RECURSO DE REVISTA EXCECIONAL
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Sumário


Tendo o Recorrente interposto uma revista excecional e tendo o Relator decidido que existia “dupla conformidade” das decisões das instâncias, em despacho que não foi objeto de qualquer reclamação, não existe omissão de pronúncia por parte da Formação prevista no artigo 672.º n.º 3 do CPC, Formação que tem a competência de decidir da verificação dos pressupostos referidos no n.º 1 do artigo 672.º, ao não convolar o recurso, nem ao não apresentar novamente o recurso ao Relator o qual já havia procedido ao exame preliminar mencionado no n.º 5 do artigo 672.º do CPC.

Texto Integral


Processo n.º 1013/18.1T8FIG.C2.S1

Acordam, em Conferência, na Formação prevista no artigo 672.º n.º 3 do Código de Processo Civil junto da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça,

A Ré e Recorrente veio apresentar uma Reclamação do Acórdão proferido pela Formação prevista no artigo 672.º n.º 3 do Código de Processo Civil junto desta Secção Social, afirmando, designadamente, o seguinte:

“Tal não obstava a que a formação julgasse verificados os pressupostos da revista nos termos gerais, e determinasse a apresentação da revista ao relator para que procedesse ao respectivo exame preliminar, como impõe o nº.5 do artigo 672º. do CPC”

A 28 de março de 2025, o Ex.mo Relator neste Supremo Tribunal de Justiça proferiu o seguinte despacho:

“1. - A Ré, Fapricela-Indústria de Trefilaria, S.A., interpôs recurso de revista excepcional, do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 08.11.2024, proferido sobre a sentença da 1.ª instância de 13.05.2024, com fundamento no artigo 672.º, n.º 1, alíneas a) e b) do Código de Processo Civil (questão com relevância jurídica e interesses de particular relevância social).

2. - Vejamos se estão reunidos os requisitos gerais de admissibilidade do recurso:

O valor da causa foi fixado na sentença em € 156.824,76 e a sucumbência do Recorrente é superior a € 15.000,01 - artigo 629.º, n.º 1 do C.P.C.

Quem recorre é a Ré com legitimidade para o efeito, dado ter ficado vencida -artigo 631.º, n.º 1, do CPC.

As notificações do Acórdão foram remetidas em 11.11.2024, presumindo-se a respectiva notificação às partes no dia 14.11.2024.

O recurso foi apresentado em 04.12.2024, tendo a recorrente pago a multa pela apresentação das alegações no 3.º dia útil subsequente ao termo do prazo.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O prazo é de 15 dias, pelo que recurso é tempestivo – artigos 26.º, n.º 1, alínea e) e 80.º, n.º 2, do Código de Processo do Trabalho.

3. - Dupla conforme.

O Tribunal da Relação confirmou a decisão da primeira instância com fundamentação que não é, essencialmente, diferente e sem voto de vencido.

Assim, após trânsito, remetam-se os autos à Formação para apreciação dos requisitos específicos de admissibilidade do recurso de revista excecional.”.

Como se vê do teor deste despacho o Ex.mo Relator apreciou expressamente os pressupostos gerais de admissibilidade do recurso, considerou que os mesmos estavam presentes e enviou o recurso para a Formação prevista no artigo 672.º, n.º 3, junto desta Secção Social para apreciação dos pressupostos específicos de admissibilidade da revista excecional.

No despacho afirma-se expressamente que “o Tribunal da Relação confirmou a decisão da primeira instância com fundamentação que não é, essencialmente, diferente e sem voto de vencido” e tal decisão não foi objeto de qualquer reclamação pelo Recorrente.

O exame preliminar referido no n.º 5 do artigo 672.º já foi realizado pelo Relator pelo que seria a prática de um ato inútil uma nova apresentação do recurso ao Relator.

Aliás o Recorrente interpôs inequivocamente o seu recurso exclusivamente como revista excecional – a revista excecional não era subsidiária como poderia ser – tendo assumido a existência de “dupla conforme” que em momento algum no seu recurso pôs em causa. Só a vem pôr em causa agora que a sua revista excecional não foi admitida…

Não há, pois, qualquer nulidade por omissão de pronúncia do Acórdão da Formação.

E, tão-pouco, há qualquer nulidade por omissão de fundamentação:

O Recorrente e ora Reclamante afirma que a questão que colocou era esta: “para melhor aplicação do direito, é necessário definir o substrato mínimo das normas que podem ser aplicadas, por impulso do n.º 1 do artigo 18º. da Lei n.º 98/2009, a um determinado caso que não tem qualquer regulamentação específica na lei? A inexistência de resposta a esta questão no Acórdão reclamado é objetivamente análoga à total omissão de fundamentação para inadmissibilidade da revista excecional”.

Antes de mais, importa recordar que a lei admite expressamente que a fundamentação da decisão da Formação possa ser sucinta (n.º 4 do artigo 672.º do CPC: “a decisão (…) sumariamente fundamentada”).

Depois, sublinhe-se que, ao contrário do que é sugerido na questão cuja resposta pretensamente seria necessária para uma melhor aplicação do direito, não há que atender apenas a normas legais, ou “regulamentação específica na lei”, porque o artigo 18.º da LAT não se refere a normas legais, mas sim a regras sobre a segurança e saúde no trabalho.

Pode ler-se, ainda, no Acórdão objeto da presente reclamação: “não estando no domínio da responsabilidade penal e sim no domínio da responsabilidade civil pode o intérprete, mormente o julgador, recorrer à analogia para preenchimento de lacunas, importa sobretudo ter presente que o atual artigo 18.º da LAT não faz referência a normas legais, mas sim a regras de segurança, bem podendo as mesmas resultar da experiência ou dos usos” e “[a] deficiente avaliação dos riscos (factos 18, 28 e 29) e verificação do estado dos equipamentos (facto 30) e até a conceção dos mesmos (factos 20, 22 a 26) demonstram inequivocamente a violação culposa de regras de segurança”.

Por outro lado, aderiu-se expressamente à fundamentação do Acórdão do Tribunal da Relação quanto à existência de responsabilidade agravada do empregador, dizendo-se que o Acórdão recorrido tinha “uma argumentação que reputamos de inteiramente convincente e muito bem articulada”. Isto significa que se concordou c e aderiu à decisão do Tribunal da Relação quanto às normas legais aplicáveis à situação concreta.

Em suma, não era necessária – e muito menos “claramente necessária” – a intervenção deste Tribunal para a melhor aplicação do direito para responder à questão colocada pelo Reclamante na sua revista excecional.

E acrescentou-se que “não é certamente por se tratar de um acidente de trabalho que se justifica a admissão da presente revista excecional á luz da alínea b) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC”, porquanto “se assim fosse a revista excecional em matéria de acidentes de trabalho nada teria de excecional”, sendo que “a decisão de impor a responsabilidade agravada num caso como o presente não é suscetível de causar qualquer alarme ou comoção social”.

A decisão da Formação foi assim fundamentada, sendo que a lei, como já sublinhámos, permite expressamente uma argumentação sucinta (“sumariamente fundamentada”).

Pelas razões apresentadas não ocorre, tão-pouco, qualquer inconstitucionalidade, mormente por violação do disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.

Decisão: Indefere-se a presente reclamação.

Custas pelo Reclamante.

18-06-2025

Júlio Gomes (Relator)

José Eduardo Sapateiro

Mário Belo Morgado