ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
RECURSO DE REVISTA
CONTRADIÇÃO DE JULGADOS
QUESTÃO FUNDAMENTAL DE DIREITO
REVOGAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
LUCRO CESSANTE
Sumário


I .Verifica-se a contradição que alude a al. d) do nº 2 do artigo 629º do CPC, se no acórdão recorrido se decidiu que - não tendo o autor alegado que não pôde auferir entre a revogação unilateral pela ré de um contrato de prestação de serviços, sem justa causa, e o termo desse contrato, rendimentos equivalentes aos perdidos durante esse período- não há lugar a obrigação de indemnizar e se no acórdão invocado- não tendo a autora alegado que teve despesas durante o período em que o contrato de prestação de serviços vigoraria se não fosse a revogação unilateral pela ré, sem justa causa - se decidiu fixar indemnização segundo a equidade;
II. Num e no outro caso, as situações materiais litigiosas são de um ponto de vista jurídico-normativo equiparáveis: se no primeiro caso o autor não alegou rendimentos que auferiu por não ter de cumprir integralmente o contrato ,e no segundo a autora não alegou as despesas deixou de fazer por não ter de cumprir o mesmo contrato, em ambos os casos está em causa o cálculo dos lucros cessantes segundo a teoria da diferença.

Texto Integral


Revista nº 1491/22.4T8TVD.L1-A.S1

Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça:


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AA intentou contra VESAUTO - AUTOMÓVEIS E REPARAÇÕES, S.A. açcão em que pediu que a Ré fosse condenada a pagar-lhe, a título de indemnização, o montante de € 48.000,00, acrescido de juros desde a citação até integral pagamento.

Alegou, em síntese, que celebrou com a Ré um contrato de prestação de serviços pelo qual se obrigou a realizar serviços de vigilância, com termo em 31 de Dezembro de 2022, no total de 22 meses. Não obstante, em 15 de Julho de 2021, a Ré informou-o de que apenas pretendia os seus serviços até 31 de Agosto de 2021, sofrendo, assim, o A., com a resolução do contrato, um prejuízo no montante líquido de € 48.000,00, correspondente ao remanescente do preço estipulado no contrato.

A Ré contestou.

Após julgamento, foi proferida a sentença recorrida que concluiu assim:

"Nos termos e fundamentos expostos, julgo a presente ação improcedente, por não provada e, em consequência, absolvo a R. VESAUTO - AUTOMÓVEIS E REPARAÇÕES, SA do pedido formulado pelo A. AA.

Custas a cargo do A..

Notifique e registe."

Não se conformou o Autor que da sentença interpôs recurso de apelação, o qual foi também julgado improcedente.

O acórdão da Relação conheceu de duas questões suscitadas pelo apelante: a da impugnação da decisão de facto; e a da saber de se ao Autor assistia o direito a ser indemnizado pela Ré devido à "revogação antecipada" e sem justa causa do contrato que celebraram e, na afirmativa, qual o valor da indemnização devida, sustentando o apelante que tinha direito a lucros cessantes correspondentes ao valor que tinha deixado de receber por força do contrato se este não tivesse sido revogado.

A impugnação de facto foi julgada apenas parcialmente procedente.

Assim, ao facto dado como provado de que “O acordo referido em 2. regulava-se pelas cláusulas constantes do "Caderno de Encargos Serviço de Vigilância - Rondas Grupo JAP 2021/2022", cujo teor não se apurou” a Relação eliminou a parte final, isto é, a parte onde se escreve "cujo teor não se apurou".

Em relação à segunda questão, verifica-se que a Relação confirmou a sentença.

Assim, entendendo que a quantificação da indemnização por lucros cessantes devia equivaler à diferença entre a situação patrimonial que existia se o contrato tivesse sido integralmente executado e aquela que resultou da diferença e que, por isso, a indemnização não se resumia às retribuições que o A. tinha deixado de auferir, a Relação ponderou que: “Ante os (escassos) factos alegados e provados, não podemos considerar que, por causa da cessação antecipada do contrato, se verificou uma situação danosa para o Autor, sofrendo um efetivo prejuízo, por não ter podido (ou muito provavelmente não vir a poder) auferir um nível rendimentos que atingisse o patamar expetável, isto é, o nível da remuneração que, em termos globais - descontando também as suas despesas - iria obter se o contrato tivesse vigorado pelo prazo previsto.”

Também a sentença tinha entendido que o lucro cessante não correspondia às retribuições que o A. tinha deixado de auferir mas antes aos rendimentos que tinha deixado de auferir calculados de acordo com a teoria da diferença (com dedução de despesas e de receitas obtidas a partir da revogação). E, por isso, concluiu também: ”não tendo sido alegados nem demonstrados prejuízos concretos deve a ré ser absolvida do pedido formulado pelo A. “

Não se conformou, de novo, o autor com o acórdão da Relação tendo dele interposto recurso de revista, sem menção de quaisquer disposições legais no que se refere ao fundamento do recurso.

Rematou o recurso com as seguintes conclusões:

“I. O Douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa contraria o disposto nos artigos 406.º, 564.º e 798.º do Código Civil, bem como a posição da Doutrina e da Jurisprudência nele citadas, fazendo uma interpretação e aplicação contrária ao sentido dos acórdãos nele citados;

II. Entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa, no acórdão de que aqui se recorre, em suma, que a responsabilidade civil, seja contratual, seja extracontratual, não dispensa nunca o pressuposto da existência de dano, sem a qual não há obrigação de indemnizar, e que, no caso em apreço, não se pode considerar que, por causa da cessação antecipada do contrato, se verificou uma situação danosaparao aqui Recorrente, porque, segundo o entendimento desse Tribunal, o mesmo Recorrente não provou que o contrato que celebrou com a Recorrida fosse em regime de exclusividade, fundamentando a sua decisão, quanto à matéria de direito, nos seguintes acórdãos:

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05-02-2015,proferido no âmbito do processo n.º 4747/07.2TVLSB.L1.S1;

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19-11-2020, proferido no âmbito do processo n.º 10608/19.5T8PRT.P1;

Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14-07-2021, no âmbito do processo n.º 181113/10.6YIPRT.E1; e

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21-01-2010, proferido no âmbito do processo n.º 872/06.5TVPRT.P1;

III. A Jurisprudência citada não vai no mesmo sentido da conclusão tecida pelo Tribunal da Relação de Lisboa no Douto Acórdão de que qui se recorre, impondo-se decisão diferente;

IV. In casu, estamos perante um contrato de prestação de serviços, cuja definição se encontra no artigo 1154.º do Código Civil;

V. Segundo o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra proferido no âmbito do processo n.º 926/10.3TVPRT.C1, em 18-11-2014,disponível para consulta em www.dgsi.pt, o contrato por via do qual alguém se obrigaa prestar a outrem determinados serviços (no caso concreto deste acórdão, serviços de arquitectura), mediante retribuição, e do qual não resulta para o prestador dos serviços qualquer outro interesse que não seja o de receber a retribuição, é um contrato de prestação de serviços que, por força do disposto no artigos 1156.º e 1170.º do código Civil é livremente revogável por qualquer das partes, independentemente da existência de justa causa;

VI. Entenderam os Venerandos Desembargadores naquele acórdão, todavia, que, não obstante a sua livre revogabilidade, estando em causa um contrato oneroso que tem como objecto a prestação de determinados serviços, a sua revogação unilateral por parte do contraente a quem se destinam os serviços implica, em princípio, a obrigação de indemnizar a outra parte pelos prejuízos decorrentes da cessação antecipada do contrato;

VII. Segundo o referido acórdão, não haverá, porém, lugar a qualquer indemnização quando exista justa causa para a revogação do contrato e desde que essa justa causa se reconduza a qualquer facto ou circunstância que seja imputável à contraparte;

VIII. A justa causa, enquanto pressuposto da faculdade de revogar o contrato (como acontece na situação previstas artigo 1170.º,n.º2, do Código Civil), há-de corresponder a qualquer facto, situação ou circunstância que torne inexigível, de acordo com as regras da boa-fé, a manutenção da relação contratual e que poderá ser ou não imputável à contraparte;

IX. Todavia, enquanto factor de exclusão da obrigação de indemnizar a cargo da parte que revoga o contrato, apenas releva a justa causa que se reconduza a um comportamento ou actuação da contraparte, de forma a que possa afirmar-se que a revogação do contrato decorreu de uma determinada actuação da contraparte que, segundo as regras da boa-fé, tornava inexigível para a parte revogante a manutenção da relação contratual;

X. No caso em apreço nos presentes autos, o contrato foi revogado pela Ré sem justa causa;

XI. Daquiresultaque,incasu,apesar dalivrerevogabilidade do contrato pela Recorrida, a mesma teria sempre que indemnizar o Recorrente, uma vez que a revogação não assenta em motivo que constitua justa causa;

XII. Aqui chegados, conclui-se que o Recorrente tem direito a ser indemnizado pela Recorrida, pela revogação antecipada do contrato;

Vejamos então em que moldes:

XIII. Segundo o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 19-02-2019, no âmbito do processo n.º 13908/17.5T8LSB.L1-7, disponível para consulta em www.dgsi.pt, “assiste ao prestador de serviços direito a uma indemnização pelos lucros cessantes, respeitantes ao período em que o contrato vigoraria não fosse a revogação unilateral (imprópria), consubstanciados na diferença entre o que o prestador teria recebido no período ainda previsto para a duração do contrato, deduzido do que tenha ganho por não ter de cumprir integralmente o contrato celebrado, designadamente das despesas que faria na execução do contrato até ao seu termo”;

XIV. Sucumbindo factualidade suficiente para calcular os lucros cessantes em tais termos, há que fixar a indemnização segundo a equidade (artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil);

XV. De tal Acórdão não resulta que a obrigação de indemnizar pelos lucros cessantes esteja dependente da verificação de qualquer dano que não seja o próprio lucro cessante, que será o valor que o prestador teria recebido no período ainda previsto para a duração do contrato, que, no caso em apreço, são os €48.000,00 (quarenta e oito mil euros) reclamados, que resultam da diferença entre o que o Recorrente recebeu pela prestação dos serviços e aquilo que teria recebido no período ainda previsto para a duração completa do contrato;

XVI. Esse valor, que consubstancia o lucro cessante, resulta do próprio contrato e das condições negociadas e aceites pelas partes, e que não foram postas em crise nos presentes autos;

XVII. Estádevidamentealegada, fundamentada e demonstrada, nos autos, pelo Recorrente, a dimensão do dano, neste caso, do lucro cessante, baseada, precisamente, na teoria da diferença;

XVIII. O Recorrente deu cumprimento ao artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, mormente nos artigos 15.º, 44.º, 49.º e 55.º da Petição Inicial, alegando, demonstrando, justificando e comprovando a existência do seu direito a ser indemnizado, do prejuízo por si sofrido e da concreta dimensão do mesmo, indicando o valor do lucro cessante – o lucro que deixou de auferir, no valor de €48.000,00 (quarenta e oito mil euros);

XIX.O Autor, aqui Recorrente, deu cumprimento ao ónus de alegar os pressupostos do seu direito à indemnização, nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, alegando os factos que integram o prejuízo;

XX. Nesse sentido vide também o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, proferido em 14-07-2021, no âmbito do processo n.º 181113/10.6YIPRT.E1, e o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de19-11-2020, proferido no âmbito do processo n.º 10608/19.5T8PRT.P1, ambos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt;

XXI. O Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21-01-2010, proferido no âmbito do processo n.º872/06.5TVPRT.P1, citado pelo Tribunal da Relação de Lisboa no Douto Acórdão recorrendo, vai no mesmo sentido, e, com todo o devido respeito, não foi devidamente interpretado pelo Tribunal da Relação de Lisboa;

XXII. Naquele caso concreto, e contrariamente ao que sucedeu no caso dos presentes autos, a Autora não deu cumprimento ao ónus de alegar os pressupostos do seu direitoàindemnização, nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, não alegando os factos que integram o prejuízo, limitando-se a pedir o pagamento de determinada quantia a título de indemnização por danos patrimoniais;

XXIII. O Tribunal da Relação de Lisboa, no caso em discussão nos presentes autos, partiu da interpretação (incorrecta, a nosso ver) daquele acórdão, para concluir que só existiria lucro cessante se o Recorrente tivesse provado que o contrato celebrado com a Recorrida era em regime de exclusividade e que ficou impedido de celebrar outros contratos com outras entidades;

XXIV. Daquele acórdão, e dos demais acórdãos citados pelo Tribunal da Relação de Lisboa no acórdão recorrido, não resulta tal interpretação, de dependência (ou não dependência) da verificação de lucro cessante de um regime de exclusividade na prestação contratual;

XXV. No mesmo sentido vai também a posição do Supremo Tribunal de Justiça, materializada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido em 05-02-2015, no âmbito do processo n.º 4747/07.2TVLSB.L1.S1, disponível para consulta em www.dgsi.pt, que estabelece que a revogação unilateral de um contrato de prestação de serviços oneroso pela parte solicitante constitui-a na obrigação de indemnizar o prestador dos serviços pelos danos provocados, abarcando tanto os danos emergentes como os lucros cessantes(artigo1172.º,alíneac),exviartigo1156.ºdoCódigoCivil);

XXVI. Segundo o mesmo, a quantificação dos lucros cessantes em função das receitas projectadas para o período contratual em falta satisfaz os requisitos da probabilidade e da previsibilidade do dano a que se reportam os artigos 563.º e 564.º, n.º 2, do Código Civil;

XXVII. Também desse Acórdão não resulta que a obrigação de indemnizar pelos lucros cessantes esteja dependente da verificação de qualquer dano que não seja o próprio lucro cessante;

XXVIII. Contrariamente à posição assumida pelo Acórdão de que aqui se recorre, esse Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça não afasta a obrigação de indemnizar os lucros cessantes nas situações em que o lesado ficou disponível para realizar outras actividades, por conta própria ou de outrem;

XXIX. Nenhum acórdão faz depender a obrigação de indemnizar pelos lucros cessantes da existência ou não existência de um regime de exclusividade na prestação da parte lesada, nem da existência de qualquer outro dano que não o próprio lucro cessante, contrariamente ao que entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa no Douto Acórdão de que aqui se recorre;

XXX. A obrigação de indemnizar compreende tanto o dano emergente(damnum emergens) como o lucro cessante (lucrum cessans);

XXXI. Constitui lucro cessante, para efeitos de indemnização fundada em responsabilidade contratual, a diminuição da facturação de uma empresa ou de um prestador de serviços, enquanto consequência adequada da cessação antecipada do contrato de prestação de serviços sem justa causa;

XXXII. Neste caso, a quantificação do acréscimo patrimonial frustrado corresponderá ao valor do que não foi facturado, como poderia ter sido não fosse a cessação antecipada do contrato de prestação de serviços, pela outra parte, sem justa causa, que, no caso concreto, ascende ao valor líquido de €48.000,00 (quarenta e oito mil euros);

XXXIII. A indemnização pelos danos materiais na modalidade lucros cessantes corresponde à frustração da expectativa de um lucro, ou seja, a perda de um ganho esperado, que encontra tutela jurídica no artigo 564.º do Código Civil;

XXXIV. Essa é a posição da doutrina dominante – vide, entre outros, os comentários de Pires de Lima e Antunes Varela ao artigo 564.º do Código Civil, in Código Civil Anotado, Volume I, págs. 579 e 580;

XXXV. Se não fosse a resolução injustificada do contrato de prestação de serviços pela Ré aqui Recorrida, o Autor, aqui recorrente, teria, até ao final do contrato, um ganho de, pelo menos, mais €48.000,00 (quarenta e oito mil euros), ganho esse que se frustrou por causa alheia ao Autor e imputável, única e exclusivamente, à Ré;

XXXVI. O Recorrente, ao celebrar o contrato de prestação de serviços para o período de 22 (vinte e dois) meses, pela quantia mensal de €3.000,00 (três mil euros), tinha uma expectativa, que lhe foi criada pela Recorrida, de auferir um lucro total de €66.000,00 (sessenta e seis mil euros);

XXXVII. Ao fazer cessar o contrato de prestação de serviços antecipadamente, sem justa causa, a Recorrida deu origem a uma frustração dessa expectativa de lucro, sendo, por isso, responsável pelo pagamento, ao Recorrente, do valor que o mesmo perdeu com a antecipação do fim do contrato;

XXXVIII. Os contratos são para cumprir – pacta sunt servanda;

XXXIX. As partes têm, como regra, o direito de fixar livremente o conteúdo dos contratos;

XL. A liberdade contratual é a faculdade de criar um pacto que, uma vez concluído, nega a cada uma das partes a possibilidade de se afastar unilateralmente dele - pacta sunt servanda;

XLI. Os contratos devem ser pontualmente cumpridos e só podem modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei – artigo 406.º do Código Civil;

XLII. O contrato de prestação de serviços em questão, ainda que pudesse ser revogado pela Recorrida, não o poderia ser sem que esta fosse responsabilizada peloslucroscessantes,queoRecorrentedeixoude auferir com a cessação antecipada e sem justa causa do contrato;

XLIII. O Douto Acórdão de que se recorre está em contradição, por fazer uma incorrecta apreciação e aplicação do seu sentido como Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05-02-2015, proferido no âmbito do processo n.º 4747/07.2TVLSB.L1.S1, com o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19-11-2020, proferido no âmbito do processo n.º 10608/19.5T8PRT.P1, com o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14-07-2021, no âmbito do processo n.º 181113/10.6YIPRT.E1, e com o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21-01-2010, proferido no âmbito do processo n.º 872/06.5TVPRT.P1;

XLIV. Contraria também o disposto nos artigos 406.º, 564.º e 798.º do Código Civil, que impõe, no caso concreto,aobrigação de a Recorrida indemnizar o Recorrente pelos lucros cessantes;

XLV.A apreciação do presente recurso de revista é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito e para que seja feita justiça;

XLVI. Deverão ser revogados a Douta Sentença e o Douto Acórdão recorrido e ser proferido Acórdão que condene a Recorrida no pagamento, ao Recorrente, de indemnização no montante líquido de €48.000,00 (quarenta e oito mil euros), acrescida dos juros que se vencerem sobre essa quantia, entre a data da citação e o integral pagamento de todas as quantias em dívida, a calcular em sede de execução de sentença.

Nestes termos e nos melhores de Direito que VV. Exas. Mui Doutamente suprirão, deverá o presente RECURSO ser admitido e julgado totalmente procedente, devendo, em consequência, ser proferido ACÓRDÃO que revogue o acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação e, por consequência, a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, e, assim, condene a Recorrida no pagamento, ao Recorrente, de indemnização no montante líquido de €48.000,00 (quarenta e oito mil euros), a título de lucros cessantes, acrescida dos juros que se vencerem sobre essa quantia, entre a data da citação e o integral pagamento de todas as quantias em dívida, a calcular em sede de execução de sentença, pois só assim, Colendos Conselheiros, farão V. Exas. a COSTUMADA JUSTIÇA”.

Porém, com o fundamento de que o acórdão confirmou a sentença, sem fundamentação essencialmente diferente, de que não foi accionado pelo Autor-recorrente a via do recurso da revista excepcional nos termos previstos no art. 672º do CPC e de que não se está perante um caso em que o recurso seria sempre admissível, a Exma. Relatora da Relação rejeitou o recurso.

Desse despacho veio o Autor recorrente reclamar, com os seguintes fundamentos:

- não se verifica uma conformidade irrestrita e exacta do acórdão da Relação com a decisão da 1ª instância, não sendo as fundamentações totalmente coincidentes: a de facto, porque a Relação alterou o ponto 3 e a de direito porque as citações jurisprudenciais não são inteiramente coincidentes com as da sentença;

- o recorrente invocou nas suas conclusões I, II, XLIII, XLIV e XLV, como fundamento específico do recurso e da recorribilidade, a existência de um conflito jurisprudencial a resolver;

- no caso, o recurso é admissível nos termos do art. 629º, nº 2, al. d) do CPC, uma vez que o acórdão está em contradição com um acórdão do Supremo e três das Relações, que identifica e porque o acórdão da Relação só não admite recurso por motivo estranho à alçada do tribunal, como é o caso da dupla conformidade.

Porém, o relator proferiu decisão singular em que indeferiu a reclamação e confirmou o despacho reclamado que não admitiu o recurso de revista, com a seguinte fundamentação:

“ (…) Em primeiro lugar, o art. 671º, nº 3 do CPC não exige para que se verifique a dupla conformidade, que exista uma total coincidência entre o acórdão da Relação e a decisão da 1ª instância. A circunstância do teor da sentença da 1ª instância e do acórdão recorrido não coincidirem ponto por ponto na sua linha de argumentação não significa que haja qualquer fundamentação diferente, e muito menos fundamentação essencialmente diferente (cfr. Ac. STJ de 1.10.2019, proc. 620/14.6T8LSB.B.L1-A.S1. Basta que a Relação confirme a sentença sem fundamentação essencialmente diferente. E a fundamentação só e essencialmente diferente “quando a solução jurídica do pleito prevalecente na Relação tenha assentado, de modo radicalmente ou profundamente inovatório, em normas, interpretações normativas ou institutos jurídicos perfeitamente diversos e autónomos dos que haviam justificado e fundamentado a decisão proferida na sentença apelada – ou seja, quando tal acórdão se estribe decisivamente no inovatório apelo a um enquadramento jurídico perfeitamente diverso e radicalmente diferenciado daquele em que assentara a sentença proferida em 1ª instância” (Ac. STJ de 9.7.2015, proc. 542/13.8T2AVR.C1.S1). Por outro lado, “a modificação, pelo Tribunal da Relação, da decisão de facto proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, não serve de elemento aferidor da diversidade da fundamentação das duas decisões, sendo, totalmente, irrelevante para esse efeito” (Ac. STJ de 17.5.2018, proc. 3811/13.3TBPRD.P1.S1). Sendo a fundamentação das decisões das instâncias coincidente entre si, está, por isso, afastada a admissibilidade do recurso de revista por força da dupla conformidade de decisões, não relevando, para esse efeito, que a Relação tenha rectificado um ponto da factualidade provada quando tal rectificação nenhum reflexo teve na decisão de direito (art. 671º, n.º 3, do CPC) ( Ac. STJ de 8.3. 2018. proc. 484/14.0T8LRS.L1.S1).

Ora, revertendo ao caso sub judice, verifica-se que, como atrás se anotou, tanto a sentença como o acórdão rejeitaram a ideia de que os lucros cessantes equivalessem simplesmente às retribuições deixadas de auferir, convergindo no entendimento de que esses lucros resultavam da diferença entre o que o A. tinha deixado de auferir e o que tinha auferido na realidade, o que não tinha sido alegado.

Há, assim, inequivocamente, dupla conformidade.

Argumenta, ainda, o recorrente que invocou nas suas conclusões I, II, XLIII, XLIV e XLV das suas alegações, como fundamento específico do recurso e da recorribilidade, a existência de um conflito jurisprudencial a resolver.

Porém, e mau grado a referência à contradição do acórdão com outros acórdãos (conclusão XLIII), a verdade é que o recorrente não indicou como fundamento da recorribilidade a previsão da al. d) do nº 2 do art. 629º do CPC. E tanto assim foi que nem sequer juntou qualquer cópia do(s) pretenso(s) acórdão(s) fundamento. E é esse o entendimento da doutrina e da jurisprudência: “Nos casos que constituem excepções à recorribilidade das decisões (v.g. art. 629º, nº 2) (…) devem ser indicados os motivos especiais de admissibilidade. Quando esta dependa da alegação de contradição jurisprudencial, o recorrente deve demonstrar essa contradição mediante cópia ou certidão do acórdão (…)”. (Abrantes Geraldes e outros, CPC anotado, vol. I, 2018, pág. 764).

Aliás, ainda que se entenda que deve ser proferido despacho de aperfeiçoamento no sentido de convidar o recorrente a indicar o fundamento da recorribilidade (Abrantes Geraldes, Recursos…, 5ª edição, pág. 132) sempre subsistirá a falta de junção do acórdão fundamento que determina a imediata rejeição do recurso (art. 637º, nº 1 ,segunda parte, do CPC).

Fica, assim, prejudicada a apreciação da agora invocada contradição jurisprudencial para efeitos do art. 629º, nº 2, al. d) do CPC. (…) “

Notificado da decisão singular, o autor/recorrente veio reclamar para a conferência, com os fundamentos seguintes:

“1. Entende o Tribunal a quo, no Douto Despacho ora reclamado, proferido em 13 de Dezembro de 2023, que a revista interposta pelo aqui Recorrente não pode ser admitida, por se verificar a existência de “dupla conforme” e por, no seu entender, o Recorrente não ter invocado que o recurso é sempre recorrível, nos termos conjugados dos artigos 629.º, n.º 2, e 637.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (doravante CPC).

2. Ora, com todo o devido respeito, entende o Recorrente que não assiste razão ao Tribunal a quo.

3. Para se verificar uma situação de dupla conforme, terão de estar presentes três requisitos de aplicação: ausência de voto de vencido, uma conformidade essencial de fundamentação, e finalmente, uma conformidade decisória.

4. Ainda que, in casu, tenha havido ausência de voto de vencido, não há, no entender do Recorrente, uma conformidade essencial de fundamentação entre a Douta Sentença proferida na primeira instância e o Douto Acórdão recorrido, nem uma conformidade decisória.

5. Não se verifica uma conformidade irrestrita e exacta do Acórdão da Relação com a decisão de 1.ª instância.

6. A fundamentação de facto e de direito do Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa não é totalmente coincidente com fundamentação de facto e de direito vertida na Douta Sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância.

7. Desde logo, quanto à matéria de facto, o Tribunal da Relação procedeu, no Douto Acórdão recorrido, à modificação da mesma, alterando o Ponto 3 da matéria dada como provada, por ter feito uma interpretação diferente da que foi feita pelo Tribunal de 1.ª Instância.

8. Também a fundamentação de direito não é inteiramente coincidente, designadamente no que se refere à Jurisprudência citada.

9. Assim, entende o Recorrente que não se verifica, no caso em apreço, uma situação de dupla conforme.

No entanto, e caso assim não se entenda, sempre se dirá o seguinte:

10. Tendo em conta que cada regra tem a sua excepção, também a regra da dupla conforme, contida no n.º 3 do artigo 671.º do CPC, apresenta as suas excepções.

11. A dupla conforme apresenta hoje três excepções: a revista extraordinária (artigo 629.º, n.º 2, do CPC), a revista excepcional (artigo 672.º do CPC) e o direito transitório (artigo 7.º da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho).

12. A primeira e segunda excepções constituem dois subtipos do recurso de revista comum, a par da revista “normal”.

13. A revista “normal” ocorre quando não exista dupla conforme e a revista extraordinária e a revista excepcional ocorrem apesar de existir dupla conforme.

14. São estas as excepções mais relevantes, que aliás constam expressamente da norma do n.º 3 do artigo 671.º do CPC, que se refere à dupla conforme, na primeira e última parte.

15. Esses subtipos do recurso de revista, designadamente a revista extraordinária, não implicam qualquer formalidade distinta das formalidades prescritas quanto ao recurso de revista em geral, nomeadamente no artigo 639.º do CPC.

16. A Revista apresentada pelo Autor-Apelante preenche os requisitos da revista extraordinária, sendo admissível, independentemente de se verificar, ou não, “dupla conforme”.

Vejamos:

17. A primeira excepção à dupla conforme é a revista extraordinária, conforme consta, aliás, da primeira parte do n.º 3 do artigo 671.º, relativo à regra da dupla conforme.

18. Nos termos deste n.º 3, “sem prejuízo dos casos em que a revista é sempre admissível, não é admitido recurso de revista de acórdão da Relação que confirme (…) a decisão proferida na 1.ª instância”.

19. Da conjugação destes dois segmentos da norma contida no n.º 3, retiramos que não é admitido recurso do acórdão da Relação que padeça de dupla conformidade, excepto se se tratar de caso em que a revista é sempre admissível.

20. Os casos em que a revista é sempre admissível são os que constam, efectivamente, das alíneas a), b), c) e d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC.

21. Nomeadamente, diz-nos este n.º 2 que, “independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso:

a) com fundamento na violação das regras de competência internacional, das regras de competência em razão da matéria ou da hierarquia, ou na ofensa de caso julgado;

b) das decisões respeitantes ao valor da causa e dos incidentes, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre; c) das decisões proferidas, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça; [ou]

d) do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se tiver proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.

22. Acrescente-se que a excepção da revista extraordinária não vinha prevista na versão anterior da norma da dupla conforme, o que suscitava alguma contradição na Doutrina, no sentido de perceber se a revista extraordinária contida nos n.os 2 e 3 do artigo 629.º do CPC, se sobrepunha ao pressuposto da dupla conforme.

23. Contudo, com a introdução da primeira parte do n.º 3 do artigo 671.º do CPC, resolveu-se, assim, a questão, não existindo agora margem para dúvidas de que a revista extraordinária consiste numa das exceções legais à regra da dupla conforme

24. Ora, in casu, o Recorrente recorre de Acórdão da Relação que está em contradição com outros acórdãos, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, sem que tenha sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC.

25. O Recorrente, logo no início das suas alegações, refere que “o Douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa contraria o disposto nos artigos 406.º,564.º e 798.º do Código Civil, bem como a posição da Doutrina e da Jurisprudência nele citadas, fazendo uma interpretação e aplicação contrária ao sentido dos acórdãos nele citados”.

26. Alega, expressamente, que o Douto Acórdão recorrido, quanto à matéria de direito, está em contradição com os seguintes acórdãos:

-Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05-02-2015, proferido no âmbito do processo n.º 4747/07.2TVLSB.L1.S1;

-Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19-11-2020, proferido no âmbito do processo n.º 10608/19.5T8PRT.P1;

-Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14-07-2021, no âmbito do processo n.º 181113/10.6YIPRT.E1; e

-Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21-01-2010, proferido no âmbito do processo n.º 872/06.5TVPRT.P1.

27. Esses acórdãos foramproferidosno domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito,

28. Tanto, que o próprio Tribunal da Relação os cita no seu Acórdão, ainda que fazendo uma interpretação contrária ao teor dos mesmos.

29. O Acórdão recorrido está também em contradição com o disposto nos artigos 406.º,564.º e 798.º do Código Civil, conforme alegado no recurso.

30. Está, assim, preenchido o requisito da contradição entre o Acórdão recorrido e outros Acórdãos de Tribunais da Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, contradição essa que se encontra alegada no Recurso de Revista.

31. O Recorrente invocou e alegou, nas suas conclusões (pontos I, II, III, XLIII, XLIV e XLV, entre outros), como fundamento específico do seu recurso e da recorribilidade do acórdão, a existência de um conflito jurisprudencial a resolver, indicando os acórdãos com os quais o acórdão recorrido está em contradição, dando, assim, cumprimento ao disposto no artigo 637.º do CPC.

32. De resto, o presente recurso não se encontra excluído pela regra da alçada da Relação, tendo um valor superior à mesma, valor esse que é de conhecimento oficioso.

33. A presente causa tem um valor de €48.000,00 (quarenta e oito mil euros).

34. Assim, o valor da causa é superior à alçada da Relação (€30.000,00) e a decisão impugnada é desfavorável ao Recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, na medida em que é desfavorável ao Recorrente na exacta medida do valor do prejuízo por si sofrido, que é o valor da causa.

35. A admissibilidade do recurso de revista extraordinária baseada na alínea d) do artigo 629.º, n.º 2, do CPC, para acórdão da Relação “do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal”, circunscreve-se (numa lógica de cumulação de requisitos) aos casos em que se pretende recorrer de acórdão proferido no âmbito de acção cujo valor excede a alçada da Relação, sem desrespeitar o valor mínimo de sucumbência (âmbito de recorribilidade delimitada pelo artigo 629.º, n.º 1, do CPC), e relativamente ao qual, de acordo com o objecto recursivo ou a sua natureza temática, esteja excluído, por regra, o recurso de revista por motivo de ordem legal impedimento ou restrição) alheio à conjugação do valor do processo com o valor da alçada da Relação (casos em que se integra a irrecorribilidade ditada pela dupla conformidade decisória, nos termos do artigo 671.º, n.º 3, que salvaguarda, para sua superação, as situações de revista extraordinária do artigo 629.º, nº 2) - vide, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 15-03-2022 e 16-11-2023, disponíveis para consulta em www.dgsi.pt.

36. Acresce que o Recorrente deu cumprimento aos formalismos consagrados nos artigos 637.º e 639.º do CPC, pelo que nada obsta à apreciação do recurso de revista.

37. Assim, a revista apresentada pelo Recorrente é tempestiva e admissível, pelo que deverá ser aceite e deferido o requerimento de interposição de recurso apresentado pelo Autor Recorrente em 2 de Novembro de 2023, apreciando-se e julgando-se o recurso de revista nos termos aí alegados e requeridos.

DA DOUTA DECISÃO SINGULAR

38. Conclui o Sr. Relator que “ainda que se entenda que deve ser proferido despacho de aperfeiçoamento no sentido de convidar o recorrente a indicar o fundamento da recorribilidade (Abrantes Geraldes, Recursos…, edição, pág. 132) sempre subsistirá a falta de junção do acórdão fundamento que determina a imediata rejeição do recurso(art. 637º, 1 ,segunda parte, do CPC)”.

39. Ora, o Ac. do Tribunal Constitucional n.º 641/2020, de 16 de Novembro, julga inconstitucional a norma contida na segunda parte do n.º 2 do artigo 637.º do Código de Processo Civil, quando estabelece, nos recursos em que se invoque um conflito jurisprudencial que se pretende ver resolvido, que o recorrente junta obrigatoriamente, sob pena de imediata rejeição, cópia, ainda que não certificada, do acórdão fundamento, sem que antes seja convidado a suprir essa omissão, cfr. cópia que se junta.

40. Esse acórdão, consta, inclusivamente, das notas ao artigo 637.º do Código de Processo Civil disponível para consulta no site da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa.

41. Assim, a interpretação do Sr. Relator, com todo o devido respeito, é inconstitucional, pelo que, entendendo-se ser obrigatória a junção de cópia do acórdão fundamento, terá, nesse caso, que haver convite ao aperfeiçoamento da reclamação apresentada pelo aqui Recorrente, o que não se verificou.

42. Ademais, todos os acórdãos citados se encontram devidamente identificados, com indicação de que estão disponíveis online, no site www.dgsi.pt.

Termos em que deverá a reclamação ser recebida e julgada procedente e, em consequência, ser proferido despacho de admissão de recurso apresentado pelo Recorrente em 2 de Novembro de 2023, seguindo-se os ulteriores termos, até final.

Caso assim não se entenda, sempre deverá haver convite ao aperfeiçoamento da reclamação, no sentido de convidar o recorrente a indicar o fundamento da recorribilidade e a juntar cópia do acórdão fundamento.”

Em conferência, o Colectivo proferiu a seguinte decisão:

(…)

“Dupla conformidade:

Com a mesma argumentação da reclamação, designadamente a que a decisão de facto foi alterada e a fundamentação de direito não é coincidente, o recorrente entende que não se verifica uma situação de dupla conforme e que o recurso de revista normal devia ter sido admitido.

Porém, e no que a este aspecto se refere, há que sufragar a decisão singular, pois, como aí se refere, a fundamentação da Relação só é essencialmente diferente da da 1ª instância “quando a solução jurídica do pleito prevalecente na Relação tenha assentado, de modo radicalmente ou profundamente inovatório, em normas, interpretações normativas ou institutos jurídicos perfeitamente diversos e autónomos dos que haviam justificado e fundamentado a decisão proferida na sentença apelada – ou seja, quando tal acórdão se estribe decisivamente no inovatório apelo a um enquadramento jurídico perfeitamente diverso e radicalmente diferenciado daquele em que assentara a sentença proferida em 1ª instância” (Ac. STJ de 9.7.2015, proc. 542/13.8T2AVR.C1.S1).

Ora, como se sublinhou na decisão singular, tanto a sentença como o acórdão rejeitaram a ideia de que os lucros cessantes equivalessem simplesmente às retribuições deixadas de auferir, convergindo no entendimento de que esses lucros resultavam da diferença entre o que o A. tinha deixado de auferir e o que tinha auferido na realidade (o que não tinha sido alegado).

A Relação confirmou, assim, a decisão da 1ª instância, sem fundamentação essencialmente diferente e sem que a rectificação operada na decisão de facto tenha tido algum reflexo teve na decisão de direito (cfr. Ac. STJ de 8.3.2018. proc. 484/14.0T8LRS.L1.S1).

Convite ao aperfeiçoamento:

Na decisão referiu-se, a final, o seguinte”: (…) Aliás, ainda que se entenda que deve ser proferido despacho de aperfeiçoamento no sentido de convidar o recorrente a indicar o fundamento da recorribilidade (Abrantes Geraldes, Recursos…, 5ª edição, pág. 132) sempre subsistirá a falta de junção do acórdão fundamento que determina a imediata rejeição do recurso (art. 637º, nº 1, segunda parte, do CPC).”

Argumenta o reclamante que o Ac. do Tribunal Constitucional n.º 641/2020, de 16 de Novembro, julgou inconstitucional a norma contida na segunda parte do nº 2 do art. 637º do CPC, quando estabelece que nos recursos em que se invoque um conflito jurisprudencial que se pretende ver resolvido, que o recorrente junta obrigatoriamente, sob pena de imediata rejeição, cópia, ainda que não certificada, do acórdão fundamento, sem que antes seja convidado a suprir essa omissão.

E na verdade, o Ac. do TC nº 641/2020, decidiu “ Julgar inconstitucional a norma contida na segunda parte do n.º 2 do artigo 637.º do Código de Processo Civil, quando estabelece, nos recursos em que se invoque um conflito jurisprudencial que se pretende ver resolvido, que o recorrente junta obrigatoriamente, sob pena de imediata rejeição, cópia, ainda que não certificada, do acórdão fundamento, sem que antes seja convidado a suprir essa omissão, por ofensa do artigo 20.º, números 1 e 4, da Constituição” (v. , no mesmo sentido, o Ac. do TC n.º 151/2020; e na jurisprudência deste Tribunal, o Ac. STJ de 7.6.2022, proc, 753/20.0T8VNF-I.G1-A.S1).

Porém, o fundamento principal da decisão singular reside no facto de o recorrente não ter indicado como fundamento da recorribilidade a previsão da al. d) do nº 2 do art. 629º do CPC.

Com efeito, aí se escreveu:

“Argumenta, ainda, o recorrente que invocou nas suas conclusões I, II, XLIII, XLIV e XLV das suas alegações, como fundamento específico do recurso e da recorribilidade, a existência de um conflito jurisprudencial a resolver.

Porém, e mau grado a referência à contradição do acórdão com outros acórdãos (conclusão XLIII), a verdade é que o recorrente não indicou como fundamento da recorribilidade a previsão da al. d) do nº 2 do art. 629º do CPC. E tanto assim foi que nem sequer juntou qualquer cópia do(s) pretenso(s) acórdão(s) fundamento. E é esse o entendimento da doutrina e da jurisprudência: “Nos casos que constituem excepções à recorribilidade das decisões (v.g. art. 629º, nº 2 ) (…) devem ser indicados os motivos especiais de admissibilidade. Quando esta dependa da alegação de contradição jurisprudencial, o recorrente deve demonstrar essa contradição mediante cópia ou certidão do acórdão (…)”. (Abrantes Geraldes e outros, CPC anotado, vol. I, 2018, pág. 764).”

Insiste o reclamante que tal previsão se encontra preenchida, uma vez que invocou e alegou nas suas conclusões do recurso (pontos I, II, III, XLIII, XLIV e XLV, entre outros), como fundamento específico do seu recurso e da recorribilidade do acórdão, a existência de um conflito jurisprudencial a resolver, indicando os acórdãos com os quais o acórdão recorrido está em contradição, dando, assim, cumprimento ao disposto no art. 637º do CPC.

É verdade que o recorrente não indicou expressamente como fundamento da recorribilidade a previsão da al. d) do nº 2 do art. 629º do CPC.

Porém, como referem Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, em Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, 2014, volume II, a pág. 44, “a indicação do fundamento específico da recorribilidade não está sujeita a qualquer regras, para além da sua inserção nas conclusões”.

Afigura-se-nos, assim, que, para invocar a contradição jurisprudencial, se não mostra decisiva a indicação do preceito legal do art. 629º, nº 2, al. d) do CPC.

Por outro lado, verifica-se que, na conclusão XLIII do seu recurso de revista, o recorrente alegou, expressamente, que o acórdão recorrido está em “contradição” com os acórdãos que aí indicou, sendo que nas conclusões XIII, XIV, XV, XX, XXI, XXII, XXIII, XXIV, XXV, XXVI XXVII, XXVIII e XXIX se esforçou por demonstrar as divergências entre o acórdão recorrido e os acórdãos referidos (que serviram, curiosamente, de apoio à decisão recorrida).

Cremos, por isso, que não se revela, desde já, como “ostensiva”, a falta do pressuposto especifico de recorribilidade (Notas cit., pág. 45), de modo a justificar a decisão imediata de admitir ou rejeitar o recurso, pelo que só se deverá formular juízo definitivo sobre a alegada contradição, após convite à junção do(s) acórdão que o recorrente eleger como acórdão(s) fundamento, assim se sufragando a posição atrás referida do Ac. do TC nº 641/2020, secundada pelo Ac. STJ de 7.6.2022, com o esclarecimento de que deve ser permitida apenas a enunciação e a apresentação de um único acórdão para demonstrar, em relação a cada questão, a referida divergência, assim se seguindo, neste aspecto, a orientação do Ac. STJ de 30.04.2019, no proc. nº 2822/18.7T8VNF.G1.S1, sumariada deste modo: “Apesar de inexistir uma disposição legal específica regulando a situação em que é apresentado mais do que um acórdão fundamento, é razoável, num primeiro momento, convidar o recorrente a escolher o acórdão em relação ao qual pretende que seja apurada a existência da oposição – uma espécie de “despacho de aperfeiçoamento” – aplicando-se por analogia, designadamente para efeitos de prazo, o disposto no artigo 639.º, n.º 3, do CPC e ainda do artigo 652.º, n.º 1, al. a), ex vi do artigo 679.º do CPC”.

Pelo exposto, acorda-se em deferir a reclamação e substituir a decisão singular pelo convite ao recorrente para apresentar, no prazo de 10 dias, um único acórdão fundamento transitado em julgado (mediante cópia ou certidão) por cada questão jurídica, devendo explicitar onde se situa a contradição essencial entre os dois acórdãos (o recorrido e o fundamento).

Sem custas.”

O autor e recorrente respondeu ao convite, mediante requerimento que apresentou, em que formulou a seguinte conclusão:

“I. Dão-se aqui por integralmente reproduzidas, em nome da economia processual, as alegações e as conclusões constantes do requerimento de recurso de revista apresentado pelo Recorrente.

II. O Douto Acórdão de que se recorre está em contradição, por fazer uma incorrecta apreciação e aplicação do seu sentido com o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05-02-2015, proferido no âmbito do processo n.º 4747/07.2TVLSB.L1.S1, com o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19-11-2020, proferido no âmbito do processo n.º 10608/19.5T8PRT.P1, com o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14-07-2021, no âmbito do processo n.º 181113/10.6YIPRT.E1, e com o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21-01-2010, proferido no âmbito do processo n.º 872/06.5TVPRT.P1.

III. Contraria também o disposto nos artigos 406.º, 564.º e 798.º do Código Civil, que impõe, no caso concreto, a obrigação de a Recorrida indemnizar o Recorrente pelos lucros cessantes.

IV. Assim, a apreciação do presente recurso de revista é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito e para que seja feita justiça.

V. Termos em que deverão ser revogados a Douta Sentença e o Douto Acórdão recorrido e ser proferido Acórdão que condene a Recorrida no pagamento, ao Recorrente, de indemnização no montante líquido de €48.000,00 (quarenta e oito mil euros), acrescida dos juros que se vencerem sobre essa quantia, entre a data da citação e o integral pagamento de todas as quantias em dívida, a calcular em sede de execução de sentença.

Nestes termos e nos melhores de Direito que VV. Exas. Mui Doutamente suprirão, deverá o presente RECURSO ser admitido e julgado totalmente procedente, devendo, em consequência, ser proferido ACÓRDÃO que revogue o acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação e, por consequência, a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, e, assim, condene a Recorrida no pagamento, ao Recorrente, de indemnização no montante líquido de €48.000,00 (quarenta e oito mil euros), a título de lucros cessantes, acrescida dos juros que se vencerem sobre essa quantia, entre a data da citação e o integral pagamento de todas as quantias em dívida, a calcular em sede de execução de sentença, pois só assim, Colendos Conselheiros, farão V. Exas. a COSTUMADA JUSTIÇA!

Juntou 4 documentos – Acórdãos.”

Notificada, a ré respondeu, formulando as seguintes conclusões:

“I. Após ser notificado para o efeito, o Recorrente veio juntar aos autos um articulado no qual identifica quatro questões jurídicas para cada uma das quais junta o respetivo Acórdão que considera estar em contradição com o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no presente caso.

II. Contudo, cumpre referir que o Recorrente formula, para todas as questões jurídicas, a mesma conclusão, pelo que apenas se pode concluir que, na verdade, existe apenas uma questão jurídica no presente Recurso: saber se os lucros cessantes pela cessação antecipada do contrato são indemnizáveis independentemente dos circunstancialismos exigidos pelo Acórdão recorrido.

III. Considerando que o Recorrente foi notificado para juntar apenas um Acórdão fundamento por cada questão jurídica, devem ser desconsiderados todos os Acórdãos invocados, com exceção do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 18/11/2014, no âmbito do processo n.º 926/10.3TVPRT.C1.

IV. Importa, também, esclarecer que os “circunstancialismos” a que o Recorrente se refere são, na verdade, os pressupostos da responsabilidade civil contratual, que não podem ser afastados.

V. Efetivamente, não basta o Recorrente alegar que sofreu um dano derivado dos lucros cessantes, é necessário efetuar prova do dano alegado, o que não se verificou no presente caso, conforme é entendimento do Tribunal de Primeira Instância e do Tribunal da Relação de Lisboa, no Acórdão recorrido.

VI. Nos termos supra expostos, Requer-se, desde já, que apenas seja considerado o Primeiro Acórdão invocado pelo Recorrente.

VII. Sem prescindir, e por mera cautela de patrocínio, e antes de se proceder à análise dos Acórdãos invocados pelo Recorrente, importa referir que o Recorrente apresenta uma interpretação restritiva, incorreta e sem fundamento do Acórdão recorrido.

VIII. Segundo o Recorrente, o Acórdão recorrido considera que não se verificou uma situação danosa para o mesmo em virtude da cessação antecipada do contrato, porque o Recorrente não provou que o contrato que celebrou com a Recorrida fosse em regime de exclusividade.

IX. No entanto, nos termos daquele Acórdão, a existência do direito de indemnizar vai muito além da prova da celebração do contrato em regime de exclusividade: exige, para além da mera alegação de um dano, a prova, em audiência de julgamento, do efetivo prejuízo.

X. No entanto, é entendimento da 2.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa, que o Recorrente não logrou alegar ou provar a existência de um verdadeiro e efetivo prejuízo, conforme lhe competia, nos termos do n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil, inexistindo, assim, o dever de indemnizar.

XI. Procede-se, agora, àanálisede cadaum dos Acórdãos juntos pelo Recorrente, bem como a justificação da contradição dos mesmos com o Acórdão recorrido.

XII. No que concerne ao Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 18/11/2014, no âmbito do processo n.º 926/10.3TVPRT.C1, referente à questão “os lucros cessantes, em virtudeda cessaçãoantecipada do contrato sem justa causa, são ou não indemnizáveis”:

XIII. Antes de mais, importa referir que este Acórdão é de 2014, pelo que é natural que a posição da doutrina em Portugal tenha sofrido alterações ao longo dos dez anos transatos.

XIV. Seguidamente, cumpre esclarecer que não se compreende a inclusão desta questão jurídica no presente recurso, uma vez que se trata de uma questão que se encontra decidida desde a primeira instância, sem nunca ter sido contestada pela Recorrida.

XV. O Acórdão recorrido conclui que o dever de indemnizar compreende, também, os lucros cessantes, no entanto, é “indispensável que dos factos provados resulte a existência de um dano efetivo”, o que, considera o douto Aresto, não se verificou no presente caso.

XVI. Por outro lado, o Acórdão invocado não está em contradição com o Acórdão recorrido.

XVII. O Recorrente alega que “a contradição essencial entre o Acórdão recorrido e o Acórdão invocado reside no facto de este último determinar que, estando em causa um contrato oneroso que tem por objeto a prestação de determinados serviços, a sua revogação unilateral por parte do contraente a quem se destinam os serviços implica, em princípio, a obrigação de indemnizar a outra parte pelos prejuízos decorrentes da cessação antecipada do contrato, sem fazer depender essa obrigação de indemnizar de qualquer dos circunstancialismos indicados no douto Acórdão recorrido, mas sim da existência de justa causa para a resolução do contrato”.

XVIII. Antes de mais, importa esclarecer que o Acórdão invocado não versa sobre a mesma questão dos presentes autos.

XIX. Efetivamente, no processo que deu origem àquele Acórdão, os serviços já haviam sido prestados, aquando da revogação do contrato, o que não se verifica no presente caso, onde todos os serviços efetivamente prestados foram pagos.

XX. Mais ainda, naquele Acórdão, não existe qualquer referência aos lucros cessantes.

XXI. Pelo que se desconhece o motivo que levou o Recorrente a juntar este Acórdão e alegar a sua contradição com o Acórdão recorrido.

XXII. Nestes termos, desde já se requer que seja desconsiderado o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 18/11/2014, no âmbito do processo n.º 926/10.3TVPRT.C1, por não versar sobre a mesma questão que o Acórdão recorrido, nos termos da alínea d), n.º 1, do artigo 629.º do Código de Processo Civil.

XXIII. Ainda que assim não se entenda, o que não se aceite e por mero exercício de patrocínio se equaciona, o Recorrido considera que os dois Acórdãos não estão em contradição.

XXIV. Efetivamente, ambos os acórdãos consideram que existe direito de indemnização perante a revogação unilateral, sem justa causa, de um contrato de prestação de serviços oneroso que seja celebrado por tempo determinado ou para a prestação de determinados serviços.

XXV. Neste sentido, o Acórdão recorrido conclui que “não dúvida de que o dever de indemnizar compreende não o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão cfr. art. 564.º do CC”.

XXVI. Por último, cumpre reforçar que os “circunstancialismos indicados no Douto Acórdão recorrido” se traduzem nos pressupostos da responsabilidade civil contratual, que não podem ser afastados.

XXVII. Por outro lado, no que concerne ao Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 19/02/2019, no âmbito do processo n.º 13908/17.5T8LSB.L1-7, referente à questão “Em que moldes são os lucros cessantes indemnizáveis”.

XXVIII. Em primeiro lugar, conquanto este Aresto seja mais o recente junto pelo Recorrente, a verdade é que o mesmo é, já, de 2019, tendo já decorrido cinco anos sobre a prolação do mesmo, o que bem demonstra a dificuldade do Recorrente encontrar jurisprudência recente que fundamente a sua posição.

XXIX. Segundo o Recorrente, o Acórdão recorrido está em contradição com este Acórdão porque este determina “que assiste ao prestador de serviços direito a uma indemnização pelos lucros cessantes, respeitantes ao período em que o contrato vigoraria não fosse a revogação unilateral (imprópria),consubstanciados na diferença entre o que o prestador teria recebido no período ainda previsto para a duração do contrato, sem fazer depender essa obrigação de indemnizar de qualquer dos circunstancialismos indicados no Douto Acórdão Recorrido”.

XXX. Antes de mais, e contrariamente ao referido no ponto 13. das alegações apresentadas pelo Recorrente, reforça-se que o Acórdão recorrido defende a existência da obrigação de indemnização pelos lucros cessantes, desde que os danos sofridos sejam provados.

XXXI. Do mesmo modo, não se aceita o alegado no ponto 17. pelo Recorrente, uma vez que o entendimento do Acórdão invocado é, precisamente, o entendimento do Acórdão recorrido, pelo que não se concebe qualquer contradição entre os dois Arestos.

XXXII. Mais do que isso, o Aresto invocado está em contradição com a posição defendida pelo Recorrente, o que se retira, inclusivamente, das alegações do Recorrente, cfr. ponto 15. e ponto 17. das alegações.

XXXIII. Por outro lado, e contrariamente ao invocado pelo Recorrente no ponto 22., aquele não deu cumprimento ao ónus de alegar os pressupostos do seu direito à indemnização, conforme consta da matéria de facto assente no Acórdão recorrido e que não pode ser alterada em sede de Recurso de Revista – cfr. n.º 2 do artigo 682.º do Código Civil.

XXXIV. Por último, importa esclarecer que o Acórdão invocado pelo Recorrente não condena a Ré a pagar a totalidade do valor devido pelo cumprimento do contrato aplicando a teoria da diferença e condenando a Ré, no lucro que era expectável a Autora obter com o cumprimento integral do contrato.

XXXV. In casu, foi, também, este o entendimento do Acórdão recorrido.

XXXVI. No entanto, nos termos deste Acórdão e, também, da sentença proferida na primeira instância, não foi possível, por falta de alegação do Recorrente, calcular o lucro que era expectável que aquele obtivesse com o cumprimento integral do contrato.

XXXVII. Pelo que não se concebe qualquer contradição entre o Acórdão invocado e o Acórdão recorrido.

XXXVIII. Por último, desde já se requer que os Acórdãos invocados no ponto 23. das alegações do Recorrente sejam desconsiderados pelo douto Tribunal de Recurso, uma vez que os mesmos não são juntos e que o Recorrente foi notificado para juntar, apenas, um Acórdão por cada questão jurídica.

XXXIX. No que concerne ao Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 21/01/2010, no âmbito do processo n.º 872/06.5TVPRT.P1, referente à questão “a verificação da obrigação de indemnizar está dependente da verificação de qualquer outro dano ou “efetivo prejuízo” que não seja o próprio lucro cessante”:

XL. Nos termos do exposto no ponto 33. das alegações do Recorrente, este entende que “a contradição essencial entre o Acórdão recorrido e o Acórdão aqui invocado reside na interpretação que o tribunal a quo faz desse acórdão pois, do mesmo resulta que os lucros cessantes são indemnizáveis sem que tenha que haver prova de qualquer “dano efetivo” (ou de qualquer regime de exclusividade) que não seja o próprio lucro cessante ou ganho frustrado com a resolução antecipada do contrato , sendo que naquele caso concreto e contrariamente ao que sucedeu no caso dos presentes autos autora não deu cumprimento o ónus de alegar os pressupostos do seu direito à indemnização nos termos do artigo 342 nº 1 do Código Civil não alegando os factos que integram o prejuízo limitando-se a pedir o pagamento determinada quantia a título de indemnização por danos patrimoniais.”

XLI. No entanto, da própria argumentação do Recorrente se retira que ambos os Arestos partilham o mesmo entendimento.

XLII. Cumpre esclarecer que o Acórdão recorrido não faz qualquer referência ao dano emergente, centrando-se, apenas nos lucros cessantes, não se compreendendo esta alegação do Recorrente.

XLIII. Do mesmo modo, não se compreende que o Recorrente alegue que do Acórdão invocado resulta que os lucros cessantes são indemnizáveis sem que tenha que haver prova de qualquer “dano efetivo”, quando naquele aresto se pode ler: “Daí não decorre que o mandatário possa exigir, sem mais, as retribuições que auferiria até ao termo da execução das obras projetadas.

Na verdade, a menção feita ao lucro cessante mostra que o que está em causa é o prejuízo efetivamente sofrido pelo mandatário.

XLIV. Por outro lado, no Acórdão invocado, pode ler-se: “Ora a Autora limitou-se a pedir o pagamento da quantia de 67.200,00 Euros a título de indemnização por danos patrimoniais, “corresponde ao valor que a Autora auferiria se tivesse concluído a prestação de serviços para que foi contratada.

(…)

Sobre o Autor recai o ónus delegar os pressupostos do seu direito à indemnização, nos termos do art.342º, nº1, do CC; o que inclui necessariamente a alegação dos factos que integram o prejuízo”.

XLV. Ora, com o devido respeito, isto foi, efetivamente, o que se verificou no presente caso.

XLVI. Salvo melhor opinião, parece-nos por demais evidente que o caso vertido no Acórdão invocado é em tudo semelhante ao caso vertido no Acórdão recorrido, não se vislumbrando qualquer contradição entre os mesmos: em ambos os casos, o Autor limitou-se a peticionar o valor correspondente ao cumprimento integral do contrato, preterindo o ónus de alegar os factos que integram o prejuízo.

XLVII. In casu, esta conclusão retira-se dos factos provados, sendo certo que a matéria de facto não pode ser alterada em sede de Recurso de Revista – cfr. n.º 2 do artigo 682.º do Código de Processo Civil

XLVIII. Pra concluir, importa, mais uma vez, referir que o Recorrente foi notificado para a junção, apenas, de um Acórdão por cada questão jurídica, pelo que deve ser desconsiderado o alegado no ponto 26. das alegações apresentadas,

XLIX. Mais ainda, o Acórdão invocado pelo Recorrente é de 2010, tendo decorrido já mais de 14 anos desde a sua prolação.

L: Por último, no que concerne ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 05/02/2015, no âmbito do processo n.º 4747/07.2TVLSB.L1.S1, referente à questão “a verificação da obrigação de indemnizar pelos lucros cessantes está dependente da existência de um regime de exclusividade na prestação da parte lesada”:

LI. O recorrente considera que “a contradição essencial entre o Acórdão recorrido e o Acórdão aqui invocado reside no facto de este último fazer indemnizáveis os lucros cessantes pela cessação antecipada do contrato, sem fazer essa obrigação de indemnização dependente de qualquer circunstancialismo, nomeadamente da celebração do contrato cessado em regime de exclusividade ou do impedimento, para o prestador, de celebrar outros contratos com outras entidades”.

LII. Antes de mais, importa esclarecer que este Acórdão não faz qualquer referência à existência de um regime de exclusividade, dizendo respeito à determinação do valor da indemnização, conforme tenha sido, ou não, provada a efetiva verificação de um dano.

LIII. Conforme foi já referido, os circunstancialismos referidos pelo Recorrente são, na verdade, os requisitos da responsabilidade civil, nomeadamente, a prova do efetivo dano sofrido, que não podem ser afastados.

LIX. Ainda que esse dano se materialize no instituto dos lucros cessantes, o mesmo deve ser alegado e provado, nos termos e para os efeitos do artigo 342.º do Código Civil, uma vez que se trata de um elemento constitutivo do direito do Autor, não bastando alegar que se sofreu um dano derivado dos lucros cessantes

LV. É necessário efetuar prova do dano alegado, o que não se verificou no presente caso, conforme é entendimento do Tribunal de Primeira Instância e do Tribunal da Relação de Lisboa, no Acórdão recorrido.

LVI. O Acórdão invocado considera que “a matéria de facto apurada (…) reflete com a necessária segurança a repercussão patrimonial negativa que a opção da R. teve na esfera jurídica da A.” e que “a matéria de facto apurada revela-se suficiente para a quantificação da indemnização ainda que por critérios aproximados”

LVII. Mais ainda, considera, também, que as despesas que o Autor teria com o cumprimento integral do contrato celebrado, bem como as receitas que auferiu por não precisar de cumprir integralmente o contrato, por se tratarem de um facto modificativo do Autor, deveriam ser invocadas pela Ré, e que não tendo, tais factos sido invocados por nenhuma das partes, eles não foram alvo de discussão no julgamento daquele processo.

LVIII. Acontece que, no presente caso, a Ré, ora Recorrida, alegou esses factos, tendo, inclusivamente, requerido o ofício do Instituto da Segurança Social, IP, e da Autoridade Tributária para juntarem declarações de situação contributiva do Autor, ora Recorrente, desde o início previsto da prestação de serviços (01/03/2021)até ao termo previsto do contrato (31/12/2022), com vista a provar a exclusividade alegada pelo Autor, ora Recorrente, e os reais lucros cessantes.

LIX. A questão da existência de despesas associadas ao cumprimento integral do contrato e de outras receitas que o Autor, ora Recorrente, auferiu por não ter de cumprir integralmente o contrato foi alegada, discutida e sujeita a prova no presente processo.

LX. No entanto, no presente caso, a matéria de facto apurada não reflete a repercussão patrimonial negativa que a revogação do contrato teve na esfera jurídica do Recorrente.

LXI. Ora, tratando-se da matéria de facto fixada pelo douto Tribunal da Relação, importa reforçar, uma vez mais, que a mesma não pode ser alterada pelo Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito do Recurso de Revista, nos termos e para os efeitos do n.º 2 do artigo 682.º do Código de Processo Civil.

LXII. Pelo que, apenas se pode concluir que não existe contradição entre o Acórdão recorrido e o Acórdão invocado, verificando-se, pelo contrário, que a matéria de facto provada nos dois processos é diferente.

LXIII. Perante tamanha disparidade na matéria fática dos dois Acórdãos, e salvo melhor opinião, é por demais evidente que a solução jurídica nos dois Arestos nunca poderia ser a mesma, sendo, necessariamente, contrária.

LXIV. Importa, mais uma vez, referir que a jurisprudência apresentada pelo Recorrente se revela bastante antiga, sendo certo que o Acórdão aqui invocado é de 2015, tendo passado quase dez anos sobre a sua prolação.

LXV. Por último, importa referir que nos pontos 40. a 57. e 59. a 61. o Recorrente aproveita o articulado apresentado para tecer diversas considerações que extravasam, por completo, não só o conteúdo da notificação recebida, mas, também, o objeto do próprio recurso, sendo certo que não estão no âmbito do Acórdão invocado nem da questão jurídica suscitada.

LXVI. Nestes termos, extrapolando estas considerações o conteúdo da notificação e o objeto do próprio Recurso, devem as mesmas ser desconsideradas pelo Douto Tribunal de Recurso.

LXVII. Se assim não se entender, o que não se aceita e por mera cautela de patrocínio se equaciona, cumpre esclarecer que, nos pontos 40. a 44., o Recorrente parece pretender uma alteração da matéria de facto, o que, conforme já referido, não é admissível em sede de Recurso de Revista, cfr. n.º 2 do artigo 682.º do Código de Processo Civil.

LXVIII. Importa, ainda, clarificar que o facto de o Recorrente ter exercido outras atividades em simultâneo com a atividade de guarda noturno, exclui, por uma questão de definição do próprio conceito, a existência de um regime de exclusividade.

LXIX. Por outro lado, contrariamente ao alegado pelo Recorrente no ponto 46. das suas alegações, o lucro cessante não se traduz na diminuição da faturação de uma empresa.

LXX. A indemnização por lucros cessantes visa restabelecer a situação financeira do Recorrente, se não se tivesse verificado a revogação unilateral do contrato, sendo certo que para determinar essa situação importa atentar não só nas remunerações que não auferiu, mas, também, nas despesas que não despendeu em virtude do não cumprimento integral do contrato e nas receitas que auferiu, também em virtude do não cumprimento integral do contrato.

LXXI. In casu, feito este computo, não foi possível concluir pela existência de uma situação danosa para o Recorrente, pelo que não existe a obrigação da Recorrida indemnizar o Recorrente.

LXXII. No que respeita aos pontos 50. a 57. e 59. a 61. das alegações, traduzem-se em meras conclusões do Recorrente, sem qualquer relevância para o presente caso.

LXXIII. Para concluir, importa referir que as conclusões formuladas pelo Recorrente não se coadunam com as alegações que lhes precedem.

LXXIV. Efetivamente, no ponto II das conclusões do Recurso, o Recorrente invoca Acórdãos que não junta e aos quais não faz qualquer referência no decorrer das suas alegações (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, no âmbito do processo n.º 10608/19.5T8PRT.P1 e Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, no âmbito do processo n.º 181113/10.6YIPRT.E1).

LXXV. Por outro lado, não constam daquelas conclusões todos os Acórdãos fundamento juntos pelo Recorrente, nomeadamente, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, no âmbito do processo n.º 926/10.3TVPRT.C1, e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do processo n.º 13908/17.5T8LSB.L1-7.

LXXVI. Mais ainda, no ponto III das conclusões, o Recorrente invoca uma contradição com os artigos 406.º, 564.º e 798.º do Código Civil, que não é invocada durante as alegações.

LXXVII. Pelo que apenas se pode concluir pela completa desadequação das conclusões face às alegações do recurso apresentado pelo Recorrente.

LXXVIII. Nestes termos e nos melhores de direito, que V.as Ex.as doutamente suprirão, deve improceder o presente recurso, mantendo-se a decisão proferida pelo douto

LXXIX. Tribunal da Relação de Lisboa, com as legais consequências, fazendo-se assim, como é habitual, inteira JUSTIÇA.

Nestes termos e nos melhores de direito, que V.as Ex.as doutamente suprirão, deve improceder o presente recurso, mantendo-se a decisão proferida pelo douto Tribunal da Relação de Lisboa, com as legais consequências, fazendo-se assim, como é habitual, inteira JUSTIÇA.”

Cumpre decidir:

Sintetiza-se no acórdão de 7.6.2018, proc. 2877/11.5TBPDL-D.L2.S1:

“I- (…)

II-A contradição jurisprudencial imprescindível para a admissibilidade da revista, ao abrigo do art. 629º, nº 2, al. d), implica a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos:

i) o não cabimento de recurso ordinário impugnativo do acórdão recorrido por motivo alheio à alçada do tribunal;

ii)a existência de, pelo menos, dois acórdãos em efetiva oposição, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão de direito fundamental, tendo por objeto idêntico núcleo factual, ali versados;

III -(…)

IV. A contradição de julgados que releva como condição da admissibilidade do recurso de revista é a oposição frontal sobre a mesma questão fundamental de direito, no sentido de que as decisões em confronto tenham convocado um quadro normativo ou regras de conteúdo e alcance substancialmente idênticos e tenham subjacente um núcleo factual idêntico ou coincidente, na perspectiva das normas ali diversamente interpretadas e aplicadas.“

A situação de facto não tem de ser exactamente coincidente. O que é preciso é que se estabeleça um confronto jurisprudencial na discussão e resolução de situações materiais litigiosas que, de um ponto de vista jurídico-normativo, sejam equiparáveis (Ac. STJ de 29.6.2017, proc. 366/13.2TNLSB.L1.S1-A).

O recorrente identifica quatro questões fundamentais de direito em relação às quais o acórdão da Relação estará em contradição com outros tantos acórdãos: três da Relação e um do Supremo.

Assim, identificou as seguintes questões:

a) se os lucros cessantes, em virtude da cessação antecipada do contrato sem justa causa são ou não indemnizáveis;

b) em que moldes são os lucros cessantes indemnizáveis;

c) se a verificação da obrigação de indemnizar está dependente da verificação de qualquer outro dano ou “efectivo prejuízo que não seja o próprio lucro cessante

d) se a verificação da obrigação de indemnizar pelos lucros cessantes está dependente da existência de um regime de exclusividade na prestação da parte lesada

Porém, existem apenas duas verdadeiras questões: a de saber que lucros cessantes são indemnizáveis e a de saber se o A. alegou e provou esses lucros cessantes.

É o que decorre, aliás, do sumário do acórdão recorrido:

“ I- (…)

II- A revogação unilateral pela Ré do contrato de prestação de serviços de vigilância (de guarda-noturno) que celebrou com o Autor, antes do fim do prazo que havia sido estipulado, ainda que lícita, pode fazê-la incorrer na obrigação de indemnizar o Autor do prejuízo que este sofrer, nos termos conjugados dos artigos 1156.°, 1170.°, n.° 1, e 1172.°, ai. c), do CC.

III. - A responsabilidade civil, seja contratual, seja extracontratual (delitual, pelo risco ou até por facto lícito), não dispensa nunca o pressuposto da existência de dano (recaindo sobre o autor o ónus da prova a esse respeito - cf. art. 342.°, n.° 1, do CC), sem o qual não haverá obrigação de indemnizar, aplicando-se neste âmbito as disposições dos artigos 562.° e ss. do CC. Assim, sendo indispensável que dos factos provados resulte a existência de um dano efetivo, não há dúvida que o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão, podendo tais "benefícios" ou vantagens patrimoniais serem danos futuros, desde que previsíveis (cf. art. 564.° do CC).

IV. - No caso dos autos, não há lugar a obrigação de indemnizar, uma vez que, ante os factos alegados e provados, não se pode considerar que, por causa da cessação antecipada do contrato, se verificou uma situação danosa para o Autor, sofrendo um efetivo prejuízo, por não ter podido (ou muito provavelmente não vir a poder) auferir um nível de rendimentos que atingisse o patamar expetável, isto é, o nível da remuneração que, em termos globais (descontando também as suas despesas) iria obter se o contrato tivesse vigorado pelo prazo previsto.

V - Efetivamente, ainda que o Autor tenha deixado de auferir as quantias mensais que a Ré lhe iria pagar se o contrato tivesse vigorado até ao fim do prazo estipulado, não podemos assumir que o Autor não auferiu durante esse período de tempo quantia igual ou superior, até porque este não provou que o contrato celebrado com a Ré fosse em regime de exclusividade e que tenha ficado impedido de celebrar outros contratos com outras entidades, sendo certo que, ao não ter de cumprir integralmente o contrato celebrado, o Autor ficou disponível para realizar outras atividades, por conta própria ou de outrem.” (destaques nossos)

Assim, entendendo que a quantificação da indemnização por lucros cessantes devia equivaler à diferença entre a situação patrimonial que existia se o contrato tivesse sido integralmente executado e aquela que resultou da revogação e que, por isso, a indemnização não se resumia às retribuições que o A. tinha deixado de auferir, sendo que “ante os (escassos) factos alegados e provados” não se podia considerar que, por causa da cessação antecipada do contrato, se tinha verificado uma situação danosa para o Autor, um efectivo prejuízo, por não ter podido “auferir um nível de remuneração que, em termos globais - descontando também as suas despesas - iria obter se o contrato tivesse vigorado pelo prazo previsto”,

Portanto, e como se sublinhou na decisão singular, tanto a sentença como o acórdão rejeitaram a ideia de que os lucros cessantes equivalessem simplesmente às retribuições deixadas de auferir, convergindo no entendimento de que esses lucros resultavam da diferença entre o que o A. tinha deixado de auferir e o que tinha auferido na realidade (o que não tinha sido alegado).

Mas vejamos as “questões” tal como vêm enunciadas pelo recorrente.

1ª questão: se os lucros cessantes, em virtude da cessação antecipada do contrato sem justa causa são ou não indemnizáveis.

Para o recorrente, a contradição essencial entre o acórdão recorrido e o acórdão da Relação de Coimbra de 18.11.2014, proferido no âmbito do processo nº 926/10.3TVPRT.C1, em www.dgsi.p, reside no facto de este último determinar que a revogação unilateral por parte do contrato a quem se destinam os serviços implica, em princípio, a obrigação de indemnizar a outra parte pelos prejuízos decorrentes da cessação antecipada do contrato sem fazer depender essa obrigação de indemnizar de qualquer dos circunstancialismos indicados no acordo recorrido mas sim da existência de justa causa para a resolução do contrato.

O citado Ac. R.C. foi sumariado da seguinte forma:

“I – O contrato por via do qual alguém se obriga a prestar a outrem determinados serviços de arquitectura, mediante retribuição, e do qual não resulta para o prestador dos serviços qualquer outro interesse que não seja o de receber a retribuição, é um contrato de prestação de serviços que, por força do disposto no arts. 1156º e 1170º do C.C., é livremente revogável por qualquer das partes, independentemente da existência de justa causa.

II – Todavia, não obstante a sua livre revogabilidade, estando em causa um contrato oneroso que tem como objecto a prestação de determinados serviços, a sua revogação unilateral por parte do contraente a quem se destinam os serviços implica, em princípio, a obrigação de indemnizar a outra parte pelos prejuízos decorrentes da cessação antecipada do contrato. ( destaque nosso)

III – Não haverá, porém, lugar a qualquer indemnização quando exista justa causa para a revogação do contrato e desde que essa justa causa se reconduza a qualquer facto ou circunstância que seja imputável à contraparte.

IV – A justa causa, enquanto pressuposto da faculdade de revogar o contrato (como acontece na situação previstas art. 1170º, nº 2, do CC.), há-de corresponder a qualquer facto, situação ou circunstância que torne inexigível, de acordo com as regras da boa fé, a manutenção da relação contratual e que poderá ser ou não imputável à contraparte; todavia, enquanto factor de exclusão da obrigação de indemnizar a cargo da parte que revoga o contrato, apenas releva a justa causa que se reconduza a um comportamento ou actuação da contraparte, de forma a que possa afirmar-se que a revogação do contrato decorreu de uma determinada actuação da contraparte que, segundo as regras da boa fé, tornava inexigível para a parte revogante a manutenção da relação contratual.”

Ora, como se verifica, e em relação à indemnizabilidade dos lucros cessantes, o acórdão invocado não se encontra em contradição com o acórdão recorrido. Este não entendeu que os danos resultantes da cessação antecipada do contrato sem justa causa não são indemnizáveis. Apenas exprimiu o entendimento, que comprometeu o recurso do autor, de que os danos, que consistiam na diferença entre o rendimento perdido e o rendimento real, tinham de ser alegados e provados.

Como assim, não ocorre qualquer contradição de julgados em relação à questão da indemnizabilidade dos lucros cessantes, que não é controvertida.

Em relação aos danos em concreto, o acórdão invocado apreciou assim:

“É certo, portanto, que não está aqui em causa a questão de saber se a Autora tem ou não direito à totalidade do preço que havia sido contratado; importa apenas saber (pois é apenas esse o objecto do recurso) se a Autora tem ou não direito à 3ª prestação que, nos termos do contrato, deveria ser paga no prazo de trinta dias após a recepção pela C... da aprovação camarária do projecto base de arquitectura.

É certo que o aludido projecto ainda não havia obtido aprovação camarária e, portanto, não estava ainda verificada a condição de que dependia a exigibilidade do pagamento daquela prestação.

A verdade é que, aquando da revogação do contrato, já estavam ultrapassadas as questões que haviam impedido a apreciação do projecto apresentando pela Autora e, portanto, estavam reunidas as condições para que o mesmo visse a obter aprovação em curto prazo, ainda que, para o efeito, a Autora tivesse que proceder a algumas rectificações, já que, como resulta da matéria de facto provada, o projecto que havia elaborado e apresentado não respeitava a implantação imposta pelo Plano de Pormenor.

De qualquer forma, será seguro afirmar que a quantia de 45.000,00€ a que alude a 3ª prestação (a que nos reportamos) corresponde à remuneração/preço de serviços que, à data da revogação do contrato, a Autora já havia elaborado em parte e que, como tal, lhe é devido. É certo, no entanto, que os serviços a que se reportava tal prestação não estariam ainda inteiramente executados, já que, como se disse, a Autora ainda teria que efectuar alterações ao projecto. De qualquer forma, ultrapassados que estavam todos os entraves que se colocaram (emparcelamento, anexação e registo), a Autora tinha expectativa de receber a curto prazo o valor daquela prestação, porquanto nada obstava já a que, efectuadas as necessárias rectificações, o projecto base viesse a ser aprovado pela CM, expectativa essa que se frustrou pela circunstância de a Ré ter revogado unilateralmente o contrato.

É justo, portanto, que seja paga à Autora a aludida quantia.” (destaques nossos)

Ora, como decorre do trecho transcrito, não existe manifestamente qualquer oposição entre os acórdãos, o recorrido e o invocado, que não versam, sequer, sobre núcleos factuais idênticos.

2ª questão: em que moldes são os lucros cessantes indemnizáveis.

Para o recorrente, a contradição essencial entre o acórdão recorrido e o Ac.R.Lx. de 19.2.2019, processo nº 13908/17.5TB8LSB.L1.S1, reside no facto de este último determinar a indemnização pelos lucros cessantes, respeitantes ao período em que o contrato vigoraria não fosse a revogação unilateral (imprópria), ter como medida a diferença entre o que o prestador teria recebido no período ainda previsto para a duração do contrato, deduzido do que tenha ganho por não ter de cumprir integralmente o contrato celebrado, designadamente das despesas que faria na execução do contrato até ao seu termo.

O acórdão invocado tem o seguinte sumário:

“I. Para que ocorra um interesse atendível de terceiro obstativo à livre revogação do mandato pelo mandante é essencial que tal interesse derive de uma relação basilar contratual firmada entre o mandante e o terceiro (Artigo 1170º, nº2, do CC).

II. Um contrato de prestação de serviços de medicina do trabalho é revogável unilateralmente pelo empregador (Artigos 1156º e 1170º, nº1, do Código Civil).

III. Todavia, assiste ao prestador de serviços direito a uma indemnização pelos lucros cessantes, respeitantes ao período em que o contrato vigoraria não fosse a revogação unilateral (imprópria), consubstanciados na diferença entre o que o prestador teria recebido no período ainda previsto para a duração do contrato, deduzido do que tenha ganho por não ter de cumprir integralmente o contrato celebrado, designadamente das despesas que faria na execução do contrato até ao seu termo.

IV. Sucumbindo factualidade suficiente para calcular os lucros cessantes em tais termos, há que fixar a indemnização segundo a equidade (Artigo 566º, nº3, do Código Civil)." (destaques nossos)”.

Para o acórdão recorrido, como se recorda, os lucros atendíveis eram os resultavam da diferença entre o que o autor tinha deixado de auferir e o que tinha auferido na realidade, o que não tinha sido alegado.

Segundo o acórdão de 19.2.2019. a autora terá direito a uma indemnização dos lucros cessantes, na diferença entre o que a autora teria recebido no período entre a revogação unilateral e o termo do contrato, deduzido do que tenha ganho por não ter de cumprir integralmente o contrato celebrado, designadamente das despesas que faria na execução do contrato até ao seu termo, sendo certo que a autora não alegou (nem demonstrou) qualquer factualidade a tal propósito. Cita-se, em abono, um acórdão deste STJ de 7.7.2010, proc. 4865/07, que considera que “com a revogação do contrato ocorre prejuízo para o contratado que se traduz na perda de retribuição a que tinha direito, devendo a indemnização colocá-lo na situação patrimonial que teria se o contrato de prestação de serviço não tivesse sido revogado” e que “ pondo de parte cálculos rigorosos ou quaisquer outras fórmulas matemáticas, o tribunal deve recorrer à equidade para quantificar o que entende por justa indemnização”.

Assim, e no caso apreciado, o acórdão invocado entendeu que, “inexistindo factos provados que permitam calcular os lucros cessantes pela teoria da diferença (…) o tribunal tem que fixar o seu valor” e tendo em consideração que “ o contrato tinha uma vigência prevista de mais de 21 meses, com a mensalidade acordada de 7784 euros , o que perfaria um total de 163464 euros “ e que “neste tipo de prestação de serviço a margem de lucro do prestador não é inferior a 15%”, devia em equidade atribuir a indemnização de € 24.519,60.

É verdade que o acórdão invocado só se debruçou sobre as despesas que deixou de gastar, para deduzir àquela quantia que teria de receber. Não se debruçou exactamente sobre o que a autora ganhou realmente no período entre a revogação unilateral e o termo do contrato, para aquilatar se o autor sofreu um efectivo prejuízo, comparando os rendimentos perdidos com o rendimento real que auferiu depois da revogação.

Porém, a situação material litigiosa é análoga ou equiparável: também no acórdão recorrido estão em causa “ganhos” que o autor teria auferido “ por não ter de cumprir integralmente o contrato celebrado” e também, como no acórdão invocado, o autor não alegou (nem demonstrou) qualquer factualidade a propósito desses ganhos (incluindo as despesas evitadas) que deviam ter sido deduzidos. Todavia, ao invés de fixar uma indemnização em equidade, o tribunal a quo decidiu julgar o recurso improcedente, pelo que, nesta particular questão, se entende que existe oposição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado.

3ª questão: se a verificação da obrigação de indemnizar está dependente da verificação de qualquer outro dano ou “efectivo” prejuízo que não seja o próprio lucro cessante.

Entende o recorrente que a contradição essencial entre o acórdão recorrido e o acórdão aqui invocado reside na interpretação que o Tribunal a quo faz desse acórdão, pois, do mesmo resulta que os lucros cessantes são indemnizáveis sem que tenha que haver prova de qualquer “dano efectivo” (ou de qualquer regime de exclusividade) que não seja o próprio lucro cessante ou ganho frustrado com a resolução antecipada e sem justa causa do contrato, sendo que, naquele caso concreto, e contrariamente ao que sucedeu no caso dos presentes autos, a autora não deu cumprimento ao ónus de alegar os pressupostos do seu direito à indemnização, nos termos do art. 342º, nº 1, do Código Civil, não alegando os factos que integram o prejuízo, limitando-se a pedir o pagamento de determinada quantia a título de indemnização por danos patrimoniais.

O referido acórdão recorrido foi sumariado assim:

“I– A revogação do mandato por qualquer das partes é sempre admissível, excepto se o mandato tiver sido conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro, caso em que não pode ser revogado pelo mandante sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa.

II – Resulta claramente da previsão da al. c) do art. 1172º do CC que a sua “ratio” é a tutela da confiança.

III – Em ambas as situações da al. c) do mesmo art. se tutela o direito do mandatário à retribuição do mandato, pois que um dos pressupostos da responsabilidade do mandante-revogante é que o mandato seja retribuído.

IV – A doutrina tradicional tem entendido que a obrigação de indemnizar em consequência da revogação unilateral do mandato é uma indemnização por factos lícitos, sustentando-se também que a correspondente responsabilidade se deve enquadrar na chamada responsabilidade pela confiança, que constitui uma terceira via, intercalada entre a responsabilidade obrigacional e a delitual.”

No acórdão pode ler-se ainda:

“Essa é a situação configurada nos autos, já que flui dos factos provados que a Autora foi contratada, enquanto arquitecta, para elaborar projectos de arquitectura e planeamento de edificações, incluindo o acordo das partes o controlo de execução da componente de arquitectura das obras, para satisfazer os pedidos dos clientes da Ré, o que pressupunha uma actuação prolongada no tempo.

A questão coloca-se no facto de a lei não conferir a indicação da medida dos prejuízos a serem indemnizados, impondo-se por isso recorrer ao funcionamento da teoria da diferença, nos termos dos arts. 562º, 563º e 564º do CC.

A este respeito referem os Profs. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Vol. II, 4ª ed, pág. 814, o seguinte: “quando o mandato (oneroso) tiver sido conferido por certo tempo ou para determinado assunto, o prejuízo da revogação calcular-se-á em função da compensação que o mandato devia proporcionar normalmente ao mandatário; sendo a revogação sem a conveniente antecedência, o prejuízo medir-se-á também em função do tempo que faltou para essa antecedência. Em qualquer dos casos se procura assim fixar o lucro cessante do mandatário”.

Dai não decorre que o mandatário possa exigir, sem mais, as retribuições que auferiria até ao termo da execução das obras projectadas.

Na verdade, a menção feita ao lucro cessante mostra que o que está em causa é o prejuízo efectivamente sofrido pelo mandatário.

Esta indemnização visa apenas reparar o dano resultante da dita revogação extemporânea, nos termos dos arts.562º, 563º e 564º, do Código Civil, o que não passa por obrigar a parte que revogou o contrato, em tais circunstâncias, a ter que pagar todas as prestações que seriam devidas até as obras em execução estarem concluídas, como pretende a Autora. (Neste sentido o acima citado Acórdão da Relação de Coimbra de 10/02/2009). Também o Acórdão do STJ de 29/09/1998, in CJ STJ Tomo III, pág.34 refere o seguinte: “o art.1156º manda aplicar, com as necessárias adaptações, as disposições sobre o mandato às modalidades do contrato de prestação de serviços não regulados especialmente…..Tratando-se de mandato (ou de prestação de serviço), a revogação feita contra o prazo estipulado sempre produzirá o seu efeito normal de pôr termo ao contrato, embora com a criação de obrigação de indemnizar. Não tem, pois, o mandante (ou o recebedor do serviço) de cumprir as suas obrigações contratuais, designadamente a de retribuição, pelo tempo correspondente ao prazo não decorrido; ao invés, tem de indemnizar os prejuízos causados, para os quais a lei não dá qualquer medida que não seja a resultante do funcionamento da teoria da diferença – art.566º, nº2…

Daí que não possa a outra parte pedir, sem mais, as retribuições ajustadas para esse período, cabendo-lhe antes alegar e provar qual o prejuízo por si sofrido efectivamente dependente não só das receitas que não auferiu, mas também da existência ou inexistência de despesas não efectuadas.”

Também no mesmo sentido, cfr Ac. da RL de 20/09/2007, CJ Tomo IV, pág.99.

O certo é que a Autora não alegou, como lhe era imposto nos termos do art. 342º, nº1 do Código Civil, qual o prejuízo efectivamente sofrido, em conformidade com a exigência da teoria da diferença.

Logo, como bem referiu nesta parte a sentença objecto de recurso, “não podia a Autora pedir, sem mais, as retribuições ajustadas para o período em causa, cabendo-lhe alegar e provar (art.342º, nº1) qual o prejuízo por si sofrido efectivamente, dependente, não só das receitas que não auferiu, mas também da existência ou inexistência de despesas não efectuadas. Ora a Autora limitou-se a pedir o pagamento da quantia de 67.200,00 Euros a título de indemnização por danos patrimoniais, “correspondente ao valor que a Autora auferiria se tivesse concluído a prestação de serviços para que foi contratada. (art.45º da p.i)…Ao pretender ver a indemnização fixada no valor da remuneração que auferiria se tivesse concluído a prestação de serviços para que foi contratada, a Autora visa a satisfação do seu interesse contratual positivo, o que não pode proceder”. E não colhe o argumento da recorrente, ao afirmar nas suas conclusões de recurso que, sem prejuízo de não se encontrarem alegados tais factos, sempre se poderia ter relegado para execução de sentença a fixação do montante da indemnização, ao abrigo do disposto no art.661º, nº2, do CPC. Na verdade, é nesta parte pacífico o entendimento de que este normativo legal não visa suprir o ónus de alegação das partes acerca dos prejuízos sofridos. Sobre o Autor recai o ónus de alegar os pressupostos do seu direito à indemnização, nos termos do art.342º, nº1, do CC; o que inclui necessariamente a alegação dos factos que integram o prejuízo. Só no caso de, tendo sido alegada e provada a existência de dano, não ser possível fixar o seu objecto ou quantidade, é que o art.661º, nº2 do CPC permite que se relegue a fixação da indemnização para o que se vier a liquidar em execução de sentença.

A Autora não cumpriu nesta parte o ónus de alegação, pelo que não pode este Tribunal suprir essa omissão. Consequentemente, bem andou a sentença objecto de recurso ao julgar a acção improcedente, o que se mantém, julgando igualmente improcedente a apelação.” (itálico nosso)

Assim, e como emerge manifestamente da sua leitura, não é verdade que do acórdão invocado resulte que “ que os lucros cessantes são indemnizáveis sem que tenha que haver prova de qualquer “dano efectivo” (ou de qualquer regime de exclusividade) que não seja o próprio lucro cessante ou ganho frustrado com a resolução antecipada sem justa causa do contrato.

Não se verifica, pois, qualquer contradição essencial entre o acórdão recorrido e o invocado.

4ª questão: se a verificação da obrigação de indemnizar pelos lucros cessantes está dependente da existência de um regime de exclusividade na prestação da parte lesada.

Entende o recorrente que a contradição essencial entre o acórdão recorrido e o Acórdão do STJ de 5.2.2015, no processo nº 4747/07.2TVLSB.L1.S1, reside no facto de este último fazer indemnizáveis os lucros cessantes pela cessação antecipada do contrato, sem fazer essa obrigação de indemnização dependente de qualquer circunstancialismo, nomeadamente da celebração do contrato cessado em regime de exclusividade ou do impedimento, para o prestador, de celebrar outros contratos com outras entidades.

Transcreve-se o sumário do referido acórdão do Supremo:

“1. A revogação unilateral de um contrato de prestação de serviços oneroso pela parte solicitante constitui-a na obrigação de indemnizar a prestadora dos serviços pelos danos provocados, abarcando tanto os danos emergentes como os lucros cessantes (art. 1172º, al. c), ex vi art. 1156º do CC).

2. Tratando-se de prestação de serviços por tempo determinado, a quantificação da indemnização por lucros cessantes deve equivaler à diferença entre a situação patrimonial que existiria se o contrato tivesse sido integralmente executado e aquela que resultou da revogação antecipada.

3. A quantificação dos lucros cessantes em função das receitas projectadas para o período contratual em falta satisfaz os requisitos da probabilidade e da previsibilidade do dano a que se reportam os arts. 563º e 564º, nº 2, do CC.

4. A falta de prova de factos necessários à quantificação da diferença patrimonial, mesmo com recurso à equidade, determina a prolação de uma sentença de condenação genérica (art. 609º, nº 2, do CPC).

5. Não tendo as partes deduzido na acção declarativa qualquer alegação em torno de eventuais despesas que a prestadora de serviços deixou de efectuar por causa da revogação antecipada do contrato, nem sendo possível afirmar a existência de uma relação causal entre a revogação antecipada e uma eventual redução dessas despesas, a indemnização por lucros cessantes corresponde ao valor das receitas projectadas para o período contratual em falta.” ( destaques nossos).

O acórdão recorrido refere que não tendo o autor provado que o contrato celebrado com a ré o foi em regime de exclusividade não provou que tenha ficado impedido de celebrar contratos com outras entidades e que não tenha ficado disponível para realizar outras actividades por conta própria ou de outrem e assim não poder auferir um nível de remuneração que, em termos globais (descontando também as suas despesas) iria obter se o contrato tivesse vigorado pelo prazo previsto.

Ora, o acórdão invocado não aborda qualquer situação semelhante, de a aí autora não ter provado que celebrou contrato em regime de exclusividade e (ou) de não ter ficado disponível para realizar outras actividades por conta própria ou outrem. Debruça-se apenas sobre eventuais despesas que a ali autora haveria de realizar se o contrato subsistisse no período a que respeitavam as receitas projectadas (pelo exercício de serviços de acesso à internet).

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em deferir a reclamação e admitir o recurso de revista, circunscrito, embora, à questão de saber se, não tendo alegado o seu rendimento real a partir da revogação do contrato, o autor tem, ainda assim, direito a indemnização por lucros cessantes.

Custas pela recorrida.

Requisite o processo principal.


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Lisboa, 14 de Janeiro de 2025

António Magalhães (Relator)

Maria João Vaz Tomé

Manuel Aguiar Pereira