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RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO
NULIDADE DE SENTENÇA
CONCURSO DE INFRACÇÕES
CONTRA-ORDENAÇÃO CONTINUADA
MEDIDA DA COIMA
COIMA ÚNICA
Sumário
Contraordenações laborais – Rejeição parcial do recurso – Nulidades da sentença – Punição da pluralidade de contraordenações – Alternativa entre a contraordenação continuada e a punição do concurso – Culpa – Benefício económico – Medida concreta das coimas parcelares e da coima única – Artigos 39.º e 49.º da Lei n.º 107/2009, 129.º n.º 1 – g) e n.º 2 (na redacção da Lei n.º 7/2009 de 12 de Fevereiro ), 551.º n.º 4 e 554.º n.º 4 – c), do Código do Trabalho e 18.º e 19.º do Regime Geral das Contraordenações (Sumário elaborado pela Relatora)
Texto Integral
Acordam em conferência, na 4.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
1. A recorrente, veio interpor o presente recurso da sentença proferida em 5.3.2024 (referência citius 159969101), pelo Juízo do Trabalho de Torres Vedras, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte (doravante também Tribunal de primeira instância, Tribunal recorrido ou Tribunal a quo), que condenou a recorrida conforme o dispositivo a seguir citado: “III - DECISÃO: Pelo exposto, julgo a impugnação judicial parcialmente procedente e, em consequência: 1) Condeno a Arguida pela prática, dolosa, de uma contraordenação muito grave, p. e p., nos termos dos artigos 129.º, n.º 1, al. g), e n.º 2, 551º, n.º 4, e 554º, n.º 4, al. c), todos do Código do Trabalho, no pagamento de uma coima no valor de €14.000,00 (catorze mil euros) e na sanção acessória de publicidade da decisão condenatória – processo n.º 242300052; 2) Condeno a Arguida pela prática, dolosa, de uma contraordenação muito grave, p. e p., nos termos dos artigos 129.º, n.º 1, al. g), e n.º 2, 551º, n.º 4, e 554º, n.º 4, al. c), todos do Código do Trabalho, no pagamento de uma coima no valor de €15.000,00 (quinze mil euros) e na sanção acessória de publicidade da decisão condenatória – processo n.º 242300055; 3) Condeno a Arguida pela prática, dolosa, de uma contraordenação muito grave, p. e p., nos termos dos artigos 129.º, n.º 1, al. g), e n.º 2, 551º, n.º 4, e 554º, n.º 4, al. c), todos do Código do Trabalho, no pagamento de uma coima no valor de €15.000,00 (quinze mil euros) e na sanção acessória de publicidade da decisão condenatória – processo n.º 242300059; 4) Condeno a Arguida pela prática, por negligência, de três contraordenações graves, p. e p. pelos artigos 108º, n.ºs 1, 3, al. a), e 7, da Lei n.º 102/2009, de 10/09, e do artigo 554º, n.º 3, al. c), do Código do Trabalho, no pagamento de uma coima no valor de €1.300,00 (mil e trezentos euros) por cada contraordenação - processos n.º 242300047, 242300048 e 242300049; 5) Efetuo o cúmulo jurídico de todas as coimas suprarreferidas, condenando a Arguida no pagamento da coima única no valor de €31.000,00 (trinta e um mil euros), por cujo pagamento responde também, solidariamente com a Arguida, a sua gerente AA (NIF ...). Custas a cargo da Arguida / recorrente, fixando a taxa de justiça em 3 Uc’s – artigo 94º, n.º 3, do RGCO, e artigo 8.º, n.º 7, do RCP e Tabela III, anexa ao mesmo, ex vi artigos 59º e 60º da Lei n.º 107/2009, de 14/09.”
2. No recurso, a arguida/recorrente, conclui pedindo: “(...) requer-se que o presente Recurso seja declarado procedente e, em consequência, seja revogada a douta decisão recorrida, substituindo-se por douto Acórdão que determine a absolvição da Arguida pela prática dolosa, de três contraordenação muito grave, p. e p., nos termos dos artigos 129.º, n.º 1, al. g), e n.º 2, 551º, n.º 4, e 554º, n.º 4, al. c), todos do Código do Trabalho, euros) e na sanção acessória de publicidade da decisão condenatória; Subsidiariamente e caso assim não entendam os Venerandos Juízes Conselheiros, sempre deverá ser proferido douto Acórdão que declare a nulidade da douta sentença recorrida, por manifesto erro de julgamento e contradição entre os factos provados e a decisão proferida, bem como por omissão de pronúncia quanto à concretização da medida da coima aplicada em cúmulo jurídico. E não sendo este o entendimento perfilhado por V. Exas., Venerandos Conselheiros, e caso se conclua no sentido de existir condenação por todos os processos de contraordenação aqui em apreço, sempre deverá ser aplicada uma coima única, por contraordenação continuada, em cúmulo jurídico, configurando a conduta da Arguida como negligente, pelo limite mínimo, no montante de € 12.240,00 euros.”
3. Nas alegações de recurso, vertidas nas conclusões, a recorrente invoca, em síntese, os seguintes argumentos: Nulidade da sentença devido a erro notório na apreciação da prova
• Impugnação dos factos provados 6, 9, 15, 17 e 19 com base em erro notório na apreciação dos depoimentos das testemunhas BB e CC e do auto de inquirição da testemunha DD recolhido na fase organicamente administrativa do processo (cf. conclusões I a XI); Nulidade da sentença devido a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão
• Impugnação dos factos provados 16, 18, 20, 22, 23, 24 e 38, por contradição e erro na qualificação dos contratos que deviam ser qualificados como contratos de prestação de serviços (cf. conclusões XII a XXIII); Nulidade da sentença por falta de indicação dos factos provados que fundamentam a decisão do cúmulo
• Omissão da indicação dos factos e do raciocínio lógico que está na base da fixação do valor coima única do cúmulo jurídico (conclusões XXXV a XXXVII); Erro de direito
• Não foram provados os elementos do dolo nem a vantagem patrimonial obtida pela arguida e/ou pelas restantes arguidas (cf. conclusões XXIV a XXVIII);
• Não havendo dolo as coimas concretas devem ser fixadas no mínimo (cf. conclusões XXXIII a XXXIV);
• Verificam-se os pressupostos da contraordenação continuada pelo que, a ser condenada a arguida devia sê-lo por duas e não por seis contraordenações, uma pela alegada utilização de trabalhadores cedidos e outra pela falta de realização de exames médicos de admissão (cf. conclusões XXIX a XXXII);
• Não tendo a recorrente obtido proveito económico não há motivo para que os montantes das coimas parcelares não sejam fixados no mínimo.
Normas violadas
• Artigos 374.º n.º 2, 379.º nº 1.º -a), 410.º n.º 2 do Código de Processo Penal (CPP), artigos 14.º e 30.º do Código Penal (CP), artigos 18.º e 19.º do Regime Geral das Contraordenações (RGCO), artigo 1154.º do Código Civil (CC) e artigo 129.º n.º 2 - g) do Código do Trabalho (CT) (cf. conclusões XXXVIII a XLI).
4. O digno magistrado do Ministério Público junto ao Tribunal de primeira instância não respondeu ao recurso.
5. Na segunda instância, o digno magistrado do Ministério Público emitiu parecer defendendo, em síntese, que:
• O recurso deve ser julgado inadmissível quanto às três contraordenações graves previstas e punidas pelos artigos 108º n.ºs 1, 3 - a), e 7, da Lei n.º 102/2009, de 10.09, 554º, n.º 3 - c), do CT, às quais o Tribunal aplicou, respectivamente, as coimas concretas de 1300 euros, uma vez que o valor das coimas é inferior ao exigido pelo artigo 49.º n.º 1 – a) da Lei 107/2009 para que possa haver recurso para o Tribunal da Relação;
• Deve ser negado provimento ao recurso na restante parte uma vez que os alegados vícios previstos no artigo 410.º n.º 2 do CPP têm de resultar do texto da sentença recorrida, o que não é o caso.
6. Foi cumprido o disposto no artigo 417.º do CPP tendo a recorrida respondido ao parecer mencionado no parágrafo que antecede, defendendo, em síntese, que: tendo as coimas parcelares inferiores ao valor previsto no artigo 49.º n.º 1 – a) da Lei 107/2009 contado para a elaboração do cúmulo, o Tribunal deve levar em conta o valor da coima única, impugnada, e admitir o recurso; no mais invoca argumentos já constantes das alegações de recurso. Questão prévia Inadmissibilidade parcial do recurso
7. Não é admissível o recurso para o Tribunal da Relação, da decisão judicial da primeira instância que confirmou a decisão da ACT que condenou a arguida pela prática negligente, de três contraordenações graves, previstas e punidas pelas disposições conjuntas dos artigos 108º n.ºs 1, 3 - a) e 7 da Lei n.º 102/2009 e 554º n.º 3 - c) do CT, respectivamente, no pagamento de uma coima no valor de 1300 euros por cada uma dessas contraordenações, uma vez que as coimas parcelares aplicadas não são superiores a 25 Uc. É o que resulta do artigo 49.º n.º 1 – a) da Lei 107/2009 e da interpretação que dele tem sido feita pela jurisprudência, em casos comparáveis, em que existe cumulo jurídico de coimas parcelares que, pelo seu valor, não admitem recurso, com outras que o admitem (cf. acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, proferidos, respectivamente, nos processos 12940/16.0T8LSB.L1-4 e 1915/23.3T8ALM.L1-4 e acórdão do Tribunal da relação de Guimarães, proferido no processo 2099/17.1T8VCT.G1, publicados em dgsi.pt).
8. Em consequência, não tendo sido o presente recurso interposto para melhoria do direito e uniformização de jurisprudência (cf. artigos 49.º n.º 2 e 50.º n.º 3 da Lei 107/2009), a decisão mencionada no parágrafo anterior é irrecorrível. Por isso, o recurso é rejeitado nessa parte e a recorrente será condenada no pagamento de uma importância entre 3 UC e 10 UC (cf. artigos 414.º n.º 2 e 420.º n.º 1 – b) e n.º 3 do CPP ex vi artigos 92.º n.º 1 e 93.º n.º 3 do RGCO e artigo 60.º da Lei 107/2009).
9. Motivos pelos quais o Tribunal rejeita o recurso da decisão judicial no que respeita às infracções referidas no parágrafo 7 e condena a recorrente em 3 UC de taxa de justiça pela rejeição parcial do recurso.
10. Mantém-se a admissão do recurso na restante parte. Delimitação do âmbito do recurso
11. São as seguintes as questões relevantes para a decisão do recurso:
A. Nulidades da sentença
B. Inexistência de dolo
C. Contraordenação continuada
D. Medida concreta das coimas parcelares e da coima única Factos
12. Nota preliminar: os factos provados e não provados serão a seguir agrupados, respectivamente, em dois parágrafos, mantendo a numeração pela qual foram indicados na sentença recorrida, para facilitar a leitura e remissões.
13. Factos provados Da decisão impugnada / acusação:
1) No dia 25/11/2022, pelas 10h30m deslocou-se ao local de trabalho da Arguida XX, Lda., sita na ..., uma equipa inspetiva constituída pelo inspetor autuante e pela inspetora EE a fim de verificar as condições de trabalho dos trabalhadores afetos à atividade de trabalhos na agricultura;
2) O Eng.º CC, trabalhador da Arguida XX, Lda., com as funções de responsável pela área da produção, que naquelas circunstancias de tempo e lugar se encontrava presente foi o interlocutor com a equipa inspetiva e explicou a esta todo o processo produtivo;
3) Este trabalhador informou também a equipa inspetiva que para assegurarem a produção, à data estavam a utilizar a mão de obra proveniente de empresas “prestadoras de serviços”, e que possuía como prova documental as faturas emitidas pelas arguidas;
4) Na sequência das declarações prestadas pelo trabalhador Eng.º CC, e na pessoa deste, o inspetor autuante notificou a Arguida XX, Lda., para até ao dia 30/11/2022 apresentar vários documentos necessários ao desenvolvimento da ação inspetiva, nomeadamente: a certidão permanente da empresa e as faturas das prestações de serviços agrícolas emitidos pelas empresas “Prestadoras de Serviços Agrícolas”;
5) Recebida a notificação o Eng.º CC apresentou as seguintes faturas das prestações de serviços:
a) Fatura Recibo n.º 8 (Prestação de Serviços) emitida pelo arguido FF, com data de emissão a 02/11/2022, no valor de €2.098,90;
b) Fatura Recibo FT M/10 (Prestação de Serviços), emitida pela Arguida YY, Unipessoal, Lda., com data de emissão a 04/11/2022, no valor de €2.047,92;
c) Fatura Recibo FAT 89122/63 (Prestação de Serviços) emitida pela Arguida ZZ, Unipessoal, Lda.., com data de emissão a 4/11/2022, no valor de €1.749,00;
6) No dia 06/12/2022, o inspetor autuante acompanhado pelos inspetores GG, HH e II e com a colaboração dos militares da GNR do Posto Territorial da Lourinhã, realizaram nova visita inspetiva à exploração agrícola, sita na ...;
7) Chegados ao local, os inspetores identificaram-se junto dos trabalhadores que se encontravam ao serviço, entre os quais, o trabalhador da Arguida XX, Lda.., BB, com a categoria profissional de encarregado;
8) A equipa inspetiva com a ajuda dos militares da GNR verificou de forma presencial, pessoal e imediata que na referida exploração, se encontravam a trabalhar, a realizar tarefas de agricultura, sob a autoridade, direção, fiscalização e mediante retribuição da Arguida, entre outros, os seguintes trabalhadores da Arguida:
a) JJ, admitido em 02/11/2022, com contrato a termo incerto;
b) KK, admitido em 02/11/2022, com contrato a termo incerto;
c) LL, admitido em 18/08/2022, com contrato a termo incerto;
9) A equipa inspetiva verificou ainda que na referida exploração se encontravam também a realizar tarefas de agricultura, nomeadamente, tarefas de poda da vinha, sob a orientação e instruções de BB, trabalhador da Arguida XX, Lda.., os seguintes trabalhadores:
a) … com contrato de trabalho celebrado a termo incerto com o arguido FF:
i. MM (NISS n.º ...), admitido em 11/10/2022;
ii. NN (NISS n.º ...), admitido em 11/10/2022;
iii. OO (NISS n.º ...), admitido em 11/10/2022;
b) … com contrato de trabalho a termo certo celebrado com a ArguidaYY, Unipessoal, Lda.:
i. DD (NISS n.º ...), admitido em 12/09/2022;
ii. PP (NISS n.º ...), admitido em 12/09/2022;
iii. QQ (NISS n.º ...), admitido em 06/09/2022;
iv. RR (NISS n.º ...), admitido em 03/08/2022;
v. SS (NISS n.º ...), admitido em 10/11/2022;
c) … com contrato de trabalho a termo certo celebrado com a Arguida ZZ, Unipessoal, Lda.:
i. TT (NISS n.º ...), admitido em 21/09/2022;
ii. UU (NISS n.º ...), admitido em 21/09/2022;
iii. VV (NISS n.º ...), admitido em 21/09/2022;
iv. WW (NISS n.º ...), admitido em 19/09/2022;
v. AAA (NISS n.º ...), admitido em 16/08/2022;
10) Após a visita inspetiva àquele local de trabalho, a equipa inspetiva dirigiu-se às instalações da Arguida XX, Lda., sitas na ...;
11) Chegados ao local a equipa inspetiva foi recebida pela gerente da Arguida XX, Lda., AA, a quem foi entregue uma notificação, para até ao dia 13/12/2022, apresentar vários documentos, nomeadamente, o registo dos trabalhadores, o registo do número de horas prestadas pelos trabalhadores, os recibos de retribuição, a declaração de remunerações à Segurança Social, todos referentes ao mês novembro de 2022, os contratos de trabalho dos trabalhadores, a Apólice de acidentes de trabalho, respetivo recibo e declaração de retribuição à seguradora onde constem os nomes dos trabalhadores, as fichas de aptidão dos últimos exames de saúde realizados aos trabalhadores, e o comprovativo de organização dos serviços de segurança e Saúde no Trabalho, todos relativos aos trabalhadores dos arguidos/as FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda., suprarreferidos no ponto 9);
12) No dia 12/12/2022, através de correio eletrónico com o endereço e-mail ...; foram apresentados os registos dos tempos de trabalho de novembro de 2022, os contratos de trabalho a termo incerto, a comunicação de admissão à ISS IP, e os recibos de retribuição de novembro de 2022 todos referentes a MM, OO e NN, trabalhadores do arguido FF;
13) No dia 12/12/2022, através de correio eletrónico com o endereço e-mail ..., foram apresentados os contratos de trabalho a termo certo, a comunicação de admissão à segurança social, os registos dos tempos de trabalho e os recibos de retribuição de novembro de 2022, todos relativos a PP, DD, QQ e SS, trabalhadores da Arguida YY, Unipessoal, Lda.,;
14) No dia 07/12/2022, através de correio eletrónico, com o endereço e-mail ..., foram apresentados os contratos de trabalho a termo certo e comunicação de admissão à segurança social, registo dos tempos de trabalho de novembro de 2022, recibos de retribuição de novembro de 2022, todos referentes a TT, UU, VV, WW e AAA, trabalhadores da Arguida ZZ, Unipessoal, Lda.,;
15) O arguido FF cedeu os trabalhadores MM, OO e NN (3) à Arguida XX, Lda., que no dia da visita inspetiva de 06/12/2022, se encontravam sob as ordens e orientações do trabalhador da Arguida XX, Lda., o encarregado BB;
16) O arguido FF emitiu à Arguida XX, Lda.., (contratante) a Fatura Recibo n.º 8, com data de emissão a 02/11/2022, que estabelece que a Arguida XX, Lda., irá pagar como contrapartida pela “prestação de serviços de mão de obra agrícola em poda de vinha”, o valor de €2.098,90 (dois mil e noventa e oito euros e noventa cêntimos);
17) A Arguida YY, Unipessoal, Lda. cedeu os trabalhadores PP, DD, QQ e SS (5) à Arguida XX, Lda., que no dia da visita inspetiva de 06/12/2022, se encontravam sob as ordens e orientações do trabalhador da Arguida XX, Lda.., o encarregado BB;
18) A Arguida YY, Unipessoal, Lda., emitiu à Arguida XX, Lda.., a fatura recibo FT M/10 com data de emissão a 04/11/2022, e valor total de €2.047,92, na qual está estabelecido que a Arguida XX, Lda., irá pagar à Arguida YY, Unipessoal, Lda., como contrapartida pela prestação de serviços de mão de obra agrícola em poda de vinha, o valor de €6,00 por hora por serviço prestado, acrescido de iva à taxa legal em vigor;
19) A Arguida ZZ, Unipessoal, Lda. cedeu, pelo menos, os trabalhadores TT, UU, VV, WW e AAA (5) à Arguida XX, Lda., que no dia da visita inspetiva de 06/12/2022, se encontravam sob as ordens e orientações do trabalhador da Arguida XX, Lda.., o encarregado BB;
20) A Arguida …, Unipessoal, Lda, emitiu à Arguida XX, Lda.., a Fatura Recibo n.º FAT 89122/63, com data de emissão a 04/11/2022, que estabelece que a Arguida XX, Lda., irá pagar como contrapartida pela “prestação de serviços de mão de obra agrícola em poda de vinha”, o valor de €1.749,00;
21) Todos os contratos de prestação de serviços celebrados entre a Arguida XX, Lda.., e o/as arguido/as FF, YY, Unipessoal, Lda., e. ZZ, Unipessoal, Lda., estabelecem que o/as arguido/as prestarão à Arguida XX, Lda.., serviços de poda de vinhas, poda e formação de arvores e outros trabalhos inerentes às mesmas culturas, disponibilizando os meios humanos e técnicos necessários à boa execução dos serviços solicitados, mediante o pagamento de €6,00 por hora;
22) O arguido FF, tem como atividade económica principal registada de atividades dos serviços relacionados com a agricultura (CAE R3 - 01610);
23) A ArguidaYY, Unipessoal, Lda., tem como atividade económica principal registada de Atividades dos Serviços relacionados com a agricultura (CAE R3 - 01610);
24) A Arguida ZZ, Unipessoal, Lda., tem como atividade económica principal fornecimento de recursos humanos, atividade de serviços relacionados com a agricultura, silvicultura e exploração florestal (CAE R3 - 78300);
25) O/as arguido/as FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda., (cedentes) não possuem Alvará para o exercício de atividades de “Empresa de Trabalho Temporário”, não têm no seu objeto social a cedência temporária de trabalhadores, e nem sequer utilizam a designação de “trabalho temporário”;
26) O arguido FF é uma pessoa singular e as arguidas YY, Unipessoal, Lda. e ZZ, Unipessoal, Lda., (cedentes) e a Arguida XX, Lda., (utilizadora) não são sociedades coligadas, não estão em relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, e não têm estruturas organizativas comuns;
27) O/as arguido/as FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda., não tinham qualquer acordo escrito de cedência ocasional dos respetivos trabalhadores, com a manifestação de concordância dos mesmos com a cedência;
28) A Arguida XX, Lda., sabia que a cedênca dos trabalhadores pelos arguidos FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda., era proibida e punida por lei, mas não se coibiu de agir, nos termos suprarreferidos, com a intenção de utilizar a mão-de-obra desses trabalhadores no exercício da sua atividade;
29) No dia 12/12/2022, a Arguida XX, Lda., através do endereço eletrónico e-mail ..., procedeu ao envio dos contratos de trabalho dos seus trabalhadores e algumas fichas de aptidão médica, não tendo apresentado as fichas de aptidão para o trabalho dos trabalhadores JJ, KK e LL;
30) Nessa sequência, no dia 05/01/2023, através de correio eletrónico enviado para os endereços e-mail ... e e-mail ..., o inspetor autuante notificou a Arguida XX, Lda. para esclarecer, entre outros assuntos, o motivo do não envio das fichas de aptidão médica dos trabalhadores JJ, KK e LL;
31) No dia 06/01/2023, através do através do endereço eletrónico e-mail ..., a Arguida XX, Lda., enviou a resposta ao pedido de esclarecimentos onde informava que “as consultas em falta serão efetuadas em Janeiro, mais concretamente 12/01/2023”;
32) No dia 16/01/2023, através do endereço eletrónico e-mail ..., a Arguida XX, Lda., remeteu ao inspetor autuante as fichas de aptidão médica dos trabalhadores JJ, KK e LL, onde está indicado pelo médico do trabalho, Dr. BBB, com cédula profissional n.º ...que os trabalhadores foram submetidos a exames de saúde de admissão no dia 12/01/2023;
33) A Arguida XX, Lda., não agiu com o zelo e cuidado que lhe era exigível e de que era capaz ao não assegurar a realização do exame de saúde obrigatório aos trabalhadores JJ, KK e LL, “antes do inicio da prestação de trabalho ou, se a urgência da admissão o justificar, nos 15 dias seguintes”, de forma a comprovar e avaliar a aptidão física e psíquica destes para o exercício da atividade de Trabalhador Agrícola, bem como a repercussão desta e das condições em que é prestada na saúde dos mesmos, por médico do trabalho, tendo-o feito só após a intervenção dos inspetores do trabalho;
34) A Arguida XX, Lda., tem como atividade económica principal de viticultura (CAE REV 3 - 01210), sendo legalmente representada pela gerente AA (NIF ...);
35) No ano de 2021 a Arguida XX, Lda., apresentou um volume de negócios no valor de €4.599.236,00; Da impugnação judicial:
36) A Arguida XX, Lda. (na qualidade de “Segunda Contratante” celebrou com cada um dos arguidos FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda., (sendo estes na qualidade de “Primeiro/a Contratante”), respetivamente em 01.08.2022, 01.07.2022, 01.07.2022, um contrato denominado de prestação de serviços, no qual, além do mais, foi clausulado o seguinte:
1º
1- A Primeira Contratante prestará à Segunda Contratante os seguintes serviços: poda e formação de vinhas, poda e formação de árvores e outros trabalhos inerentes às mesmas culturas.
2-Para tanto, a Primeira Contratante disponibilizará os meios humanos e técnicos que considerar necessário para salvaguardar o serviço contratualizado, nas propriedades exploradas pela Segunda Contratante, mais concretamente as parcelas inscritas no parcelário.
2°
1-A Primeira Contratante obriga-se a executar os serviços supra indicados com o mais elevado nível de qualidade e eficiência, colocando a sua maior diligência na execução dos mesmos.
2- A Primeira Contratante e os eventuais trabalhadores que estejam a si conotados, não estão sujeitos à subordinação a ordens por parte da Segunda Contratante.
3- A Primeira Contratante garante a boa qualidade dos serviços prestados, responsabilizando-se integralmente por quaisquer danos que decorram da falta de qualidade e inadequação dos serviços prestados ou de qualquer outro cumprimento defeituoso da sua obrigação de prestar os serviços aqui acordados.
4- Serão da responsabilidade da Primeira Contratante, todas as despesas ocasionadas durante a vigência do contrato e inerentes ao desempenho das suas funções, nomeadamente, deslocações, alimentação, estadias, contratação de mão-de-obra, material, etc.
5- Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, a Segunda Contratante poderá a todo o tempo, e pelos seus próprios meios, fiscalizar a execução dos serviços contratados.
3º
1- A disponibilização dos equipamentos e outros meios técnicos ou materiais, bem como dos recursos humanos necessários à boa execução dos serviços solicitados pela Segunda Contratante ao abrigo do presente Contrato, são da exclusiva responsabilidade da Primeira Contratante.
2-A Primeira Contratante organizará, de acordo com a sua disponibilidade, os tempos de prestação do presente serviço, não estando sujeito a qualquer horário.
4º
1- Como contrapartida dos serviços contratados, a Segunda Contratante pagará à Primeira Contratante, o montante de 6€, por hora.
2- O pagamento será feito através de transferência bancária para a conta da Primeira Contratante com o IBAN (…) e será pago mensalmente, contra a emissão da respetiva fatura, devidamente descriminada.
5º
1- O presente contrato de prestação de serviços entre em vigor no dia 4 de julho de 2022 e tem a duração de um ano, sendo renovável por sucessivos e iguais períodos, podendo, no entanto, ser denunciado ou alterado por qualquer das partes, mediante comunicação escrita enviada à outra, desde de que faça com a antecedência mínima de 30 (trinta) dias.
2- Em caso de incumprimento por uma das partes, das obrigações decorrentes do presente contrato, poderá a outra rescindi-lo, por escrito, com aviso prévio de 30 dias, sem prejuízo da obrigação de indemnização pela parte faltosa, nos termos gerais do Direito.
6º
1- Os impostos decorrentes do pagamento referido na cláusula 4ª são inteiramente suportados pela Primeira Contratante, bem como todas as despesas que ela houver de efetuar para o correto desempenho das suas funções.
2- Será assim da responsabilidade da Primeira Contratante:
a) Emitir recibos face às quantias recebidas;
b) Contratar Seguro de Acidentes de Trabalho Próprio;
c) Efetuar descontos legais obrigatórios quer ao nível dos impostos, quer da segurança social. (…)
37) A Arguida XX, Lda. efetuava um controlo sobre o número de horas e de trabalhadores que os arguidos FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda., colocavam a trabalhar nas suas instalações, de modo a verificar se as faturas estariam ou não devidamente emitidas;
38) Os serviços de poda e formação das vinhas eram obrigatoriamente acompanhados por responsáveis da sociedade Arguida XX, Lda., por forma a garantir que eram executados da forma que pretendia, de forma a não colocar em risco a quantidade e qualidade da produção anual, com prejuízo para a empresa.
14. Factos não provados Da decisão impugnada / acusação:
1) No âmbito da visita de 25.11.2022 o Eng.º CC afirmou ao inspetor autuante que a Arguida não tinha aquela data celebrado nenhum contrato de prestação de serviços com as empresas “Prestadoras de Serviços Agrícolas”;
2) No âmbito da notificação referida no ponto 4) dos factos provados foi também solicitada a apresentação de contrato de prestação de serviços celebrados com as empresas “Prestadoras de Serviços Agrícolas”;
3) A Arguida XX, Lda. foi já condenada pela prática uma infração classificada como muito grave, imputada a título de negligência, que à data da infração ainda não se encontrava prescrita: Processo 322200028, por infração ao artigo 25.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 27/2010, praticada em 2021/10/05, à qual foi aplicada a coima de €2.040, com data de condenação em 2022/11/11 e prescrição em 2026/10/04; Da impugnação judicial:
4) Com a celebração dos contratos referidos no ponto 36) dos factos provados, a Arguida XX, Lda. apenas pretendeu contratar com os arguidos FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda., uma obrigação de resultado da atividade por ele exercidas – preparação de terras (lavrar), de colheita e de formação e poda das vinhas – contra o pagamento de um preço, não exercendo a mesma qualquer poder de direção e organização sobre os trabalhadores que prestaram esse serviço;
5) Não seria possível determinar o preço dos serviços prestados - preparação de terras (lavrar), de colheita e de formação e poda das vinhas - sem recorrer a um cálculo sustentado em valor hora, porquanto as vicissitudes a que estas tarefas estão sujeitas (meteorológicas, morfologias do terreno, tipos de árvores) não permitem prever a duração e quantidade de mão-de-obra necessária até à conclusão dos trabalhos;
6) A Arguida XX, Lda., não tinha intervenção do recrutamento, seleção, contratação, coordenação, direção, fiscalização e pagamento da remuneração do trabalho realizado pelos trabalhadores com contrato de trabalho celebrado com os arguidos FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda..;
7) A Arguida XX, Lda., subcontrata junto de uma consultora externa a gestão de recursos humanos, incluindo os serviços de promoção da segurança e da saúde no trabalho, nos quais se incluem os exames médicos de admissão dos trabalhadores e estava convencida que os trabalhadores JJ, KK e LL haviam realizado os exames médios de admissão, havendo apenas a necessidade de programar os exames periódicos. Quadro legal relevante
15. Quadro legal essencial, com relevo para a decisão:
Código do Trabalho ou CT
Artigo 129.º
Garantias do trabalhador
1 - É proibido ao empregador:
a) Opor-se, por qualquer forma, a que o trabalhador exerça os seus direitos, bem como despedi-lo, aplicar-lhe outra sanção, ou tratá-lo desfavoravelmente por causa desse exercício;
b) Obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho;
c) Exercer pressão sobre o trabalhador para que actue no sentido de influir desfavoravelmente nas condições de trabalho dele ou dos companheiros;
d) Diminuir a retribuição, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho;
e) Mudar o trabalhador para categoria inferior, salvo nos casos previstos neste Código;
f) Transferir o trabalhador para outro local de trabalho, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, ou ainda quando haja acordo;
g) Ceder trabalhador para utilização de terceiro, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho;
h) Obrigar o trabalhador a adquirir bens ou serviços a ele próprio ou a pessoa por ele indicada;
i) Explorar, com fim lucrativo, cantina, refeitório, economato ou outro estabelecimento directamente relacionado com o trabalho, para fornecimento de bens ou prestação de serviços aos seus trabalhadores;
j) Fazer cessar o contrato e readmitir o trabalhador, mesmo com o seu acordo, com o propósito de o prejudicar em direito ou garantia decorrente da antiguidade.
2 - Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.
Redacção dada pelo seguinte diploma: Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro
Artigo 185.º
Condições de trabalho de trabalhador temporário
1 - O trabalhador temporário pode ser cedido a mais de um utilizador, ainda que não seja titular de contrato de trabalho por tempo indeterminado para cedência temporária, se o contrário não for estabelecido no respectivo contrato.
2 - Durante a cedência, o trabalhador está sujeito ao regime aplicável ao utilizador no que respeita ao modo, lugar, duração do trabalho e suspensão do contrato de trabalho, segurança e saúde no trabalho e acesso a equipamentos sociais.
3 - O utilizador deve elaborar o horário de trabalho do trabalhador e marcar o período das férias que sejam gozadas ao seu serviço.
4 - Durante a execução do contrato, o exercício do poder disciplinar cabe à empresa de trabalho temporário.
5 - O trabalhador tem direito à retribuição mínima de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho aplicável à empresa de trabalho temporário ou ao utilizador que corresponda às suas funções, ou à praticada por este para trabalho igual ou de valor igual, consoante a que for mais favorável.
6 - O trabalhador tem direito, em proporção da duração do respectivo contrato, a férias, subsídios de férias e de Natal, bem como a outras prestações regulares e periódicas a que os trabalhadores do utilizador tenham direito por trabalho igual ou de valor igual.
7 - A retribuição do período de férias e os subsídios de férias e de Natal de trabalhador contratado por tempo indeterminado para cedência temporária são calculados com base na média das retribuições auferidas nos últimos 12 meses, ou no período de execução do contrato se este for inferior, excluindo as compensações referidas no artigo 184.º e os períodos correspondentes.
8 - O trabalhador temporário cedido a utilizador no estrangeiro por período inferior a oito meses tem direito ao pagamento de um abono mensal a título de ajudas de custo até ao limite de 25 /prct. do valor da retribuição base.
9 - O disposto no número anterior não se aplica a trabalhador titular de contrato de trabalho por tempo indeterminado para cedência temporária, ao qual são aplicáveis as regras de abono de ajudas de custo por deslocação em serviço previstas na lei geral.
10 - Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, é aplicável ao trabalhador temporário o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável a trabalhadores do utilizador que exerçam as mesmas funções.
11 - O utilizador deve informar o trabalhador temporário dos postos de trabalho disponíveis na empresa ou estabelecimento para funções idênticas às exercidas por este, com vista à sua candidatura.
12 - Constitui contra-ordenação grave a violação do disposto no n.º 3 e o exercício de poder disciplinar por parte do utilizador ou a violação do disposto no número anterior.
Redacção dada pelo seguinte diploma: Lei n.º 93/2019, de 04 de Setembro
Artigo 549.º
Regime das contra-ordenações laborais
As contra-ordenações laborais são reguladas pelo disposto neste Código e, subsidiariamente, pelo regime geral das contra-ordenações.
Artigo 551.º
Sujeito responsável por contra-ordenação laboral
1 - O empregador é o responsável pelas contra-ordenações laborais, ainda que praticadas pelos seus trabalhadores no exercício das respectivas funções, sem prejuízo da responsabilidade cometida por lei a outros sujeitos.
2 - Quando um tipo contra-ordenacional tiver por agente o empregador abrange também a pessoa colectiva, a associação sem personalidade jurídica ou a comissão especial.
3 - Se o infractor for pessoa colectiva ou equiparada, respondem pelo pagamento da coima, solidariamente com aquela, os respectivos administradores, gerentes ou directores.
4 - O contratante e o dono da obra, empresa ou exploração agrícola, bem como os respetivos gerentes, administradores ou diretores, assim como as sociedades que com o contratante, dono da obra, empresa ou exploração agrícola se encontrem em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, são solidariamente responsáveis pelo cumprimento das disposições legais e por eventuais violações cometidas pelo subcontratante que executa todo ou parte do contrato nas instalações daquele ou sob responsabilidade do mesmo, assim como pelo pagamento das respetivas coimas.
Artigo 554.º
Valores das coimas
1 - A cada escalão de gravidade das contra-ordenações laborais corresponde uma coima variável em função do volume de negócios da empresa e do grau da culpa do infractor, salvo o disposto no artigo seguinte.
2 - Os limites mínimo e máximo das coimas correspondentes a contra-ordenação leve são os seguintes:
a) Se praticada por empresa com volume de negócios inferior a (euro) 10 000 000, de 2 UC a 5 UC em caso de negligência e de 6 UC a 9 UC em caso de dolo;
b) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a (euro) 10 000 000, de 6 UC a 9 UC em caso de negligência e de 10 UC a 15 UC em caso de dolo.
3 - Os limites mínimo e máximo das coimas correspondentes a contra-ordenação grave são os seguintes:
a) Se praticada por empresa com volume de negócios inferior a (euro) 500 000, de 6 UC a 12 UC em caso de negligência e de 13 UC a 26 UC em caso de dolo;
b) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a (euro) 500 000 e inferior a (euro) 2 500 000, de 7 UC a 14 UC em caso de negligência e de 15 UC a 40 UC em caso de dolo;
c) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a (euro) 2 500 000 e inferior a (euro) 5 000 000, de 10 UC a 20 UC em caso de negligência e de 21 UC a 45 UC em caso de dolo;
d) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a (euro) 5 000 000 e inferior a (euro) 10 000 000, de 12 UC a 25 UC em caso de negligência e de 26 UC a 50 UC em caso de dolo;
e) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a (euro) 10 000 000, de 15 UC a 40 UC em caso de negligência e de 55 UC a 95 UC em caso de dolo.
4 - Os limites mínimo e máximo das coimas correspondentes a contra-ordenação muito grave são os seguintes:
a) Se praticada por empresa com volume de negócios inferior a (euro) 500 000, de 20 UC a 40 UC em caso de negligência e de 45 UC a 95 UC em caso de dolo;
b) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a (euro) 500 000 e inferior a (euro) 2 500 000, de 32 UC a 80 UC em caso de negligência e de 85 UC a 190 UC em caso de dolo;
c) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a (euro) 2 500 000 e inferior a (euro) 5 000 000, de 42 UC a 120 UC em caso de negligência e de 120 UC a 280 UC em caso de dolo;
d) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a (euro) 5 000 000 e inferior a (euro) 10 000 000, de 55 UC a 140 UC em caso de negligência e de 145 UC a 400 UC em caso de dolo;
e) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a (euro) 10 000 000, de 90 UC a 300 UC em caso de negligência e de 300 UC a 600 UC em caso de dolo.
5 - O volume de negócios reporta-se ao ano civil anterior ao da prática da infracção.
6 - Caso a empresa não tenha actividade no ano civil anterior ao da prática da infracção, considera-se o volume de negócios do ano mais recente.
7 - No ano de início de actividade são aplicáveis os limites previstos para empresa com volume de negócios inferior a (euro) 500 000.
8 - Se o empregador não indicar o volume de negócios, aplicam-se os limites previstos para empresa com volume de negócios igual ou superior a (euro) 10 000 000.
9 - A sigla UC corresponde à unidade de conta processual.
Artigo 558.º
Pluralidade de contra-ordenações
1 - Quando a violação da lei afectar uma pluralidade de trabalhadores individualmente considerados, o número de contra-ordenações corresponde ao número de trabalhadores concretamente afectados, nos termos dos números seguintes.
2 - Considera-se que a violação da lei afecta uma pluralidade de trabalhadores quando estes, no exercício da respectiva actividade, foram expostos a uma situação concreta de perigo ou sofreram dano resultante de conduta ilícita do infractor.
3 - A pluralidade de infracções dá origem a um processo e as infracções são sancionadas com uma coima única que não pode exceder o dobro da coima máxima aplicável em concreto.
4 - Se, com a infracção praticada, o agente obteve um benefício económico, este deve ser tido em conta na determinação da medida da coima nos termos do disposto no artigo 18.º do regime geral das contra-ordenações, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro.
Artigo 559.º
Determinação da medida da coima
1 - Na determinação da medida da coima, além do disposto no regime geral das contra-ordenações, são ainda atendíveis a medida do incumprimento das recomendações constantes de auto de advertência, a coacção, falsificação, simulação ou outro meio fraudulento usado pelo agente.
2 - No caso de violação de normas de segurança e saúde no trabalho, são também atendíveis os princípios gerais de prevenção a que devem obedecer as medidas de protecção, bem como a permanência ou transitoriedade da infracção, o número de trabalhadores potencialmente afectados e as medidas e instruções adoptadas pelo empregador para prevenir os riscos.
3 - Cessando o contrato de trabalho, no caso de o arguido cumprir o disposto no artigo 245.º e proceder ao pagamento voluntário da coima por violação do disposto no n.º 1 ou 5 do artigo 238.º, no n.º 1, 4 ou 5 do artigo 239.º ou no n.º 1, 2 ou 3 do artigo 244.º, esta é liquidada pelo valor correspondente à contra-ordenação leve.
Lei n.º 107/2009 de 14 de Setembro ou apenas Lei 107/2009
Artigo 39.º
Decisão judicial
1 - O juiz decide do caso mediante audiência de julgamento ou através de simples despacho.
2 - O juiz decide por despacho quando não considere necessária a audiência de julgamento e o arguido ou o Ministério Público não se oponham.
3 - O despacho pode ordenar o arquivamento do processo, absolver o arguido ou manter ou alterar a condenação.
4 - O juiz fundamenta a sua decisão, tanto no que respeita aos factos como no que respeita ao direito aplicado e às circunstâncias que determinaram a medida da sanção, podendo basear-se em mera declaração de concordância com a decisão condenatória da autoridade administrativa.
5 - Em caso de absolvição, o juiz indica porque não considera provados os factos ou porque não constituem uma contra-ordenação.
Artigo 49.º
Decisões judiciais que admitem recurso
1 - Admite-se recurso para o Tribunal da Relação da sentença ou do despacho judicial proferidos nos termos do artigo 39.º, quando:
a) For aplicada ao arguido uma coima superior a 25 UC ou valor equivalente;
b) A condenação do arguido abranger sanções acessórias;
c) O arguido for absolvido ou o processo for arquivado em casos em que a autoridade administrativa competente tenha aplicado uma coima superior a 25 UC ou valor equivalente, ou em que tal coima tenha sido reclamada pelo Ministério Público;
d) A impugnação judicial for rejeitada;
e) O tribunal decidir através de despacho não obstante o recorrente se ter oposto nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 39.º
2 - Para além dos casos enunciados no número anterior, pode o Tribunal da Relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público, aceitar o recurso da decisão quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência.
3 - Se a sentença ou o despacho recorrido são relativos a várias infracções ou a vários arguidos e se apenas quanto a alguma das infracções ou a algum dos arguidos se verificam os pressupostos necessários, o recurso sobe com esses limites.
Artigo 51.º
Âmbito e efeitos do recurso
1 - Se o contrário não resultar da presente lei, a segunda instância apenas conhece da matéria de direito, não cabendo recurso das suas decisões.
2 - A decisão do recurso pode:
a) Alterar a decisão do tribunal recorrido sem qualquer vinculação aos termos e ao sentido da decisão recorrida;
b) Anulá-la e devolver o processo ao tribunal recorrido.
Artigo 60.º
Direito subsidiário
Sempre que o contrário não resulte da presente lei, são aplicáveis, com as devidas adaptações, os preceitos reguladores do processo de contra-ordenação previstos no regime geral das contra-ordenações.
Regime Geral das Contraordenações ou RGCO
Artigo 1.º
Definição
Constitui contra-ordenação todo o facto ilícito e censurável que preencha um tipo legal no qual se comine uma coima.
Artigo 8.º
(Dolo e negligência)
1 - Só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência.
2 - O erro sobre elementos do tipo, sobre a proibição, ou sobre um estado de coisas que, a existir, afastaria a ilicitude do facto ou a culpa do agente, exclui o dolo.
3 - Fica ressalvada a punibilidade da negligência nos termos gerais.
Artigo 18.º
Determinação da medida da coima
1 - A determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contra-ordenação.
2 - Se o agente retirou da infracção um benefício económico calculável superior ao limite máximo da coima, e não existirem outros meios de o eliminar, pode este elevar-se até ao montante do benefício, não devendo todavia a elevação exceder um terço do limite máximo legalmente estabelecido.
3 - Quando houver lugar à atenuação especial da punição por contra-ordenação, os limites máximo e mínimo da coima são reduzidos para metade.
Artigo 19.º
Concurso de contra-ordenações
1 - Quem tiver praticado várias contra-ordenações é punido com uma coima cujo limite máximo resulta da soma das coimas concretamente aplicadas às infracções em concurso.
2 - A coima aplicável não pode exceder o dobro do limite máximo mais elevado das contra-ordenações em concurso.
3 - A coima a aplicar não pode ser inferior à mais elevada das coimas concretamente aplicadas às várias contra-ordenações.
Artigo 20.º
(Concurso de infracções)
Se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contra-ordenação, será o agente sempre punido a título de crime, sem prejuízo da aplicação das sanções acessórias previstas para a contra-ordenação.
Código de Processo Penal ou CPP
Artigo 410.º
Fundamentos do recurso
1 - Sempre que a lei não restringir a cognição do tribunal ou os respectivos poderes, o recurso pode ter como fundamento quaisquer questões de que pudesse conhecer a decisão recorrida.
2 - Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
c) Erro notório na apreciação da prova.
3 - O recurso pode ainda ter como fundamento, mesmo que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, a inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade que não deva considerar-se sanada.
Código Penal ou CP
Artigo 14.º
Dolo
1 - Age com dolo quem, representando um facto que preenche um tipo de crime, actuar com intenção de o realizar.
2 - Age ainda com dolo quem representar a realização de um facto que preenche um tipo de crime como consequência necessária da sua conduta.
3 - Quando a realização de um facto que preenche um tipo de crime for representada como consequência possível da conduta, há dolo se o agente actuar conformando-se com aquela realização.
Artigo 30.º
Concurso de crimes e crime continuado
1 - O número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente.
2 - Constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.
3 - O disposto no número anterior não abrange os crimes praticados contra bens eminentemente pessoais. Apreciação das questões suscitadas pelo recurso
A. Nulidades da sentença
16. Segundo o Tribunal julga perceber, a arguida/recorrente, invoca as três nulidades seguintes:
• Erro notório na apreciação da prova – cf. artigo 410.º n.º 2 – c) do CPP;
• Contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão – cf. artigo 410.º n.º 2 – b) do CPP;
• Falta de indicação dos factos provados que fundamentam a decisão do cúmulo – cf. artigos 374.º n.º 2, 379.º n.º 1 – a) e 410.º n.º 3 do CPP;
17. A propósito dos alegados vícios da sentença recorrida, convém começar por sublinhar que este Tribunal conhece apenas da matéria de direito, nos termos do artigo 51.º n.º 1 da Lei 107/2009. Porém, por força do disposto no artigo 50.º, n.º 4 da Lei 107/2009, a recorrente pode invocar, quanto à matéria de facto, os vícios constantes do artigo 410.º do CPP.
18. Condição da procedência dos vícios previstos no artigo 410.º n.º 2 do CPP é que os mesmos resultem do texto da decisão, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum. Adicionalmente, o recurso pode ter como fundamento outros vícios que determinem a nulidade da sentença, nos termos previstos no artigo 410.º n.º 3 do CPP, para cuja verificação o Tribunal pode recorrer à comparação entre a sentença e as peças processuais relevantes, como resulta da seguinte jurisprudência (cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo 905/05.2JFLSB.L1-9, disponível em dgsi.pt): “(...) esta patologia constitui o vício de nulidade da sentença por omissão de pronúncia. Porque [...] entendemos que a apreciação das causas de nulidade da sentença tem precedência lógica e legal sobre a averiguação dos vícios da apreciação da prova. Sem sabermos se o tribunal recorrido considera provado ou não provado determinado facto, não podemos determinar se, relativamente a esse facto, há um vício de apreciação da prova. Por outro lado, só este entendimento é coerente com o de que todos os vícios de apreciação da prova previstos no art.º 410º/2 do CPP têm que resultar do próprio texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum [...]. Na verdade, salvo se na decisão recorrida se reproduzirem a acusação ou a pronúncia e a contestação, o que não é legalmente exigido, nem constitui prática comum, a omissão de decisão sobre se se consideram provados ou não provados factos alegados naquelas peças, não pode resultar do texto da decisão recorrida por si só, sendo necessário recorrer às referidas peças.”
19. Os vícios da sentença constantes do artigo 410.º do CPP só podem ser conhecidos mediante invocação pelo sujeito processual por eles afectado, neste caso a arguida/recorrente.
20. Dito isto, o Tribunal apreciará a seguir se ocorre algum dos vícios acima enunciados no parágrafo 16.
21. No que respeita aos dois primeiros vícios, previstos no artigo 410.º n.º 2 – b) e c) do CPP, tal como foi acima explicado, o artigo 410.º n.º 2 do CPP exige que tais vícios resultem do texto da sentença, por si ou conjugada com as regras da experiência comum.
22. A esse propósito, importa verificar se resulta do texto da sentença que, relativamente aos factos provados 6, 9, 15, 17 e 19 existe erro notório na apreciação da prova (cf. artigo 410.º n.º 12 – c) do CPP) e relativamente aos factos provados 16, 18, 20, 22, 23, 24 e 38 existe contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão (cf. artigo 410.º n.º 2 – b) do CPP).
23. O texto da sentença recorrida posto em crise contém a seguinte fundamentação da convicção do Tribunal a quo, quanto aos factos provados: “O tribunal formou a convicção com base na apreciação crítica e conforme às regras de experiência comum dos depoimentos prestados pelas testemunhas CCC (inspetor da ACT, autuante no caso dos autos), CC (agrónomo, trabalhador da Arguida entre 2021 e agosto de 2023), BB (encarregado de trabalhos agrícolas ao serviço da Arguida entre 2001 e 2023) e DDD (trabalhador da Arguida desde 2020, exercendo funções na oficina e na adega / armazém), conjugadas com a prova documental junta aos autos, nos termos que melhor se passam a enunciar por referência a cada um dos factos provados e não provados. # Factos provados: Ressalvados os casos especificamente concretizados, infra, a prova dos factos em apreço, provenientes da acusação, estriba-se no teor dos próprios autos de notícia (quatro) que deram início aos autos, cuja autoria e teor foram confirmados em audiência de julgamento pela testemunha CCC, conjugados com a prova documental anexa a cada um desses autos, nos termos que sepassam a enunciar estabelecendo a conexão entre cada documento e o ponto da matéria de facto que o mesmo sustenta: - duplicado da notificação junto como doc. 4 anexo aos autos de notícia dos processos n.º 242300052/55/59: ponto 4); - faturas / recibo, juntas como doc. 5, anexas aos autos de notícia dos processos n.º 242300052/55/59: respetivamente, pontos 5-a), 5-b) e 5-c); - contratos de trabalho juntos como doc. 5, anexos ao auto de notícia dos processos n.º 242300047/48/49: ponto 8); - contratos de trabalho e comprovativos de comunicação da admissão de trabalhador à segurança social, juntos como doc. 9, anexos ao auto de notícia do processo n.º 242300052 – ponto 9-a); - contratos de trabalho e comprovativos de comunicação da admissão de trabalhador à segurança social, juntos como doc. 8, anexos ao auto de notícia do processo n.º 242300055 – ponto 9-b); - contratos de trabalho e comprovativos de comunicação da admissão de trabalhador à segurança social, juntos como doc. 8, anexos ao auto de notícia do processo n.º 242300059 – ponto 9-c); - duplicados da notificação juntos como doc. 6, anexos aos autos de notícia dos processos n.º 242300052/55/59: ponto 11); - mail, registos de tempos de trabalho, contratos de trabalho, comprovativos de comunicação da admissão de trabalhador à segurança social e recibos de retribuição, juntos como docs. 7 a 10, anexos ao auto de notícia do processo n.º 242300052 – ponto 12); - mail, registos de tempos de trabalho, contratos de trabalho, comprovativos de comunicação da admissão de trabalhador à segurança social e recibos de retribuição, juntos como docs. 7 a 10, anexos ao auto de notícia do processo n.º 242300055 – ponto 13); - mail, registos de tempos de trabalho, contratos de trabalho, comprovativos de comunicação da admissão de trabalhador à segurança social e recibos de retribuição, juntos como docs. 7 a 10, anexos ao auto de notícia do processo n.º 242300059 – ponto 14); - faturas / recibo, juntas como doc. 5, anexas aos autos de notícia dos processos n.º 242300052/55/59 e contratos, denominados de prestação de serviços, juntos pela Arguida com a defesa escrita apresentada nos processos n.º 242300052/55/59, a fls. 84 a 101 do processo n.º 242300052 – pontos 14) a 21); - comprovativo de declaração de início de atividade junto como doc. 1, anexo ao auto de notícia do processo n.º 242300052 – pontos 22) e 26); - registos comerciais juntos como doc. 1, anexos aos autos de notícia dos processos n.º 242300055/59 – pontos 23) e 24) e 26); - mail, contratos de trabalho e fichas de aptidão médica juntos como docs. 4 e 5, anexos ao auto de notícia dos processos n.º 242300047/48/49: ponto 29); - mail junto como doc. 6, anexo ao auto de notícia dos processos n.º 242300047/48/49: ponto 30); - mail junto como doc. 7, anexo ao auto de notícia dos processos n.º 242300047/48/49: ponto 31); - mail e fichas de aptidão médica juntos como doc. 8, anexos ao auto de notícia dos processos n.º 242300047/48/49: ponto 32); - registo comercial e relatório único da Arguida juntos como doc. 1 e 2, anexos aos autos de notícia dos processos n.º 242300052/55/59: pontos 34) e 35); No que concerne ao facto dos trabalhadores identificados no ponto 9) dos factos provados se encontrarem sob as ordens e orientações de BB, encarregado/trabalhador da Arguida XX, Lda., no dia da visita inspetiva (de 06/12/2022), para além de estar vertido nos autos de notícia cuja autoria e teor o inspetor autuante reiterou em audiência de julgamento, teve-se ainda presente o depoimento prestado pelo próprio BB que confirmou que era ele quem, pela manhã, acompanhava esses trabalhadores às propriedades / vinhas e lhes explicava como deveriam fazer a poda, e que ao longo do dia ia passando pelo local onde os mesmos se encontravam para verificar se os trabalhos estavam a ser feitos como ele explicava, afirmando ainda que fazia em cada dia um registo dos trabalhadores presentes e do número do horas de trabalho que os mesmos prestavam, justificando que o fazia para ver se batia certo como o número de horas que eram cobradas pelas empresas que enviavam esses trabalhadores. A prova dos factos vertidos no ponto 27) resulta desde logo do facto da própria Arguida XX, Lda., alegar que a base contratual que mantinha com o/as arguido/as FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda., estriba-se nos contratos de prestação de serviços que juntou com a defesa escrita e não em qualquer acordo de cedência de trabalhadores. A imputação subjetiva a título doloso vertida no ponto 28) dos factos provados, infere-se a partir da factualidade objetivamente comprovada, tendo presente que o próprio teor dos contratos denominados de prestação de serviços, reproduzido no ponto 36) dos factos provados, é idêntico para todas os alegadas prestadores de serviços, pelo que não pode deixar de ter sido a Arguida XX, Lda., - único elo comum de ligação em todos eles – a determinar o clausulado desses contratos, deles resultando manifestamente que a Arguida pretendia não um qualquer serviço prestado pelos arguido/as FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda.., mas sim mão-de-obra fornecida pelos trabalhadores contratados por aqueles outros arguidos, para desempenhar tarefas a executar no modo e nos termos que a mesma definia, sob a sua orientação, supervisão e controlo, pagando um custo/hora por cada hora de trabalho prestado por cada um desses trabalhadores e não um preço pela execução de um serviço definido. De resto, veja-se que do próprio clausulado dos contratos resulta que: - nem sequer delimita desde logo um serviço concreto a executar, reportando-se de forma genérica a “poda e formação de vinhas, poda e formação de árvores e outros trabalhos inerentes às mesmas culturas”; - a Arguida XX, Lda., “poderá a todo o tempo, e pelos seus próprios meios, fiscalizar a execução dos serviços contratados”; - o valor definido não respeita ao preço da execução de nenhum serviço concreto, mas sim “6€, por hora.”; - o contrato “tem a duração de um ano, sendo renovável por sucessivos e iguais períodos” (o que é completamente incongruente com o contrato de prestação de serviços para execução de serviços concretos e determinados); Acresce que, como resulta dos factos provados (estes alegados pela própria) a Arguida efetuava um controlo sobre o número de horas e de trabalhadores que arguidos FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda., colocavam a trabalhar nas suas instalações, de modo a verificar se as faturas estariam ou não devidamente emitidas, preocupação que certamente não teria de ter se simplesmente contratasse um serviço/resultado e não a própria atividade, e, por outro lado, que os serviços de poda e formação das vinhas eram obrigatoriamente acompanhados pelos responsáveis por forma a garantir que eram executados da forma que pretendia, o que se coaduna justamente com os factos também provados (cfr. pontos 9), 15), 17) e 19)) de que os trabalhadores com contrato com os arguidos FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda., se encontravam a trabalhar, aquando da inspeção, sob a orientação e instruções do trabalhador da Arguida XX, Lda., BB, o que não sucede quando se contrata um mero serviço ou uma obrigação de resultado. É assim em nosso entender patente que a Arguida contratou mão-de-obra que queria que fosse desempenhada nos termos por ela definidos, controlando e fiscalizando o trabalho prestado pelos trabalhadores em questão para assegurar que assim sucedia. De resto, melhor evidência não poderia existir senão o depoimento prestado por BB ao afirmar que quando identificava uma necessidade de trabalho da Arguida XX, Lda., se limitava a contactar os restantes arguidos / prestadores para pedir o envio de trabalhadores para a execução da tarefa sem que fosse efetuada qualquer avaliação prévia da tarefa a desempenhar por partes dos referidos arguidos / prestadores, visando o apuramento do concreto serviço a prestar ou a definição dos seus termos ou de um preço. E as finalidades inerentes à referida forma de contratação ficam também bem evidenciadas pelo próprio clausulado dos denominados contratos de prestação de serviços, nomeadamente a de não ter dessa forma de responder pelo cumprimento de deveres e encargos que normalmente teria de suportar enquanto entidade empregadora, pois que outra explicação não se encontra para que num contrato que seria de prestação de serviços se fosse consignar que seriam da responsabilidade do alegado prestador de serviços o pagamento dos impostos e despesas e que fossem os mesmos a contratar seguros de acidentes de trabalho e a efetuar os descontos para impostos e segurança social, relacionadas com os trabalhadores desses prestadores (!). A formalização de denominados contratos de prestação de serviço, que não têm assim correspondência com os termos em que a prestação da atividade era prestada, nada mais consubstancia do que uma tentativa de conferir uma aparência de legalidade para tentar dissimular uma conduta que necessariamente se sabe ser ilegal, nomeadamente a utilização indevida de trabalhadores, ficando por isso necessariamente demonstrada a existência de dolo da Arguida. No que concerne à imputação negligente vertida no ponto 33) dos factos provados, a mesma infere-se a partir da comprovação objetiva da não submissão dos trabalhadores à realização dos exames no prazo definido na Lei, tendo presente que é ao empregador que cabe diligenciar e assegurar a realização desses exames, seja diretamente seja, por subcontratação (realidade que neste caso foi alegada pela Arguida mas que se não provou), dever que não assegurou, não atuando por isso com o cuidado e diligência que se lhe eram exigidos. No que concerne ao ponto 36) o teor dos contratos em questão estriba-se nos próprios contratos juntos aos autos pela Arguida com a defesa escrita e com a própria impugnação judicial. Os factos vertidos nos pontos 37) e 38) foram confirmados pela testemunha BB.”
24. No que respeita ao alegado erro notório na apreciação da prova, em causa parece estar a constatação, pelos inspectores da ACT, de que os trabalhadores em questão desempenhavam a sua actividade sob as ordens e direcção da recorrente/arguida (cf. factos provados 6, 9, 15, 17 e 19).
25. A esse propósito, a recorrente/arguida alega que o Tribunal não levou em conta e/ou apreciou erroneamente, os depoimentos das testemunhas BB e CC e o auto de inquirição da testemunha DD recolhido na fase organicamente administrativa do processo.
26. Do texto da sentença transcrito no parágrafo 23, resulta que o Tribunal a quo apreciou criticamente a prova pessoal e documental relevante para julgar provados os factos 6, 9, 15 e 17 a 19, aqui impugnados pela recorrente. Em particular, o Tribunal a quo referiu expressamente na sentença que formou a sua convicção sobre o tema probatório em crise com base nos depoimentos das testemunhas CCC (inspetor da ACT, autuante), CC (agrónomo, trabalhador da arguida/recorrente entre 2021 e agosto de 2023), BB (encarregado de trabalhos agrícolas ao serviço da arguida/recorrente entre 2001 e 2023) e DDD (trabalhador da arguida/recorrente desde 2020, exercendo funções na oficina e na adega/armazém), conjugados com a prova documental junta aos autos, nomeadamente os quatro autos de notícia, cuja autoria e teor foram confirmados em audiência de julgamento pela testemunha CCC e a prova documental anexa a cada um desses autos, que o Tribunal levou em conta na sua análise.
27. Pelo que, contrariamente ao que parece defender a recorrente, o Tribunal levou em conta os depoimentos das testemunhas BB e CC, prestados em audiência de julgamento, e os meios de prova recolhidos na fase organicamente administrativa do processo, que conjugou com os restantes elementos de prova pessoal e documental, acima mencionados no parágrafo 23.
28. A este propósito importa recordar que compete ao juiz determinar o âmbito da prova a produzir, podendo o Ministério Público e o arguido arrolar até ao máximo de duas testemunhas por cada infracção, como prevê o artigo 47.º n.ºs 2 e 3 da Lei 107/2009. Nesse contexto, a recorrente/arguida, não alega que arrolou a testemunha DD para ser ouvida pelo Tribunal em audiência de julgamento e que, ouvida a mesma, o Tribunal não apreciou esse depoimento. Pelo que, quanto a esse aspecto, não merece censura a análise critica da prova constante do texto da sentença recorrida.
29. O Tribunal recorda ainda que a prova pessoal e os documentos particulares estão sujeitos ao princípio da livre apreciação do Tribunal, consagrado no artigo 127.º do CPP (ex vi artigos 60.º da Lei 107/2009 e 41.º do RGCO). Ora, do texto da sentença não resulta que na análise que fez das provas o Tribunal a quo tenha violado as regras gerais da experiência, nomeadamente o principio consagrado no artigo 127.º do CPP. Pelo que, não existe o alegado erro notório na apreciação da prova resultante do texto da sentença. Acresce que, o Tribunal da Relação não pode reapreciar a prova produzida (cf. artigo 51.º n.º 1 da Lei 107/2009).
30. Quanto à alegada contradição entre os factos provados ou entre estes a decisão, segundo o Tribunal da Relação julga perceber, a recorrente defende que, pelo facto de o Tribunal a quo ter considerado provadas, simultâneamente, a celebração de contratos de prestação de serviço, previstos no artigo 1154.º do CC e a cedência de trabalhadores, incorreu em contradição. Ora, uma coisa é ficar provada a designação que as partes deram a um determinado negócio jurídico que celebraram, outra é a qualificação jurídica dos factos, incluindo desses negócios, feita pelo Tribunal. A esse propósito, desde que respeitados os limites previstos nos artigos 358.º e 359.º do CPP (ex vi artigos 60.º da Lei 107/2009 e 41.º do RGCO), que aqui não estão em causa, compete únicamente ao Tribunal e não às partes, fazer a qualificação jurídica dos factos, incluindo dos negócios jurídicos apurados, independentemente da designação que as partes deram aos negócios cuja celebração se apurou.
31. É o que resulta da seguinte fundamentação da sentença recorrida, na parte em que aprecia os meios de prova relevantes “A formalização de denominados contratos de prestação de serviço, que não têm assim correspondência com os termos em que a prestação da atividade era prestada, nada mais consubstancia do que uma tentativa de conferir uma aparência de legalidade para tentar dissimular uma conduta que necessariamente se sabe ser ilegal, nomeadamente a utilização indevida de trabalhadores, ficando por isso necessariamente demonstrada a existência de dolo da Arguida.
e aprecia a questão de direito “No caso em apreço resulta dos factos provados que a Arguida XX, Lda.., sob a aparência e cobertura da celebração dos contratos nominados de prestação de serviços referidos no ponto 36) dos factos provados, com os arguidos FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda., utilizava a mão-de-obra dos trabalhadores com contratos de trabalho celebrados com estas arguidas para a execução de tarefas próprias das sua atividade, nomeadamente formação e poda das vinhas, sem que tal relação contratual correspondesse verdadeiramente à execução de um efetivo contrairo de prestação de serviços.”
32. Pelo que, não existe a alegada contradição devida a erro na aplicação e interpretação do artigo 1154.º do CC.
33. Em consequência, não se verifica nenhum dos vícios previstos no artigo 410.º n.º 2 – b) e c) do CPP, invocados pela recorrente.
34. No que respeita ao alegado vicio de omissão da indicação dos factos e do raciocínio lógico que estiveram na base da fixação da coima única, convém sublinhar que o dever de fundamentação se rege pelo disposto no artigo 39.º n.º 4 da Lei 107/2009 e não pelo disposto nos artigos 374.º n.º 2 e 379.º n.º 1 – a) do CPP. Nos termos do artigo 39.º n.º 4 da lei 107/2009, o juiz fundamenta a sua decisão, tanto no que respeita aos factos como no que respeita ao direito aplicado e às circunstâncias que determinaram a medida da sanção, podendo basear-se em mera declaração de concordância com a decisão condenatória da autoridade administrativa.
35. Ora, da leitura da sentença recorrida resulta que o Tribunal a quo, não se limitou a aderir aos fundamentos da decisão administrativa, mas fundamentou a decisão no que respeita aos factos, à convicção sobre os factos, ao direito aplicável e, em particular, às circunstâncias que determinaram a medida concreta das coimas parcelares e da coima única.
36. A esse propósito, o Tribunal recorda que os factos com relevo para a decisão sobre cúmulo jurídico das coimas parcelares são os factos provados mencionados na sentença recorrida, acima transcritos no parágrafo 13. Na apreciação da questão de direito, o Tribunal de primeira instância julgou que tais factos integram a prática, pela recorrente, em concurso efectivo, das contraordenações acima enunciadas no parágrafo 1.
37. Sob o título “Das coimas” o Tribunal a quo ponderou os elementos disponíveis nos autos que levou em conta na determinação das coimas concretas.
38. Sob o título “Do cúmulo jurídico das coimas”, o Tribunal a quo mencionou o seguinte: “- Do cúmulo jurídico das coimas: Dispõe o artigo 19.º do RGCO que: 1 - Quem tiver praticado várias contra-ordenações é punido com uma coima cujo limite máximo resulta da soma das coimas concretamente aplicadas às infrações em concurso. 2 - A coima aplicável não pode exceder o dobro do limite máximo mais elevado das contra-ordenações em concurso. 3 - A coima a aplicar não pode ser inferior à mais elevada das coimas concretamente aplicadas às várias contra-ordenações. Desta forma, determinadas as coimas unitárias, importa proceder ao seu cúmulo jurídico, condenando a Arguida numa coima única que não pode ser inferior ao valor da coima unitária aplicada de valor mais elevado - €15.000,00 – nem exceder a soma do valor das coimas concretamente aplicadas - €47.900,00 (€14.000,00 + €15.000,00 + €15.000,00 + €1.300,00 + €1.300,00 + €1.300,00). Dentro de tal moldura e ponderando a ilicitude global da conduta da Arguida, considero adequada e proporcional a fixação da coima única em €31.000,00.”
39. Resulta do trecho da sentença mencionado no parágrafo anterior que o Tribunal a quo indicou a disposição legal à luz da qual determinou a moldura abstracta do cúmulo, explicou como chegou à moldura abstracta da coima única e justificou a escolha da coima única concreta com ponderação global da ilicitude.
40. Ou seja, na sentença recorrida, sob o título “Do cúmulo jurídico das coimas, embora de forma sucinta, o Tribunal a quo fundamentou a decisão de modo a permitir à destinatária e ao Tribunal da Relação, compreender o processo lógico que o levou a optar pela medida concreta da coima única no valor de 31 000,00 euros.
41. Pelo que, por um lado, encontram-se satisfeitas as exigências de fundamentação da decisão judicial previstas no artigo 39.º n.º 4 da Lei 107/2009. Por outro lado, a decisão recorrida não enferma do vício de nulidade previsto nos artigos 374.º n.º 2 e 379.º n.º 1 – a) do CP, uma vez que tais disposições legais não se aplicam subsidiáriamente na parte em que a Lei 107/2009 regula especificamente o dever de fundamentação no artigo 39.º n.º 4.
42. Motivos pelos quais não se verifica nenhuma das nulidades alegadas pela recorrente.
43. O que sucede é que, e nessa parte a recorrente tem razão, o Tribunal a quo determinou a coima única apenas com base na avaliação global da ilícitude quando a determinação da coima única deve ter por base, não só a avaliação global da ilicitude, mas também a culpa do conjunto das contraordenações. No entanto, a falta de ponderação global da culpa do conjunto das contraordenações não constitui uma nulidade mas um erro de julgamento, que o Tribunal apreciará infra na análise da questão D.
B. Inexistência de dolo
44. A recorrente defende que não se provaram os elementos do dolo e, por isso, no caso de subsistir a punição pela prática das contraordenações mais graves, o Tribunal deve julgar que foram cometidas com negligência.
45. Para resolver esta questão, o Tribunal começa por recordar que o objecto do presente recurso é apenas a decisão que condenou a arguida pela prática dolosa de três contraordenações muito graves previstas nos artigos 129.º n.º 1 - g) e n.º 2 (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2, em vigor à data da prática dos factos), 551º n.º 4 e 554º n.º 4 - c) do CT. No que respeita às restantes contraordenações o recurso não foi admitido.
46. Feita esta clarificação, o Tribunal sublinha que, do facto provado 28 resulta o seguinte: “A Arguida XX, Lda., sabia que a cedênca dos trabalhadores pelos arguidos FF, YY, Unipessoal, Lda., e ZZ, Unipessoal, Lda., era proibida e punida por lei, mas não se coibiu de agir, nos termos suprarreferidos, com a intenção de utilizar a mão-de-obra desses trabalhadores no exercício da sua atividade.”
47. De acordo com o artigo 1.º do RGCO (ex vi artigo 549.º do CT), para que alguém seja responsável pela prática de uma contraordenação é necessário que o facto praticado pelo agente seja típico, ilícito, censurável e punível com uma moldura de coima previamente definida numa estatuição tipica.
48. Os elementos da infracção enunciados no parágrafo anterior pressupõem a existência de um agente e de um facto tipico. Por sua vez o facto tipico contém elementos objectivos ou tipo objectivo e elementos subjectivos ou tipo subjectivo. O que é posto em causa pela recorrente é a verificação do tipo subjectivo, em particular, a existência de dolo.
49. Para apreciar se existe dolo o Tribunal acompanha aqui a seguinte doutrina (Augusto Silva Dias, Direito das Contra-Ordenações, Almedina, páginas 105 e 106): “Actua dolosamente quem sabe que realiza a factualidade descrita num tipo contra-ordenacional e quer realizá-la. O dolo é composto por um elemento cognitivo e um elemento volitivo e pode assumir as modalidades de dolo directo, necessário ou eventual [...]. para que o dolo possa desempenhar a sua função de apelo [...], é necessário que abranja todos os elementos do ilícito-típico indispensáveis para que o agente atinja o problema da ilicitude do facto. No quadro de um ilícito tipico “formal”, desmaterializado, a cuja realização não vai associado um desvalor socialmente perceptível, entre esses elementos tem de constar a proibição. (...) Coloca-se o problema de saber se a prova do dolo admite um grau de exigência menor do que o dolo dos tipos penais. A resposta é, quanto a nós, afirmativa, não só porque os tipos contraordenacionais são em regra mais parcos em elementos objectivos e a prova do dolo por isso mais simples, mas também porque os agentes são frequentemente pessoas colectivas e a prova do dolo é aqui, pela natureza da coisa, mais flexível. Isto não significa obviamente que a prova do dolo seja dispensável ou possa ser intuída imediatamente da realização do facto típico. Um dolus in re ipsa, isto é, um dolo extraído sic et simpliciter da verificação de um facto (...), é também aqui inadmissíevel [...]. (...) A comprovção do dolo, como a de qualquer elemento subjectivo, é efectuada por meio de inferências a partir das circunstâncias fácticas do caso concreto. Inferência é a operação lógica que permite extrair de uma factualidade indiciada ilações acerca da existência de uma dada situação, designadamente de um estado mental [...]. Como método de apreensão da realidade a inferência permite compreendê-la e consequentemente explicá-la e valorá-la. Nada tem a ver, pois, com presunções. Estas instituem regras baseadas numa frequência média ou estatistica do acontecer que permitem tirar conclusões no caso concreto dispensando a realização da prova. Enqueanto a inferência é um método lógico adequado a reconstituir o estado psíquico do agente numa situação da vida, as presunções permitem concluir no sentido da existência de um estado psíquico a partir de regras pré-estabelecidas, afastando a sua comprovação nasituação concreta”.
50. À luz da doutrina que antecede é forçoso constatar que o Tribunal a quo, ao motivar assim a sua convicção “A imputação subjetiva a título doloso vertida no ponto 28) dos factos provados, infere-se a partir da factualidade objetivamente comprovada, tendo presente que (...)
inferiu o dolo das circunstâncias/meios de prova que analisou detalhadamente no texto da sentença acima citado no parágrafo 23.
51. Foi nesse contexto que o Tribunal a quo ficou convicto de que a recorrente agiu com intenção de usar a mão de obra que lhe foi cedida pelos co-arguidos sabendo que essa cedência era proibida.
52. Existido comparticipação, a recorrente deve ser punida segundo a sua culpa (cf. artigo 16.º n.º 2 do RGCO (ex vi artigo 549.º do CT).
53. Pelo que, não merece censura a sentença recorrida, na parte em que julgou que a arguida/recorrente agiu com dolo ao praticar as três contraordenações muito graves previstas nos artigos 129.º n.º 1 - g) e n.º 2, 551º n.º 4 e 554º n.º 4 - c) do CT.
C. Contraordenação continuada
54. A recorrente discorda da sentença impugnada pelo facto de não ter sido aplicada a figura da contraordenação continuada em alternativa à punição em concurso efectivo das três contraordenações muito graves previstas nos artigos 129.º n.º 1 - g) e n.º 2 (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2), 551º n.º 4 e 554º n.º 4 - c) do CT.
55. Tais contraordenações consistiram na cedência de 3, 5 e 5 trabalhadores, feita à recorrente, respectivamente, por cada um dos três co-arguidos mencionados nos factos provados 15 e 16, 17 e 18 e 19 e 20, mediante pagamento de uma quantia que receberam da recorrente, sem que os co-arguidos/cedentes tivessem alvará para o exercício da actividade de empresa de trabalho temporário. Os pagamentos feitos pela recorrente, respectivamente, a cada um dos co-arguidos, pela cedència dos trabalhadores, ocorreram em 21.11.2022, 6.12.2022 e 4.11.2022. Em 6.12.2022 tais trabalhadores encontravam-se a trabalhar nas instalações/propriedade da recorrente e sob as suas ordens e direcção, sem terem concordado por escrito com a cedência. Nos três casos, a recorrente e cada um dos coarguidos, celebraram contratos que designaram de prestação de serviços para formalizar a cedência de facto dos trabalhadores em questão. Nos três casos, a recorrente conhecia a proibição e agiu com dolo, tal como foi explicado supra na análise da questão B.
56. Sendo estes os contornos da situação, importa agora levar em conta que à luz do critério previsto no artigo 30.º n.º 2 do Código Penal (CP), a contraordenação continuada consiste numa pluralidade de actos susceptíveis, cada um, de integrar várias vezes o mesmo tipo legal ou tipos legais diferentes mas análogos, que apresentem entre si uma conexão objectiva e subjectiva.
57. A conexão objectiva, na contraordenação continuada, existe quando se verificam dois requisitos: a violação plúrima de um ou vários tipos contraordenacionais que no essencial protejam o mesmo interesse jurídico ou interesses jurídicos afins; através de condutas idênticas ou homogéneas, que formem uma unidade de contexto situacional, podendo a próximidade no tempo e no espaço ser um indício forte dessa unidade de contexto situacional.
58. A conexão subjectiva é compatível tanto com o dolo conjunto, como com o dolo continuado, como com uma pluralidade de resoluções (de modo que não fica excluída da continuação a figura dos crimes negligentes). O que é essencial para que se verifique a conexão subjectiva é a existência de uma relação que, de fora e de maneira considerável, facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comporte de modo diferente. Daqui decorre que a figura da infracção continuada, tal como está consagrada no direito português põe o acento tónico na unificação que, para a continuação, deriva da diminuição da culpa em nome de uma exigibilidade sensívelmente diminuida (cf. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 3.ª Edição, Gestlegal, páginas 1193 a 1200).
59. Por força da neutralidade ética das contraordenações, no caso em análise, a culpa não se baseia numa censura ética, dirigida ao agente e à sua atitude interna, como acontece com a culpa jurídico penal, mas consiste antes numa imputação do facto à responsabilidade social do seu autor. Entendida assim a culpa contraordenacional, também a contraordenação continuada se funda na mesma ideia substancial de diminuição da culpa do agente, em função do circunstâncialismo exógeno e, portanto, esse requisito tem de verificar-se uma vez que o intérprete e aplicador do direito, caso decida aplicar subsidiáriamente o artigo 30 n.º 2 do CP, deve fidelidade absoluta à construção legal aí consagrada (cf. Maria João Antunes, Concurso de Contraordenações, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Fasc. 3, Julho-setembro 1991, páginas 467 e 468 e Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 3.ª Edição, Gestlegal, página 1199).
60. Feito este enquadramento, afigura-se que na situação descrita no parágrafo 55 se verificam a conexão objectiva e subjectiva, acima mencionadas nos parágrafos 57 e 58. Pelo que não existe obstáculo dogmático à aplicação da figura da infracção continuada com os contornos previstos no artigo 30.º n.º 2 do CP.
61. O que sucede é que, se por um lado o artigo 558.º do CT afasta a contraordenação continuada quando o número de contraordenações corresponde ao número de trabalhadores concretamente afectados (o que não é o caso), por outro lado, pelos motivos a seguir expostos não existe, no presente caso, analogia substancial entre o regime primário aplicável às contraordenações laborais aqui em litígio e o regime subsidiário previsto no artigo 30.º n.º 2 CP, que consagra a figura do crime continuado.
62. Com efeito, importa levar em conta que as contraordenações em causa no presente recurso, previstas e punidas pelos artigos 129.º n.º 1 - g) e n.º 2, 551º n.º 4 e 554º n.º 4 - c) do CT, estão cobertas pelo regime das contraordenações laborais e da segurança social, regime sectorial regulado pelo CT e pela Lei 107/2009. Assim sendo, o regime primário do processo sancionatório aqui aplicável é o previsto no CT e na Lei 107/2009. O regime geral previsto no RGCO, embora não careça de remissão expressa para se aplicar, aplica-se às contraordenações laborais e da segurança social nos termos de uma aplicação subsidiária, como prevêm os artigos 549.º do CT e 60.º da Lei 107/2009. Por sua vez, o artigo 32.º do RGCO, prevê que as regras do CP se aplicam subsidiáriamente às contraordenações.
63. Neste contexto, a aplicação subsidiária da regra prevista no artigo 30.º n.º 2 do CP, que consagra a figura do crime continuadao, ao sector das contraordenações laborais aqui em causa, por força dos artigos 32.º do RGCO e 349.º do CT, a ter lugar, seria uma forma de colmatar um espaço vazio deixado pela regulamentação primária prevista no regime sectorial e no regime geral das contraordenações.
64. A dificuldade que se coloca consiste em apurar se existe verdadeiramente uma omissão do regime primário quanto à punição da contraordenação continuada ou se a ausência de regra expressa, seja no regime sectorial primário previsto no CT e na Lei 107/2009, seja no regime geral primário consagrado no RGCO, tem o sentido de regular a questão.
65. Para resolver a dificuldade enunciada no parágrafo anterior, o Tribunal leva em conta que a consagração legislativa da figura do crime continuado, como alternativa para certas situações de concurso efectivo, constitui uma opção dogmática e de politica criminal que tem por objectivos: em primeiro lugar, evitar dificuldades práticas de comprovação judicial de cada uma das realizações que integram a continuação, que ficarão assim cobertas pelo efeito do caso julgado; em segundo lugar, evitar as consequências desproporcionadas e injustas, face ao conteúdo e ao sentido do ilícito total, a que pode conduzir a punição do concurso de infracções.
66. Ora, no caso em análise tais dificuldades não se verificam porque o número de contraordenações cometidas é limitado e não existe o risco de aplicação de uma coima desproporcionada, uma vez que o limite máximo da coima única do concurso previsto no artigo 19.º n.º 2 do RGCO não pode exceder o dobro do limite máximo mais elevado das contraordenações em concurso. Por tais motivos, neste caso concreto falta a analogia substancial entre os regimes primário e subsidiário, que é pressuposto da aplicação deste último (cf. para o sector da concorrência, Lei da Concorência, Comentário Conimbricense, 2.ª Edição, Almedina, páginas 281 a 283).
67. Acresce que, apesar de não existirem obstáculos dogmáticos à aplicação da figura da contraordenação continuada, desde que estejam verificados todos os requisitos previstos no artigo 30.º n.º 2 do CP, afigura-se que a ausência de consagração normativa da contraordenação continuada no artigo 19.º do RGCO, foi querida pelo legislador e, portanto (pelo menos em regra e sem prejuízo de casos excepcionais em que a analogia substancial o justifique), não é uma lacuna que deva ser preenchida pela aplicação analógica do artigo 30.º n.º 2 do CP, em condições, como sucede no caso em análise, em que não existe analogia substancial entre o regime primário e o subsidiário; em tais condições, é forçoso concluir que a omissão do direito primário foi uma opção de politica de ordenação social tomada pelo legislador e, portanto, a aplicação do direito subsidiário desvirtuaria a regulamentação primária, quer sectorial, quer geral, que tem primazia (cf. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Regime Geral das Contraordenações, 2.ª Edição, Universidade Católica Editora, páginas 122 e 123).
68. Motivos pelos quais improcede este segmento da argumentação da recorrente.
D. Medida concreta das coimas parcelares e da coima única
69. No que respeita à medida concreta das coimas parcelares, segundo o Tribunal julga perceber, a recorrente defende que, a ser condenada pelas três infracções muito graves objecto de recurso, o Tribunal deve julgar que agiu com negligência e não com dolo e, portanto, aplicar a moldura abstracta da coima prevista para a negligência que é menor. Adicionalmente, a recorrente defende que não tendo ficado provado que obteve benefício económico, as coimas concretas parcelares devem ser fixadas no mínimo da moldura abstracta.
70. Convém recordar que, por cada uma das contraordenações muito graves aqui em causa, previstas e punidas pelos artigos 129.º n.º 1 – g) e n.º 2 (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2), 551.º n.º 4 e 554.º n. 4, o Tribunal a quo condenou a arguida, respectivamente, nas coimas parcelares de 14.000 euros 15.000 euros e 15.000 euros, conforme dispositivo da sentença recorrida transcrito supra no parágrafo 1.
71. À luz do disposto no artigo 18.º n.º 1 do RGCO, ex vi artigo 559.º do CT, a determinação da medida da coima, no caso em análise, faz-se em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contra-ordenação. De entre estes factores, com base nos quais deve ser determinada a medida concreta da coima, os que são postos em causa pela recorrente, são a culpa, que a recorrente defende que foi negligente e não dolosa, e o benefício económico, que a recorrente defende não ter obtido.
72. Cada uma das três contraordenações muito graves previstas no artigo 129.º n.º 1 g) e n.º 2 praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a 2 500 000 euros e inferior a 5 000 000 euros, como é o caso da recorrente, é punica com uma coima de 42 UC a 120 UC em caso de negligência e de 120 UC a 280 UC em caso de dolo.
73. Dito isto, pelos motivos já acima explicados na análise da questão B, não merece censura a sentença impugnada na parte em que julgou que a recorrente agiu com dolo. Pelo que, improcede a pretensão da recorrente de que lhe seja aplicada a moldura abstracta da coima prevista para a negligência.
74. Quanto à alegada inexistência de benefício económico, o Tribunal a quo julgou que existe benefício económico com base na seguinte a fundamentação: “(iv) no que respeita ao benefício económico, no que concerne às contraordenações muito graves não podemos deixar de subscrever a decisão impugnada quando consigna que embora não tenha sido apurado um valor em concreto, haverá que concluir que a Arguida impugnante, beneficiando da cedência ilícita dos trabalhadores, obteve um beneficio que se traduziu em não ter de cumprir com as obrigações legais e custos que teria de suportar se contratasse diretamente os trabalhadores ou recorresse à sua contratação a empresas de trabalho temporário devidamente licenciadas (...)”.
75. Com efeito, do conjunto dos factos provados enunciados supra no parágrafo 13, em particular dos factos provados 15 a 21, resulta que a recorrente, embora tenha pago uma retribuição às co-arguidas pela cedência dos trabalhadores eximiu-se do cumprimento dos deveres que para si resultariam, enquanto utilizadora, do regime de prestação de trabalho do trabalhador temporário, consagrado nos artigos 185.º a 192.º do CT. Em particular, a recorrente eximiu-se da obrigação de supportar os encargos resultantes do pagamento aos trabalhadores cedidos da retribuição mínima e dos subsídios de férias e de Natal e outras prestações regulares e periódicas, em dinheiro ou em espécie, previstos no artigo 185.º n.ºs 5 e 6 do CT (na redacção da Lei 93/2019 de 4.9, em vigor à data da prática dos factos).
76. Em consequência, tendo os factores mencionados no parágrafo anterior valor económico, afigura-se que a recorrente, com a prática das três contraordenações muito graves aqui em causa, obteve um benefício económico não concretamente apurado/liquidado, pelo facto de se ter subtraído ao cumprimento dos deveres enunciados no parágrafo anterior.
77. Pelo que, não merece censura a sentença recorrida na parte em que levou em conta, na determinação da medida concreta das coimas parcelares, que a recorrente/arguida, obteve benefício económico com a prática das contraordenações muito graves aqui em causa.
78. Motivos pelos quais o Tribunal mantém inalteradas as coimas parcelares concretas aplicadas.
79. No que respeita à discordância da recorrente quanto à punição da pluralidade de contraordenações, tal como já foi explicado na análise da questão C, não é de aplicar no presente caso o regime subsidiário do crime continuado previsto no artigo 30.º n.º 2 do CP , devendo as contraordenações aqui em causa ser punidas de acordo com as regras do concurso – cf. artigo 19.º do RGCO (ex vi artigo 549.º do CT).
80. Como também já foi referido no parágrafo 43, a determinação da coima única do concurso exige a avaliação global da ilicitude e da culpa do conjunto das contraordenações.
81. Com efeito, de acordo com a doutrina que o Tribunal aqui acompanha: “A determinação da coima única pauta-se pela avaliação global da ilicitude e da culpa do conjunto das contra-ordenações em concurso não podendo ser reiterados critérios que presidiram à obtenção das coimas correspondentes a cada uma delas. Tal qual sucede, de resto, com a fixação da pena única do concurso de crimes. Assim, fora de consideração ficam a situação económica do agente, o benefício económico que este retirou da prática das contra-ordenações, bem como so critérios previstos nos ns. 2 e 3 do art.º 19.º do RGCO para determinação da medida da coima.”
82. Ora, na determinação da medida da coima única do concurso, o Tribunal a quo ponderou apenas a iliciude, como resulta do seguinte trecho da sentença recorrida: “Dentro de tal moldura e ponderando a ilicitude global da conduta da Arguida, considero adequada e proporcional a fixação da coima única em €31.000,00.”
83. O problema que se coloca é saber se a ponderação adicional da culpa da recorrente pode conduzir à diminuição da coima única do concurso fixada em 31 000,00 euros.
84. A resposta que o Tribunal da Relação dá é negativa, uma vez que a culpa do conjunto das três infracções objecto do recurso foi dolosa, como foi acima explicado na análise da questão B. Do facto provado 28 resulta que o dolo foi directo – cf. artigo 14.º n.º 1 do CP, ex vi artigo 32.º do RGCO e artigos 8.º n.º 2 a contrario do RGCO, todos eles aplicáveis por força do artigo 549.º do CT. Pelo que, embora o Tribunal a quo devesse ter feito a ponderação global da culpa, adicionalmente à ponderação global da ilicitude, o certo é que da ponderação adicional do dolo directo das três contraordenações graves não resulta a pretendida diminuição mas antes o agravamento da medida concreta da coima única.
85. Em consequência, mantém-se inalterada a coima única do concurso e improcede este segmento da argumentação da recorrente. Em síntese
86. O Tribunal rejeita o recurso da sentença da primeira instância na parte em que condenou a recorrente/arguida pela prática negligente de três contraordenações graves, previstas e punidas pelas disposições conjuntas dos artigos 108º n.ºs 1, 3 - a) e 7 da Lei n.º 102/2009 e 554º n.º 3 - c) do CT, respectivamente, no pagamento de uma coima de 1.300 euros por cada uma dessas contraordenações, uma vez que nos termos do artigo 49.º n.º 1 – a) da Lei 107/2009, nessa parte, a decisão não é recorrivel.
87. O objecto do presente recurso é apenas a decisão que condenou a arguida pela prática dolosa de três contraordenações muito graves previstas nos artigos 129.º n.º 1 - g) e n.º 2 na redacção em vigor à data da prática dos factos (actual n.º 3 após renumeração levada a cabo pela Lei 13/2023), 551º n.º 4 e 554º n.º 4 - c) do CT.
88. À luz do disposto no artigo 410.º n.ºs 2 do CPP (ex vi artigo 50.º da Lei 107/2009) e no artigo 39.º n.º 4 da Lei 107/2009, não se verifica nenhum das nulidades da sentença recorrida invocadas pela arguida/recorrente.
89. Não merece censura a sentença recorrida, na parte em que julgou que a arguida/recorrente agiu com dolo ao praticar as três contraordenações muito graves previstas nos artigos 129.º n.º 1 - g) e n.º 2, 551º n.º 4 e 554º n.º 4 - c) do CT.
90. Apesar de não existirem obstáculos dogmáticos à aplicação da figura da contraordenação continuada, desde que estejam verificados todos os requisitos previstos no artigo 30.º n.º 2 do CP, afigura-se que a ausência de consagração normativa da contraordenação continuada no artigo 19.º do RGCO não é uma lacuna mas a solução que o legislador quis consgarar e, portanto não há lugar à aplicação analógica do artigo 30.º n.º 2 do CP.
91. Pelo que, à luz do disposto nos artigos 558.º n.º 3 do CT e 19.º (ex vi artigo 549.º do CT), não merece censura a punição do concurso de contraordenações.
92. Resulta dos factos provados 15 a 21 que a recorrente, com a prática das três contraordenações muito graves objecto do presente recurso, obteve um benefício económico não concretamente apurado/liquidado, pelo facto de se ter eximido do cumprimento dos encargos com o pagamento, aos trabalhadores cedidos, da retribuição mínima e dos subsídios de férias e de Natal e outras prestações regulares e periódicas, em dinheiro ou em espécie, previstas no artigo 185.º n.ºs 5 e 6 do CT. (na redacção da Lei 93/2019 de 4.9, em vigor à data da prática dos factos).
93. Do facto provado 28 resulta que a recorrente praticou as três contraordenações muito graves aqui em causa com dolo directo – cf. artigo 14.º n.º 1 do CP, ex vi artigo 32.º do RGCO e artigos 8.º n.º 2 a contrario do RGCO, todos eles aplicáveis por força do artigo 549.º do CT.
94. Embora na determinação da coima única do concurso, o Tribunal a quo devese ter feito a ponderação global da culpa, adicionalmente à ponderação global da ilicitude, o certo é que da ponderação adicional do dolo directo das três contraordenações muito graves não resultaria a pretendida diminuição, mas antes o agravamento, da medida concreta da coima única.
95. Motivos pelos quais é negado provimento ao recurso. Custas
96. A recorrente é condenada em 3 UC de taxa de justiça pela rejeição parcial do recurso – cf. artigos 414.º n.º 2 e 420.º n.º 1 – b) e n.º 3 do CPP ex vi artigos 92.º n.º 1 e 93.º n.º 3 do RGCO e artigo 60.º da Lei 107/2009.
97. Tendo sido condenada em primeira instância, pelo decaimento total no presente recurso a recorrente é condenada em 4 Uc de taxa de justiça – cf. artigo 513.º n.º 1 do CPP (ex vi artigos 92.º n.º 1 e 93.º n.º 3 do RGCO e artigo 60.º da Lei 107/2009), conjugado com o artigo 8.º n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais.
Decisão
Acordam as juízes que compõem a presente secção em:
I. Rejeitar o recurso da sentença da primeira instância na parte em que condenou a recorrente pela prática negligente de três contraordenações graves, previstas e punidas pelas disposições conjuntas dos artigos 108º n.ºs 1, 3 - a) e 7 da Lei n.º 102/2009 e 554º n.º 3 - c) do CT.
II. Condenar a recorrente em 3 Uc de taxa de justiça pela rejeição parcial do recurso.
III. Negar provimento ao recurso na restante parte e manter a decisão recorrida.
IV. Condenar a recorrente em 4 Uc de taxa de justiça pelo decaimento total no recurso.
Lisboa, 23.10.2024
Paula Pott
Paula santos
Alda Martins