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PEDIDO DE ALTERAÇÃO DA REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
CITAÇÃO DO REQUERIDO
Sumário
Se o requerente do pedido de alteração do exercício das responsabilidades parentais expuser sucintamente os fundamentos do seu pedido, alegando circunstâncias supervenientes que tornem necessário alterar o que estiver estabelecido, o Tribunal só pode considerar infundado o pedido e mandar arquivar o processo, depois de ordenar a citação da requerida e aguardar pelo termo do prazo para a eventual apresentação de alegações, conforme estabelecido no art. 42º nº 3 a 5 RGPTC.
Texto Integral
Processo n.º 6710/24.0T8MAI.P1 Juízo de Família e Menores ...
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Sumário (elaborado pela Relatora):
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I. RELATÓRIO
1.AA veio requerer Alteração do Regime das Responsabilidades Parentais, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 42.º do RGPTC, relativamente à menor BB, nascida em 9.06.2014, contra CC, pedindo que fosse designada data para a realização da Conferência de Pais a que alude o art. 35.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível.
Para o efeito alegou em síntese que, desde a homologação do acordo de regulação das responsabilidades parentais até à presente data o circunstancialismo da criança e dos seus progenitores alterou-se substancialmente, quer porque o Requerente viu cessar o seu contrato de trabalho com a empesa A... S.A., onde desempenhava o cargo de Diretor de Loja, encontrando-se a partir de 1 de janeiro de 2025, incapaz de continuar a suportar sozinho a totalidade das despesas da filha menor, estando a Requerida capaz de contribuir nas despesas da filha, assim como no que concerne aos convívios fixados, estes demonstram-se manifestamente insuficientes, uma vez que, em consequência do ambiente de hostilidade que se tem vindo a instalar entre os progenitores, é presentemente impossível articular os convívios previstos na cláusula 3.ª n.º 1 alínea A) e B) do acordo, não conseguindo os progenitores alcançar acordo nos convívios fixados mediante aviso prévio de 24h, pelo que os convívios da criança com o Pai limitam-se a dois fins-de- semana por mês, tendo sido impossível a manutenção de uma relação de grande proximidade entre a criança e o seu pai.
2. Não foi ordenada a citação da Requerida.
3. Não tendo sido realizada qualquer diligência, veio a ser proferida a decisão recorrida em 20.01.2025, Ref. Citius 467703358, com o seguinte teor:
“Pelo exposto, decido:
-julgar a ação manifestamente improcedente e, em consequência,
- determino o arquivamento dos autos.
Custas pela A.
Registe e notifique.”
4. Inconformado com a referida sentença, o Requerente interpôs o presente recurso de apelação, no qual formulou as seguintes CONCLUSÕES
I. O despacho ora sob recurso viola claramente o estatuído nos n.ºs, 3 e 4 do artigo 42.º do RGPTC, na medida em que o Tribunal a quo proferiu despacho a considerar o pedido formulado pelo Requerente antes de ter sido citada a Requerida e, consequentemente, antes de ter findo o prazo legalmente fixado para a Requerida alegar o que tivesse por conveniente.
II. O Tribunal a quo, não interpretou corretamente a lei e a matéria de facto alegada pelo Requerente que justifica a alteração.
III. E, mesmo quanto à fundamentação utilizada no despacho de indeferimento que aqui se transcreve: “(...) a variação de contexto, de acordo com o alegado, surge do lado da capacidade do obrigado a alimentos (...) O requerente diz que viu cessar o seu contrato de trabalho. Não diz, todavia, em concreto, em que medida a cessação da relação laboral se refletiu no seu rendimento e, deste modo, na sua capacidade de prestar: se está sem emprego, se trabalha noutro local, quanto aufere, se beneficia de algum subsídio. Acresce que uma situação de desemprego, tendencialmente temporária, não traduzindo uma perda de capacidade aquisitiva de caráter permanente, não deve, por si só, determinar a alteração do montante de alimentos, sob pena de se gerar insegurança quanto aos meios de subsistência da menor, não sendo atendível, para este efeito, qualquer alteração de rendimento, mesmo que pontual e/ou transitória. Por outro lado, “As necessidades dos filhos devem ser satisfeitas se possível até com prioridade sobre as próprias necessidades dos progenitores, cabendo a eles progenitores o esforço de obter os rendimentos que propiciem aos filhos um crescimento equilibrado e sadio.” (...) De semelhante falta de concretização carece a alegação de que a partir de 1 de janeiro de 2025, o requerente não se encontra capaz de continuar a suportar sozinho a totalidade das despesas da filha menor e de que um ano após a rutura conjugal, a Mãe encontra-se perfeitamente capaz de contribuir nas despesas da filha, o que não permite ao Tribunal sequer concluir que a pretensão é, em abstrato, fundada”, sempre se diga que a mesma padece de erros e deficiências.
IV. O Recorrente alegou, no que agora importa considerar, ainda que de forma sintética– mas é o que se lhe exige nesta fase liminar –, os factos que, posteriormente concretizados no segundo momento, caso não seja possível o acordo, poderiam consubstanciar a pretendida alteração. São eles: Em virtude do divórcio sofreu uma diminuição muito significativa da sua capacidade económica; Viu o seu contrato de trabalho com a empesa A... S.A., onde desempenhava o cargo de Diretor de Loja, cessar; A partir de 1 de janeiro de 2025, não se encontra capaz de continuar a suportar sozinho a totalidade das despesas da filha menor; O valor com o qual se encontra onerado, €450,00 a título de alimentos a que acrescem a totalidade das despesas escolares, é manifestamente exagerado, não só relativamente às despesas típicas de uma criança de 10 anos de idade, mas, sobretudo, face à realidade atual do alimentante. A Mãe encontra-se perfeitamente capaz de contribuir nas despesas da filha, não fazendo sentido o Pai vivenciar uma situação de constrangimento financeiro por se encontrar obrigado a suportar a totalidade das despesas da filha de ambos; Os convívios são manifestamente insuficientes, porque, em consequência do ambiente de hostilidade que se tem vindo a instalar entre os Progenitores, é presentemente impossível articular os convívios previstos na cláusula 3.ªn.º1 alínea A) e B).
V. As conclusões vertidas no despacho, salvo melhor opinião, alicerçam-se, certamente, no facto de não ter sido, conforme se impunha, ordenado o prosseguimento dos autos.
VI. Caso tal tivesse sucedido, no momento próprio, e não lograssem os progenitores acordo, teria comprovado o Requerente não se tratar de uma situação de desemprego temporário, mas de uma incapacidade para prestar trabalho, por tempo indeterminado, certamente com impacto muito significativo na sua capacidade económica (e de suportar a totalidade das despesas da filha).
VII. Não se compreende, também, a menção de que a variação de contexto, de acordo com o alegado, surge do lado da capacidade do obrigado a alimentos, consabidamente os elementos constitutivos da obrigação de alimentos são, por um lado, a necessidade de alimentos do alimentando (credor) e, por outro, a possibilidade de prestação por parte do alimentante (devedor) - art. 2004º do Cód. Civil, tais elementos desempenham uma dupla função, porquanto são, simultaneamente, pressupostos da constituição e da permanência da obrigação de alimentos e critérios de determinação do respetivo quantum.
VIII. Em todo o caso, o que se verifica é que, para esta fase inicial do processo, a situação descrita pelo Recorrente satisfaz as necessidades legais de alegação sintética de circunstâncias supervenientes e, como tal, o requerimento inicial não podia ter sido liminarmente indeferido.
IX. Por estes motivos entende-se que o despacho padece também de erro na fundamentação fáctica, mormente, no que se refere aos pressupostos da alteração das responsabilidades parentais.
X. Não existindo dúvidas de que a situação de desemprego configura, nos termos do artigo 42.º, n.º 1 RGPTC, uma circunstância superveniente que torna necessário alterar o anteriormente estabelecido, até porque, no caso concreto, foi precisamente tendo em conta o vencimento do Requerente que agora cessou que os progenitores acordaram que este suportaria em exclusivo a totalidade das despesas de educação da filha menor.
XI. Verificados os pressupostos da obrigação de alimentos (necessidade e recursos), a medida da prestação alimentar e a hipotética necessidade de a alterar será determinada à luz de um princípio de proporcionalidade, atendendo ao “binómio: necessidade do alimentando - possibilidades do obrigado, ponderação que só pode e deve ser feita após ser dado cumprimento ao disposto no n.º 3 do art. 42.º RPTC, uma vez que aí é afirmado que, depois de ser autuada a ação de alteração da regulação das responsabilidades parentais, o requerido é citado para, no prazo de 10 dias, alegar o que tiver por conveniente.
XII. Acresce que, só depois de junta a alegação ou findo o prazo para a sua apresentação, o Juiz, se considerar o pedido infundado ou desnecessária a alteração manda arquivar o processo, condenando em custas o requerente – cfr. n. º4 do citado art.42.º.
XIII. Por outro lado, o n.º6 do mesmo dispositivo legal dispõe que: “antes de mandar arquivar os autos ou de ordenar o seu prosseguimento, pode o juiz determinar a realização das diligências que considere necessárias”.
XIV. Com efeito, ao abrigo da lei supletivamente aplicável – o C.P.C. – por via do disposto no art. 33.º do RGPTC, não se vislumbra fundamento legal para o indeferimento liminar decidido pelo Tribunal a quo.
XV. Entende o Requerente, salvo melhor opinião que não há lugar processual para o indeferimento liminar da alteração do pedido relativo ao exercício das responsabilidades parentais previsto no art. 42.º do RGPTC.
XVI. Porquanto, a referida lei especial (RGPTC) não prevê para a situação em apreço a existência de despacho liminar prévio à citação da parte requerida, sendo que por aplicação subsidiária da lei geral (CPC) também não pode, hoje, haver lugar a despacho de tal natureza.
XVII. Assim sendo, mesmo para o caso de Tribunal a quo considerar infundado o pedido ou desnecessária a alteração, cumprindo o requerimento inicial os requisitos mínimos, não poderá decidir liminarmente, tendo pelo menos de ouvir, previamente, a parte requerida, a qual será devidamente citada para esse efeito (nomeadamente para, querendo, vir alegar o que tiver por conveniente).
XVIII. Pelo que, o despacho ora sob recurso deve ser revogado e substituído por um outro que ordene a citação da Requerida e o prosseguimento dos ulteriores trâmites processuais.
Concluiu, pedindo que o presente recurso seja julgado procedente e, em consequência, seja revogado o Despacho proferido pelo Tribunal a quo, ordenando-se a citação da Requerida nos autos sub júdice e bem assim o prosseguimento dos autos. 5. A Recorrida não ofereceu contra-alegações.
6. O Digno Magistrado do MP ofereceu resposta, pugnando pelo parcial provimento do recurso.
7. Foram observados os vistos legais.
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II. DELIMITAÇÃO do OBJECTO do RECURSO:
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. arts 635º, nº 3 e 4, 639º, n.ºs 1 e 2 e 608º nº 2 do CPC- devendo o tribunal resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, não estando obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, nem estando sujeito às alegações das partes no tocante á indagação, interpretação e aplicação das regras de direito- cfr. art. 5º nº 3 do CPC).
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A questão a decidir, em função das conclusões de recurso, é a seguinte:
- se os autos devem prosseguir para apreciação dos fundamentos suscitados pelo Apelante para a alteração do regime das responsabilidades parentais.
III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
Para a decisão a proferir relevam os factos inerentes à tramitação processual e respectivas peças processuais constantes do relatório acima elaborado, tendo este Tribunal procedido à consulta integral dos autos principais para a prolação da presente Decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.
Requerente e Requerida, em sede de divórcio por mútuo consentimento, acordaram quanto ao exercício das responsabilidades parentais relativas à sua filha menor, acordo esse celebrado em 21.11.2023, que foi objecto de parecer favorável do Magistrado do Ministério Público, tendo sido devidamente homologado.
Decorrido pouco mais de 1 ano desde a celebração daquele acordo-13.12.2024-, veio o progenitor, aqui Apelante, requerer a alteração dos termos do referido acordo quer na vertente da prestação de alimentos, quer na vertente do regime de visitas, alegando de forma sumária circunstâncias supervenientes relativas à sua situação económica- decorrentes da cessação do seu contrato de trabalho- impeditivas de continuar a suportar a prestação de alimentos que havia acordado pagar, bem como a manifesta insuficiência de convívios com a menor durante a semana.
Fê-lo ao abrigo do art. 42º do RGPTC, cujo teor aqui se reproduz, uma vez que a tramitação deste incidente tem relevância para a decisão do presente recurso, estando como está suscitada pelo Apelante a violação do regime estatuído nesse preceito legal:
1 - Quando o acordo ou a decisão final não sejam cumpridos por ambos os pais, ou por terceira pessoa a quem a criança haja sido confiada, ou quando circunstâncias supervenientes tornem necessário alterar o que estiver estabelecido, qualquer um daqueles ou o Ministério Público podem requerer ao tribunal, que no momento for territorialmente competente, nova regulação do exercício das responsabilidades parentais.
2 - O requerente deve expor sucintamente os fundamentos do pedido e:
a) Se o regime tiver sido estabelecido por acordo extrajudicial, juntar ao requerimento:
i) Certidão do acordo, e do parecer do Ministério Público e da decisão a que se referem, respetivamente, os n.os 4 e 3 do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 272/2001, de 13 de outubro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 324/2007, de 28 de setembro, pela Lei n.º 61/2008, de 31 de outubro, e pelo Decreto-Lei n.º 122/2013, de 26 de agosto; ou
ii) Certidão do acordo e da sentença homologatória;
b) Se o regime tiver sido fixado pelo tribunal, o requerimento é autuado por apenso ao processo onde se realizou o acordo ou foi proferida decisão final, para o que será requisitado ao respetivo tribunal, se, segundo as regras da competência, for outro o tribunal competente para conhecer da nova ação.
3 - O requerido é citado para, no prazo de 10 dias, alegar o que tiver por conveniente.
4 - Junta a alegação ou findo o prazo para a sua apresentação, o juiz, se considerar o pedido infundado, ou desnecessária a alteração, manda arquivar o processo, condenando em custas o requerente.
5 - Caso contrário, o juiz ordena o prosseguimento dos autos, observando-se, na parte aplicável, o disposto nos artigos 35.º a 40.º
6 - Antes de mandar arquivar os autos ou de ordenar o seu prosseguimento, pode o juiz determinar a realização das diligências que considere necessárias.
Ora, resulta dos autos de forma evidente que o Tribunal a quo não seguiu a tramitação prevista no referido preceito legal para o incidente de alteração do exercício das responsabilidades parentais, desde logo porque não procedeu à citação da Requerida, não determinou qualquer diligência prévia à decisão a proferir, tendo-se limitado a mandar arquivar os autos por ter considerado manifestamente improcedente a ação.
O Apelante insurge-se desde logo contra o facto de o Tribunal a quo ter determinado o arquivamento dos autos antes mesmo de a Requerida ter sido citada, sustentando que o requerimento inicial não podia ter sido liminarmente indeferido como foi, dado que só depois de junta a alegação pela Requerida ou findo o prazo para a sua apresentação o juiz pode mandar arquivar o processo caso considere infundado o pedido ou desnecessária a alteração do regime das responsabilidades parentais, como decorre do nº 4 do mencionado art. 42º do RGPTC.
Parece-nos inegável que o Tribunal a quo não seguiu a tramitação prevista no aludido preceito legal, e fê-lo sem que tenha apresentado qualquer justificação para o efeito, num processo de jurisdição voluntária, cujo regime legal embora assente numa relativa maleabilidade processual, tem em vista a procura da verdade material em detrimento de decisões estritamente formais.
A decisão proferida pelo Tribunal a quo consubstancia um indeferimento liminar do incidente de alteração do exercício das responsabilidades parentais por ter considerado manifestamente infundado o pedido de alteração, num caso em que o indeferimento liminar não é admissível, porque ainda que considerasse o pedido infundado ou desnecessária a alteração nesta fase liminar, o que não se concede, impunha-se por determinação legal que tivesse primeiramente citado a Requerida para alegar o que tivesse por conveniente e só depois de junta essa alegação, ou findo o prazo para a sua apresentação, poderia indeferir tal pedido e mandar arquivar o processo.
Tal consubstancia uma nulidade processual principal, traduzida na falta de citação- tendo sido o acto completamente omitido-a qual é de conhecimento oficioso, que não se pode considerar sanada porquanto a Requerida não teve qualquer intervenção no processo, e que acarreta a nulidade de todo o processado depois do requerimento inicial, salvando-se apenas este, nos termos dos arts. 187º al. a) e 188º nº 1 al. a) do CPC aplicável aos presentes autos por força do art. 33º nº 1 do RGPTC, nulidade processual que determina a anulação da decisão final se estiver a coberto da mesma, como se afigura ser o caso.
“As nulidades- para cuja apreciação é competente o tribunal onde o processo se encontre ao tempo da reclamação (cfr. Arts. 199º nº 3 e 198º nº 2)- serão julgadas logo que apresentada a reclamação (art. 200º, nº 2). Se, entretanto, o ato afetado de nulidade for coberto por qualquer decisão judicial, o meio próprio de o impugnar deixará de ser a reclamação (para o próprio juiz) e passará a ser o recurso da decisão a interpor no prazo de 30 dias cominado no nº 1 do art. 638º.”[1]
Por princípio, das nulidades cabe reclamação, em conformidade com o aforismo segundo o qual dos despachos recorre-se e das nulidades reclama-se.
Como já referia Alberto dos Reis “ a arguição da nulidade só é admissível quando a infracção processual não está ao abrigo de qualquer despacho judicial; se há um despacho a ordenar ou autorizar a prática ou omissão do acto ou formalidade, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade que se tenha cometido, não é a arguição ou reclamação por nulidade, é a impugnação do respectivo despacho pela interposição do recurso competente.“
Assim ocorreu no caso em apreço, porquanto o Apelante só tomou conhecimento da nulidade aquando da notificação da decisão de arquivamento dos autos.
Estando a nulidade processual cometida (omissão de citação da Requerida exigida pelo art. 42º nº 3 do RGPTC) a coberto da decisão final que se lhe seguiu, que a sancionou, a parte passou a dispor do direito de invocar essa nulidade no próprio recurso a interpor dessa mesma decisão que pôs termo ao incidente de alteração do exercício das responsabilidades parentais.
Deste modo, a invocação da nulidade processual em causa é tempestiva, a qual apesar de não ter sido assim qualificada pelo Apelante, foi por este invocada a violação do regime estabelecido no art. 42º do RGTPC por omissão daquele acto processual, estando tal questão aflorada no presente recurso, e como tal pode ser declarada por este Tribunal da Relação.
A propósito desta temática dá-se ainda conta dos Ac RC de 12/3/2013, proferido no Proc. Nº 1677/10.4TBPMS-C.C1; Ac RL de 27/11/2019, proferido no Proc. Nº e Ac STJ de 7/6/2022, proferido no Proc. Nº 4292/18.0T8VNF-A.G2.S1, consultáveis em www.dgsi.pt.
Por conseguinte, verificada a apontada nulidade processual, que para além de ter sido mencionada em sede deste recurso, é de conhecimento oficioso, estando a mesma a coberto da decisão recorrida, a mesma conduzirá à consequente anulação do processado, não podendo manter-se a decisão recorrida.
Sem prejuízo do assim decidido, afigura-se-nos que a decisão recorrida padece igualmente de erro de julgamento quanto à apreciação da alegada insuficiência dos fundamentos alegados pelo Requerente respeitantes às circunstâncias supervenientes necessárias para solicitar a alteração ao acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, porquanto o art. 42º nº 2 do RGPTC apenas exige que o Requerente exponha sucintamente os fundamentos desse pedido de alteração, o que nos parece ter ocorrido.
Pelo Apelante foi suficientemente alegado que o seu contrato de trabalho cessou no final do ano transacto, e que ficou impossibilitado de suportar sozinho a prestação de alimentos que acordara ficar a seu cargo, e que a Requerida entretanto mostra-se capaz de contribuir-hipótese que inclusivamente ficara prevenida no acordo entre eles estabelecido na cláusula 2ª, F)-, circunstâncias objectivamente supervenientes que constituem fundamento válido para o pedido de alteração do regime do exercício das responsabilidades parentais na vertente da prestação de alimentos.
Assim como foi também alegado pelo Apelante que os convívios com a menor durante a semana não são suficientes nem na prática têm sido mantidos, não sendo necessário que seja previamente intentado qualquer incidente de incumprimento para que o regime nessa vertente possa e deva ser alterado se tal for aconselhável em função do superior interesse da filha menor.
Se esses fundamentos são ou não infundados, e se justificam ou não a pretendida alteração do acordado entre os progenitores quanto ao exercício das responsabilidades parentais, são decisões a tomar depois de ouvida a Requerida, e implementadas as diligências que se afigurem necessárias.
Não obstante, mesmo que se considerasse não estarem suficientemente concretizados os fundamentos de facto subjacentes à pretendida alteração, sempre competiria ao Juiz proferir despacho a convidar o Requerente a aperfeiçoar o seu requerimento inicial, com vista a concretizar e complementar os factos que se lhe afigurem insuficientemente concretizados, podendo o Juiz a quo investigar livremente os factos, recolher as informações convenientes, estando-se no âmbito de um processo de jurisdição voluntária, sendo disso sintomático o previsto no nº 6 do art. 42º do RGPTC que lhe permite determinar a realização das diligências que considere necessárias antes mesmo de mandar arquivar os autos ou de ordenar o seu prosseguimento.
Por conseguinte, não pode manter-se a decisão recorrida, determinando-se a anulação do processado subsequente à apresentação do requerimento inicial para que seja dado integral cumprimento ao regime estabelecido no art. 42º do RGPTC, com citação da Requerida e posterior prosseguimento dos autos para conhecimento dos fundamentos do pedido de alteração do exercício das responsabilidades parentais.
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DECISÃO:
Em face do exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto, em julgar procedente a presente apelação, anulando-se a decisão recorrida, determinando-se o normal prosseguimento dos autos, com citação da Requerida e posterior conhecimento dos fundamentos do pedido de alteração do exercício das responsabilidades parentais.
Sem custas.
Notifique.
Porto, 17.06.2025
Maria da Luz Teles Meneses de Seabra
(Relatora)
João Proença
(1º Adjunto)
Maria Eiró
(2ª Adjunta)
(O presente acórdão não segue na sua redação o Novo Acordo Ortográfico)
__________________________ [1] Francisco Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. I, p. 510