O segmento do acórdão da Relação que indeferiu a arguição de nulidade prevista no art. 195º, nº1, do CPC, não é passível de recurso de revista.
Os Recorrentes rematam a alegação com as seguintes conclusões:
I – Configura-se a questão de saber se tendo os Apelantes invocado Nulidade, porquanto na Sentença Recorrida não se elencaram os factos não provados, nem, por outro lado, se especificaram os meios de prova que foram decisivos para a formulação da convicção do tribunal recorrido, justificando-se a anulação do Saneador-Sentença, ao passo que o Acórdão Recorrido decidiu exatamente o contrário “ Em conclusão, não se verifica qualquer “nulidade processual”, nem a sentença padece do vício formal identificado, improcedendo a apelação nesta parte “, cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito e cujos interesses são de particular relevância.
II – Invocam os Recorrentes (…) a contradição entre o Acórdão Recorrido e o Acórdão da Relação de Lisboa no Processo n.º 161/09.3 TCSNT.Ll-2 (igualmente, e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2019 Fevereiro 26, no Processo n.º 1316/14.4TBVNG-A.P1.S2), em torno da questão de saber se tendo os Apelantes invocado Nulidade, porquanto na Sentença Recorrida não se elencaram os factos não provados, nem, por outro lado, se especificaram os meios de prova que foram decisivos para a formulação da convicção do tribunal recorrido, justificando-se a anulação do Saneador-Sentença, ao passo que o Acórdão Recorrido decidiu exatamente o contrário “ Em conclusão, não se verifica qualquer “nulidade processual”, nem a sentença padece do vício formal identificado, improcedendo a apelação nesta parte “.
III - No confronto entre a solução assumida no Acórdão Recorrido e no Acórdão Fundamento constata-se que sobre a referida questão foram adotadas soluções distintas (contradição jurisprudencial).
IV - Entendem os Recorrentes que se encontram reunidos os pressupostos legais para o Recurso de Revista Excecional ser admitido.
ASSIM
V - Vêm os Recorrentes interpor recurso de revista excecional, ao abrigo dos artigos 671.º e 672.º, n.º l, alíneas a), b) e c), do Código de Processo Civil, enunciando as questões sobre as quais pretende ver recair a reapreciação do Tribunal de Revista
VI – Para se lavrar Acórdão em que se decida que com a omissão das formalidades referidas, previstas no artigo 607.º, n.º 4, do Código de Processo Civil (não declarar quais os factos que considera não provados e não especificar os concretos meios de prova que determinaram a decisão, positiva ou negativa), cometeu-se uma nulidade processual prevista no artigo 195.º, n.º 1, do Código Processo Civil, justificando-se a anulação do Saneador - Sentença e de todos os atos subsequentes, nos termos do artigo 195.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, violando-se o disposto nos artigos 154.º, n.º1, 607.º, n.º 4, do Código de Processo Civil e no artigo 205.º, n.º 1, Constituição da República Portuguesa.
VII - Defendemos ser aplicável ao caso sujeito a orientação do Acórdão Fundamento de que as “ nulidades da sentença, taxativamente previstas no art. 615.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, não compreendem a decisão sobre a matéria de facto “.
SEM PRESCINDIR E CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA
VIII - É, em qualquer caso, importante e de grande relevância jurídica que este Supremo Tribunal de Justiça se pronuncie sobre a arguição da nulidade do Saneador Sentença proferido pela 1ª Instância por não ter discriminado os factos dados como não provados (“ escrevendo, que não “ existe factualidade relevante a elencar como não provada “) e também não ter especificado os meios de prova que foram decisivos para a formação da convicção do Juiz, não satisfazendo, igualmente, a exigência legal estabelecida no artigo 607.º, n.º 4, do Código de Processo Civil.
IX - Não se pode reconhecer ao Saneador Sentença e Acórdão Recorrido tais requisitos de clareza e precisão na indicação da matéria de facto não provada, para lá da omissão de fundamentação dessa decisão, pelo que enferma de nulidade, nos termos dos artigos 615.º, n.º 1, alíneas b) e c), 684.º, n.º 2, do Código de Processo Civil e como tal, não pode manter-se devendo ser anulado, para o que se deve ordenar a baixa do processo ao Tribunal Recorrido, para que aí “ se fazer a reforma da decisão anulada, pelos mesmos juízes quando possível “
X – A fundamentação da matéria de facto provada e não provada, com a indicação dos meios de prova que levaram à decisão, assim como a fundamentação da convicção do julgador, devem ser feitas com clareza, objetividade e discriminadamente, de modo a que as partes, destinatárias imediatas da decisão, saibam o que o Tribunal considerou provado e não provado e qual a fundamentação dessa decisão reportada à prova fornecida pelas partes e adquirida pelo Tribunal.
XI - A exigência de fundamentação das respostas negativas aos quesitos constituiu inovação na revisão do Código de Processo Civil de 1995/96: não era requisito no Código de Processo Civil de 1939 e só passou a sê-lo, quanto aos factos provados no Código de Processo Civil de 1961, mantendo-se até ao DL. 329-A/95, de 12.12, o dever, quanto aos factos julgados provados, de especificar os fundamentos decisivos para a formação da convicção do Tribunal.
XII - A formulação constante do Saneador Sentença Recorrido, que o Acórdão Recorrido “ validou “, reportada ao dever de fundamentação constante do artigo 607.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, é complexa, obscura, não permitindo a imediata e exigível compreensão e apreensão dos factos que o Saneador Sentença considerou.
XIII - Tal implica que os destinatários imediatos do Saneador Sentença indaguem, através da apreciação da (s) Petição (ões) dos Embargos.
XIV - A necessidade imposta pela Decisão, no que respeita ao apuramento cristalino do completo elenco dos factos, para lá de ser totalmente omissa a fundamentação quanto a eles, consubstancia nulidade, nos termos dos artigos 607.º, n.º4 e 615.º, n.º 1, alíneas c) e d), do Código de Processo Civil.
XV - Na ponderação da natureza instrumental do processo civil e dos princípios da cooperação e adequação formal, as decisões que, no contexto adjetivo, relevam decisivamente para a decisão justa da questão de mérito, devem ser fundamentadas de modo claro e indubitável, pois só assim ficam salvaguardados os direitos das partes, mormente, em sede de recurso da matéria de facto, habilitando ao cumprimento dos ónus impostos aos Recorrentes impugnantes da matéria de facto, mormente, quanto à concreta indicação dos pontos de facto considerados incorretamente julgados e os concretos meios de prova, nos termos das alíneas a) e b), do n.º 1, do artigo 640.º, do Código de Processo Civil.
XVI - Uma deficiente ou obscura alusão aos factos provados ou não provados pode comprometer o direito ao recurso da matéria de facto e, nessa perspetiva, contender com o acesso à Justiça e à tutela efetiva, consagrada como direito fundamental no artigo 20.º, da Constituição da República.
NA PARTE EM QUE SE REFERE À DECISÃO “ não nos merece censura a decisão do tribunal recorrido de dar como provado o ponto impugnado “ (“ o facto 11 dado como provado “), “ que se mantém “.
XVII – Configura-se a questão de saber se tendo os Apelantes invocado, “ o fundamento previsto na alínea a), do n.º 1, do artigo 672.º, do Código de Processo Civil, porquanto a questão jurídica sujeito tem carácter paradigmático e exemplar, transponível para outras situações, detendo relevância autónoma e independente em relação às partes envolvidas. Constituindo um instrumento processual em que fundamentalmente se pretendem tutelar interesses ligados à “ melhor aplicação do direito ”, justificando-se a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça em face da questão cujo relevo jurídico é indiscutível, o que decorre das situações seguintes:
- Existência de legislação cuja interpretação seja passível de sérias divergências, tendo como fito atalhar decisões contraditórias (efeito preventivo);
- As instâncias terem decidido a questão ao arrepio do entendimento uniforme da jurisprudência ou da doutrina (efeito reparador).
XVIII - Invocam os Recorrentes (…)o fundamento previsto na alínea c), do n.º 1, do artigo 672.º, do Código de Processo Civil, porquanto o Acórdão Recorrido tem a data de “ 2024.09.10 “, estando em contradição, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, com o anterior Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, com trânsito em julgado e proferido em “ 14/09/2017 “, no Processo n.º 818/15.0T8AGH-A, em torno da questão de saber se de uma carta registada enviada por um particular sem o serviço especial de entrega em mão própria, carta que não foi entregue ao seu destinatário (pessoa singular), se pode dizer que tenha chegado ao seu poder (para efeitos do artigo 224.º, do Código Civil), decidindo este Acórdão que “
II. De uma carta registada com a/r enviada por um particular sem o serviço especial de entrega em mão própria, carta que veio a ser entregue a pessoa (que nos autos não se sabe quem é) De uma carta registada com a/r enviada por um particular sem o serviço especial de entrega em mão própria, carta que veio a ser entregue a pessoa (que nos autos não se sabe quem é) diferente do destinatário (pessoa singular), não se pode dizer que tenha chegado ao poder do destinatário (para os efeitos do art. 224 do CC) “, ao passo que o Acórdão Recorrido decidiu exatamente o contrário: do “ teor das cartas juntas aos autos como doc. 3 com a contestação, datadas de 13.9.2016, resulta expresso que nas mesmas se comunica o “preenchimento da livrança dada de caução e avalizada” pelos executados, “nela incluindo o capital em dívida e respetivos encargos, tudo no valor global de €106.441,53, tendo fixado o seu vencimento para o dia 18.3.2016”, e interpela-se os mesmos ao seu pagamento “.
XIX - No confronto entre o Acórdão Recorrido e o Acórdão Fundamento constata-se que sobre a referida questão foram adotadas soluções distintas, o que justifica o acesso ao terceiro grau de jurisdição, nos termos do artigo 672.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil.
XX - A Revista “ excecional “ é sempre possível com fundamento na aludida contradição jurisprudencial.
XXI - Vêm os Recorrentes interpor recurso de revista excecional, ao abrigo dos artigos 671.º e 672.º, n.º l, alíneas a) e c), do Código de Processo Civil, enunciando as questões sobre as quais pretende ver recair a reapreciação do Tribunal de Revista.
XXII – Para se lavrar Acórdão em que se Decida se de uma carta registada enviada por um particular sem o serviço especial de entrega em mão própria, carta que não foi entregue ao seu destinatário (pessoa singular), se pode dizer que tenha chegado ao seu poder (para efeitos do artigo 224.º, do Código Civil).
XXIII - O Tribunal considerou provado que do “ preenchimento da livrança foi dado conhecimento aos Embargantes, conforme cartas datadas de 13.09.2016, juntas aos autos como docs. 3 com a contestação “ – ponto “ 11. “, dos “ Factos Provados: “ PORÉM
XXIV - Não existe qualquer tipo de prova que leve à convicção de que do “ … preenchimento da livrança foi dado conhecimento aos Embargantes … “.
ISTO, PORQUE
XXV - Nada na lei determina que a interpelação por via postal recebida por terceiro presume que o destinatário efetivamente a recebeu por entrega a esse terceiro.
XXVI – Cabe ao remetente da carta (Exequente/Embargado) provar que o terceiro entregou a carta de interpelação que recebeu ao destinatário.
XXVII - Que as cartas foram efetivamente entregues pelo terceiro aos Embargantes/Executados, em interpelação do credor ao devedor para tornar a obrigação exigível (conforme artigo 342.º, n.º n1, do Código Civil).
XXVIII - A interpelação dos Embargantes/Executados para o preenchimento da livrança é uma declaração negocial recetícia (artigo 224.º, do Código Civil).
ASSIM SENDO
XXIX - A Embargada/Exequente tinha que provar – é ónus seu (artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil) – que notificou efetivamente os Embargantes/Executados e não um terceiro dessa interpelação.
PORÉM
XXX - Não há nenhuma prova daquilo que leve à convicção de que do “ … preenchimento da livrança foi dado conhecimento aos Embargantes … “ nem das “ cartas datadas de 13.09.2016, juntas aos autos como docs. 3 com a contestação ” nem de qualquer outra.
LOGO
XXXI - Há erro no julgamento de facto: aquele facto merece resposta de não provado.
XXXII - Aqueles que consideram eficaz a declaração negocial do envio de uma carta registada, sem o serviço especial de entrega em mão própria, carta que não foi entregue ao seu destinatário, fazem uma errada interpretação do artigo 224.º, do Código Civil e esquecem inteiramente o artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil.
PELO, QUE
XXXIII - Importa eliminar da matéria de facto considerada provada o ponto “ 11. “, dos “ Factos Provados: “ (do “ preenchimento da livrança foi dado conhecimento aos Embargantes, conforme cartas datadas de 13.09.2016, juntas aos autos como docs. 3 com a contestação “) totalmente desconforme à prova produzida neste processo.
Face a esta alteração e quanto ao preenchimento pelo exequente do título antecipadamente entregue em branco, pelo valor da totalidade das prestações previstas no contrato de empréstimo e juros, feito neste condicionalismo (sem prévia interpelação dos obrigados no título) é abusivo.
XXXIV - Invocam os Recorrentes BB e AA, o fundamento previsto na alínea c), do n.º 1, do artigo 672.º, do Código de Processo Civil, porquanto o Acórdão Recorrido tem a data de “ 2024.09.10 “ e contradiz, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, o anterior Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, com trânsito em julgado e proferido em 2016 Outubro 11, no Processo n.º 4233/10.3TBVFX-A.L1-7, em torno da questão de saber se face ao preenchimento pelo portador do título antecipadamente entregue em branco, pelo valor da totalidade das prestações previstas no contrato de empréstimo e juros, feito neste condicionalismo (sem prévia interpelação dos obrigados no título) é abusivo.
XXXV - No confronto entre o Acórdão Recorrido e o Acórdão Fundamento constata-se que sobre a referida questão foram adotadas soluções distintas, o que justifica o acesso ao terceiro grau de jurisdição, nos termos do artigo 672.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil.
XXXVI – Tratando-se do vencimento de prestações futuras em que se desdobrava cumprimento do negócio subjacente e tendo sido invocado o não recebimento do “doc. 3 com a contestação”, competia à exequente, no âmbito das relações imediatas, demonstrar que enviou as missivas interpelativas em referência.
XXXVII – O ato de interpelação prévio a efetuar pela portadora relativamente à subscritora do título e aos avalistas, exigindo-lhes o pagamento do montante mutuado e declarando a resolução do negócio por incumprimento definitivo do mutuário, afigura-se-nos imprescindível para que se possam considerar vencidas as obrigações vincendas, o que legitimará, nessa especiais circunstâncias, o preenchimento pelo portador da livrança entregue em branco.
XXXVIII - Os elementos probatórios reunidos nos autos não habilitam minimamente a que se possa considerar provado que os Recorrentes tenham tido conhecimento das cartas para o efeito do artigo 224.º, do Código Civil.
XXXIX - O preenchimento pela Exequente da Livrança entregue em branco, pelo valor da totalidade das prestações previstas no “ contrato de empréstimo, celebrado entre o Exequente e a sociedade “Quadricor – Artes Gráficas, Lda.”, junto como doc. 1 com a contestação “ - ponto “ 6. “, dos factos considerados provados -, feito neste circunstancialismo (sem prévia interpelação dos Obrigados na Livrança), é abusiva.
XL - Devem Vossas Excelências julgar procedente o Recurso, revogando-se o Acórdão Recorrido e julgando procedente (s) a (s) Oposição (ões) à Execução apresentada (s) pelos Executados BB e AA, extinguindo-se a Execução também intentada contra eles.
Contra alegou a Recorrida, pugnando pela inadmissibilidade da revista; assim não se entendendo, deve a mesma ser julgada improcedente.
Decisão singular.
O relator proferiu o seguinte despacho:
“Visto as conclusões dos Recorrentes, a revista suscita a apreciação das seguintes questões:
i) - Nulidade por não discriminação dos factos não provados na sentença;
ii) - Impugnação da matéria de facto, concretamente quanto ao ponto nº11 da matéria de facto que os Recorrentes pretendem alterar para não provado;
iii) - Saber “se a carta registada enviada por um particular, sem o serviço especial de entrega em mão própria, se pode concluir que tenha chegado ao poder do destinatário”;
iv)- Preenchimento abusivo da livrança, antecipadamente entregue em branco, pelo valor da totalidade das prestações previstas no contrato de empréstimo e juros, feito neste condicionalismo (sem prévia interpelação dos obrigados no título).
Como se verifica situação de dupla conforme quanto a todas as questões identificadas, os Recorrentes interpõem revista excepcional, ao abrigo do art. 672º, nº1, alínea c), do CPC contradição do acórdão recorrido, respectivamente, com os acórdãos:
Do STJ de 26.02.2019, P. 136/14.4TBVNG-A.P1.S2;
Da Relação de Lisboa de 14.09.2017, P. 818/15.0T8AGH-A;
Da Relação de Lisboa de 11.10.2016, proferido no P. nº 4233/10.3TBVFX-A.L1-7.
A revista excepcional destina-se a possibilitar o recurso de revista nos casos em que por força da regra da dupla conforme (art. 671º, nº3), tal acesso estaria vedado.
Em anotação ao art. 672º do CPC, escrevem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil anotado, I, pag. 812), que “a revista excepcional está prevista para situações de dupla conforme, nos termos em que esta é delimitada pelo nº3 do art. 671º (sem prejuízo dos casos em que a revista é sempre admissível) desde que se verifiquem também os pressupostos gerais de acesso ao terceiro grau de jurisdição. (…)
O acesso à revista excepcional depende naturalmente da verificação dos pressupostos gerais de revista, designadamente os que respeitam à natureza ou conteúdo da decisão, em face do art. 671º, nº1, ao valor do processo e da sucumbência (art. 629º, nº1) ou à legitimidade (art. 631º).”
Constitui jurisprudência pacífica neste STJ que:
“Sem admissibilidade da revista em termos gerais, não é admissível a revista excepcional”, (acórdãos de 29.10.2020, P. 1387/17, e de 29.09.2022, P. 1070/20).
“A revista excepcional prevista no art. 672º só pode incidir sobre decisões finais e não sobre decisões interlocutórias, de natureza estritamente processual”. (acórdão de 31.01.2023. P. 4183/16).
Á luz das precedentes considerações, não pode ser objecto de revista o acórdão recorrido, confirmatório da sentença, que julgou não verificada a nulidade por não discriminação dos factos não provados, nem pode constituir objecto de revista o inconformismo dos Recorrentes contra o facto nº11 da matéria de facto, por o STJ não conhecer da matéria de facto (cfr. art. 674º, nº3 do CPC), nem a questão de saber “se a carta registada enviada por um particular, sem o serviço especial de entrega em mão própria, se pode concluir que tenha chegado ao poder do destinatário”, por as decisões em causa não preencherem a previsão no nº1 do art. 671º do CPC – “acórdão da Relação que conheceu do mérito da causa ou que pôs termo ao processo” - , e só quanto a estas, verificada uma situação de dupla conforme, pode haver revista excepcional.
Em face do exposto, decide-se:
- Rejeitar o recurso de revista quanto às questões supra identificadas em i), ii) e iii).
- Notifique e após trânsito, remeta à formação (art. 672º, nº3 do CPC) a quem cabe decidir sobre a verificação do pressuposto de revista excepcional invocado quanto à questão do alegado preenchimento abusivo da livrança.”
I – Deve anular-se a Decisão do Excelentíssimo Senhor Juiz Conselheiro Relator ao decidir (rejeitar “ o recurso de revista quanto às questões supra identificadas em i), ii) e iii) “), praticou um ato que a lei (artigo 672.º, do Código de Processo Civil) não admite, influindo no exame ou na decisão da causa e ordenar-se que proceda ao envio para a “ formação constituída por três juízes ” – artigo 672.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, para “ apreciação preliminar sumária” porquanto aquela questão é nula, nos termos do artigo 195.º, do Código de Processo Civil.
II - Deve anular-se a Decisão do Excelentíssimo Senhor Juiz Conselheiro Relator ao decidir (rejeitar “ o recurso de revista quanto às questões supra identificadas em i), ii) e iii) “), omitiu um ato que a lei (artigo 655.º, n.º 1, do Código de Processo Civil) prescreve, influindo no exame ou na decisão da causa e ordenar-se que se proceda à audição de “ cada uma das partes, pelo prazo de 10 dias “ – artigo 655.º, n.º 1, do Código de Processo Civil -, porquanto o Excelentíssimo Senhor Juiz Conselheiro Relator não cumpriu, como entendem os Recorrentes que deveria ter cumprido, o dever de sua audição,
III – Deve ser extraída do ordenamento jurídico a Decisão do Excelentíssimo Senhor Juiz Conselheiro Relator ao decidir (rejeitar “o recurso de revista quanto às questões supra identificadas em i), ii) e iii) “), omitiu um ato que a lei (artigos 20.º, da Constituição da República Portuguesa, 3.º, n.º 3 e 655.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil) prescreve, influindo no exame ou na decisão da causa e ordenar-se que se proceda à audição de “ cada uma das partes, pelo prazo de 10 dias “, porquanto o Excelentíssimo Senhor Juiz Conselheiro Relator cometeu nulidade processual ao não respeitar nem observar o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito conhecer de questões sem dar a oportunidade às partes de, previamente, sobre elas se pronunciarem, sendo proibidas decisões-surpresa.
IV- A aplicação remissiva do regime legal no processo executivo por força do artigo 854.º, do Código de Processo Civil, permite ainda identificar a recorribilidade de acórdãos da Relação quando se verifique a situação prevista no artigo 629.º, nº. 2, alínea d), do Código de Processo Civil (divergência essencial relativa a acórdão da Relação, em casos em que o acesso ao Supremo esteja impedido por motivos diversos dos relacionados com a alçada).
V – Em todos os casos decididos pelo Excelentíssimo Senhor Juiz Conselheiro Relator, quando rejeita “ o recurso de revista quanto às questões supra identificadas em i), ii) e iii) “, os Recorrentes convocam a contradição do Acórdão Recorrido com outros Acórdãos Fundamento, quando o Recurso de Revista está vedado por razões não ligadas ao valor do processo ou da sucumbência.
VI - Concede-se a possibilidade de pronúncia por parte do Supremo Tribunal de Justiça, sobre divergências das Relações em matérias que nunca poderiam ser apreciadas pelo Supremo, porque o recurso para este tribunal estaria afastado à partida.
VII - Independentemente de estarmos perante Recurso de Decisões Interlocutórias de 1.ª instância, em sede de oposição deduzida contra a execução, aplica-se sem mais o artigo 854.º, do Código de Processo Civil: irrecorribilidade em Revista e aplicação do artigo 629.º, n.º 2, seja para decisões finais, seja para decisões interlocutórias “velhas”.
VIII - Atenta a aplicabilidade do artigo 629.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, no seu todo, incumbe ao Supremo Tribunal de Justiça aquilatar da existência ou não das suscitadas contradições.
IX - Mostrando-se verificados os requisitos gerais e específicos de admissibilidade o Recurso de Revista interposto pelos Recorrentes deve, no seu momento (artigo 672.º, n.º 5, do Código de Processo Civil), ser admitido “ quanto às questões supra identificadas em i), ii) e iii) “, deferindo-se a Reclamação.
SEM PRESCINDIR
X - Pode constituir objeto de Revista o inconformismo dos Recorrentes contra o facto n.º 11 da matéria de facto, por o Supremo Tribunal de Justiça conhecer da matéria de facto, ao abrigo da exceção prevista no artigo 674.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.
O despacho do relator que indeferiu o recurso de revista relativamente às questões supra referidas em i), ii) e iii), não foi precedido de audição do Recorrente.
A alegada nulidade processual por omissão do despacho previsto no art. 655º do CPC, sempre estaria sanada com o acórdão da conferência, pelo que não será necessário apreciá-la (cfr. acórdãos do STJ de 09.07.2015, Sumários, 2015, pag. 429, e de 08.03.2016, P. 157/07, Sumários, Mar./2016, p. 6049.
Os Recorrentes interpuseram revista das seguintes decisões:
i) - Nulidade por não discriminação dos factos não provados na sentença;
ii) - Impugnação da matéria de facto, concretamente quanto ao ponto nº11 da matéria de facto que os Recorrentes pretendem alterar para não provado;
iii) - Saber “se a carta registada enviada por um particular, sem o serviço especial de entrega em mão própria, se pode concluir que tenha chegado ao poder do destinatário”;
Considerou o acórdão recorrido que a circunstância de a sentença não ter elencado os factos não provados, não constitui a nulidade processual do art. 195º, nº1, do CPCivil.
Na conclusão VI da revista, os Recorrentes insurgem-se contra este segmento decisório.
Esta decisão da Relação não é passível de recurso – art. 630º, nº2, do CPCivil.
A discordância dos Recorrentes com o ponto 11 da matéria de facto - “Do preenchimento da livrança foi dado conhecimento aos Embargantes, conforme cartas de13.09.2016, juntas aos autos como doc. 3, com a contestação” – não admite recurso de revista, nos termos do art. 674º, nº3 do CPC, por não verificada qualquer uma das situações excepcionais ali previstas: “ofensa de disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova, ou que fixe a força de determinado meio de prova.”
Quanto à alegação de ter o relator praticado um acto nulo por ter rejeitado a revista, ao invés de a remeter à formação prevista no art. 672º, nº3, do Código de Processo Civil, para “apreciação preliminar sumária”:
Não lhes assiste razão.
A este propósito, refere cf. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 7ª edição, p. 460):
“A tramitação da revista excepcional no STJ, passa pela sua distribuição na 1ªespécie do art. 215º do CPC, já que a lei apenas prevê uma espécie de recursos de revista; efectuada a distribuição, o recurso é apresentado ao relator que profere despacho liminar, com apreciação dos pressupostos e requisitos gerais, com eventual reclamação para a conferência (nº3 do art. 652º); se verificar a existência de uma situação de dupla conforme, e o recorrente tiver invocado algum ou alguns dos fundamentos excepcionais para a admissibilidade da revista (nº1 do art. 672º), o relator determina a remessa à Formação prevista nº3 do art. 672º, que exclusivamente intervém para apreciação de tais fundamentos; admitido, por acórdão da formação, o processo é remetido de novo ao relator a quem foi inicialmente distribuído.”
É este o procedimento seguido no STJ na sequência do Provimento nº23/2019, do Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Por conseguinte, a intervenção da Formação limita-se a decidir sobre a verificação do fundamento ou fundamentos da revista excepcional invocados, não lhe cabendo verificar se no caso se mostram preenchidos os pressupostos gerais de recorribilidade, relacionados com a natureza e conteúdo da decisão, valor da causa e da sucumbência, legitimidade e tempestividade.
Os restantes fundamentos da revista excepcional:
Relativamente à questão da não discriminação dos factos não provados, que o acórdão recorrido entendeu não consubstanciar a nulidade prevista no art. 615º, nº1, b) e d), alegam os Recorrentes contradição com o acórdão do STJ de 26.02.2019, proferido no P. nº 1316/14. TBVNG-A.P1.S2, motivo por que interpõem o recurso ao abrigo da alínea c) do nº1, art. 672º.
Também a questão do alegado “preenchimento abusivo da livrança”, cuja decisão, nos dizeres dos Recorrentes, está em contradição com o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 11.10.2016, (P.nº4233/10.3TBVFX-A.L1-7), pode também constituir o fundamento da revista excepcional previsto no art. 672º, nº1, c) do CPC.
Cabe à Formação a que alude o nº3 do art. 672º do CPC, decidir se se verificam os fundamentos da revista excepcional invocados.
Decisão.
Em face do exposto, acorda-se em:
- Confirmar o despacho do relator que rejeitou o recurso com fundamento na nulidade do art. 195º, nº1, do CPC;
Após trânsito, remeta os autos à Formação para os fins supra referidos.
Custas pelos Recorrentes.
Lisboa, 23/04/2025
Ferreira Lopes (relator)
Fátima Gomes
Nuno Manuel Pinto Oliveira