ACÇÃO DE DIVISÃO DE COISA COMUM
HERANÇA
REPRESENTAÇÃO
PARTILHA
COMPROPRIETÁRIO
Sumário

(Sumário da responsabilidade do relator)
I- Se entre os demandantes se encontram todos os herdeiros do consorte pré-falecido, sendo a Ré a outra consorte do imóvel que comprovadamente integra a herança do consorte falecido, então a respectiva herança mostra-se devidamente representada nos termos do art.º 2091, nº 1, do CC, não se exigindo que previamente à divisão de coisa comum se proceda necessariamente à sua partilha.
II- Conhecendo-se os comproprietários, independentemente do conteúdo do seu direito, não se encontra qualquer utilidade, prática ou jurídica, para que, previamente à divisão do imóvel, se proceda à partilha dos bens deixados pelos comproprietários falecidos, onde se incluía a compropriedade do imóvel a dividir; sabe-se a quem pertence o direito, por sucessão, e conhece-se também a sua extensão, não advindo qualquer interesse prático na exigência da partilha, por decesso dos primitivos comproprietários. A divisão da coisa comum, assim como a venda antecipada antes da partilha, não prejudica o direito patrimonial dos respectivos interessados.

Texto Integral

I – RELATÓRIO
APELANTES/AUTORAS: A …, B …, C …, D … e E …
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APELADA/RÉ: F …
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Com os sinais dos autos. Valor da acção: o indicado na petição segundo o despacho de 7/11/2023, seja 109.630, 15 euros (despacho de 7/11/2023)
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I.1. As Autoras intentaram conta a Ré a presente acção de divisão de coisa comum alegando, em síntese, que são os únicos herdeiros de G …, já falecido, e que este último e a Requerida eram os donos e legítimos proprietários, em partes iguais, do prédio urbano, destinado a habitação, correspondente à fração “…”, sita na Rua …, n.º …, …, Linda-a-Velha, Oeiras. Mais alegam que tem sido a Requerida a utilizar em exclusivo o mesmo imóvel. Uma vez que os Requerentes não pretendem manter a situação de indivisão da fracção, vieram requerer que seja declarada a indivisibilidade do imóvel e que seja dissolvida essa compropriedade através da adjudicação do mesmo imóvel à Requerida ou da venda com repartição do respetivo valor.
I.2. Citada, a requerida apresentou contestação, defendendo-se, entre o mais, por excepção dilatória, alegando, para o efeito, que os requerentes não são comproprietários da fracção em apreço, mas sim, herdeiros de um dos comproprietários, sem que tenha sido previamente efetuada a partilha dos bens da herança aberta em nome desse comproprietário, pelo que os requerentes, na qualidade de herdeiros, não poderiam instaurar a presente ação de divisão da coisa comum para dividir um prédio que integra a herança.
I.3. Notificados para o exercício do contraditório, os requerentes pugnaram pela improcedência da referida exceção dilatória, mantendo, no essencial, a posição vertida pelos mesmos no requerimento inicial.
I.4. Inconformadas com a decisão de 6/5/2024 que julgou verificada a excepção dilatória de nulidade de todo o processo, resultante do erro na forma de processo em consequência, absolveu a requerida da instância (artigos 278.º, n.º 1, alínea b), 576.º, n.ºs 1 e 2, 577.º, alínea b), e 578.º, todos do CPC), dela apelaram as Autoras, em cujas alegações concluem:
A. O presente recurso tem por objeto a douta sentença de 06.05.2024 que julgou procedente a excepção dilatória de nulidade de todo o processo por alegado vício na forma do processo;
B. A decisão sob sindicância violou os artigos 2030.º, 2031.º, 2032.º, 2033.º, 2050.º, 2091.º, 2131.º, 2156.º, 2159, n.º 1, 1412.º e 1413.º, todos do Código Civil (CC), bem como os artigos 6.º, n.º 2 e 590.º, n.º 2, alínea a), e 3, do CPC;
C. Caso assim não se entenda a omissão do Tribunal a quo ao não convidar os ora Recorrentes a suprir a alegada irregularidade detetada configura a prática de nulidade processual, já que influencia o julgamento da causa
D. O presente meio processual – acção de divisão de coisa comum – é o meio adequado a assegurar o interesse das partes,
E. Já que “Nenhum dos comproprietários é obrigado a permanecer na indivisão, salvo quando se houver convencionado que a coisa se conserve indivisa.” – cf artigo 1412.º, n.º 1, do CC;
F. Não existe qualquer fundamento legal que obrigue os ora recorrentes a recorrem, primeiramente, à partilha do bem imóvel em causa nestes autos,
G. Até porque, não pretendem os recorrentes partilhar o bem ou permanecer em copropriedade com a recorrida, o que sempre se verificaria em caso de partilha de apenas metade do bem;
H. Nesta senda apela-se a atenção de V. Exas. para a abundante jurisprudência existente, entre a qual se encontram os acórdãos citados nas Alegações;
I. A decisão proferida deverá ser substituída por outra que declare totalmente improcedente a excepção dilatória de nulidade de todo o processo e ordene o prosseguimento dos autos
J. A sentença sob sindicância violou, também, o disposto nos artigos 6.º, n.º 2, e 590.º, n.º 2, alínea a), e 3, do CPC;
K. A legitimidade e o interesse em agir dos ora recorrentes jamais poderia aferir-se do mero registo do óbito na certidão predial permanente do imóvel, até porque o exercício dos direitos do falecido transmite-se imediatamente para os seus herdeiros por via da simples aceitação da herança (expressa ou tácita);
L. Sem prejuízo, mal andou também o Tribunal a quo a não convidar (facto que sempre se impunha) os Recorrentes a sanar a alegada irregularidade ao abrigo dos artigos 6.º, n.º 2, e 590.º, n.º 2, alínea a), e 3, ambos do CPC, o que consubstancia uma nulidade processual (artigo 195.º, n.º 1 do CPC);
M. Assim, para, ao decidir como decidiu o Tribunal a quo incorreu em erro manifesto na aplicação da lei, violando o disposto nos artigos 6.º, n.º 2, 590.º, n.º 2, alínea a), e n.º 3, e, ainda, o artigo 547.º, todos do CPC
Termina pedindo a revogação da decisão e a sua substituição por outra que ordena o prosseguimento dos autos.
I.2. Em contra-alegações a Ré pugna pela manutenção do decidido
I.3. Nada obsta ao conhecimento do recurso, a instância mantem-se válida
I.4 Questões a resolver:
a) Saber se ocorre, no despacho recorrido erro de interpretação e de aplicação do disposto nos art.º sº 2030.º, 2031.º, 2032.º, 2033.º, 2050.º, 2091.º, 2131.º, 2156.º, 2159, n.º 1, 1412.º e 1413.º, todos do Código Civil (CC);
b) Subsidiariamente, entendendo-se a necessidade do registo do imóvel a favor da herança indivisa do comproprietário pré-falecido, saber se ocorre nulidade processual por falta de convite dos ora recorrentes a sanar a alegada irregularidade ao abrigo dos artigos 6.º, n.º 2, e 590.º, n.º 2, alínea a), e 3, ambos do CPC;
II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
É do seguinte teor a decisão recorrida:
“A …, B …, C …, D … e E … (Requerentes) vieram intentar a presente ação de divisão de coisa comum contra F … (Requerida), alegando, em síntese, que os Requerentes são os únicos herdeiros de G …, já falecido, e que este último e a Requerida eram os donos e legítimos proprietários, em partes iguais, do prédio urbano, destinado a habitação, correspondente à fração “F”, sita na Rua …, n.º …, …, …, Oeiras. Mais alegam que tem sido a Requerida a utilizar em exclusivo o mesmo imóvel.
Uma vez que os Requerentes não pretendem manter a situação de indivisão da fração, vieram requerer que seja declarada a indivisibilidade do imóvel e que seja dissolvida essa compropriedade através da adjudicação do mesmo imóvel à Requerida ou da venda com repartição do respetivo valor.
Citada, a Requerida apresentou contestação, defendendo-se, entre o mais, por exceção dilatória, alegando, para o efeito, que os Requerentes não são comproprietários da fração em apreço, mas sim, herdeiros de um dos comproprietários, sem que tenha sido previamente efetuada a partilha dos bens da herança aberta em nome desse comproprietário, pelo que os Requerentes, na qualidade de herdeiros, não poderiam instaurar a presente ação de divisão da coisa comum para dividir um prédio que integra a herança.
Notificados para o exercício do contraditório, os Requerentes pugnaram pela improcedência da referida exceção dilatória, mantendo, no essencial, a posição vertida pelos mesmos no requerimento inicial.
Cumpre apreciar e decidir. Compulsados os autos, com a devida vénia, constata-se que assiste razão à Requerida, pelas seguintes ordens de razão.
Constitui pressuposto da ação de divisão de coisa comum a existência de compropriedade, i.e., que incida sobre o bem concreto a dividir um direito detido conjuntamente pelos contitulares.
Sucede, porém, que os herdeiros do comproprietário não têm direito a parte determinada dos bens que compõem a respetiva herança, mas apenas a uma parte ideal do todo, pelo que a ação de divisão de coisa comum não é adequada para pôr termo à comunhão hereditária, pois enquanto se não fizer a partilha o direito daqueles recai sobre o conjunto da herança e não sobre bens certos e determinados, relativamente aos quais não têm a qualidade de proprietários. Dito de outro modo, antes da partilha inexiste compropriedade, sendo certo que depois da partilha é que a poderá haver.
Deste modo, cumpre distinguir duas situações: (i) a situação em que o comproprietário, que consta do registo predial nessa qualidade, é uma pessoa falecida, sendo os seus herdeiros os requerentes da ação de divisão da coisa comum; e (ii) a situação em que a herança indivisa é, ela própria, comproprietária (a par de terceiros) de um imóvel.
Na primeira situação, que é a que se verifica nestes autos, na esteira de alguma Doutrina e Jurisprudência, que se acolhe, não se estando perante uma coisa comum de que os Requerentes (herdeiros) sejam comproprietários, posto que ainda não foi efetuada a partilha, tais herdeiros não podem instaurar ação de divisão de coisa comum para dividir um prédio que integre a herança. Por outras palavras, os herdeiros do comproprietário não podem instaurar ação de divisão de coisa comum sem que, previamente, tenham procedido à partilha (Neste sentido, na Doutrina, cf. LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA, Processos Especiais de Divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas, 3.ª ed., Coimbra: Almedina, 2023, p. 17 e, na Jurisprudência, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 04/02/1997, proc. n.º 435/96 (SILVA PAIXÃO), in www.stj.pt; e o Acórdão de 30/01/2013, proc. n.º 1100/11.7TBABT.E1.S1 (ÁLVARO RODRIGUES), disponível em www.dgsi.pt).
Efetivamente, enquanto a causa de pedir no processo de inventário é a existência de comunhão hereditária integrada por bens a partilhar deixados pelo inventariado, correspondendo o pedido na partilha de tais bens pelos interessados, no processo de divisão de coisa comum a causa de pedir consiste na compropriedade de certo bem que se quer dissolver, coincidindo o pedido com a adjudicação ou com a venda desse bem. Por seu turno, na segunda situação é já aceite na Jurisprudência dos Tribunais Superiores que a ação de divisão de coisa comum possa ser intentada por ou contra a herança indivisa, representada por todos os herdeiros, nos termos do artigo 2091.º, n.º 1, do Código Civil, que nela farão valer o direito em nome da herança e não em nome próprio (Cf. LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA, ob. cit., pp. 17 e 18; e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 02/02/2021, proc. n.º 284/18.8T8LSB.L1-7 (MICAELA SOUSA), Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 11/03/2021, proc. n.º 5901/18.7T8GMR.G1 (ANTÓNIO FIGUEIREDO DE ALMEIDA), e Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 22/03/2021, proc. n.º 25509/18.6T8PRT.P1 (ANA PAULA AMORIM), disponíveis em www.dgsi.pt).
Volvendo ao caso sub judice, resultando das certidões do registo predial juntas no requerimento inicial que a propriedade do imóvel está ainda registada no nome do falecido e no nome da Requerida, e que, deste modo, a herança indivisa não se encontra registada, ela própria, como comproprietária referido imóvel, afigura-se que não podem os herdeiros daquele comproprietário falecido instaurar a presente ação de divisão de coisa comum sem que, previamente, tenham procedido à partilha.
Por conseguinte, afigura-se que a presente ação não é o meio processual adequado/próprio para proceder à divisão do imóvel em apreço.
A impropriedade da forma de processo conduz à nulidade de todo o processo, o que configura uma exceção dilatória, sendo certo que se considera existir erro sobre a forma de processo especial quando o fim concreto para que processo foi utilizado não corresponda ao fim a que lei o destina (artigo 193.º e 576.º do Código de Processo Civil).
Acresce que a impropriedade do meio impede o aproveitamento de qualquer ato praticado, inadmissível em qualquer outra forma de processo.
Adicionalmente, nos termos do disposto nos artigos 576.º e 577.º, alínea b), do Código de Processo Civil, as exceções dilatórias obstam a que o Tribunal conheça do mérito da causa e dão lugar à absolvição do Réu da instância.
Pelo exposto, ao abrigo dos artigos 278.º, n.º 1, alínea b), 576.º, n.ºs 1 e 2, 577.º, alínea b), e 578.º, todos do CPC, julga-se verificada a exceção dilatória de nulidade de todo o processo, resultante do erro na forma de processo e, em consequência, absolve-se a Requerida da instância. Custas pelos Requerentes, atento o seu decaimento (art.º 527.º e ss. do CPC).
Fixa-se à causa o valor atribuído pelos Requerentes no requerimento inicial (o qual não mereceu oposição por parte da Requerida): € 109.630,15 - cf. artigo 302.º, n.º 2, do CPC.
Notifique e registe.
III- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
III.1. Conforme resulta do disposto nos art.ºs 608, n.º 2, 5, 635, n.º 4, 649, n.º 3, do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539).
III.2. Não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objecto tal como enunciadas em I.
III.3. Saber se ocorre, no despacho recorrido, erro de interpretação e de aplicação do disposto nos art.ºs 2030.º, 2031.º, 2032.º, 2033.º, 2050.º, 2091.º, 2131.º, 2156.º, 2159, n.º 1, 1412.º e 1413.º, todos do Código Civil (CCiv).
III.3.1. Sustentam em suma os Autores que:
. os ora recorrentes actuaram como herdeiros únicos da herança indivisa do falecido G …, o que fazem de forma unânime e em representação da universalidade da herança;
. nada obriga a que, primeiramente, tenha de ser concluída a partilha do bem e, só posteriormente, possa ser requerida a sua divisão, os ora Recorrentes não pretendem partilhar o imóvel, nem poderiam, visto a aqui Recorrida não ser sequer herdeira do falecido coproprietário;
.  não sendo o processo de inventário a sede própria para pôr fim à copropriedade que se pretende fazer cessar. Nesta senda, vide o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa 25.02.2021 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido no Processo n.º 20403/19.6T8SNT.L1-6;
III.3.2. Por seu turno sustenta-se, no que aqui releva, na decisão recorrida que:
. enquanto a causa de pedir no processo de inventário é a existência de comunhão hereditária integrada por bens a partilhar deixados pelo inventariado, correspondendo o pedido na partilha de tais bens pelos interessados, no processo de divisão de coisa comum a causa de pedir consiste na compropriedade de certo bem que se quer dissolver, coincidindo o pedido com a adjudicação ou com a venda desse bem;
. por seu turno, na segunda situação é já aceite na Jurisprudência dos Tribunais Superiores que a ação de divisão de coisa comum possa ser intentada por ou contra a herança indivisa, representada por todos os herdeiros, nos termos do artigo 2091.º, n.º 1, do Código Civil, que nela farão valer o direito em nome da herança e não em nome próprio;
. resultando das certidões do registo predial juntas no requerimento inicial que a propriedade do imóvel está ainda registada no nome do falecido e no nome da requerida, e que, deste modo, a herança indivisa não se encontra registada, ela própria, como comproprietária do referido imóvel, afigura-se que não podem os herdeiros daquele comproprietário falecido instaurar a presente ação de divisão de coisa comum sem que, previamente, tenham procedido à partilha;
III.3.3. Importa, desde logo, não confundir a impropriedade da forma de processo com a inadequação da pretensão deduzida em relação ao fundamento invocado (a qual consubstancia uma situação de manifesta improcedência da acção). Ou seja: a forma de processo é aferível em função do tipo de pretensão formulada pelo autor e não em referência à pretensão que devia ser por ele deduzida. Se a forma de processo empregue não for apropriada ao tipo da pretensão deduzida, ocorre o vício processual de erro na forma de processo; se a forma de processo seguida se adequar à pretensão formulada, mas esta não for conforme aos fundamentos invocados, estaremos, quando muito, perante uma questão de mérito conducente à improcedência da acção.[2]
III.3.4. E qual é a pretensão das Autoras? A pretensão é: “...em consequência da impossibilidade de divisão, entre as partes, do Imóvel objeto da copropriedade, determinar-se a sua divisão em valor pela adjudicação ou venda judicial”. Como fundamento alegam que:
. o imóvel cuja divisão se requer nestes autos era detido em copropriedade pela Requerida e por G …;
. o coproprietário G … faleceu em 02.11.2022 – cf. Certidão de óbito que ora aqui se junta como Documento n.º 3 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;
. o coproprietário falecido encontrava-se casado, com a 1ª A. – A … - no regime da separação de bens os requerentes são os únicos herdeiros do falecido a aqui 1.ª A., foi constituída cabeça-de-casal da respetiva herança os requerentes, por terem legitimidade, intentam contra a requerida a presente ação de divisão de coisa comum;
. o falecido coproprietário e a requerida são coproprietários da fração“…”, sita na Rua …, n.º …, …, Linda a Velha, descrita na Conservatória do Registo Predial de Oeiras sob o n.º …, da União de Freguesias de …, … e …, e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo …º, da União de Freguesias de …, … e … (doravante designado por “Imóvel”), conforme certidão predial permanente com o código …-…-…-…-… e caderneta matricial já juntos como Doc. 1 e 2;
. os Requerentes, na qualidade de herdeiros legítimos do falecido coproprietário, são coproprietários de ½ do Imóvel, mostrando-se registada a aquisição a favor do coproprietário falecido pela AP. … de 1990/09/05, a Requerida é coproprietária do restante ½, mostrando-se registada a aquisição a favor desta pela mesma AP. … de 1990/09/05;
. o objeto da compropriedade (fração “…”) é substancial e juridicamente indivisível, não sendo possível a sua divisão sem a alteração da sua substância, diminuição de valor ou prejuízo do fim a que se destina, não há possibilidade de acordo com a outra comproprietária, aqui Requerida, nomeadamente quanto ao uso e ao destino a dar ao Imóvel objeto da copropriedade;
. os Requerentes pretendem assim pôr termo imediato à indivisão do imóvel em causa;
III.3.5. Havendo uma situação de compropriedade entre o falecido G … e a requerida F …, em razão do falecimento de G … ocorre em relação ao imóvel uma situação de compropriedade entre a herança do mesmo e a requerida; sendo os Autores os únicos herdeiros do falecido G …, pretendendo por termo à indivisão do imóvel que se encontra em compropriedade com a Ré, que não é herdeira do falecido, o meio próprio não é o do processo de inventário, precisamente porque a Ré não é herdeira do falecido antes a acção especial de divisão de coisa comum. Defende-se na sentença recorrida que só seria assim se nos termos do artigo 2091.º, n.º 1, do Código Civil se os Autores nela fizessem valer o direito em nome da herança e não em nome próprio como, aparentemente, fazem.
III.3.6. A herança é comummente designada na doutrina como uma comunhão, na medida em que sendo vários os herdeiros os seus direitos incidem sobre uma plêiade de bens e direitos relativamente a cada um dos quais não é possível afirmar que qualquer deles seja titular do direito de propriedade até porque em partilha pode qualquer desses bens ou direitos ficar a pertencer a apenas um ou alguns dos herdeiros aplicando-se-lhe, é certo, as regras da compropriedade. As regras da compropriedade são aplicáveis com as necessárias adaptações à comunhão de quaisquer outros direitos, sem prejuízo do disposto especialmente para cada um deles (art.º 1404 do CCiv); na falta de acordo sobre o uso da cosia comum a qualquer dos comproprietários é lícito servir-se dela e o uso da coisa comum por um dos comproprietários não constitui posse exclusiva, ou posse de quota superior à dele, salvo se tiver havido inversão do título (art.º 1406, n.ºs 1 e 2 do CCiv). O comproprietário pode dispor da sua quota na comunhão mas não pode sem consentimento dos restantes consortes dispor de parte especificada da coisa comum (in casu em exclusivo gozo pessoal, já que ao construir sobre o terreno os Autores inviabilizam o gozo desse terreno por parte dos outros comproprietários), sendo que a disposição de parte especificada da coisa comum é havida como disposição de coisa alheia (art.º 1408, n.ºs 1 e 2 do CCiv).
III.3.7. Segundo a doutrina tradicional na compropriedade a cada um dos comproprietários pertence um quota parte ideal ou abstracta da coisa, fracção do direito de propriedade que se estende até a divisão sobre todas e cada uma das partes do objecto _BAUDRY e CHAUVEAU, Des biens, n.º 267, doutrina que foi combatida na medida em que no fundo se trata de uma ficção para facilitar e explorar as relações existentes entre os condóminos (o objecto imediato de um direito deveria ser uma coisa e não também um direito como é o caso da quota), sustentando uns que o que ocorre é que o direito se fracciona (UNGER, Revista di diritto civile, 1921, p.12) e quem pense que não é o direito que se reparte antes o seu valor económico (WINDSCHEID, Pandette, § 142, nota 11) e quem sustente que não ocorre nenhum fraccionamento do direito, acontecendo que cada consorte é titular de um direito de propriedade sobre toda a coisa (vários direitos de vários titulares sobre a coisa toda (DERNBURG, Pandette, I, § 195) e ainda quem entenda que a compropriedade forma uma pessoa colectiva, entidade distinta dos consortes (LUZZATO, La comproprieta nel diritto italiano, n.ºs 19 e ss).[3] Entre nós, não tem sido pacífico o entendimento sobre a natureza jurídica da compropriedade, por último Menezes Leitão sustentando que a Lei não personifica a compropriedade pelo que carece de sentido qualificá-la como pessoa colectiva como alguma doutrina alemã a entende, Henrique Mesquita reconhece a unidade subordinada a uma organização, ainda que não personalizada, Rui Pinto Duarte e Menezes Leitão reconhecem a unidade do direito com pluralidade de titulares, Sousa Antunes rejeita a ideia unitária, contrapõe a doutrina da pluralidade de direitos sobre a mesma coisa, o mesmo acontecendo com José Luís Bonifácio Ramos que não aderindo às teorias unitárias sustenta que sobrevindo a compropriedade serão os diversos sujeitos titulares de uma única coisa, a unidade opera a nível da coisa não ao nível do direito, sobre elas incidem vários direitos de propriedade titulados por sujeitos distinto dos demais, o regime jurídico do instituto ajuda a perceber esta situação pois identifica os direitos dos diferentes sujeitos da coisa submetida ao regime uno da compropriedade.[4] Perfilhamos este entendimento. Na comunhão em mão comum ou propriedade colectiva, há um património que é afectado a um certo fim que pertence a dois ou mais sujeitos unidos por um determinado vínculo que tanto pode ser o património comum dos cônjuges, das sociedades não personalizadas e a comunhão hereditária, afectação a um fim que inexiste na compropriedade.[5]
III.3.8. Alguma jurisprudência e também alguma doutrina da especialidade, apontam decisivamente no sentido de que só se pode dividir os bens da herança de que se seja proprietário, ou seja, que tenham sido atribuídos aos herdeiros em partilha previamente realizada. Neste exacto sentido, podem ver-se, entre outros, o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 10-12-1987, de que foi Relator, o Ex Conselheiro Almeida Ribeiro assim sumariado: I - Os herdeiros, por meio de acção de divisão de coisa comum, só podem dividir os bens da herança de que já sejam proprietários, isto é, que lhes tenham já sido atribuídos em partilha previamente realizada. II - A existência ou inexistência de partilha previa é, pois, um facto que tem imperiosamente de ser apurado pelas instâncias quando aquela acção tenha por objecto bens da herança. Nesse sentido também o Acórdão do STJ de 4-02-1997, relatado pelo Exmº Conselheiro Silva Paixão, assim sumariado na parte que ora interessa: II - A compropriedade pressupõe um direito de propriedade comum sobre uma coisa ou bem concreto e individualizado, ao invés do que sucede na contitularidade do direito à herança que recai sobre uma universalidade de bens, ignorando-se sobre qual ou quais deles o direito hereditário se concretizará. III - Os herdeiros do comproprietário não podem usar de acção de divisão de coisa comum (nem podem nela ser demandados), sem que, previamente, se tenham habilitado e procedido à partilha. A nível doutrinal, assim se pronuncia o Ilustre Magistrado, Dr. Luís Filipe Pires de Sousa, na sua obra de referência «Acções Especiais de Divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas», apoiado em largo acervo jurisprudencial aí indicado: «No caso de comunhão hereditária a mesma cessa pela partilha de uma generalidade de bens entre os interessados, por forma a ficar determinado quais os patrimónios individuais em que tais bens passarão a estar integrados. Até à partilha, os herdeiros são apenas titulares de um direito sobre o conjunto da herança e não sobre bens certos e determinados. Só após a atribuição dos bens em partilha é que os herdeiros podem recorrer à acção de divisão de coisa comum. Dito de outro modo, os herdeiros do comproprietário não podem instaurar acção de divisão de coisa comum sem que, previamente, tenham procedido à partilha. Só após a individualização de um direito de propriedade sobre uma quota do prédio é que se torna viável a divisão de coisa comum.»[ Luís Filipe Pires de Sousa, «Acções Especiais de Divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas», O Ilustre Professor de Coimbra, Doutor Rabindranath Capelo de Sousa assim ensina nas sua Lições de Direito das Sucessões: «Nos casos em que haja lugar à partilha da herança, segundo a opinião dominante, o domínio e posse sobre os bens em concreto da herança só se efectivam após a partilha, uma vez que até aí a herança constitui um património autónomo nada mais tendo os herdeiros do que o direito a uma quota parte do património hereditário» [Rabindranath Capelo de Sousa, Lições de Direito das Sucessões, pg. 185]. Também Professor de Coimbra, o Doutor Pereira Coelho, assim escreveu no seu Direito das Sucessões: «Não se trata uma vulgar compropriedade entendida como participação na propriedade de bens concretos e determinados. Pelo contrário, contitularidade do direito à herança significa tanto como um direito a uma parte ideal, não de cada um dos bens de que se compõe a herança, mas sim da própria herança em si mesma considerada». É inteiramente certo que o nº 1, do art.º 1412º do Código Civil estatui que «nenhum dos comproprietários é obrigado a permanecer na indivisão, salvo se houver convencionado que a coisa se conserve indivisa». Trata-se da consagração legal do vetusto brocardo romano «in communione vel societate nemo compelitur invitus detineri». O direito de exigir a divisão a que se refere o citado inciso legal e que é adjectivado pela acção de divisão de coisa comum, tem pressupostos, e um deles é que os herdeiros do autor da sucessão não dispõem sobre os bens que integram acervo hereditário um direito real, maxime, o direito de propriedade, carecem de efectuar a partilha antes de pretender a divisão de coisa comum. Não há que confundir compropriedade com contitularidade do direito à herança, partilhados os bens, a benefício de inventário ou extrajudicialmente (nesta modalidade só se houver consenso de todos), então as quotas hereditárias serão, em concreto, preenchidas e, só então, os herdeiros serão proprietários dos bens que integrarem as respectivas quotas ou quinhões.[6] Nesse mesmo sentido entendemos nós em acórdão que está disponível no sítio www.dgsi.pt sob o nº 4829/17.2T8LSB.L1-2; revendo a posição anterior numa situação paralela entendemos agora que a acção de divisão de coisa comum é a própria, pelas razões que a seguir referimos.
III.3.9. Os Autores são, alegadamente, os únicos herdeiros do mencionado G … que tinha em compropriedade com a Ré- que não é sua herdeira- o mencionado imóvel, alegadamente indivisível, sendo que os Autores, enquanto herdeiros do mencionado G … não pretendem manter a compropriedade do imóvel que integra a herança indivisa. Os Autores não pretendem partilhar entre si o imóvel que integra a herança indivisa do mencionado G … enquanto comproprietário do mesmo e a Ré também não é herdeira do falecido, pretendem por fim à indivisão da compropriedade que existe sobre o imóvel entre a herança e terceiro. Como acima dissemos, a forma de processo é aferível em função do tipo de pretensão formulada pelo autor e não em referência à pretensão que devia ser por ele deduzida. Se a forma de processo empregue não for apropriada ao tipo da pretensão deduzida, ocorre o vício processual de erro na forma de processo; se a forma de processo seguida se adequar à pretensão formulada, mas esta não for conforme aos fundamentos invocados, estaremos, quando muito, perante uma questão de mérito conducente à improcedência da acção. Acompanhamos aqui o acórdão da Relação do Porto de 22/3/2021 no mencionado processos 25509/18.8T8PRT.P1 relatado por Micaela de Sousa quando refere: “...Mas também refere:”[p]pode ocorrer que a herança indivisa seja, ela própria, comproprietária (a par de terceiros) de um imóvel. Sendo interposta uma ação de divisão de coisa comum de tal imóvel por terceiro, antes da partilha, deverão ser demandados todos os herdeiros, os quais agirão como representantes da herança e não em nome próprio (cfr. art.º  2091º/1 do Código Civil)- LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA, Processos Especiais de Divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas, pág. 19-.O AUTOR tem o cuidado de distinguir as diferentes situações que se podem prefigurar, numa ação de divisão de coisa comum, sob o lado ativo e no lado passivo, começando por analisar a hipótese, no lado ativo, de se apresentar o herdeiro, invocando a qualidade de proprietário, mas também se aprecia a situação, no lado passivo, quando é demandada a herança ilíquida e indivisa, por ser a comproprietária do bem cuja divisão se requer... No caso de estarmos perante uma herança indivisa – ainda não partilhada – mas cujos herdeiros já estão determinados, não detém a mesma personalidade judiciária, não podendo subsumir-se ao conceito legal de património autónomo semelhante cujo titular não esteja determinado, porque como se referiu o legislador refutou tal enquadramento legal... Neste caso, a legitimidade para deduzir oposição em defesa de interesses da herança não pertence a esta, mas sim, conjuntamente, a todos os seus herdeiros, sendo estes as partes na ação, ou ao cabeça de casal – art.º 2091º, do C. Civil. Quer intervenham os herdeiros, quer qualquer das outras entidades referidas, nas situações excecionais a tanto admissíveis, essa intervenção apenas se verifica porque a massa de bens em causa, dado já se mostrar ultrapassado o período de jacência, se acha despojada de personalidade judiciária. Daí a indispensável intervenção dessas pessoas – herdeiros ou outras entidades –, como se, de certo modo, de “representantes” da herança se tratassem, mas assim não sucedendo por que atuando em seu próprio nome, e não – como na representação se faz mister –, em nome do património representado, porquanto este, não dispondo da possibilidade de ser parte em processo judicial não pode, obviamente, propor ou ver contra si proposta qualquer demanda judicial. Trata-se, pois, de legitimidade imposta por lei, decorrente da falta de personalidade judiciária por parte da herança ilíquida e indivisa... São conhecidos os herdeiros da falecida C…, que demandados nessa qualidade não a refutaram e por isso, considera-se que aceitaram a herança A herança e os herdeiros estão devidamente identificados. Desta forma, ao património hereditário de C… sucederam D… e E…, filha e neto (herdeiro testamentário) e como tal, na qualidade de herdeiros, são a parte demandada como sujeito passivo na ação e com personalidade judiciária, porque não estamos na presença de uma herança jacente e a herança ilíquida e indivisa não tem personalidade judiciária. D… e E… são demandados na qualidade de sucessores de C… e é nessa qualidade que são chamados a pronunciar-se sobre a divisão do prédio, pois não se atribui aos réus a qualidade de proprietários do prédio. Apenas a herança, da qual são herdeiros, é comproprietária do prédio na proporção de ¼...Conclui-se, assim, que estão na ação, tal como a autora perspetiva a sua pretensão, os comproprietários do imóvel, todos os consortes e a sua promoção não depende da instauração de processo de inventário para partilha dos bens por óbito de C…, onde se inclui este concreto bem. O inventário apenas faz cessar a comunhão hereditária, mas tal circunstância não impede a divisão do bem quando estão devidamente identificados os comproprietários, sendo um deles os herdeiros de uma herança ilíquida e indivisa. A realidade de facto a que se reporta o acórdão citado na sentença – Ac. Rel. Lisboa (e não do STJ) de 25 de outubro de 2011, Proc. 5326/10.2TBFUN.L1-7[12] (acessível em www.dgsi.pt) é distinta da que se aprecia na presente ação, porquanto no douto acórdão os herdeiros assumiam-se como comproprietários e com tal fundamento instauraram a ação de divisão de coisa comum...”.
III.3.10.  No acórdão referido foi ordenado o prosseguimento da acção porque os demandados individualizados foram-nos na qualidade de herdeiros do falecido consorte. Na situação que nos ocupa não é o consorte não herdeiro que pretende por fim
à indivisão, são os próprios herdeiros do consorte do lado activo. Transpondo para a situação dos autos é verdade que no cabeçalho da acção os autores não se identificam como herdeiros do consorte mas fazem-no, entre o mais, nos art.ºs 11 e ss quando afirmam “..Deste modo, não restam dúvidas que os únicos e universais herdeiros do coproprietário falecido são os aqui Requerentes – cf. artigos. 2131.º e ss. do CC, os quais, por terem legitimidade, intentam contra a Requerida a presente ação de divisão de coisa comum. O falecido coproprietário e a Requerida são coproprietários da fração “…”, sita na Rua …, n.º …, …, Linda a Velha, descrita na Conservatória do Registo Predial de Oeiras sob o n.º …, da União de Freguesias de …, … e …, e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo …º, da União de Freguesias de …, … (doravante designado por “Imóvel”), conforme certidão predial permanente com o código …-…-…-…-… e caderneta matricial já juntos como Doc. 1 e 2, os Requerentes, na qualidade de herdeiros legítimos do falecido coproprietário, são coproprietários de ½ do Imóvel, mostrando-se registada a aquisição a favor do coproprietário falecido pela AP. … de 1990/09/05 – vide Doc. 1 e 2 juntos, a Requerida é coproprietária do restante ½, mostrando-se registada a aquisição a favor desta pela mesma AP. … de 1990/09/05... Os Requerentes pretendem assim pôr termo imediato à indivisão do imóvel em causa”. Verdade que no registo predial o imóvel continua a estar registado em compropriedade entre o falecido e a Ré, não tendo sido o mesmo registado a favor da herança nos termos dos art.ºs 37 e  49 do CRgP, segundo os quais o meeiro ou qualquer dos herdeiros pode pedir a favor de todos os titulares, o registo de aquisição de bens e direito que façam parte da herança indivisa (37/1), registo que é feito em comum e sem determinação de parte ou direito com base em documento comprovativo da habilitação e em declaração que identifique os respectivos bens (49). O registo, nos termos do art.º 37/1, não se confunde com o registo nos termos do art.º 37/2 que se refere ao registo por um dos comproprietários ou compossuidores dos direitos ou bens a favor dos demais titulares e tem geralmente em vista justamente a divisão judicial ou extrajudicial dos bens. O art.º  49.º do CRgP autoriza expressamente o registo de aquisição em comum e sem determinação de parte ou de direito nas condições que nele se explicitam e isto, por seu turno, viabiliza a transmissão de direitos sobre imóvel assim registado na pendência da indivisão hereditária sem ofensa do princípio da legitimação estabelecido no art.º  9.º do mesmo diploma.[7] O que o registo da aquisição em comum e sem determinação de parte ou direito faz presumir é que o bem pertence a uma determinada herança (Neste sentido o Parecer do Conselho Técnico dos Registo e Notariado de 28.1.2009), mas tal nem sequer é posto em causa pela Ré. Será impedimento para a propositura da acção de divisão de coisa comum? Se no âmbito da acção de divisão do imóvel for acordada a venda da fracção que cabia ao falecido G … pois terá de ser inscrita no registo a aquisição da ½ da fracção a favor dos herdeiros do mesmo sem determinação de parte ou direito.
III.3.11. A Ré, para além de excepcionar a impropriedade do meio processual, o que diz é que “inexiste menção de qualquer aquisição nomeadamente por sucessão hereditária dos autores um algum deles (5) e que, “pese embora G … ter falecido na constância do matrimónio com a Autora...e ter deixado um filha desse casamento a Autora D … e ainda ter deixado de união anterior mais três filhos os Autores B …, C … e E … isso não faz deles ou seja da viúva e dos filhos comproprietários da referida fracção (6)...o imóvel faz parte da herança indivisa como é o caso, esta é que é comproprietária do imóvel e não os herdeiros (17)...a Ré não enjeita a possibilidade de vir a ser alcançado uma acordo que ponha termo à situação actual da fracção pondo-se assim termo à indivisão (23).” A Ré não impugna que os Autores sejam os únicos herdeiros do falecido consorte, e, nessa circunstância, entre os demandantes  encontram-se todos os herdeiros do consorte pré-falecido, sendo a Ré a outra consorte do imóvel o qual, comprovadamente, integra a herança do consorte falecido, então a respectiva herança mostra-se devidamente representada nos termos do art.º 2091, nº1, do CC, não se exigindo que previamente à divisão de coisa comum se proceda necessariamente à sua partilha. Os Autores estão em litisconsórcio necessário, exercendo "em conjunto" o direito que era do falecido comproprietário à divisão. Estando na acção não só a Ré consorte como todos os herdeiros do falecido consorte que tal como a Ré não pretendem manter-se na indivisão, sendo essa a pretensão dos Autores que delimita a forma do processo, nenhum obstáculo epistemológico ocorre a que a acção prossiga[8], sendo que o registo nos termos daquelas disposições legais apenas se imporá no caso de alienação da quota parte que pertencia ao falecido G … por parte dos herdeiros.
IV- DECISÃO.
Tudo visto acordam os juízes em julgar procedente a apelação, consequentemente revogam a decisão recorrida, que é substituída por esta que ordena o prosseguimento dos autos entendendo-se que todos os Autores estão em litisconsórcio necessário, exercendo "em conjunto" o direito que era do falecido comproprietário à divisão.
Regime da Responsabilidade por Custas: custas pela Ré que decai e porque decai (art.º 527/1 e 2)

Lxa., 24-10-2024
Vaz Gomes
Arlindo Crua
Laurinda Gemas

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[1] Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pela Lei 41/2013 de 26/7, atento o disposto nos art.º º 5/1, 8, e 7/1 (a contrario sensu) e 8 da mesma Lei que estatuem que o novel Código de Processo Civil entrou em vigor no dia 1/09/2013 e que se aplica imediatamente, atendendo a que a acção foi autuada e distribuída em 2023 e a data da decisão recorrida que é de 6/5/2024; ao Código referido, na redacção dada pela Lei 41/2013, pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação de origem.
[2] Nesse sentido entre outros AcRlxa de 17/3/2011 no processo 3245/08.5YIPRT.L1-2 relatado por Isabel Canadas.
[3] Manuel Rodrigues, in A Posse, Almedina, 1981, pág. 142/143; este autor num outro estudo na Revista de Legislação e Jurisprudência, n.º 55, pp 319 e ss, sustenta que a compropriedade analisa-se em um conjunto de direitos da mesma natureza e extensão, estando cada um dos consortes, no exercício respectivo do direito, limitado pelo exercício dos outros, de modo que há uma realização simultânea e coordenada de todos eles, não se concebendo uma realização simultânea e contraditória de todos eles.
[4] Bonifácio Ramos, José Luís, in Manual de Direitos Reais, 2017, AAFDL, pp 344/345.
[5] Último autor e obra citados, pág. 337.
[6] Cfr. AcSTJ de 30/1/2013 no processo 1100/11.7TBABT.E1.S1 relatado por Álvaro Rodrigues disponível no sítio www.dgsi.pt.
[7] Nesse sentido entre outros o AcSTJ de 26/6/2007, no processo 07ª1661 relato por Nuno Cameira disponível no sítio www.dgsi.pt.
[8] Neste sentido entre outros o Ac da RLxa de 25/2/2021 no processo n.º 20403/19.6T8SNT.L1-6, relatado por António Santos, numa situação em que tendo falecido um dos comproprietários do imóvel entre os Autores e os Réus estão todos os herdeiros do mesmo, disponível no sítio www.dgsi.pt