexto de resultados acumulados negatives e, portanto, sem recuperação para valores positivos, esta tendência tem-se mantido ao longo do segundo semestre de 2020, sendo previsível que o mês de dezembro seja fechado com um valor também negativo a rondar €194.864,30.
Para esta situação contribuíram não só dividas existentes de quotas dos associados da OMD que, em 30 de setembro 2020, ascendiam a €381.630,00, mas também despesas extraordinárias com medidas de apoio aos nossos associados, como a aquisição de máscaras e a sua distribuição que ascenderam, respetivamente, a €170.662,50 e €107.445,29.
Adicionalmente, entre as medidas de apoio tomadas, a OMD não faturou quotas aos seus associados no segundo trimestre de 2020, medida que se estima ter um impacto de €490.000,00 no seu orçamento.
Os resultados negativos acumulados colocam, naturalmente, forte pressão sobre a necessidade de restabelecer o equilíbrio da situação económico-financeira da OMD.
Com efeito, as mais recentes previsões financeiras da OMD apontam para que o ano de 2020 seja encerrado com um resultado negativo estimado entre € 190.00 e €210 000,00, os quais transitarão para 2021.(…)
Neste contexto foi decidido pela OMD proceder ainda a uma reestruturação ao nível dos recursos humanos através da maximização de recursos com vista a reduzir custos com a estrutura interna como forma de desagravar os resultados negativos registados e recuperar de forma estável o equilíbrio económico-financeiro
No caso do departamento jurídico constata-se que o posto de trabalho correspondente à sua Direção constitui o custo mais elevado em toda a estrutura interna de recursos humanos da OMD
Com efeito, a manutenção do de posto de trabalho em apreço no ano de 2019 ascendeu a um total de €111.709,70 e que em 2020 se estima de €105.752,39, os quais se computam considerando as rubricas salariais associadas (nas quais se incluem os subsídios de ferias e de natal) (…) verifica-se igualmente que é possível proceder à reestruturação do posto de trabalho em causa, assegurando ao mesmo tempo a manutenção da execução das funções atribuídas à Direção do Departamento Jurídico, através de serviços externos que, de resto, já prestam serviços à OMD, e dos restantes departamentos que integram a OMD com competências relacionadas mas autónomas daquele, como é o caso do Conselho Deontológico e de Disciplina.
Com efeito, as entidades externas de prestação de serviços desta natureza não só oferecem serviços especializados de assessoria jurídica nas mais diversas áreas do Direito que se relacionam com a atividade da OMD, como oferecem condições para investir na permanente formação e atualização dos seus recursos humanos, disponibilizando igualmente um serviço de elevada competência técnica e de qualidade, adequado às exigências de rigor e ao permanente acompanhamento da atividade da OMD, com a vantagem de esta poder recorrer aos mesmos consoante as suas necessidades e avaliar os custos associados, nomeadamente, da sua oportunidade.
Acresce que os serviços prestados por via de tais entidades terceiras serão mais alargados relativamente ao leque de funções desempenhadas pela Trabalhadora, permitindo otimizar e rentabilizar a atividade do departamento.
Com efeito, compete atualmente à Direção do Departamento Jurídico a execução nomeadamente das seguintes tarefas: assessorar o Conselho Diretivo no exercício das suas funções, podendo emitir pareceres que este entenda solicitar sobre projetos de diplomas legais em que a OMD seja diretamente interessada e tem necessariamente de ser ouvida, bem como sobre diplomas legais vigentes, e sobre a elaboração de regulamentos a submeter ao Conselho Geral.
Assim, as entidades terceiras que prestam atualmente serviços à OMD ou que esta entenda contratar de acordo com as suas necessidades, a par dos serviços internos de assessoria existentes e que se manterão, garantem, não só a execução daquelas funções mas também de valências técnicas alargadas em todo o conjunto de outros aspetos jurídicos associados à atividade da OMD, nomeadamente, de direito administrativo, laboral, fiscal e contratual.
Acresce que, nos termos do Estatuto da OMD, também o Conselho Deontológico e de Disciplina da OMD dispõe de competências que coincidem com algumas das funções que até recentemente foram sendo desenvolvidas pela Direção Jurídica, tal como a elaboração de pareceres que lhe sejam cometidos ou a elaboração de normas, deliberações, resoluções e recomendações de natureza ética ou deontológica ou propostas de alteração para aprovação pelo Conselho Geral. Além disso, o referido Conselho conta já com uma assessoria jurídica externa gerida de forma autónoma relativamente ao Departamento Jurídico. Paralelamente, a OMD conta ainda com assessoria a nível interno na resolução de questões laborais, cujo custo ascende a uma verba de €20.000,00/ano adicionalmente ao custo associado à manutenção do posto de trabalho da Direção do Departamento Jurídico.
Em suma, a reestruturação perspetivada permitirá a flexibilização e otimização dos custos associados.
Assim, tal medida de redução de custos no Departamento Jurídico, no conjunto das medidas que têm vindo a ser tomadas, resulta da decisão gestionária da OMD que visa recuperar o equilíbrio orçamental das suas contas e inverter o desequilíbrio económicofinanceiro existente.
B. Da necessidade de despedir o trabalhador afeto ao posto de trabalho a extinguir e a sua categoria profissional, bem como dos critérios para seleção dos trabalhadores a despedir:
O processo de reestruturação que a OMD visa implementar passa pela extinção da função de Diretor Departamento Jurídico, único posto existente Ordem, inexistindo qualquer outro mesmo conteúdo funcional.
Conjugados todos os aspetos acima melhor descritos com a inerente e necessária adoção do modelo organizativo descrito, a reestruturação levada a efeito implica extinção do posto trabalho "Diretor do Departamento Jurídico”, na medida em que o exercício das funções integradas na estrutura organizativa da OMD se torna secundário desnecessário.
Consequentemente, verifica-se o esvaziamento das referidas funções, distribuindo-se residualmente as mesmas pelos assessores jurídicos internos e entidades externas, sem qualquer perda de qualidade e eficácia do respetivo desempenho.
Assim, e perante o cenário atual, não se justifica a manutenção autónoma do posto de trabalho de Diretora do Departamento Jurídico, cujas funções são aquelas que se deixaram descritas acima (….)
Não existe na OMD outro cargo compatível com as suas funções, nem com a sua categoria profissional (…).
Inexistem, igualmente, na OMD contratos de trabalho a termo para tarefas correspondentes ao posto de trabalho que se pretende extinguir (…).
Assim, e verificados os pressupostos previstos nos artigos 367.º e seguintes do Código do Trabalho, a OMD comunica a V. Exa. a intenção de proceder à extinção do seu posto de trabalho (…)”.
14. A Autora remeteu à Ré uma carta datada de 28 de dezembro de 2020, informando que solicitou a intervenção da Autoridade para as Condições do Trabalho (adiante, “ACT”), alegando fazê-lo “nos termos e para os fins previstos no n.º 2 do art. 370.º do CT, nas alíneas c) e d) do n.º 1 e no n.º 2 do art. 368.º do Código do Trabalho, e artigo 29.º, do Código do Trabalho” – cfr. carta cuja cópia se encontra junta aos autos em 26/5/2021.
15. A Autora remeteu à ré uma carta datada de 4 de janeiro de 2021, cuja cópia se encontra junta pela autora e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, expressando a sua oposição ao comunicado despedimento por alegada necessidade de extinguir o seu contrato de trabalho, na qual fez constar, designadamente, que: “ (…) a intenção que V. Exa. me comunica não é possível que ocorra, ao menos, pela forma que pretenderia: a da extinção do posto de trabalho, conforme a orgânica estrutural da OMD em respeito pela Lei aplicável. (…) não está na disponibilidade dos órgãos da Ordem proceder à extinção de um posto de trabalho correspondente à chefia do Departamento, porque esta ... é a única trabalhadora, titulada, ..., deste departamento e com maior antiguidade (…)
III- Da existência de condutas consubstanciadoras de assédio que culminaram na intenção de despedimento por extinção do posto de trabalho (…)
Nos últimos 6 meses de exercício de funções com o novo Bastonário verificou-se que:
a) A Diretora do departamento jurídico encontra-se impedida do acesso à decisão efetiva do coletivo, tendo de produzir atos administrativos por presunção ou com base em relatos de membros individuais do Órgão, posto que não tem acesso a nenhum elemento oficial que resulte das reuniões do executivo
b) a trabalhadora é por diversas vezes, verbalmente ou por escrito, remetida para a consulta do site público da OMD, caso a diretora pretenda estudar ou estar a par de procedimentos que atualmente lhe são exigidos adivinhar,
c) não existiu até à data uma única reunião, para conhecimento, integração ou planeamento do trabalho jurídico, por manifesta impossibilidade de agenda do dirigente nos últimos seis meses após a sua eleição:
d) a intermediação das suas funções de chefia jurídica, mas também de todo o departamento, é realizada unicamente pelo secretariado administrativo sem qualificações para o efeito;
e) foi mesmo alvo da acusação explicita e sem fundamento (como de imediato provado) sobre formas de funcionamento do departamento, recebendo perguntas que se apresentam insólitas em 16 anos de prática, por si só reveladoras do profundo desconhecimento das funções e da atividade da Ordem no plano da atividade jurídico administrativa, por parte dos seus autores;
f) foram realizados pedidos notoriamente desproporcionais às tarefas pretendidas, associando-lhes respostas de teor politico/ ideológico dirigidas à trabalhadora; na permanente confusão entre a natureza contratual profissional da Diretora do departamento jurídico e juízos de comparabilidade e acusação de anteriores Órgãos de direção;
g) foi esta ... e ..., sujeita a um muito sério sofrimento ético, por continuadamente desconhecer a atribuição de dossiers do executivo, pelo bastonário, a seus colegas de profissão, enquanto a diretora recebia e solicitava informação e, bem assim, fornecia pareceres detalhados sobre a necessidade da Ordem agir no tratamento urgente do contencioso (…).
Tudo demonstra que o propósito do Presidente do Conselho Diretivo da OMD foi, desde a primeira hora (tomada de posse) e independentemente dos fundamentos económico financeiros despedir a ... do Departamento Jurídico (…).
IV – Da inexistência dos fundamentos invocados para a extinção do posto de trabalho.”
16. A ACT emitiu o seu relatório, datado de 5 de janeiro de 2021, cuja cópia se encontra junta aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, tendo o mesmo sido rececionado pela Ré, no dia 7 de janeiro de 2021, no qual concluiu “terem sido observados pelo empregador os requisitos previstos na alínea c) e d) do n.º 1, já que no n.º 2 do art. 368.º do Código do Trabalho, ou seja, na concretização do posto de trabalho a extinguir, a categoria profissional da trabalhadora em causa, dado que é a única existente na referida unidade, pelo que não existe a obrigatoriedade de observar a ordem de critérios relevantes e não discriminatórios presentes nas varias alíneas do mesmo número e artigo”.
17. Em 18 de janeiro de 2021, a Empregadora remeteu à Autora, por correio registado com aviso de receção, a decisão de despedimento por extinção do posto de trabalho, cuja cópia se encontra junta pela autora e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
18. Na mesma data em que a decisão foi remetida à Autora, a Ré procedeu igualmente à comunicação à ACT.
19. Além de notificação por via postal realizada nos termos descritos anteriormente e que a Autora recebeu apenas em 25 de janeiro de 2021, a decisão de despedimento por extinção do seu posto de trabalho foi-lhe igualmente remetida através de correio eletrónico, em 20 de janeiro de 2021, tendo o mesmo sido recebido nesse mesmo dia.
20. A Ré procedeu a duas transferências bancárias para a conta titulada em nome da Autora, sob o número PT50 ...46, transferências essas datadas de 30/3/2021 (cfr docs 65 e 66 juntos pela R com o articulado motivador) no valor global de €65.586,97.
21. A autora devolveu à ré a quantia total no dia 5 de abril de 2021.
22. À data do procedimento em apreço nestes autos, a Autora auferia mensalmente os seguintes valores:
a) € 4.867,44, a título de retribuição base;
b) € 79,20, a título de diuturnidades;
c) € 926,69, a título de isenção de horário de trabalho;
d) € 7,00 diários, a título de subsídio de alimentação
23. A Ré contava com cerca de 10919 associados, cujo valor da quota individual se cifra em € 45,00, sendo que por deliberação do Conselho Diretivo, de 17 de março de 2020, foi decidido proceder à isenção do respetivo pagamento para o segundo trimestre de 2020.
24. À data da comunicação da Decisão de despedimento a ré apurou os seguintes créditos, da autora, referentes a:
a) Retribuição de férias vencidas e não gozadas: € 15.180,30;
b) Subsídio de férias vencidas em 1 de janeiro de 2021: € 5.873,33;
c) Proporcionais de retribuição de férias: € 1.528,67;
d) Proporcionais de subsídio de férias: € 1.528,67;
e) Proporcionais de subsídio de Natal: € 1.287,48;
f) Créditos de Formação: € 3.815,50.
25. Quanto à retribuição de férias vencidas e não gozadas foi apurado um montante total de € 15.180,30 correspondente a 56 dias uteis de férias apurados por gozar.
26. Por correio eletrónico datado de 25 de janeiro de 2021, a Autora comunicou à Ré que “Na carta hoje rececionada é imposto unilateralmente o gozo de férias até 5 de abril de 2021 e correspondente ao período de pré-aviso fixado na lei. Contudo as férias que me são impostas excedem o número de férias a que tenho direito, pelo que solicito que me informem o cálculo dos dias férias efetuado. Em qualquer caso iniciarei hoje o período de férias que me seja devido, aguardando a indicação referida.”
27. Nessa sequência, revistos os registos internos da Ré quanto ao gozo das férias da Autora, a ré apurou um total de 48 dias úteis de férias vencidas e não gozadas.
28. Desta retificação foi a Autora informada por correio eletrónico por si recebido em 13 de fevereiro de 2021.
28. A Autora gozou férias nas seguintes datas:
a. de 26 a 31 de janeiro de 2021 (inclusive);
b. de 01 a 28 de fevereiro de 2021;
c. de 1 a 31 de março de 2021
d. 1 e 5 de abril de 2021.
29. A autora interpôs uma ação administrativa contra a Ré, tendo em vista impugnar a deliberação mencionada em 11., a qual corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal do ..., Unidade Orgânica 1, sob o número ....
30. A R Ordem dos Médicos Dentistas (doravante designada apenas por “Ordem” ou “OMD”) é uma associação pública profissional representativa das pessoas que exercem a profissão de médico dentista, tendo por finalidade regular e supervisionar o acesso à profissão de médico dentista e o seu exercício.
31. O surto do novo Coronavírus (COVID-19) disseminou-se de forma rápida e globalmente, encontrando-se já há vários meses em território português, constituindo uma situação de calamidade ou emergência pública.
32. Em 30 de junho de 2020, a R apresentou um resultado contabilístico intercalar negativo de €664.144,76, para os primeiros 6 meses do ano.
33. O resultado líquido do exercício dos 12 meses do ano de 2020 da R foi de € 215.600,00 negativos.
34. Para esta situação contribuíram as imparidades de dividas a receber que, em 30 de junho 2020, ascendiam a €359.013,06, mas também despesas extraordinárias com medidas de apoio aos nossos associados, como a aquisição de máscaras e a sua distribuição que ascenderam, respetivamente, a €170.662,50 e €107.445,30, adicionalmente, entre as medidas de apoio tomadas, a OMD não faturou quotas aos seus associados no segundo trimestre de 2020, medida que teve um impacto de € 418.325,00 no seu orçamento.
35. O posto de trabalho da A correspondente à direção do departamento jurídico da R era o custo mais elevado de todos os trabalhadores com contrato de trabalho em vigor com a R, em toda a estrutura interna de recursos humanos da OMD.
36. A manutenção do de posto de trabalho da A no ano de 2019 ascendeu a um total de €113.021,07, da seguinte forma (…)
37. Após o vertido em 17. R continuou a recorrer a serviços jurídicos externos e também a serviços administrativos integrados nos restantes departamentos da OMD, como é o caso do Conselho Deontológico e de Disciplina.
38. As entidades externas de prestação de serviços jurídicos ofereciam serviços especializados de assessoria jurídica nas diversas áreas do Direito, sendo que a R pode recorrer aos mesmos consoante as suas necessidades e avaliar os custos associados, nomeadamente, da sua oportunidade.
39. Os serviços prestados por via de tais entidades terceiras incluem patrocínio forense e assessoria em direito laboral que não era prestado pela A.
40. A R pede a estas entidades terceiras pareceres e assessoria nas áreas de direito administrativo, laboral, fiscal e contratual.
41. O Conselho Deontológico e de Disciplina da OMD elabora pareceres que lhe sejam cometidos, elabora normas, deliberações, resoluções e recomendações de natureza ética ou deontológica, e faz propostas de alteração para aprovação pelo Conselho Geral.
42. A OMD tem assessoria a nível interno na resolução de questões laborais, cujo custo ascende a valor não concretamente apurado (…)
43. No sentido de reduzir o impacto dos resultados negativos registados, como referido em 30. a 34. supra, a Ré tomou resoluções ao nível do seu funcionamento, designadamente as seguintes medidas/restrições financeiras:
a) As reuniões do Conselho Diretivo deixaram de se realizar em salas de hotéis, tendo passado a realizar-se na sede da OMD;
b) As despesas de alojamento dos membros da OMD, deslocados no exercício das suas funções, passaram a ter um limite máximo de €100,00 por dia;
c) As despesas de refeições dos membros da OMD, no exercício das suas funções passaram a ter por limite o valor de €25,00;
d) A adjudicação de serviços externos passou a depender de consulta prévia de, pelo menos, três entidades;
e) Na maioria das rubricas de despesa da OMD (estadas, viagens) as novas regras implementadas permitiram uma redução de custo para €234.500,00, o que representou um corte relativamente aos valores gastos nos últimos dois anos.
f) Também as rendas e alugueres foram revistas para não ultrapassarem os €362.000,00, tendo sofrido um corte em relação à média dos últimos dois.
44. A Autora é a única trabalhadora da Ré cujo conteúdo funcional do posto de trabalho consiste na função de ...do Departamento Jurídico.
45. A A é a única jurista que exercia funções na Ré e com quem esta havia firmado contrato de trabalho, aquando do referido em 5. e até à extinção do posto de trabalho da A pela R.
46. Aquando do referido em 5. e até à extinção do posto de trabalho da A pela R, esta era ....
47. Aquando do referido em 5. e até à extinção do posto de trabalho da A pela R, o Departamento Jurídico era integrado pelos seguintes trabalhadores da R: a A e DD, que há 19 anos presta serviços de apoio administrativo nesse departamento e que, a dada altura concluiu a licenciatura em ..., continuando após a sua licenciatura até à atualidade a desempenhar as mesmas funções, tendo após a licenciatura passado a ter a categoria de técnica de apoio jurídico, sendo sempre a A que fazia os pareceres jurídicos e propostas de decisão de órgãos da R (apesar da A poder contar com a colaboração de DD no preenchimento de minutas para esse efeito).
48. Após o procedimento de extinção de posto de trabalho da A, a R manteve o Departamento Interno de Serviços Jurídicos na sua orgânica.
49. A R questionou a A sobre o funcionamento do Departamento jurídico.
50. A A dirigiu a seguinte mensagem de correio eletrónico ao Sr Bastonário e aos Conselheiros do Conselho Diretivo da Ré, em 11 de janeiro de 2021, - cfr. Documento n.º 18 junto com o articulado motivador e aqui se dá por integralmente reproduzido – e no qual se pode ler:
“Exmo. Bastonário,
Exmos. Senhores Conselheiros do Conselho Diretivo da OMD,
Tomei conhecimento da dispensa do Dr. CC, ... cujo o trabalho estava afeto ao Departamento da Ordem que chefio.
Esta decisão, que cabe aos órgãos da Ordem, deveria, no mínimo, ser-me previamente comunicada. Contudo, tal conduta omissiva não me surpreende, porquanto estamos perante mais um reflexo da afronta sistemática à minha dignidade profissional enquanto diretora do departamento.
Sobretudo, estando V. Exas. cientes que não existe para além de mim própria qualquer outro trabalhador / ... afeto ao departamento com funções de apoio aos órgãos executivos, entre os quais o Conselho Diretivo, o que demonstra a intenção inequívoca de substituir todas as pessoas do Departamento Jurídico da Ordem por motivos subjetivos e não objetivos, pois a Ordem não pode ficar, materialmente e por imposição da lei, sem serviços jurídicos.
O departamento encontra-se, diante desta conduta, de forma consciente e incorreta, a muitos níveis, a ser desnatado, esvaziado, num claro prejuízo para o funcionamento e organização dos corpos funcionais da OMD, e sem que se atenda uma consulta interna da direção dos serviços, aliás, numa clara ultrapassagem desta direção técnica estatutária.
Esta uma perseguição pessoal revela-se no desprezo pelas funções exercidas e que consubstancia em mais uma um comportamento assediante para com a Diretora do Gabinete Jurídico.
Esta conduta é ilícita, ilegal e moralmente reprovável, tanto mais que a Ordem dos Médicos Dentistas é uma Ordem Profissional cujos órgãos devem prosseguir o interesse público e respeitar a legalidade.”
51. O tema da adenda ao contrato de trabalho da Autora, sua eventual revogação, era um tema político da Ré, sendo do conhecimento geral e da classe, tendo sido objeto da campanha eleitoral que decorreu, embora tenha sido questão residual e não central.
52. Ocorreram reuniões entre o Sr. Bastonário da R e a A, estando presentes outras pessoas, em número concretamente não apurado, desde julho de 2020 e até à formalização da extinção do posto de trabalho da A.
53. A Autora, em finais de setembro de 2020, inícios de outubro desse ano, foi contactada por mandatários do Sr. Bastonário da R, advogados, no sentido de encontrar uma solução extra judicial com vista a pôr termo ao contrato de trabalho da Autora, reduzindo os custos financeiros com o posto de trabalho da Autora.
54. O Sr. Bastonário chegou a trocar mensagens escritas também por correio eletrónico e conferências telefónicas ou por outros meios à distância, para além de contactos pessoais, reuniões e contactos telefónicos com a A, para tratar de assuntos da R.
55. A expressão “Dra. BB a postura desta Ordem mudou” consta do email remetido à Autora por um membro do Conselho Diretivo da Ré, datado de 12/11/2020, junto como doc 5 com a contestação da A e que aqui se tem por integralmente reproduzido, e foi remetida em resposta às comunicações da Autora que constam desse mesmo documento 5 e que aqui se têm igualmente por reproduzidas.
(…)
58. No site https://www.base.gov.pt/, no contrato aí inscrito como tendo sido celebrado pela R a 20.05.2021, em que é Adjudicatário S..., SP RL, com o preço de € 19.900,00 e com a menção “Prestação de serviços de patrocínio judiciário - contencioso administrativo”, e no contrato aí inscrito como celebrado a 05.02.2021, em que é Adjudicatário A..., SP RL, com o preço de € 15.000,00 e a menção “PROCEDIMENTO DE CONTRATAÇÃO PÚBLICA PARA CELEBRAÇÃO DO CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS JURIDICOS NO ÂMBITO DO REGIME JURÍDICO DA PROTEÇÃO RADIOLÓGICA, APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º108/2018, DE 3 DE DEZEMBRO” consta na fundamentação para recurso ao ajuste direito, “ausência de recursos próprios.”
57. No ano de 2020 a OMD teve receitas de € 1960.870,634.
58. No ano de 2020 foi constituída provisão, que foi inscrita na contabilidade da R, como passivo, no valor de € 16.869,00, que tem a designação de “Provisão Dr.ª BB”, que não implicou disponibilidade monetária pela R, não sendo uma divida, tendo por base a incerteza e probabilidade de um evento.
59. No ano de 2019, foi constituída provisão com a mesma inscrição no valor de € 217.541,00.
60. Do relatório e Contas de 2020 da R consta:
“Em 2019, na sequência de uma alteração ao contrato de trabalho da Diretora do Departamento Jurídico da OMD, foi registada uma provisão para fazer face a uma obrigação decorrente dessa alteração. Em 2020 foi atualizado o montante da provisão.”
61. No ano de 2020 a R teve menores receitas em consequência, sobretudo, da não cobrança de quotas no 2.º trimestre de 2020 e do facto de ter havido redução acentuada dos rendimentos suplementares com organização de Congressos e Patrocínios.
62. A OMD a 31 de dezembro de 2020 tinha inscrito na rúbrica contabilística “caixa e Depósitos à Ordem” € 3.161.238, e na rúbrica “Outros Investimentos financeiros, em ativo não corrente”, € 2.577.294,00, tendo assim ativos de liquidez imediata ou quase imediata o total de € 5.738.532,00.
63. Consta da base de dados https://www.base.gov.pt/, a aquisição de serviços jurídicos a advogados e sociedades de advogados que até 15/6/2021 ascenderam a € 34.900,00.
64. A Autora sofreu perturbação e constrangimento e sentiu-se diminuída na sequência do processo de extinção do posto de trabalho.
Na fundamentação de direito do Acórdão recorrido pode ler-se:
“A autora considera que o seu despedimento foi ilícito por não serem verdadeiros os motivos relativos ao desequilíbrio económico-financeiro invocados pela ré, por inexistir nexo causal e de adequação entre os motivos invocados e o despedimento, por o desequilíbrio económico-financeiro invocado se ter devido a uma decisão voluntária de não realização de receita, por impossibilidade legal de extinção do departamento que a autora dirigia, por não haver impossibilidade prática de subsistência da relação de trabalho, por as funções de assessoria jurídica que desempenhava continuaram a ser exercidas ainda que por prestadores externos, e por estar um causa um despedimento dirigido à sua pessoa e não ao posto de trabalho, estão em causa os fundamentos de ilicitude previstos pelo art.º 381º, al. b) e 384º, al. a), ambos do Código do Trabalho.
Da matéria de facto provada resulta que a ré invocou como fundamento do despedimento a existência de resultados acumulados negativos que em 30 de junho de 2020 ascendiam a € 664.144,69, sendo previsível o fecho do mês de Dezembro de 2020 com um valor ainda negativo a rondar € 194.864,30, situação para a qual teriam contribuído as dívidas de quotas dos associados, despesas extraordinárias com medidas de apoio aos mesmos no contexto do surto de Covid 19, a decisão de, pelo mesmo motivo, não ter faturado quotas aos associados no 2.º trimestre de 2020, havendo a necessidade de reestabelecer o equilíbrio da situação económico-financeira, face à previsão de encerramento do exercício de 2020 com resultados negativo, para o que a ré decidiu proceder a reestruturação dos recursos humanos através da maximização de recursos com vista à redução de custo como forma e desagravar aqueles resultados, tendo optado por extinguir o posto de trabalho correspondente ao custo mais elevado de toda a sua estrutura interna, passando as correspondentes funções a ser asseguradas através de serviços externos, que já lhe prestavam serviços, e dos seus restantes departamentos com competências relacionadas, permitindo a flexibilização e otimização dos custos associados.
Ora, tal como apresentado, o motivo invocado pela ré para a extinção do posto de trabalho da autora subsume-se à reestruturação da atividade produtiva, determinada pelo objetivo de redução de custos face aos resultados negativos do exercício do ano de 2020, o que se subsume ao disposto pelo art.º 359.º, n.º 2, al. b) do CT, relativo aos motivos estruturais.
Importa ter presente que a decisão de reestruturação empresarial que implique extinção de postos de trabalho é uma decisão de gestão que os tribunais podem sindicar em termos muito limitados, como ocorre relativamente ao despedimento coletivo.
A este respeito, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça é unânime na consideração de que a legalidade do despedimento terá de ser aferida segundo os critérios empresariais utilizados pelo empregador, competindo ao julgador unicamente verificar a exatidão ou veracidade dos motivos que foram invocados e a existência de um nexo causal entre esses motivos e o despedimento, por forma a que, segundo juízos de razoabilidade, se possa concluir que aqueles eram idóneos a justificar a decisão de diminuição de pessoal por via do despedimento.
No que especificamente respeita ao despedimento por extinção do posto de trabalho, já o Ac. do STJ de 1/10/2008 perfilhava o entendimento de que, na apreciação da verificação do motivo justificativo da cessação do contrato, as decisões técnicas- económicas ou gestionárias a montante da extinção do posto de trabalho estão cobertas pela liberdade de iniciativa dos órgãos dirigentes da empresa.
Concordamos.
Na verdade, o que caracteriza estas formas de cessação contratual é, essencialmente, a "localização" do motivo e a sua "natureza", distinguindo-as do despedimento com invocação de justa causa, em que o pressuposto material se traduz na verificação de uma justa causa, imputável a título de culpa à pessoa do trabalhador e apurada em processo disciplinar (arts. 353.° e segs. do CT). Nos despedimentos coletivos e por extinção do posto de trabalho o motivo situa-se na área da empresa (é inerente à organização produtiva e exterior às relações de trabalho) e a sua natureza é essencialmente económica.
(…)
Da matéria de facto provada, resulta a demonstração dos fundamentos invocados pela ré para proceder ao despedimento.
Na verdade, ficou provado que em junho de 2020, a ré apresentou um resultado contabilística intercalar negativo de € 664 144,76, tendo o exercício desse ano sido encerrado com um resultado líquido negativo de € 215 600,00, o que confirma a previsão anunciada na comunicação da intenção de extinção do posto de trabalho e na decisão subsequente.
Ficou também provado que no sentido de reduzir o impacto dos resultados negativos registados a ré tomou uma série de outras medidas para além da extinção do posto de trabalho de diretor do departamento jurídico, o que permitiu uma redução de custos em relação aos dois anos anteriores.
Por outro lado, ocorreu uma efetiva reestruturação, designadamente do departamento jurídico já que, tendo continuado a contar com a técnica de apoio jurídico, licenciada em solicitadoria que já antes prestava apoio administrativo no departamento jurídico, a ré passou a contratar a assessoria com entidades externas, que já antes prestavam serviços á ré, sendo que estas oferecem serviços especializados nas diversas áreas do direito, o que lhe permitia recorrer a tais serviços consoantes as necessidades, bem como avaliar a oportunidades dos custos associados, estando incluídas até tarefas não exercidas pela direção do departamento jurídico, como o mandato forense e a assessoria em determinadas áreas relevantes para a atividade da ré, como direito administrativo, laboral, fiscal e contratual que não eram asseguradas por aquela, racionalizando e flexibilizando os custos com o recurso a tais serviços externos, que até 15 de junho de 2021 ascendiam a € 34 900,00.
E não resulta da matéria de facto provada que as funções correspondentes ao posto de trabalho de diretor do departamento jurídico não tenham sido efetivamente externalizadas.
Também ficou demonstrado que o posto de trabalho extinto era o custo mais elevado da ré em toda a sua estrutura interna de recursos humanos tendo, em 2019 tais custos ascendido a € 113 021,07.
Da matéria de facto provada resulta ainda que para o resultado líquido negativo do exercício de 2020 contribuíram as dívidas no valor de € 359 013,06, bem como despesas extraordinárias com medidas de apoio aos associados, durante a pandemia, como a aquisição de máscaras e sua distribuição que ascenderam, respetivamente a € 170 662,50 e € 107 445,30 e ainda a decisão da ré, nesse mesmo contexto, de não faturar quotas aos associados no 2.º trimestre de 2020, o que teve um impacto de € 418 325,00 no seu orçamento.
Ora, considerando o que acima se expôs quanto aos limites da intervenção do tribunal no controlo dos motivos invocados para o despedimento, afigura-se-nos que a extinção do posto de trabalho em causa não merece censura, constituindo medida de racionalização de custos apta a desagravar a situação em que a ré se encontrava no ano de 2020, por permitir, a par com as demais medidas implementas, a redução de custos legitimamente almejada pela ré.
A situação económico-financeira da ré não era de desequilíbrio estrutural, já que a mesma no ano de 2020 teve uma receita de € 1 960 870,634 e que a 31 de dezembro de 2020, tinha ativos de liquidez imediata ou quase imediata de € 5 738 532,00.
Mas, não é disso que se trata na situação dos autos. Trata-se antes de uma situação de desequilíbrio conjuntural que a ré considerou justificar a implementação de medidas tendentes a reduzir os seus custos, não se vislumbrando qualquer motivo relevante para que a reestruturação da organização não possa ser justificada por tal desequilíbrio ainda que meramente conjuntural. De resto, em bom rigor, a opção da ré de empreender a reestruturação, que resulta da matéria de facto ter acontecido, nem tem que ser justificada, pois, podia a ré ter feito a mesma reestruturação, sem que ocorresse qualquer outro motivo que não a decisão gestionária de modificar a sua estrutura.
Diz a autora que a ré não podia proceder eliminação do posto de trabalho do diretor do departamento jurídico porque está legalmente obrigada a ter na sua estrutura o dito departamento nos termos da Lei n.º 124/2015, de 2 de setembro. Contudo, desta não resulta qualquer obrigatoriedade de as Ordens a Profissionais terem um diretor jurídico, mas apenas a previsão da existência de um departamento de serviços jurídico (art.º 70.º da dita Lei), cujo quadro de pessoal quer em termos de quantidade, quer de qualidade, não se encontra definido, e que no caso da ré até se manteve como resulta da matéria de facto, ainda que agora apenas integrado pela técnica de apoio jurídico.
De resto, a referida Lei 124/2015 aprovou a 3.ª alteração ao Estatuto da Ordem dos Médicos Dentistas, conformando-a com a Lei 2/2013 de 10/01 que aprovou o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais, a qual prevê expressamente, no seu art.º 44.º, que as associações públicas profissionais instituem os serviços operacionais e técnicos (sendo o departamento de serviços jurídicos da OMD um serviço de técnico, nos termos do art.º 70.º da Lei 124/2015) necessários para o desempenho das suas atribuições, sem prejuízo da faculdade de externalização de tarefas.
Improcede, pois, o argumento da autora.
Envolvendo tal reestruturação a eliminação do posto de trabalho, a licitude da decisão de despedir apenas depende da sua efetivação e existência de nexo e adequação entre a reestruturação e a cessação do contrato de trabalho, sendo que não compete ao tribunal aferir da natureza de tais medidas enquanto atos de gestão da ré.
E como já vimos tal relação causal e de adequação, no caso dos autos, tem-se por demonstrada.
E é irrelevante, do nosso ponto de vista que, no caso, a decisão de reestruturação e extinção do posto de trabalho tenha resultado da constatação de uma situação económico financeira para a qual contribuíram decisões da ré com impacto na redução da sua receita, pois, como como resulta do acima referido, não compete ao tribunal sindicar as eras decisões de gestão da ré, mesmo que se apresentem como ruinosas. Tal só seria de ponderar se consubstanciasse uma situação de culpa do empregador na criação dos motivos para o despedimento (art.º 368.º, n.º 2, al. a) do CT), o que não tem qualquer sustentação na matéria de facto, pois, a decisão de suportar custos adicionais com o apoio aos associados durante a pandemia e de reduzir as receitas com a cobrança das quotas nesse mesmo período não se pode considerar irrazoável ou imprudente considerando que a ré é uma ordem profissional competindo-lhe, além do mais, zelar pelas condições do exercício da atividade dos seus associados e a defesa dos seus interesses, e o impacto que a pandemia teve, como é público e notório, no exercício da atividade destes enquanto médicos dentistas, que ficaram, ainda que temporariamente, impedidos de a realizar, com inevitáveis impactos negativos nos seus rendimentos. Muito menos se pode considerar que tais decisões da ré serviram apenas para gerar o motivo para o despedimento da autora”.
Face a esta argumentação existirá contradição entre o Acórdão recorrido e, por um lado, o Acórdão proferido pelo STJ de 11-12-2019 no processo n.º 7031/16.7T8FNC.L1.S1 (António Leones Dantas) e, pelo outro, o Acórdão proferido pelo STJ a 13-12-2023 no processo n.º 19328/16.1T8PRT.L1.S1 (Ramalho Pinto)?
Na resposta a esta questão importa atender a que “a oposição entre acórdãos deve ser frontal e não apenas implícita ou pressuposta”2.
Naquele primeiro Acórdão de 11-12-2019 a questão que se colocava era qual o critério do empregador que decidiu encerrar uma das quatro lojas que tinha numa determinada região para a escolha da loja que deveria ser encerrada em concreto. Decidiu-se que o empregador não tinha motivado de forma suficiente e coerente a sua opção: como se pode ler no Acórdão, “[d]esconhece-se se a loja em causa estava a causar prejuízos significativos à operação comercial da Ré naquele mercado, ou se está em causa apenas a menor rentabilidade da mesma e a mera expectativa de manutenção do volume de vendas nas restantes lojas sem os custos da exploração daquela loja”, afirmando-se, igualmente, que “uma mera redução de custos derivados da operação de uma concreta loja, não quantificada, motivada na redução do volume de vendas dessa loja, em dois anos, não pode ser entendida como motivo proporcionalmente adequado ao encerramento dessa loja e aos custos sociais do mesmo derivados, não se tendo demonstrado sequer a dimensão dos prejuízos, a existirem, da operação global nesse mercado derivados do funcionamento dessa loja”. Na verdade, a motivação apresentada pelo empregador não explicava a escolha da loja a encerrar e, por conseguinte, dos postos de trabalho a extinguir.
No caso dos autos temos, pelo contrário, uma situação de desequilíbrio económico-financeiro. Dir-se-á que se trata de algo de conjuntural e o artigo 359.º n.º 2 do Código do Trabalho (aplicável ao despedimento por extinção do posto de trabalho por força da remissão do artigo 367.º, n.º 2 do CT), ao contrário do que dispunha o artigo 16.º da Lei da Cessação do Contrato de Trabalho (Decreto-Lei n.º 69-A/89 de 27 de fevereiro), não fala em motivos conjunturais. Contudo, o desequilíbrio económico-financeiro referido no n.º 2 do artigo 359.º não tem de ser definitivo (aliás o despedimento, quer se trate de despedimento coletivo quer de despedimento por extinção do posto de trabalho, visa pôr termo a tal desequilíbrio, na esperança de que o mesmo seja transitório). Acresce que, mesmo sem qualquer desequilíbrio o despedimento será possível quando haja uma reestruturação da organização produtiva, o que, como adiante desenvolveremos, foi o caso. Procurando o empregador reduzir custos, a escolha do posto de trabalho da Autora como sendo aquele que deveria ser suprimido resulta, desde logo, da circunstância de ser “o custo mais elevado de todos os trabalhadores com contrato de trabalho em vigor com a R, em toda a estrutura interna de recursos humanos” do empregador (facto 35).
Não há, tão-pouco, qualquer oposição entre o Acórdão recorrido e a decisão deste Tribunal no processo n.º 19328/16.1T8PRT.L1.S1. Neste caso, mais uma vez a questão que se colocava era a da verificação do nexo de causalidade entre os motivos invocados pelo banco autor do despedimento e a decisão do mesmo. Constatou-se que “no momento em que foi efetuado o despedimento, o Réu já tinha assegurado o cumprimento até ao final de 2016 dos objetivos previstos no Plano de Recuperação, i.e., a redução do número de colaboradores em 1000 e a redução dos custos operacionais em 150 milhões de euros (excluindo os custos de reestruturação)”, Em suma, os objetivos proclamados na decisão de proceder ao despedimento coletivo já tinham, em rigor, sido alcançados anteriormente. Como o Acórdão refere, “[i]mporta (…) aferir se, no momento escolhido para a realização do despedimento, os mencionados objetivos já se encontravam assegurados”, o que era precisamente o caso com a consequente ilicitude do despedimento.
Ora esse não é, de todo, o caso dos presentes autos. No momento em que se tomou a decisão do despedimento – dezembro de 2020 (factos 11 e 12) – e em que a mesma foi comunicada à Autora (18 de janeiro de 2021, facto 17) o desequilíbrio económico-financeiro era real (facto 33: O resultado líquido do exercício dos 12 meses do ano de 2020 da R foi de € 215.600,00 negativos), ainda que fosse superável. E o despedimento foi uma das medidas de execução da reestruturação planeada. Sublinhe-se que o facto de o empregador não ter faturado quotas aos seus associados no segundo trimestre de 2020, como medida de apoio em razão do COVID (facto 34) não corresponde a qualquer facto culposo por parte deste.
Não existindo, por conseguinte, as oposições invocadas pelo Recorrente e não se justificando a admissibilidade da revista excecional à luz da alínea c) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC, deverá a mesma ser admitida à luz do disposto na alínea a) do mesmo n.º 1 do artigo 672.º do CPC?
O Acórdão recorrido, no excerto da fundamentação que transcrevemos supra invoca expressamente a jurisprudência deste Tribunal nos seguintes termos:
“A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça é unânime na consideração de que a legalidade do despedimento terá de ser aferida segundo os critérios empresariais utilizados pelo empregador, competindo ao julgador unicamente verificar a exatidão ou veracidade dos motivos que foram invocados e a existência de um nexo causal entre esses motivos e o despedimento, por forma a que, segundo juízos de razoabilidade, se possa concluir que aqueles eram idóneos a justificar a decisão de diminuição de pessoal por via do despedimento”.
O que corresponde, por exemplo, ao critério consagrado no Acórdão proferido no processo n.º19328/16.1T8PRT.L1.S1: “O Tribunal deve respeitar os critérios de gestão da empresa, na medida em que sejam razoáveis e consequentes. Não compete ao Tribunal apreciar se o despedimento era a única medida possível ou se se revelou eficaz para o fim pretendido, designadamente a superação dos desequilíbrios económico-financeiros. Mas deve sindicar a veracidade dos motivos invocados, bem como a existência de uma correspondência entre esses motivos e o despedimento, de modo a verificar se a redução de pessoal através deste despedimento coletivo se mostra justificada”.
A decisão agora recorrida limita-se, em suma, a seguir uma orientação jurisprudencial largamente dominante não se vislumbrando, pois, que seja “claramente necessária” uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça nesta sede para uma melhor aplicação do direito.
Decisão: Acorda-se em não admitir a presente revista excecional
Custas pelo Recorrente
Lisboa, 25 de junho de 2025
Júlio Manuel Vieira Gomes (Relator)
José Eduardo Sapateiro
Mário Belo Morgado
_____________________________________________
2. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, 6.ª ed. Atualizada, Almedina, Coimbra, 2020, p. 439.↩︎