Alcançados os dois terços da pena, com um mínimo absoluto de seis meses (artigo 61º, nº 3 do Cód. Penal), e obtido o consentimento do recluso, como é o caso, o legislador abranda as exigências de defesa da ordem e paz social e prescinde do requisito da prevenção geral, considerando que o condenado já cumpriu uma parte significativa de prisão e que, por conseguinte, tais exigências já estarão minimamente garantidas.
Donde, aos dois terços da pena, é único requisito material a expectativa de que o condenado, em liberdade, conduzirá a sua vida responsavelmente sem cometer crimes, ou seja, importa que se atente na prevenção especial na perspetiva de ressocialização (positiva) e prevenção da reincidência (negativa).
Pelo que, no que respeita aos fins das penas, subsiste apenas a finalidade de ajuda ao recluso na mudança e regeneração (ressocialização) e na prevenção de cometimento de novos crimes.
Na avaliação da prevenção especial terá o julgador de elaborar um juízo de prognose sobre a conduta do recluso no que respeita a reiteração criminosa e o seu bom comportamento futuro, a aferir pelas circunstâncias do caso, vida anterior do recluso, personalidade do recluso e evolução desta durante a execução da pena de prisão.
Havendo sérias, fundadas e profundas dúvidas quanto à possibilidade de se formular um juízo de prognose efetivamente positivo de que o recluso conduzirá, em liberdade, no futuro, a sua vida de forma responsável e afastado da prática de crimes, tal impede que se lance mão de um mecanismo — o da liberdade condicional aos dois terços da pena de prisão cumprida — cuja natureza tem carácter excecional.
I – RELATÓRIO
i. O recluso AA interpôs recurso do despacho judicial de 17/03/2025, que não lhe concedeu a liberdade condicional por referência ao marco dos dois terços da pena que atualmente cumpre no Estabelecimento Prisional de ….
Peticiona a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que determine a concessão da liberdade condicional ao recorrente.
Apresentou motivação, extraindo as seguintes conclusões:
“A) Veio o Tribunal a quo proferir decisão de não conceder a Liberdade Condicional ao Recluso.
B) No âmbito da reunião do Conselho Técnico, do dia 11/03/2025, foi emitido, por unanimidade, parecer favorável à concessão da liberdade condicional ao Recluso, tendo o Ministério Público emitido parecer desfavorável.
C) Foi proferida decisão pelo Tribunal a quo de não concessão de liberdade condicional, por existirem dúvidas sobre se o Recluso está preparado para a liberdade ao nível da sua consciência critica e interiorização do desvalor dos crimes praticados e suas consequências, sendo necessário uma análise mais prolongada no tempo.
D) Posição com a qual o Recluso não se conforma.
E) O Recluso encontra-se a cumprir uma pena de quatro anos de prisão, no âmbito do Proc. 387/16.3… que correu termos no Juízo de Competência Genérica de …, Juiz …, do Tribunal Judicial da Comarca de …, pela prática de dois crimes de violência doméstica.
F) De referir que, até de acordo com o depoimento dos ofendidos, os factos pelos quais o Recluso foi condenado foram praticados quando o mesmo se encontrava alcoolizado, tendo historial de consumo excessivo de bebidas alcoólicas.
G) Contudo, desde o ano de 2017, que o Recluso não teve mais contacto com os ofendidos.
H) Iniciou, ainda antes da sua prisão, um relacionamento, idêntico aos dos cônjuges, com BB e que mantém até presente data, relacionamento esse que foi caracterizado pelo casal como adequado e de entreajuda.
I) Desde a sua prisão em 26/07/2022 que o seu comportamento prisional de mostra adequado e sem registo disciplinar, tendo já beneficiado de duas licenças de saída jurisdicional que decorreram sem qualquer incidente.
J) Desde 09/09/2024 que integra o regime aberto no interior, trabalhando na Quinta … onde vem desenvolvendo actividade de âmbito rural, sendo considerado pelos Serviços de Vigilância como um recluso cumpridor e dedicado nas tarefas que lhe são distribuídas.
K) O Recluso, quando sair em liberdade, tem a possibilidade de voltar a trabalhar para o mesmo empregar que tinha antes da sua prisão, no qual exercia a sua actividade profissional de encarregado geral de obras de construção civil.
L) Desde a sua prisão, em 24/06/2024, que o Recluso não voltou a consumir bebidas alcoólicas, nem aquando das suas licenças de saída jurisdicional, tendo jurado perante a sua actual companheira que não voltará a consumir bebidas alcoólicas.
M) O Recluso tem vindo a tomar consciência da sua conduta e reconhecimento da gravidade dos seus atos, assumindo que tratou mal as vítima, e que lhe deve um pedido de desculpa, pretendendo repará-las mediante o pagamento dos valores a que foi condenado em sede de indemnização.
N) Na última avaliação realizada pelos serviços de reinserção social foi possível constatar uma evolução da sua capacidade autocrítica e maior noção do dano causado às vítimas, reconhecendo o desajuste comportamental que esteve na génese dos crimes praticados, valorizando a actual relação afectiva que mantém e a intenção de prosseguir o seu percurso de vida de forma ajustada.
O) Motivo pelo qual, foi dado unanimemente parecer favorável a concessão de liberdade condicional ao Recluso, pelas entidades que com o mesmo contactam diariamente.
P) Assim, não aceita o Recluso a promoção do Ministério Público no sentido de emitir parecer desfavorável e a decisão de não concessão da liberdade condicional.
Q) É entendimento do Recluso que se encontram reunidos todos os requisitos para a concessão de liberdade condicional, por referência ao cumprimento de 2/3 da pena, quando o mesmo já cumpriu cerca de 2 anos e oito meses de prisão, tendo neste período apresentado um comportamento prisional adequando e uma evolução no sentido de tomar consciência da sua conduta e reconhecimento da gravidade dos seus atos.
R) Obrigar o Recluso ao cumprimento, quase, integral da pena a que foi condenado é não valorizar o esforço e o compromisso que o Recluso tem vindo a demonstrar, durante a sua prisão, de prosseguir o seu percurso de vida de forma ajustada.
S) Estando preenchido o requisito formal de que o recluso, em liberdade, conduzirá a sua vida responsavelmente sem cometer crimes.
T) Pelo que, o Tribunal a quo ao decidir como decidiu violou o disposto no art. 61º do Código Penal.
U) Nestes termos, deverá o presente recurso ser julgado procedente revogando-se o despacho de que ora se recorre por outro que conceda a liberdade condicional ao recluso AA, por ter atingido os 2/3 da pena a que foi condenado e preencher os requisitos estabelecidos no art. 61º, nº 1, 2 e 3 do Código Penal.”.
ii. Admitido o recurso, o MP respondeu, pugnando pela improcedência do recurso e concluindo do seguinte modo:
“1.º- O recluso AA interpôs recurso da Douta Sentença referência …, proferida em 17/03/2025, que não lhe concedeu a liberdade condicional, pedindo a revogação da mesma e a sua substituição por Douto Acórdão que lhe conceda a liberdade condicional.
2.º- A decisão recorrida foi proferida após o conselho técnico, por unanimidade, ter emitido parecer favorável e o Ministério Público se ter pronunciado desfavoravelmente à concessão da liberdade condicional.
3.º- Aquela decisão foi proferida com referência aos dois terços da pena única de prisão, pelo que teve de apreciar se estavam preenchidos os pressupostos do artigo 61.º, n.º 2, alínea a), Código Penal.
4.º- Concordando com o sustentado na douta Sentença recorrida, consideramos que não se mostram preenchidos os pressupostos do artigo 61.º, n.º 2, alínea a) Código Penal, o que impede a concessão da liberdade condicional.
5.º- Por decisão proferida no processo n.º 387/16.3…, do Juízo de Competência Genérica de …, J…, foi o recluso condenado na pena única de quatro anos de prisão efetiva, pela prática de dois crimes de violência doméstica. A execução da pena foi liquidada nos seguintes termos: metade em 23-07-2024, 2/3 em 23-03-2025 e termo em 23-07-2026.
6.º- A Douta Sentença recorrida contém uma explicação concreta para não atribuir a liberdade condicional ao recorrente, fazendo uma análise do percurso do recluso, considerando o teor da douta Sentença condenatória e todos os elementos que instruem os presentes autos, não se limitando a fazer uma exposição acrítica dos elementos e informações trazidas aos autos.
7.º- Consideramos que não existe nos autos demonstração de uma evolução da situação do recluso e na aquisição de estratégias preventivas da reincidência que permita afastar os pressupostos e os fundamentos que sustentaram a não concessão de liberdade condicional decidida nos autos anteriormente.
8.º- Importa sublinhar que o recluso mudou o discurso sobre os factos em comparação com a primeira audição de recluso, sem que seja percetível qual o fator motivador dessa mudança.
9.º- Nessa medida, é necessário avaliar se a mudança se deveu a um efetivo juízo de autocritica ou, diferentemente, se o recluso considerou que seria a forma mais rápida de reaver a sua liberdade (mediante leitura da douta sentença proferida em 05.07.2024).
10.º- Conforme sublinhado na douta Sentença, o recluso praticou os crimes contra duas companheiras diferentes, de dois relacionamentos diferentes, mediante condutas praticadas entre 23.07.2016 a 23.07.2018.
11.º- Para além das condenações referidas, o recluso apresenta condenações pela prática de um crime de ameaça agravada, um crime de ofensa à integridade física simples, um crime de furto, sete crimes de violação de domicílio e três crimes de introdução em lugar vedado ao público. – ponto 3) dos factos provados.
12.º- No que respeita ao crime de violência doméstica entendemos que ainda não existem evidências sólidas de que o recluso tenha consciência crítica plena sobre as suas condutas, das consequências para as vítimas e da gravidade do crime de violência doméstica.
13.º- Acresce que só em 07-02-2025 foi deferida a primeira licença de saída jurisdicional ao recluso.
14.º- O consumo de bebidas alcoólicas em excesso não pode servir de justificação para a multiplicidade de episódios e datas em que o recluso praticou factos com relevância criminal.
15.º- As condutas são suscetíveis de prejudicar gravemente a confiança da sociedade na postura do recluso, que praticou os crimes que implicaram sua reclusão contra duas vítimas.
16.º- Analisado o percurso prisional e as competências demonstradas e adquiridas, consideramos que o recluso continua a apresentar necessidade de desenvolver estratégias preventivas da reincidência, bem como a necessidade de ganhar competências a nível pessoal que lhe permitam adotar um comportamento e um percurso de vida conforme ao direito, quando confrontado com contextos de dificuldade, de pressão e eventual prejuízo.
17.º- Desta forma, continua a não se vislumbrar uma alteração sustentada de comportamento e atitude do recluso que permita formular um juízo de que irá conduzir a sua vida de forma diferente em contextos da mesma natureza.
18.º- Ao decidir naqueles termos, a douta sentença efetuou uma correta aplicação do disposto no artigo 61.º n.º 2, al. a), e n.º 3, do Código Penal.
19.º- Acresce que o recorrente não pugna pela alteração dos factos dados como provados na sentença que negou a concessão da liberdade condicional.
20.º - A Douta Sentença recorrida não violou qualquer das normas legais invocadas no recurso.
21.º- Pelo exposto, o recurso interposto pelo recluso não merece provimento, devendo manter-se a Douta Sentença recorrida.
iii. Colhidos os vistos e realizada a Conferência, cumpre decidir.
*
II – QUESTÕES A DECIDIR.
Como é pacificamente entendido, o âmbito dos recursos é definido pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, que delimitam as questões que o tribunal ad quem tem de apreciar, sem prejuízo das que forem de conhecimento oficioso (cfr. Germano Marques da Silva in Curso de Processo Penal, vol. III, 2ª ed., pág. 335, Simas Santos e Leal Henriques, in Recursos em Processo Penal, 6ª ed., 2007, pág. 103, e, entre muitos outros, o Ac. do S.T.J. de 05.12.2007, Procº 3178/07, 3ª Secção, disponível in Sumários do STJ, www.stj.pt, no qual se lê: «O objecto do recurso é definido e balizado pelas conclusões extraídas da respectiva motivação, ou seja, pelas questões que o recorrente entende sujeitar ao conhecimento do tribunal de recurso aquando da apresentação da impugnação - art. 412.°, n.° 1, do CPP -, sendo que o tribunal superior, tal qual a 1.ª instância, só pode conhecer das questões que lhe são submetidas a apreciação pelos sujeitos processuais, ressalvada a possibilidade de apreciação das questões de conhecimento oficioso, razão pela qual nas alegações só devem ser abordadas e, por isso, só assumem relevância, no sentido de que só podem ser atendidas e objecto de apreciação e de decisão, as questões suscitadas nas conclusões da motivação de recurso, (...), a significar que todas as questões incluídas nas alegações que extravasem o objecto do recurso terão de ser consideradas irrelevantes.»)
Atentas as conclusões apresentadas, que traduzem as razões de divergência do recurso com a decisão impugnada – a decisão que não lhe concedeu a liberdade condicional por reporte ao marco dos 2/3 das penas –, a questão a examinar e decidir é a de saber se a decisão recorrida merece censura por, contrariamente ao ali decidido, estarem preenchidos todos os pressupostos para que seja concedida ao recorrente a liberdade condicional, nesta fase do cumprimento da pena.
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III – TRANSCRIÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA.
A decisão recorrida tem o seguinte teor:
“I. RELATÓRIO
Os presentes autos, em que é recluso AA, com os demais sinais dos autos e actualmente preso no Estabelecimento Prisional de …, destinam-se à apreciação da liberdade condicional.
Foi elaborado relatório pelas equipas técnicas de tratamento prisional e reinserção social versando os aspectos previstos no artigo 173º, nº 1, alíneas a) e b), do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade.
O Conselho Técnico emitiu, por unanimidade, parecer favorável à concessão da liberdade condicional, nos termos do artigo 175º, nº 2 do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade.
Ouvido o recluso, este, entre outros esclarecimentos, deu o seu consentimento à concessão da liberdade condicional, cfr. artigo 176º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade.
O Ministério Público emitiu parecer desfavorável, cfr. artigo 177º, nº 1, do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade.
*
Mantêm-se os pressupostos de validade e de regularidade da instância, não existindo nulidades, questões prévias ou incidentais, ou excepções de que cumpra conhecer e que obstem ao conhecimento do mérito da questão a decidir: apreciação da liberdade condicional, com referência aos 2/3 da pena.
II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Com relevância para a decisão da causa, julgam-se PROVADOS os seguintes factos:
1) O recluso AA cumpre, à ordem do Processo nº 387/16.3…, do Juízo de Competência Genérica de …, J…, do Tribunal Judicial da Comarca de …, uma pena de 4 (quatro) anos de prisão pela prática de dois crimes de violência doméstica, pelos factos julgados provados na sentença junta aos autos em 11-08-2022, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
2) A liquidação da pena foi efectuada nos seguintes moldes: metade em 23-07-2024, 2/3 em 23-03-2025 e termo em 23-07-2026.
3) Além dos crimes referidos em 1), o recluso tem antecedentes criminais, pela prática de um crime de ameaça agravada, um crime de ofensa à integridade física simples, um crime de furto, sete crimes de violação de domicílio e três crimes de introdução em lugar vedado ao público.
4) O recluso tem historial de consumo excessivo de bebidas alcoólicas, mas em meio prisional tem-se apresentado abstinente.
5) Na última avaliação da liberdade condicional, realizada em Julho de 2024, AA não assumia os crimes, não apresentava consciência crítica quanto aos crimes e suas consequências, e assumia uma atitude de vitimização e de minimização da sua conduta criminal.
6) Concretamente, em sede de audição perante o Tribunal, em 24-06-2024, o recluso verbalizou o seguinte:
“Acha que está preso de uma CC e uma DD.
A CC tem um lar ilegal.
À DD dei-lhe 6 anos de comer. Ela sempre mentiu em Tribunal e na GNR. Já tinha cumprido uma pena e saiu em liberdade condicional.
Nesse período conheceu a CC. Fez-lhe uns trabalhos para o lar. Nunca lhe pagou. Às vezes dava-lhe uma camisola, outras vezes comida, outras vezes dormia em casa dela.
Ela começou a persegui-lo. Foi morar para a … e ela veio viver também para lá. Teve que esconder o seu carro.
Também não sabe porque é que está preso. Nunca lhes tocou. A CC é que bate nas velhas do lar.”;
7) Presentemente, apresenta um discurso de reconhecimento da prática dos factos pelos quais se encontra condenado, pede desculpa às vítimas e verbaliza que as tratou mal e que nunca mais as quer ver.
8) Tem comportamento prisional adequado e sem registo disciplinar.
9) Cumpre a pena em regime comum e só em 07-02-2025 lhe foi deferida a primeira licença de saída jurisdicional, apesar de dois pedidos feitos anteriormente.
10) O condenado iniciou funções laborais em meio prisional em 21-03-2023 nas obras da ala prisional, cessando-as em 22-10-2023 por indisciplina. Em 27-05-2024 reiniciou funções como faxina, tendo em 09-09-2024 integrando o regime aberto no interior, trabalhando na “Quinta …”, onde vem desenvolvendo actividades de âmbito rural, sendo considerado pelos Serviços de Vigilância como um recluso cumpridor e dedicado nas tarefas que lhe são distribuídas.
11) Mantém, há cerca de quatro anos e seis meses, uma união marital com BB, relacionamento que foi caracterizado pelo casal como adequado e de entreajuda.
12) O condenado poderá voltar a desempenhar a actividade profissional que exercia antes da reclusão, como encarregado geral de obras de construção civil, para o mesmo empregador, recebendo cerca de 2.900 Euros mensalmente, valor que se revela suficiente para fazer face aos encargos assumidos pelo agregado que pretende integrar.
Motivação da Decisão sobre a Matéria de Facto
Na sua decisão sobre a matéria de facto, procedendo a uma valoração global e concatenada, à luz das regras de direito probatório e, quando possível a livre apreciação, à luz das regras da experiência comum, com a concorrência de critérios lógicos e objectivos, o Tribunal considerou:
a. Certidão da(s) decisão(ões) condenatória(s) e do despacho da liquidação da pena;
b. Relatórios das equipas técnicas de tratamento prisional e reinserção social;
c. Ficha biográfica do recluso actualizada;
d. Certificado do registo criminal do recluso;
e. Declarações do recluso, colhidas em sede das duas audições realizada nos termos e para efeitos do artigo 176º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade.
Todos estes elementos de prova, complementando-se e corroborando-se entre si, convergem unanimemente no sentido dos factos provados, não se detectando neles contradições, inexactidões ou inverosimilhanças carecidas de maior explicação (sem prejuízo das explanações que adiante faremos).
III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
A liberdade condicional tem como escopo «o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa equilibradamente recuperar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão. Com tal medida […] espera o Código fortalecer as esperanças de uma adequada reintegração social do interessado, sobretudo daquele que sofreu um afastamento mais prolongado da colectividade» [cf. Leal-Henriques e Simas Santos, in “Código Penal”, Rei dos Livro, 1º Vol., 2.ª ed., pág. 504].
Assim, a finalidade primária da liberdade condicional «é a reinserção social do cidadão recluso, sendo certo que, até serem atingidos os dois terços da pena, esta finalidade está limitada pela exigência geral preventiva de defesa da sociedade» [cf. Anabela Rodrigues, in “A Fase da Execução das Penas e Medidas de Segurança no Direito Português”, BMJ, 380, pág. 26]
Efectivamente, verificados que estejam, como estão no presente caso, os requisitos de ordem formal - quais sejam o cumprimento de metade da pena com um mínimo absoluto de seis meses (período de tempo a partir do qual, na perspectiva do legislador, a pena tem potencialidade de já ter cumprido as suas finalidades) e o consentimento do recluso (artigo 61º do Cód. Penal) , o legislador exige, ainda, que a libertação se revele compatível com a defesa da ordem e paz social (artigo 61º, nº 2, al. b) do Cód. Penal).
Pretende-se, pois, dar ênfase à prevenção geral, traduzida na protecção dos bens jurídicos e na expectativa que a comunidade deposita no funcionamento do sistema penal.
Não estando assegurado este requisito, não poderá ser concedida a liberdade condicional, ainda que o condenado revele bom prognóstico de recuperação.
Contudo, alcançados os dois terços da pena, com um mínimo absoluto de seis meses (artigo 61º, nº 3 do Cód. Penal), e obtido o consentimento do recluso, como é o caso, o legislador abranda as exigências de defesa da ordem e paz social e prescinde do requisito da prevenção geral, considerando que o condenado já cumpriu uma parte significativa de prisão e que, por conseguinte, tais exigências já estarão minimamente garantidas.
Donde, aos dois terços da pena, é único requisito material a expectativa de que o condenado, em liberdade, conduzirá a sua vida responsavelmente sem cometer crimes, ou seja, importa que se atente na prevenção especial na perspectiva de ressocialização (positiva) e prevenção da reincidência (negativa).
Pelo que, no que respeita aos fins das penas, subsiste apenas a finalidade de ajuda ao recluso na mudança e regeneração (ressocialização) e na prevenção de cometimento de novos crimes.
Na avaliação da prevenção especial terá o julgador de elaborar um juízo de prognose sobre a conduta do recluso no que respeita a reiteração criminosa e o seu bom comportamento futuro, a aferir pelas circunstâncias do caso, vida anterior do recluso, personalidade do recluso e evolução desta durante a execução da pena de prisão.
Este prognóstico de recuperação consubstancia o último dos pressupostos materiais: o legislador apenas permite a libertação condicional caso haja fundada expectativa de que, em liberdade, o condenado conduzirá a sua vida responsavelmente, sem cometer crimes (artigo 61º, nº 2 al. a) do Cód. Penal).
Vertendo ao caso destes autos.
Aprecia-se a concessão da liberdade condicional por referência ao marco dos 2/3 da pena, pelo que, não mais há que convocar razões de prevenção geral para o caso.
Sobra, pois, a apreciação das necessidades de prevenção especial.
Quanto a estas o Tribunal entende que ainda não se apresentam um grau compatível com a libertação antecipada do recluso.
Com efeito, pese embora no que concerne ao comportamento prisional, ao investimento no trabalho e ao enquadramento social e familiar no exterior, a análise global seja favorável ao recluso, persistem-nos muitas dúvidas sobre se o recluso está preparado para a liberdade ao nível da sua consciência crítica e interiorização do desvalor dos crimes praticados e suas consequências.
Os serviços de reinserção social indicam no seu último relatório que «Na última avaliação realizada sobre a consciência critica do condenado em relação ao desvalor dos crimes de praticou, AA assumiu uma atitude de vitimização e de minimização da sua conduta criminal, contudo, na recente avaliação realizada foi possível constatar evolução da sua capacidade autocritica e maior noção do dano causado às vitimas, reconhecendo o desajuste comportamental que esteve na génese dos crimes praticados, valorizando a actual relação afectiva que mantém e a intenção de prosseguir o seu percurso de vida de forma ajustada.».
Por seu turno, os serviços prisionais dão nota, no respectivo último relatório, que o recluso ainda apresenta discurso autocentrado e de vitimização.
Conjugando estas análises particulares com as últimas declarações prestadas pelo recluso, em sede de audição realizada em 10-03-2025, e com aqueloutras que prestou na sua audição realizada em 24-06-2024, transcritas na alínea 6) dos factos provados, consideramos, tal como perfilhado pelo Ministério Público no seu parecer que antecede, que será necessário perceber se estamos perante uma verdadeira alteração de postura e de sentido crítico, mediante uma análise mais prolongada no tempo.
Atente-se que o condenado cumpre pena por dois crimes de violência doméstica, contra duas companheiras diferentes, de dois relacionamentos diferentes, por factos que denotam um comportamento agressivo, impulsivo e profundamente ofensivo da dignidade da mulher, sendo que, até há cerca de oito meses atrás, o recluso nem sequer assumia a prática de tais crimes, vitimiza-se e culpabilizava as vítimas.
Presentemente, o seu discurso e a sua postura evidenciam uma mudança positiva, mas será genuína? Ou será uma mudança estratégica para almejar a liberdade condicional?
Suscitam-se-nos muitas dúvidas perante uma mudança tão radical, quanto rápida; dúvidas que só com o decurso de mais algum tempo de reclusão poderão ficar resolvidas. Com efeito, julga-se necessário mais algum tempo de reclusão para avaliar se esta mudança de postura do recluso se mantém e se é realmente genuína.
Por ora, suscitam-se muitas dúvidas sobre se o recluso já interiorizou em plenitude a dimensão da gravidade dos seus actos e das suas consequências para as vítimas. Ora, a reflexão autocrítica sobre a conduta criminosa e suas consequências é indispensável para que se conclua que o condenado está munido de um relevante inibidor endógeno.
Quem não logrou ainda percepcionar em plenitude o mal cometido, dificilmente possui mecanismos passíveis de evitar a repetição da sua conduta. Como explicitam João Luís de Moraes Rocha e Sónia Maria Silva Constantino (in “Reclusão e Mudança” – “Entre a Reclusão e a Liberdade” - Vol. II, Pensar a Reclusão, Almedina, pág. 171), «sem interiorização da responsabilidade dificilmente será possível alterar comportamentos».
Acresce que, o recluso ainda não beneficiou de licenças de saída em número assaz suficiente para permitir testar a sua capacidade contentora no exterior, bem como firmar-se uma convicção sobre se logra manter uma conduta normativa em meio livre e se está capaz de observar as injunções e proibições inerentes à liberdade condicional.
Tudo visto e ponderado, julga-se que o recluso continua a apresentar necessidade de continuar a desenvolver estratégias preventivas da reincidência, sem olvidar que já há vários sinais positivos no seu percurso prisional que, a manter, poderão permitir um juízo de prognose favorável à liberdade condicional numa próxima avaliação.
Neste momento, por razões de prevenção especial, impõe-se que não se acompanhe o parecer unânime do Conselho Técnico, mas sim o parecer do Ministério Público, no sentido de que não estão reunidas condições para que seja concedida ao recluso a liberdade condicional.
A não concessão da liberdade condicional, nesta fase, não deverá ser entendida pelo recluso como razão para a sua desmotivação em termos de consolidação do seu percurso prisional, mas como o reconhecimento de que o recluso tem ainda um caminho a consolidar, no qual deve investir, para que, um dia, a sua reintegração em meio livre possa ser um êxito.
IV. DECISÃO
Com os fundamentos de facto e de Direito acima expostos, DECIDE-SE não conceder a liberdade condicional a AA.
*
A eventual concessão de liberdade condicional será reapreciada em renovação da instância, cfr. artigo 180º, nº 1 do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, que se fixa em 17-03-2026.”.
*
IV – FUNDAMENTAÇÃO.
Debrucemo-nos, então, sobre o mérito da decisão, para encontrarmos resposta à questão a decidir – a de saber se estão preenchidos todos os pressupostos para que seja concedida ao recorrente a liberdade condicional, nesta fase do cumprimento da pena.
Partindo-se sempre do pressuposto formal da existência de consentimento por parte do condenado (cfr. n° 1, do artigo 61°, do Código Penal), o legislador optou nos n°s 2, 3 e 4 do artigo 61º do Código Penal, não só por uma diferenciação temporal dos pressupostos formais, situando-os em metade (1/2) e dois terços (2/3) da pena de prisão cumprida para a liberdade condicional facultativa e em cinco sextos (5/6) de pena de prisão superior a 6 anos, para aquela de carácter obrigatório ou automático, mas também por uma diferenciação material dos seus pressupostos.
Assim, quando está em causa a concessão da liberdade condicional respeitante ao cumprimento de metade da pena de prisão, acentuam-se por um lado razões de prevenção especial, seja negativa, de que o condenado não cometa novos crimes, seja positiva, de reinserção social, e de prevenção geral, compatibilidade da liberdade com a defesa da ordem e paz social —cfr. alíneas a) e b) do n° 2, do mencionado artigo 61°.
Quando está em causa a concessão da liberdade condicional respeitante ao cumprimento de dois terços da pena de prisão, a lei não confere a mesma relevância à prevenção geral. Passa-se a acentuar razões de prevenção especial, seja negativa, de que o condenado não voltará a delinquir, seja positiva, conducente à sua reinserção social.
Por isso, no momento de apreciação da liberdade condicional quando o condenado já cumpriu dois terços da pena, deve entender-se que esse cumprimento parcial satisfaz plenamente as razões de prevenção geral, ficando a liberdade condicional, quando facultativa, apenas dependente do cumprimento das exigências de prevenção especial.
Para o efeito deverá ter-se em atenção as repercussões que o cumprimento da pena está a ter na personalidade do condenado e que podem vir a revelar-se na sua vida futura. "Assim, para além da vontade subjectiva do condenado, o que releva é (...) a «capacidade objectiva de readaptação», de modo que as expectativas de reinserção sejam manifestamente superiores aos riscos que a comunidade deverá suportar com a antecipação da sua restituição à liberdade."1.
Importa ainda acentuar-se que o regime de liberdade condicional em face dos pressupostos de que depende, excepcionando evidentemente a obrigatória aos cinco sextos da pena, se o condenado nisso consentir, tem carácter excecional.
Na verdade, quando a apreciação se faz por reporte aos marcos do meio da pena e dos dois terços da pena, a liberdade condicional é a exceção.
Bem se compreende que assim seja porque a pena já é fixada tendo em consideração as molduras legais cabíveis aos crimes em função da sua gravidade e cujo quantum concreto é determinado tendo em consideração as exigências concretas de prevenção. Por isso, a concessão de liberdade condicional deverá apenas ter lugar nas situações excepcionais em que se revele patentemente que o condenado está apto a conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes (a que acresce, no caso da concessão por reporte a metade da pena, o requisito de que a defesa da ordem e da paz pública não sejam postas em causa.
O preceituado no artigo 61°, n° 2, do Código Penal exige que se efectue um prognóstico individualizado e favorável de reinserção social, assente, essencialmente, na probabilidade séria de que o condenado em liberdade adopte um comportamento socialmente responsável, sob o ponto de vista criminal.
Importa, pois, aferir os índices de ressocialização revelados pelo condenado no caso concreto – para isso devem ponderar-se as circunstâncias concretas de cada caso, designadamente a conduta do recluso, anterior e posterior à sua condenação, bem como a sua própria personalidade, designadamente a sua evolução ao longo do cumprimento da respetiva pena de prisão no sentido de interiorizar o desvalor da sua conduta, e cuja exteriorização seja patente e se revele pelo menos num discurso dotado de coerência e que se apresente como manifestamente sentido; decorrente de um sentimento aprofundado de consciência do mal do crime.
Essa é a primeira condição necessária, indispensável e incontornável para a conclusão da possibilidade de ressocialização, com a adopção de comportamento socialmente responsável.
Não esqueçamos que a integração social não só não se esgota no plano familiar, social e laboral, como significa, antes de mais, aceitação dos valores penalmente protegidos e determinação do comportamento segundo tais valores o que só é possível depois de assumido integralmente e sem quaisquer reservas ou pretextos o mal do crime.
Porque assim é, não obstante o esforço argumentativo do recorrente, nenhuma crítica merece a decisão recorrida ao constatar a inviabilidade de se estabelecer, neste momento, um prognóstico positivo de ressocialização com adoção de comportamento normativo.
Em primeiro lugar, assim sucede atenta a personalidade manifestada pelo condenado aquando do cometimento dos crimes (personalidade à qual deve atender-se em face do disposto no art. 61.º, n.º 2, do CP, que determina expressamente a relevância das circunstâncias do caso, da vida anterior do agente e da sua personalidade). Tratando-se de um indivíduo sem limitações cognitivas, a prática dos factos não pode deixar de revelar uma personalidade com dificuldade em respeitar princípios e valores conformes com a vida em sociedade e que denota manifesto desprezo pela situação das vítimas.
Considerou o Tribunal a quo a gravidade dos factos que importaram a aplicação ao recluso das penas de prisão e o que eles revelam da sua personalidade [“Atente-se que o condenado cumpre pena por dois crimes de violência doméstica, contra duas companheiras diferentes, de dois relacionamentos diferentes, por factos que denotam um comportamento agressivo, impulsivo e profundamente ofensivo da dignidade da mulher”].
Por outro lado, ponderou o Tribunal a quo a inviabilidade de se concluir pela consolidação do juízo de autocensura e da interiorização do desvalor das suas condutas delituosas:
“(…) persistem-nos muitas dúvidas sobre se o recluso está preparado para a liberdade ao nível da sua consciência crítica e interiorização do desvalor dos crimes praticados e suas consequências.
Os serviços de reinserção social indicam no seu último relatório que «Na última avaliação realizada sobre a consciência critica do condenado em relação ao desvalor dos crimes de praticou, AA assumiu uma atitude de vitimização e de minimização da sua conduta criminal, contudo, na recente avaliação realizada foi possível constatar evolução da sua capacidade autocritica e maior noção do dano causado às vitimas, reconhecendo o desajuste comportamental que esteve na génese dos crimes praticados, valorizando a actual relação afectiva que mantém e a intenção de prosseguir o seu percurso de vida de forma ajustada.».
Por seu turno, os serviços prisionais dão nota, no respectivo último relatório, que o recluso ainda apresenta discurso autocentrado e de vitimização.
Conjugando estas análises particulares com as últimas declarações prestadas pelo recluso, em sede de audição realizada em 10-03-2025, e com aqueloutras que prestou na sua audição realizada em 24-06-2024, transcritas na alínea 6) dos factos provados, consideramos, tal como perfilhado pelo Ministério Público no seu parecer que antecede, que será necessário perceber se estamos perante uma verdadeira alteração de postura e de sentido crítico, mediante uma análise mais prolongada no tempo.
(…)
sendo que, até há cerca de oito meses atrás, o recluso nem sequer assumia a prática de tais crimes, vitimiza-se e culpabilizava as vítimas.
Presentemente, o seu discurso e a sua postura evidenciam uma mudança positiva, mas será genuína? Ou será uma mudança estratégica para almejar a liberdade condicional?
Suscitam-se-nos muitas dúvidas perante uma mudança tão radical, quanto rápida; dúvidas que só com o decurso de mais algum tempo de reclusão poderão ficar resolvidas. Com efeito, julga-se necessário mais algum tempo de reclusão para avaliar se esta mudança de postura do recluso se mantém e se é realmente genuína.”.
Não deixou o Tribunal a quo de ponderar a insuficiente avaliação da sua efectiva capacidade de reinserção social responsável. Fê-lo por considerar que ainda não se verificam elementos para se concluir pela consolidação do necessário juízo de autocensura e por não pode reconhecer-se uma capacidade contentora/dissuasora no apoio de que o recluso beneficia no exterior.
Efetivamente, estando AA em cumprimento de pena única aplicada pela prática de dois crimes de violência doméstica, e não obstante o seu novo relacionamento (mantido há cerca de quatro anos e seis meses – sendo certo que desse tempo, por reporte ao marco dos dois terços da pena, o período de dois anos e sete meses corresponde a tempo de reclusão) ter sido “caracterizado pelo casal como adequado e de entreajuda”, é de todo desaconselhável uma libertação sem uma testagem consolidada da dinâmica deste relacionamento num meio menos contentor. Não deixou o Tribunal a quo de ponderar que “só em 07-02-2025 lhe foi deferida a primeira licença de saída jurisdicional, apesar de dois pedidos feitos anteriormente”.
Todas as circunstâncias consideradas, com assento nos factos provados, dão nota de sérias, fundadas e profundas dúvidas quanto à possibilidade de se formular um juízo de prognose efectivamente positivo de que o recluso conduzirá, em liberdade, no futuro, a sua vida de forma responsável e afastado da prática de crimes, impedindo que se lance mão de um mecanismo — o da liberdade condicional aos dois terços da pena de prisão cumprida — cuja natureza, como supra se referiu, tem carácter excepcional.
Assim, afigura-se-nos que o expendido a este propósito na decisão recorrida não merece qualquer censura e impõe que se conclua, como ali, que o percurso prisional do recluso deverá ser consolidado por forma a reduzir os factores de risco e vulnerabilidade que ainda apresenta em grau considerável e que não permitem a assunção de um "risco prudente" – É imperioso reconhecer que persistem exigências de prevenção especial que impedem que se formule um juízo de prognose favorável quanto à conduta do recluso em liberdade, razão pela qual se mostra plenamente avisado seguir o parecer emitido pelo Ministério Público.
Nestes termos, sem necessidade de mais considerandos, por despiciendos, concluímos que a decisão recorrida não merece qualquer reparo e, em consequência, o recurso interposto pelo recluso não pode deixar de ser julgado improcedente.
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V. DECISÃO
Pelo exposto acordam os Juízes desta Relação em jugar improcedente o recurso interposto pelo recluso AA e, em consequência, em confirmar a douta decisão recorrida nos seus precisos termos.
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Tributação.
Condena-se o recluso no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC.
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D.N.
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O presente acórdão foi elaborado pelo Relator e por si integralmente revisto (art. 94º, n.º 2 do C.P.P.).
Évora, 3 de junho de 2025
Jorge Antunes (Relator)
Manuel Ramos Soares (vencido, conforme declaração de voto infra)
Mafalda Sequinho dos Santos
Declaração de voto de vencido:
Votei vencido porque teria revogado a decisão recorrida e determinado a sua substituição por outra que concedesse a liberdade condicional.
Os fatores de ponderação sobre as perspetivas de reinserção social em liberdade, sem necessidade de cumprimento do remanescente da pena em reclusão são globalmente positivos, como, de resto, está assinalado na decisão recorrida. É de valorizar, especialmente, o facto de o recluso ter uma nova relação marital, que os serviços de reinserção social avaliam como adequada e equilibrada, que diminui os riscos de reincidência, de se encontrar em RAI e ter beneficiado de uma saída jurisdicional, tudo sem percalços, de trabalhar no EP e sobretudo de se encontrar a pagar voluntariamente uma das indemnizações em que foi condenado e de ter boas perspetivas laborais para poder continuar a fazer esses pagamentos.
Os aspetos negativos salientados na sentença – um trecho do relatório dos serviços do estabelecimento prisional e a mudança de atitude do recluso da audição realizada em 24jun2024 para a realizada em 16mar2025, considerada meramente tática – estão, salvo o devido respeito, empolados no seu significado e descontextualizados. Lidos os relatórios e o auto de audição do arguido, não lhes atribuo o impacto negativo dado na sentença recorrida.
Parece-me, pois, em conclusão, que, com as adequadas condições de fiscalização e imposição de deveres, nada obstaria à libertação condicional do recorrente.
Manuel Ramos Soares
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1 Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 04.07.2012 – Relator: Desembargador Joaquim Gomes - decisão proferida no processo n° 1751/10.7TXPRT-H.P1, disponível em: http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/7a5e107991e3067980257a4400397469?OpenDocument