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ACOMPANHAMENTO DE MAIOR
DESIGNAÇÃO DO ACOMPANHANTE
DESIGNAÇÃO PELO TRIBUNAL
PRESTAÇÃO DE CONTAS
Sumário
I - Na reapreciação da prova a Relação goza da mesma amplitude de poderes da 1.ª instância e, tendo como desiderato garantir um segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto impugnada, deve formar a sua própria convicção. II - Na designação do acompanhante, deve ser dada primazia à escolha feita pelo beneficiário, desde que este a possa fazer de forma livre e consciente e se a escolha feita é a que melhor serve o interesse imperioso do beneficiário. III – O exercício da autonomia pelo beneficiário não exige que a declaração de vontade do beneficiário se faça em momento em que não se verifique qualquer declínio das suas aptidões. Exige, sim, que este tenha capacidade bastante para efetuar tal escolha de forma livre e esclarecida. IV - A designação do acompanhante passa a caber exclusivamente ao Tribunal inexistindo escolha por parte do beneficiário, na falta de capacidade e discernimento do beneficiário para avaliar o conteúdo e alcance da sua decisão ou quando a escolha não se adequar ao interesse imperioso do beneficiário. V - O acompanhante presta contas apenas quando cesse a sua função ou, na sua pendência, quando assim seja determinado judicialmente (cf. artigo 151.º, nº 2 do CCivil), razão pela qual, na decisão que decrete as medidas de acompanhamento, não tem o tribunal recorrido que fixar qualquer obrigação a esse nível.
Texto Integral
Processo nº 835/21.0T8VFR.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro-Juízo Local Cível de Santa Maria da Feira-...
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Dr. Miguel Baldaia
2º Adjunto Des. Dr.ª Teresa Sena Fonseca
AA, residente na Quinta ..., ..., ... ...; BB, residente na Rua ..., ...; CC, residente na Rua ..., ...; e DD, residente na Rua ... norte, ... ..., intentaram a presente ação especial de acompanhamento, com pedido de suprimento do consentimento, a favor de EE, residente na Travessa ..., ..., ..., concelho ....
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Tendo o processo seguido os seus regulares termos foi, a final, proferida decisão que, julgando a ação procedente por provada decretou, além do mais, a favor de EE, nascido a ../../1936, as seguintes medidas de acompanhamento: I-Atribuir-se o poder de representação geral e de administração total de bens do beneficiário, em conformidade com o disposto nos artigos 138.º e 145.º, n.º 2, al.ºs b) e c), e n.º 4, do Código Civil, ao acompanhante, incluindo o de movimentação de contas bancárias até ao montante de € 3.500,00 mensais, cujo valor será atualizado anualmente a partir de 1 de Janeiro de cada ano em função da respetiva taxa de inflação; II-Vedar-lhe o direito para contrair casamento, perfilhar e para testar, conforme resulta do disposto nos artigos 1601.º, al. b), 1850.º, n.º 1, e 2189.º, al. b), do Código Civil, com as alterações resultantes da redação que lhes foi introduzida pela Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto, bem como o de constituir união de facto, de recorrer à procriação medicamente assistida (cf. art.º 6.º, n.º 2, da Lei n.º 32/2006, de 26 de Julho, com a redação ora introduzida) e de adotar, de se deslocar, sozinho, no país ou no estrangeiro, fixar domicílio e residência e de celebrar negócios da vida corrente.
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Mais se nomeou como acompanhante ao requerido/beneficiário o seu irmão FF.
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Não se conformando com o assim decidido veio o Requerido interpor recurso rematando com as seguintes conclusões: 1-O Artigo 143.º do CC refere que a escolha do acompanhado deve ser respeitada. 2- O acompanhado declarou em 18/05/2021, quando foi inquirido pelo Tribunal e perante o perito medico qual a sua escolha: o filho GG ou a filha HH, numa altura em que se encontra firmado nos autos o acompanhado não carecer de acompanhamento e outrossim estar no gozo das suas faculdades. 3- O Tribunal ignorou por completo a escolha do acompanhado, nem sequer a referindo, escolha essa constante no relatório medico junto os autos em 25/06/2021. 4- Deve constar nos factos provados: “O acompanhado declarou que escolheria o filho GG ou a sua filha HH, como as pessoas da sua confiança para o ajudarem caso viesse a precisar de ajuda no futuro”. 5- Deve assim ser o filho GG o designado para o cargo de acompanhante de seu pai. 6- De forma surpreendente, o Tribunal veio a optar e escolher um irmão do requerido, que foi inquirido duas vezes como testemunha, indicada pelos 4 filhos requerentes. Tal corresponde a uma decisão surpresa, que impediu devidamente o contraditório, nulidade que expressamente se argui. 7- Ocorre a absoluta ausência de elementos quanto à situação pessoal do acompanhante designado, faltando um relatório social sobre a pessoa escolhida, que in casu se justifica. 8- Esta pessoa do seu irmão, por outro lado não pode ser nomeado acompanhante, porquanto, considerando que o acompanhado é titular de valores monetários de vários milhões de euros, este seu irmão alegadamente diz que lhe tratou de um assunto fiscal, que se entende credor do acompanhado. 9- E considerando que o acompanhado nunca perguntou ao acompanhante se devia alguma coisa, considerando que o acompanhante se recusa em pleno Tribunal a dizer quando vai apresentar a conta dos seus honorários, e que se recusa a dizer qual o valor dos seus honorários, conforme a sua inquirição no dia 14/01/2022 10- Nomear esta pessoa como acompanhante é, com todo o devido respeito não perceber um manifesto conflito de interesses existe entre credor e devedor, cumulados na mesma pessoa, sendo este com acesso direito a essas contas bancárias do acompanhante, sendo certo que o acompanhado não lhe reconhece qualquer credito. 11- Deveria ficar provado nos factos provados que: “O Sr. FF sente-se credor do seu irmão em valores que se recusou a informar o Tribunal, que o acompanhado nunca lhe pediu contas, e mais se recusou a informar quando apresentaria a conta relativa a esses honorários”. 12- Por outro lado consta dos autos que o FF, nomeado acompanhante, tentou impedir que os filhos GG e HH de almoçar fora com o pai, proibindo expressamente essas saídas sem o seu consentimento, em clara oposição com os superiores interesses do acompanhado, respeitando as vontades dos outros 4 filhos. 13- Deve ser dado por provado “que o acompanhante tentou impedir que os filhos GG e HH saíssem do lar com o seu pai, para almoçar conforme documento por si assinado em 23/08/2021”. 13- Como outro lado a pedido da requerente BB assumiu o FF a colocação do acompanhado no Lar 1..., escondendo dos filhos GG e HH essa escolha e decisão. 14- Deve assim ser dado por provado: “que o acompanhante decidiu unilateralmente a colocação do acompanhado em agosto de 2021 no Lar 2..., sem consultar ou avisar os filhos GG e HH” 15- Estes factos denunciam á saciedade que o acompanhante nomeado pelo Tribunal não considera os filhos escolhidos pelo acompanhado para cuidarem dele, que não se coíbe de praticar atos que os afastem do pai, tudo no interesse dos 4 filhos requerentes e não no interesse do acompanhado. 16- O Tribunal decidiu acolher como mais credível a versão dos 4 filhos requerentes e da testemunha FF que veio a ser nomeado como acompanhante. Entende o recorrente que o Tribunal ignorou um conjunto de factos que permitem uma leitura e uma decisão totalmente diferente. 17- Deveria constar dos factos provados: “que a requerente BB e demais requerentes são testemunhas da ex-esposa do acompanhado contra este em providencia cautelar de arrolamento contra o acompanhado, conforme a própria confessou”. 18- Não se afigura correto ou digno manter no conselho de família pessoas que são testemunhas contra o acompanhado, pelo que a requerente BB, deve ser afastada. 19- 0 acompanhado deveria estar internado no Lar em 3... e não em ..., pois estaria perto de casa, poderia passar em sua casa umas horas com uma cuidadora, poderia passar tempo com amigos no Parque e no Lar ... teria muitas pessoas conhecidas com o estimam, inclusivamente o medico da instituição seu cunhado e amigo. 20- Inexiste um relatório social para se estabelecer onde o acompanhado estaria melhor, o que torna a decisão nula. 21- Não fosse o mandatário do acompanhado em setembro de 2021 alertar o Tribunal e o Lar 2..., para a carga excessiva de medicação que o acompanhado estava a sofrer, esta nunca seria alterada. 22-Estar em ..., num lar onde ninguém o conhece, é estar desterrado, estar em ... é tirar ânimo, alegria e contato social. Nesta fase da sua vida, a necessidade de estímulos positivos é essencial por um lado para não piorar a sua condição, como por outro lado é essencial para o seu bem-estar e mesmo recuperação. 23-Conforme denunciado por requerimento de 29/04/2021, 3 dos 4 requerentes deslocaram-se ao escritório do mandatário do acompanhado e agrediram fisicamente o irmão GG, e agrediram verbalmente o acompanhado á porta do escritório. Porque, pura e simplesmente não queriam que o pai, o acompanhado contestasse a ação. 24- Deve ser dado por provado que “os requerentes vigiavam o acompanhado e impediram o seu irmão II de visitar o acompanhado em junho de 2021”. 25- Igualmente não se afigura razoável, estando-se a falar de um património financeiro na ordem dos 6 milhões de euros, que não se fixe que acompanhante o dever de prestação de contas. 26-Estando-se presente 6 filhos, divididos em 2 grupos, com relações cortadas, é imperioso que se imponha transparência na relação vindoura, que o acompanhamento acarreta.
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Devidamente notificados contra-alegaram os Requerentes concluindo pelo não provimento do recurso
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II- FUNDAMENTOS
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cf. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
No seguimento destas são as seguintes as questões que importa apreciar a decidir:
a)- saber se tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto; b)- decidir em conformidade face ao julgamento da impugnação da matéria de facto.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
É a seguinte a matéria de facto que vem dada como provado pelo tribunal recorrido:
1. O beneficiário nasceu a ../../1936, encontrando-se no estado de divorciado.
2. É portador de “Síndrome Demencial”, com deterioração mental, que atinge grave e globalmente todas as funções psíquicas.
3. Esta situação clínica decorre de patologia de carácter adquirido e progressivo, rapidamente progressivo, sendo incapacitante desde data posterior a 18-05-2021, provavelmente desde julho de 2021.
4. À data da instauração da presente ação (19-03-2021) residia sozinho, numa casa situada em ..., onde se manteve a viver sozinho desde que está divorciado há cerca de 25 anos.
5. Tem seis filhos todos com as suas vidas familiares independentes e devidamente organizadas.
6. Adoeceu gravemente infetado por SARS-COV-2, tendo sido internado no dia 16-02-2021, com pneumonia intersticial bilateral grave, disfunção hematológica e síndrome demencial de etiologia não esclarecida, ficando muito debilitado fisicamente, dependente nas atividades de vida diárias, prostrado, com períodos confusionais e de agitação.
7. Até esse episódio tinha sido saudável, não fazendo qualquer medicação regularmente.
9. Teve alta para o domicílio após um período em que recebeu cuidados numa Estrutura de Apoio Residencial.
10. Teve novo recurso ao Serviço de Urgência, no dia 22-05-2021, tendo sido levado pela filha BB, sendo referido como motivo de admissão “comportamento estranho, num homem descrito como autónomo para as atividades de vida diárias (AVD), que vive sozinho, mas tem o apoio dos filhos”.
11. Ao exame objetivo apresentava-se consciente, orientado no tempo e no espaço e colaborante durante a anamnese, discurso fluente, algo ansioso e não percebendo a razão para a ida ao hospital; diz sentir-se bem e que tem ido regularmente ao médico assistente e feito análises; menciona que os filhos querem provar que está demente para ficarem com a herança; exame neurológico sumário sem alterações.
12. Fez Tomografia Axial Computorizada (TAC) cerebral, com alterações inocentes compatíveis com a idade.
13. Foi avaliado por neurologia, apresentando-se consciente, com discurso de alto volume e discretamente desinibido, negando qualquer défice cognitivo, sem assimetria motora e sem parkinsonismo.
14. Tem alta no mesmo dia, com indicação de manter acompanhamento, com o neurologista que já o acompanha, com o diagnóstico de “Demência Soe, com perturbação do comportamento".
15. Foi avaliado em Consulta de Neurologia pelo Prof. Doutor JJ. Na sua Declaração Médica de 04-05-2021 consta: “senhor com boa aparência, bem cuidado, atento e muito colaborante, é autónomo e conduz um veículo ligeiro sem dificuldade, faz as suas próprias compras sem ajuda; não refere queixas cognitivas, cuja ausência é testemunhada por um filho; não refere qualquer doença prévia, mantendo-se ativo apesar da idade; não toma qualquer medicação; o exame neurológico é normal; na avaliação neuropsicológica não se verificam alterações cognitivas significativas, exceto um pequeno declínio em provas de evocação verbal diferida e muitos ligeiros defeitos das funções de controlo executivo (Montreal Cognitive Assessment-MoCA: 27/30 pontos).
16. Posteriormente foi atendido no Serviço de Urgência do Centro Hospitalar 2... a 20-06-2021 por episódio de alteração do estado de consciência e movimentos involuntários dos membros, o que foi interpretado como prostração e bradicinesia/tremor/rigidez por provável reação iatrogénica a neurolépticos ou eventual quadro para-infecioso.
17. No dia 08-07-2021 foi encaminhado ao Serviço de Urgência do Centro Hospitalar 1... pela PSP ... por desorientação temporoespacial, desorganização comportamental, agitação psicomotora heteroagressividade.
18. Foi avaliado por Medicina Interna e depois por Psiquiatria que concluiu tratar-se de um doente com ideação delirante persecutória, com atividade alucinatória auditiva, com desorganização do padrão comportamental, com hostilidade e risco de heteroagressividade.
19. Pelo quadro descrito em 17 e 18 e atendendo à incapacidade sociofamiliar de lidar com a situação, propôs-se internamento que o doente aceitou.
20. Foi internado no Hospital ..., tendo melhorado apesar de algumas intercorrências, como queda da própria altura que obrigou a avaliação no Serviço de Urgência do Centro Hospitalar 1... (exames auxiliares de diagnóstico normais), isolamento posterior durante 7 dias por não ser capaz de usar máscara e de cumprir distanciamento social, e episódios hipotensivos e hiperglicémicos.
21. Aquando da alta, a 09-08-2021, apresentava-se consciente, calmo e colaborante, parcialmente orientado no espaço, no tempo e na pessoa, postura adequada, contacto cordial, atenção captável e mantida, discurso fluente, mas pouco espontâneo, com perda da ideia alvo, não verbaliza ideação delirante, sem solilóquios, humor eutímico, sono e apetite mantidos, não verbalizando ideação auto ou heterolesiva.
22. Saiu do Hospital com o diagnóstico de Demência com Perturbação do Comportamento, melhorado, para a ERPI ..., em ..., graças ao trabalho realizado pelo Serviço Social do Hospital com conhecimento dos familiares que foi possível contactar, orientado para a Consulta de Psiquiatria do Centro Hospitalar 2... e com a indicação de manter tratamento com rivastigmina (medicação específica para a Demência), olanzapina (neuroléptico tranquilizante), lorazepam (benzodiazepina tranquilizante), trazodona (antidepressivo facilitador do sono), sitagliptina (antidiabético oral), pantoprazola (para proteção gástrica e furosemida (diurético).
23. Foi recebido em Consulta de Neurologia pelo seu Neurologista assistente no dia 28-09-2021, e segundo nota clínica emitida pelo mesmo "tem uma deterioração cognitiva que no último meio ano evoluiu de forma rápida, na consulta não demonstrou agitação, embora o comportamento seja nitidamente demencial".
24. As avaliações clínicas realizadas nos dias 29-09-2021, no Tribunal, com Interrogatório do Requerido realizado pelo Meritíssimo Juiz, e no dia 14-10-2021, na ERPI, confirmaram a existência de alterações da memória, especialmente da memória recente, desorientação no tempo e no espaço, prejuízo na atenção, capacidade de concentração e no discurso, com respostas ao lado, ideação perseverante, inquietação, humor disfórico, irritável, com acentuado prejuízo do juízo crítico, tendo assim perdido a sua autonomia e a sua capacidade de gerir a sua pessoa e bens.
25. Não pareceu que entendesse as razões para a avaliação que estava a acontecer.
26. A capacidade geral de discernimento e de crítica mostrou-se prejudicada, nomeadamente para a sua situação mórbida e também para o exame a que estava a ser sujeito.
27. Constata-se a existência de uma limitação grave da sua faculdade de discernimento.
28. Está completamente dependente na utilização dos recursos da comunidade, nomeadamente nos cuidados de saúde e segurança.
29. À luz dos conhecimentos médicos atuais não se prevê que cure independentemente de qualquer terapêutica.
30. Apesar disso é necessária a continuação dos tratamentos médicos e a manutenção dos cuidados que tem recebido na ERPI, pelo seu crescente grau de dependência.
31. A Instituição onde se encontra atualmente reúne as condições necessárias em termos de equipamentos e equipa multidisciplinar.
32. A Instituição tem assegurado também o devido distanciamento em relação às dificuldades e divergências dos filhos no que respeita aos cuidados exigidos pela condição clínica do pai o que não lhes tem possibilitado criar as condições de suporte social que promovessem a continuação de um processo de envelhecimento digno e mais saudável.
33. Tem tido saídas diárias, saindo com os vários filhos (sai com um filho, mas outros ficam vigilantes) e, em regra, volta mais confuso.
34. A deficiência constatada limita séria e muito provavelmente de forma permanente as capacidades do Requerido, impedindo-o de gerir a sua pessoa e bens, nomeadamente celebrar negócios próprios da vida corrente e mesmo na tomada de cuidados de saúde e segurança.
35. O irmão do Requerido, FF, assumiu perante a responsabilidade pela pessoa do Requerido, tendo procedido ao respetivo internamento na Estrutura Residencial A..., sito na Rua ..., ..., ... em ....
36. O referido FF tem assumido o pagamento das mensalidades junto do ERPI, que orça, em média, o montante de € 1.460,25 acrescido de € 120,00 mensais com despesas extra e medicamentosas.
37. O filho do Requerido, GG, inscreveu o Requerido na Estrutura Residencial B..., pertencente à Associação Bem Estar ..., cujos custos imputados mensalmente, tendo por referência a data de 19 de Janeiro de 2022, numa possível admissão, eram de € 1.240,00 (quarto duplo) ou € 1.390 (quarto individual), excluindo as despesas extra, como medicação e produtos de incontinência.
38. Não há notícia de que o beneficiário tenha celebrado testamento vital ou outorgada procuração para cuidados de saúde.
39. O Requerido, até ao momento em que adoeceu gravemente e foi internado em 16-02-2021, foi absolutamente autónomo na tomada de decisões sobre a sua pessoa e administração de bens.
40. Desde, pelo menos, o período em que o Requerido se divorciou o mesmo manteve um relacionamento regular com a sua filha BB, a qual o visitava todos os dias na respetiva, onde lhe levava pão fresco e o jornal.
41. Era a filha BB quem cuidava da limpeza da roupa do Requerido e que diligenciava pela limpeza da casa.
42. O Requerido era totalmente autónomo na gestão do seu património, tendo aforrado valores na ordem dos seis milhões de euros, que tem depositado em Bancos em Portugal e em Espanha.
43. O Requerido nunca deu a conhecer aos filhos o dinheiro que tinha.
44. Declarou, na audição pessoal de 18-05-2021, que emprestou dinheiro aos filhos GG e DD e precisou em seu valor.
45. Pedia habitualmente conselhos financeiros ao irmão FF, solicitando o seu apoio sempre que tinha necessidade e a quem confidenciou o seu património bancário.
46. Aufere, ainda, uma pensão de reforma.
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III-O DIREITO
Questão prévia:
Nas suas contra-alegações vieram os Requerentes alegar a caducidade do mandato estribando-se na factie species da al. b) do artigo 1174.º do CCivil.
Preceitua esta alínea que o mandato caduca:
(…)
b)- Por sentença de acompanhamento do mandante ou do mandatário, quando essa sentença, relativamente aos atos abrangidos pelo mandato, atribua poderes de representação ao acompanhante ou determine a necessidade de autorização prévia.
Como se extrai da referida alínea a caducidade do mandato ocorre não apenas pelo simples facto de haver uma sentença de acompanhamento, mas apenas se e quando essa sentença interferir diretamente nos atos abrangidos pelo mandato.
Ou seja, há dois cenários em que o mandato caduca: a)- o acompanhante fica com poderes de representação, isto é, se a sentença atribuir ao acompanhante poderes de representação para os atos que estavam cobertos pelo mandato, o próprio mandato deixa de fazer sentido, pois o acompanhado já não pode atuar sozinho nesses atos; b)- determinação de autorização prévia, isto é, se a sentença determinar que os atos que estavam abrangidos pelo mandato só podem ser praticados com autorização prévia, então o mandato perde a sua autonomia e caduca.
Acontece que, em qualquer dos casos o mandato só se extingue quando a sentença de acompanhamento transitar em julgado, pois só então ela produz efeitos definitivos a menos que a sentença tenha execução provisória, adveniente de ao recurso interposto da mesma ter efeito meramente devolutivo o que não é o caso [cf. artigo 647.º, nº 3 al. a) do CPCivil].
É que até ao trânsito em julgado, o acompanhado mantém a capacidade jurídica que tinha antes da sentença, salvo se a decisão tiver execução provisória.
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Diante do exposto e uma vez que a decisão de acompanhamento ainda não transitou em julgado torna-se evidente que ainda não operou a caducidade do mandato forense que foi conferido ao ilustre advogado.
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Como supra se referiu a primeira questão que vem colocada no recurso prende-se com: a)- saber se tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto.
Importa antes de nos debruçarmos sobre a questão enunciada que ao processo de acompanhamento de maior são lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, o disposto nos processos de jurisdição voluntária no que respeita aos poderes do juiz, ao critério de julgamento e à alteração das decisões com fundamento em circunstâncias supervenientes (cf. artigo 981.º do CPCivil).
Significa, portanto, que o referido processo se encontra sujeito aos seguintes princípios básicos:
a)- O tribunal pode investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar inquéritos e reconhecer informações convenientes, só sendo admitidas as provas que o juiz considere necessárias (cf. artigo 986.º, nº 2, CPCivil);
b)- Nas providências a tomar, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adotar em cada caso a solução que julgue mais conveniente e oportuna” (artigo 987º CPC);
c)- As resoluções podem ser alteradas, sem prejuízo dos efeitos já produzidos, com fundamento em circunstâncias supervenientes que justifiquem a alteração (dizem-se supervenientes tanto as circunstâncias ocorridas posteriormente à decisão como as anteriores, que não tenham sido alegadas por ignorância ou outro motivo ponderoso) (artigo 988.º).
Não existindo, em direito positivo, processos inquisitórios puros, nem processos dispositivos puros, as referidas normas consagram a prevalência do princípio do inquisitório sobre o princípio do dispositivo:
a) ao nível da conformação do objeto da ação, atribuindo ao tribunal amplos poderes quanto ao conhecimento dos factos, quer ao nível das providências a tomar. “Os factos essenciais que constituam a causa de pedir não delimitam o âmbito de cognição do tribunal já que este pode considerar outros factos (complementares, concretizadores, instrumentais, notórios, de que tenha conhecimento no exercício das suas funções ou que sejam constitutivos do desvio da função processual), para além daqueles que sejam alegados pelas partes”, “não estando dependente de nenhum ónus de alegação pelos intervenientes, na precisa medida em que pode conhecer oficiosamente os factos, quer por investigação própria, quer na sequência de alegação dos interessados”.[1]
b) ao nível da instrução da causa–o tribunal não está adstrito às demonstrações probatórias que as partes possam oferecer para fundamentar a decisão, admitindo também aquelas que o juiz, por sua iniciativa, possa trazer ao processo, podendo ainda recusar a produção de provas quando as considere desnecessárias.
“Nos processos de jurisdição voluntária, o juiz não está, em princípio, dependente dos factos direta ou indiretamente alegados pelos interessados, seja qual for a função que aqueles desempenhem no processo, dispondo de uma ampla iniciativa probatória, não estando dependente de qualquer ónus de alegação e apenas admitindo as provas que entender necessárias”.[2]
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Diante do exposto, revela-se inócuo o pretendido pelos apelados no que se refere à rejeição da impugnação da matéria de facto pelo não cumprimento dos ónus impostos perlo artigo 640.º do CPCivil.
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Isto dito, como resulta do corpo alegatório e das respetivas conclusões o apelante impugna a decisão da matéria de facto, alegando que deveriam ter sido dados como provados um conjunto de factos.
Vejamos, então, se lhe assiste razão.
O controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialeticamente na base da imediação e da oralidade.
Ora, contrariamente ao que sucede no sistema da prova legal, em que a conclusão probatória é prefixada legalmente, no sistema da livre apreciação da prova, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objeto do julgamento, com base apenas no juízo que fundamenta no mérito objetivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo.
“O que é necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela sobre o julgamento do facto como provado ou não provado”.[3]
De facto, a lei determina expressamente a exigência de objetivação, através da imposição da fundamentação da matéria de facto, devendo o tribunal analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (artigo 607.º, nº 4 do CPCivil).
Todavia, na reapreciação dos meios de prova, a Relação procede a novo julgamento da matéria de facto impugnada, em busca da sua própria convicção, desta forma assegurando o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria, com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância.[4]
Impõe-se-lhe, assim, que “analise criticamente as provas indicadas em fundamento da impugnação, quer a testemunhal, quer a documental, conjugando-as entre si, contextualizando-se, se necessário, no âmbito da demais prova disponível, de modo a formar a sua própria e autónoma convicção, que deve ser fundamentada”.[5]
Tendo presentes estes princípios orientadores, vejamos agora se assiste razão ao apelante, neste segmento recursivo da impugnação da matéria de facto, nos termos por ela pretendidos.
Alega o apelante que:
Deve constar nos factos provados que: “O acompanhado declarou que escolheria o filho GG ou a sua filha HH, como as pessoas da sua confiança para o ajudarem caso viesse a precisar de ajuda no futuro”.
Para o efeito convoca as declarações do apelante prestadas em 18/05/2021 e o relatório pericial junto aos autos em 25/06/2021.
Ouvidas as referidas declarações delas consta o seguinte:
A instâncias do Sr. juiz do processo foi perguntado ao apelante: “se algum dia o Sr. EE precisasse de ajuda porque já não podia, quem escolheria?
Resposta: “Eu tenho duas filhas. Uma vive em ..., a outra vive em .... Eu penso que ambas eram capazes de me acolher para me levar a fim da vida”.
Pergunta: Qual era a pessoa em quem o Sr. confiaria numa situação em que já não fosse capaz de decidir? Em quem tinha mais confiança?
Resposta: “Era a HH e o GG”, lido muito com eles (...) o mais velho foi quem pôs nesta situação, ficou pouco satisfeito quando não lhe dei um terreno há 30 anos (…)”.
Pergunta: Nas pessoas que intentaram a presente ação (…) se o Sr. precisasse de ajuda confiaria nelas?
Resposta: “Começo pelo AA que foi o autor deste processo (…)”.
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Com base nas referidas declarações deverá ser dado como provado o seguinte facto: “Na inquirição ocorrida em 18/05/2021 o acompanhado declarou que as suas duas filhas, se estivesse numa situação em que precisasse seriam capazes de o acolher até ao fim da sua vida e, se estivesse numa situação em que já não fosse capaz de decidir era nos seus filhos GG e HH em quem mais confiaria para o ajudar”.
Pretende depois o apelante que deve ficar nos factos provados que: “O Sr. FF sente-se credor do seu irmão em valores que se recusou a informar o Tribunal, que o acompanhado nunca lhe pediu contas, e mais se recusou a informar quando apresentaria a conta relativa a esses honorários”.
Como se torna evidente o citado item encerra uma conclusão e não um facto.
Efetivamente, o ponto em causa encerra um juízo valorativo sobre o comportamento do Sr. FF ao afirmar que ele “se recusou a informar” determinados valores e a apresentar a conta dos honorários.
Uma afirmação é conclusiva quando, em vez de descrever objetivamente os factos, interpreta-os ou tira ilações sobre eles. Neste caso, a frase não se limita a relatar que o Sr. FF não indicou os valores ou a data da apresentação da conta, mas assume que houve uma "recusa" da sua parte. Isso implica uma intenção ou um comportamento deliberado, o que configura uma conclusão e não apenas a narração de um facto objetivo.
Importa não esquecer que o artigo 607.º, nº 4 do CPCivil[6] dispõe que na fundamentação da sentença, o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.
No âmbito do anterior regime do Código de Processo Civil, o artigo 646.º, nº 4 do CPCivil, previa, ainda, que: têm-se por não escritas as respostas do tribunal coletivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documento, quer por acordo ou confissão das partes”.
Esta norma não transitou para o atual diploma, o que não significa que na elaboração da sentença o juiz deva atender às conclusões ou meras afirmações de direito.
Ao juiz apenas é atribuída competência para a livre apreciação da prova dos factos da causa e para se pronunciar sobre factos que só possam ser provados por documento ou estejam plenamente provados por documento, admissão ou confissão.
Compete ao juiz singular determinar, interpretar e aplicar a norma jurídica (artigo 607.º, nº 3 do CPCivil) e pronunciar-se sobre a prova dos factos admitidos, confessados ou documentalmente provados (artigo 607.º, nº 4).
Às conclusões de direito são assimiladas, por analogia, as conclusões de facto, ou seja, “os juízos de valor, em si não jurídicos, emitidos a partir dos factos provados e exprimindo, designadamente, as relações de compatibilidade que entre eles se estabelecem, de acordo com as regras da experiência“[7].
Antunes Varela considerava que deve ser dado o mesmo tratamento “às respostas do coletivo, que, incidindo embora sobre questões de facto, constituam em si mesmas verdadeiras proposições de direito“[8].
Em qualquer das circunstâncias apontadas, confirmando-se que, em concreto, determinada expressão tem natureza conclusiva ou é de qualificar como pura matéria de direito, deve continuar a considerar-se não escrita porque o julgamento incide sobre factos concretos.
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Diante do exposto nunca o referido ponto poderia constar dos factos provados.
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Pretende depois o apelante que deve ser dado como provado que:“que o acompanhante tentou impedir que os filhos GG e HH saíssem do lar com o seu pai, para almoçar conforme documento por si assinado em 23/08/2021”.
Para o efeito convoca o seu requerimento apresentado nos autos em 23/08/2021 e capeado pela declaração do Sr. FF de 20/10/2021 à qual, aliás, se fez referência na análise do ponto anterior.
Ora, salvo o devido respeito, o requerimento do apelante apresentado nos autos em 23/08 limita-se a fazer uma narrativa que precisa de ser demonstrada.
Acontece que a referida declaração do Sr. FF não tem essa virtualidade, pois que, a ERPI em causa, limitou-se a comunicar que as saídas estavam impedidas sustentando esse impedimento na citada declaração.
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Propugna depois o apelante que deve ser dado como provado que: “que o acompanhante decidiu unilateralmente a colocação do acompanhado em agosto de 2021 no Lar 2..., sem consultar ou avisar os filhos GG e HH”
O ponto em questão já tem expressão na resenha dos factos provados bastando, para o efeito, ler o ponto 35. da referida resenha suportado, aliás, em termos probatórios na cópia da declaração junta aos autos em 20/10/2021, da autoria do referido acompanhante, razão qual se revela inútil, sob pena de repetição, a pretendido aditamento do mencionado ponto aos factos provados.
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Alega também o apelante que deveria constar dos factos provados que: “a requerente BB e demais requerentes são testemunhas da ex-esposa do acompanhado contra este em providencia cautelar de arrolamento contra o acompanhado, conforme a própria confessou”.
Mas pergunta-se qual a relevância em termos de solução jurídica a dar ao pleito do apontado facto?
A resposta é simples: nenhum.
Acaso a determinada circunstância inibia os Requerentes de propor a presente ação, que como se revelou ao longo do seu desenvolvimento era mais que justificada?
Desta forma, atento o carácter instrumental da reapreciação da decisão da matéria de facto, no sentido de que a reapreciação pretendida visa sustentar uma certa solução para uma dada questão de direito, a inocuidade da aludida matéria de facto justifica que este tribunal indefira essa pretensão, em homenagem à proibição da prática no processo de atos inúteis (artigo 130.º do CPCivil).
Como refere Abrantes Geraldes,[9] “De acordo com as diversas circunstâncias, isto é, de acordo com o objeto do recurso (alegações e, eventualmente, contra-alegações) e com a concreta decisão recorrida, são múltiplos os resultados que pela Relação podem ser declarados quando incide especificamente sobre a matéria de facto. Sintetizando as mais correntes: (…) n) Abster-se de conhecer da impugnação da decisão da matéria de facto quando os factos impugnados não interfiram de modo algum com a solução do caso, designadamente por não se visionar qualquer solução plausível da questão de direito que esteja dependente da modificação que o recorrente pretende operar no leque de factos provados ou não provados”.
Bem pode dizer-se, pois, que a impugnação da decisão sobre matéria de facto, neste conspecto, é mera manifestação de “inconsequente inconformismo”[10], razão pela qual nos abstemos de a reapreciar relativamente ao facto em questão.[11]
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E as mesmas considerações valem, mutatis mutandis, em relação à alegação do apelante de que deve ser dado por provado que:“os requerentes vigiavam o acompanhado e impediram o seu irmão II de visitar o acompanhado em junho de 2021”.
Efetivamente, também o citado ponto factual não tem qualquer relevância em termos de decisão jurídica da ação.
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Diante do exposto deve ser aditado à fundamentação factual apenas o seguinte facto:
47. Na inquirição ocorrida em 18/05/2021 o acompanhado declarou que as suas duas filhas, se estivesse numa situação em que precisasse seriam capazes de o acolher até ao fim da sua vida e, se estivesse numa situação em que já não fosse capaz de decidir era nos seus filhos GG e HH em quem mais confiaria para o ajudar”.
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Alterada a fundamentação factual pela forma referida importa agora: b) saber a subsunção jurídica deve ou não ser alterada.
a)- A questão da nomeação do acompanhante.
Como emerge da decisão foi nomeado acompanhante ao apelante o seu irmão Dr. FF.
É contra tal nomeação que se insurge o apelante contrapondo que devia ter sido nomeado como seu acompanhante o seu filho GG por ter sido essa a manisfetação da sua vontade. Quid iuris?
O artigo 143.º do Código Civil sob a epigrafe “Acompanhante” tem a seguinte redação: 1- O acompanhante, maior e no pleno exercício dos seus direitos, é escolhido pelo acompanhado ou pelo seu representante legal, sendo designado judicialmente. 2- Na falta de escolha, o acompanhamento é deferido, no respetivo processo, à pessoa cuja designação melhor salvaguarde o interesse imperioso do beneficiário, designadamente: a) Ao cônjuge não separado, judicialmente ou de facto; b) Ao unido de facto; c) A qualquer dos pais; d) À pessoa designada pelos pais ou pela pessoa que exerça as responsabilidades parentais, em testamento ou em documento autêntico ou autenticado; e) Aos filhos maiores; f) A qualquer dos avós; g) À pessoa indicada pela instituição em que o acompanhado esteja integrado; h) Ao mandatário a quem o acompanhado tenha conferido poderes de representação; i) A outra pessoa idónea. 3- Podem ser designados vários acompanhantes com diferentes funções, especificando-se as atribuições de cada um, com observância dos números anteriores.
Por sua vez o artigo 144.º do mesmo diploma legal sob a epigrafe “Escusa e exoneração” preceitua o seguinte: 1- O cônjuge, os descendentes ou os ascendentes não podem escusar-se ou ser exonerados. 2- Os descendentes podem ser exonerados, a seu pedido, ao fim de cinco anos, se existirem outros descendentes igualmente idóneos. 3- Os demais acompanhantes podem pedir escusa com os fundamentos previstos no artigo 1934.º ou ser substituídos, a seu pedido, ao fim de cinco anos.
O artigo 145.º rege sobre o “Âmbito e conteúdo do acompanhamento” estabelecendo o seguinte regime: 1- O acompanhamento limita-se ao necessário. 2- Em função de cada caso e independentemente do que haja sido pedido, o tribunal pode cometer ao acompanhante algum ou alguns dos regimes seguintes: a) Exercício das responsabilidades parentais ou dos meios de as suprir, conforme as circunstâncias; b) Representação geral ou representação especial com indicação expressa, neste caso, das categorias de atos para que seja necessária; c) Administração total ou parcial de bens; d) Autorização prévia para a prática de determinados atos ou categorias de atos; e) Intervenções de outro tipo, devidamente explicitadas. 3- Os atos de disposição de bens imóveis carecem de autorização judicial prévia e específica. 4- A representação legal segue o regime da tutela, com as adaptações necessárias, podendo o tribunal dispensar a constituição do conselho de família. 5- À administração total ou parcial de bens aplica-se, com as adaptações necessárias, o disposto nos artigos 1967.º e seguintes.
O artigo 146.º refere-se ao critério do exercício do cargo definindo o “Cuidado e diligência” a observar pelo acompanhante do seguinte modo: 1 - No exercício da sua função, o acompanhante privilegia o bem-estar e a recuperação do acompanhado, com a diligência requerida a um bom pai de família, na concreta situação considerada. 2 - O acompanhante mantém um contacto permanente com o acompanhado, devendo visitá-lo, no mínimo, com uma periodicidade mensal, ou outra periodicidade que o tribunal considere adequada.
O artigo 150.º regula o “Conflito de interesses” entre o acompanhante e o acompanhado do seguinte modo: 1 - O acompanhante deve abster-se de agir em conflito de interesses com o acompanhado. 2 - A violação do dever referido no número anterior tem as consequências previstas no artigo 261.º 3 - Sendo necessário, cabe-lhe requerer ao tribunal autorização ou as medidas concretamente convenientes.
Para além das normas legais citadas, importa ter presente para decidir a questão suscitada, quais foram as medidas de acompanhamento decretadas pelo tribunal a quo e cuja medida não é questionada no recurso.
Essas medidas foram as seguintes:
a)- Atribuir-se o poder de representação geral e de administração total de bens do beneficiário, em conformidade com o disposto nos artigos 138.º e 145.º, n.º 2, al.ºs b) e c), e n.º 4, do Código Civil, ao acompanhante, incluindo o de movimentação de contas bancárias até ao montante de € 3.500,00 mensais, cujo valor será atualizado anualmente a partir de 1 de janeiro de cada ano em função da respetiva taxa de inflação;
b)- Vedar-lhe o direito para contrair casamento, perfilhar e para testar, conforme resulta do disposto nos artigos 1601.º, al. b), 1850.º, n.º 1, e 2189.º, al. b), do Código Civil, com as alterações resultantes da redação que lhes foi introduzida pela Lei n.º 49/2018, de 14 de Agosto, bem como o de constituir união de facto, de recorrer à procriação medicamente assistida (cf. art.º 6.º, n.º 2, da Lei n.º 32/2006, de 26 de Julho, com a redação ora introduzida) e de adotar, de se deslocar, sozinho, no país ou no estrangeiro, fixar domicílio e residência e de celebrar negócios da vida corrente.
Tendo sido estas as medidas que foram consideradas necessárias, a designação do acompanhante deve ter como referencial essas medidas e a atuação que será necessária para as colocar em prática.
Como resulta da leitura das normas legais supracitadas, o acompanhante deve ser maior e no pleno exercício dos seus direitos, donde resulta que terá de ser uma pessoa singular, não pode ser uma instituição, ainda que hospitalar ou de solidariedade social onde o acompanhado se encontre internado ou colocado–sem prejuízo de se aceitar a designação de pessoa singulares indigitada por estas.
O acompanhante é designado judicialmente mas, em regra, deve corresponder ao escolhido pelo próprio acompanhado ou pelo seu representante legal.
A lei não define regras formais ou materiais para a formulação pelo maior dessa escolha.
Por isso, ela poderá resultar de um documento escrito redigido antecipadamente pelo maior em momento em que se encontre em plenas condições para exercer por si mesmo os seus direitos e para acautelar a possibilidade futura da necessidade de acompanhamento, como poderá resultar da audição do beneficiário no decurso do próprio processo se o tribunal concluir que o mesmo mantém capacidade para fazer de modo consciente essa opção. E, cremos, poderá ainda resultar da vontade presumível do beneficiário, se houver elementos para a determinar, isto é, para reconstituir a ideia que o beneficiário formularia se fosse confrontado com a necessidade da escolha à luz do seu modo de ver, pensar e se relacionar com as pessoas do seu convívio.
Na falta de escolha-ou, cremos, se o tribunal julgar a escolha inconveniente por não reconhecer ao acompanhante escolhido idoneidade para o exercício das funções-a nomeação deve recair sobre a pessoa cuja designação melhor salvaguarde o interesse imperioso do beneficiário.
Este é o critério supletivo a observar pelo tribunal, o que significa que o rol de pessoas indicadas nas várias alíneas do n.º 2 do artigo 143.º do Código Civil é meramente exemplificativo- “designadamente” refere o texto da norma– e, sobretudo, que a sequência pela qual eles são indicados não constitui uma ordenação que importe uma regra de precedência obrigatória para o tribunal, sem prejuízo de a ordem seguida revelar uma graduação influenciada por regras da experiência e ser por isso atendível.
Como se evidencia das alegações recursivas o apelante defende que manifestou no processo, aquando da sua inquirição em 18/05/2021, a escolhe do seu acompanhante.
Vem provado nos autos que: “Na inquirição ocorrida em 18/05/2021 o acompanhado declarou que as suas duas filhas, se estivesse numa situação em que precisasse de ajuda seriam capazes de o acolher até ao fim da sua vida e, se estivesse numa situação em que já não fosse capaz de decidir, era nos seus filhos GG e HH em quem mais confiaria para o ajudar” (cf. ponto 47. dos factos provados).
Resulta também dos autos que, em 23/06/2021, portanto, em data posterior à referida inquirição, o apelante era um maior não condicionado no exercício dos seus direitos pessoais e patrimoniais (cf. relatório elaborado pelo Dr. KK junto aos autos em 25/06/2021) conclusão, aliás, que também já constava da avaliação feita em 04/05/2021 na consulta de Neurologia pelo Prof. Doutor JJ (cf. ponto 15. dos factos provados).
A questão que agora importa dilucidar é se, aquela declaração do apelante, pode ser subsumida na factie species do nº 1 do artigo 143.º do CCivil, ou seja, se no caso de vir a tornar-se necessário, escolheria um dos referidos filhos como seu acompanhante.
Ora, a resposta, a nosso ver, respeitando-se, entendimento diverso, é positiva.
Com efeito, o recorrente à data da inquirição (18/05/2021) e mesmo posteriormente (23/06/2021) sendo um maior em pleno gozo das suas faculdades mentais e sem necessidade de acompanhamento, não condicionado no exercício dos seus direitos pessoais e patrimoniais, de forma clara e espontânea afirmou, se qualquer rebuço que, se estivesse numa situação em que já não fosse capaz de decidir, era nos seus filhos GG e HH em quem mais confiaria para o ajudar, ou seja, seria um, desses seus dois filhos, que escolheria como seu acompanhante.[12]
Nestes termos, imperioso se torna reconhecer que devia ter sido um dos referidos filhos designado como acompanhante do recorrente, por forma a respeitar a sua escolha, solução que a lei consagra no já citado nº 1 do artigo 143.º do CCivil.
Aliás, a consagração da referida solução normativa decorre de um princípio estruturante do sistema–o princípio da autonomia (considerando (n) da Convenção das Nações Unidas dos Direitos das Pessoas com Deficiência), que, no caso, se manifesta numa fase prévia ao funcionamento da medida de apoio, não obstante aquela escolha carece de ser confirmada pelo tribunal, a quem compete a última palavra na designação do acompanhante.
Como assim, tendo havido uma escolha livre e consciente por parte do beneficiário/apelante, o tribunal só deve afastar-se dessa escolha se tiver fundamentos bastantes para concluir que o “interesse imperioso do beneficiário” impõe a designação de outro acompanhante, pois que o princípio consagrado na norma (e no instituto em geral) é o do respeito pela autonomia do beneficiário, sendo certo que o tribunal pode ainda designar um acompanhante substituto ou vários acompanhantes, tal como decorre do n.º 3 do art.º 143º do CCivil e do art.º 900.°, n.º 2, do CPCivil.
Acontece que, no caso sub Júdice o tribunal recorrido, como se evidencia da respetiva decisão, nem sequer equacionou, na designação do acompanhante, essa escolha do beneficiário/recorrente, e, por lógica implicância, não a afastou por o interesse imperioso do beneficiário impor outra designação que não aquela escolha.
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Como assim, podendo qualquer um dos citados filhos (GG e HH) ser nomeado acompanhante do apelante, a nosso ver, deve ser designado para ocupar o referido cargo o filho GG, por ter sido designado pela decisão recorrida para membro do conselho de família e, como também aí se refere, ter manifestado a vontade de zelar pelo bem-estar do progenitor/recorrente de molde a permitir uma situação de equilíbrio.
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Procedem, assim as conclusões 1ª a 6ª formuladas pelo apelante e prejudicada fica, em função dessa procedência, a análise das questões 7ª a 11ª.
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No que se refere às restantes conclusões formuladas importa, desde logo, dizer o seguinte.
Como resulta do art.º 138.º do C. Civil, o acompanhamento de maior visa a aplicação de medidas para “potenciar a possibilidade de participar ativamente no mundo jurídico por parte de quem enfrenta barreiras para tal”, de modo a permitir “abranger as situações em que estes obstáculos se criam quer ao nível da formação quer ao nível da expressão da vontade”.[13]
Portanto, o processo destinado a assim prover–e, naturalmente, a decisão nele a proferir–é para acautelar a situação de necessidade de acompanhamento do beneficiário, nomeando-lhe um acompanhante e fixando as medidas legalmente previstas e que se considerem necessárias para atingir tal desiderato (é o que resulta, nomeadamente, dos arts. 140.º, nº1, 143.º, 145.º, 146.º, 147.º e 149º, nº 1 do C.Civil e 900.º, nº1 do CPCivil).
Por outro lado, e como resulta do art.º 145.º do C. Civil, as medidas de acompanhamento– ainda que o catálogo das mesmas previsto no nº 2 seja aberto[14] – são traçadas por via do seu cometimento ou desempenho ao acompanhante e sempre tendo presente que “o regime do maior acompanhado se orienta pelo princípio de aproveitamento de toda a capacidade de exercício e de gozo do acompanhado”.[15]
Estando o respetivo processo traçado para prover à situação de necessidade de acompanhamento do maior e para, em vista de lhe dar execução, nomear-lhe um acompanhante e traçar a este um leque de competências apropriadas para o pôr em prática, tal processo, além do apuramento da necessidade de acompanhamento da pessoa em causa, tem exclusivamente como âmbito de decisão o relacionamento e interação entre o beneficiário do acompanhamento e o acompanhante (embora quanto a este possa designar um substituto ou possa até designar vários acompanhantes, como se prevê no nº 2 do art.º 900.º do CPCivil e nº 3 do art.º 143ºº do CCivil).
Ora, sendo este o desiderato do processo em causa, revela-se inócuo o vertido nas conclusões 12ª a 24ª formuladas pelo apelante, para além de que os factos em que as mesmas se sustentavam terem sido dados como não provados.
Ainda sempre se dirá como se segue.
Relativamente à questão de o apelante dever estar internado no Lar em 3... e não no que atualmente se encontra, está assente nos autos que:
-o recorrente sofre de uma limitação grave da sua faculdade de discernimento;
-está completamente dependente na utilização dos recursos da comunidade, nomeadamente nos cuidados de saúde e segurança.
-à luz dos conhecimentos médicos atuais não se prevê que cure independentemente de qualquer terapêutica;
-apesar disso é necessária a continuação dos tratamentos médicos e a manutenção dos cuidados que tem recebido na ERPI, pelo seu crescente grau de dependência;
-a Instituição onde se encontra atualmente reúne as condições necessárias em termos de equipamentos e equipa multidisciplinar;
-a referida Instituição tem assegurado também o devido distanciamento em relação às dificuldades e divergências dos filhos no que respeita aos cuidados exigidos pela condição clínica do pai o que não lhes tem possibilitado criar as condições de suporte social que promovessem a continuação de um processo de envelhecimento digno e mais saudável (cf. pontos 27. a 32. dos factos provados que não foram objeto de impugnação).
Deste quadro factual resulta que o apelante/beneficiário deve continuar na ERPI onde atualmente se encontra o que é, aliás, corroborado na decisão recorrida apoiado no parecer do Sr. Perito, não se antevendo razões, ponderosas, para alterar essa rotina.
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No que se refere à circunstância de a filha do apelante-BB-não fazer parte do conselho de família, não se se divisam razões para a retirar de tal cargo quando resulta dos factos provados que:
- foi ela que conduziu o apelante ao Serviço de Urgência, no dia 22-05-2021;
- desde, pelo menos, o período em que o apelante se divorciou o mesmo manteve um relacionamento regular com a sua filha BB, a qual o visitava todos os dias na respetiva casa, onde lhe levava pão fresco e o jornal;
- e era ela quem cuidava da limpeza da roupa do apelante e que diligenciava pela limpeza da casa (cf. pontos 10., 40. e 41. dos factos provados que não foram objeto de impugnação).
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Nas conclusões 25ª e 26ª refere o apelante que não se afigura razoável, estando-se a falar de um património financeiro na ordem dos 6 milhões de euros, que não se fixe que acompanhante o dever de prestação de contas.
Preceitua o artigo 151.º, nº 2 do CCivil que “o acompanhante presta contas ao acompanhado e ao tribunal, quando cesse a sua função ou, na sua pendencia, quando assim seja judicialmente determinado”.
É também essa a conclusão que se extrai do disposto no art.º 1944.º do CCivil, que estabelece a obrigação de prestar contas do tutor-posto que, nos termos do n.º 4 do art.º 145º do CCivil, a representação legal do acompanhado segue o regime da tutela, com as adaptações necessárias.
Estabelecem estas normas, inequivocamente, uma obrigação de prestação de contas a cargo do acompanhante, sendo que o CPCivil prevê, nos artigos 948º do Código de Processo Civil, um “processo especialíssimo” para a prestação de contas do tutor ou do acompanhante.
Acontece que, do primeiro dos normativos citados resulta, com toda a clareza, que o acompanhante presta contas apenas quando cesse a sua função ou, na sua pendência, quando assim seja determinado judicialmente.
Nestes termos, torna-se evidente que o tribunal recorrido não tinha, como parece entender o apelante, que fixar, aquando da prolação da sua decisão, a obrigação de o acompanhante prestar contas, quando tal obrigação resulta já resulta da lei e nas condições aí preceituadas.
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Improcedem, assim, também as referidas conclusões.
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IV- DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação parcialmente procedente por provada e, consequentemente, revogam a decisão recorrida na parte em nomeou como acompanhante do beneficiário/recorrente o seu irmão FF nomeando, em sua substituição, para exercer tal o seu filho GG.
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Face a tal substituição e dado que o filho GG fazia parte do Conselho de Família deverá o tribunal recorrido providenciar pela nomeação do segundo membro para compor tal Conselho.
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No mais mantém-se a decisão recorrida.
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Custas pelo apelante e apelados na proporção do respetivo decaimento (artigo 527.º, nº 1 do C.P.Civil).
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Porto, 12 de maio de 2025.
Dr. Manuel Domingos Fernandes
Dr. Miguel Baldaia de Morais
Drª. Teresa Fonseca
_____________________________ [1] Cf. António José Fialho, “Conteúdo e Limites do Princípio Inquisitório na Jurisdição Voluntária”, Petrony, pág. 96. [2] António José Fialho, obra citada, pp. 67-68. [3] Miguel Teixeira de Sousa in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, p. 348. [4] Cf. acórdãos do STJ de 19/10/2004, CJ, STJ, Ano XII, tomo III, pág. 72; de 22/2/2011, CJ, STJ, Ano XIX, tomo I, pág. 76; e de 24/9/2013, processo n.º 1965/04.9TBSTB.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt. [5] Cf. Ac. do S.T.J. de 3/11/2009, processo n.º 3931/03.2TVPRT.S1, disponível em www.dgsi.pt. [6] No que diz respeito aos factos conclusivos cumpre observar que na elaboração do acórdão deve observar-se, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 607.º a 612.º CPCivil aplicáveis ex vi artigo 663.º, nº 2 do mesmo diploma legal. [7] José Lebre de Freitas e A. Montalvão Machado, Rui pinto Código de Processo Civil–Anotado, Vol. II, Coimbra Editora, pág. 606. [8] Antunes Varela, J. M. Bezerra, Sampaio Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição Revista e Atualizada de acordo com o DL 242/85, S/L, Coimbra Editora, Lda., 1985, pág. 648. [9] In Recursos em Processo Civil Novo Regime, 2.ª edição revista e atualizada pág. 297. [10] A.S. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”; Almedina, 5.ª edição, 169. [11] Importa lembrar que no preâmbulo do Dec. Lei n.º 39/95, de 15 de fevereiro (pelo qual foi introduzido o segundo grau de jurisdição em matéria de facto) o legislador fez constar que um dos objetivos propostos era “facultar às partes na causa uma maior e mais real possibilidade de reação contra eventuais (…) erros do julgador na livre apreciação das provas e na fixação da matéria de facto relevante para a solução jurídica do pleito (…)” (negrito e sublinhados nossos). [12] Aliás, importa referir que o exercício da autonomia pelo beneficiário não exige que a declaração de vontade do beneficiário se faça em momento em que não se verifique qualquer declínio das suas aptidões. Exige, sim, que este tenha capacidade bastante para efetuar tal escolha de forma livre e esclarecida. Mesmo que a situação atual do acompanhado já não lhe permita fazer essa escolha, é ainda de ter em conta a sua vontade presumível, se houver elementos para a determinar, isto é, para reconstituir a ideia que o beneficiário formularia se fosse confrontado com a necessidade da escolha à luz do seu modo de ver, pensar e se relacionar com as pessoas do seu convívio. Só não será de respeitar a escolha do acompanhado se as suas faculdades mentais não lhe permitirem fazer uma tal avaliação, isto é, se não tiver capacidade bastante para compreender esse ato ou se a pessoa por ele escolhida não se revelar idónea para o exercício do cargo. Em suma, deve concluir-se que deve ser dada primazia à escolha do beneficiário sempre que a mesma se não revele desadequada aos seus interesses. [13] Cf. Paula Távora Vítor, in “Código Civil Anotado”, Ana Prata (Coord.), Volume I, 2ª edição, Almedina, 2019, pág. 168. [14] Neste sentido, Pinto Monteiro, “Das incapacidades ao maior acompanhado – Breve apresentação da Lei nº49/18”, in www.cej.mj.pt, pág. 22. [15] Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. II, Almedina, 2021, reimpressão, pág. 340.