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ACORDO DE EMPRESA
RETRIBUIÇÃO DE FÉRIAS
SUBSÍDIO DE FÉRIAS
SUBSÍDIO DE NATAL
RELAÇÕES ENTRE AS FONTES DE REGULAÇÃO
Sumário
I - Aos Autores incumbe a alegação dos factos que consideram fundamentar o pedido formulado, de pagamento das médias atinentes ao trabalho suplementar nas retribuições de férias e subsídios de férias e de Natal. II - Às Rés incumbe alegar factos que infirmem o alegado pelos Autores. III - Não é suficiente, na prossecução deste desiderato, que as Rés se limitem a colocar como hipótese que, entre o trabalho suplementar por aqueles alegado, tenha existido trabalho prestado em dias feriados e em dias de descanso obrigatório ou complementar, com majoração retributiva, cujas médias deveriam ser apuradas separadamente, nada referindo em concreto sobre o assunto. IV – Em relação ao subsídio de Natal, se é certo que os artigos 250º do CT/2003 e 262º do CT/2009 estabeleceram o princípio de que a base de cálculo das prestações complementares e acessórias é apenas a retribuição base e diuturnidades, também é certo que excepcionam as situações em que as disposições legais, convencionais ou contratuais dispuserem em contrário, pelo que, se tal acontecer, as componentes variáveis da retribuição terão assento no cálculo daquele subsídio.
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa
I – Relatório
AA, BB, CC, DD, intentaram a presente acção declarativa de condenação, a seguir a forma de processo comum, contra Scotturb – Transportes Urbanos, Lda., e Viação Alvorada, Lda., pedindo “1. Serem a Rés solidariamente condenadas a pagar ao Autor AA nas retribuições de férias, subsídios de férias e Natal a quantia total de 20.649,69€ (vinte mil seiscentos e quarenta e nove euros e sessenta e nove cêntimos), referente à média anual dos valores auferidos a título de trabalho suplementar (16.787,03€) e de trabalho nocturno (3.862,66€) auferidos com carácter de regularidade nos anos de 2008 a 2022;
2. Serem as Rés solidariamente condenadas a pagar ao Autor BB as retribuições de férias, subsídios de férias e Natal a quantia de 24.986,40€ (vinte e quatro mil novecentos e oitenta e seis euros e quarenta cêntimos) referente à média anual dos valores auferidos a título de trabalho suplementar (22.551,66€), de trabalho nocturno (935,02€) e de subsídio de agente único (1.499,72€) auferidos com carácter de regularidade nos anos de 1998 e 2022;
3. Serem as Rés solidariamente condenadas a pagar ao Autor CC nas retribuições de férias, subsídios de férias e Natal a quantia de 13.268,15€ (treze mil duzentos e sessenta e oito euros e quinze cêntimos) referente à média anual dos valores auferidos a título de trabalho suplementar (10.667,59€), de trabalho nocturno (1.780,94€) e de subsídio de agente único (819,63€) auferidos com carácter de regularidade nos anos de 1993 a 2020;
4. Serem as Rés solidariamente condenadas a pagar ao Autor DD nas retribuições de férias, subsídios de férias e Natal a quantia de 12.300,49€ (doze mil trezentos euros e quarenta e nove cêntimos) referente à média anual dos valores auferidos a título de trabalho suplementar (11.122,72€) e de trabalho nocturno (1.177,77€) auferidos com carácter de regularidade nos anos de 2006 a 2022; 5. Serem as Rés solidariamente condenadas a pagar aos Autores os juros de mora legais vencidos e vincendos até integral pagamento das quantias peticionadas;”.
Alegam que, são quatro motoristas de pesados de passageiros que trabalhavam para a Ré, Scotturb, uma empresa de transporte público, e que foram transferidos para a Ré, Viação Alvorada, após esta ter vencido o concurso público para a exploração do serviço na Área Metropolitana de Lisboa.
A transmissão de estabelecimento ocorreu em 01/01/2023, pelo que a Ré, Viação Alvorada, passou a ser a sua entidade empregadora, mantendo-se a Ré, Scotturb, solidariamente responsável pelas obrigações vencidas até à data da transmissão, durante dois anos.
A sua retribuição é composta por uma parte fixa e por outra variável. A parte certa da remuneração é composta pela retribuição mensal base, e a parte variável é composta pelo subsídio de agente único, pelo trabalho suplementar e pelo trabalho nocturno.
A Ré, Scotturb, nunca integrou na retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal, a média dos valores auferidos a título de trabalho suplementar e de trabalho nocturno, bem como o subsídio de agente único, que eram pagos com regularidade mensal. Só a partir de Agosto de 2022, com aplicação do contrato colectivo de trabalho celebrado entre a FECTRANS e a ANTROP, publicado no BTE n.º 27, de 22/07/2022, o subsídio de Natal passou apenas a integrar, nos termos da cláusula 57.ª, o valor da retribuição base.
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Foi realizada audiência de partes não sendo possível a sua conciliação.
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As Rés apresentaram contestação, alegando desde logo que o pedido do 3.º Autor é improcedente por se referir a créditos anteriores a 1996, que não foram reclamados nem transmitidos para as Rés.
Alegam ainda que os pedidos dos 1.º e 2.º Autores são improcedentes por não se verificarem os requisitos de regularidade e periodicidade das retribuições variáveis, que não devem ser integradas no subsídio de Natal a partir de 2003, nem no cálculo das prestações complementares ou acessórias.
Concluem pedindo seja “liminarmente declarado improcedente o pedido pelo 3.º A. de créditos pelo período anterior ao ano de 1996, bem como a presente acção ser declarada improcedente por falta de fundamento no que toca aos valores peticionados a título de integração das retribuições variáveis na retribuição de férias e subsídios de férias e totalmente improcedente no que toca à sua integração no subsídio de Natal a partir de2003, bem como no demais peticionado e, consequentemente, serem as RR. absolvidas nessa medida dos pedidos como formulados pelos AA.”
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Foi proferido despacho saneador, o qual conheceu da validade e regularidade da instância.
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Foi fixado o objecto do litígio.
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Foi dispensada a fixação dos temas da prova.
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Foi realizado julgamento com observância do legal formalismo.
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A sentença julgou “a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente:
a) Condeno as RR. Scotturb - Transportes Urbanos, Lda. e Viação Alvorada Lda., a integrarem nas retribuições de férias, subsídios de férias e de Natal do A. AA a média dos valores recebidos a título de trabalho suplementar e de trabalho nocturno em 11 dos 12 meses de trabalho anteriores aos meses em que são gozadas as férias e processado o subsídio de Natal, no período temporal compreendido entre 2008 e 2022. b) Condeno as RR. Scotturb - Transportes Urbanos, Lda. e Viação Alvorada Lda., a integrarem nas retribuições de férias, subsídios de férias e de Natal do A. BB a média dos valores recebidos a título de trabalho suplementar em 11 dos 12 meses de trabalho anteriores aos meses em que são gozadas as férias e processado o subsídio de Natal, no período temporal compreendido entre 1998 e 2012, 2014 e 2019.
c) Condeno as RR. Scotturb - Transportes Urbanos, Lda. e Viação Alvorada Lda., a integrarem nas retribuições de férias, subsídios de férias e de Natal do A. BB a média dos valores recebidos a título de trabalho nocturno em 11 dos 12 meses de trabalho anteriores aos meses em que são gozadas as férias e processado o subsídio de Natal, no período temporal compreendido entre 1998 e 2019, 2021 e 2022.
d) Condeno as RR. Scotturb - Transportes Urbanos, Lda. e Viação Alvorada Lda., a integrarem nas retribuições de férias, subsídios de férias e de Natal do A. BB a média dos valores recebidos a título de subsídio de agente único em 11 dos 12 meses de trabalho anteriores aos meses em que são gozadas as férias e processado o subsídio de Natal, no período temporal compreendido entre 1998 e 2002.
e) Condeno as RR. Scotturb - Transportes Urbanos, Lda. e Viação Alvorada Lda., a integrarem nas retribuições de férias, subsídios de férias e de Natal do A. CC a média dos valores recebidos a título de trabalho suplementar em 11 dos 12 meses de trabalho anteriores aos meses em que são gozadas as férias e processado o subsídio de Natal, em 2005, e de 2010 a 2020.
f) Condeno as RR. Scotturb - Transportes Urbanos, Lda. e Viação Alvorada Lda., a integrarem nas retribuições de férias, subsídios de férias e de Natal do A. CC a média dos valores recebidos a título de trabalho nocturno no período temporal compreendido entre 2005 e 2020.
g) Condeno as RR. Scotturb - Transportes Urbanos, Lda. e Viação Alvorada Lda., a integrarem nas retribuições de férias, subsídios de férias e de Natal do A. DD a média dos valores recebidos a título de trabalho suplementar em 11 dos 12 meses de trabalho anteriores aos meses em que são gozadas as férias e processado o subsídio de Natal, no período temporal compreendido entre 2006 e 2017.
h) Condeno as RR. Scotturb - Transportes Urbanos, Lda. e Viação Alvorada Lda., a integrarem nas retribuições de férias, subsídios de férias e de Natal do A. DD a média dos valores recebidos a título de trabalho nocturno em 11 dos 12 meses de trabalho anteriores aos meses em que são gozadas as férias e processado o subsídio de Natal, no período temporal compreendido entre 2006 e 2019, 2021 e 2022.
i) Condeno as RR. Scotturb - Transportes Urbanos, Lda. e Viação Alvorada Lda., a pagarem aos AA. os juros moratórios, calculados às taxas legais de 15%, 10%, 7% e 4% ou outra que vier a ser legalmente fixada, sobre as quantias calculadas de acordo com os critérios supra expostos, desde a data do vencimento dos créditos, até efectivo e integral pagamento. j) Absolvo as RR. do pedido de condenação na integração na retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal da média dos valores vencidos até 31 de Dezembro de 1995, formulada pelo A. CC.”
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Inconformadas, as Rés interpuseram recurso, concluindo nas suas alegações que
“A. No que toca ao requisito da periodicidade e da sua repercussão nas expectativas de ganho do trabalhador, é evidente que a falta da cadência mensal exigível na realização do trabalho em dia de feriado e em dia de descanso obrigatório e complementar e, consequentemente, a falta do seu especial pagamento mensal, não permitia (e não permite) legitimar que o A. gerasse a expectativa dessa componente remuneratória considerar-se sua retribuição integrante do valor da retribuição de férias, do subsídio de férias e de natal vencidos durante esse período de tempo.
B. Os valores mensais de trabalho prestado em dias de feriado e em dias de descanso semanal obrigatório ou complementar não são passíveis de integrar o valor médio do demais trabalho suplementar apurado para efeito de incorporar o pagamento daquelas retribuições caso os AA. não demonstrem o seu abono 11 meses por ano, pelo que nesta parte improcede desde logo o pedido do AA.-
C. Revertendo a jurisprudência acima Alegada para o clausulado do Acordo de Empresa celebrado entre a Stagecoach Portugal Transportes Rodoviários, Lda, e a FESTRU (publicado no BTE, n.º 1, de 08.01.1997), aplicável às relações de trabalho sub iudice, verifica-se mutatis mutandis ser igual a ratio decidendi no que toca à interpretação das suas análogas cláusulas 46.ª (Remuneração por trabalho nocturno), 47.ª (Remuneração do trabalho suplementar) e 48.ª (Remuneração do trabalho em dia de descanso semanal ou feriado), para o que importa à boa decisão nos autos.
D. Ora nenhum dos cálculos apresentados pelos AA. nas tabelas anuais sob os artigos 34.º a 37.º, da p.i., obedece a esse critério que a citada jurisprudência vem consolidando ficando, por tal, impugnados todos os valores e cálculos aí apresentados, com os demais efeitos legais.
E. Isto porque, reitera-se, esses cálculos não autonomizam as quantias relativas aos abonos pelo trabalho suplementar em dia de feriado e de descanso semanal (cl.ª 48) o que significa que o valor de tais abonos terá sido indistintamente inserido na coluna dessas tabelas relativas aos abonos por trabalho suplementar (cl.ª 47.ª) e, assim, deles não se distingue, não permitindo apurar se o seu pagamento se verificou, ou não, 11 vezes por ano permitindo alcançar a cifra da sua média mensal anual; F. Face ao exposto, deve a sentença recorrida ser revogada no que toca ao decidido sobre aos valores peticionados a título de integração das retribuições variáveis, por ter desconsiderado as relativas ao trabalho em dia feriado e de descanso semanal, na retribuição de férias e nos subsídios de férias (e não nos subsídios de Natal como adiante se verá), cujo montante deverá ser remetido liquidar em sede de execução de sentença. G. Sempre improcederá o pedido de integração daqueles componentes remuneratórios variáveis no pagamento dos subsídios de Natal, bem como do subsídio de agente único, pois, conforme já determinava o artigo 250.º do Código do Trabalho de 2003 e determina o vigente n.º 1, do artigo 262.º, do Código do Trabalho de 2009, sob a epígrafe “Cálculo de prestaçãocomplementar ou acessória”: “Quando disposição legal, convencional ou contratual não disponha em contrário, a base de cálculo da prestação complementar ou acessória é constituída pela retribuição base e diuturnidades.”.
H. O subsídio de Natal é uma prestação complementar, logo, exige-se para a não aplicação do comando do então artigo 250.º do Código do Trabalho de 2003 e do artigo 262.º do vigente que o Acordo de Empresa invocado a contrarie em sentido oposto, o que, manifestamente, não se verifica.
I. Acresce, por força do disposto nessas normas e no artigo 8.º, n.º 1, da Lei n.º 99/2003 de 27 de Agosto que aprovou o Código do Trabalho de 2003, que para efeitos de subsídio de Natal de 2003 em diante apenas se computa a retribuição base, nada mais sendo devido a tal título pelas RR. aos AA.
J. Esses normativos são aplicáveis no caso, já que parte dos subsídios de Natal em causa venceram-se depois da entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003, reportando-se a efeitos de factos ou situações ainda não totalmente passadas (artigos 3.º, n.º 1, e 8.º, n.º 1, da Lei n.º 99/2003), considerando que Acordo de Empresa aplicável lhes é anterior, pois, foi publicado no ano de 1997.
K. A interpretação que funda a decisão recorrida não é pois aplicável ao caso sub iudice uma vez que o n.º 1, da cláusula 51.ª do Acordo de Empresa não afasta expressamente aqueles normativos, em sentido contrário, limitando-se a estipular que “Todos os trabalhadores abrangidos por este AE têm direito a um subsídio correspondente a um mês de retribuição o qual será pago ou posto à sua disposição até 15 de Dezembro de cada ano.”, pelo que deve nessa parte a sentença ser revogada e substituída no sentido propugnado pelas Recorrentes.
Nestes termos e nos demais de Direito aplicável, sem prescindir do mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada parcialmente a decisão proferida pelo tribunal a quo como acima exposto, consequentemente, serem as RR., ora Recorrentes, absolvidas de parte do pedido como acima alegado.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Exmo Procurador-Geral Adjunto, junto este Tribunal da Relação, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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As Rés exerceram o contraditório.
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Os autos foram aos vistos às Exmas Desembargadoras Adjuntas.
Cumpre apreciar e decidir
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II – Objecto
Considerando as conclusões de recurso apresentadas, que delimitam o seu objecto, cumpre apreciar e decidir
- sobre as consequências, em concreto, da não autonomização pelos Autores da remuneração auferida em dias feriados e em dias de descanso obrigatório ou complementar, para efeitos da sua integração na retribuição de férias e no subsídio de férias;
- se devem ser incluídos no subsídio de Natal vencido entre 2003 e 2022 os valores médios recebidos pelos Autores a título de trabalho suplementar.
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III – Fundamentação de Facto
São os seguintes os factos considerados provados pela 1ª instância:
1-O Autor, AA, foi admitido ao serviço da Ré em 02 de Junho de 2008, para sob as suas ordens, direcção e fiscalização lhe prestar a sua actividade de motorista de pesados de passageiros em regime de agente único.
2- O Autor, BB, foi admitido ao serviço da Ré em Agosto de 1998, para sob as suas ordens, direcção e fiscalização lhe prestar a sua actividade de motorista de pesados de passageiros em regime de agente único.
3- O Autor, DD, foi admitido ao serviço da Ré em 16 de Novembro de 2001, para sob as suas ordens, direcção e fiscalização lhe prestar a sua actividade de motorista de pesados de passageiros em regime de agente único.
4- O Autor, CC, foi admitido ao serviço da Rodoviária de Lisboa, S.A., em data não concretamente apurada, para sob as suas ordens, direcção e fiscalização lhe prestar a sua actividade de motorista de pesados de passageiros em regime de agente único, estando ao serviço desta, pelo menos desde 1 de Janeiro de 1993.
5- Os Autores estão sindicalizados no Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos de Portugal, por sua vez filiado na FECTRANS, e as Rés são associadas na ANTROP.
6- Retirado conforme decisão infra.1
7- Em Junho de 2022, a Ré, Scotturb, informou que, conjuntamente com a empresa Vimeca Transportes, se apresentou, através da criação de nova entidade empresarial, a Ré Viação Alvorada, Lda., ao concurso público para exploração do serviço de transporte público de passageiros da Área Metropolitana de Lisboa, tendo vencido a área geográfica do Lote 1.
8- Por força de tal factualidade, o serviço de transporte público assegurado pela Ré Scotturb passaria a ser prestado pela Ré Viação Alvorada, Lda., que desenvolveria a sua actividade nas instalações das empresas da Ré Scotturb e da Vimeca Transportes com recurso aos meios e equipamentos destas empresas.
9- A exploração do serviço de transporte público de passageiros pela Ré Viação Alvorada teve o seu início no dia 01/01/2023, operando-se a partir de tal data a transmissão automática do estabelecimento, transmitindo-se para a Ré Viação Alvorada a posição de empregador nos contratos de trabalho dos trabalhadores da Ré Scotturb.
10- Os Autores têm um horário de trabalho de 40 horas semanais, distribuídas por 5 dias, cumprindo com os serviços de carreiras impostos pelas Rés, em chapas numeradas/escalas de serviço diárias que variam consoante a vontade e interesse destas que, em termos abstractos, pode ser efectuada por qualquer trabalhador da empresa, sendo assim uma chapa geral de um determinado serviço específico.
11- Sendo, portanto, as Rés que indicam aos Autores o traçado rodoviário e os destinos a atingir, dentro dos horários e escalas por elas pré-estabelecidos, determinando ainda qual o trabalhador concreto que irá efectuar a chapa de serviço geral naquele dia específico.
12- Até 01/01/2023 os Autores sempre exerceram um horário de trabalho que lhe era imposto pela Ré Scotturb.
13- A remuneração dos Autores é composta por uma parte certa e outra variável, sendo a parte certa composta pela retribuição base.
14- Com efeitos a 1 de Janeiro de 1996, a sociedade, Stagecoach Portugal Transportes Rodoviários, Lda, adquiriu a actividade da empresa Rodoviária de Lisboa, S.A., atinente ao Centro de Actividades de Transporte (CAT) 1 e 2.
15- Em 2001, a Stagecoach vendeu à Vimeca Transportes a sua operação em Portugal, criando-se assim a Scotturb, constituída em Junho de 2001 (cfr. https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Scotturb e https://scotturb.com/a-empresa/)
16- A partir de Fevereiro de 1996, o salário base, bem como todos os suplementos devidos, passaram a ser pagos pelas Stagecoach Portugal.
17- Os trabalhadores afectos aos Centros de Actividade de Transporte (CAT) 1 e 2 deveriam reclamar os créditos vencidos e não liquidados de que fossem titulares relativamente à Rodoviária até ao momento da transmissão dos referidos estabelecimentos, ou seja, até 31 de Dezembro de 1995.
18- O Autor, AA, prestou trabalho suplementar no período temporal compreendido entre os anos de 2008 a 2022, com a seguinte periodicidade:
a) 2008- de Junho a Dezembro (7 meses);
b) De 2009 a 2022- de Janeiro a Dezembro (12 meses);
19- O Autor, AA, prestou trabalho nocturno no período temporal compreendido entre os anos de 2008 a 2022, com a seguinte periodicidade:
a) 2008- de Junho a Dezembro (7 meses);
b) De 2009 a 2022- de Janeiro a Dezembro (12 meses).
20- O Autor, BB, prestou trabalho suplementar no período temporal compreendido entre os anos de 1998 a 2022, com a seguinte periodicidade:
a) 1998- de Agosto a Dezembro (5 meses);
b) De 1999 a 2012- de Janeiro a Dezembro (12 meses);
c) De 2014 a 2019 - de Janeiro a Dezembro (12 meses).
21- O Autor, BB, prestou trabalho nocturno no período temporal compreendido entre os anos de 1998 a 2022, com a seguinte periodicidade:
a) 1998- de Agosto a Dezembro (5 meses);
b) De 1999 a 2019- de Janeiro a Dezembro (12 meses);
c) 2021 e 2022 - de Janeiro a Dezembro (12 meses);
22- O Autor, BB, auferiu quantias pecuniárias a título de subsídio de agente único, no período temporal compreendido entre 1998 e 2002, com a seguinte periodicidade:
a) 1998 - de Agosto a Dezembro (5 meses);
b) De 1999 a 2002 - de Janeiro a Dezembro (12 meses).
23- O Autor, CC, prestou trabalho suplementar no período temporal compreendido entre os anos de 1993 a 2020, com a seguinte periodicidade:
a) De 1993 a 1995- de Janeiro a Dezembro (12 meses);
b) Em 2005 - de Janeiro a Dezembro (12 meses);
c) De 2010 a 2020 - de Janeiro a Dezembro (12 meses).
24- O Autor, CC, prestou trabalho nocturno no período temporal compreendido entre os anos de 1993 a 2020, com a seguinte periodicidade:
a) De 1993 a 1995- de Janeiro a Dezembro (12 meses);
b) De 2004 a 2020 - de Janeiro a Dezembro (12 meses).
25- O Autor, CC, auferiu quantias pecuniárias a título de subsídio de agente único, no período temporal compreendido entre 1993 e 1995, com a seguinte periodicidade:
a) De 1993 a 1995 - de Janeiro a Dezembro (12 meses).
26- O Autor, DD, prestou trabalho suplementar no período temporal compreendido entre os anos de 2006 a 2022, com a seguinte periodicidade:
a) 2006 e 2007 - de Janeiro a Dezembro (12 meses);
b) De 2009 a 2017 - de Janeiro a Dezembro (12 meses);
27- O Autor, DD, prestou trabalho nocturno no período temporal compreendido entre os anos de 2006 a 2022, com a seguinte periodicidade:
a) 2006 e 2007 - de Janeiro a Dezembro (12 meses);
b) De 2009 a 2019 - de Janeiro a Dezembro (12 meses);
c) 2021 e 2022 - de Janeiro a Dezembro (12 meses).
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IV – Apreciação do Recurso
1.Como questão prévia, consideramos que a matéria elencada sob o nº6 dos factos provados é matéria de Direito e não de facto, pelo que se exclui a mesma do elenco dos factos provados.
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2.A primeira questão a decidir é a da autonomização da remuneração auferida em dia feriado ou de descanso semanal obrigatório ou complementar, e consequências dessa não autonomização para efeitos da integração dessas retribuições na retribuição de férias e no subsídio de férias.
As Rés alegam que os valores mensais do trabalho prestado em dias feriados e em dias de descanso semanal obrigatório ou complementar não são passíveis de integrar o valor médio do demais trabalho suplementar apurado para efeito de incorporar o pagamento das retribuições de férias e dos subsídios de férias, caso os Autores não demonstrem o seu abono 11 meses por ano. Acrescentam que nenhum dos cálculos apresentados pelos Autores nas tabelas anuais obedece a esse critério, pois não autonomizaram as quantias relativas aos abonos pelo trabalho suplementar em dia feriado e de descanso semanal, o que significa que o valor dos abonos que alegaram “terá sido indistintamente inserido na coluna dessas tabelas relativas aos abonos por trabalho suplementar … e, assim, deles não se distingue, não permitindo apurar se o seu pagamento se verifica, ou não, 11 vezes por ano permitindo alcançar a cifra da sua média mensal anual.” Concluem, impugnando todos os valores e cálculos aí apresentados.
Desde logo dizer que as Rés não parecem pretender impugnar a resposta à matéria de facto. Mas, se essa fosse a sua pretensão, manifestamente não cumpriram os ónus a que se refere o artigo 640º do CPC, pelo que sempre seria a mesma inadmissível.
Verbalizam pretender a revogação da sentença, com a remessa para liquidação posterior, quanto aos valores médios a integrar nas retribuições de férias e nos subsídios de férias atinentes ao trabalho suplementar em todas as suas vertentes, por os Autores não terem identificado separadamente de entre o trabalho suplementar prestado, qual foi prestado em dia feriado ou em dia de descanso obrigatório ou complementar.
De notar que, na contestação, as Rés alegam que “os valores mensais de trabalho prestado em dias de feriado e em dias de descanso semanal obrigatório ou complementar não são passíveis de integrar o valor médio do demais trabalho suplementar apurado para efeito de incorporar o pagamento daquelas retribuições caso os AA. não demonstrem o seu abono 11 meses por ano”, e que “nenhum dos cálculos apresentados pelos Autores nas tabelas anuais sob os artigos 34.º a 37.º, da p.i., obedece a esse critério que a citada jurisprudência vem consolidando indo, por tal, impugnados todos os valores e cálculos aí apresentados, com os demais efeitos legais. Isto porque, desde logo, esses cálculos não autonomizam as quantias relativas aos abonos pelo trabalho suplementar em dia de feriado e de descanso semanal (cl.ª 48) o que significa que o valor de tais abonos terá sido, porventura, indistintamente inserido na coluna dessas tabelas relativas aos abonos por trabalho suplementar (cl.ª 47.ª) e, assim, deles não se distingue, não permitindo apurar se o seu pagamento se verificou, ou não, 11 vezes por ano permitindo alcançar a cifra da sua média mensal anual.”
Ou seja, as Rés alegaram que os Autores, nas tabelas anuais que apresentam na p.i. não obedecem à discriminação dos valores auferidos a título de trabalho em dias feriados e em dias de descanso obrigatório ou complementar e declaram impugnar os valores apresentados. No entanto, nada alegam no sentido de demonstrar que, efectivamente, os valores apresentados pelos Autores, a título de trabalho suplementar, não podiam ser os que estes apresentaram. Ora, se impugnaram tais valores, deveriam ter esclarecido concretamente por que razão o faziam.
Os Autores alegaram os factos constitutivos do seu direito, e fizeram prova dos mesmos, como lhes competia (artigo 342º nº1 do C.Civil), sendo que, mesmo em sede recursiva, as Rés não impugnaram a matéria de facto, mormente a prova considerada pelo tribunal a quo como demonstrativa do alegado pelos Autores.
As Rés afirmam, em sede de contestação, que os valores dos abonos alegados pelos Autores na p.i. “terá sido, porventura, indistintamente inserido na coluna dessa tabelas relativas aos abonos por trabalho suplementar”, mas o tribunal não age mediante a invocação de suspeitas ou suposições.
Aos Autores incumbia a alegação dos factos que consideravam fundamentar o pedido formulado, de pagamento das médias atinentes ao trabalho suplementar nas retribuições de férias e subsídios de férias e de Natal. Assim fizeram.
Às Rés incumbia alegar factos que infirmassem o alegado pelos Autores. Não o fizeram, limitando-se a colocar, como hipótese, que, entre o trabalho suplementar por aqueles alegado, tenha existido trabalho prestado em dias feriados e em dias de descanso obrigatório ou complementar, com majoração retributiva, cujas médias deveriam ser apuradas separadamente, nada referindo em concreto sobre o assunto, o que é insuficiente para contrapor a tese dos Autores.
Portanto, nada mais resta do que considerar improcedente o recurso, nesta parte.
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3. Consideram ainda as Rés que a base de cálculo da prestação complementar, subsídio de Natal, é apenas a retribuição base e as diuturnidades, pelo que improcederá a integração das componentes remuneratórios variáveis a que se refere o recurso - os vários tipos de trabalho suplementar e o subsídio de agente único - no pagamento dos subsídios de Natal após o ano de 2003.
A 1ª instância pronunciou-se nos seguintes termos: “Quanto ao subsídio de Natal, prescreve a cláusula 51ª n.º 1 do mesmo AE que todos os trabalhadores por ele abrangidos têm direito a um subsídio correspondente a 1 mês de retribuição o qual será pago ou posto à sua disposição até 15 de Dezembro de cada ano.
Considerando o conceito de retribuição assumido pelo AE, mais não resta do que concluir pela inclusão, nas férias e nos subsídios de férias e de Natal, da média dos valores recebidos, a título de trabalho suplementar e de trabalho nocturno, calculada pelos 12 meses de trabalho anteriores aos meses em que são gozadas as férias e processado o subsídio de Natal (cfr., neste sentido, o Acórdão do STJ de 09-05-2007 (P. 06S3211, disponível para consulta em Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (dgsi.pt)), no período temporal compreendido entre 1993 e 27 de Julho de 2022.
Com efeito, nos termos da cláusula 2ª n.º 1 do contrato colectivo de trabalho celebrado entre a FECTRANS e a ANTROP, publicado no BTE n.º 27, de 22/07/2022, este instrumento de regulamentação colectiva de trabalho entrou em vigor 5 dias após a sua publicação no BTE, ou seja, em 27 de Julho de 2022.
(…)
Quanto à integração no subsídio de Natal, estabelece a cláusula 57ª:
1- Todos os trabalhadores abrangidos por este CCTV têm direito a um subsídio correspondente a um mês de retribuição base, o qual será pago ou posto à sua disposição até 15 de dezembro de cada ano. 2- Considerando a integração da totalidade do subsídio de agente único na retribuição base paga aos motoristas de serviço público, o montante pago a título de subsídio de Natal inclui já o aludido valor. No caso dos motoristas de serviço comercial, o montante pago a título de subsídio de Natal incluirá, para além da retribuição base, o proporcional do subsídio de serviço público, nos termos da cláusula 17.ª.
O regime convencional diverge do actual Código do Trabalho no que respeita às componentes retributivas das férias e respectivo subsídio (cfr. 0 art.º 264º do CT).
Está, no entanto, em linha com o conceito de retribuição a atender para o cálculo do subsídio de Natal (cfr. o art.º 263º n.º 1 do CT), considerando que a partir do CT de 2003 a “retribuição” para efeitos de subsídio de natal, salvo disposição contrária dos IRCT, é constituída apenas pela retribuição base e diuturnidades.
Como resulta do disposto no art.º 3º n.º 3 do CT de 2009, as normas legais reguladoras de contrato de trabalho só podem ser afastadas por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que, sem oposição daquelas normas, disponha em sentido mais favorável aos trabalhadores quando respeitem às seguintes matérias:
j) Forma de cumprimento e garantias da retribuição, bem como pagamento de trabalho suplementar.
O mencionado contrato colectivo de trabalho prescreve, na cláusula 89ª n.º 1 que as partes consideram que o presente CCTV é globalmente mais favorável do que a anterior regulamentação colectiva aplicável, cujas disposições são integralmente revogadas.
Em conformidade, prevalece, na aplicação ao caso, a regulamentação constante do contrato colectivo de trabalho celebrado entre a FECTRANS e a ANTROP, publicado no BTE n.º 27, de 22/07/2022.
Em consequência, não deve ser incluída, nas férias e nos subsídios de férias e de Natal, a média dos valores recebidos, a título de trabalho suplementar e de trabalho nocturno, a partir de 27 de Julho de 2022.
Por último, e quanto ao subsídio de agente único, dispunha a cláusula 79ª n.º 3 do acordo de empresa celebrado entre a Stagecoach Portugal Transportes Rodoviários, Lda. e a FESTRU que a todos os motoristas de veículos pesados de serviço público de passageiros que trabalhem em regime de agente único será atribuído um subsídio especial de 25% sobre a remuneração da hora normal durante o tempo efectivo de serviço prestado naquela qualidade, com pagamento mínimo do correspondente a 4 horas de trabalho diário nessa situação.
Pode ler-se no Acórdão do STJ de 26-03-2008 (P.08S009, disponível em Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (dgsi.pt)): “(...) Ora, face aos normativos citados, dúvidas não há acerca da natureza remuneratória do subsídio de agente único que era recebido pelo autor. Com efeito, para além da regularidade e periodicidade com que era pago (...) é inquestionável que o subsídio era uma contrapartida do trabalho prestado pelo autor, mais propriamente era uma contrapartida pelo exercício das funções de cobrador-bilheteiro.
Ora, tratando-se de uma prestação de natureza remuneratória, a sua inclusão na retribuição e no subsídio de férias torna-se obrigatória, face ao disposto no art.º 6.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 874/76 e no art.º 255.º, n.ºs 1 e 2, do Código do Trabalho, nos termos dos quais a retribuição correspondente ao período de férias não pode ser inferior à que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo, tendo aqueles direito, ainda, a um subsídio de férias de montante igual ao dessa retribuição, sendo que, agora, por força do disposto no nº 2 do referido artº 255º, o subsídio de férias compreende, somente, a retribuição base “ e as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho”, o que acontece com o subsídio de agente único.
E no que concerne ao subsídio de Natal, a conclusão é a mesma, face ao disposto no n.º 1 da cl.ª 52.ª do A.E., que expressamente se refere ao subsídio de Natal, e ao disposto no art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 88/96, de 3/7. Nos termos daqueles dois normativos, os trabalhadores têm direito a um subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, excepto nassituações especiais neles previstas, mas que ao caso não interessam. Ora,como já dissemos, o subsídio de agente único tem natureza remuneratória, integrando, por isso, o conceito de retribuição.
Consequentemente, não pode deixar de ser computado para efeitos do subsídio de Natal.
A ré alega que o subsídio de agente único deixou de integrar o subsídio de Natal, pelo menos, a partir da entrada em vigor do Código do Trabalho. E tal resultaria, segundo a ré, do disposto no art.º 254.º conjugado com o disposto no art.º 250.º daquele corpo normativo. Com efeito, diz a ré, embora no n.º 1 do art.º 254.º se estipule que “[o] trabalhador tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano”, a verdade é que o art.º 250.º, n.º 1, restringe o conceito de retribuição, para efeitos de cálculo das prestações complementares e acessórias, à retribuição base e às diuturnidades.
A ré tem razão quando alega que o Código de Trabalho restringiu o conceito de retribuição, para efeitos de cálculo das prestações complementares e acessórias, à retribuição base e às diuturnidades. O n.º 1 do art.º 250.º do C.T. diz efectivamente isso, mas não diz só isso. Também diz que tal só acontece, se não houver disposições legais, convencionais ou contratuais em sentido contrário -(11). Ora, dizendo o n.º 2 da cl.ª 42.º do A.E. que “[a] retribuição compreende a remuneração de base e todas as outras remunerações regulares e periódicas directas ou indirectamente feitas em dinheiro ou em espécie” e determinando a cl.ª 52.º do mesmo A.E. que “[t]odos os trabalhadores abrangidos por este AE têm direito a um subsídio correspondente a um mês de retribuição, o qual será pago ou posto à sua disposição até 15 de Dezembro de cada ano”, parece óbvio que a retribuição a levar em conta nocálculo do subsídio de Natal terá de ser a retribuição prevista no A.E. e não a prevista no n.º 1 do art.º 250.º do C.T., por daí resultar um regime mais favorável para o autor.
Só assim não seria se o disposto no art.º 250.º do C.T. tivesse natureza absolutamente imperativa, o que manifestamente não acontece, atenta a ressalva nele expressamente contida. (...)”.
Assim, e tal como sucede para o trabalho suplementar e o trabalho nocturno, atenta a natureza de retribuição do subsídio de agente único mais não resta do que concluir pela inclusão, nas férias e nos subsídios de férias e de Natal, da média dos valores recebidos, a título de subsídio de agente único, calculada pelos 12 meses de trabalho anteriores aos meses em que são gozadas as férias e processado o subsídio de Natal, de 1993 a 27 de Julho de 2022.
(…)
A partir de 27 de Julho de 2022, do cct aplicável e já citado resulta a integração, com efeitos a Janeiro de 2022 do subsídio de agente único (cfr. a cláusula 85º), mantendo-se apenas a obrigação de pagamento dos proporcionais de tal subsídio na retribuição de férias e no subsídio de férias. No caso dos AA., como nenhum dos AA. auferiu qualquer quantia a título de subsídio de agente único após 1 de Janeiro de 2022, nada há a determinar quanto a tal matéria.”
Vejamos
De acordo com o disposto no art.º 8º nº 1 da Lei 99/2003 (CT/2003) “… ficam sujeitos ao Código do Trabalho os contratos de trabalho e os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho celebrados ou aprovados antes da sua entrada em vigor, salvo quanto às condições de validade e aos efeitos de factos ou situações totalmente passados anteriormente àquele momento.”
Isto significa que relativamente aos factos ocorridos após 1 de Dezembro de 2003, altura em que entrou em vigor a Lei 99/2003, que aprovou o Código do Trabalho (CT), tem aplicação o CT.
Com a entrada em vigor da Lei 7/2009, de 12-02, que aprovou o novo Código do Trabalho, e considerando o disposto no seu artigo 7.º nº 1 - “Sem prejuízo do disposto no presente artigo e nos seguintes, ficam sujeitos ao regime do Código do Trabalho aprovado pela presente lei os contratos de trabalho e os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho celebrados ou adoptados antes da entrada em vigor da referida lei, salvo quanto a condições de validade e a efeitos de factos ou situações totalmente passados anteriormente àquele momento.” - a partir de 17-02-2009, aos factos ocorridos após esta data, tem aplicação este Código.
Nos termos do art.º 254º CT/2003 “[O] trabalhador tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano” (nº 1). Tem semelhante redacção o artigo 263º nº1 do CT/2009.
De acordo com o artigo 250º do CT/2003 – “Cálculo de prestações complementares e acessórias
1 - Quando as disposições legais, convencionais ou contratuais não disponham em contrário, entende-se que a base de cálculo das prestações complementares e acessórias nelas estabelecidas é constituída apenas pela retribuição base e diuturnidades.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, entende-se por:
a) Retribuição base - aquela que, nos termos do contrato ou instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, corresponde ao exercício da actividade desempenhada pelo trabalhador de acordo com o período normal de trabalho que tenha sido definido; b) Diuturnidade - a prestação pecuniária, de natureza retributiva e com vencimento periódico, devida ao trabalhador, nos termos do contrato ou do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, com fundamento na antiguidade.
E de acordo com o disposto no artigo 262.º do CT/2009 – “Cálculo de prestação complementar ou acessória
1 - Quando disposição legal, convencional ou contratual não disponha em contrário, a base de cálculo de prestação complementar ou acessória é constituída pela retribuição base e diuturnidades.
2 - Para efeito do disposto no número anterior, entende-se por:
a) Retribuição base, a prestação correspondente à actividade do trabalhador no período normal de trabalho; b) Diuturnidade, a prestação de natureza retributiva a que o trabalhador tenha direito com fundamento na antiguidade.”
Como afirma Monteiro Fernandes, o subsídio de Natal constitui uma prestação complementar, pois “não tem correspectividade directa com certa quantidade de trabalho”2 , pelo que o “mês de retribuição” a que se referem os art.º 254º nº1 do CT/2003 e 263º nº1 do CT/2009, é equivalente apenas ao somatório da retribuição base e diuturnidades.3
A noção de retribuição base e diuturnidades é dada pelas alíneas a) e b) do nº 2, dos artigos 250º e 262º, respectivamente dos CT/2003 e 2009, nelas se não enquadrando outras prestações complementares, como ocorre com as prestações em causa no presente recurso.
Cumpre, no entanto, atentar que, se é certo que os artigos 250º do CT/2003 e 262º do CT/2009 estabeleceram o princípio de que a base de cálculo das prestações complementares e acessórias é apenas a retribuição base e diuturnidades, excepcionam, no entanto, as situações em que as disposições legais, convencionais ou contratuais dispuserem em contrário. In casu, há assim ainda a considerar, no período em causa, os IRC aplicáveis – o AE publicado no BTE nº 1 de 1997 - AE entre a Stagecoach Portugal Transportes Rodoviários, Lda, e a FESTRU — Feder. dos Sind. de Transportes Rodoviários e Urbanos e suas alterações – e o CCT publicado no BTE nº27 de 2022 - Contrato coletivo entre a Associação Nacional de Transportes de Passageiros - ANTROP e a Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações - FECTRANS - Revisão global.
Nos termos da cláusula 51ª do AE referido – “Subsídio de Natal
1 — Todos os trabalhadores abrangidos por este AE têm direito a um subsídio correspondente a um mês de retribuição o qual será pago ou posto à sua disposição até 15 de Dezembro de cada ano.
(…)”
A cláusula 41ª referente à “Retribuição do trabalho” dispõe que “1 — Só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito, como contrapartida do seu
trabalho.
2 — A retribuição compreende a remuneração base e todas as outras remunerações regulares e periódicas directa ou indirectamente feitas em dinheiro ou espécie.
(…)”
O CCT referido entrou em vigor 5 dias após a sua publicação no Boletim do Trabalho e Emprego (cfr. cláusula 2ª nº1).
Dispõe na sua cláusula 56ª “(Retribuição e subsídio de férias)
1- Durante o período em que ocorra o gozo de férias, os trabalhadores receberão da empresa a retribuição e um subsídio de férias de montante igual à retribuição base, correspondente ao período de férias a que têm direito.
2- Considerando a integração da totalidade do subsídio de agente único na retribuição base paga aos motoristas de serviço público, o montante pago a título de retribuição e de subsídio de férias inclui já o aludido valor. No caso dos motoristas de serviço comercial, o montante pago a título de retribuição e de subsídio de férias incluirá, para além da retribuição base, o proporcional do subsídio de serviço público, nos termos da cláusula 17.ª
3- Dos proporcionais a serem pagos na retribuição e subsídio de férias exclui-se qualquer outra cláusula de expressão pecuniária. 4- O subsídio de férias será pago no mês anterior ao gozo das férias ou, caso o gozo ocorra de forma interpolada, no mês anterior àquele em que se verificar o gozo do período mínimo de dez dias úteis consecutivos.”
E, de acordo com a sua cláusula 57ª “(Subsídio de Natal)
1- Todos os trabalhadores abrangidos por este CCTV têm direito a um subsídio correspondente a um mês de retribuição base, o qual será pago ou posto à sua disposição até 15 de dezembro de cada ano.
2- Considerando a integração da totalidade do subsídio de agente único na retribuição base paga aos motoristas de serviço público, o montante pago a título de subsídio de Natal inclui já o aludido valor. No caso dos motoristas de serviço comercial, o montante pago a título de subsídio de Natal incluirá, para além da retribuição base, o proporcional do subsídio de serviço público, nos termos da cláusula 17.ª
(…)”
Portanto, há que aferir se as atribuições patrimoniais que estão em causa no recurso integram ou não o conceito de retribuição a atender para o cálculo do subsídio de Natal no período questionado, tal como este está previsto na lei ou no IRC aplicáveis.
As recorrentes não questionam a natureza retributiva do trabalho suplementar, e do subsídio de agente único. O que entendem é que o subsídio de Natal apenas é integrado pela retribuição base.
No entanto, verifica-se que, em matéria de subsídio de Natal, o clausulado no instrumento de regulamentação colectiva, ao fazer corresponder este subsídio à totalidade da remuneração mensal, entendida esta em conformidade com o previsto na cláusula 41ª nº 1 e 2 do AE, é muito mais abrangente do que o que está previsto nos CT´s, onde o subsídio de Natal se circunscreve à retribuição base e diuturnidades, como supra referido. E é a própria legislação codicística que salvaguarda a hipótese de os IRC disporem em contrário, admitindo que a base de cálculo da prestação complementar comporte outras prestações, contrapartida do trabalho, pagas com carácter regular e periódico, para além da retribuição base e das diuturnidades.
Dispõe o artigo 3º nº1 do CT/2009 que “As normas legais reguladoras de contrato de trabalho podem ser afastadas por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, salvo quando delas resultar o contrário.” Isto é “[E]m caso de concurso entre as normas constantes do Código do Trabalho/2003 e as disposições dos instrumentos de regulamentação colectiva, a lei permite a intervenção destas últimas, quer em sentido mais favorável aos trabalhadores, quer em sentido menos favorável, apenas se exigindo que as normas do Código do Trabalho não sejam imperativas, pois se o forem, nunca se permitirá a intervenção das normas da regulamentação colectiva.”4
No presente caso, o IRC abrange as prestações variáveis que revistam as referidas características de serem contrapartida do trabalho e sejam pagas com carácter regular e periódico, e as Recorrentes não discutem neste recurso a natureza retributiva que foi declarada na sentença.
Já não assim quanto ao subsídio de Natal atinente ao ano de 2022, dado que o CCT aplicável o restringe à retribuição base (cláusula 57ª nº 1), pelo que, nesta parte, procede o recurso, alterando-se a sentença recorrida quanto ao Autor AA, relativamente à variável do trabalho suplementar, única objecto do recurso.
***
V – Decisão
Face ao exposto acordam as Juízas deste Tribunal e Secção em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelas Rés, e, em consequência, altera-se a sentença recorrida, passando a alínea a) do dispositivo a ter a seguinte redacção: “a) Condeno as RR. Scotturb - Transportes Urbanos, Lda. e Viação Alvorada Lda., a integrarem nas retribuições de férias, subsídios de férias e de Natal do A. AA a média dos valores recebidos a título de trabalho nocturno em 11 dos 12 meses de trabalho anteriores aos meses em que são gozadas as férias e processado o subsídio de Natal, no período temporal compreendido entre 2008 e 2022.
Relativamente ao trabalho suplementar, condenam-se as RR. Scotturb - Transportes Urbanos, Lda. e Viação Alvorada Lda., a integrarem nas retribuições de férias, subsídios de férias a média dos valores recebidos em 11 ou 12 meses de trabalho anteriores aos meses em que são gozadas as férias no período temporal entre 2008 e 2022, e em relação ao subsídio de Natal no período temporal entre 2008 e 2021.
Custas a cargo das Rés e do Autor AA, na proporção do respectivo decaimento.
Registe.
Notifique.
Registe e notifique.
Lisboa, 29 de Janeiro de 2025
Paula de Jesus Jorge dos Santos
Francisca Mendes
Alexandra Lage
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1. Tinha a seguinte redacção - Aplicam-se às relações laborais entre os Autores e as Rés as disposições do Acordo de Empresa da Stagecoach Portugal Transportes Rodoviários, L.da, e a FESTRU — Feder. Dos Sind. de Transportes Rodoviários e Urbanos, publicado no BTE n.º 1, 1ª Série, de 08 de Janeiro de 1997, e suas sucessivas alterações (http://bte.gep.mtss.gov.pt/completos/1997/bte1_1997.pdf), e a partir de 27 de Julho de 2022, o contrato colectivo de trabalho celebrado entre a FECTRANS e a ANTROP, publicado no BTE n.º 27, de 22/07/2022. http://bte.gep.msess.gov.pt/documentos/2022/27/29022933.pdf
2. In Direito do Trabalho, 16º edição, pág. 406.
3. Monteiro Fernandes, ob e pág. citadas.
4. Acórdão desta Relação de 19-06-2024 – Processo 25994/21.9T8LSB.L1-4.