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IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
CABEÇA DE CASAL
PODERES DE ADMINISTRAÇÃO
HERDEIROS
UTILIZAÇÃO DE IMÓVEL DE HERENÇA
Sumário
1 - A não especificação dos concretos pontos de facto que a recorrente considera incorretamente julgados implica a rejeição do recurso na parte referente à impugnação da decisão sobre a matéria de facto. 2. Os poderes de administração que cabem ao cabeça de casal têm de ser compaginados com os direitos dos outros herdeiros. Donde, neste particular, temos que ter sempre em atenção, também, o que consta do nº 1, do art.º 2074º do CC. 3. O direito do Apelante – fazer a sua vida diária na fração autónoma em litigio - não resulta de qualquer contrato celebrado entre o Apelante e a autora da herança, antes se insere no tipo de direitos que resultam do relacionamento salutar entre mãe e filho. 4. Este tipo de direito do Apelante – fazer a sua vida diária na fração autónoma em litigio - que era a casa de morada de família da falecida e do Apelante, não se insere naqueles que se extingam por efeito da morte do autor da herança, antes se mantendo até à liquidação integral e partilha dos bens que integram a herança. 5. Estando provado que o Apelante residia gratuitamente na fração dos autos, com autorização da falecida, o mesmo tem o direito de aí continuar a residir até à liquidação integral e partilha da herança sem que esteja obrigado ao pagamento de qualquer valor pela ocupação da fração.
Texto Integral
ACORDAM OS JUÍZES NA 8ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
1. Relatório.
H., cabeça-de-casal da herança aberta por óbito de M., intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra M. M. peticionando que:
a) Declare que a fracção autónoma supra identificada é propriedade da herança, da qual o A. é cabeça-de-casal;
b) Condene o R. a restituir a referida fracção autónoma e o seu recheio;
c) Condene o R. no pagamento de indemnização pela privação do uso de € 35.100,00 (trinta e cinco mil e cem euros);
d) Condene o R. no pagamento de uma compensação à herança de valor equivalente às rendas que seriam auferidas pelo arrendamento da fracção autónoma em valor nunca inferior a € 1.200,00 (mil e duzentos euros) mensais até à data da entrega efectiva da fracção autónoma ao cabeça-de-casal.
Após contestação do Réu o processo seguiu os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença que terminou com a seguinte decisão:
“Pelos fundamentos expostos, julgo a acção parcialmente procedente, e em consequência:
a) Declaro que a fracção autónoma supra identificada é propriedade da herança, da qual o A. é cabeça-de-casal;
b) Condeno o R. a restituir a referida fracção autónoma e o seu recheio;
c) Condeno o R. no pagamento à herança de uma indemnização no valor mensal de € 450,00, desde a data da sua notificação judicial avulsa e até à entrega da fração autónoma ao cabeça de casal.
- Absolvo o R. do restante pedido formulado pelo A.;
- Condeno A. e R. o pagamento das custas, na proporção dos respectivos decaimentos.”
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Não se conformando com o decidido veio o Réu interpor recurso da sentença, sustentando que deve ser dado provimento ao presente recurso, proferindo-se acórdão que revogue a sentença do Tribunal de 1ª Instância de Lisboa, absolvendo-se o Recorrente dos pedidos contra este formulados, a que corresponde a um juízo de verdadeira equidade, apresentando, após alegações, as seguintes conclusões:
1. Com o presente recurso, o Recorrente vem impugnar a decisão, quer quanto à matéria de facto, quer quanto à matéria de direito.
2. Salvo o devido respeito por opinião diversa, verifica-se erro na apreciação da prova por parte do Tribunal a quo, relativamente aos factos dado como provados;
3. O Tribunal a quo baseia a sua decisão em interpretação errónea das normas que regulam a administração da herança;
4. A apreciação da prova testemunhal por parte do Tribunal a quo foi erradamente valorada, e que o critério de lógica e de experiência que aplica estão feridos de fundamentação e não atendem tão pouco a um critério justo e normativo.
5. O Tribunal a quo entendeu que a prova testemunhal acarretada por parte do Recorrente foi reveladora de conhecimento dos factos, nomeadamente que ambas as testemunhas conheciam o Recorrente desde o seu nascimento;
6. Ambas as testemunhas apresentaram um depoimento conhecedor dos factos, isento e credível;
7. Dúvidas não restam de que as testemunhas arroladas pelo Recorrente conheciam a sua vivência e deixaram bem explicito em sede de discussão e julgamento que a falecida mãe do Recorrente havia permitido que este ali vivesse com ela sem qualquer contrapartida monetária;
8. Prova essa que desde já se elucida que o Tribunal “a quo” nem sequer a apreciou convenientemente ao ponto de em pleno juízo formular a sua decisão;
9. O Tribunal “a quo” não atendeu ao disposto no 2074º, n.º 1 do C.C., o qual determina que “O herdeiro conserva em relação à herança, até à sua integral liquidação e partilha, todos os direitos e obrigações que tinha para com o falecido, à excepção dos que se extinguem por efeito da morte deste.”.
10. O Recorrente já habitava no referido imóvel em data anterior ao falecimento da sua mãe, autora da herança em questão;
11. E detinha para tal a autorização desta, tendo-se vislumbrado que não procedia ao pagamento de qualquer quantia monetária pela utilização da fração;
12. Habitando ali a título gratuito, cedência essa feita pela sua falecida mãe, autora da herança;
13. Conforme é entendido pelos Tribunais Superiores - Vide TRL Ac.– Processo 2027/17.4T8LSB.L1-7, relator Ana Rodrigues da Silva - tal direito, não se insere naqueles que se extinguem por efeito da morte do autor da herança, antes de mantendo até à partilha dos bens;
14. Pelo que é lícito ao Recorrente a sua permanência na fração até à efetiva partilha dos bens, nos mesmos termos que até então;
15. E resultante da autorização que detinha da autora da herança para habitar na respetiva fração a título gratuito, não pode o Recorrente ser obrigado ao pagamento qualquer quantia pelo seu uso e fruição, por tal não ter sido estipulado por esta em vida - Vide Ac. TRL, de 28-06-2012, relator Maria José Mouro e Ac. TRG, de 20-03-2018, relator Maria Cristina Cerdeira.
16. Razão pela qual, não se concede o juízo feito pelo Tribunal a quo que proferiu a sentença que se recorre, a qual demonstra uma clara falta de análise critica sobre os autos e as provas produzidas, bem como um claro abuso do poder de livre apreciação;
17. Nessa medida, somente o douto Tribunal da Relação de Lisboa, devidamente competente a decidir do presente recurso, poderá fazer a real e devida justiça;
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Não houve resposta ao recurso por parte do A., ora apelado.
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Colhidos os vistos e preparada a deliberação, importa apreciar e decidir.
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2 - Mérito do recurso.
1. Objeto do recurso.
Este objeto, como é sabido, é, em regra e ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, delimitado pelas conclusões das alegações do Recorrente [artigos 608.º, n.º 2, “in fine”, 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC)].
Assim, as questões que se colocam no presente recurso são:
a) - Deve ser alterada a matéria de facto?
b) – Deve ser alterada a decisão de direito?
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2. Fundamentação de facto.
2.1. O tribunal “a quo” deu como provados os seguintes factos:
1) O A. é cabeça-de-casal da herança aberta por óbito da mãe do A. e do R., M. J. M. M.
2) Desde o falecimento da sua mãe, o A. tem vindo a administrar o património da herança.
3) Do acervo hereditário faz parte uma fracção autónoma correspondente ao 2.º Esq., do prédio urbano sito na Travessa Henrique Cardoso, n.º 62, 1700-228 Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade sob o artigo 288º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº 79 da freguesia de Alvalade, identificada na relação de bens como verba n.º 2 dos bens imóveis.
4) A fracção autónoma referida no artigo anterior tem o valor patrimonial de € 50.465,80, e é composta por um quarto, uma sala, casa de banho e cozinha, com uma área de cerca de € 60,00 m2.
5) O R. faz a sua vida diária na fracção autónoma supra identificada, designadamente ali pernoitando, fazendo as refeições diárias, recebendo amigos e outros familiares, estando inclusive ali recenseado desde o mês de Junho de 2011.
6) O R. sempre residiu naquela habitação com autorização da falecida sua mãe.
7) O R. não dispõe de outra casa para residir.
8) O A. a requereu notificação judicial avulsa do R., tendo este sido notificado a 15 de Março de 2019, para entregar a fracção em causa e seu recheio, bem como pagar à herança compensação por rendas não recebidas no valor mensal de € 900,00.
9) Apesar de notificado, o R. não entregou a fracção autónoma ao cabeça-de-casal, nem pagou qualquer renda ou compensação pelo uso da fracção.
10) O A., como administrador do acervo hereditário ainda não partilhado, pretende dar de arrendamento a identificada fracção autónoma com o objectivo de rentabilizar o património da herança e gerar recursos financeiros.
11) A fracção autónoma valia no mercado do arrendamento, por ser em Lisboa e numa zona central da cidade, uma renda mensal não inferior a € 900,00.
2.2. O tribunal “a quo” deu como não provados os seguintes factos:
i) O R. foi interpelado pelo cabeça-de-casal por carta datada de 29 de Novembro de 2018, na qual pedia que lhe entregasse a fracção autónoma que ocupa.
ii) O A. voltou a interpelar o R. por carta registada com aviso de recepção, datada de 22 de Janeiro de 2019, para entregar a fracção autónoma id. na petição inicial, sob pena de, caso não a entregasse de imediato, pagar o valor mensal de € 900, a título de compensação por rendas não recebidas.
iii) O valor mensal da fracção seja de € 1.200,00.
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3. Fundamentação de direito.
3.1. Da impugnação da decisão quanto à matéria de facto.
Estabelece o art. 640º do CPC:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 (…)
Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, pág. 165-169, escreve:
“a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos.
c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;
d) (…)
e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente. (…)
A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se em alguma das seguintes situações:
Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (artºs. 635º, nº 4 e 641º, nº 2, al. b));
a) Falta de especificação, nas conclusões dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (artº 640º, nº 1, al. a));
b) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios de prova constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.)
c) Falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
d) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação. (…)”
Esta tem sido a orientação do S.T.J., de que é exemplo, o Ac. de 16/05/2018, in www.dgsi.pt:
“Sendo as conclusões não apenas a súmula dos fundamentos aduzidos nas alegações stricto sensu, mas também e sobretudo as definidoras do objeto do recurso e balizadoras do âmbito do conhecimento do tribunal, no caso de impugnação da decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente indicar nelas, por referência aos concretos pontos de facto que constam da sentença, aqueles cuja alteração pretende e o sentido e termos dessa alteração.
Por menor exigência formal que se adote relativamente ao cumprimento dos ónus do art. 640º do CPC e em especial dos estabelecidos nas suas alíneas a) e c) do nº 1, sempre se imporá que seja feito de forma a não obrigar o tribunal ad quem a substituir-se ao recorrente na concretização do objeto do recurso.
Apesar de a recorrente ter, nas conclusões recursivas, alegado que (…, verifica-se erro na apreciação da prova por parte do Tribunal a quo, relativamente aos factos dado como provados; A apreciação da prova testemunhal por parte do Tribunal a quo foi erradamente valorada,…”, “.... as testemunhas apresentaram um depoimento conhecedor dos factos, isento e credível …, “Prova essa que desde já se elucida que o Tribunal “a quo” nem sequer a apreciou convenientemente ao ponto de em pleno juízo formular a sua decisão…”, nas conclusões recursivas não consta a especificação dos pontos de facto que o recorrente considera terem sido incorretamente julgados. O recorrente não indicou, nas conclusões, por referência aos concretos pontos de facto que constam da sentença, aqueles cuja alteração pretende.
A não satisfação do ónus previsto no art.º 640º, nº 1, al. a) do C.P.C. implica a rejeição do recurso na parte referente à impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Assim, rejeita-se o recurso na parte referente à impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
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3.2. – Deve ser alterada a decisão de direito.
Na sentença sob recurso, estando demonstrado que o bem em disputa faz parte da herança cuja administração cabe ao Autor, o tribunal “a quo”, apreciando as normas que regulam a administração da herança, conclui que o Réu está obrigado a restituir o bem ao Autor, cabeça de casal, e obrigado ao pagamento de um valor mensal, desde a data em que a cabeça-de-casal manifestou a sua oposição até à entrega do bem.
No entender do apelante o Tribunal “a quo” baseia a sua decisão em interpretação errónea das normas que regulam a administração da herança.
Vejamos.
Não se põe em causa que a administração da herança, até à sua liquidação e partilha, pertence ao cabeça-de-casal, cf. art.º 2079.º do Código Civil (CC) e o cabeça-de-casal pode pedir aos herdeiros ou a terceiro a entrega dos bens que deva administrar e que estes tenham em seu poder, e usar contra eles de ações possessórias a fim de ser mantido na posse das coisas sujeitas à sua gestão ou a ela ser restituído, cf. art.º 2088º do CC.
Porém, os poderes de administração que cabem ao cabeça de casal têm de ser compaginados com os direitos e deveres dos outros herdeiros.
Donde, neste particular, temos que ter sempre em atenção, também, o que consta do art.º 2074º do CC.
Com efeito, o nº 1, do normativo acabado de citar, dispõe: “O herdeiro conserva, em relação à herança, até à sua integral liquidação e partilha, todos os direitos e obrigações que tinha para com o falecido, à exceção dos que se extinguem por efeito da morte deste”.
Importa ter presente, como resulta dos factos provados, que “O R. faz a sua vida diária na fração autónoma supra identificada, designadamente ali pernoitando, fazendo as refeições diárias, recebendo amigos e outros familiares, estando inclusive ali recenseado desde o mês de Junho de 2011” e “O R. sempre residiu naquela habitação com autorização da falecida sua mãe”, sendo que não está demonstrado que o Réu, ora Apelante, efetuasse o pagamento de qualquer quantia pela utilização da fração dos autos em vida de sua mãe, ou que esta tivesse exigido algum pagamento, não resultando dos autos quaisquer factos que permitam definir os contornos em que a autora da herança, mãe do autor e réu, permitiu que o Réu, ora Apelante, fizesse a sua vida diária na fração autónoma supra identificada.
Conclui-se, assim, que o Apelante residia a título gratuito na fração dos autos, tendo tal direito sido concedido pela autora da herança, mãe do Apelado e Apelante.
Ora, o direito do Apelante de residir na fração em litigio não resulta de qualquer contrato celebrado entre o Apelante e a autora da herança, antes se insere no tipo de direitos que resultam do relacionamento salutar entre mãe e filho.
Donde, este tipo de direito do Apelante – fazer a sua vida diária na fração autónoma em litigio, que era a casa de morada de família da falecida e do Apelante, não se insere naqueles que se extingam por efeito da morte do autor da herança, antes se mantendo até à liquidação integral e partilha dos bens que integram a herança.
Quer isto dizer que é licito ao Apelante permanecer na fração dos autos, até à liquidação integral e partilha da herança sem que esteja obrigado ao pagamento de qualquer valor pela ocupação da fração.
Neste sentido, ainda que num caso diferente dos presentes autos, mas com analogia, vide Ac. TRL, de 28-06-2012, relatora Maria José Mouro, onde se pode ler:
“Quanto à situação da casa de morada de família entre o momento da abertura da sucessão e o da partilha, valem as regras gerais relativas à administração da herança – entre as quais o aludido art. 2088.
A casa a que se reportam os autos estaria sujeita à gestão da aqui A., como cabeça-de-casal, podendo ela usar, mesmo contra os herdeiros, das acções possessórias. Determinante, todavia, é a circunstância de, aderindo ao entendimento de Capelo de Sousa, considerarmos, no que concerne ao cônjuge e demais partilhantes, que estes têm em relação à utilização da casa em questão – casa de morada de família – enquanto a partilha não esteja efectuada, os mesmos direitos e obrigações que tinham em vida do falecido, por analogia do que dispõe o nº 1 do art. 2074 do CC.
Isto independentemente da expectativa da A. poder vir a tornar-se titular do direito de propriedade ou, se assim não for, do direito de habitação do imóvel.
Deste modo, sendo aquela a casa da A. – onde viveu com o seu falecido marido desde 1986 – pode continuar a ali residir, nos termos em que anteriormente o fizera, detendo a posse da casa nos limites do antes sucedia.”
Em conclusão, estando provado que o Apelante residia gratuitamente na fração dos autos, com autorização da falecida, o mesmo tem o direito de aí continuar a residir até à liquidação integral e partilha da herança sem que esteja obrigado ao pagamento de qualquer valor pela ocupação da fração.
Assim, na procedência das conclusões do Apelante, impõe-se a procedência do recurso e, consequentemente, a revogação da sentença recorrida.
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4. Decisão.
Pelo exposto, acordam os juízes deste coletivo da 8ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar procedente a apelação e, em consequência, decidem:
a) - Revogar a sentença sob recurso.
b) - Absolver o Réu/Apelante dos pedidos.
c) Condenar o Autor/Apelado nas custas da ação e do recurso.
Notifique.