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PERSI
REQUISITOS
COMUNICAÇÃO
DEVER DE INFORMAR
Sumário
I. A omissão da informação, a falta de integração do devedor no PERSI pela instituição de crédito ou a ausência de comunicação da extinção do procedimento constituem violação de normas de carácter imperativo. Deste modo, sendo o seu cumprimento verdadeira condição de procedibilidade, o respectivo incumprimento configura excepção dilatória atípica ou inominada e insuprível. II. Face à diferente natureza das causas extintivas previstas nos n.ºs 1 e 2 do art.º 17.º do DL 227/2012, correspondendo as primeiras a fundamentos que operam ex lege (ainda que a eficácia da extinção fique dependente da sua comunicação e recepção pelo destinatário) e dependendo as segundas da vontade da instituição bancária, apenas quanto a estas se afigura exigir a lei a motivação da decisão tomada, apontando as razões pelas quais entende, ainda que verificado um (ou vários) dos fundamentos extintivos, que o procedimento não pode manter-se. III. Havendo notícia nos autos do falecimento de um dos executados em data anterior ao incumprimento do contrato de mútuo em vigor, ainda que se não encontre junta a certidão do assento de óbito não deve ser indeferido liminarmente o requerimento executivo por falta de integração daquele (ou dos seus herdeiros) no PERSI, sem se encontrar devidamente esclarecido se o óbito ocorreu ou não. (Sumário da Relatora)
Texto Integral
Processo n.º 2277/22.1T8ENT-A.E1[1] Tribunal Judicial de Santarém Juízo de Execução do Entroncamento – Juiz 1
I. Relatório
Nos presentes autos de acção executiva, a seguir o processo comum, na sua forma sumária, que o Banco (…), SA, entretanto substituído pela cessionária habilitada (…), SARL, pessoa colectiva de direito luxemburguês, move a (…), (…), (…) e (…), para cobrança coerciva da quantia global de € 56.599,45, servem de títulos executivos duas escrituras públicas denominadas de mútuo com hipoteca e fiança, ambas outorgadas em 3 de Dezembro de 2007, tendo os primeiros executados como mutuários constituído a favor do Banco hipotecas voluntárias sobre a fração autónoma que identificou[2], as quais se mostram definitivamente inscritas a favor do credor.
Alegou a instituição exequente que os executados (…) e (…) não pagaram a prestação vencida em 11 de Outubro de 2021, nem nenhuma das que se venceu posteriormente e, tendo sido integrados no PERSI, foi o procedimento extinto sem as prestações terem sido regularizadas ou o contrato reestruturado.
Posteriormente, foram ainda os executados interpelados para regularizar as prestações em atraso sob pena dos contratos serem resolvidos. Tendo persistindo na situação de incumprimento, emitiu a instituição bancária declarações resolutivas, com vencimento de todo o capital mutuado.
Os executados (…) e (…) outorgaram as escrituras públicas, subscrevendo também o respetivo documento complementar na qualidade de fiadores, tendo renunciado ao benefício de excussão prévia.
*
Foi colhida informação nas bases de dados da Segurança Social e da AT que davam conta do óbito do executado (…).
Solicitado esclarecimento ao SF quanto ao modo como fora colhida a informação do óbito do executado esclareceu que: “Em 10/11/2020 foi registado neste Serviço de Finanças com o n.º de entrada 2020E002665591, o ofício n.º 85099287 de 30/10/2020, proveniente do Departamento de Investigação e Ação Penal – Secção de Rio Maior do Ministério Público – Procuradoria da República da Comarca de Santarém, relativo ao Processo n.º 825/20.0T9STR, respeitante a uns autos de Carta Rogatória. Nesse ofício, cujo teor se anexa, este Serviço de Finanças era questionado se em nome de (…), nascida em 05-12-1959, (…), nascido em 5/02/1956 e (…), nascido em 10/05/1956, se encontravam registados quaisquer bens. Após consulta às bases de dados da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), verificou-se que não se encontravam registados quaisquer contribuintes com os nomes referidos no ofício. Partindo da hipótese de se dar o facto de a sequência nome próprio, nome de família, se encontrar invertida no ofício que nos tinha sido enviado, foi efetuada nova pesquisa às bases de dados da AT, colocando os nomes pela ordem inversa àquela que nos tinha sido enviada. Dessa pesquisa resultou a descoberta de um registo de contribuinte em nome de (…), a que foi atribuído o NIF …, nascido em 10/05/1956, e cujo óbito ocorreu em 12/09/2017, conforme foi apurado por consulta à Visão Integrada do Contribuinte efetuada em 16-11-2020. Tendo-se verificado por essa mesma consulta que o de cujus era sujeito passivo de IUC e de IMI, consultei a base de dados da Gestão de Divergências relativa às participações de Imposto de Selo sobre as Transmissões Gratuitas, tendo constatado que em 18-11-2020 ainda não havia sido efetuada. Nesse mesmo dia foi enviada uma notificação dirigida aos Herdeiros de (…), cujo Aviso de Receção foi assinado por (…) em 04/12/2020, e foi informado o Procurador do Ministério Público junto do Departamento de Investigação e Ação Penal – Secção de Rio Maior, através do nosso e-mail n.º 1545/2020, dos factos apurados, dos bens existentes e de que este Serviço de Finanças iria encetar as diligências necessárias à instauração do Processo de Imposto de Selo sobre as Transmissões Gratuitas. A signatária do Aviso de Receção compareceu neste Serviço de Finanças em 09-12-2022, assumindo-se como herdeira de (…), apresentando como prova desse facto a Escritura de Compra de Venda do imóvel em que o autor da herança consta na matriz como sujeito passivo. Tendo por base a informação constante no documento referido no parágrafo anterior foi criado o n.º de contribuinte para a herança indivisa de (…), que ficou registada sob o n.º (…), não tendo, no entanto, sido instaurado o Processo de Imposto de Selo. Informou também a signatária que, posteriormente à data de aquisição do imóvel, o autor da herança adquiriu nacionalidade portuguesa, apresentando como prova de tal facto fotocópia do Passaporte Português. Perante tal informação procedeu este Serviço à consulta da plataforma interserviços do Ministério da Justiça a fim de confirmar tal informação, vindo a apurar que para além de a mesma ser verdadeira quanto à nacionalidade, não se encontrava registado em Portugal o casamento com a signatária, uma vez que o estado civil do de cujus consta como solteiro. (…) Mais informo que: - o autor da herança consta como executado no Processo Executivo n.º 2277/22.1T8ENT, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Santarém Entroncamento – Juízo de Execução – Juiz 1. - O autor da herança consta como executado no Processo de Execução Fiscal n.º 2062202201024361 - A herança aberta por óbito do autor da herança, com o NIF (…), consta como executado nos seguintes processos de execução fiscal: (…)”.
Tendo sido solicitada informação ao IRN, não foi possível obter a confirmação do óbito do executado.
Foi de seguida proferida decisão, que decretou como segue:
A) Julgou oficiosamente verificada a excepção dilatória inominada insanável decorrente do desrespeito, pelo exequente originário “Banco (…), S.A.”, da demonstração da válida comunicação aos executados (…) e/ou aos seus herdeiros, e (…), da extinção do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento instituído pelo Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, e, em consequência, determinou a extinção da execução nessa parte, ficando prejudicada a pretendida citação da executada (…) «para vir juntar aos autos o assento de óbito do executado (…), bem como informar quem são os herdeiros do mesmo, comprovando essa qualidade através de junção de escritura de habilitação de herdeiros ou assento de nascimento/casamento»;
B) Determinou a prossecução da execução relativamente aos executados (…) e (…).
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Inconformada, apresentou a exequente habilitada o presente recurso e, tendo desenvolvido na alegação os fundamentos da sua discordância com o decidido, formulou a final as seguintes conclusões:
“A) Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida em 08/07/2024, a fls._, cujo conteúdo foi notificado à ora Recorrente em 10/07/2024, qual determinou a extinção da execução e a absolvição dos Recorridos no âmbito da presente ação, da qual o ora Recorrente não se conforma, porquanto a referida decisão padece de erro de julgamento.
B) Fundamenta o Tribunal aquo a decisão proferida por entender que o Recorrente não fundamentou legalmente a extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (doravante, PERSI) instituído pelo Decreto-Lei nº 227/2012, de 25 de Outubro.
C) Desde logo, cumpre esclarecer que o ora recorrente atuou sobre o princípio geral de boa-fé processual pelo que, tanto as comunicações da integração, bem como as comunicações de extinção em PERSI foram feitas com a consciência de que estaria a proceder em conformidade com o legalmente admissível, como o fez e não incumpriu, muito menos desrespeitou qualquer normativo legal.
D) As comunicações de integração e de extinção do PERSI foram realizadas através de carta, em consonância com o estabelecido do Decreto-Lei nº 227/2012, de 25 de Outubro, indicando, para além do mais, as causas de extinção, nomeadamente quanto ao decurso de 91 dias desde o início do procedimento.
E) Posto isto, a comunicação de extinção do PERSI remetida pela Recorrente cumpre igualmente o regulado no artigo nº 8 do aviso do Banco de Portugal nº 17/2012 Portugal, isto é, a comunicação pela qual a instituição informa o cliente bancário da extinção do PERSI deve conter, em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis, os elementos que determinaram a extinção do PERSI.
F) Relativamente ao disposto no artigo 17.º do Decreto-Lei nº 227/2012, de 25 de Outubro, cumpre fazer a distinção entre o nº 1 e o nº 2 do artigo 17º de acordo com o aviso do Banco de Portugal supra referido.
G) Assim, no nº 1 encontram-se previstos os factos automáticos de extinção do PERSI, por sua vez, no nº 2 encontram-se elencados factos que podem motivar a extinção do PERSI por iniciativa da instituição de crédito, relativamente aos quais devem ser estar fundamentados com base no nº 3 do artigo 17º.
H) Desta forma, e estando em causa a aplicação do nº 1, não pode entender o douto Tribunal aquo– como, erradamente, fez – que a carta que comunicou a extinção do PERSI por decurso do prazo estipulado no artigo 17.º, n.º 1, alínea c) não seja suficientemente clara, rigorosa e legível, em especial quando o cliente já estava devidamente informado das consequências do decurso do prazo de 91 dias (nesse sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, Processo N.º 2348/22.4T8ENT.E1, datado de 28/04/2023).
I) Porquanto, in casu, dúvidas não podem existir quanto à motivação subjacente à causa pela qual se deu a extinção do PERSI.
J) Reitere-se: as cartas remetidas pela Recorrente comunicam a extinção do PERSI por decurso do prazo legal estipulado no artigo 17.º, n.º 1, alínea c) inexistindo qualquer incumprimento daquele normativo pela Recorrente pois trata-se de um facto automático extintivo do PERSI (decurso dos 91 dias desde o início do procedimento).
K) Mais, os Recorridos tinham conhecimento e não podiam desconhecer que a consequência do decurso do prazo legal de 91 dias seria a extinção do procedimento PERSI, na medida em que a carta de integração no PERSI remetida, estava acompanhada com anexo com informação detalhada quanto ao regime do Decreto-Lei n.º 227/2012, em cumprimento de todos os deveres legais de informação a que a instituição bancária se encontrava adstrita.
L) Em face do supra exposto e, salvo douto e melhor entendimento, não podia o Tribunal a quo ter decidido como decidiu, porquanto, a decisão proferida consubstancia um manifesto erro de julgamento, devendo ser revogada e substituída por outra que determine o prosseguimento da instância.
Conclui pedindo a revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que determine o prosseguimento dos autos, seguindo-se os ulteriores termos da instância executiva.
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Sabendo-se que é pelo teor das conclusões que se fixa e delimita o objecto do recurso, a única questão suscitada e a que cumpre dar resposta é saber se, ao invés do que foi considerado na decisão recorrida, a comunicação de extinção do PERSI cumpre o disposto no 17.º do DL 227/2012, de 25 de Outubro.
* Fundamentação De facto
À decisão interessam os factos relatados em I e ainda os seguintes:
1. Com o requerimento executivo o exequente Banco (…), S.A. juntou aos autos como títulos executivas duas escrituras outorgadas no dia 03-12-2007 e respectivos documentos complementares, a primeira denominada de «Compra e Venda Mútuo com Hipoteca e Fiança» e a segunda de «Mútuo com Hipoteca e Fiança», cujos teores se têm por integralmente reproduzidos.
2. Na primeira escritura consta terem os executados (…) e (…) declarado que se confessavam devedores ao exequente da importância de € 85.000,00 recebida a título de empréstimo.
Declararam ainda que constituíam a favor do exequente hipoteca sobre a fração ali identificada para garantia do pagamento e liquidação da quantia mutuada, e bem assim dos respetivos juros, à taxa anual efetiva de 5,52%, acrescidos de uma sobretaxa até 4% ao ano, em caso de mora, a título de cláusula penal, e despesas fixadas para efeitos de registo em € 3.400,00.
Na mesma escritura pública (…) ficou estipulado que o empréstimo e a hipoteca se regulam pelo Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de Novembro (Regime Geral) e pelas demais disposições legais aplicáveis e pelas condições constantes do documento complementar, de que os mutuários têm perfeito conhecimento e que aceitaram inteiramente (…).
3. Consta do documento complementar à escritura que foi convencionado o prazo de 338 meses para o empréstimo a contar de 11 de Dezembro de 2007, salvo se esse dia coincidir com a data da celebração do contrato, e sendo assim, o prazo iniciar-se-á a partir dessa data e será amortizado em 338 prestações mensais, de capital e juros, a primeira com vencimento no mesmo dia do mês seguinte e as restantes em igual dia dos meses subsequentes.
4. Consta ainda do referido documento complementar que o empréstimo vence juros sobre o capital em dívida, calculados dia a dia e cobrados postecipadamente ao mês, à taxa resultante da média aritmética simples das cotações diárias da Euribor a 90 dias, que vigore no mês anterior a cada período de contagem de juros dia útil anterior ao início do período de contagem de juros, acrescida de 0,9%, com arredondamento para o quarto ponto percentual imediatamente superior.
5. A taxa nominal na data da aprovação do empréstimo foi ali fixada em 5,307%, correspondendo-lhe a taxa anual efectiva de 5,52%, calculada nos termos do Decreto Lei nº 220/94, de 23 de Agosto.
6. Foi também convencionado que, em caso de mora, os respetivos juros serão contados dia a dia e calculados à taxa que ao tempo vigorar para os juros remuneratórios contratuais, acrescida de uma sobretaxa de 4% ao ano a título de cláusula penal, reduzida a 3%, nos termos do art.º 8.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 58/2013, de 08 de Maio.
7. A hipoteca voluntária encontra-se registada provisoriamente na Conservatória do Registo Predial de Rio Maior pela Ap. … de 2007/10/15, tendo sido a mesma convertida em definitiva pela Ap. … de 2008/03/28 (…).
8. A hipoteca garante até ao limite de capital de € 85.000,00 e juro anual calculado à taxa de 5,52% acrescido de 4% em caso de mora a título de cláusula penal e despesas no valor de € 3.400,00 sendo o montante máximo assegurado de € 112.676,00 (…).
9. Consta do documento complementar que a hipoteca pode ser executada se não forem pagas as prestações nas datas previstas, caso em que a falta de pagamento de uma delas importa o vencimento imediato de todas.
10. Por escritura pública de mútuo com hipoteca e fiança outorgada a 3 de Dezembro de 2007 (…) os executados (…) e (…) constituíram a favor do Banco exequente segunda hipoteca voluntária sobre o imóvel identificado.
11. Consta da escritura pública referida em 10. e respetivo documento complementar que da mesma é parte integrante, que o executado se confessou devedor ao exequente da importância de € 7.500,00 que recebeu a título de empréstimo.
12. A segunda hipoteca sobre a fracção identificada destinou-se a garantir o pagamento e liquidação da quantia mutuada, e bem assim dos respetivos juros, à taxa anual efetiva de 5,69%, acrescidos de uma sobretaxa até 4% ao ano, em caso de mora, a título de cláusula penal, e despesas fixadas para efeitos de registo em € 997,60.
13. Na escritura pública referida em 10 ficou estipulado que o empréstimo e a hipoteca se regulam pelo Decreto-Lei nº 349/98, de 11 de Novembro (Regime Geral) e pelas demais disposições legais aplicáveis e pelas condições constantes do documento complementar, de que os mutuários têm perfeito conhecimento e que aceitou inteiramente (…).
14. Do referido documento complementar ficaram a constar que foi convencionado o prazo de 338 meses para o reembolso do empréstimo, a contar de 11 de Dezembro de 2007 salvo se esse dia coincidir com a data do contrato, e sendo assim, o prazo iniciar-se-á a partir dessa data e será amortizado em 338 prestações mensais, de capital e juros, a primeira com vencimento no mesmo dia do mês seguinte e as restantes em igual dia dos meses subsequentes.
15. Nos termos do referido documento complementar o empréstimo vence juros sobre o capital em dívida, calculados dia a dia e cobrados postecipadamente ao mês, à taxa resultante da média aritmética simples das cotações diárias da Euribor a 90 dias, que vigore no mês anterior a cada período de contagem de juros dia útil anterior ao início do período de contagem de juros, acrescida de 0,9%, com arredondamento para o quarto ponto percentual imediatamente superior.
16. Mais consta que em caso de mora os respetivos juros serão contados dia a dia e calculados à taxa que ao tempo vigorar para os juros remuneratórios contratuais, acrescida de uma sobretaxa de 4% ao ano a título de cláusula penal, reduzida a 3%, nos termos do art.º 8.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 58/2013, de 08 de Maio.
17. A hipoteca voluntária encontra-se registada temporariamente na Conservatória do Registo Predial de Rio Maior pela Ap. … de 2007/10/15, tendo sido a mesma convertida em definitiva pela Ap. … de 2008/03/28 (…).
18. A hipoteca garante até ao limite de capital de € 7.500,00 e juro anual calculado à taxa de 5,44% acrescido de 4% em caso de mora a título de cláusula penal e despesas no valor de € 997,60 sendo o montante máximo assegurado de € 10.621,60 (…).
19. Ficou estipulado no documento complementar que a hipoteca pode ser executada se não forem pagas as prestações nas datas previstas, caso em que a falta de pagamento de uma delas importa o vencimento imediato de todas.
20. Os executados (…) e (…) outorgaram as escrituras públicas (…), subscrevendo também o respetivo documento complementar, declarando: "Que solidariamente afiançam todas as obrigações que os mutuários assumem a título do presente empréstimo, e que na qualidade de fiadores e como principais pagadores se obrigam perante o Banco ao cumprimento das mesmas, renunciando desde já e expressamente ao benefício de excussão prévia. “Que desde já dá, ainda o seu acordo a quaisquer modificações de taxa de juro, prazo do empréstimo, ou outras alterações que venham a ser convencionadas entre o mutuário e o Banco.”
21. O Banco exequente juntou aos autos carta datada de 07-12-2021, tendo como destinatária a aqui executada (…), com o seguinte teor: «(…) Assunto: Responsabilidades em incumprimento N/Refª.: (…) (…) Como é do conhecimento de V. Exa., encontram-se ainda por regularizar as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo. Face ao exposto, na data de emissão desta carta, foi V. Exa integrado(a) no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (*) e está a ser acompanhado por uma Unidade de Recuperação. (…) Na eventualidade de não ter condições para regularizar os valores identificados, deverá V. Exa. enviar-nos no prazo máximo de 10 dias, a documentação abaixo indicada, comprovativa da sua situação financeira, para que possamos proceder a uma avaliação correta da capacidade financeira de V. Exa. e ponderar pela apresentação de eventual proposta de regularização: (a) cópia da última certidão de liquidação do imposto sobre o rendimento de pessoas singulares disponível; (b) comprovativo do rendimento auferido por V. Exa., nomeadamente a título de salário, remuneração pela prestação de serviços ou prestações sociais; (c) descrição e quantitativo dos encargos que V. Exa. suporta, nomeadamente com as obrigações decorrentes de contratos de crédito, incluindo os celebrados com outras instituições de crédito. Mais informamos que a situação de crédito vencido foi comunicada à Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal. Para mais informações agradecemos que contacte os nossos serviços através do telefone (…) ou através dos canais habituais. Informamos que existe uma rede de apoio ao consumidor endividado. As informações sobre esta rede poderão ser consultadas no “Portal do Consumidos, disponível em www.consumidor.pt” (…) (*) Criado pelo DL 227/2012, de 25 de Outubro de 2012, cujas condições se encontram descritas no documento em anexo. Excluem-se deste procedimento as operações de Leasing, ALD, Factoring e Letras. (…)»
22. O anexo à carta a que se refere o ponto anterior tinha o seguinte teor: Anexo II “OPERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento, criado pelo Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, visa promover a regularização de situações de incumprimento através de soluções negociadas entre o cliente bancário e a instituição de crédito. Negociação de soluções Nos 30 dias após a integração do crédito em incumprimento em PERSI (data indicada na presente comunicação), a instituição de crédito deve avaliar a capacidade financeira do cliente bancário, propondo-lhe soluções para renegociar o contrato de crédito ou consolidar dívidas, quando tal seja viável.
O cliente bancário deve responder às propostas no prazo de 15 dias, podendo apresentar alterações ou propostas alternativas. A instituição de crédito não está obrigada a aceitar as propostas do cliente bancário. Garantias do cliente bancário Durante o PERSI, as instituições de crédito não podem:
• Resolver o contrato de crédito;
• Iniciar ações judiciais contra o cliente bancário; e
• Ceder o crédito a outra entidade que não seja uma instituição de crédito, salvo para efeitos de titularização. Deveres do cliente bancário
O cliente bancário deve colaborar com a instituição de crédito na procura de soluções para a regularização da situação de incumprimento. Para tal deve respeitar os prazos para disponibilizar os documentos e as informações que lhe sejam solicitados (10 dias) e responder às propostas da instituição de crédito (15 dias). Extinção do PERSI
O PERSI extingue-se no 91.º dia após o seu início, se não for prorrogado por acordo entre as partes, ou com a declaração de insolvência do cliente bancário.
A instituição de crédito pode ainda extinguir o PERSI caso:
• Verifique não ser viável a apresentação de propostas;
• Ocorra a penhora ou seja decretado arresto sobre bens do cliente bancário;
• Seja nomeado administrador judicial provisório no âmbito de processo de insolvência;
• O cliente bancário não colabore durante o PERSI;
• O cliente bancário ou a instituição de crédito recuse as propostas apresentadas;
• O cliente bancário pratique atos suscetíveis de pôr em causa direitos ou garantias da instituição de crédito.
A instituição de crédito deve informar o cliente bancário dos fundamentos para a extinção do PERSI. Mediador do Crédito
O cliente bancário que esteja a incumprir um contrato de crédito à habitação e seja igualmente mutuário de outros contratos de crédito pode beneficiar das garantias do PERSI por um período adicional de 30 dias caso solicite a intervenção do Mediador do Crédito nos 5 dias seguintes à extinção do PERSI. Regime extraordinário de proteção de clientes com contratos de crédito à habitação em incumprimento. Os clientes com crédito respeitante à habitação própria permanente que se encontrem em incumprimento e em situação particularmente vulnerável podem solicitar à instituição de crédito o acesso ao regime extraordinário, desde que preencham os requisitos legalmente previstos. Este regime, destinado à proteção de devedores de crédito à habitação em situação económica muito difícil, foi aprovado pela Lei n.º 58/2012, de 9 de Novembro, e entrará em vigor até 31 de Dezembro de 2015, com possibilidade de prorrogação.
Ao abrigo deste regime, a instituição de crédito está obrigada a propor ao cliente bancário um plano de restruturação da dívida, quando tal seja viável. E situações excecionais, a instituição de crédito deve propor soluções que leve à extinção parcial ou total da dívida. Rede de apoio ao cliente bancário
Os clientes bancários com créditos em risco de incumprimento ou em atraso no pagamento das suas prestações podem obter informação, aconselhamento e acompanhamento junto da rede extrajudicial de apoio ao cliente bancário, a título gratuito.
A rede de apoio ao cliente bancário é constituída por entidades habilitadas e reconhecidas pela Direção-Geral do Consumidor.
Para mais informações sobre a rede de apoio, consulte o "Portal do Consumidor", em www.consumidor.pt.
Para outras informações sobre os regimes relativos ao incumprimento de contratos de crédito consulte o seu Balcão (...), o Portal do Cliente Bancário, em http://clientebancario.bportugal.pt, e o portal "Todos Contam", em www.todoscontam.pt.
23. O Banco exequente juntou aos autos carta datada de 07-12-2021, tendo como destinatários os «Herdeiros de (…)» e o seguinte teor: «(…) Assunto: Responsabilidades em incumprimento N/Refª.: (…) (…) Como é do conhecimento de V. Exa., encontram-se ainda por regularizar as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo. Face ao exposto, na data de emissão desta carta, foi V. Exa integrado(a) no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (*) e está a ser acompanhado por uma Unidade de Recuperação. (…) Na eventualidade de não ter condições para regularizar os valores identificados, deverá V. Exa. enviar-nos no prazo máximo de 10 dias, a documentação abaixo indicada, comprovativa da sua situação financeira, para que possamos proceder a uma avaliação correta da capacidade financeira de V. Exa. e ponderar pela apresentação de eventual proposta de regularização: (a) cópia da última certidão de liquidação do imposto sobre o rendimento de pessoas singulares disponível; (b) comprovativo do rendimento auferido por V. Exa., nomeadamente a título de salário, remuneração pela prestação de serviços ou prestações sociais; (c) descrição e quantitativo dos encargos que V. Exa. suporta, nomeadamente com as obrigações decorrentes de contratos de crédito, incluindo os celebrados com outras instituições de crédito. Mais informamos que a situação de crédito vencido foi comunicada à Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal. Para mais informações agradecemos que contacte os nossos serviços através do telefone (…) ou através dos canais habituais. Informamos que existe uma rede de apoio ao consumidor endividado. As informações sobre esta rede poderão ser consultadas no “Portal do Consumidos, disponível em www.consumidor.pt” (…) (*) Criado pelo DL 227/2012, de 25 de Outubro de 2012, cujas condições se encontram descritas no documento em anexo. Excluem-se deste procedimento as operações de Leasing, ALD, Factoring e Letras. (…)»
24. O anexo à carta identificada no ponto anterior tinha o seguinte teor:
5. Junta à missiva consta anexo com o seguinte conteúdo:
“O PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento, criado pelo Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, visa promover a regularização de situações de incumprimento através de soluções negociadas entre o cliente bancário e a instituição de crédito. Negociação de soluções Nos 30 dias após a integração do crédito em incumprimento em PERSI (data indicada na presente comunicação), a instituição de crédito deve avaliar a capacidade financeira do cliente bancário, propondo-lhe soluções para renegociar o contrato de crédito ou consolidar dívidas, quando tal seja viável.
O cliente bancário deve responder às propostas no prazo de 15 dias, podendo apresentar alterações ou propostas alternativas. A instituição de crédito não está obrigada a aceitar as propostas do cliente bancário. Garantias do cliente bancário Durante o PERSI, as instituições de crédito não podem:
• Resolver o contrato de crédito;
• Iniciar ações judiciais contra o cliente bancário; e
• Ceder o crédito a outra entidade que não seja uma instituição de crédito, salvo para efeitos de titularização. Deveres do cliente bancário
O cliente bancário deve colaborar com a instituição de crédito na procura de soluções para a regularização da situação de incumprimento. Para tal deve respeitar os prazos para disponibilizar os documentos e as informações que lhe sejam solicitados (10 dias) e responder às propostas da instituição de crédito (15 dias). Extinção do PERSI
O PERSI extingue-se no 91.º dia após o seu início, se não for prorrogado por acordo entre as partes, ou com a declaração de insolvência do cliente bancário.
A instituição de crédito pode ainda extinguir o PERSI caso:
• Verifique não ser viável a apresentação de propostas;
• Ocorra a penhora ou seja decretado arresto sobre bens do cliente bancário;
• Seja nomeado administrador judicial provisório no âmbito de processo de insolvência;
• O cliente bancário não colabore durante o PERSI;
• O cliente bancário ou a instituição de crédito recuse as propostas apresentadas;
• O cliente bancário pratique atos suscetíveis de pôr em causa direitos ou garantias da instituição de crédito.
A instituição de crédito deve informar o cliente bancário dos fundamentos para a extinção do PERSI. Mediador do Crédito
O cliente bancário que esteja a incumprir um contrato de crédito à habitação e seja igualmente mutuário de outros contratos de crédito pode beneficiar das garantias do PERSI por um período adicional de 30 dias caso solicite a intervenção do Mediador do Crédito nos 5 dias seguintes à extinção do PERSI. Regime extraordinário de proteção de clientes com contratos de crédito à habitação em incumprimento.
Os clientes com crédito respeitante à habitação própria permanente que se encontrem em incumprimento e em situação particularmente vulnerável podem solicitar à instituição de crédito o acesso ao regime extraordinário, desde que preencham os requisitos legalmente previstos. Este regime, destinado á proteção de devedores de crédito à habitação em situação económica muito difícil, foi aprovado pela Lei n.º 58/2012, de 9 de Novembro, e entrará em vigor até 31 de Dezembro de 2015, com possibilidade de prorrogação.
Ao abrigo deste regime, a instituição de crédito está obrigada a propor ao cliente bancário um plano de restruturação da dívida, quando tal seja viável. E situações excecionais, a instituição de crédito deve propor soluções que leve à extinção parcial ou total da dívida. Rede de apoio ao cliente bancário
Os clientes bancários com créditos em risco de incumprimento ou em atraso no pagamento das suas prestações podem obter informação, aconselhamento e acompanhamento junto da rede extrajudicial de apoio ao cliente bancário, a título gratuito.
A rede de apoio ao cliente bancário é constituída por entidades habilitadas e reconhecidas pela Direção-Geral do Consumidor.
Para mais informações sobre a rede de apoio, consulte o "Portal do Consumidor", em www.consumidor.pt.
Para outras informações sobre os regimes relativos ao incumprimento de contratos de crédito consulte o seu Balcão (...), o Portal do Cliente Bancário, em http://clientebancario.bportugal.pt, e o portal "Todos Contam", em www.todoscontam.pt.
25. O Banco exequente juntou aos autos carta datada de 08-03-2022, tendo como destinatária a aqui executada (…) e o seguinte teor: «(…) Assunto: Responsabilidades em incumprimento N/Refª.: (…) (…) Verificamos que permanecem em mora as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo, em que V. Exa. figura como interveniente e obrigado das responsabilidades assumidas pelo(a) Sr.(a) (…). Informamos que, na sequência de terem decorrido 91 dias da integração no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento e permanecendo em mora as responsabilidades supra mencionadas, consideramos extinto o referido procedimento (*). Assim, se decorridos que sejam 15 dias sobre a data de emissão desta carta se mantiverem por regularizar as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo, iremos de imediato e sem precedência de qualquer outra notificação, promover a resolução dos contratos e a execução judicial dos créditos. Sem prejuízo do referido anteriormente, relembramos que ainda poderá contactar a Unidade de Recuperação através do telefone (…), com vista à regularização extrajudicial das referidas responsabilidades de crédito. Informamos que existe uma rede de apoio ao consumidor endividado. As informações sobre esta rede poderão ser consultadas no “Portal do Consumidos, disponível em www.consumidor.pt” (…) (*) Decorre do DL 227/2012, de 25 de Outubro. Se estiver a incumprir um contrato de crédito à habitação e for igualmente mutuário de outros contratos de crédito poderá solicitar a intervenção do Mediador do Crédito nos 5 dias seguintes à extinção do PERSI e beneficiar das garantias do PERSI por um período adicional de 30 dias. (…)».
26. O Banco exequente fez juntar aos autos carta datada de 08-03-2022, tendo como destinatários os «Herdeiros de (…)» e o seguinte teor: «(…) Assunto: Responsabilidades em incumprimento N/Refª.: (…) (…) Vimos per este meio informar que, na sequência de terem decorrido 91 dias da integração no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento e permanecendo em mora as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo, consideramos extinto o referido procedimento (*). Assim, se decorridos que sejam 15 dias sobre a data de emissão desta carta se mantiverem por regularizar as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo, iremos de imediato e sem precedência de qualquer outra notificação, promover a resolução dos contratos e a execução judicial dos créditos. Sem prejuízo do referido anteriormente, relembramos que ainda poderá contactar a Unidade de Recuperação através do telefone (...), com vista à regularização extrajudicial das referidas responsabilidades de crédito. (…) Informamos que existe uma rede de apoio ao consumidor endividado. As informações sobre esta rede poderão ser consultadas no “Portal do Consumidos, disponível em www.consumidor.pt” (…) (*) Decorre do DL 227/2012, de 25 de Outubro. Se estiver a incumprir um contrato de crédito à habitação e for igualmente mutuário de outros contratos de crédito poderá solicitar a intervenção do Mediador do Crédito nos 5 dias seguintes à extinção do PERSI e beneficiar das garantias do PERSI por um período adicional de 30 dias. (…)».
* De Direito Da regularidade da comunicação de extinção do PERSI
Como resulta do dispositivo da decisão recorrida e transcritas conclusões do recurso, está em causa determinar se a comunicação de extinção alegadamente enviada pela instituição bancária mutuante cumpre os termos legalmente prescritos quanto aos requisitos substantivos a que deve obedecer.
Antes de mais, cumpre referir que, em nosso entender, os autos não reúnem elementos suficientes para que possa ser tomada decisão em relação ao mutuário (…).
Com efeito, constando da base de dados do SF que o mesmo faleceu em 2017, informação de que o banco credor tomou conhecimento, e tanto assim que as cartas de integração e extinção do PERSI alegadamente enviadas se encontram endereçadas aos “Herdeiros de (…)”, a verdade é que inexiste confirmação desse óbito, chamando-se ainda a atenção para a circunstância de se mencionar em alguma documentação recebida das bases inquiridas e consultadas ser a DN daquele mutuário 10 de Maio de 1965 e noutros 10 de Maio de 1956, divergência que é suficiente para comprometer os esforços de localização de eventual assento de óbito.
Seja como for, e não sendo de todo seguro que, em caso de morte do mutuário que se encontra em situação de incumprimento, haja obrigação de integração dos seus herdeiros (naturalmente enquanto representantes da herança) em PERSI, os autos não forneciam os elementos necessários a um despacho liminar de indeferimento, não podendo subsistir, nesta parte, a decisão impugnada.
No que se reporta à executada (…), considerou-se na decisão recorrida que da carta de extinção não constava a devida e legalmente exigida fundamentação.
A propósito das exigências formuladas pelo DL 272/2012, não se discute que o cumprimento efectivo da lei não se basta com uma aparência de cumprimento dos deveres que o regime introduzido pelo diploma em referência faz recair sobre as entidades concedentes de crédito. Todavia, não é menos certo que a sua aplicação não prescinde igualmente da efetiva colaboração do devedor que deve, também ele, actuar de boa fé, sendo naturalmente indispensável o seu comprometimento com o procedimento em ordem a encontrar uma solução satisfatória no quadro das opções possíveis[3].
Não existindo igualmente controvérsia quanto ao direito que assiste ao cliente bancário consumidor de aferir da regularidade e legalidade de todo o procedimento, em particular quando é demandado judicialmente pela instituição, e reconhecendo ainda que, ocorrendo a extinção do procedimento, o conhecimento do ou dos fundamentos que a determinaram é essencial à sua defesa, estando em causa declarações negociais valem aqui naturalmente os critérios interpretativos fixados nos art.ºs 236.º e seguintes. Ora, “o critério objectivo da interpretação quanto ao sentido normal da declaração negocial consagrado no artigo 236.º, n.º 1, do CC, é baseado na impressão de um declaratário normal, tido este por pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente, em face da declaração negocial e das circunstâncias que o declaratário real conhecia ou podia conhecer (acórdão do STJ de 10/12/2020, no processo 709/12.6TVLSB.L1.S1 acessível em www.dgsi.pt), sendo nosso o destaque).
Vêm tais considerações a propósito da comunicação de extinção efectuada pela instituição bancária apelante à executada (…) em ordem a dar cumprimento ao disposto no art.º 17.º do DL 272/2012.
Epigrafado de “Extinção do PERSI”, é o seguinte o teor do preceito: 1. O PERSI extingue-se: a) Com o pagamento integral dos montantes em mora ou com a extinção, por qualquer outra causa legalmente prevista, da obrigação em causa; b) Com a obtenção de um acordo entre as partes com vista à regularização integral da situação de incumprimento; c) No 91.º dia subsequente à data de integração do cliente bancário neste procedimento, salvo se as partes acordarem, por escrito, na respetiva prorrogação; ou d) Com a declaração de insolvência do cliente bancário. 2- A instituição de crédito pode, por sua iniciativa, extinguir o PERSI sempre que: a) Seja realizada penhora ou decretado arresto a favor de terceiros sobre bens do devedor; b) Seja proferido despacho de nomeação de administrador judicial provisório, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-C do Código da Insolvência e da recuperação de Empresas; c) A instituição de crédito conclua, em resultado da avaliação desenvolvida nos termos do artigo 15.º, que o cliente bancário não dispõe de capacidade financeira para regularizar a situação de incumprimento, designadamente pela existência de ações executivas ou processos de execução fiscal instaurados contra o cliente bancário que afetem comprovada e significativamente a sua capacidade financeira e tornem inexigível a manutenção do PERSI; d) O cliente bancário não colabore com a instituição de crédito, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou à disponibilização de documentos solicitados pela instituição de crédito ao abrigo do disposto no artigo 15.º, nos prazos que aí se estabelecem, bem como na resposta atempada às propostas que lhe sejam apresentadas, nos termos definidos no artigo anterior; e) O cliente bancário pratique atos suscetíveis de pôr em causa os direitos ou as garantias da instituição de crédito; f) O cliente bancário recuse a proposta apresentada, sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo anterior; ou g) A instituição de crédito recuse as alterações sugeridas pelo cliente bancário a proposta anteriormente apresentada, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo anterior. 3- A instituição de crédito informa o cliente bancário, através de comunicação em suporte duradouro, da extinção do PERSI, descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento. 4- A extinção do PERSI só produz efeitos após a comunicação referida no número anterior, salvo quando o fundamento de extinção for o previsto na alínea b) do n.º 1. 5- O Banco de Portugal define, mediante aviso, os elementos informativos que devem acompanhar a comunicação prevista no n.º 3”.
O aviso previsto no n.º 5 do preceito veio a ser o n.º 17/2012, entretanto revogado e substituído pelo Aviso 7/2021, actualmente em vigor, dispondo aquele no seu art.º 8.º (a que corresponde, com idêntica redacção para o que aqui releva, o art.º 9.º do Aviso agora vigente) a propósito da comunicação de extinção do PERSI – epígrafe do mesmo – que:
A comunicação pela qual a instituição de crédito informa o cliente bancário da extinção do PERSI deve conter, em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis, as seguintes informações:
a) Descrição dos factos que determinam a extinção do PERSI ou que justificam a decisão da instituição de crédito de pôr termo ao referido procedimento, com indicação do respetivo fundamento legal;
b) Consequências da extinção do PERSI, nos casos em que não tenha sido alcançado um acordo entre as partes, designadamente a possibilidade de resolução do contrato e de execução judicial dos créditos;
c) Quando esteja em causa um contrato de crédito à habitação, informação acerca do regime constante do Decreto-Lei nº 349/98, de 11 de novembro, na redação da Lei nº 59/2012, de 9 de novembro, relativamente à resolução e ao direito à retoma do contrato de crédito;
d) No caso de o cliente bancário estar abrangido pelo regime extraordinário de regularização do incumprimento de contratos de crédito à habitação, referência, quando tal decorra do referido diploma legal, ao direito do cliente bancário à aplicação de medidas substitutivas, bem como aos termos em que poderá solicitar a sua aplicação;
e) Identificação das situações em que o cliente bancário pode solicitar a intervenção do Mediador do Crédito mantendo as garantias associadas ao PERSI;
f) Indicação dos elementos de contacto da instituição de crédito através dos quais o cliente bancário pode obter informações adicionais ou negociar soluções para a regularização da situação de incumprimento”.
É conhecida a profunda divisão jurisprudencial, também ao nível deste Tribunal da Relação de Évora, de que aliás se dá exaustiva nota na decisão recorrida, no que se refere à interpretação do transcrito art.º 17.º. Assim, enquanto alguns defendem, como na decisão recorrida, que a indicação de uma das causas ditas objectivas previstas no n.º 1 como fundamento extintivo não isenta a instituição bancária de justificar a não manutenção do procedimento, sustentam outros -entendimento que acolhemos- que face à diferente natureza das causas extintivas previstas nos nºs 1 e 2 do preceito, correspondendo as primeiras a fundamentos que operam ex lege (ainda que a eficácia da extinção fique dependente da sua comunicação e recepção pelo destinatário) e dependendo as segundas da vontade da instituição bancária, apenas quanto a estas se afigura exigir a lei a motivação da decisão tomada, apontando as razões pelas quais entende, ainda que verificado um (ou vários) dos fundamentos extintivos, que o procedimento não pode manter-se.
Revertendo ao caso dos autos faz-se notar que, como resulta dos factos alinhados, a comunicação de inclusão da executada no PERSI, para lá da indicação das prestações em mora, valores parcelares e totais em dívida, fazia-se acompanhar do texto informativo divulgado pelo BdP como anexo II ao Aviso 17/2012, dele constando que o procedimento se extinguiria no 91.º dia após a sua inclusão -que se dava na data da missiva, conforme ali igualmente se mencionava- ressalvada a possibilidade de ser prorrogado por acordo das partes. Deste modo, ao ser-lhe enviada a carta datada de 8 de Março de 2022, na qual se comunicava que “na sequência de terem decorrido 91 dias de integração no PERSI – Procedimento de Regularização de Situações de Incumprimento e permanecendo em mora as responsabilidades supra mencionadas, consideramos extinto o referido procedimento”, com uma chamada para esclarecer que tal “Decorre do DL 227/2012, de 25 de Outubro”, não oferece dúvida, para um declaratário normal, colocado na posição da destinatária da missiva e atendendo ao conhecimento que este necessariamente detinha, dada a informação anterior e a ausência de acordo de prorrogação, de qual o fundamento da extinção do procedimento.
Sustentamos assim a posição assumida nos acórdãos destes TRE de 26/5/2022 (processo 18/22.2T8ENT.E1[4]), 15/06/2023 (processo 93/23.2T8ENT.E1), 27/11/2023 (processo 543/23.8T8ENT.E1), decisão sumária de 28/4/2023 (processo 348/22.4T8ENT.E1) e, mais recentemente, nos acórdãos de 23/5/2024 (processo n.º 2578/23.1T8ENT.E1), e de 16/1/2025 (processo 553/24.5T8ENT.E1), todos disponíveis em www.dgsi.pt, no sentido de que, fundamentando a extinção do PERSI, como é aqui o caso, alguma das causas objectivas elencadas no n.º 1 do art.º 17.º, o dever de informação satisfaz-se com a comunicação de extinção contendo a indicação desse fundamento, tanto mais que na anterior comunicação de integração o mesmo havia sido dado a conhecer como causa extintiva.
Não pode, pois, subsistir também nesta parte a decisão impugnada, tanto mais que, estando em causa um despacho tomado ao abrigo do art.º 726.º do CPCiv, o indeferimento aqui previsto é reservado aos casos de manifesta e indiscutível improcedência do pedido, o que não se verifica.
* III. Decisão Acordam os Juízes da 2.ª secção cível deste Tribunal da Relação de Évora em julgar procedente o recurso, revogando a decisão recorrida, a qual deverá ser substituída por decisão que determine o regular processamento dos autos.
Sem custas (não há lugar ao pagamento de taxa de justiça, encargos ou custas de parte, dado que os executados não chegaram a ser citados).
*
Évora, 30 de Janeiro de 2025
Maria Domingas Simões
Cristina Dá Mesquita
Vítor Sequinho dos Santos (com voto de vencido)
Voto de vencido
(…) e (…) foram demandados na qualidade de mutuários, com a alegação de que não pagaram a prestação vencida em 11.10.2021, nem qualquer das que se venceram posteriormente. O exequente alegou ainda que (…) e (…) foram integrados em PERSI e que este procedimento foi extinto sem que as prestações tenham sido regularizadas ou o contrato reestruturado.
Consta das bases de dados da Segurança Social e da AT a informação de que o executado (…) faleceu. Porém, tendo sido solicitada informação ao IRN, não foi possível obter confirmação desse óbito.
Ficou provado que o exequente enviou, a (…) e aos «Herdeiros de (…)», cartas mediante as quais lhes comunicou a sua integração em PERSI.
Também ficou provado que o exequente enviou, a (…) e aos «Herdeiros de (…)», cartas em que declarou, nomeadamente, o seguinte:
- Carta enviada a (…):
«Verificamos que permanecem em mora as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo, em que V. Exa. figura como interveniente e obrigado das responsabilidades assumidas pelo(a) Sr.(a) (…).
Informamos que, na sequência de terem decorrido 91 dias da integração no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento e permanecendo em mora as responsabilidades supra mencionadas, consideramos extinto o referido procedimento (*).
Assim, se decorridos que sejam 15 dias sobre a data de emissão desta carta se mantiverem por regularizar as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo, iremos de imediato e sem precedência de qualquer outra notificação, promover a resolução dos contratos e a execução judicial dos créditos.
Sem prejuízo do referido anteriormente, relembramos que ainda poderá contactar a Unidade de Recuperação através do telefone (…), com vista à regularização extrajudicial das referidas responsabilidades de crédito.
Informamos que existe uma rede de apoio ao consumidor endividado. As informações sobre esta rede poderão ser consultadas no “Portal do Consumidos, disponível em www.consumidor.pt”
(…)
(*) Decorre do DL 227/2012, de 25 de Outubro. Se estiver a incumprir um contrato de crédito à habitação e for igualmente mutuário de outros contratos de crédito poderá solicitar a intervenção do Mediador do Crédito nos 5 dias seguintes à extinção do PERSI e beneficiar das garantias do PERSI por um período adicional de 30 dias.
- Carta enviada aos «Herdeiros de (…)»:
«Vimos per este meio informar que, na sequência de terem decorrido 91 dias da integração no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento e permanecendo em mora as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo, consideramos extinto o referido procedimento (*).
Assim, se decorridos que sejam 15 dias sobre a data de emissão desta carta se mantiverem por regularizar as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo, iremos de imediato e sem precedência de qualquer outra notificação, promover a resolução dos contratos e a execução judicial dos créditos.
Sem prejuízo do referido anteriormente, relembramos que ainda poderá contactar a Unidade de Recuperação através do telefone (…), com vista à regularização extrajudicial das referidas responsabilidades de crédito. (…)
Informamos que existe uma rede de apoio ao consumidor endividado. As informações sobre esta rede poderão ser consultadas no “Portal do Consumidos, disponível em www.consumidor.pt” (…)
(*) Decorre do DL 227/2012, de 25 de Outubro. Se estiver a incumprir um contrato de crédito à habitação e for igualmente mutuário de outros contratos de crédito poderá solicitar a intervenção do Mediador do Crédito nos 5 dias seguintes à extinção do PERSI e beneficiar das garantias do PERSI por um período adicional de 30 dias.»
O tribunal a quo julgou oficiosamente verificada a excepção dilatória inominada insanável decorrente do desrespeito, pelo exequente, da demonstração da válida comunicação, aos executados (…) e/ou aos seus herdeiros, e a (…), da extinção do PERSI. Em consequência, determinou a extinção da execução relativamente a esses dois executados e ordenou a sua prossecução relativamente aos dois restantes.
De acordo com a posição que fez vencimento, esse segmento da decisão do tribunal a quo deverá ser revogado, determinando-se o prosseguimento da execução também contra (…) e (…), com os seguintes fundamentos:
- Os autos não reúnem elementos suficientes para que possa ser tomada uma decisão em relação ao executado (…), pois inexiste confirmação do óbito deste; não sendo seguro que, em caso de morte do mutuário que se encontra em situação de incumprimento, haja obrigação de integração dos seus herdeiros (naturalmente enquanto representantes da herança) em PERSI, os autos não fornecem os elementos necessários a um despacho liminar de indeferimento;
- Quanto à executada (…) e ao contrário do entendimento sufragado pelo tribunal a quo, o conteúdo da carta mediante a qual o banco exequente lhe comunicou a extinção do PERSI cumpre as exigências do n.º 3 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10. Isto porque, face à diferente natureza das causas extintivas previstas nos n.ºs 1 e 2 daquele artigo, correspondendo as primeiras a fundamentos que operam ex lege (ainda que a eficácia da extinção fique dependente da sua comunicação e recepção pelo destinatário) e dependendo as segundas da vontade da instituição bancária, apenas quanto a estas se afigura exigir a lei a motivação da decisão tomada, apontando as razões pelas quais entende, ainda que verificado um (ou vários) dos fundamentos extintivos, que o procedimento não pode manter-se.
Discordo de ambos estes fundamentos.
Quanto ao primeiro:
(…) é e continua a ser devedor e executado. Foi ele, e não aos seus herdeiros, que o exequente demandou. O seu hipotético óbito não se encontra certificado nos autos e, em consonância com isso, os seus herdeiros não foram habilitados. Portanto, para efeitos processuais, (…) está vivo, pela simples razão de não se encontrar demonstrada, pelo meio legalmente previsto (certidão de assento de óbito), a sua morte. Não é concebível um estatuto processual de «morto-vivo» (releve-se-nos o eventual mau gosto da designação, mas não encontramos outra capaz de significar aquilo que pretendemos), de sujeito processual cuja morte não está demonstrada mas, apesar de tudo, indiciada em termos suficientemente fortes para produzir alguns efeitos.
Sendo assim, o acerto da decisão recorrida sai reforçado. Tendo a carta referida no n.º 23 sido remetida aos «Herdeiros de (…)» e não estando demonstrado o óbito deste, é de concluir que (…) nem sequer foi integrado em PERSI. O exequente tratou (…) como um «morto-vivo»: na dúvida sobre se ele faleceu, demandou-o a ele, mas pretendeu cumprir o disposto nos artigos 12.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 227/2012 na pessoa dos seus hipotéticos e desconhecidos herdeiros.
Parece-nos evidente que esta actuação do exequente não cumpre o disposto nos artigos 12.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 227/2012. Até se encontrar demonstrado o seu óbito pelo meio legalmente exigido, é o próprio devedor quem tem de ser integrado em PERSI. Não faz sentido demandar o devedor e pretender ter cumprido o dever de integração deste em PERSI na pessoa dos seus hipotéticos herdeiros.
Daí que o verdadeiro problema não seja a insuficiência do conteúdo da carta referida no n.º 26, mas sim o incumprimento do dever de integração do devedor (…) em PERSI. Pelo que, independentemente do entendimento que se perfilhe acerca da interpretação a dar ao n.º 3 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, sempre se verificaria a excepção dilatória inominada, insanável e de conhecimento oficioso, da falta de integração do devedor em PERSI, decorrente da al. b) do n.º 1 do artigo 18.º do mesmo diploma legal.
Quanto ao segundo:
A decisão recorrida encontra-se tão solidamente fundamentada, que torna dispensável qualquer acrescento. Adiro a essa fundamentação. Ainda assim, deixo algumas observações complementares, eventualmente redundantes.
O n.º 3 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012 estabelece que «a instituição de crédito informa o cliente bancário, através de comunicação em suporte duradouro, da extinção do PERSI, descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento».
O n.º 4 do mesmo artigo dispõe que «a extinção do PERSI só produz efeitos após a comunicação referida no número anterior, salvo quando o fundamento de extinção for o previsto na alínea b) do n.º 1.».
Decorre da conjugação destas duas normas que o dever de comunicação estabelecido no n.º 3 abrange, quer as hipóteses previstas no n.º 2, quer as previstas no n.º 1. Em todas elas, mesmo na prevista na al. b) do n.º 1, a comunicação é obrigatória. Além de obrigatória, a comunicação é condição da eficácia da extinção do PERSI em todas as hipóteses previstas no n.º 2 e naquelas que o são nas als. a), c) e d) do n.º 1, pois o n.º 4 apenas exclui a da al. b) deste número.
Portanto, sublinhamos, o disposto no n.º 3 do artigo 17.º acerca do conteúdo da comunicação é aplicável, por igual, a todas as hipóteses previstas nos n.ºs 1 e 2. Qualquer distinção que o intérprete faça dos termos em que tal aplicação tenha lugar, contraria o n.º 3, que expressamente consagrou um regime uniforme para todas as referidas hipóteses. O entendimento de que o n.º 3, na sua totalidade ou apenas na sua parte final, não é aplicável às hipóteses previstas no n.º 1, ou a alguma delas, consubstancia-se numa interpretação restritiva da norma. Ora, a legitimidade da interpretação restritiva de uma norma legal carece de fundamentação convincente. Coisa que, salvo o devido respeito, não vi até este momento.
Dito isto, concentremos a nossa atenção na al. c) do n.º 1 do artigo 17.º.
Constitui argumento recorrente de quem sustenta o entendimento de que, nesta hipótese, a comunicação prevista no n.º 3 apenas tem de mencionar o fundamento legal da extinção do PERSI e o facto de terem decorrido 90 dias desde a data da integração do cliente bancário em PERSI, sem mais, que, na realidade, nada mais a instituição de crédito terá a dizer com alguma utilidade para aquele. Estabelecendo a lei um prazo e tendo este decorrido, que poderia a instituição de crédito comunicar ao cliente bancário além do facto de esse prazo já ter decorrido e, em consequência disso, o PERSI se ter extinguido?
A primeira observação que este argumento me suscita é a de que, a ser válido, quem a ele recorre fica indevidamente a meio da interpretação restritiva do n.º 3 por si empreendida. Deixar de aplicar apenas a sua parte final à hipótese prevista na al. c) do n.º 1 implica reduzir o conteúdo da comunicação à lembrança, dirigida ao cliente bancário, de que decorreu o prazo do PERSI e, por isso, este se extinguiu, com indicação da norma legal ao abrigo da qual isso ocorreu. Torna a comunicação uma mera formalidade sem conteúdo útil para além do de chamar a atenção do cliente para o facto de aquele prazo ter decorrido e de indicar a referida norma. O que é manifestamente pouco. Por isso afirmei que, se é para chegar a este resultado que se faz uma interpretação restritiva do n.º 3, melhor será levá-la até ao fim e concluir que a comunicação nele prevista não tem lugar na hipótese prevista na al. c) do n.º 1. Fazer tal comunicação só para lembrar o cliente bancário de que o prazo do PERSI decorreu, acaba por constituir uma formalidade com escassa utilidade.
É evidente que a solução que defendo se encontra nos antípodas de qualquer daquelas que acabo de enunciar. O dever de comunicação estabelecido no n.º 3 abrange, indubitavelmente, as hipóteses previstas no n.º 1, nomeadamente a da sua al. c). E, por ser assim, deverá ter um conteúdo útil, na perspectiva dos objectivos prosseguidos pelo regime legal do PERSI, entre os quais avulta o de proteger o cliente bancário, nomeadamente atribuindo-lhe o direito de receber, da instituição de crédito, informação clara e completa acerca da sua situação, «atentas as assimetrias de informação entre consumidores e instituições de crédito» (cfr. o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 227/2012).
Na hipótese prevista na al. c) do n.º 1 do artigo 17.º, para ter um conteúdo efectivamente útil, para garantir, na maior medida possível, a satisfação do direito do cliente bancário a informação clara e completa, a comunicação prevista no n.º 3 não pode resumir-se a um mero lembrete de que o prazo do PERSI já passou. Ainda menos quando, como no caso dos autos, a descrição do fundamento legal da extinção do PERSI se resume à menção do Decreto-Lei n.º 227/2012, sem, ao menos, se dizer que artigos, números e alíneas se tem em vista. Adiante falarei sobre esta específica questão. Só a refiro neste momento para evidenciar a magreza da informação prestada à recorrida (…). Repito, fazer uma comunicação nestes termos é, sob o ponto de vista da satisfação do direito do cliente bancário à informação, o mesmo que não fazer comunicação nenhuma.
Sendo assim e procurando responder à questão, que os defensores da posição que procuro refutar colocam, de saber que mais poderá a instituição de crédito dizer na comunicação prevista no n.º 3, direi: muita coisa. Concretamente: o que fez a instituição de crédito para resolver a situação do cliente bancário, que medidas propôs e qual foi a justificação destas face à avaliação a que procedeu nos termos do artigo 15.º; qual foi a resposta que obteve do cliente bancário; se essas medidas foram implementadas, se e em que medida o cliente bancário cumpriu os seus deveres, por que razões a situação de incumprimento não foi ultrapassada e por que não se justifica a prorrogação prevista no final da al. c) do n.º 1.
A diferença entre uma comunicação feita nos termos que acabei de enunciar e aquela que se limita a lembrar o cliente bancário de que o prazo do PERSI já decorreu e, por isso, este último se extinguiu, é abissal. Constitui uma evidência que apenas a primeira proporcionará, ao cliente bancário, uma informação digna desse nome e consentânea com os fins do Decreto-Lei n.º 227/2012. A segunda não passa de uma formalidade com escassa ou nula utilidade.
Mais, um dever de informação densificado nos termos expostos incentivará a instituição de crédito a cumprir o seu dever de diligenciar no sentido de a situação de incumprimento ser ultrapassada, em vez de adoptar uma atitude passiva que, no limite, poderia resumir-se a deixar o prazo referido na al. c) do n.º 1 decorrer. Por esta via, o dever de informar constitui, também, um mecanismo de incentivo da instituição de crédito a cumprir cabalmente os deveres que o Decreto-Lei n.º 227/2012 lhe impõe e facilita a sindicância da sua actuação por terceiros.
Por tudo isto, o cumprimento do disposto na parte final do n.º 3 do artigo 17.º na hipótese prevista na al. c) do n.º 1 é possível e, para satisfazer o direito do cliente bancário à informação, de forma alguma pode resumir-se à comunicação de que o prazo estabelecido nesta última norma já decorreu.
Consequentemente, como o tribunal a quo bem decidiu, a comunicação efectuada à recorrida (…) não cumpre a exigência decorrente da parte final do n.º 3.
Analisemos, por último, a questão, acima aflorada, da falta de indicação do fundamento legal da extinção do PERSI. Questão essa que, saliente-se, o tribunal a quo também conheceu e decidiu acertadamente.
Na carta remetida à recorrida (…), o recorrente limitou-se a mencionar, em nota de rodapé, que aquele fundamento é o «DL 227/2012 de 25 de Outubro», sem indicação dos artigos, números e alíneas. Ora, isto não satisfaz a exigência legal de descrição do fundamento legal de extinção do PERSI. Indicar, genericamente, um diploma legal com 40 artigos, alguns dos quais bastante extensos, numa comunicação dirigida a um cliente bancário que é, necessariamente, um consumidor, nos termos da al. a) do artigo 3.º, é o mesmo que nada. Certamente será muito mais difícil, a um não jurista, confrontar-se com os 40 artigos do Decreto-Lei n.º 227/2012, que, a um jurista experimentado, confrontar-se com os 2334 artigos do Código Civil. E ninguém duvidará que uma peça processual destinada a ser lida por juristas em que se justifique determinada asserção remetendo, em bloco, para o Código Civil, não estará juridicamente fundamentada.
Decorre do n.º 3 do artigo 17.º que a indicação do fundamento legal da extinção do PERSI constitui um elemento essencial da comunicação nele prevista, pelo que a omissão da referida indicação determina, por si só, a ineficácia dessa comunicação. O mesmo é dizer que, ainda que se procedesse a uma interpretação restritiva (limitada) dessa norma nos termos que procurei refutar, sempre a comunicação de extinção do PERSI que foi dirigida à recorrida (…) seria ineficaz, nos termos do n.º 4 do mesmo artigo.
Concluindo, verifica-se a excepção dilatória inominada, insanável e de conhecimento oficioso, com fundamento da qual o tribunal a quo julgou extinta a instância relativamente aos recorridos (…) e (…. Confirmaria, pois, a decisão recorrida, ainda que, relativamente ao primeiro, com fundamento não coincidente.
Vítor Sequinho dos Santos
Sumário: (…)
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[1] Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos:
1.ª Adjunta: Sr.ª Juíza Desembargadora Cristina Dá Mesquita;
2.º Adjunto: Sr. Juiz Desembargador Vítor Sequinho dos Santos.
[2] Designada pela letra “H”, correspondente ao terceiro andar esquerdo, destinado a habitação e uma arrecadação no sótão, com o número de polícia seis do prédio urbano sito na Rua de (…), Lote seis, na cidade, freguesia e concelho de Rio Maior, descrito na Conservatória do Registo Predial de Rio Maior sob o número (…) da dita freguesia e inscrito na matriz sob o artigo (…).
[3] Daí que, como se compreende, a omissão do fornecimento de informações e elementos solicitados possa ser, por si, comprometedora da necessária apreciação da situação financeira do devedor, impedindo a apresentação de propostas de regularização com um mínimo de consistência e, inviabilizando todo o processo, como se verificou no caso tratado no acórdão deste TR de 26 de Maio de 2022, processo 8/22.2T8ENT.E1, também subscrito pela ora relatora na qualidade de 2.ª adjunta, ainda acessível em www.dgsi.pt.
[4] Subscrito pela ora relatora como adjunta.