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PROCESSO TUTELAR CÍVEL
INCUMPRIMENTO
ALEGAÇÕES
PROVA
PRAZO
Sumário
Sumário (a que se refere o artigo 663º nº 7 do CPC e elaborado pelo relator): I - A prorrogação de prazo judicial para defesa não se faz por categoria de acção e não se faz oficiosamente, carecendo de requerimento que apresente a justificação da ocorrência de anormal dificuldade de organização da defesa. II - Não havendo tal requerimento, não pode entender-se o despacho que declara prorrogar por oito dias o prazo para apresentação, pelos progenitores, em processo tutelar cível, de alegações, na sequência do quase transcurso, até à suspensão da instância para acordo, do primeiro prazo de quinze dias concedido, como outorgando a concessão de um novo prazo de quinze dias acrescido de mais oito.
Texto Integral
Acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório
No presente apenso de incumprimento das responsabilidades parentais que AA intentou contra BB, relativamente ao filho de ambos, CC, peticionando a final a condenação do progenitor ao pagamento de €3.094,91 em dívida, foi proferido em 22.01.2025, por referência 155339622, o seguinte despacho:
“Compulsados os autos verifica-se que, não tendo sido logrado o acordo entre as partes na conferência de pais realizada no dia 22.04.2024, foram estas notificadas para, no prazo de 15 dias, apresentarem as suas alegações.
No dia 6.05.2024, vieram as partes, quase no terminus do prazo de que dispunham para apresentarem as alegações, requerer a suspensão da instância pelo período de 30 dias alegando encontrarem-se a encetar conversações no sentido de chegar a um acordo que permitisse por termo aos presentes autos.
Deferida a requerida suspensão e decorrido o período de suspensão, as partes foram notificadas para esclarecerem se tinham logrado chegar a um entendimento, tendo Requerente e Requerido vindo dizer que o acordo não se concretizou, pelo que solicitavam novo prazo para apresentarem as suas alegações.
Cumprindo, face à posição das partes, dar o devido andamento aos autos e, considerando que em virtude do prazo que havia sido dado inicialmente ter sido dado sem efeito, foi concedida no despacho proferido a 27.11.2024, a prorrogação do prazo por 8 dias.
Sucede que, ao contrário do defendido pelo Requerido, a prorrogação do prazo por oito dias não era para acrescer ao prazo de 15 dias que decorre da lei, mas sim ao prazo que já havia sido concedido anteriormente e que foi dado sem efeito no despacho que deferiu a suspensão da instância, uma vez que, tendo já decorrido praticamente a totalidade daquele prazo, não fazia sentido conceder de novo 15 dias. E muito menos sentido fazia, além dos 15 dias, conceder ainda um prazo adicional de 8 dias, o qual nem se compreende a que se destinaria uma vez que os autos não se revestem de especial complexidade e as partes tiveram muito tempo para preparar as suas alegações.
Temos, pois, que inexistem fundamentos para legitimar a interpretação do despacho proferido no sentido de pretender conceder às partes o prazo de 15 dias acrescido de 8 dias para as partes apresentarem as suas alegações.
A Requerente então apresentar as suas alegações no dia 10.12.2024.
O Requerido apresentou as suas alegações a 23.12.2024.
Temos, pois, que dúvidas não restam que as alegações apresentadas pelo Requerido são extemporâneas, razão pela qual, não podem ser admitidos.
Pelo exposto, não admito as alegações apresentadas pelo Requerido, por extemporâneas.
Desentranhe/elimine.
Para inquirição das testemunhas arroladas pela Requerente designa-se o dia (…)”.
*
Inconformado, o progenitor interpôs o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões:
A. O Tribunal creditou, no despacho do dia 27/11/2024, justificada a prorrogação, por 08 dias, do prazo para a partes apresentarem alegações ou para arrolarem até 10 testemunhas e juntarem documentos (art.º 39.º, n.º 4 do RGPTC);
B. O Tribunal fixou, no despacho do dia 27/11/2024, para a Recorrida e o Recorrente apresentarem alegações ou arrolarem até 10 testemunhas e juntarem documentos, um prazo global de 23 dias, i.e., o prazo de 15 dias do art.º 39.º, n.º 4 do RGPTC + a prorrogação, por 08 dias, do prazo in casu;
C. O Tribunal notificou a Recorrida e o Recorrente no dia 29/11/2024 (art.º 33.º, n.º 1 do RGPTC e art.º 248.º, n.º 1 do CPC);
D. A Recorrida e o Recorrente presumiram-se notificados no dia 02/12/2024 [art.º 33.º, n.º 1 do RGPTC, arts. 248.º, n.º 1 do CPC e art.º 279.º, b) do CC];
E. A Recorrida apresentou, no dia 10/12/2024, alegações, e, com a peça processual, arrolou 02 testemunhas e juntou 02 documentos (art.º 39.º, n.º 4 do RGPTC);
F. O Recorrente apresentou e arrolou, no dia 23/12/2024, alegações e 01 testemunha (art.º 39.º, n.º 4 do RGPTC);
G. As alegações e o rol de testemunhas do Recorrente do dia 23/12/2024 foram temporâneos [arts. 33.º, n.º 1 e 39.º, n.º 4 do RGPTC, arts. 138.º, n.º 1, 1.ª parte e 248.º, n.º 1 do CPC e art.º 279.º, b) do CC];
H. As alegações e o rol de testemunhas do Recorrente do dia 23/12/2024 devem ser admitidos [arts. 33.º, n.º 1 e 39.º, n.º 4 do RGPTC, arts. 138.º, n.º 1, 1.ª parte e 248.º, n.º 1 do CPC e art.º 279.º, b) do CC];
I. A prorrogabilidade, por 08 dias, do prazo para a apresentação de alegações ou se arrolarem até 10 testemunhas e se juntarem documentos, a que alude o despacho dia 29/11/2024, recaía sobre o prazo legal de 15 dias (art.º 39.º, n.º 4 do RGPTC);
J. A fixação, no despacho do dia 29/11/2024, de um prazo de 08 dias para as partes apresentarem alegações ou se arrolarem até 10 testemunhas e se juntarem documentos não iria ao encontro dos cânones processuais e das particularidades do Processo n.º 6738/20.9T8VNF-C do Juízo de Família e Menores de Cascais do Tribunal da Comarca de Lisboa Oeste – Juiz 2;
K. O prazo de 08 dias para a Recorrida e o Recorrente apresentarem alegações ou arrolarem até 10 testemunhas e juntarem documentos representaria um exercício judicial arbitrário e ilícito;
L. A entender do Tribunal, no despacho do dia 22/01/2025, de que o despacho do dia 29/11/2024 ‘concedeu’, à Recorrida e ao Recorrente, um prazo de 08 dias para apresentarem alegações ou arrolarem até 10 testemunhas e juntarem documentos não reflete a lei (art.º 39.º, n.º 4 do RGPTC);
M. O despacho do dia 22/01/2025 violou o art.º 39.º, n.º 4 do RGPTC e os arts. 4.p, 6.p, n.º 1, 7.º, n.º 1, 151.º, n.º 1, 269.º, n.º 1, c), 272.º, n.º 1 e 276.º, n.º 1, c), in fine e 547.º do CPC ex vi art.º 33.º do RGPTC e o art.º 20.º, n.ºs 4 e 5 CRP.
À CAUTELA, e, caso assim não se entenda,
N. A suspensão da instância, ordenada judicialmente no dia 31/05/2024, cessou, de modo automático, e, sem a exigência da notificação das partes, no dia 01/07/2024 [arts. 13.º e 33.º, n.º 1 do RGPTC, arts. 138.º, n.ºs 1 e 2, 269.º, n.º 1, c), 272.º, n.º 1 e 276.º, n.º 1, c), in fine do CPC e arts. 279.º, b) e e) e 296.º do CC];
O. As alegações e o requerimento probatório da Recorrida do dia 10/12/2024 e as alegações e o rol de testemunhas do Recorrente do dia 23/12/2024 não poderiam, por extemporaneidade, ser admitidos no despacho do dia 22/01/2025 [arts. 13.º, 33.º, n.º 1 e 39.º, n.º 4 do RGPTC e arts. 138.º, n.os 1 e 2, 269.º, n.º 1, c), 272.º, n.º 1 e 276.º, n.º 1, c), in fine do CPC];
P. O Tribunal deveria, no despacho do dia 22/01/2025, ter marcado o dia e a hora para a inquirição das testemunhas arroladas no requerimento da Requerida do dia 05/09/2023 e nas alegações do Recorrente do dia 04/12/2023 (art.º 33.º, n.º 1 da RGPTC e art.º 151.º, n.º 1 do CPC);
Q. O despacho do dia 22/01/2025 violou o art.º 39.º, n.º 4 do RGPTC e os arts. 151.º, n.º 1, 269.º, n.º 1, c), 272.º, n.º 1 e 276.º, n.º 1, c), in fine do CPC ex vi art.º 33.º do RGPTC.
Tendo em conta o exposto, requer-se a V.as/ Ex.as que se dignem a julgar o recurso procedente e:
a) a revogar o despacho recorrido e a substituí-lo por um outro, no qual se admitam, por temporâneas, as alegações e o rol de testemunhas do Recorrente;
b) caso assim não se entenda [a)], a revogar, em parte, o despacho recorrido e a substituí-lo em conformidade, onde não se admitam, por intempestividade, as alegações e o requerimento probatório da Recorrida e se marque o dia e hora para a inquirição das testemunhas arroladas no requerimento do dia 05/09/2023 e nas alegações do dia 04/12/2023”.
Contra-alegou a progenitora formulando a final as seguintes conclusões:
“A. O Recorrente, veio interpor recurso, de “apelação, autónomo, com efeito suspensivo, a subir imediatamente e em separado.” Contudo, o efeito do recurso, é devolutivo e não suspensivo, nos termos do disposto nos artigos 32.º nº 4 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, e artigo 647.º do Código de Processo Civil, assim o determinam. O Recorrente não requereu, aquando da interposição do recurso, por forma fundamentada que o efeito do recurso fosse outro. Com efeito, deverá ser admitido o recurso interposto pelo Recorrente, com efeito meramente devolutivo, o que desde já se requer.
B. O Requerido, ora aqui Recorrente veio interpor recurso do douto despacho a quo de 22/01/2025, que não admitiu as alegações apresentadas pelo Recorrente, por terem sido consideradas extemporâneas.
C. Os factos relevantes a considerar para apreciar se o tribunal a quo decidiu bem ou não, são os seguintes:
i) Em 22/04/2024 realizou-se a Conferência de Pais e, não tendo sido possível alcançar o acordo entre as partes, foram as mesmas notificadas para, no prazo de 15 (quinze) dias, apresentarem as suas alegações – prazo que terminaria a 07/05/2024;
ii) Em 06/05/2024, as partes requereram a suspensão da instância pelo período de 30 dias, com vista à celebração de eventual acordo;
iii) a 30/05/2024, o tribunal a quo determina a suspensão da instância e ainda dá sem efeito a notificação feita, para alegações, “sendo que, se necessário, tal será posteriormente determinado.”;
iv) a 08/11/2024, o tribunal a quo notificou as partes a fim de informarem o que tivessem por conveniente dado o decurso integral do prazo de suspensão;
v) em resposta ao mesmo, as partes apresentaram os requerimentos em 18/11/2024 e 21/11/2024 em que informaram não ter sido possivel alcançar o acordo, e requereram prazo para alegações;
vi) Em 27/11/2024 o Tribunal a quo determina a cessação da suspensão da instância – que durou por cerca de 6 (seis) meses – e fixa o prazo de 8 dias para as partes apresentarem alegações;
vi) A Requerente apresentou alegações em 10/12/2024 – respeitando o prazo de 8 dias, e o Requerido apresentou alegações em 23/12/2024;
vii) Em 22/01/2025, é proferido, pelo tribunal a quo, o douto despacho no qual não admite as alegações do Recorrente por serem extemporâneas.
D. O Recorrente interpõe o presente recurso, por entender que o prazo fixado no douto despacho de 27/11/2024, era de 23 dias, ou seja, (15 + 8), concluindo que as alegações foram apresentadas dentro do prazo para o efeito e por isso devem as mesmas ser admitidas.
E. A Recorrida perfilha o entendimento adotado pelo tribunal a quo, não merendo por isso, o despacho recorrido qualquer reparo, conforme detalharemos. A verdade é que o prazo de 8 (oito) dias, é justificado, porquanto o prazo para a apresentação das alegações, o de 15 (quinze) dias, teve o seu início aquando da realização da conferência de Pais e, na véspera desse prazo terminar as partes requereram a suspensão da instância. Após 6 meses de instância suspensa, as partes requerem novo prazo para apresentar alegações. Ora, neste cenário, é evidente que não se justificava, nem foi requerido pelas partes um acréscimo excecional de prazo para apresentar alegações. O que, a ser eventualmente requerido, sempre teria que ser devidamente fundamentado a fim de justificar o prazo de 23 (vinte e três) dias. O que não aconteceu. E, não aconteceu, porque, tal como refere, e bem, o douto tribunal a quo, o processo ora em causa, não reveste especial complexidade que justificasse definir um prazo mais alargado.
F. O que as partes requereram, foi a concessão de novo prazo para apresentarem alegações, e que do mesmo fossem as partes notificadas de forma a garantir a igualdade dos meios de defesa.
G. Compreende-se o alcance do tribunal a quo, quando fixa o prazo de 8 (oito) dias para apresentação de alegações, quando: i)O primeiro prazo concedido de 15 dias ficou praticamente esgotado; ii) Após 6 meses de suspensão da instância, e apesar do esforço que as partes encetaram, a verdade é que desde, pelo menos, 18/11/2024 e 21/11/2024, as partes informaram o douto tribunal de que não tinham chegado a acordo e que o mesmo não era possível de alcançar. Logo, e em bom rigor, quer dizer que, pelo menos desde essas datas, se pode afirmar que as partes, na prática, poderiam estar a preparar as suas alegações. Razão pela qual, se pode igualmente afirmar que os direitos de defesa das partes não ficaram afetados com a fixação do prazo de 8 (oito) dias para apresentarem as suas alegações.
H. O referido despacho, foi necessário para garantir a regularidade da instância e o prosseguimento dos autos, do ponto de vista formal e garantístico do direito que assiste ás partes de igualdade de armas. Com efeito, não assiste razão – salvo o devido respeito por opinião diferente – ao Recorrente.
I. Defender que, tal como pretende o Recorrente, que ao prazo de 15 dias somam os 8 dias, é interpretação extensiva, proibida por lei.
J. Não é despiciendo afirmar que o sentido que o tribunal a quo quis conferir ao despacho recorrido, é o sentido lógico, e perfeitamente justificado, até porque foi precisamente essa a interpretação alcançada pela Recorrida.
K. Cumpre ainda perguntar, após leitura integral dos factos cronologicamente descritos, quais as razões que justificariam ao tribunal a quo, conceder um prazo excecional, mais alargado – de 23 (vinte e três) dias, para as partes alegarem, quando: i) não foi requerido pelas partes; ii) não existem circunstâncias no caso concreto que confiram aos autos especial complexidade. O Recorrente pretende defender que a expressão “prorrogabilidade” pressupõe uma dilação a um prazo já fixado. No entanto, o Recorrente, em toda a parte omite que: i) o prazo legal tinha já decorrido, antes das partes requerem a suspensão da instância e ii) que os autos estiveram suspensos por um período de 6 meses. Portanto, in casu, não era a primeira vez que ocorria notificação ás partes para alegarem. Não pode por isso o termo “prorrogabilidade” ser lido e interpretado sem a contextualização do caso concreto.
L. Evidentemente que o termo foi utilizado pelo tribunal a quo, considerando, todo o período antecedente já decorrido, e que o processo não teve desenvolvimento processual e a aguardar impulso processual das partes. O que, conduz à conclusão de que o prazo de 8 (oito) dias concedido às partes se revela um prazo absolutamente justificado no caso concreto.
M. Importa ainda mencionar que o objeto do presente recurso, não é o teor do despacho proferido em 27/11/2024 – pois quanto a este encontra-se esgotado o prazo de apelação autónoma, mas tão só o teor do despacho proferido em 22/01/2025.
N. O Recorrente apresenta ainda como fundamento de que o tribunal a quo, não respeitou o douto despacho de 31/05/2024, que determinou a suspensão da instância e deu sem efeito a notificação às partes para alegarem, e aí referindo que, se necessário, seria posteriormente determinado.
O. Ora, não assiste razão ao Recorrente, porquanto, a verdade é que o tribunal a quo, deu sem efeito a notificação para as partes alegarem em consonância com a suspensão da instância– por tal não contender com os efeitos da suspensão operada com vista a ser celebrado acordo, que à época, se pensara existir viabilidade para ser alcançado – mas não deu sem efeito o prazo que tinha sido concedido às partes para esse efeito, outrossim, determinou que, caso se revelasse necessário, tal seria determinado. Ora, tendo-se revelado necessário, o tribunal proferiu despacho no qual determina o prazo de 8 (oito) dias para alegarem. Concluindo-se, por isso, que nada há a reparar.
P. Importa ainda mencionar que os direitos de defesa das partes não ficaram beliscados com o douto despacho recorrido, uma vez que, o mesmo não consubstanciou uma diminuição – ilegal – do prazo legal de 15 dias, porquanto, as partes tiveram mais do que o referido prazo para prepararem convenientemente a sua defesa, como bem revelam os factos ocorridos nos autos. Com efeito, o tribunal a quo não violou o artigo 39.º nº 4 do RGPTC, nem o artigo 20º nºs 4 e 5 da CRP.
Q. Subsidiariamente, vem o Recorrente alegar que a declaração da cessação da suspensão da instância, determinado no despacho de 27/11/2024, se revelou um ato inútil, e ilícito, e consequentemente, vem requerer que seja determinado que a suspensão da instância ocorreu de forma automática, ao fim dos 30 dias, e que por sua vez, seja determinado que as partes deveriam apresentar alegações até ao dia 02/07/2024, devendo por isso, concluir-se pela extemporaneidade das alegações apresentadas por ambas as partes.
R. Todavia, conforme referido em M. supra, o prazo de impugnação do douto despacho de 27/11/2024, encontra-se largamente ultrapassado, razão pela qual, não pode agora o Recorrente, querer, através da interposição do recurso do despacho de 22/01/2025, impugnar igualmente, outra decisão que já se encontra consolidada no nosso ordenamento jurídico. Com efeito, e ao abrigo do princípio da segurança jurídica no que concerne à formação definitiva das decisões, não pode o pedido subsidiário do Recorrente ser admitido, uma vez que o mesmo consubstancia uma interposição do recurso do despacho proferido em 27/11/2024, cujo prazo para o efeito se encontra ultrapassado, não podendo o mesmo, neste momento, ser alvo de recurso, tal como pretende o Recorrente.
S. Por outro lado, não podemos deixar de evidenciar que: i) em julho de 2024 as partes encontravam-se ainda a encetar negociações, como tal, não estavam as mesmas, predispostas a apresentar alegações, pois à época, havia ainda a possibilidade de as partes lograrem o acordo; ii) Por outro lado, é legítimo que o tribunal a quo possa auscultar as partes quanto ao desenvolvimento das conversações encetadas entres as partes para se alcançar o acordo, principalmente num processo de jurisdição voluntária, como é o caso sub judice, pois são vários os cenários possíveis, nomeadamente: i) as partes poderiam comunicar, mesmo após os 6 meses de suspensão da instância, que ainda existia viabilidade de acordo, e que seria necessário definir um prazo adicional para a conclusão do mesmo; ii) as partes poderiam comunicar ao tribunal que os diferendos inultrapassáveis poderiam ser resolvidos através de mediação, e requerer a realização de conferência de pais, com vista a que os mesmos fossem ultrapassados e por fim alcançado o acordo; iii) as partes poderiam, como fizeram, comunicar que não se vislumbrava hipótese de ser alcançado o acordo.
T. Ora, dadas as possibilidades existentes e a natureza do processo, a atuação do tribunal, também é, conhecer a situação concreta em que as partes se encontram para, e em função disso, adaptar-se e promover o que melhor se adequar ao desenvolvimento da lide.
U. Esta sim, é a atuação que melhor define e acautela o “equilíbrio global do processo”; o cumprimento do “princípio da adequação processual” e o respeito pelo dever de “gestão processual” e ao direito a um processo justo e equitativo.
V. Com efeito, e uma vez mais, a atuação do tribunal a quo, não merece qualquer reparo.
W. Ora, tendo as partes comunicado em 18/11/2024 e 21/11/2024 que não era possível alcançar o acordo, impunha-se, tal como fez o tribunal recorrido, determinar a cessação da suspensão da instância, uma vez que a mesma se destinava à resolução consensual do litígio, e consequentemente, fixar um prazo e notificar as partes, para querendo, alegarem, indicarem testemunhas e juntarem documentos, nesse mesmo prazo. Nesta senda, não há, por parte do tribunal a quo, qualquer ato inútil, e muito menos ilícito.
X. Em face de tudo o supra exposto, conclui-se que bem decidiu, o Douto Tribunal a quo, inexistindo qualquer fundamento de facto ou de direito para a(s) censura(s)que o Recorrente dirige, à decisão recorrida.
(…)”
Respondeu o Ministério Público, formulando a final as seguintes conclusões:
“5.1. BB, não se conformando com a decisão proferida a 22/01/2025, que não admitiu as suas alegações, por extemporâneas, veio dela interpor recurso. Alega, essencialmente, que o despacho proferido a 27/11/2024 deverá ser interpretado como concedendo um prazo adicional de 8 dias aos 15 dias previstos no art.º 39º n.º 4 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível.
5.2. Da análise dos autos decorre que, não tendo sido logrado o acordo entre as partes na conferência de pais realizada no dia 22/04/2024, foram estas notificadas para, no prazo de 15 dias, apresentarem as suas alegações.
5.3. No decurso do prazo concedido, requerente e requerido vieram requerer a suspensão da instância pelo período de 30 dias, alegando encontrarem-se a encetar conversações no sentido de chegar a um acordo que permitisse por termo aos presentes autos, o que foi deferido.
5.4. Decorrido o período de suspensão, as partes foram notificadas para esclarecerem se tinham logrado chegar a um entendimento, tendo Requerente e Requerido vindo dizer que o acordo não se concretizou, pelo que solicitavam novo prazo para apresentarem as suas alegações.
5.5. Cumprindo, face à posição das partes, dar o devido andamento aos autos e, considerando que em virtude do prazo que havia sido dado inicialmente ter sido dado sem efeito, foi, a 27/11/2024, proferido o despacho com o seguinte teor: uma vez a que a instância se manteve suspensa por acordo das partes durante cerca de 6 meses, período durante o qual diligenciaram pela resolução consensual do litígio, afigura-se-justificada a prorrogação do prazo para apresentarem alegações por 8 (oito) dias, a contar da notificação do presente despacho.
5.6. Ora, tal como bem se expende na decisão recorrida, ao contrário do defendido pelo Requerido, a prorrogação do prazo por oito dias não era para acrescer ao prazo de 15 dias que decorre da lei, mas sim ao prazo que já havia sido concedido anteriormente e que foi dado sem efeito no despacho que deferiu a suspensão da instância, uma vez que, tendo já decorrido praticamente a totalidade daquele prazo, não fazia sentido conceder de novo 15 dias. E muito menos sentido fazia, além dos 15 dias, conceder ainda um prazo adicional de 8 dias, o qual nem se compreende a que se destinaria uma vez que os autos não se revestem de especial complexidade e as partes tiveram muito tempo para preparar as suas alegações.
5.7. De facto, é forçoso concluir, tal como o Tribunal a quo, que inexistem fundamentos para legitimar a interpretação do despacho proferido no sentido de pretender conceder às partes o prazo de 15 dias acrescido de 8 dias para as partes apresentarem as suas alegações.
5.8. Assim, no caso vertente, as alegações apresentadas pelo Requerido são extemporâneas, não devendo ser admitidas.
5.9. Por fim, sempre se dirá que não se verifica qualquer nulidade ou irregularidade na decisão proferida, a qual se encontra formal e substancialmente correcta, não nos merendo, por isso, nenhuma censura.
Face ao exposto, deverá o recurso ser julgado improcedente e a decisão proferida confirmada”.
O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, em separado e com efeito devolutivo, consignando porém o tribunal que “não se afigura que os autos devam prosseguir sem o conhecimento do mesmo uma vez que levaria à eventual prática de atos inúteis caso a decisão proferida viesse a ser revogada”, em função do que deu sem efeito a data marcada para inquirição das testemunhas.
*
Corridos os vistos legais, cumpre decidir:
II. Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação - artigo 635.º, n.º 3, 639.º, nº 1 e 3, com as excepções do artigo 608.º, n.º 2, in fine, ambos do Código de Processo Civil - a questão a decidir é a da tempestividade das alegações do progenitor e, assim não se entendendo, se também não deviam ter sido admitidas as alegações da progenitora por extemporaneidade, em consequência do que ficariam no processo apenas as alegações iniciais e a prova nelas oferecida, que o tribunal deveria decidir ser a matéria a apreciar.
*
III. Matéria de facto
A constante do relatório que antecede.
Acresce que o teor do despacho de 08.11.2024 é o seguinte: “Notifique os progenitores a fim de requererem o que tiverem por conveniente, atento o decurso integral do prazo de suspensão”.
Acresce o teor das respostas, do progenitor, a 18.11.2024 – requerendo a prorrogação de prazo para apresentação de alegações – e da progenitora, a 21.11.2024, requerendo “que sejam as partes notificadas para querendo, apresentarem alegações no prazo de 15 dias, ficando dessa forma assegurado princípio de igualdade de meios de defesa previsto no artigo 4º do Código de Processo Civil”.
Acresce que o teor do despacho de 27.11.2024 que prorrogou o prazo é o seguinte:
“Atento o exposto no requerimento que antecede, declaro cessada a suspensão da instância. Uma vez a que a instância se manteve suspensa por acordo das partes durante cerca de 6 meses, período durante o qual diligenciaram pela resolução consensual do litígio, afigura-se- justificada a prorrogação do prazo para apresentarem alegações por 8 (oito) dias, a contar da notificação do presente despacho”.
*
IV. Apreciação
Nos termos do 39º nº 4 do RGPTC o prazo legal para alegações com indicação de prova é de 15 dias. Considerou o legislador que tal prazo era o suficiente para garantir aos progenitores o direito de defesa das suas respectivas posições discordantes.
Como sabemos, este prazo, marcado pela lei, para a prática de um acto processual, é um prazo processual que pode ser prorrogado – artigo 141º do Código de Processo Civil.
Não contém o RGPTC nenhuma disposição específica sobre prorrogação de prazo processual, pelo que há que aplicar o Código de Processo Civil, nos termos do artigo 33º daquele Regime, a saber “1 - Nos casos omissos são de observar, com as devidas adaptações, as regras de processo civil que não contrariem os fins da jurisdição de menores”.
Não há na lei processual civil uma disposição que permita ao juiz sempre e em qualquer circunstância, sem fundamentação e independentemente de qualquer pedido circunstanciado nesse sentido, prorrogar prazos processuais. Podemos até retirar do artigo 569º nº 5 do Código de Processo Civil a regra básica para a prorrogação: “Quando o juiz considere que ocorre motivo ponderoso que impeça ou dificulte anormalmente ao réu ou ao seu mandatário judicial a organização da defesa, pode, a requerimento deste e sem prévia audição da parte contrária, prorrogar o prazo da contestação, até ao limite máximo de 30 dias”. Apesar da não audição da parte contrária, o que se garante é a excepcionalidade da prorrogação: - apenas por concreto motivo ponderoso de anormal dificuldade de organização de defesa e sempre sob requerimento, ou seja, nunca por iniciativa oficiosa do juiz. E compreende-se: - é que estamos sempre na matéria sensível da garantia de igualdade de tratamento às partes, o que, mesmo em processos de jurisdição voluntária, como é o caso, perante a discordância dos progenitores, não deixa de fazer sentido ser aplicado.
Desta mesma necessidade de justificação concreta, decorre outrossim que a prorrogação de prazo não actua por categoria de processo.
O recorrente não demonstra que qualquer dos progenitores haja pedido ao tribunal a prorrogação do prazo de quinze dias, leia-se, de prorrogação dum novo prazo de quinze dias, nem demonstra quais as circunstâncias concretas que justificariam neste caso uma prorrogação de prazo.
Por outro lado, o despacho que concede o prazo de oito dias para alegações, está sujeito às regras de interpretação da declaração jurídica – artigo 236º do Código Civil – sendo que, tal como para a interpretação da lei, precisamos não interpretar em sentido que não tem qualquer correspondência com o texto onde a declaração está plasmada. No referido despacho não há qualquer referência à concessão de um prazo de 15 dias, nem a acréscimo ou prorrogação dele, nem há qualquer referência a uma causa que justifique a prorrogação de um novo prazo de 15 dias por mais 8.
O prazo processual, estabelecido por lei, é contínuo, suspendendo-se durante as férias judiciais – é a regra geral que resulta do artigo 138º do Código de Processo Civil. A suspensão de contagem do prazo processual deve considerar-se ocorrer também por via de outros motivos, e designadamente porque, de acordo com ambas as partes, a instância é suspensa para tentar obter ou viabilizar uma resolução consensual.
Quando cessa a causa de suspensão, a contagem do prazo reinicia-se. Não estamos em presença dos casos para os quais o artigo 275º nº 2 do Código de Processo Civil expressamente comina a inutilização do prazo transcorrido. Portanto, se quando a instância foi suspensa para se tentar um acordo já estava a correr o prazo para apresentação de alegações, deve entender-se que a menção “prorrogação” feita no despacho que estabeleceu o prazo de 8 dias, se refere ao prazo que já se tinha iniciado mas não se tinha completado e que estava assim em curso quando a instância foi suspensa.
Não conseguimos, por tudo o que se disse, secundar o recorrente nem quando defende que o tribunal estabeleceu um prazo de 23 dias, nem quando defende que da aplicação da lei ao presente caso sempre teria de resultar um prazo de 15 dias, porque esse é o mínimo que a lei concede para a defesa das posições de cada progenitor. Repara-se que o prazo de 15 dias foi concedido e praticamente transcorreu até à suspensão, e ao ser concedido mais 8 dias, esse mesmo prazo de 15 que já quase havia corrido acabou mesmo a ser prolongado com respeito, no período de tempo prorrogado, pelo período legal de 15 dias. Quer isto dizer, em última análise, que não houve nenhum prejuízo para a defesa do progenitor ora recorrente. E por isto, também não podemos secundar o recorrente quando afirma que o cumprimento da lei sempre obrigaria à concessão de um novo prazo de 15 dias. E em bom rigor, para questionar a legalidade do despacho de 27.11.2024 que concedeu o prazo de oito dias, se se entendia que era o prazo mínimo a conceder, em vista do tribunal, anteriormente, ter dado sem efeito a notificação que havia sido feita para as partes alegarem, e por uma razão de confiança nessa mesma decisão de dar sem efeito o prazo, era preciso que o despacho de 27.11.2024 tivesse sido objecto de recurso, o que não é o caso, porque o recurso vem interposto, apenas, do despacho que julga extemporâneas as alegações do progenitor.
Em suma, não vemos razão para interpretar o despacho recorrido – nem a lei obriga a tanto – como tendo concedido o prazo de 23 dias, ao abrigo do qual a apresentação da alegação do progenitor, ora recorrente, seria tempestiva.
Mas, questão que o recorrente coloca subsidiariamente, pode então chegar-se à extemporaneidade das alegações da progenitora, pela via da acusação de que a cessação da suspensão opera de modo automático – artigo 276º, nº 1, al. c), parte final, do Código de Processo Civil – recomeçando a correr o prazo, que já estava em curso?
Com o devido respeito, não, porque apesar dessa regra, os progenitores não apresentaram as alegações transcorrido que foi o dia que faltava para o esgotamento do prazo inicial, e os seus requerimentos de pedido de prazo para apresentação de alegações, meses depois, e na sequência do convite do tribunal a esclarecerem se conseguiam acordo, apresentam uma aceitação dos termos processuais em que este convite assentou – que passam precisamente por não se considerar o reinício automático do prazo em curso – do mesmo modo que acabam a sanar a sua falta de apresentação de alegações, abrindo-lhes a hipótese de alegarem, que aliás pediram. Defender a solução agora apresentada pelo recorrente seria absolutamente contraditório com a sanação referida.
Não pode assim considerar-se procedente a questão que é levantada subsidiariamente, e em consequência dessa suposta extemporaneidade, exigir, conforme conclusão P do recurso, que fiquem apenas a valer no processo as alegações iniciais da requerente apresentadas em 05.09.2023 e as alegações iniciais do requerido, apresentadas em 04.12.2023, devendo os autos prosseguir para a sua prova, mediante os meios de prova nelas indicados.
Em suma, improcede o recurso na totalidade.
Tendo nele decaído, é o recorrente responsável pelas custas – artigo 527º nº 1 e 2 do Código de Processo Civil.
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V. Decisão
Nos termos supra expostos, acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso e em consequência confirmam a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.
Registe e notifique.
Lisboa, 08 de Maio de 2025
Eduardo Petersen Silva
António Santos
Nuno Lopes Ribeiro (vencido)
Declaração de voto
Votei vencido, na medida em que discordo da solução adoptada pela maioria do colectivo, no que tange à conclusão recursória P.: (O Tribunal deveria, no despacho do dia 22/01/2025, ter marcado o dia e a hora para a inquirição das testemunhas arroladas no requerimento da Requerida do dia 05/09/2023 e nas alegações do Recorrente do dia 04/12/2023 (art.º 33.º, n.º 1 da RGPTC e art.º 151.º, n.º 1 do CPC).
Constando da fundamentação do Acórdão que os autos devem prosseguir para produção de prova, incluindo dos meios de prova apresentados pelo recorrente em 4/12/2023 – o que sufragamos -, parece-nos que, como corolário desse entendimento, o recurso deveria ser julgado parcialmente procedente e determinada expressamente a produção daquela prova, assim se revogando parcialmente o despacho recorrido, que apenas admitiu a produção da prova testemunhal arrolada pela recorrida.
No restante, subscrevo a decisão. Nuno Lopes Ribeiro
Processado por meios informáticos e revisto pelo relator.