ACÇÃO DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL DA REGULARIDADE E LICITUDE DO DESPEDIMENTO
EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
VALOR DA CAUSA
TRABALHADORA LACTANTE
INDEMNIZAÇÃO
DESPEDIMENTO ILÍCITO
Sumário

Despedimento ilícito – Extinção do posto de trabalho – Trabalhadora lactante – Decisão a proferir no caso de não ser apresentado o articulado de motivação do despedimento – Critérios a levar em conta na fixação da indemnização em substituição da reintegração – Ponderação da ilicitude e do montante da retribuição – Decisões que admitem sempre recurso – Impossibilidade de fixar o valor da causa por não existirem articulados – Fixação do valor da causa para efeito de custas – Acerto ulterior – Artigos 63.º, 369.º, 381.º, 384.º, 391.º e 392.º n.º 3 do Código do Trabalho – Artigos 98.º - P e 98.º - J do Código d Processo do Trabalho

Texto Integral

Apelação em processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento
Tribunal de origem: 1.º Juízo do Trabalho de Loures – Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte
Recorrente
AA, titular do número de identificação fiscal ..., com domicílio na Rua...
Recorrido
XX, UCRL, titular do número único de identificação fiscal e pessoa colectiva ..., com sede no Largo...
Acordam em conferência, na 4.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
Sentença recorrida
1. Por sentença de 20.8.2024 (referência citius 161921091), cujo teor se dá por integralmente reproduzido, o 1.º Juízo do Trabalho de Loures, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, (doravante também Tribunal de primeira instância, Tribunal recorrido ou Tribunal a quo), proferiu a seguinte decisão:
“Por conseguinte, ao abrigo da citada disposição legal:
1. Declara-se ilícito o despedimento de AA, ocorrido no dia 31-05-2024;
2. Condena-se a ré/empregadora “XX, UCRL” a pagar à autora:
a. uma indemnização em substituição da reintegração, correspondente a 45 (quarenta e cinco) dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, até ao trânsito em julgado da presente decisão, não podendo ser inferior a seis meses de retribuição base e diuturnidades;
b. As retribuições que a autora/trabalhadora deixou de auferir desde o dia 01-06-2024 até ao trânsito em julgado da presente decisão, deduzidas do eventual subsídio de desemprego que tenha atribuído à trabalhadora, devendo a empregadora, nesse caso, entregar estas últimas quantias à Segurança Social, nos termos do disposto no artigo 390.º do CT.
Os concretos valores serão liquidados posteriormente.
Custas a cargo da ré empregadora.
Valor da ação - € 2.000,00.”
Alegações da recorrente
2. Inconformada com a sentença mencionada no parágrafo anterior, a recorrente (trabalhadora), dela veio interpor o presente recurso (cf. referência citius 15612531 de 6.9.2024), formulando o seguinte pedido:
“(...) deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida na parte impugnada (...)”
3. Nas suas alegações, vertidas nas conclusões, a recorrente impugna a decisão recorrida com base, em síntese, nos seguintes argumentos:
Valor da acção
• A recorrente discorda da fixação do valor da acção em 2000 euros porque esse valor não corresponde a qualquer indemnização ou créditos salariais reconhecidos;
• Na óptica da recorrente o valor da acção deve ser fixado a final, em função da indemnização e créditos salariais que venham a ser reconhecidos, porque a sua fixação em 2000 euros prejudica o direito da autora ao recurso;
• A sentença recorrida violou o disposto 98.º P n.ºs 1 e 2 do Código de Processo do Trabalho (CPT).
Graduação do valor da indemnização
• A recorrente discorda da graduação em 45 dias de retribuição (por cada ano de antiguidade), da indemnização devida em substituição da reintegração;
• Na óptica da recorrente, tal indemnização deve graduar-se em 60 dias de retribuição por cada ano de antiguidade, tendo em conta o elevado grau de ilicitude que resulta da inobservância das formalidades previstas nos artigos 369.º e 379.º do Código do Trabalho (CT) e das normas que protegem a maternidade;
• A sentença recorrida violou o disposto no artigo 392.º n.º 3 do CT.
Contra-alegações da recorrida
4. A recorrida (empregadora) contra-alegou (cf. referência citius 15650953 de 17.9.2024), defendendo, em síntese:
• A sentença é irrecorrível porque o que está em causa é apenas a indemnização em substituição da reintegração e não o despedimento
• Na óptica da recorrida aplica-se o disposto no artigo 629.º do CPC e, por isso, tendo em conta o valor da causa, não é admissível o recurso.
Parecer do Ministério Público
5. O digno magistrado do Ministério Público junto ao Tribunal da Relação, emitiu parecer (cf. referência citius 22398175 de 26.11.2024), ao abrigo do disposto no artigo 87.º n.º 3 do CPT, no qual pugna pela improcedência do recurso, com base, em síntese, nos seguintes fundamentos:
• A fixação do valor da causa pelo Tribunal a quo foi provisória uma vez que a recorrente apresentou o articulado previsto no artigo 98.º J n.º 3 – c) e nos termos do artigo 98.º P do CPT, sendo impossível fixar neste momento o valor da causa, o valor de 2.000 euros foi fixado apenas para efeitos de custas sem prejuízo do posterior acerto;
• O valor fixado em nada prejudica o direito ao recurso, uma vez que a sentença é recorrível independentemente do valor da causa, nos termos do artigo 79.º - a) do CT;
• A graduação da indemnização foi adequada para compensar a recorrente da ilicitude do despedimento.
6. A recorrente respondeu ao parecer mencionado no parágrafo anterior, mediante requerimento junto com a referência citius 725257 de 9.12.2024, defendendo, em síntese, que a graduação da indemnização em 45 dias de retribuição por cada ano de antiguidade não é adequada nem proporcional ao grau de ilicitude do despedimento.
7. A recorrida, por requerimento de 20.1.2025, com a referência citius 73333 8, vem pedir o desentranhamento do requerimento da recorrente, mencionado no parágrafo anterior, defendendo que não é permitida a prática desse acto processual, uma vez que, o parecer do digno magistrado do Ministério Público não está sujeito ao contraditório; para sustentar a sua argumentação a recorrida invoca o disposto no artigo 3.º n.º 3 do CPC, ex vi artigo 1.º n.º 2 – a) do CPT.
Antecedentes do litígio
8. A recorrente instaurou a presente acção, que segue a forma de processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, mediante a junção do formulário a que alude o artigo 98.º C do CPT, ao qual anexou a decisão de despedimento (comunicação da necessidade de extinção do posto de trabalho que lhe foi enviada pela recorrida), a declaração de situação de desemprego apresentada à Segurança Social pela recorrida e um recibo de vencimento – cf. referência citius 5332106 de 14.6.2024
9. A recorrida, notificada para o efeito na audiência de partes, não apresentou o articulado de motivação do despedimento previsto no artigo 98.º J e declarou reintegrar a recorrente propondo que, findo o período de lactante, a recorrente retomasse o trabalho sem prejuízo de as partes juntarem aos autos o respectivo acordo de reintegração assinado por ambas – cf. acta de audiência de partes com a referência citius 161626845 de 8.7.2024 e requerimento com a referência citius 15486869 de 27.8.2024.
10. A recorrente, notificada pelo Tribunal para optar pela reintegração ou pela indemnização, informou que opta pela indemnização – cf. despacho com a referência citius 161866087 de 7.8.2024 e requerimento com a referência citius 15553618 de 17.8.2024.
11. Notificada para esse efeito conforme ordenado na sentença recorrida, a recorrente juntou aos autos o articulado a que se refere o artigo 98.º J n.º 3 – c) do CPT – cf. referência citius 15617024 de 9.9.2024.
Questões prévias suscitadas pela recorrida
A. Inadmissibilidade do contraditório
B. Inadmissibilidade do recurso
Delimitação do âmbito do recurso
12. Têm relevância para a decisão do recurso as seguintes questões, suscitadas pela recorrente:
C. Impugnação do valor da causa
D. Graduação da indemnização
Factos que o Tribunal leva em conta para apreciar o recurso
13. Os acima mencionados nos parágrafos 1 a 11.
Quadro legal relevante
14. Para a apreciação do recurso tem relevo, essencialmente, o quadro legal seguinte:
Código de Processo do Trabalho ou CPT
Artigo 79.º
Decisões que admitem sempre recurso
Sem prejuízo do disposto no artigo 629.º do Código de Processo Civil e independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso para a Relação:
a) Nas ações em que esteja em causa a determinação da categoria profissional, o despedimento do trabalhador por iniciativa do empregador, independentemente da sua modalidade, a reintegração do trabalhador na empresa e a validade ou subsistência do contrato de trabalho;
b) Nos processos emergentes de acidente de trabalho ou de doença profissional;
c) Nos processos do contencioso das instituições de previdência e de abono de família, das associações sindicais, das associações de empregadores e das comissões de trabalhadores.
Artigo 81.º
Modo de interposição dos recursos
1 - O requerimento de interposição de recurso contém, obrigatoriamente, a alegação do recorrente, devendo constar das respetivas conclusões o fundamento específico da recorribilidade e a identificação da decisão recorrida, especificando, se for caso disso, a parte dela a que o recurso se restringe.
2 - Sempre que o fundamento específico de recorribilidade referido no número anterior se traduza na invocação de um conflito jurisprudencial que se pretende ver resolvido, o recorrente junta obrigatoriamente, sob pena de imediata rejeição, cópia, ainda que não certificada, do acórdão fundamento.
3 - Em prazo idêntico ao da interposição do recurso, pode o recorrido responder à alegação do recorrente.
4 - Na alegação pode o recorrido impugnar a admissibilidade ou a tempestividade do recurso, bem como a legitimidade do recorrente.
5 - Havendo recurso subordinado, deve ser interposto no mesmo prazo da alegação do recorrido, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto nos números anteriores.
6 - À interposição do recurso de revista aplica-se o regime estabelecido no Código de Processo Civil.
Artigo 87.º
Julgamento dos recursos
1 - O regime do julgamento dos recursos é o que resulta, com as necessárias adaptações, das disposições do Código de Processo Civil que regulamentam o julgamento do recurso de apelação e de revista.
2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, quando funcionar como tribunal de revista, o Supremo Tribunal de Justiça tem os poderes estabelecidos no Código de Processo Civil.
3 - Antes do julgamento dos recursos, o Ministério Público, não sendo patrono ou representante de qualquer das partes, tem vista no processo para, em 10 dias, emitir parecer sobre a decisão final a proferir, devendo observar-se, em igual prazo, o contraditório.
Artigo 98.º-J
Articulado de motivação do despedimento
1 - O empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador.
2 - No caso de pretender que o tribunal exclua a reintegração do trabalhador nos termos previstos no artigo 392.º do Código do Trabalho, o empregador deve requerê-lo desde logo no mesmo articulado, invocando os factos e circunstâncias que fundamentam a sua pretensão, e apresentar os meios de prova para o efeito.
3 - Se o empregador não apresentar o articulado referido no número anterior, ou não juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, o juiz declara a ilicitude do despedimento do trabalhador, e:
a) Condena o empregador a reintegrar o trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, ou, caso o trabalhador tenha optado por uma indemnização em substituição da reintegração, a pagar-lhe, no mínimo, uma indemnização correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 391.º do Código do Trabalho;
b) Condena ainda o empregador no pagamento das retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento;
c) Ordena a notificação do trabalhador para, querendo, no prazo de 15 dias, apresentar articulado no qual peticione quaisquer outros créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou da sua cessação, incluindo a indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 389.º do Código do Trabalho.
4 - Na mesma data, o empregador é notificado da sentença quanto ao referido nas alíneas a) e b) do número anterior.
5 - Se o trabalhador apresentar o articulado a que se refere a alínea c) do n.º 3, o empregador é notificado para, no prazo de 15 dias, apresentar contestação, observando-se seguidamente os restantes termos do processo comum regulados nos artigos 57.º e seguintes.
Artigo 98.º-P
Valor da causa
1 - Para efeitos de pagamento de custas, aplica-se à acção de impugnação judicial de regularidade e licitude do despedimento o disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 12.º do Regulamento das Custas Processuais.
2 - O valor da causa é sempre fixado a final pelo juiz tendo em conta a utilidade económica do pedido, designadamente o valor de indemnização, créditos e salários que tenham sido reconhecidos.
3 - Se for interposto recurso antes da fixação do valor da causa pelo juiz, deve este fixá-lo no despacho que admite o recurso.
Código de Processo Civil ou CPC
Artigo 2.º
Garantia de acesso aos tribunais
1 - A proteção jurídica através dos tribunais implica o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, a pretensão regularmente deduzida em juízo, bem como a possibilidade de a fazer executar.
2 - A todo o direito, exceto quando a lei determine o contrário, corresponde a ação adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente, bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da ação.
Artigo 629.º
Decisões que admitem recurso
1 - O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.
2 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso:
a) Com fundamento na violação das regras de competência internacional, das regras de competência em razão da matéria ou da hierarquia, ou na ofensa de caso julgado;
b) Das decisões respeitantes ao valor da causa ou dos incidentes, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre;
c) Das decisões proferidas, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça;
d) Do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.
3 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso para a Relação:
a) Nas ações em que se aprecie a validade, a subsistência ou a cessação de contratos de arrendamento, com exceção dos arrendamentos para habitação não permanente ou para fins especiais transitórios;
b) Das decisões respeitantes ao valor da causa nos procedimentos cautelares, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre;
c) Das decisões de indeferimento liminar da petição de ação ou do requerimento inicial de procedimento cautelar.
Regulamento das Custas Processuais ou RCP
Artigo 12.º
Fixação do valor em casos especiais
1 - Atende-se ao valor indicado na l. 1 da tabela i-B nos seguintes processos:
a) Nos processos relativos à impugnação judicial da decisão sobre a concessão do apoio judiciário;
b) Nas intimações para prestação de informação, consulta de processos ou passagem de certidões;
c) Nos processos de contencioso das instituições de segurança social ou de previdência social e dos organismos sindicais, nos processos para convocação de assembleia geral ou de órgão equivalente, nos processos para declaração de invalidade das respectivas deliberações e nas reclamações de decisões disciplinares;
d) Nos recursos dos actos de conservadores, notários e outros funcionários;
e) Sempre que for impossível determinar o valor da causa, sem prejuízo de posteriores acertos se o juiz vier a fixar um valor certo;
f) Nos processos cujo valor é fixado pelo juiz da causa com recurso a critérios indeterminados e não esteja indicado um valor fixo, sem prejuízo de posteriores acertos quando for definitivamente fixado o valor.
2 - Nos recursos, o valor é o da sucumbência quando esta for determinável, devendo o recorrente indicar o respectivo valor no requerimento de interposição do recurso; nos restantes casos, prevalece o valor da acção.
Código do Trabalho ou CT
Artigo 63.º
Protecção em caso de despedimento
1 - O despedimento de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante ou de trabalhador no gozo de licença parental carece de parecer prévio da entidade competente na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres.
2 - O despedimento por facto imputável a trabalhador que se encontre em qualquer das situações referidas no número anterior presume-se feito sem justa causa.
3 - Para efeitos do n.º 1, o empregador deve remeter cópia do processo à entidade competente na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres:
a) Depois das diligências probatórias referidas no n.º 1 do artigo 356.º, no despedimento por facto imputável ao trabalhador;
b) Depois da fase de informações e negociação prevista no artigo 361.º, no despedimento colectivo;
c) Depois das consultas referidas no n.º 1 do artigo 370.º, no despedimento por extinção de posto de trabalho;
d) Depois das consultas referidas no artigo 377.º, no despedimento por inadaptação.
4 - A entidade competente deve comunicar o parecer referido no n.º 1 ao empregador e ao trabalhador, nos 30 dias subsequentes à recepção do processo, considerando-se em sentido favorável ao despedimento quando não for emitido dentro do referido prazo.
5 - Cabe ao empregador provar que solicitou o parecer a que se refere o n.º 1.
6 - Se o parecer for desfavorável ao despedimento, o empregador só o pode efectuar após decisão judicial que reconheça a existência de motivo justificativo, devendo a acção ser intentada nos 30 dias subsequentes à notificação do parecer.
7 - A suspensão judicial do despedimento só não é decretada se o parecer for favorável ao despedimento e o tribunal considerar que existe probabilidade séria de verificação da justa causa.
8 - Se o despedimento for declarado ilícito, o empregador não se pode opor à reintegração do trabalhador nos termos do n.º 1 do artigo 392.º e o trabalhador tem direito, em alternativa à reintegração, a indemnização calculada nos termos do n.º 3 do referido artigo.
9 - Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.ºs 1, 6 ou 8.
Artigo 381.º
Fundamentos gerais de ilicitude de despedimento
Sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes ou em legislação específica, o despedimento por iniciativa do empregador é ilícito:
a) Se for devido a motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos, ainda que com invocação de motivo diverso;
b) Se o motivo justificativo do despedimento for declarado improcedente;
c) Se não for precedido do respectivo procedimento;
d) Em caso de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante ou de trabalhador durante o gozo de licença parental inicial, em qualquer das suas modalidades, se não for solicitado o parecer prévio da entidade competente na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres.
Artigo 384.º
Ilicitude de despedimento por extinção de posto de trabalho
O despedimento por extinção de posto de trabalho é ainda ilícito se o empregador:
a) Não cumprir os requisitos do n.º 1 do artigo 368.º;
b) Não observar o disposto no n.º 2 do artigo 368.º;
c) Não tiver feito as comunicações previstas no artigo 369.º;
d) Não tiver posto à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação por ele devida a que se refere o artigo 366.º, por remissão do artigo 372.º, e os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho.
Artigo 391.º
Indemnização em substituição de reintegração a pedido do trabalhador
1 - Em substituição da reintegração, o trabalhador pode optar por uma indemnização, até ao termo da discussão em audiência final de julgamento, cabendo ao tribunal determinar o seu montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381.º
2 - Para efeitos do número anterior, o tribunal deve atender ao tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial.
3 - A indemnização prevista no n.º 1 não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.
Artigo 392.º
Indemnização em substituição de reintegração a pedido do empregador
1 - Em caso de microempresa ou de trabalhador que ocupe cargo de administração ou de direcção, o empregador pode requerer ao tribunal que exclua a reintegração, com fundamento em factos e circunstâncias que tornem o regresso do trabalhador gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa.
2 - O disposto no número anterior não se aplica sempre que a ilicitude do despedimento se fundar em motivo político, ideológico, étnico ou religioso, ainda que com invocação de motivo diverso, ou quando o fundamento da oposição à reintegração for culposamente criado pelo empregador.
3 - Caso o tribunal exclua a reintegração, o trabalhador tem direito a indemnização, determinada pelo tribunal entre 30 e 60 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, nos termos estabelecidos nos n.ºs 1 e 2 do artigo anterior, não podendo ser inferior ao valor correspondente a seis meses de retribuição base e diuturnidades.
Jurisprudência e doutrina que o Tribunal leva em conta
15. O Tribunal leva em conta os seguintes elementos que serão mencionados na fundamentação:
Jurisprudência disponível em dgsi.pt
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26.9.2019, processo 1712/17.5T8BRR-B.L1-6
Doutrina
António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 6.ª Edição, Almedina
Hélder Quintas, Comentários ao Código de Processo do Trabalho, Almedina, páginas 700 e 701
Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II, 9.ª Edição, Almedina
Pires de Lima e Antunes varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª Edição, Coimbra Editora, Limitada
Sebastien Van Drooghenbroeck, La Proportionalité dans le droit de la convention européennene des droits de l´homme, Bruylant, Bruxelles, página 18).
Questões prévias suscitadas pela recorrida
A. Inadmissibilidade do contraditório
16. Contrariamente ao que defende a recorrida, o artigo 87.º n.º 3 do CPT prevê expressamente que o magistrado do Ministério Público tem vista no processo para, em 10 dias, emitir parecer sobre a decisão final a proferir, “devendo observar-se em igual prazo, o contraditório”.
17. Motivos pelos quais improcede este segmento da argumentação da recorrida.
B. Inadmissibilidade do recurso
18. Contrariamente ao que defende a recorrida, a presente acção tem por objecto o despedimento ilícito da recorrente e os seus efeitos – cf. artigo 98.º C n.º 1 do CPT. Em particular, o despedimento ilícito foi declarado pelo Tribunal na sentença recorrida – cf. artigo 387.º n.º 1 do CT.
19. Pelo que, independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso para o Tribunal da Relação – cf. artigo 79.º - a) do CPT. Embora se aplique ao presente processo a regra prevista no artigo 629.º n.º 1 do CPC, assim como as excepções previstas no n.º 2 desse preceito, o certo é que, independentemente de limitações decorrentes do valor da causa ou do valor da sucumbência, é sempre admissível recurso para o Tribunal da Relação, nas acções em que esteja em causa o despedimento do trabalhador, como sucede no caso em análise – cf. nesse sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 6.ª Edição, Almedina, página 89.
20. Motivos pelos quais improcede este segmento da argumentação da recorrida e se mantém a admissão do recurso.
Apreciação do recurso
C. Impugnação do valor da causa
21. A sentença recorrida fixou o valor da causa em 2.000 euros. A recorrente discorda dessa decisão porque, na sua óptica, isso afecta o seu direito ao recurso. Segundo o Tribunal da Relação julga perceber, a recorrente argumenta que o valor da causa deve ser superior e, por isso, deve ser fixado em momento posterior levando em conta o valor dos créditos e da indemnização que venham a ser reconhecidos.
22. Resulta dos factos provados que, tendo a sentença recorrida declarado ilícito o despedimento por falta de apresentação do articulado de motivação do despedimento, os autos seguem agora a forma do processo comum para apreciar os restantes efeitos do despedimento ilícito, nomeadamente, outros créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou da sua cessação, incluindo a indemnização prevista no artigo 389.º n.º 1 – a) do CT – cf. artigo 98.º J n.º 3 – c) e n.º 5.
23. Na situação em análise, a fixação do valor da causa no momento em que foi proferida a sentença recorrida convoca a aplicação dos artigos 98.º P n.º 1 do CPT e do artigo 12.º n.º 1 – e) do Regulamento das Custas Processuais (RCP), que remete para a tabela I, ponto 1. B, anexa ao RCP. Desses preceitos legais extrai-se que o valor da acção fixado na sentença recorrida tem relevo unicamente para efeitos de custas, por ser impossível determiná-lo no momento da sentença recorrida, nomeadamente porque, tratando-se de uma situação prevista no artigo 98.º - J n.º 3 - a) do CPT, em que faltam os articulados, não era possível ao Tribunal a quo, quando proferiu a sentença recorrida, determinar a antiguidade da recorrente para efeitos de cálculo do valor patrimonial que está em causa na indemnização em substituição da reintegração, nem saber qual o valor dos outros créditos previstos no artigo 98.º - J n.º 3 – c) do CPT, antes da fase processual que se seguirá à apresentação do articulado aí previsto.
24. Assim sendo, o valor da causa, no caso em análise, é susceptível de sofrer as consequências da evolução processual; deve corresponder ao valor patrimonial que estiver em causa em cada momento, desde que possa ser apurado; e é actualizável em função do resultado que vier a ser declarado na fase processual que se segue, prevista no artigo 98.º J n.º 5 do CPT. Nesse contexto, não sendo possível, pelos motivos indicados no parágrafo anterior, apurar o valor patrimonial em causa no momento em que foi proferida a sentença a que alude o artigo 98.º J n.º 3 – a) do CPT, para efeito de custas, o valor máximo da acção a levar em conta para determinar a taxa de justiça é de 2000 euros e a taxa de justiça é a prevista na tabela I ponto 1. B anexa ao RCP, como prevê o artigo 12.º n.º 1 – e) do RCP.
25. Acresce que, convém levar em conta o seguinte: pelos motivos acima explicados na análise da questão B, na presente acção é sempre admissível recurso, pelo menos para o Tribunal da Relação, independentemente do valor da causa e da sucumbência – cf. artigo 79.º n.º 1 – a) do CPT; nas alegações, a recorrente não indica o valor da sucumbência previsto no artigo 12.º n.º 2 do RCP, nem indica o valor patrimonial que pretende seja atribuído à causa mas defende apenas a sua fixação em momento ulterior, solução que já resulta do regime legal acima mencionado quando chegar o momento oportuno. Assim, quando for possível apurar o valor patrimonial em causa, a decisão actualizada sobre o valor da causa que venha a ser proferida admite sempre recurso de apelação e revista, com fundamento em que o valor excede a alçada do Tribunal de que se recorre – cf. artigos 629.º n.º 2 – b) e 671.º n.º 3 do CPC, ex vi artigos 79.º e 81.º n.º 6 do CPT.
26. Em consequência, nem a fixação do valor da causa na sentença recorrida prejudica o acerto posterior desse valor pelo Tribunal a quo, quando proferir nova decisão na fase processual que se segue, prevista no artigo 98.º - J n.º 5 do CPT, nem o direito ao recurso se encontra comprometido pela decisão recorrida que fixou o valor da causa.
27. Por isso, a recorrente carece de interesse em agir no que respeita à apreciação da questão do valor da causa, uma vez que, pelas razões acima indicadas, a impugnação do valor fixado pela primeira instância não tem por finalidade declarar a existência de um direito (ao recurso), nem prevenir ou remediar a violação desse direito, como exige o artigo 2.º n.º 2 do CPC, para que seja garantido o acesso aos Tribunais.
28. Neste sentido, o Tribunal cita a seguinte jurisprudência (cf. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26.9.2019, processo 1712/17.5T8BRR-B.L1-6, pontos I a III do sumário):
“I) O interesse em agir constitui pressuposto processual autónomo e consiste na necessidade ou utilidade da demanda, considerado o sistema jurídico aplicável às pretensões, tal como a acção é como configurada pelo Autor.
II) Visando impedir a prossecução de acções inúteis, o interesse em agir obsta ao conhecimento de mérito e impõe a absolvição do demandado da instância, constituindo excepção dilatória inominada.
III) O interesse em agir deve ser analisado à luz dos princípios constitucionais do acesso ao direito e à justiça, de modo a que não vede o acesso necessário ou útil nem permita o acesso inútil.”
29. Assim, o Tribunal julga que a recorrente não tem interesse em agir no que respeita à questão da fixação do valor patrimonial da causa, motivo pelo qual o Tribunal da Relação não aprecia essa questão. No presente caso isso não dá lugar à absolvição da instância recursiva porque a mesma deve prosseguir para apreciação da questão seguinte.
D. Graduação da indemnização
30. Segundo este Tribunal julga perceber, a recorrente defende que na fixação da graduação da indemnização a pagar em substituição da reintegração, o Tribunal a quo não levou em conta o grau de ilicitude do despedimento que resulta da violação, pela recorrida, das formalidades previstas nos artigos 369.º e 379.º do CT e das normas que protegem a maternidade, em particular, o artigo 392.º n.º 3 do CT.
31. A esse propósito, foi a seguinte a fundamentação da sentença recorrida, aqui posta em crise:
“No plano processual, constata-se que a empregadora não apresentou o seu articulado de motivação do despedimento, nem comprovou o cumprimento das formalidades legalmente exigidas. Entre essas formalidades, deveria estar, pelo menos, o parecer prévio da CITE, pois que se a trabalhadora atualmente é lactante, é porque na data do despedimento era puérpera, grávida ou já lactante.
No plano substantivo, dir-se-á que, para além de o ónus da prova de que foi previamente pedido o parecer à CITE pertencer à empregadora (art.º 63.º, n.ºs 1 e 5 do Código do Trabalho), que não o cumpriu, importará daí retirar as consequências de que este concreto despedimento teve como alvo uma trabalhadora que estava grávida, puérpera ou lactante – cf. art.º 63.º, n.º 8, o qual remete para a indemnização calculada nos termos do n.º 3 do art.º 392.º, ambos do Código do Trabalho, ou seja, a indemnização passa a ser balizada entre os 30 e os 60 dias da retribuição base e diuturnidades, por cada ano completo ou fração de antiguidade, não podendo ser inferior a seis meses de retribuição base e diuturnidades.
(...)
Quando o legislador faz referência, na alínea a) do n.º 3, à condenação do empregador no pagamento de uma indemnização, «…no mínimo, (…) correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade», está a usar os parâmetros do art.º 391.º do Código do Trabalho, ou seja, num intervalo entre 15 e 45 dias, 30 dias é o ponto mediano.
Ora, como referimos supra, nos termos dos art.ºs 63.º, n.ºs 1 e 8 e 392.º, n.º 3 ambos do Código do Trabalho, o cálculo da indemnização terá por base a fixação do número de dias de retribuição, entre os 30 e os 60 dias, pelo que, neste caso, o ponto mediano corresponde a 45 dias. É este o fundamento para que a indemnização de antiguidade seja fixada em 45 dias.”
32. Dito isto, a fixação da indemnização em substituição da reintegração a pedido da recorrida, convoca a aplicação do disposto nos artigos 63.º n.º 8, 381.º, 391.º e 392.º n.º 3 do CT. Em conformidade, essa indemnização deve ser graduada entre 30 e 60 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, não podendo ser inferior ao valor correspondente a seis meses (cf. artigo 392.º n.º 3 ex vi artigo 63.º n.º 8 do CT).
33. Na graduação da indemnização aqui em crise o Tribunal deve atender aos dois factores seguintes: o valor da retribuição base; e o grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381.º do CT – cf. artigo 391.º n.º 1 do CT.
34. Nesse contexto, os factos provados por documentos que o Tribunal deve levar em conta são os seguintes: a trabalhadora era lactante no momento do despedimento e em Maio de 2024 recebia o vencimento base mensal de 2800 euros (não se tendo apurado se recebia diuturnidades). Tais factos resultam dos documentos particulares mencionados supra no parágrafo 8; como não foram impugnados, esses documentos fazem prova plena quanto às declarações deles constantes atribuídas à recorrida; os factos compreendidos em tais declarações consideram-se igualmente provados na medida em que são contrários aos interesses da recorrida, sendo tais declarações indivisíveis nos termos aplicáveis à confissão – cf. artigo 376.º n.ºs 1 e 2 do Código Civil (CC).
35. Adicionalmente, o Tribunal leva em conta, na valoração da ilicitude do despedimento, que não foram cumpridas as formalidades exigidas para protecção da trabalhadora lactante (cf. artigo 381.º d) do CT), nem as exigidas para protecção da trabalhadora em caso de extinção do posto de trabalho (cf. artigo 381.º c) e 384.º - c) do CT), como seguir será explicado.
36. Não tendo sido apresentado o articulado de motivação do despedimento não foi produzida prova ulterior sobre o incumprimento das formalidades legais do despedimento. Tendo em conta os contornos factuais da situação em análise que foi possível apurar (cf. parágrafos 1 a 11), as formalidades legais que deviam ser cumpridas pela empregadora/recorrida são as previstas nos artigos 63.º do CT (protecção da trabalhadora lactante) e 369.º do CT (protecção da trabalhadora em caso de extinção do posto de trabalho). Na ausência de outras provas a esse propósito, o Tribunal recorre às regras do ónus da prova, das quais resulta que cabia à recorrida provar que cumpriu tais formalidades (cf. artigo 63.º n.º 5 do CT e 342.º n.º 1 do CC).
37. Pelo que, não tendo a recorrida provado que solicitou o parecer prévio da entidade competente na área de igualdade de oportunidades entre homens e mulheres exigido em caso de despedimento da trabalhadora lactante (cf. artigo 63.º n.ºs 1 a 5 do CT), nem tendo provado que comunicou previamente a necessidade de extinguir o posto de trabalho e os critérios que aplicou na selecção dos trabalhadores a despedir (cf. artigos 369.º do CT e 342.º n.º 1 do CC), tais formalidades têm-se por não cumpridas. Com efeito “O significado essencial do ónus da prova não está tanto em saber a quem incumbe fazer a prova do facto como em determinar o sentido em que deve o tribunal decidir no caso de se não fazer essa prova” (cf. Pires de Lima e Antunes varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª Edição, Coimbra Editora, Limitada, página 306).
38. Do acima exposto resulta que o grau de ilicitude a levar em conta assenta em dois factores de ilicitude, de entre os previstos no artigo 381.º do CT: a falta do respectivo procedimento por falta das comunicações a que alude o artigo 369.º do CT (cf. artigos 381.º - c) conjugado com o artigo 384.º - c), do CT); e a inobservância das formalidades previstas para protecção da trabalhadora lactante (cf. artigos 63.º e 381.º d) do CT).
39. Dentro do quadro legal acima mencionado, o Tribunal tem uma grande latitude na determinação do valor da indemnização em análise. Com efeito, os critérios que a lei estabelece para esse efeito são bastante indeterminados, na medida em que, por um lado, no que respeita ao critério da ilicitude, o artigo 381.º do CT apenas enuncia as causas de ilicitude e não o grau de gravidade de cada uma e, por outro lado, no que respeita ao critério do valor da retribuição, o artigo 391.º n.º 1 do CT não indica se a indemnização deve ser maior quando for mais elevada a retribuição ou se o valor da indemnização deve ser fixado na proporção inversa à do valor da retribuição, tendo a jurisprudência oscilado a esse propósito (sobre a indeterminação dos critérios legais e a oscilação da jurisprudência na sua interpretação, Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II, 9.ª Edição, Almedina, página 1043 e jurisprudência aí citada na nota 1738).
40. Nesse contexto, cabe ao Tribunal recorrer à “prudência” na interpretação dos critérios legais acima enunciados e fazer apelo ao princípio da proporcionalidade (cf. artigo 18.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa) para encontrar uma solução que assegure o justo equilíbrio entre a flexibilidade na interpretação dos preceitos legais em causa e a segurança jurídica que ameaça essa flexibilidade (cf. Sebastien Van Drooghenbroeck, La Proportionalité dans le droit de la convention européennene des droits de l´homme, Bruylant, Bruxelles, página 18).
41. Feito este enquadramento, o Tribunal leva em conta, para determinar o grau de ilicitude do despedimento, que o facto de se verificarem cumulativamente duas das causas de ilicitude do despedimento previstas na lei, a saber, a prevista no artigo 381.º - c) conjugado com o artigo 384.º - c), do CT e a prevista no artigo 381.º - d) conjugado com o artigo 63.º, do CT, eleva a ilicitude. Porém, a proposta de reintegração da recorrente, feita pela recorrida, atenua a ilicitude.
42. Convém também recordar que o agravamento dos limites abstractos mínimo e máximo da moldura dentro da qual deve ser graduada a indemnização, já resulta da aplicação do disposto no artigo 392.º n.º 3, ex vi artigo 63.º n.º 8, do CT e esse agravamento dá, por isso, resposta ao grau de ilicitude acrescido que resulta da violação do disposto no artigo 63.º do CT (protecção da trabalhadora lactante). Pelo que, esse factor não deve ser duplamente valorado. Assim sendo, é dentro desses limites já agravados por uma das causas de ilicitude, que o Tribunal, com base nas circunstâncias mencionadas no parágrafo anterior, julga que o grau de ilicitude do despedimento foi moderado.
43. Quanto ao valor da retribuição, 2.800 euros, o Tribunal a quo nada disse. O Tribunal da Relação julga que se trata de um valor médio pelas seguintes razões: esse valor situa-se no intervalo que vai do triplo ao quadruplo da retribuição mínima mensal prevista no artigo 273.º n.º 1 do CT que, em 2024 (ano a que se reporta o vencimento da recorrente acima apurado), foi fixada em 820 euros – cf. artigo 3.º do DL 107/2023 de 17.11. A esse propósito, o Tribunal leva também em conta que o objectivo desta indemnização é substituir a reintegração e portanto deve adequar-se ao estatuto laboral da recorrente, em matéria remuneratória.
44. Tendo em conta a análise que antecede, a fixação da indemnização aqui em crise em 45 dias (de retribuição base e diuturnidades) por cada ano ou fracção de antiguidade, feita pelo Tribunal a quo, corresponde a um valor central ou mediano, que se afigura, por isso, adequado, necessário e proporcional à gravidade da ilicitude e ao objectivo prosseguido pela indemnização, acima mencionados. Pelo que, o Tribunal da Relação mantém a decisão recorrida.
45. Tal como já foi explicado supra, em resultado da falta de articulados das partes na fase processual que antecedeu a sentença recorrida, a prova produzida não é abundante. Nesse contexto, se é certo que pelas razões acima explicadas, a solução pela qual optou o Tribunal a quo não merece censura, também é certo que isso não exclui a possibilidade de a recorrente alegar factos adicionais e pedir a condenação acrescida, no articulado previsto no artigo 98.º - J n.º 3 – c) do CT. Nesse sentido, a seguinte doutrina e o autor nela citado (cf. Hélder Quintas, Comentários ao Código de Processo do Trabalho, Almedina, páginas 700 e 701):
“Esse limite máximo pode ser alargado para os 60 dias previstos no artigo 392.º, n.º 3 do CT, se o despedimento for abusivo (art.º 331.º n.º 4, do CT) ou abranger trabalhadora grávida, puérpera ou lactante ou trabalhador no gozo de licença parental (art.º 63.º, n.º 8, do CT). Pedro Freitas Pinto [...] alerta para a necessidade de, nestes casos, olhando à falta de articulados das partes nesta fase processual, ser permitido ao trabalhador “alegar tais factos e pedir essa condenação acrescida no articulado” previsto na al. A) do n.º 3 do art.º 98.º - J, do CT”.
46. Motivos pelos quais o Tribunal da Relação julga improcedente o recurso e mantém a sentença recorrida.
Em síntese
47. São admissíveis, tando o contraditório das partes previsto no artigo 87.º n.º 3 parte final do CPT, como o presente recurso, independentemente do valor da causa e da sucumbência, nos termos do artigo 79.º - a) do CPT.
48. Nem a fixação do valor da causa na sentença recorrida prejudica o acerto posterior desse valor pelo Tribunal a quo, quando proferir nova decisão na fase processual que se segue, prevista no artigo 98.º J n.º 5 do CPT, nem o direito ao recurso se encontra comprometido pela decisão recorrida que fixou o valor da causa em 2.000 euros, uma vez que, não sendo ainda possível determinar o valor patrimonial da causa devido à ausência de articulados nesta fase, esse valor apenas tem relevo para efeito de custas – cf. artigo 98.º - P n.º 1 do CPT, artigo 12.º n.º 1 – e) do RPC e tabela I, ponto 1. B, anexa ao RCP.
49. A recorrente carece de interesse em agir no que respeita à impugnação da sentença recorrida na parte em que fixou o valor da causa uma vez que, pelos motivos explicados na análise da questão C, a pretensão da recorrente não tem por finalidade declarar a existência de um direito (ao recurso), nem prevenir ou remediar a violação desse direito, como exige o artigo 2.º n.º 2 do CPC, para que lhe seja garantido o acesso aos Tribunais.
50. Pelas razões acima expostas na apreciação da questão D, a fixação da indemnização em substituição da reintegração, em 45 dias de retribuição de base e diuturnidades por cada ano ou fracção de antiguidade, feita pelo Tribunal a quo, é adequada, necessária e proporcional à gravidade das causas da ilicitude apuradas e ao objectivo prosseguido pela indemnização, apreciados à luz dos critérios da ilicitude e do valor da retribuição – cf. artigos 63.º n.º 8, 369.º, 381.º - c) e d), 384.º - c), 391.º n.º 1 e 392.º n.º 3 do CT.
51. Motivos pelos quais o Tribunal da Relação não aprecia a sentença recorrida na parte em que fixou o valor da causa, julga improcedente o recurso na restante parte e mantém a sentença recorrida.
Decisão
Acordam os Juízes desta secção em:
I. Não apreciar a impugnação da sentença recorrida na parte em que fixou o valor da causa.
II. Julgar improcedente o recurso e manter a sentença recorrida.
III. Condenar a recorrente nas custas do recurso – artigo 527.º n.º 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 87.º n.º 1 do CPT.

Lisboa, 29 de Janeiro de 2025
Paula Pott
Sérgio Almeida
Paula Santos