PROCEDIMENTO CAUTELAR
RISCO DE LESÃO GRAVE E DIFICILMENTE REPARÁVEL
Sumário


1 – Tanto a gravidade da lesão como a sua difícil reparabilidade são aferidas pela respetiva repercussão na esfera jurídica do requerente do procedimento cautelar.
2 – A manifesta improcedência a que se referem os artigos 226º, nº 4, al. b), e 590º, nº 1, do CPC, consubstancia uma situação de evidente falta de pressupostos de facto ou de direito indispensáveis ao exercício do direito.
3 – A capacidade económica do requerido para reparar os danos causados ao requerente não é um elemento essencial ou decisivo para apreciar o requisito do periculum in mora. Isto porque a finalidade das providências cautelares é obviar aos prejuízos decorrentes da demora na obtenção da tutela definitiva.

Texto Integral


Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

I – Relatório

1.1. EMP01..., Unipessoal, Lda., instaurou procedimento cautelar comum contra AA e BB, pedindo que «seja:

a) Designado dia e hora para abertura da garagem onde se encontra armazenado o stock pertencente à requerente, sita na Rua ..., ... ... ..., ..., propriedade do 2º Requerido, para remoção de todo o material (stock) pertencente à requerente e realização de inventário;
b) Designado dia e hora para abertura da garagem do 1º Requerido, sita na Rua ..., ..., ..., para remoção de todo o material (stock) pertencente à requerente e realização de inventário;
c) Seja ordenada a entrega do livro de atas e documentos contabilísticos da requerente ao 1º Requerido.
Para tanto, nos termos do art.366º nº1 do CPC deverá proceder-se ao julgamento da presente providência, sem a audição prévia dos requeridos, uma vez que se frustrará a utilidade da medida.»
Para o efeito, alega que a Requerente foi constituída em 05.01.2018 e tinha como única sócia CC, sendo nomeado gerente o 1º Requerido.
Desde a data da constituição da Requerente que foi acordado com o 2º Requerido que o stock (vinho, azeite, cerveja, entre outros) e máquinas da sociedade ficariam armazenados numa garagem do mesmo, sita na Rua ..., ..., ..., ....
Na sequência de desinteligências entre o 1º Requerido e a sócia da Requerente, esta destituiu o 1º Requerido como gerente em 12.01.2024, nomeando como gerente DD.
Desde janeiro de 2024 que a sócia da Requerente solicitou reiteradamente ao 2º Requerido que lhe facultasse acesso à garagem para aceder ao stock ali existente e o inventariar, ao que aquele nunca acedeu.
Por outro lado, a mesma sócia teve conhecimento, através de fornecedores, que o 1º Requerido igualmente solicitara entrega de stock na sua habitação, sita na Rua ..., ..., ....
Entretanto, em 07.03.2024 CC cedeu a quota de que era titular a DD, que passou a ser o único sócio e gerente, qualidades em que solicitou o acesso ao armazém do 2º Requerido, até porque alguns fornecedores pretenderiam reaver máquinas que ali estavam, ao que o 2º requerido respondeu que só autorizaria a remoção das máquinas com autorização do 1º Requerido.
De igual modo, solicitou insistentemente a entrega do livro de atas e elementos contabilísticos referentes a 2018, tendo o contabilista referido que tais elementos se encontrariam em poder do 1º Requerido, que os não entrega, tal como recusa receber/assinar certidão de notificação judicial avulsa.
Afirma a Requerente ter conhecimento de que o 1º Requerido continua a dissipar o stock da Requerente, impedindo a última de prosseguir a sua atividade, havendo inclusive informação de que o 1º Requerido constituiu sociedade com o mesmo CAE da Requerente na mesma freguesia, tornando possível que esteja o stock a ser encaminhado para a atividade de tal sociedade.

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1.2. O Tribunal convidou a Requerente a «explicitar os bens que integram o stock, bem como os concretos equipamentos que estarão armazenados na garagem do 2º requerido, indicando, ainda que por estimativa, o respetivo valor», tendo a Requerente respondido a essa solicitação no requerimento com a referência ...35.
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1.3. Por despacho 04.07.2024, foi o procedimento cautelar indeferido liminarmente.
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1.4. Inconformada, a Requerente interpôs recurso de apelação daquela decisão, formulando as seguintes conclusões:
«I. A Recorrente nos autos à margem melhor identificada, notificada da Douta Sentença, não se conforma com a mesma;
II. Entendeu o Doutro Tribunal a quo que “(..)a providência é decretada desde que haja probabilidade séria da existência do direito e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão”.
III. Assim sendo, o requerente deve deduzir os factos que tornam provável, não apenas a existência do direito, mas também o justo receio invocado. O justo receio, que corresponde e absorve o “periculum in mora”, traduz-se num comportamento ou situação de facto que faça perigar o direito do requerente (do requerente e não de outrem) de forma grave e dificilmente reparável enquanto este recorre aos meios processuais comuns.
IV. No caso vertente, para fundamentar o justo receio, o requerente não chegou a esclarecer qual é, efetivamente, o seu receio, pois que se tudo apontava para que o seu receio fosse o de dissipação do stock e o impacto na atividade da requerente. Mas a verdade é que nada é dito quanto à (in)capacidade da requerente adquirir novo stock para o normal prosseguimento da sua atividade, menos ainda sobre a (in)capacidade dos requeridos a ressarcirem dos prejuízos decorrentes da recusa de franquear o acesso ao stock e/ou à dissipação deste.
V. O mesmo se diga dos equipamentos pertencentes a terceiros, pois que sequer se vislumbra (porque não alegado) em que medida a falta de entrega dos equipamentos lhe possa causar prejuízos diretamente a si.
VI. Também nada indica que esteja em causa stocks e equipamentos escassos e dificilmente repostos, pelo que não pode ter-se por fundado o justo receio que torne justificável contornar as delongas que uma ação comum pudesse acarretar.
VII. (...) Dito de outro modo, mesmo que haja uma lesão grave, não se justificará a intervenção cautelar se ela for reparável. E a respeito aponta a doutrina, maxime José Lebre de Freitas, que lesão grave ou dificilmente reparável é a que represente um excesso de risco/ou, risco acrescido inerente à pendência de qualquer ação (leia-se, definitiva).
VIII. Ora, salvo melhor entendimento, considero que os factos alegados, apesar de poderem consubstanciar lesão do direito da requerente, não se revelam dificilmente reparáveis, pelo menos nada de concreto é alegado a respeito.
IX. Com efeito, e apesar de ser equacionável a dissipação do stock e equipamentos, a verdade é que nada é alegado quanto à impossibilidade de ressarcimento dos danos decorrentes de tal conduta, sendo que, pelo menos aparentemente, ambos os requeridos até serão proprietários de bens imóveis, donde difícil seria concluir não terem património para ressarcir a requerente dos danos que afirma ter sofrido(...)
X. O mesmo se diga quanto à recusa de entrega do livro de atas e documentos contabilísticos respeitantes a 2018, relativamente ao que – e não se questionando o interesse da requerente em a eles aceder - não se percebe qual possa ser o periculum in mora ou a lesão grave e dificilmente reparável (porque, mais uma vez, nada é concretizado, limitando-se a requerente a aventar a possibilidade de lhes ser dado descaminho, o que não concretiza de modo algum e se afigura excessivo concluir como provável da mera recusa de entrega).
XI. Pelo exposto, considera-se que não se verifica um dos dois requisitos positivos para o decretamento de qualquer providência: existência de fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável do direito invocado, o que, per si, leva necessariamente ao indeferimento liminar do presente procedimento cautelar comum.
XII. No caso da entrega do livro de atas e dos elementos contabilísticos referentes ao exercício de 2018, dir-se-á que, em rigor, a pretensão esgotaria aquela que é a finalidade da ação de apresentação de coisas ou documentos, prevista no artigo 1045º e ss. do CPC, não podendo o procedimento cautelar esgotar, como sucederia, o objeto da ação principal, sob pena de tornar possível a atribuição de natureza por mera opção processual da parte.
XIII. Face ao exposto e sem necessidade de ulteriores considerações, indefere-se liminarmente o presente procedimento cautelar comum por não estarem reunidos os legais pressupostos.”
XIV. Entende a Recorrente que o Tribunal recorrido fez uma errónea interpretação da factualidade por si alegada.
XV. Porquanto, a Recorrente, alegou no seu Requerimento Inicial que “além do exposto, tem a Requerente conhecimento de que o anterior gerente, 1ºRequerido, tem vindo a dissipar continuamente o stock.”
XVI. Especificando também que “causando grandes prejuízos para a sociedade porquanto todo o stock que detinha se encontra armazenado no local, não podendo prosseguir a sua atividade sem o mesmo (negrito e sublinhado nosso).”
XVII. E que “(...) conforme já foi supra descrito, tem a aqui Requerente conhecimento de que o 1º Requerido tem vindo a dissipar stock pertencente à sociedade, mesmo após a sua destituição de gerente (...)”.
XVIII. E no ponto 40 conclui com a alegação “tem a aqui Requerente fundado receio de que o 1º Requerido, antes da ação ser proposta ou mesmo na sua pendência, dissipe todo o stock ainda existente, causando lesão grave e dificilmente reparável para a sociedade requerente.”
XIX. A Recorrente juntou ainda com o requerimento inicial certidão de notificação judicial avulsa em que é mencionado, por diversas vezes, que foram os requeridos interpelados por diversas vezes para entrega do livro de atas e documentos contabilísticos relativos ao ano de 2018.
XX. Inclusive, encontra-se até ao momento impedida de inserir deliberações no referido livro.
XXI. Bem como para permitir o acesso ao armazém onde se encontra armazenada a maior parte do stock da Recorrente.
XXII. Requerendo-se a notificação judicial avulsa do 2º Requerido para que procedesse a tais atos, o que não aconteceu porquanto o mesmo nem assinou a certidão e procedeu ao seu levantamento.
XXIII. Tendo ainda mencionado na factualidade alegada que “o 1º Requerido constituiu sociedade com o mesmo CAE da requerente, na mesma freguesia.
XXIV. Pelo que desconhece até se poderá estar a ser utilizado o seu stock para utilização da nova sociedade do 1º Requerido.”
XXV. E ainda, após notificação de despacho datado de 28.06.2024, a solicitar indicação do material que se encontrava armazenado nas referidas garagens, bem como valor indicatório do mesmo, a Requerente fez a questão de mencionar que teria tido conhecimento que alguns dos produtos continuam a ser comercializados em alguns estabelecimentos comerciais, tais como o estabelecimento comercial “EMP02...”, sito em ..., desconhecendo-se a quem se encontram a ser efetuados os pagamentos.
XXVI. Porquanto o rótulo dos mesmos especifica serem os mesmos comercializados pela sociedade Requerente.
XXVII. Ora, entende a Recorrente que deveria o Tribunal a quo ter tomado em consideração todos os factos por si alegados, bem como ter em consideração todas as provas carreadas para os autos, nos termos do disposto nos arts.5º nº2 al.b) e 413º do C.P.C.
XXVIII. No entanto, foi considerado, erroneamente (negrito e sublinhado nosso), pelo Tribunal recorrido que nada de concreto é alegado a respeito da lesão poder ser considerada dificilmente reparável.
XXIX. O que, conforme já foi descrito, não corresponde à realidade.
XXX. E assim, ao invés do Tribunal considerar tais factos, optou por indeferir liminarmente o procedimento cautelar, sem fornecer possibilidade de produção de prova, nomeadamente de prova testemunhal requerida pela Recorrente, nem formulando convite ao aperfeiçoamento.
XXXI. Não poderia o Tribunal a quo sustentar o indeferimento liminar do procedimento cautelar justificando com falta de alegação de matéria de facto quanto à incapacidade da Recorrente vir a adquirir novo stock, bem como relativamente aos danos causados pela retenção das máquinas armazenadas nas garagens dos requeridos, apenas para concluir pela improcedência do procedimento.
XXXII. Caso dúvidas houvesse relativamente à lesão grave e irreparável alegada pela Recorrente, nomeadamente pela sua incapacidade em adquirir novo stock e prosseguir a sua atividade económica.
XXXIII. Não obstante tal facto ter sido aflorado nos pontos 23, 25, 26, 27, 28, 35, 39 e 40 do requerimento inicial.
XXXIV. E, atendendo que a sociedade em causa é uma sociedade unipessoal, com volume de negócios reduzido, seria facilmente percetível que, alegando a mesma ser impossível prosseguir a sua atividade económica sem o material que se encontra armazenado nas ditas garagens, não detém capacidade económica para adquirir novo stock.
XXXV. Bem como no que às máquinas diz respeito, refere o doutro Tribunal a quo que “(...) o mesmo se diga dos equipamentos pertencentes a terceiros, pois sequer se vislumbra (porque não alegado) em que medida a falta de entrega dos equipamentos lhe possa causar prejuízos diretamente a si.”
XXXVI. Uma vez mais, fez o Tribunal a quo uma interpretação errada da factualidade alegada pela Recorrente.
XXXVII. Porquanto a Recorrente não menciona que os equipamentos armazenados nas referidas garagens são de terceiros.
XXXVIII. Refere apenas no requerimento inicial que “o atual gerente solicitou ao proprietário do armazém que diligenciasse no sentido de proceder à abertura do mesmo.”
XXXIX. “Porquanto os fornecedores pretendiam reaver algumas máquinas que se encontravam no mesmo.
XL. Tendo o 2º Requerido procedido à abertura para remoção das mesmas sem conhecimento da Requerente, referindo que só permitiria a remoção do stock com autorização do anterior gerente, aqui 1º Requerido.”
XLI. Em momento alguma a Recorrente especificou e mencionou que as máquinas que se encontram armazenadas atualmente nas ditas garagens são propriedade de terceiros.
XLII. Inclusive, notificada de despacho datado de 28.06.2024 para explicitar os bens que integram o stock, bem como os concretos armazenados na garagem do 2º requerido, indicando, ainda que por estimativa, o respetivo valor.
XLIII. A recorrente juntou o último inventário conhecido e especificou estarem armazenadas no local diversas máquinas de fino, porta paletes, paletes, manípulos e equipamentos de máquinas de fino, entre outros, que se depreende serem sua propriedade.
XLIV. Ora, sendo a Recorrente uma sociedade cujo objeto é o comércio por grosso e a retalho de bebidas alcoólicas e produtos alimentares, facilmente se verifica que a mesma tem a sua atividade impedida porquanto as suas máquinas e todo o seu stock se encontram “presos” nas garagens dos requeridos.
XLV. Assim, uma vez mais, caso tal não se depreendesse da factualidade alegada pela Recorrente, estando em causa o direito de propriedade da Requerente sobre todos os bens armazenados no local, deveria a mesma ter sido convidada ao aperfeiçoamento do requerimento inicial, ao abrigo dos princípios da economia processual, da cooperação e do inquisitório.
XLVI. Ao invés de indeferir liminarmente o procedimento cautelar comum, deveria o Tribunal a quo ter convidado a Recorrente ao aperfeiçoamento do requerimento inicial.
XLVII. Entendendo que, independentemente do fim e do destino do stock, mencionado mesmo que “apesar de ser equacionável a dissipação do stock e equipamentos (...)” poderá vir a surgir o respetivo direito de crédito na esfera jurídica da requerente, o que não se admite.
XLVIII. O receio da requerente recai sobre o direito de propriedade do seu stock e das máquinas que se encontram armazenadas nos locais sitos nas propriedades dos requeridos ao invés de uma eventual cobrança de um crédito.
XLIX. Até porque, entende a Requerente que caso se aguarde até ser proferida sentença em ação principal, poderá já não existir qualquer material em stock.
L. Sendo muito difícil de provar o que se encontrava armazenado no local e que foi dissipado e continua a ser pelo 1ª Requerido.
LI. Podendo nem sequer lhe vir a ser reconhecido qualquer direito indemnizatório, a esse título, sendo, uma vez mais, causada lesão grave e irreparável na esfera jurídica da sociedade aqui Recorrente.
LII. Pelo que só a abertura urgente dos mesmos, de modo a salvaguardar alguns bens que ainda se encontrem armazenados e realizar inventário atual (para verificar se será possível demonstrar na ação principal a dissipação, de forma a acautelar um possível direito indemnizatório), de forma a permitir que a sociedade possa voltar novamente ao ativo, pode amenizar a lesão grave que a Requerente se encontra a sofrer.
LIII. Inclusive, encontrando-se a sociedade Recorrente parada há mais de meio ano, sem vender, porquanto não detém stock nem máquinas, principalmente agora em época de Verão (altura em que o volume negocial será mais elevado) acarreta um prejuízo enorme para a mesma.
LIV. Causando ainda elevada confusão nos clientes, porquanto o 1º Requerido se encontra a vender na mesma região, o vinho ..., que até há data era comercializado pela sociedade Requerente.
LV. Podendo originar que os referidos clientes nunca mais mantenham relações comerciais com a Recorrente.
LVI. Inclusive até porque tem vindo constantemente a ser questionada pelos mesmos clientes se se encontra encerrada, o que já por si demonstra que caso a situação se mantenha, a sociedade (além de já se encontrar em deficiente situação económica) poderá ter que acabar mesmo por encerrar atividade, causando lesão grave e irreparável.
LVII. O que a Recorrente pretende acautelar não é puramente um direito de crédito, pelo que não faria qualquer sentido fazer menção à situação económica dos Requeridos.
LVIII. Assim, admitir que os titulares do direito de propriedade, que se encontram na iminência de sofrer uma lesão grave e irreparável (como é o caso, porquanto a sociedade Recorrente se encontra impedida de continuar a vender, há mais de 7/8 meses, na medida em que não detém acesso ao stock por si adquirido, nem detém atualmente capital para adquirir novo stock e mesmo que o detivesse causaria um prejuízo irreparável ter que adquirir tudo de novo) tenham que aguardar sem mais por uma decisão na ação principal, pedindo depois apenas uma indemnização no valor dos danos, é atribuir aos Requeridos um beneficio sem qualquer justificação possível.
LIX. A decisão recorrida parte de uma premissa errada, na qual estão em causa direitos de crédito, podendo a recorrente ser ressarcida da eventual dissipação de stock.
LX. A Recorrente pretende acautelar, com os presentes autos, o direito à restituição do stock que lhe pertence, ou seja, o seu direito de propriedade sobre os bens que se encontram armazenados no interior dos referidos armazéns.
LXI. Sendo que o periculum in mora deve ser analisado e apreciado relativamente a esse direito de propriedade e não relativamente a qualquer direito que a este possa suceder ou substituir, como seria o direito à indemnização pelos prejuízos que têm vindo e possam vir a surgir da não abertura dos armazéns.
LXII. Não deve ser imposto à Recorrente o sacrifício do seu direito real por uma substituição involuntária pela indemnização, não lhe cabendo pronunciar-se, nestes moldes, sobre a possibilidade de a Recorrente obter um valor que a compense da privação do stock e dos prejuízos que daí advêm.
LXIII. Mas ao invés cabe ao Tribunal decidir se a tutela provisória do direito real está justificada.
LXIV. Com o entendimento do Tribunal a quo estar-se-ia a esvaziar de conteúdo o procedimento cautelar comum, conferindo tutela à Recorrente apenas quando existisse o risco de a lesão que se pretende evitar não poder ser satisfeita pela via indemnizatória.
LXV. A posição dos requeridos, de recusa de entrega do stock e dos documentos contabilísticos à Recorrente, única e exclusiva proprietária dos mesmos, apesar de não deterem qualquer título que legitime a sua posse e utilização, constitui uma ameaça fundada na lesão grave e dificilmente reparável do direito de propriedade da Recorrente, estando assim demonstrada a existência do periculum in mora.
LXVI. Sendo que, como resulta da factualidade alegada, e bem assim da experiência comum, a dissipação do stock pelo 1ºRequerido a até a possível e contínua venda do mesmo em nome da sua nova sociedade, implica grave prejuízo para a sociedade recorrente que está a ver todo o seu stock a ser dissipado por um terceiro, encontrando-se impedida de prosseguir a sua atividade económica.
LXVII. Toda a factualidade alegada no requerimento inicial, bem como na notificação judicial avulsa junta, permite concluir pela existência de uma ameaça fundada de lesão grave e dificilmente reparável do direito de propriedade da Recorrente, que se pretende acautelar, pelo que mal andou o Tribunal a quo ao indeferir liminarmente a presente providência cautelar, violando o disposto nos arts. 362º do CPC e 1305º CC.
LXVIII. E no que à entrega do livro de atas, diz respeito, mais uma vez o Tribunal a quo fez uma interpretação errada da factualidade.
LXIX. Na medida em que é referido que “ o mesmo se diga quanto à recusa de entrega do livro de atas e documentos contabilísticos respeitantes a 2018, relativamente ao que – e não se questionando o interesse da requerente em a eles aceder - não se percebe qual possa ser o periculum in mora ou a lesão grave e dificilmente reparável (porque, mais uma vez, nada é concretizado, limitando-se a requerente a aventar a possibilidade de lhes ser dado descaminho, o que não concretiza de modo algum e se afigura excessivo concluir como provável da mera recusa de entrega).
LXX. Ora, no que ao periculum in mora diz respeito, uma vez mais, a requerente alegou no requerimento inicial, nos pontos 17 a 22 que já havia solicitado por diversas vezes a entrega do livro de atas e dos documentos contabilísticos, nomeadamente através de notificação judicial avulsa junta aos autos, continuando o 2º Requerido a não proceder à entrega dos mesmos.
LXXI. Alegando ainda no ponto 41 do requerimento inicial que “tem receio a Requerente que na pendência da ação principal o 1º Requerente altere ou até faça desaparecer o livro de atas e os documentos contabilísticos em falta.”
LXXII. Assim, da factualidade alegada resulta totalmente demonstrado que o receio da Recorrente será sempre que o 1ªRequerido altere ou faça desaparecer os documentos em causa.
LXXIII. Causando uma lesão grave e irreparável porquanto não é o valor indemnizatório possível de reparar este tipo de lesão, na medida em que a sociedade Recorrente ficará sempre a desconhecer o conteúdo do livro de atas e as assinaturas que poderão constar no mesmo, porquanto a anterior sócia alega nunca ter assinado qualquer ata nem lhe ter sido dados tais documentos a conhecer.
LXXIV. Bem como tem vindo constantemente a ser prejudicada pela falta de livro de atas, na medida em que, por exemplo, para alterar o pacto social da sociedade foi exigida a exibição do mesmo, sendo que a sociedade Recorrente não o detém e não pôde efetuar o ato pela sua falta.
LXXV. Inclusive após instaurar o procedimento cautelar aqui em causa, teve a sociedade Requerente informada que poderá ser prejudicada a sociedade e o seu sócio/gerente, a nível fiscal/segurança social, pela ausência do referido livro.
LXXVI. Causando uma lesão grave e irreparável porquanto não é o valor indemnizatório possível de reparar este tipo de lesão, na medida em que a sociedade Recorrente ficará sempre a desconhecer o conteúdo do livro de atas e as assinaturas que poderão constar no mesmo, porquanto a anterior sócia alega nunca ter assinado qualquer ata nem lhe ter sido dados tais documentos a conhecer.
LXXVII. Neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de 24.10.2023 (Processo nº 14487/23.0T8LSB.L1-7), citando Alberto dos Reis refere que “Convém, evidentemente, que a justiça seja pronta; mas, mais do que isso, convém que seja justa; O problema fundamental da política processual consiste exatamente em saber encontrar o equilíbrio razoável entre as duas exigências: a celeridade e a justiça (...) Mas essa demora pode, em certas circunstâncias, criar um estado de perigo, porque pode expor o titular do direito a danos irreparáveis; pode, na verdade suceder que até à altura da emanação da decisão final se produzam ocorrências graves, suscetíveis de comprometer a utilidade e eficácia da sentença.
LXXVIII. A função das providências cautelar consiste justamente em eliminar o periculum in mora, em defender o presumido titular do direito contra os danos e prejuízos que lhe pode causar a formação lenta e demorada da decisão definitiva.”
LXXIX. E no mesmo Acórdão cita-se Abrantes Geraldes, que diz que “o juiz deve convencer-se da gravidade da seriedade da situação invocada pelo requerente e da carência de uma forma de tutela que permita pô-lo a salvo dos danos futuros. A gravidade da lesão previsível deve ser aferida tendo em conta a repercussão que determinará na esfera jurídica do interessado.”
LXXX. Referindo ainda o dito Acórdão que “admitindo o tribunal recorrido que os factos alegados não são suficientemente explícitos, designadamente quanto a datas, pode/deve fazer atuar o mecanismo que o art.º590, nº4, do CPC.
LXXXI. E com o mesmo entendimento, encontramos o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 25.06.2019 (Processo nº 641/19.2T8F1G.C1) que “na verdade, já se entendeu (...) que decidindo no liminar, havendo outra corrente jurisprudencial expressiva que permitia que a providência viesse a ser decretada a final, está o julgador a cortar, desde logo, qualquer hipótese de mais tarde, produzidas as provas, poder decidir segundo essa outra corrente, no caso de, entretanto, ter mudado o seu entendimento, hipótese que sempre é bom deixar em aberto; depois, não sabe o julgador, na ocasião do liminar, se vai ser ele quem vai decidir a providência, podendo dar-se o caso de o decisor (o próprio ou outro) enfileirar na corrente que permita, em face da prova que se haja produzido, viabilizar a pretensão;
LXXXII. Por último, mas com decisiva importância, o indeferimento liminar da petição, sendo dele interposto recurso, irá dar azo a uma inevitável demora na obtenção da solução da pretensão da requerente – o que assume maior relevo, no âmbito de um procedimento cautelar, que se quer célere -, pois nesse caso, caso a Relação discorde do assim entendido, os autos terão de baixar para prosseguirem na 1ª Instância, o que não sucederia se, ainda que, mantendo o entendimento inicial, o julgador da 1ª Instância viesse, de acordo com ele, a final, a indeferir a providência, pois nesta última hipótese, já poderia a Relação, aproveitando a prova produzida, proferir decisão definitiva sobre a matéria fosse o seu entendimento coincidente ou não com o do Tribunal “a quo”.
LXXXIII. Estando os procedimentos cautelares sujeitos a despacho liminar do juiz (cf. O art.º 226, n.º4, alínea b) do CPC), tal despacho, sendo de indeferimento da petição, deve assentar num dos fundamentos legais que permitem ao Tribunal essa rejeição, sendo que, de harmonia com o disposto no art.º 590º do CPC a petição é indeferida quando o pedido seja manifestamente improcedente ou ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva conhecer oficiosamente, aplicando-se o disposto no artigo 560º.
LXXXIV. Daí que se considere prematuro que a 1ª Instância faça valer, logo na fase liminar do procedimento, o entendimento que tem sobre (a) irrelevância do alegado pela requerente para preenchimento do requisito do “periculum in mora”, indeferindo “in limine”, a providência, quando existe interpretação legal seguida por corrente jurisprudencial expressiva contrária a esse entendimento e que, impedindo alicerçar esse indeferimento na inviabilidade manifesta do pedido, era susceptível de permitir o futuro acolhimento da pretensão da Requerente, sendo pois mais razoável e adequado o prosseguimento do procedimento cautelar, inclusive, com o eventual convite ao aperfeiçoamento da petição permitindo à requerente alegar novos factos que melhor explicitem os já invocados (...) e porventura outros que também suportem a sua pretensão no âmbito de um diverso/contrário entendimento que se anteveja igualmente plausível.”
LXXXV. Menciona ainda a sentença recorrida que “no caso da entrega do livro de atas e dos documentos contabilísticos referentes ao exercício de 2018, dir-se-á que, em rigor, a pretensão esgotaria aquela que é a finalidade da ação de apresentação de coisas ou documentos, prevista no artigo 1045º e ss. Do CPC, não podendo o procedimento cautelar esgotar, como sucederia, o objeto da ação principal, sob pena de tornar possível a atribuição de natureza por mera opção processual da parte.”
LXXXVI. Ora, a providência solicitada pela Recorrente é antecipatória, no entanto tal não significa a desnecessidade de instaurar a ação definitiva, sendo que nessa mesma ação se pedirá também indemnização pelos prejuízos decorrentes do tempo em que a Recorrente se viu privada dos seus bens, entre outros.
LXXXVII. Mais uma vez, neste sentido, tem vindo a ser entendimento jurisprudencial, conforme observamos no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24.10.2023 supracitado, “o nosso sistema permite, como referido, que, através de providências cautelares, se decretem medidas com efeitos antecipatórios da decisão definitiva, sem que daí resulte a descaracterização do procedimento cautelar, nomeadamente, no que respeita à sua natureza instrumental em relação à ação principal. Apesar de antecipatórias dos efeitos jurídicos, estas providências cautelares não deixam de ter a característica de provisoriedade dos procedimentos cautelares, na medida em que se destinam a ser substituídas pela decisão que vier a resultar da ação principal de que depende.
LXXXVIII. (...) O objeto da providência cautelar não é a situação jurídica acautelada ou tutelada, mas, consoante a sua finalidade, a garantia da situação, a regulação provisória ou a antecipação da tutela que for requerida no respetivo procedimento ... Mas esta distinção também se justifica quando a providência cautelar antecipa a tutela jurisdicional: neste caso, o objeto da providência não é a situação cuja tutela antecipa, mas a própria antecipação da tutela para essa situação. É por isso que, mesmo nesta eventualidade, o decretamento da providência não retira o interesse processual à solicitação da tutela definitiva ...”
LXXXIX. O Tribunal recorrido fez uma interpretação errada de toda a factualidade, alegada no requerimento inicial, que permite concluir pela existência de uma ameaça fundada de lesão grave e dificilmente reparável do direito de propriedade da Requerente.
XC. Pelo que mal andou o Tribunal a quo ao indeferir liminarmente o presente procedimento cautelar, violando o disposto nos arts. 362º, 363º, 364º, 367º, 373º, 374º, 375º do CPC e 1305º do CC.

NESTES TERMOS E NOS DEMAIS DE DIREITO APLICÁVEL, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE E, EM CONSEQUÊNCIA:
1) SER REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA E SUBSTITUÍDA POR DECISÃO QUE ORDENE O NORMAL PROSSEGUIMENTO DOS AUTOS DE PROCEDIMENTO CAUTELAR ATÉ FINAL.»
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Cumprido o disposto no artigo 641º, nº 7, do CPC, os Recorridos não apresentaram contra-alegações.
A Requerente desistiu do pedido quanto ao 2º Requerido, BB.
Tendo a desistência do pedido sido judicialmente homologada, o objeto do recurso passa a circunscrever-se à causa de pedir e pedido deduzido contra o 1º Requerido.
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1.5. Questões a decidir

Atentas as conclusões do recurso, as quais delimitam o seu objeto (artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC), sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, a única questão a decidir consiste em saber se, em face do quadro factual alegado pela Requerente, se justificava o indeferimento liminar do procedimento cautelar com fundamento na sua manifesta improcedência. Trata-se no fundo de apurar se é (ou não) de concluir, face ao alegado no requerimento inicial, pela verificação do segundo requisito das providências requeridas: o fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável ao direito da Requerente.
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II – Fundamentos

2.1. Fundamentação de facto
Os factos que relevam para a apreciação do objeto do recurso são os que resultam do precedente relatório, para os quais se remete, e ainda os seguintes, emergentes de atos praticados no processo:
2.1.1. No requerimento inicial, no que respeita ao requisito do “justo e fundado receio de lesão grave e de difícil reparação”, a Requerente alegou:
«31. Ora, com o devido respeito por melhor opinião, dúvidas não parece haver de que o stock pertencente à sociedade aqui requerente se encontra armazenado na garagem propriedade do aqui 2ºRequerido, bem como na sua habitação.
32. Sendo de conhecimento geral tais factos.
33. Devendo ser considerado como direito da Requerente o acesso ao stock que foi adquirido com capitais da mesma e que é sua propriedade.
34. Bem como o acesso ao livro de atas da mesma e documentos contabilísticos.
35. Pelo que, quanto à propriedade dos referidos bens, parece não haver dúvidas.
36. Bem como quanto à procedência da pretensão da requerente em remover os bens que são de sua propriedade da garagem e dos locais em que foram armazenados, colocando em causa o seu direito de propriedade, bem como a manutenção da sua atividade.
(…)
38. Além da provável existência do direito, tem ainda que se mostrar suficientemente fundado o receio da sua lesão (o periculum in mora).
39. Ora, conforme já foi supra descrito, tem a aqui Requerente conhecimento de que o 1º Requerido tem vindo a dissipar stock pertencente à sociedade, mesmo após a sua destituição de gerente da mesma.
40. Tem a aqui Requerente fundado receio de que o 1ºRequerido, antes de ação ser proposta ou mesmo na sua pendência, dissipe todo o stock ainda existente, causando lesão grave e dificilmente reparável para a sociedade requerente.
41. Bem como tem receio a Requerente que na pendência da ação principal o 1º Requerente altere ou até faça desparecer o livro de atas e os documentos contabilísticos em falta. (…)».
2.1.2. A decisão recorrida, proferida em 04.07.2024, na parte relevante para a apreciação dos fundamentos da apelação, tem o seguinte teor:
«(…) No caso vertente, para fundamentar o justo receio, o requerente não chegou a esclarecer qual é, efetivamente, o seu receio, pois que se tudo apontava para que o seu receio fosse o da dissipação do stock e o impacto na atividade da requerente. Mas a verdade é que nada é dito quanto à (in)capacidade da requerente adquirir novo stock para o normal prosseguimento da sua atividade, menos ainda sobre a (in)capacidade dos requeridos a ressarcirem dos prejuízos decorrentes da recusa de franquear o acesso ao stock e/ou à dissipação deste.
O mesmo se diga dos equipamentos pertencentes a terceiros, pois que sequer se vislumbra (porque não alegado) em que medida a falta de entrega dos equipamentos lhe possa causar prejuízos diretamente a si.
Também nada indica que esteja em causa stocks e equipamentos escassos e dificilmente repostos, pelo que não poder ter-se por fundado o justo receio que torne justificável contornar as delongas que uma ação comum pudesse acarretar.
É que, para o procedimento cautelar comum (e é precisamente esse o que está em causa nos presentes autos) o legislador foi bem mais exigente (e, portanto, mais restritivo) na formulação do requisito do periculum in mora do que, em geral, para os procedimentos cautelares específicos: enquanto que para estes basta que se verifique “dano apreciável”, “justificado receio de perda da garantia patrimonial do crédito”, “justo receio de extravio ou dissipação de bens”, etc., para o primeiro não basta uma qualquer lesão, é preciso que se esteja perante uma lesão grave e dificilmente reparável do direito.
Dito de outro modo, mesmo que haja uma lesão grave, não se justificará a intervenção cautelar se ela for reparável. E a respeito a ponta a doutrina, maxime José Lebre de Freitas, que lesão grave e dificilmente reparável é a que represente um excesso de risco/ou risco acrescido inerente à pendência de qualquer ação (leia-se, definitiva).
Ora, salvo melhor entendimento, considero que os factos alegados, apesar de poderem consubstanciar lesão do direito da requerente, não se revelam dificilmente reparáveis, pelo menos, nada de concreto é alegado a respeito.
Com efeito, e apesar de ser equacionável a dissipação do stock e equipamentos, a verdade é que nada é alegado quanto à impossibilidade de ressarcimento dos danos decorrentes de tal conduta, sendo que, pelo menos aparentemente, ambos os requeridos até serão proprietários de bens imóveis, donde difícil seria concluir não terem património para ressarcir a requerente dos danos que afirma ter sofrido (os quais, repete-se, sequer são percetíveis no que tange aos equipamentos de terceiros).
O mesmo se diga quanto à recusa de entrega do livro de atas e documentos contabilísticos respeitantes a 2018, relativamente ao que – e não se questionando o interesse da requerente em a eles aceder – não se percebe qual possa ser o periculum in mora ou a lesão grave e dificilmente reparável (porque, mais uma vez, nada é concretizado, limitando-se a requerente a aventar a possibilidade de lhes ser dado descaminho, o que não concretiza de modo algum e se afigura excessivo concluir como provável da mera recusa de entrega).
Pelo exposto, considera-se que não se verifica um dos dois requisitos positivos para o decretamento de qualquer providência: existência de fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável do direito invocado, o que, per si, leva necessariamente ao indeferimento liminar do presente procedimento cautelar comum.
No caso da entrega do livro de atas e dos elementos contabilísticos referentes ao exercício de 2018, dir-se-á que, em rigor, a pretensão esgotaria aquela que é a finalidade da ação de apresentação de coisas ou documentos, prevista no artigo 1045º e ss. do CPC, não podendo o procedimento cautelar esgotar, como sucederia, o objeto da ação principal, sob pena de tornar possível a atribuição de natureza por mera opção processual da parte.
Face ao exposto e sem necessidade de ulteriores considerações, indefere-se liminarmente o presente procedimento cautelar comum por não estarem reunidos os legais pressupostos.»
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2.2. Do objeto do recurso
Os procedimentos cautelares, nos termos do artigo 2º, nº 2, do CPC, destinam-se a «acautelar o efeito útil da ação». Como salienta Miguel Teixeira de Sousa[1], «visam assegurar que a tutela definitiva que venha a ser atribuída a um direito ou interesse ainda possa ser útil. Os procedimentos cautelares visam obstar a que, por motivos relacionados com a demora na obtenção da tutela definitiva, a tutela jurisdicional seja inútil qd seja obtida pelo titular ou interessado.»
No caso dos autos, por estarmos perante um procedimento cautelar comum, releva, desde logo, a norma do artigo 362º, nº 1, do CPC, onde se dispõe que «sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência, conservatória ou antecipatória, concretamente adequada a assegurar a efetividade do direito ameaçado». Porém, nos termos do seu nº 3, «não são aplicáveis as providências referidas no nº 1 quando se pretenda acautelar o risco de lesão especialmente prevenido por alguma das providências tipificadas no capítulo seguinte», isto é, as providências previstas nos procedimentos cautelares nominados ou especificados e que aí podem ser tomadas.
O artigo 368º, nº 1, do CPC acrescenta que «a providência é decretada desde que haja probabilidade séria da existência do direito e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão». No nº 2 deste preceito é estabelecido um limite ao seu decretamento: «a providência pode, não obstante, ser recusada pelo tribunal, quando o prejuízo dela resultante para o requerido exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar».

Da conjugação das duas apontadas normas resulta que o decretamento de uma providência cautelar não especificada depende da verificação dos seguintes requisitos fundamentais, sendo os dois primeiros fundamentos do pedido de providência:
a) Probabilidade séria da existência do direito invocado;
b) Fundado receio de que outrem, antes de a ação ser proposta ou na pendência dela, cause lesão grave e dificilmente reparável a tal direito (periculum in mora);
c) Inexistência de providência específica que acautele aquele direito (a tutela requerida não pode ser obtida através de procedimentos cautelares tipificados).
d) O prejuízo resultante da providência não exceder o valor do dano que com ela se pretende evitar.

No caso dos autos, o procedimento cautelar foi liminarmente indeferido por se ter considerado que os factos alegados não consubstanciavam a «existência de fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável do direito invocado».
Portanto, no âmbito deste recurso, atenta a impugnação daquela decisão e a posterior desistência do pedido quanto ao 2º Requerido, tudo se resume em apurar se o quadro factual alegado preenche o requisito supra enunciado sob a alínea b), isto é, se é fundado o receio de que o 1º Requerido cause lesão grave e dificilmente reparável ao direito da Requerente.

O indeferimento liminar do procedimento cautelar só é admissível nas situações previstas no artigo 590º, nº 1, do CPC (conjugado com o artigo 226º, nº 4, alínea b), do mesmo diploma), isto é, quando «o pedido seja manifestamente improcedente ou ocorram, de forma evidente, exceções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva conhecer oficiosamente».
Segundo Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa[2], «os casos de indeferimento liminar correspondem a situações em que a petição apresenta vícios substanciais ou formais de tal forma graves que permitem antever, logo nessa fase, a improcedência inequívoca da pretensão apresentada pelo autor ou a verificação evidente de exceções dilatórias insupríveis, incluindo a ineptidão da petição».
Acrescentam os referidos autores que «mesmo quando, na intervenção liminar, o juiz se deparar com falhas de inferior gravidade, não está afastada a possibilidade de proferir despacho de aperfeiçoamento». Referem ainda que nas «situações em que se verifique imprecisão, vacuidade, ambiguidade ou incoerência de algum articulado, o juiz profere o despacho de convite ao aperfeiçoamento (…). O convite ao aperfeiçoamento procura completar o que é insuficiente ou corrigir o que é impreciso, na certeza de que a causa de pedir existe (na petição) e é perceptível (inteligível); apenas sucede que não foram alegados todos os elementos fácticos que a integram, ou foram-no em termos pouco precisos. Daí o convite ao aperfeiçoamento, destinado a completar ou a corrigir um quadro fáctico já traçado nos autos»[3].
Para Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[4], o apuramento sobre se o pedido é manifestamente improcedente faz-se casuisticamente, em função do pedido e dos seus fundamentos de facto e de direito e «sê-lo-á seguramente nos casos de caducidade de conhecimento oficioso do direito que se pretende fazer, bem como quando não possa haver dúvida sobre a inexistência dos factos que o constituiriam ou sobre a existência, revelada pelo próprio autor, de factos impeditivos ou extintivos desse direito».

No despacho recorrido considerou-se preenchido o primeiro pressuposto necessário ao decretamento das providências requeridas, mas não o segundo.
Portanto, no âmbito deste recurso, atenta a impugnação daquela decisão, importa apreciar se o quadro factual alegado torna fundado o receio de que o 1º Requerido cause lesão grave e dificilmente reparável ao direito da Requerente.
Quanto a este requisito, refere Abrantes Geraldes[5] que, «não é toda e qualquer consequência que previsivelmente ocorra antes de uma decisão definitiva que justifica o decretamento de uma medida provisória com reflexos imediatos na esfera jurídica da contra-parte. Só lesões graves e dificilmente reparáveis têm essa virtualidade de permitir ao tribunal, mediante solicitação do interessado, a tomada de uma decisão que o coloque a coberto da previsível lesão (…) o juiz deve convencer-se da seriedade da situação invocada pelo requerente e da carência de uma forma de tutela que permita pô-lo a salvo de danos futuros. A gravidade da lesão previsível deve ser aferida tendo em conta a repercussão que determinará na esfera jurídica do interessado», acrescentando mais adiante[6] que «[a] protecção cautelar não abarca apenas os prejuízos imateriais ou morais, por natureza irreparáveis ou de difícil reparação, mas ainda os efeitos que possam repercutir-se na esfera patrimonial do titular. Quanto aos prejuízos materiais o critério deve ser bem mais restrito do que o utilizado quanto à aferição dos danos de natureza física ou moral, uma vez que, em regra, aqueles são passíveis de ressarcimento através de um processo de reconstituição natural ou de indemnização substitutiva. (…) Apenas merecem a tutela provisória consentida pelo procedimento cautelar comum as lesões graves que sejam simultaneamente irreparáveis ou de difícil reparação».
Portanto, tanto a gravidade da lesão como a sua difícil reparação são aferidas pela sua repercussão na esfera jurídica do requerente do procedimento cautelar.
Como se afirma no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24.11.2020, proferido no processo 7692/20.2T8LSB-A.L1-7, relatado por José Capacete, «a providência cautelar comum, ao pressupor designadamente que haja fundado receio de que outrem antes de proferida a definitiva decisão de mérito cause lesão grave e dificilmente reparável ao direito ameaçado, implica, estando tão só em causa lesões que gerem meros prejuízos materiais, que o grau de dificuldade deva ser encontrado entre o montante desses prejuízos e a possibilidade do seu ressarcimento.
Verifica-se tal requisito (o fundado receio de lesão grave e de difícil reparação), caso estejam em causa danos de avultado montante».

No âmbito do recurso, a Apelante alega que estão reunidos todos os requisitos necessários à procedência do procedimento cautelar e distingue três categorias de bens:
- “stock”;
- “máquinas armazenadas nas garagens dos requeridos”;
- “livro de atas e documentos contabilísticos respeitantes a 2018”.

Importa apreciar separadamente cada um dessas categorias, pois o quadro factual alegado não é uniforme quanto a cada uma delas.
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2.2.1. Máquinas
Conforme bem se vê no artigo 4º do requerimento inicial, a Requerente distingue entre “stock” e “máquinas”, sendo aquele stock constituído por «vinho, azeite, cerveja, entre outros». Em vários artigos do requerimento inicial é efetuada essa distinção entre stock e máquinas – v. 8º, 10º, 14º, 16º, 21º, 23º, 25º, 27º, 31º, 33º, 39º, 40º, 45º e 48º. Mesmo no âmbito das alegações, a Apelante continua a fazer a distinção entre stock e máquinas (v., entre outras, as conclusões XLVIII e LIII, onde alega, respetivamente, «o direito de propriedade do seu stock e das máquinas que se encontram armazenadas nos locais sitos nas propriedades dos requeridos» e que «não detém stock nem máquinas»).
Sucede que o pedido deduzido apenas se refere ao stock (bem como ao livro de atas e aos documentos contabilísticos) e não às máquinas. Em lado algum a pretensão de tutela jurisdicional tem por objeto máquinas.
Além disso, invocando a Apelante que o seu objeto social é «o comércio por grosso e a retalho de bebidas alcoólicas e produtos alimentares», não se descortina como é que as «máquinas» poderiam integrar o alegado «stock» destinado a ser comercializado. Máquinas não são nem «bebidas alcoólicas» nem «produtos alimentares» e somente estes bens integram o seu comércio.
Por outro lado, não foi alegado nem se alcança qual o concreto prejuízo causado pela falta de entrega das máquinas e muito menos que tal privação seja suscetível de «causar lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito». Naturalmente que para estar preenchido o apontado requisito é necessário mais do que a simples falta de entrega ou, no dizer da Apelante, a violação do direito de propriedade. Aliás, nem sequer está alegado que a falta de entrega das máquinas impede a comercialização do stock, no caso de este lhe ser restituído no âmbito do presente procedimento cautelar.
Somente quanto ao stock é que a Requerente alegou, desde logo no artigo 25º do requerimento inicial, que causa «grandes prejuízos para a sociedade porquanto todo o stock que detinha se encontra armazenado no local, não podendo prosseguir a sua atividade sem o mesmo.» Também só quanto a esse específico objeto foi alegado no artigo 23º que «tem a Requerente conhecimento de que o anterior gerente, 1º Requerido, tem vindo a dissipar continuamente o stock.» Portanto, a questão da dissipação respeita ao stock e não às máquinas. Uma coisa é a dissipação do stock e outra é a manutenção da posse das máquinas que, ao fim e ao cabo, se ignora quais sejam, uma vez que a própria Requerente não as identifica de forma clara, precisa e inequívoca. Não deixa de ser estranho que uma sociedade não consiga identificar os seus bens ou que alegue, no âmbito do recurso, que a única sócia de uma sociedade unipessoal não tenha assinado qualquer ata da sociedade e que desconheça as atas, como se a sociedade se tenha constituído por si, sem qualquer intervenção da única pessoa singular em causa, e também tenha passado a exercer a atividade para que foi criada completamente à revelia da única sócia.
Mais, a própria Requerente alegou nos artigos 13º a 15º do requerimento inicial que, tendo o atual gerente solicitado a abertura do armazém por haver fornecedores que «pretendiam reaver algumas máquinas que se encontravam no mesmo», o 2º Requerido acabou por autorizar essa remoção, pelo que é seguro que as máquinas foram removidas e que a Requerente não voltou a referir-se às máquinas nos artigos subsequentes, passando a aludir unicamente ao stock e aos documentos. Portanto, o destinatário do alegado apenas pode interpretar o requerimento inicial como respeitando a uma pretensão de tutela provisória que versa apenas sobre o stock e os documentos (livro de atas e documentos contabilísticos referentes ao ano de 2018). 
Pelo exposto, não há qualquer razão para revogar a decisão recorrida na parte em que versa sobre as máquinas.
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2.2.2. Livro de atas e documentos contabilísticos respeitantes a 2018
No que respeita a estes elementos documentais, a Requerente limitou-se a alegar, no artigo 41º do requerimento inicial, que «tem receio a Requerente que na pendência da ação principal o 1º Requerente [terá pretendido dizer 1º Requerido] altere ou até faça desparecer o livro de atas e os documentos contabilísticos em falta.»
Como bem se salienta na decisão recorrida, «não se percebe qual possa ser o periculum in mora ou a lesão grave e dificilmente reparável», uma vez que «nada é concretizado, limitando-se a requerente a aventar a possibilidade de lhes ser dado descaminho, o que não concretiza de modo algum e se afigura excessivo concluir como decorrência provável da mera recusa de entrega».
Nenhuma censura merece a apontada argumentação do Tribunal recorrido, na medida em que não basta dizer-se que se tem receio que o 1º Requerido altere ou faça desaparecer os mencionados documentos. O receio teria de resultar de factos que pura e simplesmente não foram alegados. Esse receio não emerge da simples circunstância de o Requerido se recusar a fazer a sua entrega.
Também não se consegue concluir, em face da mera alegação constante do aludido artigo 41º, que da falta de uma tutela imediata quanto à entrega dos documentos resulta uma lesão grave e dificilmente reparável ao direito da Requerente.
Aliás, a Requerente nem sequer concretiza qual a lesão, que sempre teria de ser grave e de difícil reparação, que iria ocorrer se a providência não fosse decretada.
Pelo exposto, é de manter a decisão recorrida na parte em que versa sobre o livro de atas e os documentos contabilísticos referentes ao ano de 2018.
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2.2.3. Stock
O indeferimento liminar do requerimento inicial, no que respeita ao stock, baseia-se na consideração de que «nada é dito quanto à (in)capacidade da requerente adquirir novo stock para o normal prosseguimento da sua atividade, menos ainda sobre a (in)capacidade dos requeridos a ressarcirem dos prejuízos decorrentes da recusa de franquear o acesso ao stock e/ou à dissipação deste.»
Sustenta-se na decisão recorrida que «nada é alegado quanto à impossibilidade de ressarcimento dos danos decorrentes de tal conduta [«a dissipação do stock»], sendo que, pelo menos aparentemente, ambos os requeridos até serão proprietários de bens imóveis, donde difícil seria concluir não terem património para ressarcir a requerente dos danos que afirma ter sofrido».
Na tese do Tribunal recorrido, basta que os Requeridos tenham património para ressarcir a Requerente dos danos que lhe venham a ser causados para afastar o requisito do periculum in mora. Como foi homologada a desistência do pedido quanto ao 2º Requerido, apenas subsiste como relevante a fundamentação aduzida quanto ao 1º Requerido.
A título liminar, importa precisar que não resulta do alegado no requerimento inicial qual seja o concreto património do 1º Requerido ou a sua suficiência para ressarcir a Requerente dos prejuízos sofridos ou que venha a sofrer em consequência das condutas até agora assumidas.
Independentemente de tal consideração, cabe enfatizar que a capacidade económica do requerido para reparar os danos causados ao requerente não é um elemento essencial ou decisivo para apreciar o requisito do periculum in mora. Isto porque a finalidade das providências cautelares é obviar aos prejuízos decorrentes da demora na obtenção da tutela definitiva.
Segundo Miguel Teixeira de Sousa[7], «a pergunta a que as providências cautelares procuram responder é a de saber se o direito do requerente exige uma tutela imediata (embora provisória) ou pode aguardar pela posterior tutela definitiva. Assim, a aferição do p.i.m. [periculum in mora] assenta numa comparação entre a situação em que o requerente se encontraria se apenas lhe fosse concedida, mais tarde (ou até bastante mais tarde), uma tutela definitiva desse direito e a situação em que se encontrará se lhe for atribuída, de imediato, uma tutela provisória daquele direito. O requisito do p.i.m. está preenchido se uma providência cautelar puder obstar à “lesão grave e dificilmente reparável” que decorreria da demora na obtenção da tutela definitiva. O p.i.m. nada tem a ver com o ressarcimento de danos, mas antes com um problema completamente distinto: o de saber se, no caso de a providência cautelar solicitada pelo requerente não ser decretada e de, portanto, esta parte só vir a obter a tutela dos seus interesses no momento da tutela definitiva, a lesão que entretanto sofreu é grave e dificilmente reparável (…). As providências cautelares não visam evitar irressarcibilidades futuras, mas antes obviar a danos presentes que resultam da demora na obtenção da tutela definitiva. (…) O p.i.m. não é aferido em função de uma prognose sobre a ressarcibilidade futura da lesão de um direito, mas antes em função do prejuízo decorrente da falta de uma tutela imediata, ainda que provisória, para esse direito. O requisito do p.i.m. não é uma resposta à lesão ou à ameaça de lesão de um direito (essa função cabe às sanções repressivas, preventivas ou compulsórias), mas antes uma resposta à necessidade de evitar a demora de uma reacção jurisdicional contra a lesão ou a ameaça de lesão de um direito. Do exposto decorre que a “lesão grave e dificilmente reparável” do direito que se prevê no n.º 1 não é aquela que é cometida pelo titular passivo ou por um não titular do direito acautelado, mas antes aquela que decorre da demora na obtenção da tutela definitiva para esse direito.»
No caso dos autos, perante a recusa do 1º Requerido em entregar à Requerente o stock, a alegada dissipação contínua do mesmo pelo 1º Requerido e a impossibilidade de «prosseguir a sua atividade sem o mesmo [stock]», caso se provem todos os factos alegados, é elevado o risco de lesão grave e dificilmente reparável ao direito acutelado pela demora na obtenção de uma tutela jurisdicional, pois, esgotar-se-á o único stock propriedade da Requerente e sem ele não poderá prosseguir a sua atividade.
Em suma, o procedimento cautelar não poderia ser liminarmente indeferido quanto ao stock, mas sim ter prosseguido com a designação de data para a produção de prova.
Destarte, procede parcialmente a apelação.

No que respeita à responsabilidade tributária, mostrando-se paga a taxa de justiça relativa ao recurso previamente à sua interposição (art. 529º, nº 2, do CPC), não envolvendo o recurso o pagamento de encargos (arts. 529º, nº 3, e 532º do CPC), tendo o despacho recorrido sido proferido antes da citação do 1º Requerido e não tendo este intervindo no recurso, não tem em relação à Recorrente qualquer crédito relativo a custas de parte (arts. 529º, nº 4, e 533º do CPC e 25º e 26º do RCP), pelo que no recurso não há lugar ao pagamento de custas em qualquer das suas vertentes.
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III – Decisão

Assim, nos termos e pelos fundamentos expostos, julga-se parcialmente procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida na parte em que indeferiu liminarmente o procedimento cautelar quanto ao stock que a Requerente alegou estar na posse do 1º Requerido, devendo prosseguir com a designação de data para a produção de prova, mantendo-se no mais a decisão recorrida.
No recurso não há lugar ao pagamento de custas em qualquer das suas vertentes. As custas do procedimento cautelar serão suportadas em conformidade com o que vier a ser decidido a final, sem prejuízo do já decidido aquando da homologação da desistência do pedido relativamente ao 2º Requerido.
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Guimarães, 21.11.2024
(Acórdão assinado digitalmente)

Joaquim Boavida
António Figueiredo de Almeida
Alexandra Rolim Mendes


[1] CPC Online, em nota prévia aos artigos 362º a 409º do CPC.
[2] Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina, pág. 674.
[3] Ob. cit., pág. 679.
[4] Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª edição, Almedina, pág. 623.
[5] Temas da Reforma do Processo Civil, vol. III, 3ª edição, Almedina, pág. 35.
[6] Pág. 101.
[7] Ob. cit., em anotação ao artigo 362º do CPC.