I – Tendo o mandatário poderes para outorgar, em nome da mandante, contratos de arrendamento relativamente a todos os seus imóveis, estipulando as cláusulas e demais condições que entendesse por convenientes, ainda que estivessem imperfeitamente expressos, tinha também poderes para efetuar comunicações no âmbito do Novo Regime do Arrendamento Urbano, quando estas mais não são do que uma forma de atualização das cláusulas dos contratos de arrendamento.
II – Ainda que assim não fosse, manifestando o mandatário a verdadeira vontade do mandante e tendo os terceiros conhecimento de tal facto, não poderiam estes invocar qualquer vício formal.
III – A elaboração de decisão sem realização de julgamento, respondendo quanto aos factos julgados não provados, dando-lhes relevância jurídica, não é opção que se coadune com o disposto no artº 595º, nº 1, al. b), do Código de Processo Civil.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Acordam os juízes que nestes autos integram o coletivo da 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:
Nos autos de ação de procedimento especial de despejo, que correu termos no Juízo Local Cível da Guarda - Juiz 2, em que é Requerente A... IPSS e em que são Requeridos AA e BB, foi proferida sentença, julgando procedente a oposição deduzida e totalmente improcedente o presente procedimento especial de despejo.
A Recorrente A... IPSS interpôs recurso da sentença, concluindo, nas suas alegações, que:
(…).
Os Recorridos AA e BB responderam ao recurso da sentença, concluindo, nas suas contra-alegações, que:
(…).
Da conjugação do disposto nos artºs 635º, nºs 3 e 4, 637º, nº 1 e 639º, todos do Código de Processo Civil, resulta que são as conclusões do recurso que delimitam os termos do recurso (sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso - artº 608º, nº 2, ex vi artº 663º, nº2, ambos do mesmo diploma legal). Assim:
Questões a decidir:
1) Dos poderes de representação
2) Do abuso de direito
Factos julgados provados na sentença recorrida:
1. O prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, a que corresponde o 3.º andar, sito na Rua ..., ..., ... Guarda, mostra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ..., freguesia ... (...), sob o n.º 2630/19... e inscrito na matriz predial pelo artigo matricial ...56 a favor da Autora.
2. Por documento escrito que as partes denominaram “contrato de arrendamento”, datado de 03 de Maio de 1971, a Autora acordou com o Réu AA ceder-lhe o gozo para habitação do prédio sito na Rua ..., ..., ..., a freguesia ..., concelho ....
3. Mais declararam os outorgantes, no documento enunciado em 2., que o referido gozo do imóvel era cedido pelo prazo de seis meses, renovável automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo e nas mesmas condições, com início em 01 de Maio de 1971.
4. Declararam, ainda, que se fixava uma renda de mil e seiscentos escudos mensais, a ser paga em casa do senhorio ou de quem o representar até ao primeiro dia útil do mês a que respeitar.
5. Através de duas cartas, ambas datadas de 31/05/2007, sendo uma dirigida a AA e outra a BB, onde constavam como assunto “Actualização da renda de acordo com o Novo Regime de Arrendamento Urbano”, a Autora comunicou que o “valor da renda actualizada” seria de €254,00, a dividir por um “período de faseamento” que poderia ser de 2, 5 ou 10 anos, de acordo com o “período de actualização”, o valor da renda a pagar no 1.º ano, seria, um dos seguintes: Actualização em 2 anos: €163,00; Actualização em 5 anos: €118,00; Actualização em 10 anos: €92,00.
6. Nas cartas referidas em 5., a Autora comunicou ainda que a nova renda seria exigível a partir de “2007-09-01”, “referente ao mês de SETEMBRO/2007”.
7. Através de documento denominado “Notificação da avaliação da ficha n.º ...32”, dirigida ao A... e datada de 10-04-2007, o Serviço de Finanças da Guarda comunicou o resultado da avaliação efectuada à totalidade do prédio identificado em 1.
8. Por carta datada de 24/06/2007, o Réu AA, comunicou à Autora, entre outros, o seguinte:
“Acuso a recepção da v/ carta […]
Em resposta, venho desde já, adiantar o seguinte:
1.º Se e quando for legitimada a pretensão de aplicar o NRAU para a próxima actualização, o período de faseamento será de dez anos, pois reúno as condições para o efeito. Sendo uma delas o bastante, adianto como comprovante fotocópias dos BI. Por outro lado, se e quando for correctamente estabelecido o valor, o referido prazo de faseamento e a data de aplicação, o aumento só vigorará a partir do mês subsequente ao da m/ comunicação de que foram reunidas as condições para poder efectuar respectivo pagamento.
2.º De acordo com a legislação a renda corresponde a uma prestação periódica e pode ser actualizada, como tem sido. Sucessivamente, só o será um ano após a actualização anterior. Na actualização de Março, dizem ser de acordo com o RAU (321-B/90, já revogado) e depois conforme disposto no NRAU, com o arredondamento, de acordo com o n.º 1, do seu art., 25.º.
3.º Desejo, espero e anseio a aplicação do Novo Regime, bem vindo, quando reunidas condições para tal, pois é a oportunidade de serem reparadas anomalias graves, provavelmente até muito graves, que me afectam e prejudicam, e a breve prazo anulam as tentativas de conservação e manutenção que com esforço tenho feito no interior da habitação. Algumas paredes nem sequer permitem limpeza nem aceitam pintura estando a desfazer-se os rebocos devido a infiltrações de água que escorre por paredes e tectos. Há lâmpadas por onde pinga água provavelmente infiltrada nas condutas eléctricas sendo talvez por isso que os disjuntores disparam várias vezes num dia à ligação de aparelhos ou ao simples acender de luzes, sendo necessária a frequentíssima substituição de lâmpadas. Isto para não falar nas pingas de chuva em vários pontos da moradia que até já obrigaram à inversão da cabeceira de uma cama e mudança de outros móveis, e no levantamento de pavimentos cujos tacos foram substituídos ou requerem cuidados de fixação, sob pena de tropeções. Friso, que sou o mais antigo morador, desde Maio de 1971 (vai para 37 anos), e nunca o senhorio diligenciou minimamente em favor da manutenção e conservação o que bastaria para
tornar inaceitável, mesmo impossível, um estado de conservação entre o Bom e o Óptimo, que só poderia ser estimado por conveniência. É evidente que não houve qualquer vistoria de avaliação e seria impossível a qualquer leigo, quanto mais a um Engenheiro ou Arquitecto, elaborar honestamente qualquer relatório, informação ou ficha de avaliação do nível de conservação, sem focar as evidentes anomalias de elementos funcionais do edifício e da habitação e a respectiva gravidade. Assim sendo o factor correspondente ao coeficiente de conservação Médio, utilizado por imposição da Lei e não por benevolência do senhorio, aparece como por milagre do NRAU aplicado unilateral e convenientemente, de forma que falseia a realidade evidente e pretende esconder a total falta de conservação e manutenção e esconder o mau estado do prédio e da habitação. O B..., enquanto senhorio, conhecia perfeitamente as necessidades, reconhecia as razões dos inquilinos, mas evitava as intervenções dispendiosas, argumentando primeiro com as rendas baixas e mais tarde por condições várias que forçaram a integração no A... na Assembleia Geral de 29 de Outubro de 1997. Tal integração acrescentou 10 anos de actualizações e de degradações, agora com total abandono.
4.º Além de, estarem em causa os procedimentos e informações necessárias ao processo, não compreendo nem aceito a consideração do senhorio que atribui à habitação e ao prédio o estado de conservação óptimo ou bom, quando realmente o estado real de conservação e manutenção é absolutamente nulo, com exposição às condições climatéricas da nossa Guarda, sem cuidados mínimos necessários e indispensáveis, sendo que nos últimos 10 anos o abandono, é extensivo às limpezas e tratamento das zonas comuns, onde antes até havia mulher de limpeza e jardineiro a tempo parcial. Na Delegação da Guarda do A... recusam frontalmente, qualquer responsabilidade ou reclamação relacionadas com as condições de habitabilidade e do prédio, alegando, certamente com razões, ser apenas uma Agência do Banco e não de imóveis, embora nos tenha convocado para indagar sobre o interesse em comprar a casa, sem saberem de preço e condições.
5.º Lamenta-se que o senhorio não tenha estabelecido o mínimo contacto com o inquilino, que se preza de ter cumprido todas as suas obrigações, muito para além do legalmente estabelecido, antes de pretender unilateralmente actualizar, pela segunda vez no mesmo ano, a renda que por acaso, é a mais elevada que o senhorio recebe, nesta parte do prédio e no conjunto dos cerca de 20 moradores.
Desconheço se o fez em relação ao arrendatário do 1°. Andar mas sei que fomos os únicos a receber igual tratamento perante a nova Lei, exclusivamente para esta parte do prédio, de 3 moradores, cujo inquilino do 2.º Andar, já com contracto do tempo e da responsabilidade do A..., curiosamente saiu por FALTA DE CONDIÇÕES DE HABITABILIDADE, enquanto nós, eu particularmente, me tenho esforçado por manter, tendo conseguido ao menos disfarçar, durante o bom tempo e até nova deterioração provocada por cada Invernia, o crescente mau estado interior, e exterior, nomeadamente os caleiros condutores da água das chuva e os terraços nunca cuidados.
Depois de ter suportado já uma derrocada total da cozinha com destruição de móveis, utensílios, louças, máquinas e vidros incluídos os da porta e janela, (ocorrida às 12-00 horas do dia 10-10-1997) testemunhada por funcionários do B..., que alegou então não ter seguro, e participada à Companhia de Segures Império (Proc.-9704155) que nada assumiu conforme resposta 34-021904/5 de 24 do mesmo mês. Informou-me nessa altura o gestor do processo (Sr. CC) de que o meu seguro cobria os bens pessoais e do senhorio mas apenas se e quando a ocorrência fosse por culpa minha e não por motivos devidos de más condições atribuíveis ao próprio prédio.
Depois de ter assumido prejuízos e inconvenientes derivados a queda de rebocos de paredes sobre espelhos e louças na casa de banho, depois de variadíssimas intervenções com impermeabilizações, limpezas, pinturas etc. extensíveis aos terraços por cima da cozinha e até aos vãos e hall da entrada, recebo finalmente uma dupla atenção do senhorio com duas actualizações no mesmo ano.
6.º No dia 1 de Junho corrente tinha começado já a habitual empreitada praticamente inútil como digo, destinada a repor as condições mínimas de decência (aparente) e que incluíam este verão a picagem e novo reboco de pelo menos duas paredes interiores, e eventual reparação ou substituição de algum cano que possa ainda mais a porventura estar a contribuir para o aumento de humidades. A limpeza e pintura, praticamente geral, que faço cada ano, bem como algumas intervenções de fundo e de necessidade urgente para evitar males maiores como por exemplo um azulejo no cimo das escadas no 3.º andar que ameaça cair, e mede um metro por 0,50 constituindo evidente perigo se por azar cai num mau momento. Aliás o tecto do hall de entrada está desfeito com pó e estuque a cair todos os dias e não aguenta qualquer limpeza ou pintura. E já agora, recentemente ruiu todo o reboco de um muro separador dos terraços deixando a descoberto os tijolos cujos buracos são perfeita canalização para infiltração de maior quantidade de água, agravando ainda mais a situação.
Considerando que citei algumas anomalias não posso deixar de referir a da entrada principal desta área do prédio cujo sistema de segurança e encerramento não funciona há muitos anos, estando sempre aberta permitindo todo o tipo de entradas que facilitaram os roubos de flores, tapetes, correio nomeadamente jornais e revistas.
Registe-se que esse fácil acesso já permitiu que a entrada e escadas fossem usadas como retrete de vândalos e dormitório para vadios, o que é do conhecimento da P.S.P.,
Por sinal nem sequer as luzes da entrada e escadas funcionam.
A intenção neste ponto da m/ resposta, não era citar algumas anomalias evidentes mas especialmente comunicar que ao recebimento da carta que defende direitos e esquece totalmente obrigações, suspendi a tal "empreitada" habitual a que acima me refiro, para não disfarçar anomalias tão evidentes e importantes, que não poderão deixar de ser incluídas na ficha de avaliação do nível de conservação do edifício a que se refere a Portaria n.º 1192-B/2006, de 3 de Novembro, essencial no processo de actualização das rendas, para a defesa dos meus direitos, que também os tenho e dos quais não prescindo, pelo menos sem que o A... cumpra as obrigações legais, com respeito pelo inquilino e associado ou diligencie para um entendimento entre as partes o que dadas várias circunstâncias seria o mais normal e conveniente.
Termino, por agora, com a certeza de que fica sem efeito a actualização que pretendiam já a partir de 1 de Setembro e aguardo as v/noticias esperando que sejam reunidas todas as condições e efectuadas as diligências em conformidade, cumprindo- se o que for determinado em resultado de actuações correctas e imparciais, nos limites e termos que a Lei permite e confere com respeito pelos direitos, garantias e deveres das partes interessadas».
9. Após a recepção da carta identificada em 8., a Autora considerou como período de actualização 10 anos, correspondente ao valor de € 92,00.
10. No período temporal compreendido entre 01-09-2007 e 01-09-2009, os Requeridos pagaram mensalmente a quantia de € 92,00 a título de renda.
11. No período temporal compreendido entre 01-10-2009 e 01-09-2010, os Requeridos pagaram mensalmente a quantia de € 112,00 a título de renda.
12. No período temporal compreendido entre 01-10-2010 e 01-09-2011, os Requeridos pagaram mensalmente a quantia de € 132,00 a título de renda.
13. No período temporal compreendido entre 01-10-2011 e 01-09-2012, os Requeridos pagaram mensalmente a quantia de € 152,00 a título de renda.
14. No período temporal compreendido entre 01-10-2012 e 01-09-2013, os Requeridos pagaram mensalmente a quantia de € 172,00 a título de renda.
15. No período temporal compreendido entre 01-10-2013 e 01-09-2014, os Requeridos pagaram mensalmente a quantia de € 192,00 a título de renda.
16. No período temporal compreendido entre 01-10-2014 e 01-09-2015, os Requeridos pagaram mensalmente a quantia de € 212,00 a título de renda.
17. No período temporal compreendido entre 01-10-2015 e 01-09-2016, os Requeridos pagaram mensalmente a quantia de € 232,00 a título de renda.
18. No período temporal compreendido entre 01-10-2016 e 01-10-2018, os Requeridos pagaram mensalmente a quantia de € 252,00 a título de renda.
19. Através de carta registada com aviso de recepção, que C..., ACE remeteu ao Réu, datada de 09-03-2018, a primeira comunicou ao segundo o seguinte:
«O C..., ACE, na qualidade de representante do A..., doravante A..., para as matérias relacionadas com a gestão dos seus ativos imobiliários, incluindo a gestão dos contratos de arrendamento em vigor nos imóveis de que esta entidade é proprietária, pretende informar V. Ex. do seguinte:
Com referência ao contrato de arrendamento para fins habitacionais celebrado em 1 de maio de 1971, relativo ao imóvel sito na Rua ..., ..., ..., da freguesia ..., do qual V. Ex.ª é arrendatário, vimos pela presente dar início ao procedimento de transição do contrato para o Novo Regime do Arrendamento urbano (NRAU) e atualização da renda previsto no artigo 30 da Lei n. 6/2006, de 27 de fevereiro de 2006, com a redação dada pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto e pela lei n.° 79/2014, de 19 de dezembro (NRAU).
Assim, e no que diz respeito ao tipo e duração do contrato, propomos a V. Ex.ª que o arrendamento seja celebrado com prazo certo, com a duração de 2 anos.
Por outro lado, informamos V. Ex.ª que o valor do locado é de 90.334,39€, avaliado nos termos dos artigos 38 e seguintes do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), conforme consta da cópia da caderneta predial urbana que se anexa à presenta carta para vosso conhecimento pelo que propomos a V. Ex.ª a atualização da renda mensal aplicável ao contrato para o montante de 501,86€.
Nos termos do disposto nos amigos 31.º e seguintes do NRAU, V. Ex. dispõe do prazo máximo de 30 (trinta) dias a contar da data de receção desta comunicação para responder, por escrito, à mesma, podendo, nessa resposta (i) aceitar ou opor-se ao valor de renda aqui proposta, apresentando uma contrapropostas (ii) pronunciar-se, em qualquer caso, quanto ao tipo e duração do contrato aqui propostos; (iii) por fim ao contrato de arrendamento (mediante denúncia) e, bem assim (iv) informar se beneficia de uma ou mais das situações de exceção previstas na lei, a saber o Rendimento Anual Bruto Corrigido (RABC) do agregado familiar inferior a 5 “retribuições mínimas nacionais anuais” (RMMA) e/ou ter idade igual ou superior a 65 anos, ou deficiência com grau comprovado de incapacidade igual ou superior a 60%.
Caso invoque alguma das circunstâncias a que se refere a alínea (iv) supra, deverá a resposta de V. Ex.ª fazer se acompanhar dos respetivos documentos comprovativos exigidos por lei (cf. Artigo 32 NRAU).
Mais alertamos para o facto de que a falta de resposta a esta carta e/ou da invocação de qualquer das circunstâncias excecionais acima referidas, implica a aceitação do valor de renda proposto, bem como a aceitação do tipo e duração do contrato agora propostos, ficando o contrato de arrendamento submetido as regras do NRAU a partir do primeiro (1.º) dia do segundo (2.º) mês seguinte ao do termo do prazo acima referido para a V. resposta.»
20. Através de carta registada com aviso de recepção datada de 29-03-2018, os Réus remeteram ao C..., ACE a comunicação com o seguinte teor:
«Vimos pelo presente em resposta à v. comunicação, com a referência supra indicada, recepcionada em 15/03/2018 pelo n. constituinte, Exm.º Senhor AA, residente na Rua ..., ..., ... Guarda, expor o seguinte:
Através da mencionada comunicação vêm V. Ex.ªs comunicar a v. intenção de transitar para o NRAU o contrato de arrendamento para fins habitacionais, celebrado em 1 de Maio de 1971, referente ao imóvel sito na Rua ....
Ora, salvo e devido respeito tal transição para o NRAU ocorreu já em 2007, no âmbito do processo v. Ref 233-96-030074-4/3, razão pela qual não poderá, novamente, ser transitado o contrato para o NRAU ao abrigo do disposto no art. 30.° da Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro com as redacções subsequentes, uma vez que o mesmo já se encontra sujeito ao NRAU desde 2007.
Por assim ser refuta-se, veemente, o teor da v. comunicação a que agora se responde, não aceitando o n. constituinte nem a nova transição para o NRAU, nem o montante da renda, nem o tipo e prazo de duração do contrato propostos, tudo nos termos do disposto nos art.°s 31.° e seguintes do NRAU. Na verdade, não decorre da lei, na sua versão actual, a possibilidade de transitar para o NRAU contrato já anteriormente transitado ao abrigo da Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro - e, ainda, bem -, uma vez que adoptar tal entendimento temcomo consequência a aplicação dos mesmos critérios de transição tantas vezes quantas o senhorio transitasse o contrato para o NRAU, o que conduziria a um aumento da renda desproporcional, exagerado e contra legem.
Sem prescindir sempre se dirá que o n. constituinte e o seu agregado familiar auferem um rendimento anual bruto corrigido (RABC) inferior a cinco retribuições mínimas nacionais anuais (RMNA), nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 35.º e 36.°, conforme documento que se junta para todos os legais e devidos efeitos (art.° 32.°/1 do NRAU).
Mais se refere que quer o n. constituinte, quer a esposa, que também reside no locado, têm mais de 65 anos conforme consta de cópia dos seus bilhetes de identidade que se junta, nos termos do disposto nos art.ºs 32º/4 e 36° do NRAU, pelo que se opõem, também por esta razão, à submissão ao NRAU que agora V. Ex.ªs pretendem efectuar.
Em face de tudo quanto deixamos exposto, deve manter-se nos seus precisos termos quer o montante da renda, quer o tipo e o prazo de duração do contrato de arrendamento que os n constituintes mantém, actualmente, com V. Ex.ªs.
21. Através de carta registada com aviso de recepção datada de 20 de Abril de 2018 C..., ACE comunicou ao Réu o seguinte:
«Acusamos a receção da carta subscrita por DD, Advogada, que em representação de V. Ex.ª responde à nossa missiva quanto ao procedimento de transição do contrato para o NRAU, sem que, no entanto, junte procuração com poderes para tal.
Cumpre, antes de mais, esclarecer que as alterações introduzidas à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, pela Lei n.° 79/2014, de 19 de dezembro, aplicam-se aos procedimentos de transição que se encontrem pendentes, não tendo o Senhorio optado pela continuação da aplicação do regime anterior.
No que respeita ao procedimento de transição, atendendo às exceções alegadas, a que se referem os artigos 35.º e 36.º do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) (aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 31/2012, de 14/08 e pela Lei n.° 79/2014, de 19/12) - ou seja, verificando-se cumulativamente que tem 81 anos de idade e um rendimento anual bruto corrigido inferior a 5 retribuições mínimas nacionais anuais - e não havendo acordo entre as partes quanto ao valor de renda, o tipo e a duração do contrato, informamos o seguinte:
1) Mantém-se em vigor o contrato, sem alteração do regime que lhe é aplicável.
2) A renda mensal será atualizada consoante o rendimento anual bruto corrigido (RABC), determinado nos termos dos n.º 2 e 3 do art. 35.º do NRAU, devendo V. Ex.ª proceder ao envio da declaração no prazo de 15 dias após a sua obtenção, sob pena de não se poder prevalecer das limitações relativas à atualização do valor da renda.»
22. Através de carta registada com aviso de recepção, datada de 24-08-2018, C..., ACE comunicou aos Réus o seguinte:
«Acusamos a receção da certidão do RABC do agregado familiar relativo ao ano de 2017, a qual mereceu a nossa melhor atenção.
Considerando o rendimento anual bruto corrigido de V. Exas., o valor de renda mensal é fixado em 418,12€ (quatrocentos e dezoito euros e doze cêntimos) atualização efetuada através da aplicação do valor anual correspondente a 25% do RABC, nos termos da alínea i) c) do n.º 2 do artigo 35.° do NRAU.
A nova renda é devida a partir do dia 1 de outubro e vigora por um período de 10 anos, a contar de 29 de março de 2018, devendo V. Exas. fazer prova do rendimento até ao dia 30 de Setembro de cada ano, sob pena de não poderem prevalecer-se dessa circunstância.
Findo o período de 10 anos, pode o valor da renda ser atualizado, nos termos do artigo seguintes do NRAU com a redação da Lei n.° 43/2017, de 14 de junho, não podendo V. Exas invocar a circunstância prevista na alínea a) do n.° 4 do artigo 31.º do referido diploma.
23. Através de carta registada com aviso de recepção datada de 05-09-2018, os Réus comunicaram a C..., ACE o seguinte:
«Vimos pelo presente em resposta à v. comunicação, com a referência supra indicada, recepcionada em 30/08/2018 pelos n. constituintes, Exm.º Senhor AA e Esposa, residentes na Rua ..., ..., ... Guarda, expor o seguinte:
Remetemos para tudo quanto deixámos exposto nas n. anteriores comunicações. De facto, conforme já tivemos oportunidade de comunicar a V. Ex.ªs a transição para o NRAU ocorreu já em 2007, no âmbito do processo v. Ref 233-96-030074-4/3.
Não obstante, os n. constituintes sempre cooperaram com V. Ex.ªs designadamente através do envio da documentação solicitada como certidão de RABC.
Sucede, porém, que o valor da renda mensal agora fixado de 418,12€ é muito superior ao valor mensal até então pago pelos n. constituintes (252,00€).
Acresce que, pese embora os n. constituintes aufiram um RABC de 20.069,56€, a verdade é que mensalmente têm um rendimento líquido de 1.275,00€ e é, pois, com este rendimento que fazem face às suas despesas mensais correntes.
Ora, atenta a provecta idade e o seu estado de saúde, despendem, mensalmente, avultadas quantias em despesas com saúde (farmácia e médicos), a que acrescem as demais despesas mensais correntes, com a agravante das despesas com electricidade e gás atendendo não só às condições climatéricas da cidade ..., mas também ao isolamento térmico da fracção em causa. De referir que, mensalmente, os n. constituintes despendem cerca de 600,00€ com água, luz, gás, telecomunicações, a que acresce a renda da casa, alimentação, seguros e saúde.
Dai que, caso se mantenha o valor da renda agora proposto os n. constituintes não terão, pois, possibilidade de pagar a mesma e poderão, ao fim de mais de 40 anos como arrendatários, entrar contra a sua vontade e os seus princípios, em incumprimento
contratual, o que não farão!
Por assim ser, atento o circunstancialismo supra descrito e tendo em conta as boas relações contratuais que se mantém desde 1971 e o reiterado cumprimento do contrato de arrendamento por parte dos n constituintes, designadamente na pontualidade do pagamento da renda, vimos, em seu nome, peticionar seja mantido o montante da renda, no valor de 252.00€.
É que tendo presente a idade do imóvel, a qualidade e estado de conservação do mesmo localização (numa cidade do interior), por comparação com imóveis idênticos no mercado imobiliário local, verifica-se que o valor da renda agora proposto vai muito além do valor médio das rendas fixadas, na cidade ..., para imóveis idênticos (veja-se documento anexo da imobiliária Era Guarda, do qual resulta um preço médio de arrendamento de apartamentos na Guarda de 250,00€).
De realçar que os n constituintes procederam, ao longo destes 40 anos a melhorias no imóvel, designadamente instalação de nova cozinha, mudança de portas e colocação de novos estores, nunca tendo exigido obras a V. Ex.ªs que sempre receberam pontualmente a renda, sem que com isso tivessem quaisquer despesas de conservação e/ou manutenção.
Em face de tudo quanto deixamos exposto e do já alegado nas n. anteriores comunicações, solicitamos seja revisto o montante da renda proposto e, consequentemente, seja mantido, nos seus precisos termos, o montante actual da renda que se cifra em 252,00€, por ser este o valor justo adequado e proporcional ao mercado imobiliário local.
Caso assim não seja decidido e mantenham o montante da renda agora proposto de 418.12€, desde já comunicamos que é intenção dos n. constituintes procederem à resolução do contrato de arrendamento, uma vez que não pretendem incumprir o contrato por falta de pagamento da renda.
24. Por carta registada com aviso de recepção datada de 28 de Setembro de 2018, C..., ACE comunicou aos Réus o seguinte teor:
«Acusamos a receção da carta subscrita pelos Advogados EE e DD, que uma vez mais respondem em nome de V. Exas, sem que, no entanto, demonstrem poderes suficientes de tal representação.
Por mera cortesia respondemos às questões colocadas na mencionada carta, referindo, desde logo que mantemos o teor da nossa missiva de 20 de abril do corrente ano, no que respeita à legitimidade da iniciativa do senhorio de transição do arrendamento para o NRAU e atualização de renda, nos termos do art. 30.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro de 2006, com a redação atualizada.
Nenhuma das situações alegadas motivam um tratamento diferenciado, uma vez que não se enquadram nas exceções legais.
Quanto à eventual denúncia do arrendamento, esclarecemos que é também, no âmbito deste procedimento, extemporânea, por inobservância do disposto no art. 31.° do NRAU não sendo, assim, aplicáveis os artigos 29.º e 34.º, designadamente no que respeita à compensação pela realização de benfeitorias no locado».
25. Através de carta registada com aviso de recepção datada de 8 de Novembro de 2018, os Réus comunicaram a C..., ACE o seguinte:
«Vimos pelo presente responder à v. comunicação, com a referência supra indicada, recepcionada em 30/10/2018 pelos n. constituintes, Exmo Senhor AA e Esposa, residentes na Rua ..., ..., ... Guarda.
Utilizando a argumentação expendida por V. Exªs devemos começar por comunicar que quer a carta a que ora respondemos, quer as anteriores não merecem a aceitação dos n. constituintes uma vez que as mesmas se encontram subscritas por FF, sob o título de Director do Departamento de Gestão Patrimonial do C..., sem que, no entanto, demonstre poderes ou título suficiente de tal representação e/ou de poderes de representação, bastantes e suficientes, para subscrever as mencionadas comunicações em v. representação.
Sendo incontornável a exigência desses expressos poderes de representação por parte do senhorio, nos termos do disposto no art.° 9.° do NRAU, trata-se de dever indisponível cujo não cumprimento constitui invalidade insanável.
Sem prescindir do que acaba de se expor, cumpre-nos registar que V. Exªs nunca tenham respondido directamente às n. missivas, nem solicitado a junção de procuração que agora anexamos ao presente, a qual detemos desde 08/02/2018.
Sem prescindir de quanto se deixa exposto reiteramos a posição já manifestada nas n. anteriores comunicações, designadamente que não se aceita a transição do contrato que pretendem fazer para o NRAU, uma vez que a mesma já ocorreu em 2007, no âmbito do processo v. Ref 233-96-030074-4/3, não se compreendendo sequer a v. afirmação segundo a qual o senhorio não optou "pela continuação da aplicação do regime anterior". De facto, nunca os n. constituintes foram notificados de qualquer intenção por parte do senhorio no sentido de não aplicar o regime anterior de transição, pelo que a mesma operou.
Por assim ser, consideramos que o contrato de arrendamento em causa transitou, já, em 2007 para o NRAU, pelo que a transição que V Exªs agora pretendem fazer não tem cabimento legal, não sendo devido o montante de renda peticionado.
Por não se concordar com tal transição e muito menos por se considerar injustificado o aumento de renda de 252,00€ para 418,12€ procede-se à devolução da factura/recibo da Renda n.º 4987/2018A de Novembro de 2018, por não ser devido tal montante e, consequentemente, não poderem aceitar a referida factura/recibo.
Mais se refere que V Exªs indicam que vão proceder ao débito do valor de 418,12€ na conta que os n. constituintes detém na Associação A..., mas a verdade é que Ex.ªs não são detentores de qualquer autorização assinada pelos n. constituintes que permita debitar o montante de 418,12€. Por assim ser solicitamos nos seja enviado o documento de autorização de que dispõem, informando que caso seja debitado algum valor mensal para além do montante 252,00€, das contas de que os n. constituintes são titulares junto da Associação A..., recorreremos às competentes vias judiciais designadamente através da apresentação de queixa-crime.
Mais registam os n. constituintes que é lamentável que V. Exªs não tenham em conta, na ponderação necessária a uma tomada de decisão, que os n. constituintes são associados há mais de 60 anos da Associação A... com quem sempre mantiveram boas relações, denotando esta actuação de V. Exªs um desvio das finalidades de tal Associação de "desenvolvimento de ações de proteção social, complementares ao sistema público de segurança social e de saúde, e a promoção da melhoria da qualidade de vida dos seus associados e suas famílias", dado que pretendem proceder ao um aumento de renda para um valor que sabem não poder ser pago pelos n. constituintes.
Conforme já anteriormente comunicaram, caso mantenham o montante da renda agora proposto de 418,12€, comunicamos novamente que é intenção dos n. constituintes procederem à denúncia do contrato de arrendamento, uma vez que não pretendem incumprir o contrato por falta de pagamento da renda.»
26. Através de carta registada com aviso de recepção datada de 10-12-2018, os Réus comunicaram a C..., ACE o seguinte:
«Reiteramos a posição já manifestada nas n. anteriores comunicações relativas ao assunto dos n. constituintes, Exmo Senhor AA e Esposa, residentes na Rua ..., ..., ... Guarda, designadamente que não se aceita a transição do contrato que pretendem fazer para o NRAU, remetendo para tudo quanto a esse respeito deixámos exposto nas n. anteriores comunicações.
Por não se concordar com tal transição e muito menos por se considerar injustificado o aumento de renda de 252,00€ para 418,12€ procede-se à devolução da fatura/recibo da Renda n.º 5614/2018A de Dezembro de 2018, por não ser devido tal montante e, consequentemente, não poderem aceitar a referida fatura/recibo. Registamos, no entanto, que, segundo resulta da fatura/recibo cuja devolução efetivamos, a quantia de 418,12 somente será debitada em 2019-12-03.
Caso tal débito venha, efetivamente, a ocorrer reiteramos o já exposto no n. comunicação de 08/11/2018 no que diz respeito à reação dos n. constituintes caso lhes sejam debitadas quaisquer quantias em conta para além do montante de renda de 252,00€, a qual consideram ser devida.
27. Através de carta registada com aviso de recepção datada de 28-12-2018, enviada por C..., ACE aos Réus, a primeira comunicou o seguinte:
«Acusamos a receção da carta subscrita por GG e DD, Advogados, em representação de V. Exas., continuando, no entanto, sem demonstrar os poderes suficientes para tal.
Reiteramos o conteúdo da nossa anterior missiva, quer quanto à legitimidade do senhorio, quer quanto aos atos praticados no âmbito do processo de transição do arrendamento para o NRAU e atualização de renda.
Não sendo colocada nenhuma questão superveniente e tendo sido prestados todos os esclarecimentos às questões suscitadas, têm V. Exas o direito de resolver o contrato de arrendamento, caso não pretendam proceder ao pagamento da renda atualizada.
Apesar disso, e sem prejuízo do processo de atualização extraordinária de rendas que conduziu à fixação da renda atual, os princípios e valores mutualistas pelos quais se rege o A..., e no respeito do princípio da igualdade de tratamento entre Associados, sempre reclamam uma análise muito cuidada de eventuais dificuldades económicas que os nossos Associados arrendatários possam enfrentar em virtude do referido aumento, pelo que poderá o processo vir a ser reanalisado.»
28. Através de carta registada com aviso de recepção enviada pelos Réus ao C..., ACE em 10-01-2019, escreveu-se:
«Vimos pela presente em representação dos n. constituintes Ex Senhor AA a Esposa, residentes na Rua ..., ..., ... Guarda conforme procuração já junta, comunicar que os n. constituintes se encontram totalmente disponíveis para analisar eventuais propostas que V. Ex.ªs formulem na sequência da reanalise do processo a que referem na comunicação a que ora respondemos.
De facto, há o maior interesse em renegociar o valor da renda proposta por V. Ex.ªs, conforme telefonemas que os n. constituintes receberam da v. colaboradora Dra HH, estando disponíveis para ponderarem a aceitação de um valor de renda mensal que ronde os 275.00€, valor este adequado, porque proporcional, à disponibilidade económica do casal formado pelos n. constituintes e compatível com o estado em que se encontra locado, bem como com as rendas praticadas em idênticas condições na Guarda.»
29. Através de carta registada com aviso de recepção datada de 04-02-2019, C..., ACE comunicou aos Réus o seguinte:
«Acusamos a receção da carta subscrita por GG e DD, Advogados, em representação de V. Exas., continuando, no entanto, sem demonstrar os poderes suficientes para tal.
A eventual proposta que possamos fazer no âmbito da reanálise do processo, terá, naturalmente, de ser consubstanciada em situações excecionais devidamente comprovadas por V. Exas., o que até ao momento não aconteceu.
Sem prejuízo dessa comprovação, de que não podemos prescindir, certo é que ponderamos equacionar uma bonificação temporária na renda de V. Exas., tendo em conta uma análise muito cuidada de eventuais dificuldades económicas que possam enfrentar em virtude do processo atualização extraordinária de rendas que conduziu à fixação da renda em 418,12€, mas o valor daquela bonificação, no respeito do princípio da igualdade de tratamento entre Associados, terá sempre por base argumentos que possam ser comprovados.
Ficamos, assim, a aguardar o envio de documentos ou outros elementos que justifiquem a excecionalidade da situação.»
30. Através de carta registada com aviso de recepção datada de 04-04-2019, a Autora comunicou aos Réus o seguinte:
«O A... (A...) tem como missão a proteção dos riscos sociais dos seus associados através da concessão de benefícios de segurança social e de saúde. Para tal, tem o dever de rentabilizar o seu ativo, como única forma de manter e alargar todas essas ações de cariz social, no que se enquadra o procedimento de atualização de rendas e de transição para o Novo Regime de Arrendamento Urbano em referência.
Apesar disso, e sem prejuízo do processo de atualização extraordinária de rendas que conduziu à fixação da renda atual, os princípios e valores mutualistas pelos quais se rege o A..., e no respeito do princípio da igualdade de tratamento entre Associados, sempre reclamam uma análise muito cuidada de eventuais dificuldades económicas que os nossos arrendatários, que fossem associados à data do início do referido processo de atualização, possam enfrentar em virtude do referido aumento.
Neste contexto, e tendo igualmente em consideração as dificuldades económicas invocadas por V. Exa concedemos a V. Exuma bonificação excecional temporária do valor da renda até 31.12.2019, passando do valor de € 418,12 para € 275,00 com efeitos a 01 de janeiro de 2019.
Findo o período indicado, esta bonificação caducará automaticamente, sem necessidade de qualquer notificação, pelo que, sem prejuízo da eventual reavaliação do seu processo pelo A..., findo este prazo V. Ex.ª deverá proceder ao pagamento da renda devida sem qualquer bonificação.
Saliente-se que esta bonificação é concedida a título extraordinário e temporário, a proposta que agora lhe apresentamos não constituindo uma renúncia aos direitos que, para o A..., resultam do contrato de arrendamento e da estrita aplicação da lei em matéria de atualização extraordinária de rendas e de transição de contratos de arrendamento antigos para o Novo Regime de Arrendamento Urbano.»
31. Através de carta registada datada de 29-07-2019, o Réu remeteu à Autora a seguinte comunicação:
«A carta de V. Exas. por nós recebida em 11-06-2019 não careceria de outra resposta, pois tudo já fora clarificado quanto à posição que se mantinha nas cartas anteriormente escritas, em que de forma clara e inequívoca, para além da disponibilidade orçamental que não suporta o novo valor excessivo e muito superiores aos praticados na Guarda para uma casa de 50 anos sem qualquer conservação, manutenção ou melhoria anterior, feita pelo senhorio, oferece imensas dúvidas na aplicação de um imposto de 25% s/ os impostos do agregado 25 s/o subsídio de natal um subsídio específico com fins e objectivos próprios e um orçamento independente e adequado ao seu destino o mesmo se dirá do subsídio de férias e muito mais (25% do que se recebe e não se recebe e 25 + (25 de tudo o que se gaste normalmente (energia, água, etc. e muito mais). Porém, considerando o primeiro período da referida carta, onde dizem “para que não restem mais dúvidas” onde não esclarece dúvidas e nega as certezas comprovadas e documentadas validando apenas as suas concluímos: para o A... confirma-se também a carta ref.ª dep 132/2018 recebida em 15-03-2018.
Até esta data nunca existiu qualquer acordo, contracto ou documento válido para além do contracto de arrendamento de 1971 que, nesta data, anunciam o procedimento “início” de transição para o novo Regime. Confirmam reconfirmam e garantem assim a validade única e vigor desde Maio de 1971 do referido contracto e o início da sua transição sublinho início em 2018. Vigor e validade confirmado do anterior de Maio de 1971 até 2019. Anula assim e/ou considera sem efeito ou ilegal tudo quando feito fora do permitido no mesmo cuja última alteração legal está patente na carta registada com aviso de receção ref. Ap/233-96-030074-4/003, de 22-01-2007, que actualiza a renda de acordo com a lei e a portaria anual que fixa o limite do aumento (1,03100) fixando desde 03/2007 referente a Março a renda em 72,00€. Pese embora a possibilidade de continuar aplicando anualmente a Portaria e o aumento que a mesma fixa certo que não o fazendo tudo o que foi pago e ultrapassa a renda de 72,00€ mês paga desde Março de 2007 até ao momento em que se comprove legalmente a transição e as condições agora ”iniciadas”, sacado da conta sem fundamento que o A... justifique ou aceite como comprovado foi abusivo, ilegal, indevido, sem base, sendo o inquilino credor de todos os valores. O contracto de 1971 passou na segunda à ponte geral (na primeira foi recusada a venda) em 2000 e segundo o A... “não restam mais dúvidas como diz em vigor com as garantias da acta da A. Geral e as condições garantidas no contrato de venda sem as quais não haveria venda. Negando as alterações, as transições e outros contratos e valores intermédios, o A... claramente confirma o recebimento indevido, ilegal e injustificado de todos os valores que prejudiquem o vigor do que agora pretendem “iniciar” uma transição para um novo regime do contrato de 1971 (!) e para iniciar é preciso voltar ao início e devolver os milhares de euros que dizem não deviam ter cobrado, pois negam ou recusam qualquer alteração ou transição do contrato, inexistindo e garantindo a sua validade actual e cuja transição iniciam agora.
Assim sendo […] aguardamos que o assunto seja decidido por quem de direito pois vamos recorrer a todas as estancias legais e não só para garantir os nossos direitos de associados e inquilinos, como defendemos na A. Geral, onde os mesmos ficaram obrigatoriamente registados no contrato de venda, onde as casas por preço que já pagamos por inúmeras vezes só não ficaram dos inquilinos (por direito de opção) por não serem na altura propriedade horizontal. […]
Não tendo o A... dúvidas sobre a validade do contrato de 1971 até 2018, data em que se valem da sua antiguidade, e dizem “iniciar” a transição para outro regime, confirmando essa validade e vigor o mesmo contrato com a aplicação das normas e leis em vigor e considerando as diversas portarias incluindo para 2019 (os coeficientes declarados) estaria neste momento que pretendem iniciar a transição numa renda mensal que não atingiria os 90,00,€ tudo o cobrado para além da actualização de 22-01-2007 ref. ap/233-96-030074-4/003 que fixa a renda de € 72,00 (não houve mais nenhuma actualização deste contracto por não haver comunicação dessa aplicação, ilegal e abusiva por como insistem e não tem dúvidas é esse o contrato válido e em vigor em 2018 quando comunicam e confirmam a validade do mesmo e dizem “iniciar” a sua transição.
Aliás, os valores retirados posteriormente da conta foram contestados e considerados abusivos e confirmam agora com a garantia de validade desde Maio de 1971 ser legítima a devolução e tais valores. Só após a reposição da validade desse contrato de 1971 repondo os valores indevida e ilegalmente recebidos, para confirmar o vigor poderão “iniciar” a transição anunciada que só aceitarei quando judicialmente confirmado. Assim mesmo a partir do cumprimento do que os tribunais determinem com justiça jamais continuaria a habitar uma casa com 50 anos onde nunca efectuaram (no interior) a mínima actualização e/ou manutenção e só possui as condições mínimas de habitabilidade graças ao esforço e cuidados mantidos pelos locatários. O valor da renda ora pretendido não se pratica na Guarda e ainda hoje mesmo RTP confirmou que tal valor é quase o triplo do valor médio de uma renda na Guarda para uma habitação recuperada e aprovada como reunindo condições que esta não tem (luzes na escada, estuque dos tectos dos mesmos solto e a CAIR) além do interior onde chove, paredes pretas com humidade e bolor aberturas (fissuras) bem visíveis de vários metros estores que não funcionam (alguns já substituídos) tacos levantados por infiltrações, de água que todos os anos são recolocados, canalizações que se não substituídas não permitem a pressão da água necessária para disparar os aparelhos para um banho quente etc etc etc pese a valorização atribuída já que não pagando impostos o A... procura e não se importa com o valor atribuído. Solicitamos pois que o A... diligencie com a possível brevidade para que as vias legais estabeleçam, o que for de justiça e de direito para os inquilinos de 48 anos e sócios de mais de 120 (2 associados) decidam onde e como vão passar o resto das longas vidas (+ 166 anos, considerando que o A... assim o entende e pretende de uma forma que não consideramos justa, humana e acreditando mesmo que coberta por ilegalidades, o que procuraremos confirmar com as indicações e certezas que o A... se procura escudar, excluindo e anulando respostas e argumentos que por falta de disponibilidade que as condições de saúde e idade motivam e cujos dados não considerados favorecem o sistema que o A... pretende impor.
Lamentamos e procuraremos por todos os meios (legais e não só) defender os nossos direitos e razões, nos locais adequados e em todas as estâncias que a lei faculta.»
32. Através de carta registada datada de 29-01-2020, o Réu procedeu à remessa a C... das facturas/recibo de renda n.º 380/2020, de Janeiro de 2020 e referente ao mês de Fevereiro de 2020, e comunicou-lhe o seguinte, entre outros:
«(…) Pese embora o facto incompreensível de não reconhecerem as pessoas que a m/pedido e por questões de indisponibilidade e falta de condições de saúde foram por mim indigitadas para actuar em m/ nome na defesa dos meus direitos não anulei nem contrariei essa oferta de aumento razão porque o valor disponível para o A... na conta própria para pagamento de quotas e rendas para Janº e Fevº é de 275,00€ mês/renda (já depositados). Estes valores não significam acordo com os excessivos aumentos que julgo ilegais, até prova oficial em contrário e só judicialmente como digo na anterior carta aceitarei o pagamento do valor imposto c/ legal argumento (…)”
33. A Autora remeteu notificação Judicial Avulsa ao Réus, que a receberam em 23/09/2021, no âmbito da qual a primeira comunicava aos últimos que os mesmos não haviam pago as rendas referentes aos meses de Fevereiro de 2019 a Julho de 2121 nem nos oito dias seguintes a contar da data de começo da mora, nem posteriormente, declarando resolvido o contrato de arrendamento identificado em 2.
34. Na sequência da notificação judicial avulsa enviada pela Autora aos Réus, estes últimos enviaram carta à primeira com, entre outro, o seguinte teor:
«Tendo sido notificados no passado dia 23/09/2021 da Notificação Judicial Avulsa em que é Requerente o A..., I.P.S.S. e tendo presente o que é alegado na mesma vimos expor e comunicar o seguinte.
Resulta da Notificação Judicial Avulsa que não foram pagas as rendas a partir de Fevereiro de 2019 referentes à fração predial de que somos arrendatários e que corresponde ao 3º andar, fração autónoma “D” do prédio urbano sito na Rua ..., ....
Conforme já transmitido anteriormente, quer através de nossas comunicações, quer dos n. mandatários, não foi, por nós, aceite a transição do contrato que tentaram fazer em 2018 para o NRAU, uma vez que a mesma já ocorreu em 2007, no âmbito do processo v. Ref.ª 233-96-030074-4/3. De facto, entendemos que o contrato de arrendamento em causa transitou, já, em 2007 para o NRAU, pelo que a transição que tentaram efetuar não tem cabimento legal, não sendo devido o montante de renda peticionado.
Por não termos concordado com tal transição e muito menos por considerarmos injustificado o aumento de renda de 252,00€ para 418,12€ procedemos à devolução da fatura/recibo da Renda nº 4987/2018A de Novembro de 2018.
Cumpre registar que sempre procedemos ao depósito do valor das rendas que consideramos serem devidas, no montante de 275,00€ junto da nossa conta bancária no A... (tudo conforme decorre do extrato bancário que juntamos), como sempre fizemos durante mais de 50 anos de contrato de arrendamento, para que o A..., como sempre fez, debitasse o valor da renda.
A verdade é que desde 2019 e até à presente data o A... nada mais nos comunicou, e, surpreendentemente, fomos notificados do teor da Notificação Judicial Avulsa.
Salvo o devido respeito, consideramos que não se encontram reunidos os pressupostos legais que permitam a resolução que o A... pretende operar através da Notificação Judicial Avulsa, nos termos do disposto no artº 1083º/1 e 3 do CC.
Por assim ser, vimos pelo presente comunicar respeitosamente que, por não aceitarmos a resolução que o A... pretende efetuar através da Notificação Judicial Avulsa, não iremos proceder à entrega do locado livre de pessoas e bens e não iremos, por essas mesmas razões, proceder ao pagamento da indemnização de 50% peticionada, no valor de 16.453,92€.
Sem prescindir, nem conceder, sempre se dirá que, não obstante o teor da comunicação do A... de 04/04/2019 sempre foi por nós transmitido ao A... que, não se aceitava o valor da renda de 418,12€.”
35. A Autora enviou aos Réus, com data de 20-11-2021, ofício com o seguinte teor:
«Na qualidade de proprietário o A..., vem comunicar, nos termos do(s) artigo(s) 24.º e 25.º da Lei n.º 06/2006 de 27 de Fevereiro, a actualização da renda referente a:
Prédio: Rua ..., ..., em GUARDA
Fracção: II, 37-3º
A partir do dia 01 de janeiro de 2022, o montante da renda mensal referente ao mês de janeiro de 2022, anteriormente em vigor de 0.00 EUR (Zero Euros), passa para 0.00 EUR (Zero Euros). Ao valor da renda acrescerá IVA à taxa legal em vigor, se assim estiver estipulado no Contrato de Arrendamento Urbano, de acordo com o nº 24º do Novo Regime do Arrendamento Urbano, até nova actualização.
O coeficiente de actualização utilizado foi de 1.0000, conforme estipulado no Aviso do INE 17989 de 13 de setembro, publicado no DR nº 186, 2ª série, de 23 de setembro de 2021.”
36. Através de carta datada de 20-11-2021, onde consta a menção “anula e substitua a carta anteriormente enviada”, a Autora remeteu ao Réu a seguinte comunicação:
«A partir do dia 1 de janeiro de 2022, o montante da renda mensal referente ao mês de janeiro de 2022, anteriormente em vigor de 418,12€ (quatrocentos e dezoito Euros e doze cêntimos) passa para 419,92€ (quatrocentos e dezanove Euros e noventa e dois cêntimos)».
37. Através de carta datada de 21-12-2021, os Réus remeteram à Autora o seguinte texto:
«Serve apresente para responder à v. carta de 2021-11-20, por nós recebida na passada semana, na qual V. Exªs. nos comunicam que a partir de 1 de Janeiro de 2022 o montante da renda mensal, (da fração predial de que somos arrendatários e que corresponde ao 3º andar, fração autónoma “D” do prédio urbano sito na Rua ..., ...) referente ao mês de janeiro de 2022 , “(…)anteriormente em vigor de 418,12€ passa para 419,92€, (…)” mediante a aplicação do coeficiente de atualização de 1,0043, conforme estipulado no Aviso do INE n.º 17989 de 13 de Setembro, publicado no DR n.º 186, 2ª Série, de 23 de setembro de 2021.
Como decorre da anterior correspondência que enviámos a V. Exªs., e ao v. Ilustre mandatário Senhor Dr. JJ (em 14-10-2021), quanto ao montante devido da renda em questão, não aceitámos, como continuamos a não aceitar, a fixação da renda em 418,12€ razão pela qual, aliás, procedemos à devolução da fatura/recibo da Renda nº 4987/2018A de Novembro de 2018.
Cumpre registar que sempre procedemos ao depósito do valor das rendas que consideramos serem devidas, no montante de 275,00€ junto da nossa conta bancária no A... (tudo conforme decorre do extrato bancário que juntámos à n. carta de 14-10-2021), como sempre fizemos durante mais de 50 anos de contrato de arrendamento, para que o A..., como sempre fez, debitasse o valor da renda.
Pelas razões aduzidas não aceitamos que a atualização da renda devendo manter-se o valor mensal da renda no montante de 275,00€.
Aliás a haver atualização de renda por aplicação do coeficiente de atualização de 1,0043 essa atualização deve incidir sobre o valor de 275,00€ e não sobre o valor de 418,12€ que é indevido, pelas razões por nós sempre aduzidas e invocadas.”
38. Através de carta datada de 13-01-2022, os Réus remeteram ao C..., ACE a factura/recibo de renda n.º 2808/2021A, de Dezembro de 2021 e a factura/recibo de renda n.º 320/2022ª, de Janeiro de 2022, com o seguinte teor:
“Reiteramos a posição já manifestada nas n. anteriores comunicações relativas ao assunto dos n. constituintes, Exmº Senhor AA e Esposa, residentes na Rua ..., ..., ... Guarda, designadamente que não se aceita a transição do contrato que pretendem fazer para o NRAU, remetendo para tudo quanto a esse respeito deixámos exposto nas n. anteriores comunicações e, bem assim, nas comunicações dos n. constituintes.
Por não se concordar com tal transição e por se considerar injustificado o aumento de renda de 252,00€ para 418,12€ procede-se à devolução da Fatura/Recibo de Renda nº 2808/2021A de Dezembro de 2021, no valor de 418,12€ e da Fatura/Recibo de Renda nº 320/2022A de Janeiro de 2022, no valor de 419,92€, por não serem devidos tais montantes e, consequentemente, não poderem aceitar as referidas faturas/recibos. Registamos, no entanto, que, segundo resulta das faturas/recibo cuja devolução efetivamos, a quantia de 418,12€ iria ser debitada em 02/12/2021 e a quantia de 419,92€ iria ser debitada em 03/01/2022, o que até à data ainda não sucedeu. No entanto, caso tais débitos venham, efectivamente, a ocorrer reiteramos o já exposto no n, comunicação de 08/11/2018 no que diz respeito á reação dos n. constitiuintes caso lhes sejam debitadas quaisquer quantias em conta para além do montante de renda de 252,00 €, a qual consideram ser devida.”
39. Pelo menos desde início de 2019 os Réus têm depositado mensalmente, na conta com o n.º 053.10.013684-4, montante nunca inferior a € 275,00 nem superior a € 300,00 para efeitos de pagamento de renda.
40. A Autora detém autorização de saque da conta id. em 39. para levantamento de renda mensal de valor de pelo menos € 275,00.
41. A 09-04-2019 a Autora debitou da conta n.º 053.10.013684-4 a quantia de € 275,00.
42. A Autora não debitou da conta n.º 053.10.013684-4 qualquer quantia desde 10 de Abril de 2019.
43. As cartas referidas em 19, 21, 22, 24, 27, 29. foram subscritas por FF do Departamento de Gestão Patrimonial de C..., ACE, com o NIPC ...38, entidade cujo objecto é a gestão de imóveis próprios ou de terceiros, podendo ainda fazer contratos de compra e venda, arrendamento, e tudo o que necessário for para a gestão corrente dos referidos imóveis.
44. Através de documento denominado “Procuração” datado de 25 de Novembro de 2015, a Autora concedeu a FF os seguintes poderes: “para, com os de substabelecer, isoladamente e per si, os necessários poderes para representar a "Instituição" nos seguintes actos e contratos em que a Associação Mutualista seja interveniente ou participante, estipulando as cláusulas e demais condições que entender por convenientes: escrituras de compra e venda, contratos-promessa de compra e venda, contratos de arrendamento e promessas de arrendamento, trespasses, cessões de posição contratual de quaisquer contratos, permutas ou promessas de permuta, contratos de comodato e promessas de comodato, que tenham por objecto quaisquer bens imóveis ou fracções autónomas, podendo outorgar os respectivos contratos, qualquer que seja a forma para que os mesmos venham a ser celebrados, ficando ainda autorizados a praticar, requerer e assinar tudo o que para aqueles efeitos se torne necessário.
Mais dão ainda ao mandatário os necessários poderes para, em nome da "Instituição" que representam: a) levantar rendas de depósito obrigatório depositadas a favor da Instituição junto da Caixa Geral de Depósitos ou outra Instituição de Crédito; b) representar a "Instituição" em leilões de imóveis de qualquer natureza, assembleias de condóminos e, bem assim, no exercício do cargo de administradores do condomínio, de quaisquer imóveis ou fracções autónomas de que a "Instituição" seja proprietária; c) outorgar escrituras de constituição e alteração de propriedade horizontal de quaisquer imóveis ou fracções autónomas de que a "Instituição" seja proprietária; d) tomar posse judicial ou extrajudicial de bens móveis ou imóveis; e) celebrar e proceder à denúncia ou resolução de contratos de mediação imobiliária; f) representar a "Instituição" em juízo e fora dele, comprometer-se em árbitros, confessar, desistir ou transigir em qualquer processo judicial ou arbitral, sendo obrigado, neste caso, a substabelecer em advogado, por uma ou mais vezes; e, g) representar a "Instituição" junto de quaisquer organismos públicos, nomeadamente, mas não limitado, Conservatórias de Registo Predial, Serviços de Finanças, Câmaras Municipais, Tribunais, Serviços Municipalizados, EDP, Portugal Telecom e outros organismos públicos, requerendo quaisquer actos de registo, provisórios ou definitivos, ou outros incluindo averbamentos, cancelamento de registo que não devam subsistir por qualquer motivo, e prestar declarações complementares, praticando e assinando tudo o mais que seja necessário para os indicados fins”.
Factos julgados não provados na sentença recorrida:
I. A Autora não debitou da conta n.º 053.10.013684-4 o valor de € 275,00 nos meses de Fevereiro, Março ou Abril de 2019.
II. O montante autorizado pelos Réus para débito na conta n.º 053.10.013684-4 por parte da Autora era inferior a € 275,00.
B) De Direito
Dos poderes de representação
Através de documento denominado “Procuração” datado de 25 de Novembro de 2015, a Autora concedeu a FF os seguintes poderes: “para, com os de substabelecer, isoladamente e per si, os necessários poderes para representar a "Instituição" nos seguintes actos e contratos em que a Associação Mutualista seja interveniente ou participante, estipulando as cláusulas e demais condições que entender por convenientes: escrituras de compra e venda, contratos-promessa de compra e venda, contratos de arrendamento e promessas de arrendamento, trespasses, cessões de posição contratual de quaisquer contratos, permutas ou promessas de permuta, contratos de comodato e promessas de comodato, que tenham por objecto quaisquer bens imóveis ou fracções autónomas, podendo outorgar os respectivos contratos, qualquer que seja a forma para que os mesmos venham a ser celebrados, ficando ainda autorizados a praticar, requerer e assinar tudo o que para aqueles efeitos se torne necessário.
Mais dão ainda ao mandatário os necessários poderes para, em nome da "Instituição" que representam: a) levantar rendas de depósito obrigatório depositadas a favor da Instituição junto da Caixa Geral de Depósitos ou outra Instituição de Crédito; b) representar a "Instituição" em leilões de imóveis de qualquer natureza, assembleias de condóminos e, bem assim, no exercício do cargo de administradores do condomínio, de quaisquer imóveis ou fracções autónomas de que a "Instituição" seja proprietária; c) outorgar escrituras de constituição e alteração de propriedade horizontal de quaisquer imóveis ou fracções autónomas de que a "Instituição" seja proprietária; d) tomar posse judicial ou extrajudicial de bens móveis ou imóveis; e) celebrar e proceder à denúncia ou resolução de contratos de mediação imobiliária; f) representar a "Instituição" em juízo e fora dele, comprometer-se em árbitros, confessar, desistir ou transigir em qualquer processo judicial ou arbitral, sendo obrigado, neste caso, a substabelecer em advogado, por uma ou mais vezes; e, g) representar a "Instituição" junto de quaisquer organismos públicos, nomeadamente, mas não limitado, Conservatórias de Registo Predial, Serviços de Finanças, Câmaras Municipais, Tribunais, Serviços Municipalizados, EDP, Portugal Telecom e outros organismos públicos, requerendo quaisquer actos de registo, provisórios ou definitivos, ou outros incluindo averbamentos, cancelamento de registo que não devam subsistir por qualquer motivo, e prestar declarações complementares, praticando e assinando tudo o mais que seja necessário para os indicados fins”. (sublinhado nosso)
Entendeu o Tribunal a quo que de tal procuração não resulta a existência de poderes de representação da Autora para efeito de comunicação previstas no Novo Regime do Arrendamento Urbano.
Dispõe o artº 262º, do Código Civil, que:
1. Diz-se procuração o acto pelo qual alguém atribui a outrem, voluntariamente, poderes representativos.
2. Salvo disposição legal em contrário, a procuração revestirá a forma exigida para o negócio que o procurador deva realizar.
Por seu turno, dispõe o artº 9º, nº 1, do Novo Regime do Arrendamento Urbano, que Salvo disposição da lei em contrário, as comunicações legalmente exigíveis entre as partes relativas a cessação do contrato de arrendamento, atualização da renda e obras são realizadas mediante escrito assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de receção.
Daqui resulta que os poderes de representação do senhorio para proceder às comunicações previstas neste diploma, teriam de ser concedidos por forma escrita.
E dispõe o artº 238º, do Código Civil, aplicável à procuração, que:
1. Nos negócios formais não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso.
2. Esse sentido pode, todavia, valer, se corresponder à vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio se não opuserem a essa validade. (sublinhado nosso)
Esta norma opera um desvio relativamente ao disposto no artº 236º, do mesmo diploma, no sentido da sua maior objetividade, mas sempre sem esquecer as razões determinantes da exigência de forma.
Como nos diz Manuel Pita, em anotação ao artº 238º, “Código Civil anotado”, Ana Prata e outros, volume I, 2ª edição, Almedina, 2024, pág. 325:
As razões determinantes da forma podem ser relativas às partes, nomeadamente maior reflexão e ponderação de interesses, mas na maioria dos casos estão
associadas a interesses de terceiros e ao interesse público, a razões de segurança
e certeza do tráfego, que exigem documentos claros, nomeadamente para dar
publicidade às situações jurídicas criadas, o que é incompatível com sentidos
ocultos na vontade das partes. (sublinhado nosso)
Ora, no caso em apreço, resulta claro que FF tinha poderes para outorgar, em nome da autora, contratos de arrendamento relativamente a todos os seus imóveis, estipulando as cláusulas e demais condições que entendesse por convenientes.
Assim, verificamos que o mandatário tinha os mais amplos poderes, que iam muito para além das comunicações previstas no Novo Regime do Arrendamento Urbano, pelo que, ainda que imperfeitamente expresso, não podemos deixar de concluir que também estas estavam ainda abrangidas no âmbito da procuração conferida.
Na verdade, as comunicações a efetuar no âmbito do Novo Regime do Arrendamento Urbano mais não são do que uma forma de atualização das cláusulas dos contratos de arrendamento, sendo que que FF tem autonomia, tem poderes que lhe foram concedidos pela Recorrente, para as fixar como entender.
Num caso de algum modo idêntico, veja-se acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no processo nº 1376/18.9T8PBL-A.C1, disponível em www.dgsi.pt, onde se diz:
I – Constituindo a procuração um negócio jurídico formal, deve observar-se na sua interpretação a regra especial do art. 238º, nº 1, do C.Civil, o que significa que não pode prevalecer, na interpretação desse acto, um sentido que não tenha um mínimo de correspondência com o seu texto..
II – O desconto bancário, paradigmático do contrato de crédito, na prática portuguesa tende a ser assimilado a um mútuo especial.
III – A expressão “contrair qualquer empréstimo ou crédito” aposta na procuração, mesmo na esfera do conhecimento de um leigo, é tão esclarecedora quanto ao limite dos poderes de representação conferidos (cf. art. 262º, nº 1 do C.Civil), mormente quando complementada com “assinando tudo quanto se torne necessário ao bom desempenho do presente mandato”, que não se vislumbra como se pode entender que in casu, o representante tenha agido em abuso de representação.
IV – Assim, nos poderes conferidos ao procurador, mormente ao permitir “contrair qualquer empréstimo ou crédito”, enquanto formulação genérica, inclui-se o de assinar o contrato de desconto bancário.
Por outro lado, há ainda que ter em conta que a exigência de forma visa, em primeiro lugar, a proteção do representado – o que aqui não está em causa porque a atuação de FF correspondeu à vontade da Recorrente -, mas também, como muito bem se diz na decisão recorrida, provém da necessidade de proteção do arrendatário, geralmente a parte mais fraca, especialmente nestes casos de arrendamentos muito antigas, em que os arrendatários são necessariamente pessoas de idade mais avançada.
Contudo, FF manifestava a verdadeira vontade do proprietário e estes arrendatários em concreto, como decorre das suas missivas transcritas na factualidade dada como provada, não deixaram de pagar as rendas por duvidarem da legitimidade do interlocutor, tendo inclusivamente, para além do mais, reclamado da existência de defeitos no locado, apelado à sua bondade e requerido benevolência na fixação das rendas e avisado o interlocutor quanto a uma possível denúncia do contrato; ora, sabiam bem ter como interlocutor o real representante da vontade do proprietário do imóvel arrendado.
Os arrendatários deixaram sim de efetuar o pagamento das rendas por fazerem diferente interpretação da lei, defendendo não serem devidas nos termos que lhes estavam a ser exigidas pelo proprietário do imóvel.
Deste modo, não podemos deixar de concluir pela existência de poderes de representação e pela procedência do recurso.
Do abuso de direito
Dispõe o artº 334º, do Código Civil, que É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.
Mesmo que se entendesse inexistirem poderes de representação, também por estava via não seria invocável tal eventual vício de forma, por abuso de direito, na vertente de inalegabilidade formal.
Como nos diz António Menezes Cordeiro, “Tratado de Direito Civil” V, 3ª edição, Almedina, 2021, págs. 333 e 334:
O Direito requer, contudo, em sectores delimitados, formas específicas, normalmente solenes, para a dimanação de declarações negociais. Quando a forma prescrita não seja assumida nas declarações das partes, o Direito nega-lhe, salvo exceções, o reconhecimento jurídico, cominando a nulidade. Não obstante as apregoa das justificações da forma legal, quando prescrita - a reflexão das partes, a facilidade de prova e a publicidade - ao seu desrespeito não concita, nos níveis ético, psicológico e social, a reprovação enérgica que o Direito lhe conecta. As mesmas razões extrajurídicas que se viu militarem no sentido da proibição de venire contra factum proprium incitam, na sociedade, ao cumprimento dos negócios livremente celebrados, ainda que sem observância da forma legal. A desconsideração comum pelos valores jurídicos associados à forma é agravada pelo arcaísmo dos regimes modernos: oneram-se atos de relevo social e económico em regressão, enquanto outros, da maior importância, se mantêm consensuais. Conserva-se, por fim, viva a ideia de que todo o progresso jurídico tem operado contra o formalismo e na busca de verdadeiras soluções materiais.
Pode, pois, falar-se de pressão sobre o dispositivo legal que prescreve as nulidades formais. (sublinhado nosso)
Ulteriores termos do processo
Sendo julgado procedente o recurso, devem os autos regressar à primeira instância, para que elabore novo despacho saneador, de modo a decidir o demais que se encontra em causa nos presentes autos, realizando-se julgamento se necessário.
Aliás, sem realizar julgamento, o Tribunal a quo respondeu quanto aos factos não provados, dando-lhes relevância jurídica (o que não nos parece ser a atuação que mais se coaduna com o disposto no artº 595º, nº 1, al. b), do Código de Processo Civil[1]): quedou como não demonstrado que a Autora não tivesse forma de retirar tais verbas ou a existência de qualquer específico impedimento – pelo menos até ao limite de € 275,00 - da conta bancária destinada ao pagamento de rendas; aliás, quedou demonstrado que os Réus dispunham na conta bancária de onde deveria ser realizado o débito por parte da Autora de tais quantias, atempadamente ali depositadas, pelo que nesse conspecto temporal não sobreveio mora dos Réus mas sim da Autora, enquanto credora.
Como ensina António Santos Abrantes Geraldes, “Código de Processo Civil anotado”, Vol. I, 2ª edição, Almedina, 2021, pág. 721:
9. O juiz deve ainda conhecer do pedido ou dos pedidos formulados, sempre
que não exista matéria controvertida suscetível de justificar a elaboração de temas
da prova e a realização da audiência final. A antecipação do conhecimento de mé-
rito pressupõe que, independentemente de estar em jogo matéria de direito ou de
facto, o estado do processo possibilite tal decisão, sem necessidade de mais provas,
e independentemente de a mesma favorecer uma ou outra das partes. (sublinhado nosso)
IV - Decisão
Nestes termos, acordam os Juízes Desembargadores da 3ª Secção deste Tribunal da Relação em julgar procedente o recurso, revogando a decisão recorrida, devendo o Tribunal a quo elaborar novo despacho saneador, de modo a decidir o demais que se encontra em causa nos presentes autos, realizando-se julgamento se necessário.
Custas pelos apelados – artºs 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº 6 e 663º, nº 2, todos do Código de Processo Civil.
Coimbra, 14 de Janeiro de 2025
Com assinatura digital:
Anabela Marques Ferreira
Hugo Meireles
Luís Manuel Carvalho Ricardo
[1] 1 - O despacho saneador destina-se a: (…) b) Conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos pedidos deduzidos ou de alguma exceção perentória. (sublinhado nosso)