INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO
RECURSO DE REVISTA
DUPLA CONFORME
CASO JULGADO
NULIDADE
Sumário


I - Tendo sido fixado ao incidente de liquidação o valor de 21.000 euros, e encontrando-se este definitivamente fixado em virtude de as partes não o terem impugnado, é esse valor que importa tomar em consideração, designadamente para efeitos de recorribilidade da decisão a proferir nos autos. Assim,
II - Uma vez que o valor da causa é inferior ao valor da alçada da Relação que é de 30.000 euros, o presente recurso de revista atento o valor da causa e da sucumbência não é admissível (art.º 629.º n.º 1, do CPC).
III - Por outro lado, no presente caso, sendo inequívoca a verificação da dupla conforme (art.º 671.º n.º 3 do CPC), visto o acórdão da Relação ter confirmado sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente o despacho saneador e a sentença da 1.ª instância, nesta parte, tão pouco é admissível a revista.
IV - Consoante tem sido entendido pelo Supremo Tribunal de Justiça, quando o citado art.º 629.º n.º 2, do CPC se refere à admissibilidade do recurso, fundada na violação do caso julgado, tem como pressuposto ser a própria decisão impugnada a contrariar anterior decisão transitada em julgado, violando-o, ela mesma diretamente e não quaisquer outras decisões. Ora,
Uma vez que a decisão impugnada através do recurso de revista é o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 06.03.2024, e não nenhuma das decisões referidas pelo recorrente, o recurso de revista não é admissível, nos termos do citado art.º 629.º n.º 2, alínea a), in fine.
V- Acresce que o recurso de revista também não é admissível uma vez que como é jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal, a invocação de nulidades da sentença nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), 2.ª parte do CPC, não é susceptível de fundar, autonomamente, enquanto fundamento exclusivo, o recurso de revista, só sendo aquelas conhecidas se houver lugar ao conhecimento desse mesmo recurso.
Para além disso, as nulidades que foram apontadas pelo reclamante, já tinham sido por este invocadas no recurso de apelação, não assistindo competência a este Supremo Tribunal de Justiça para o conhecimento de nulidades que inquinam decisões de 1.ª instância e não do Tribunal da Relação (Vd. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.12.2021, proc. 2952/15.7T8FNC.L2.S1).

Texto Integral

Processo nº 3121/13.6TTLSB-G.L1-A.S1

4.ª Secção - Reclamação para a Conferência

Acordam em conferência na 4.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça

1. Relatório

1.1. Vem o Autor reclamar para a conferência nos termos dos artigos 643.º, n.º 4 “in fine” e 652.º, n.º 3, ambos do Código de Processo Civil (CPC), da decisão proferida pela relatora, ao abrigo do disposto no art.º 643.º do CPC, que lhe não admitiu o recurso de revista, concluindo nos seguintes termos:

1) O recorrente, porque se considera prejudicado, vem impugnar a douta decisão singular proferida pela Exm.ª Juíza Conselheira Relatora em 02.09.2024, o que faz ao abrigo do disposto no art.º 652.º, n.º 3, por remissão do n.º 4 do art.º 643.º, ambos do CPC, requerendo que sobre a matéria dessa decisão recaia um Acórdão, devendo, para o efeito, a Exm.ª Relatora submeter o caso à conferência no STJ;

2) A douta decisão singular proferida pela Exm.ª Juíza Conselheira Relatora em 02.09.2024, foi proferida como resposta à Reclamação efetuada pelo recorrente do douto despacho prolatado pela Exm.ª. Relatora em 08.05.2024, não admitindo o recurso interposto para esse Colendo SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, tendo por objeto a impugnação do douto Acórdão proferido pelo Venerando TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA de 06/03/2024, no âmbito dum incidente de liquidação;

3) Essa decisão proferida pelo TRL, decorre, pois, da interposição pelo recorrente do incidente de Liquidação resultante da prolação do douto Acórdão do TRL de 11.05.2022, do qual o então recorrente não poderia recorrer por estar limitado ao momento exequível para a prática do acto, colocando esta decisão “termo ao processo”;

4) E embora tal Acórdão não constituísse decisão final de mérito, estava a mesma ferida de várias nulidades não sanadas, bem como de omissões de pronúncia sobre questões essenciais do processo, como o reconhecimento da existência de danos sofridos pelo Autor, embora tendo reconhecido ao Autor “Justa causa” na resolução do contrato de trabalho por si efetuada;

5) O douto Acórdão proferido pelo TRL em 06.03.2024, no âmbito do mencionado incidente de liquidação, é uma decisão proferida nos termos do art.º 358.º, n.º 2 do CPC, pelo que, uma vez transitado em julgado o Acórdão do TRL de 11.05.2022, a instância extinta considera-se renovada com a instauração do mencionado Incidente de Liquidação;

6) Sendo entendimento do recorrente, que a situação em apreço se enquadra no âmbito da disposição legal referenciada, porquanto se encontra verificado o pressuposto específico constante do art.º 671.º, n.º1 do CPC;

7) Esta situação conduz-nos à explicitação dos pressupostos de admissão geral de recurso de Revista, constantes do art.º 629.º do CPC, cujo n.º 2, alínea a) do art.629.º do CPC, refere:

“2. Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso:

a) Com fundamento na violação das regras de competência internacional, das regras de competência em razão da matéria ou da hierarquia, ou da ofensa de caso julgado;”

Com efeito,

8) Verifica-se “ofensa de caso julgado” formal, por reporte ao disposto no art.º 620.º. n.º 1 do CPC, relativamente a decisões ou questões que não são de mérito (interlocutórias, portanto), e que produzem efeitos “nos precisos limites e termos” em que julgam (cfr. art.º 621.º do CPC), permitindo o conhecimento judicial através de nova indagação sobre o objeto da decisão proferida;

9) O mencionado Acórdão prolatado em 11.05.2022, não se pronunciou sobre um conjunto de circunstâncias legais invocadas pelo recorrente na Apelação interposta da segunda sentença prolatada nos autos em 11.11.2019, e limitou-se a conferir provimento parcial ao pedido do autor em primeira instância;

10) Omitindo a respetiva pronúncia sobre os restantes segmentos impugnados da sentença recorrida, designadamente os respeitantes à existência dos danos invocados no pedido e comprovados bastamente nos autos, bem como à necessária correção dos cálculos relativos à indemnização devida ao autor, como base nos documentos existentes nos autos;

11) Isto para além de claro “erro de julgamento” e incorrendo em “erro notório” na apreciação e valoração da prova existente nos autos.

12) E se uma boa parte da prova documental nos autos, entregue quando da interposição da ação judicial pelo Autor, juntamente com a PI, no Tribunal de Trabalho, em suporte de papel por exceder a capacidade do sistema citius, não foi efetivamente digitalizada, como deveria, pelos serviços da secretaria do Tribunal, tal não poderia constituir razão válida para impedir o douto Tribunal de tomar conhecimento dessa prova documental;

13) Tendo o mesmo obliterado completamente qualquer referência à mesma prova documental, quer na douta sentença, quer no douto Acórdão que decidiu o recurso em 11.05.2022.

Com efeito,

14) Verifica-se segunda ofensa de caso julgado relativamente a decisões anteriores do TRL que não foram cabalmente cumpridas pelo tribunal de 1.ª instância, como é o caso, manifestamente do douto Acórdão do TRL de 11.04.2018, que ordenou a reabertura da audiência 1.ª instância, para que o Tribunal “a quo” se pudesse pronunciar sobre a admissão de provas documentais nos autos;

15) Sendo que o douto tribunal, não só não retirou desse facto quaisquer consequências práticas para os autos, como, em clara violação dos direitos do contraditório e igualdade das partes no processo, não colocou a admissão dos documentos em causa sequer em debate à discussão das partes, não se tendo realizado audiência final nos autos inerente à reabertura;

16) Limitou-se a notificar a contraparte para se pronunciar sobre sobre a admissibilidade de alguns documentos existentes no processo e não a totalidade como havia sido ordenado pelo TRL, constituindo as mesmas, provas essenciais para que o Tribunal pudesse ajuizar da requerida ampliação da matéria de facto;

17) Na reabertura da audiência de julgamento em 29.04.2019, a ampliação do pedido resultante da atualização dos valores a contabilizar na indemnização pedida – que alteraria o valor da causa em montante acima da alçada do Tribunal da Relação (€55.537,13), permitindo que o processo pudesse vir a subir em revista ao STJ sem quaisquer objeções relativamente à aplicação do art.º 629.º, n.º 1 do CPC –, também não foi objeto de conhecimento por parte do Tribunal no decurso da audiência de reabertura do Julgamento;

18) E tanto foi assim, que a sentença resultante da reabertura da audiência, que só foi proferida em 11.11.2019, reproduziu “ipsis verbis” a anterior sentença prolatada em 09.01.2015(!);

19) E apenas em 19.09.2019, cinco meses depois de proferida segunda sentença nos autos, a Mm.ª Juiz “a quo”, veio pronunciar-se sobre o “pedido do Autor de ampliação do pedido”, à luz do disposto no art.º 265.º, n.º 2 do CPC, indeferindo o mesmo;

20) Com fundamento em que a reabertura da audiência de Julgamento havia sido restrita à admissão dos documentos nos autos e não podia conhecer de mais quaisquer questões passíveis de serem requeridas numa audiência final de Julgamento.

Com efeito,

21) Transitado em julgado o douto Acórdão proferido pelo TRL em 11.05.2022, incidente sobre a segunda sentença proferida em 11.11.2019, por dele não poder, na altura (por se encontrarem retidos quatro recursos interlocutórios no TRL, entre eles o respeitante ao pedido de “ampliação do pedido”), ser interposto recurso ordinário, o Autor interpôs incidente de Liquidação em 02.09.2022, o que, como referido, em face do disposto no art.º 358.º, n.º 2 “in fine”, importa a renovação da instância.

22) Nessa circunstância, prolatada a douta sentença em 26.05.2023 sobre o pedido no incidente de liquidação interposto, não dando provimento ao mesmo, e por referência ao disposto no art.º 644.º, n.º 4 do CPC (com equivalente legal no art.º 79-A, n.º 5 do CPT), o Autor interpôs recurso de Apelação dessa decisão para o Venerando TRL, com um âmbito mais alargado, porquanto dispõe o mencionado comando legal:

“4. Se não houver recurso da decisão final, as decisões interlocutórias que tenham interesse para o apelante independentemente daquela decisão podem ser impugnadas num recurso único a interpor após o trânsito da referida decisão.”

23) De modo equivalente dispõe o n.º 4 do art.º 671.º do CPC:

“4. Se não houver ou não for admissível recurso de revista das decisões previstas no n.º 1, os acórdãos proferidos na pendência do processo na Relação podem ser impugnados, caso tenham interesse para o recorrente independentemente daquela decisão, num recurso único, a interpor após o trânsito daquela decisão, no prazo de 15 dias após o referido trânsito.”

24) Pelo que, se, como menciona a douta decisão singular ora impugnada, “o disposto no invocado art.º 671.º, n.º 4 do CPC que respeita à recorribilidade dos “acórdãos proferidos na pendência do processo na relação” (...) “estamos perante o recurso dum acórdão proferido nos termos do art.º 671.º, n.º 1 (“(...) acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo (...)”, será esse, manifestamente, o caso vertente como demonstrado acima;

25) Convém igualmente atentar no que a Jurisprudência do Colendo STJ refere, a propósito da admissibilidade recursiva das decisões interlocutórias. Assim, transcreve-se o constante, a propósito, no Acórdão do STJ de 28.06.2023:

“1 – Quanto às decisões interlocutórias, isto é, aquelas que foram processualmente suscitadas, na ponderação duma intercorrência processual, decidindo sobre questões processuais que não importaram na extinção da instância, releva atender aos acórdãos nos quais se vertam questões de natureza adjetiva suscitadas ex novo no Tribunal da Relação, designadas na doutrina e na jurisprudência por decisões interlocutórias novas, que o regime resulta da articulação do disposto no art.º 673 e 671, n.º 4, a saber, a impugnação desses acórdãos é deferida para a revista interposta ao abrigo do n.º 1 do art.º 671, a não ser que tal determine a absoluta inutilidade do que venha a ser decidido, bem como existindo norma que possibilite a sua admissão, caso em que é admissível o recurso autónomo, art.º 673.º; relativamente a tais acórdãos proferidos na pendência do processo na Relação, que carecendo de autonomia, seriam acoplados ao recurso previsto no n.º 1, do art.º 671, não sendo este último admissível, caso da dupla conforme, ou optando o vencido pela não interposição, a impugnação de tais acórdãos da Relação é deferida para depois do trânsito em julgado daquele, enquadrável no n.º 1, do art.º 671, ficando a respetiva admissão condicionada à verificação dum interesse objetivo, n.º 4, do art.º 671.”

Com efeito,

26) O n.º 4 do art.º 671.º do CPC, permite a impugnação num recurso autónomo das decisões interlocutórias da Relação que não seja possível integrar no recurso do acórdão final, por este não ser admissível ou, sendo-o, a parte vencida optar pela não interposição da revista;

27) Tal como previsto no n.º 4 do art.º 644.º, a apreciação das decisões interlocutórias da Relação ficam apenas dependentes da verificação dum interesse objetivo do recorrente, o que é inquestionável o caso vertente;

28) A letra do n.º 3 do art.º 671.º do CPC, consiste no seguinte:

“Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte”;

29) Na senda do constante no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/2022, de 18 de outubro, estão assim, legalmente definidos “três requisitos caracterizadores da dupla conforme”:

d) Unanimidade da decisão colegial (ausência de voto de vencido pelo colectivo de Juízes Desembargadores);

e) Fundamentação essencialmente idêntica;

f) Conformidade decisória.

30) Como bem se refere no douto acórdão acima citado, “(...) nos casos em que ambas as instâncias decidem exactamente no mesmo sentido (igual conteúdo decisório), o funcionamento da dupla conforme mostra-se linear.”

Contudo,

31) Acrescenta: “Tal simplicidade de raciocínio, todavia, tornando redutora a finalidade subjacente a um mecanismo eficaz de filtragem de acesso ao Supremo, foi objeto de evolução interpretativa, dando origem ao aparecimento de um critério aferidor de conformidade decisória, que deixou de assentar na coincidência formal de decisões, determinado pelo elemento literal de interpretação, mas radicando na ideia de decisão mais favorável ao recorrente.”;

32) Como clarifica o douto acórdão do STJ citado: “A ausência de esclarecimento pelo legislador quanto ao alcance do conceito de acórdão confirmativo da decisão de 1.ª instância permitiu que fossem desenhados dois caminhos interpretativos: o da dupla conforme plena ou irrestrita e o da dupla conforme mitigada, ponderada ou racional”;

33) Sendo esta última, a posição que “(...) tem, actualmente, o acolhimento preponderante da jurisprudência deste tribunal e constitui a solução adoptada pela formação de juízes a que alude o n.º 3 do art.º 672.º do CPC.”

Contudo,

34) É de notar a referência que o douto acórdão do STJ citado efectua (na ausência de esclarecimento da lei) relativamente ao que designa por “consonância interpretativa”, considerando que “(...) a autonomização, na decisão judicial (como se de pedidos materialmente distintos se tratasse), das várias pretensões parcelares (cindíveis) de ressarcimento (em função da categorização dos danos em que a parte decompôs o seu pedido de indemnização) assume pleno cabimento porquanto o juízo objectivado na referida decisão é o “determinado pelo princípio do pedido (espécie do princípio do dispositivo), no sentido em que deve existir uma necessária correspondência entre o pedido do autor (ou do réu reconvinte) e a pronúncia ínsita na decisão judicial. O tribunal não pode decidir sobre objeto diferente do pedido ou omitir a resolução de questões que lhe foram pedidas pelo autor.”;

35) E continua o douto acórdão do STJ: “(...) embora a decisão judicial em si imponha uma decisão de indemnização em função de um montante global (art.º 609.º, n.º 1. do CPC), a mesma, porque traduzindo as pretensões da parte, mostra-se constituída por segmentos decisórios respeitantes às parcelas em que o pedido indemnizatório se compõe, que poderão ser analisados/avaliados, separadamente, para efeitos de aferição de dupla conformidade decisória (permitindo às partes restringir o objecto do recurso a cada um desses segmentos) se os mesmos se configurarem independentes; assim, são, se materialmente autónomos entre si e juridicamente cindíveis, requisitos avaliados em função da fundamentação em que cada segmento se encontra alicerçado, pois que, se ocorrer dependência essencial entre os fundamentos que fundamentam tais parcelas decisórias falha o pressuposto para a cindibilidade e a decisão terá de ser vista como uma unidade para efeitos de dupla conformidade decisória.”;

36) Donde, a conclusão de que: “(...) a conformidade decisória que caracteriza a dupla conforme impeditiva da admissibilidade da revista, nos termos do artigo 671.º, n.º 3 do CPC, (...) é apreciada, separadamente, para cada segmento decisório autónomo e cindível em que a pretensão indemnizatória global se encontra decomposta.”;

37) E, no caso sub-júdice, o que se verifica é que a decisão objeto do presente recurso não se configura como “dupla conforme”, desde logo porque, tal como explicitado adiante, não incide sobre todos os segmentos decisórios em apreço, uma vez constantes do pedido do autor e não apreciados pelo douto acórdão que reconheceu a “justa causa de resolução do contrato por parte do trabalhador”, em clara omissão de pronúncia de outros segmentos do pedido formulado pelo autor;

38) O que, constituindo uma nulidade processual, não era passível de recurso ordinário, como referido, por se não tratar de decisão final de mérito, apenas ordenando a liquidação de uma parte do pedido indemnizatório e não reconhecendo os danos materiais e morais pedidos nos autos pelo autor, apesar do acervo probatório constante dos mesmos autos com total ausência de fundamentação;

Com efeito,

39) A ação interposta no Tribunal de Trabalho, foi objeto duma segunda sentença final em 1ª instância em 11.11.2019, em que, embora colhendo provimento parcial a ação, não só não foi reconhecida a justa causa de resolução do contrato de trabalho, como não foi reconhecida a integralidade do ressarcimento dos créditos laborais, nem foram reconhecidos, em consequência, os danos invocados pelo trabalhador como resultado da resolução do contrato pela sua parte;

40) Inconformado com a decisão da douta sentença, o ora recorrente interpôs recurso de Apelação, para o Tribunal da Relação de Lisboa, que culminou com a prolação do Acórdão de 11.05.2022, onde finalmente foi reconhecida a justa causa de resolução do contrato por parte do autor, embora relativamente aos danos materiais e morais daí resultantes nada tivesse sido considerado provado, e os créditos laborais não tenham sido reconhecidos na sua totalidade;

41) E embora este último Acórdão não se tenha debruçado sobre a análise das provas constantes dos autos e que fundamentaram o pedido do autor – por omissão de pronúncia em face do alegado no recurso de Apelação da douta sentença interposto para o TRL – igualmente omitiu esta decisão os restantes fundamentos do pedido do autor, obliterando a consideração do material probatório existente nos autos e remetendo para ulterior incidente de “liquidação” o apuramento dos créditos laborais devidos;

42) Não se tratando de decisão final, mas sim duma decisão intermédia, após trânsito em julgado da decisão do Acórdão em causa, o autor interpôs o competente incidente de Liquidação, no sentido de ver reconhecidas – uma vez renovada a instância, nos termos do disposto no art.358.º, n.º 2 “in fine” do CPC – as nulidades processuais incorridas no douto Acórdão em causa, bem como no reconhecimento da matéria de facto que deveria ter sido considerada provada, conduzindo, assim, ao ressarcimento do autor quanto a todos os prejuízos causados pelo réu e comprovados nos autos;

43) Com a prolação de despacho Saneador-Sentença no âmbito do Incidente de Liquidação, em 26.05.2023, mais uma vez não foram objeto de conhecimento judicial todas as questões que poderiam ser apreciadas com a “renovação” da instância principal, tanto mais que o Tribunal deviria ter conhecido de todas as nulidades processais alegadas;

44) E, em recurso de Apelação desta douta sentença para o Venerando TRL, em 11.06.2023, é prolatado o douto Acórdão do TRL de 06.03.2024, que igualmente não deu provimento ao alegado pelo autor/recorrente e do qual foi interposto o presente recurso para o Colendo STJ, que foi objeto de Reclamação da respetiva não admissão.

Ora,

45) Nos termos do disposto no art.º 674.º do C.P.C., o Recurso de Revista pode ter por fundamento:

“1.

a) A violação da lei substantiva, que pode consistir tanto no erro de interpretação ou de aplicação, como no erro de determinação da norma aplicável;

b) A violação ou errada aplicação da lei de processo;

c) As nulidades previstas nos artigos 615.º e 666.º.”

46) E embora a letra do n.º 3 do cit. art.º 674.º do C.P.C., refira que:

“3. O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.”;

47) É um facto que as nulidades processuais constantes do elenco do art.º 615.º e art.º 666.º do C.P.C., designadamente as várias nulidades invocadas nas alegações de recurso de Apelação em causa e que suscitaram a prolação do douto Acórdão impugnado, denegando o valor processual dessa alegação e conduzindo ao decaimento da pretensão recursiva, só por si, justificariam o interesse do A./Recorrente, por referência ao constante no n.º 4 do cit. art.º 671.º do C.P.C.;

48) E é no respeito da letra daquela última disposição processual que o recurso de cuja não admissão se reclamou, se perfila como a única via processual de acesso “in casu” a outro e superior grau de jurisdição, com vista a obter a “sanação” de questões apreciadas pelo Tribunal da Relação em diferentes momentos, e que não obtiveram a final o reconhecimento que o sentido de Justiça e a Lei imporiam;

49) Acresce que, para além destas nulidades, se encontram invocadas outras nulidades cominadas pelos arts. 195.º do CPC, reportadas no referido recurso de Apelação do incidente de Liquidação de 11.06.2023, elencadas sob os n.ºs 2 e 4 (respetivamente págs. 2 e 3 da petição de recurso), e ainda as nulidades invocadas referentes ao recurso de Apelação de 11.06.2019, com omissão de pronúncia.

50) Importando “nulidades processuais” não sanadas por omissões de pronúncia relativamente à emissão de decisão quanto ao conhecimento judicial dos autos, numa deriva de “denegação de justiça” – ressalvado o devido respeito – que obtém acolhimento na Constituição da República Portuguesa, nomeadamente na consagração do Princípio da Igualdade das partes (art. 13.º da Constituição da República Portuguesa), no Acesso ao Direito e tutela jurisdicional efetiva(art.20.ºda CRP),na Responsabilização das entidades públicas (art.º 22 da CRP), na eficácia das normas relativas às Convenções Coletivas de Trabalho (cfr. art.º 56/4 da CRP), na consagração dos direitos relativos ao trabalho e aos trabalhadores (cfr. art.º 58.º e 59 .º do CRP), às decisões dos Tribunais (art.º 205 da CRP), à necessidade de cuidada e atenta fundamentação das decisões judiciais ( cfr. art.º 205.º da CRP);

51) A decisão do douto Acórdão impugnado, como referido, acaba declarando irrecorríveis o despacho que dispensou a audiência prévia, bem como o que ordenou a notificação do autor sobre a litigância de má-fé requerida pela ré (apesar do autor já se ter pronunciado em requerimento sobre o assunto, assumindo o lapso ocorrido e de ter havido despacho judicial não reconhecendo a alegada litigância invocada pela ré como de má-fé, mas apenas classificada como “temerária”), julgando totalmente improcedente o recurso de Apelação interposto e não reconhecendo a prática de quaisquer das nulidades invocadas, aliás, com o devido respeito, aquilo em que, no essencial, centrou a respetiva apreciação;

52) Não foram, portanto, reconhecidas as nulidades invocadas pelo Autor/recorrente, quer no respeitante à douta sentença, quer no concernente ao despacho saneador que a precedeu;

53) Não foi igualmente reconhecido que o tribunal “a quo” não admitiu nem analisou ou fundamentou criteriosamente todos os documentos juntos aos autos, nem apreciou devidamente as provas produzidas, bem como as declarações de parte do autor, importando a necessária reapreciação da prova produzida e/ou a admissão de novos meios de prova em sede julgamento no Tribunal da Relação, o que foi requerido à luz do disposto no art.º 662.º do CPC;

54) Não foi assim decidida a anulação/Revogação da douta sentença, nem que da reapreciação da matéria de facto, legalmente possível, fosse fixado pelo Venerando Tribunal da Relação, os valores corretos relativos aos créditos laborais, juros, antiguidade, danos patrimoniais e morais;

55) Em suma, por ter sido considerado que, à luz do disposto na parte final do n.º 2 do art.º 358.º do CPC, a “instância extinta considera-se renovada” apenas de forma mitigada e em sentido restrito, embora a letra da lei (e, em bom rigor, o respetivo espírito), podendo fazê-lo, não aponta nesse sentido;

56) E não aponta, desde logo, porque existindo o reconhecimento de nulidades diversas, omissões de pronúncia, preterição de critérios legais relativos à admissão de provas e até a disposições imperativas concernentes a cálculos legais – fazendo “tábua raza” de tudo isso – com o devido respeito, com a instância não extinta, considera-se ultrapassado o trânsito em julgado e poder-se-ia indagar da legalidade de decisões parcelares anteriores, uma vez alegadas e reconhecidas em sede de recurso;

57) De outro modo, nem faria sentido, ressalvada melhor opinião que a “instância extinta fosse renovada”, uma vez que tal não teria conteúdo útil suficiente para a retificação e correto apuramento da decisão a tomar em sede de liquidação, já que tudo estaria decidido “a priori”, apesar da omissão de pronúncia ocorrida em recursos e/ou reclamações, entretanto não atendidas.

58)E sempre se dirá que a invocada “não alegação” do valor remuneratório auferido pelo Autor/Recorrente, como razão legal para o estabelecimento da necessidade de obter a “liquidação” do valor indemnizatório resultante da resolução com justa causa, se afigura, ressalvado o devido respeito, absolutamente desnecessário, uma vez que os recibos de vencimento do Autor foram juntos à PI nos autos, no art.º 6.º, com a indicação do DOC. 5 nos autos, o contrato de trabalho do Autor encontra-se referido no art.º 1.º, sob o DOC 1 da PI, bem como no Doc 11-R, admitido expressamente na reabertura da audiência de Julgamento. Igualmente o doc 6, recibo do mês de junho de 2013, junto com a petição do incidente de Liquidação, contém a menção do vencimento ilíquido do Autor;

59) Sendo que os cálculos efetuados na sentença em primeira instância já davam claramente indicação que esses documentos haviam sido consultados e tidos em conta na sentença proferida nos autos principais.

60) Constituindo esta argumentação, uma súmula doã demonstração do interesse processual atendível do recorrente em sede de recurso para o STJ à luz do disposto na parte final do n.º 4 do art.º 671.º do CPC;

Com efeito,

61) Como referido, o Acórdão que reconheceu a justa causa de resolução do contrato de trabalho por parte do trabalhador, no plano dos vários segmentos decisórios do pedido do autor, limitou-se a reconduzir-se aos cálculos constantes da sentença proferida nos autos (sendo que a segunda sentença reproduz “ipsis verbis” o conteúdo da primeira sentença proferida nos autos), os quais estão manifestamente errados, em face do pedido formulado pelo autor e cujos pressupostos colidem com os factos constantes dos autos e objeto de prova documental;

62) Já quanto ao segmento decisório que se reporta aos danos sofridos pelo autor e da responsabilidade da ré, conforme o respetivo pedido nos autos, apenas o mencionado Acórdão referiu “não haver danos”, por não se terem dado como provados nos autos;

63) Quando é manifesto que existem nos autos comprovativos de despesas médicas e medicamentosas, bem como relatórios médicos que, sem margem para dúvidas, imputam à empresa ré a responsabilidade pelos danos sofridos pelo autor, e que deveriam ser ressarcidos, uma vez reconhecida a justa causa de resolução do contrato.

64) Foi, portanto, em “ofensa do caso julgado” que o douto Acórdão de 11.05.2022, secundou aquilo que constava já na primeira sentença proferida nos autos e foi repetido na segunda sentença, ignorando completamente o que foi decidido no Acórdão de 11.04.2018, com a admissão expressa nos autos, quando da reabertura da audiência de Julgamento, dos comprovativos documentais dos danos sofridos pelo autor e que foram completamente ignorados na segunda sentença prolatada nos autos.

Com efeito,

65) No caso em apreço. o que se verifica é que a decisão objeto de recurso igualmente não se configura como “dupla conforme”, desde logo porque, tal como explicitado adiante, não incide sobre todos os segmentos decisórios em apreço, uma vez constantes do pedido do autor e não apreciados pelo douto acórdão que reconheceu a “justa causa de resolução do contrato por parte do trabalhador”, em clara omissão de pronúncia de outros segmentos do pedido formulado pelo autor, o que, constituindo uma nulidade processual, não era passível de recurso ordinário por se não tratar de decisão final, apenas ordenando a liquidação de uma parte do pedido indemnizatório e não reconhecendo os danos materiais e morais pedidos nos autos pelo autor, apesar do acervo probatório constante dos mesmos autos, com total ausência de fundamentação.

66) Pelo que se entendeu impugnar o douto despacho então igualmente reclamado e suscitar do Venerando Tribunal da Relação, a reapreciação e análise detalhada de questões concretas e centrais do processo, apresentadas pelo ora recorrente, ressaltando a relevância processual do manifesto interesse legal do recorrente;

67) E porque se impugnou, para todos os legais efeitos, o douto Acórdão recorrido, assentando o mesmo em decisão cuja complexidade, em nosso entendimento, não foi devidamente avaliada no despacho da Exm.ª Juíza Conselheira Relatora, oportunamente reclamado, não conferindo cabimento processual ao disposto no n.º 4 do art.º 671.º do CPC, deveria a Reclamação em causa ser reapreciada e o presente recurso ser admitido a subir ao STJ;

68) E por se entender ser o douto Acórdão recorrido incurso nas nulidades invocadas, deverá o mesmo ser revogado e substituído por decisão que conduza à retificação da sentença e despacho saneador sobre que incide, devendo os autos ser objeto do saneamento não operado pelo Venerando Tribunal da Relação;

Com efeito,

69) O douto Acórdão recorrido não reconheceu a nulidade do despacho de admissão do recurso de Apelação que, em preterição do disposto no art. 617.º, n.º 1 do CPC, não se tendo pronunciado sobre as nulidades invocadas, como seria legalmente obrigado;

70) Não reconheceu a nulidade processual invocada, em função da violação do princípio da plenitude de assistência do juiz, em violação do princípio do “juiz natural” (cfr. art.º 605.º e art.º 195, n.º 1, ambos do CPC);

71) Não reconheceu igualmente, que não existe suporte documental que justifique a intervenção da Mm.ª Juiz que proferiu o despacho de admissão do recurso de Apelação;

72) Não reconheceu ainda que, em virtude do acima referido, incorreram os autos em violação dos princípios da igualdade substancial das partes e do contraditório, da aquisição processual de factos ou admissibilidade de meios probatórios;

73) Não reconheceu que, tendo a contraparte apresentado oposição ao incidente de liquidação, a mera invocação por parte do Mm.º juiz, da simplicidade da decisão a proferir, não pode ser justificativo da não fundamentação nos termos legalmente prescritos;

74) Devendo ser reconhecido que o Mm.º juiz apenas pode dispensar a realização da audiência prévia, depois de auscultadas as partes e usando os mecanismos de gestão processual e adequação formal em conformidade com a lei (cfr. arts. 61 e 62.º, ambos do CPT);

75) Devendo ser reconhecida a violação dos invocados direitos constitucionais;

76) Devendo ser reconhecida a nulidade da não fundamentação de que “não se provaram os danos”, uma vez que tal poderia ter sido indagado, apreciado e valorado pelo Tribunal da Relação;

77) Devendo ser reconhecida a existência de vícios na decisão da matéria de facto, que o Tribunal da Relação deveria ter sanado;

78) Devendo ser reconhecido, à luz dos princípios da economia processual, de que o Tribunal da Relação poderia ter intervindo na verificação e controlo sobre a efetiva correção dos cálculos indemnizatórios e dos créditos da Autora sobre a Ré;

79) Devendo ser reconhecida a necessidade de realização da audiência prévia, ou, no mínimo, ser decidido pela renovação da prova na segunda instância, com o fim de corrigir a decisão final oportunamente impugnada pelo A/Recorrente;

Requerendo-se que:

A) Que seja decidida a anulação/Revogação da douta decisão singular de confirmação do despacho reclamado;

B) O Colendo Supremo considerando admissível o recurso decida pela respetiva procedência;

C) Que, em conformidade, ordene a devolução dos autos ao TRL, e seja ordenada a reapreciação sobre a matéria de facto, vindo a ser corrigido o valor relativos ao créditos laborais, juros, antiguidade, danos patrimoniais e morais devidos ao A/ Recorrente, ou em alternativa, seja ordenada a realização de audiência de julgamento no Próprio Tribunal da Relação para renovação da prova;

D) Devendo ser considerado que, da interpretação do disposto no art. 358.º, n.º 2 do CPC “in fine”, resulte que a instância principal considerada extinta, seja considerada “renovada” para efeitos de apreciação dos erros incursos em decisões anteriores, para que a liquidação possa ser corretamente formulada;

E) Devendo ser ordenado que o TRL venha a conhecer as nulidades invocadas pelo Autor/recorrente, quer no respeitante à douta sentença, quer no concernente ao despacho saneador que a precede e ainda no respeitante ao douto Acórdão recorrido, por se entender que contendem com o necessário respeito pelos princípios da igualdade, do contraditório, com a aquisição processual de factos ou com a admissibilidade de meios probatórios;

F) No reconhecimento de que, este conjunto de circunstâncias colide frontalmente com o texto da Lei Fundamental, nomeadamente disposições constitucionais, como o art.º 13.º (Princípio da Igualdade), art.º 8.º (Força Jurídica) e art.º 20.º (Acesso ao Direito e Tutela Jurisdicional efetiva), a Responsabilização das entidades públicas (art.º 22 da CRP), a eficácia das normas relativas às Convenções Coletivas de Trabalho (cfr. art.º 56/4 da CRP), a consagração dos direitos relativos ao trabalho e aos trabalhadores (cfr. art.º 58.º e 59 .º do CRP), as decisões dos Tribunais (art.º 205 da CRP), a necessidade de cuidada e atenta fundamentação das decisões judiciais ( cfr. art.º 205.º da CRP), sendo que as disposições legais relativas aos direitos fundamentais são diretamente aplicáveis no ordenamento jurídico português, vinculando ao seu cumprimento as entidades públicas e privadas (cfr. art.º 18 da CRP);

G) Devendo ser ordenada a realização da audiência prévia, com vista à apreciação e debate sobre os aspetos controversos, em face dos elementos probatórios existentes nos autos, como explanado (doc.5, doc. 19, doc. 11R e docs. Danos);

H) Devendo ainda ser reconhecido que o tribunal da 1.ª instância não admitiu nem analisou ou fundamentou criteriosamente todos os documentos juntos aos autos, nem apreciou devidamente as provas produzidas, bem como as declarações de parte do autor, o que importaria a necessária reapreciação da prova produzida e/ou a admissão de novos meios de prova em sede julgamento no Tribunal da Relação, o que se requereu ao Venerando Tribunal, à luz do disposto no art.º 662.º do CPC”.

2. Fundamentação

2.1. Na decisão reclamada consignou-se o seguinte:

“1. Relatório

1.1. Vem o Autor, AA, ao abrigo do disposto no art.º 643.º do CPC reclamar do despacho da Exma. Juíza Desembargadora do Tribunal da Relação de Lisboa que não admitiu o recurso de revista por si interposto do acórdão desse mesmo tribunal proferido no incidente de liquidação, concluindo o seguinte:

1) Analisado o teor do douto despacho ora impugnado, de não admissibilidade do recurso interposto para o STJ, do qual se reclama, ao abrigo do disposto no art. 643.º do C.P.C., sem prejuízo do constante do art. 652.º, n.º 3 do CPC;

2) O que se verifica é que o mesmo despacho está ferido de inevitável obscuridade, dado que se alicerça em disposições legais invocadas a propósito do regime legal recursivo no concernente ao Recurso de Revista para o STJ, sem se debruçar especificadamente sobre o invocado pelo recorrente;

3) Pelo facto de não serem os mesmos explicitados no despacho ora objeto de reclamação, não é possível lobrigar os fundamentos legais pelos quais a douta decisão entende não ser admissível o recurso interposto pelo ora reclamante para o STJ, pelo que, não se nos afigura possível acolher o entendimento aí implicitamente expresso, através da mera menção das disposições legais não aplicáveis ao caso vertente.

4) E porque não é possível lobrigar as razões que conduziram à prolação do despacho em causa, não seria possível ao ora reclamante rebater os argumentos constantes do despacho de não admissão do recurso interposto. Razão porque, ressalvado o devido respeito, se reclama do mencionado despacho nos termos legalmente admissíveis.

5) A presente Reclamação impõe-se pela circunstância do alegado se tratar de matéria do conhecimento do STJ, vindo o despacho de não admissão do presente recurso, se escudar, ressalvada melhor opinião, num conjunto de disposições legais alegadamente não verificadas no caso vertente, mas em grande parte irrelevantes para a correta apreciação e fundamentação da decisão a emitir; Com efeito,

6) O Acórdão que reconheceu a justa causa de resolução do contrato de trabalho por parte do trabalhador, no plano dos vários segmentos decisórios do pedido do autor, limitou-se a reconduzir-se aos cálculos constantes da sentença proferida nos autos (sendo que a segunda sentença reproduz “ipsis verbis” o conteúdo da primeira sentença proferida nos autos), os quais estão manifestamente errados, em face do pedido formulado pelo autor e cujos pressupostos colidem com os factos constantes dos autos e objeto de prova documental;

7) Já quanto ao segmento decisório que se reporta aos danos sofridos pelo autor e da responsabilidade da ré, conforme o respetivo pedido nos autos, apenas o mencionado Acórdão mencionou “não haver danos”, por não se terem dado como provados nos autos. Quando é manifesto que existem nos autos comprovativos de despesas médicas e medicamentosas, bem como relatórios médicos que, sem margem para dúvidas, imputam à empresa ré a responsabilidade pelos danos sofridos pelo autor, e que deveriam ser ressarcidos, uma vez reconhecida a justa causa de resolução do contrato.

8) Foi, portanto, em “ofensa do caso julgado” que o douto Acórdão de 11.05.2022, secundou aquilo que constava já na primeira sentença proferida nos autos e foi repetido na segunda sentença, ignorando completamente aquilo que foi decidido no Acórdão de 11.04.2018, com a admissão expressa nos autos quando da reabertura da audiência de Julgamento, dos comprovativos documentais dos danos sofridos pelo autor e que foram completamente ignorados na segunda sentença prolatada nos autos.

9) No caso subjudice, o que se verifica é que a decisão objeto do presente recurso não se configura como “dupla conforme”, desde logo porque, tal como explicitado adiante, não incide sobre todos os segmentos decisórios em apreço, uma vez constantes do pedido do autor e não apreciados pelo douto acórdão que reconheceu a “justa causa de resolução do contrato por parte do trabalhador”, em clara omissão de pronúncia de outros segmentos do pedido formulado pelo autor, o que, constituindo uma nulidade processual, não era passível de recurso ordinário por se não tratar de decisão final, apenas ordenando a liquidação de uma parte do pedido indemnizatório e não reconhecendo os danos materiais e morais pedidos nos autos pelo autor, apesar do acervo probatório constante dos mesmos autos, com total ausência de fundamentação.

10) Pelo que se entende impugnar o douto despacho ora reclamado e suscitar do Venerando Tribunal da Relação, a reapreciação e análise detalhada de questões concretas e centrais do processo, apresentadas pelo ora recorrente, ressaltando a relevância processual do manifesto interesse legal do recorrente;

11) E porque se impugnou, para todos os legais efeitos, o douto Acórdão recorrido, assentando o mesmo em decisão cuja complexidade, em nosso entendimento, não foi devidamente avaliada no despacho ora reclamado, não conferindo cabimento processual ao disposto no n.º 4 do art. 671.º do CPC, deve a presente Reclamação ser reapreciada e o presente recurso ser admitido a subir ao STJ;

12) E por se entender ser o douto Acórdão recorrido incurso nas nulidades invocadas, deve o mesmo ser revogado e substituído por decisão que conduza à retificação da sentença e despacho saneador sobre que incide, devendo os autos ser objeto do saneamento não operado pelo Venerando Tribunal da Relação; Com efeito,

13) O douto Acórdão recorrido não reconhece a nulidade do despacho de admissão do recurso de Apelação que, em preterição do disposto no art. 617.º, n.º 1 do CPC, não se pronunciou sobre as nulidades invocadas, como seria legalmente obrigado;

14) Não reconhece a nulidade processual invocada, em função da violação do princípio da plenitude de assistência do juiz, em violação do princípio do “juiz natural” (cfr. art. 605.º e art. 195, n.º 1, ambos do CPC);

15) Não reconhece que não existe suporte documental que justifique a intervenção da magistrada que proferiu o despacho de admissão do recurso de Apelação;

16) Não reconhece que, em virtude do acima referido, incorreram os autos em violação dos princípios da igualdade substancial das partes e do contraditório, da aquisição processual de factos ou admissibilidade de meios probatórios;

17) Não reconhece que, tendo a contraparte apresentado oposição ao incidente de liquidação, a mera invocação por parte do Mm.º juiz, da simplicidade da decisão a proferir, não pode ser justificativo da não fundamentação nos termos legalmente prescritos;

18) Devendo ser reconhecido que o Mm.º juiz apenas pode dispensar a realização da audiência prévia, depois de auscultadas as partes e usando os mecanismos de gestão processual e adequação formal em conformidade com a lei;

19) Devendo ser reconhecida a violação de direitos constitucionais;

20) Devendo ser reconhecida a nulidade da não fundamentação de que “não se provaram os danos”, uma vez que tal poderia ter sido indagado, apreciado e valorado pelo Tribunal da Relação;

21) Devendo ser reconhecida a existência de vícios na decisão da matéria de facto, que o Tribunal da Relação deveria ter sanado;

22) Devendo ser reconhecido, à luz dos princípios da economia processual, de que o Tribunal da Relação poderia ter intervido na verificação e controlo sobre a efetiva correção dos cálculos indemnizatórios e dos créditos da Autora sobre a Ré;

23)Devendo ser reconhecida a necessidade de realização da audiência prévia para corrigir a decisão final oportunamente impugnada pelo A/Recorrente; Sendo imperativo que:

O Colendo Supremo Tribunal de Justiça, considerando procedente o presente recurso, decida:

5) Que seja decidida a anulação/Revogação da douta sentença e do Acórdão sobre ela incidente;

6) Que da devolução dos autos ao TRL, seja ordenada a reapreciação sobre a matéria de facto, vindo a ser corrigido o valor relativos ao créditos laborais, juros, antiguidade, danos patrimoniais e morais devidos ao A/ Recorrente, ou em alternativa, seja ordenada a realização de audiência de julgamento no Próprio Tribunal da Relação.

7) Sendo que, da interpretação do disposto no art. 358.º, n.º 2 do CPC “in fine”, resulte que a instância principal considerada extinta, seja considerada “renovada” para efeitos de apreciação dos erros incursos em decisões anteriores, para que a liquidação possa ser corretamente formulada;

8) Devendo o TRL vir a conhecer as nulidades invocadas pelo Autor/recorrente, quer no respeitante à douta sentença, quer no concernente ao despacho saneador que a precede e ainda no respeitante ao douto Acórdão recorrido, por se entender que contendem com o necessário respeito pelos princípios da igualdade, do contraditório, com a aquisição processual de factos ou com a admissibilidade de meios probatórios;

9) No reconhecimento de que, este conjunto de circunstâncias colide frontalmente com o texto da Lei Fundamental, nomeadamente disposições constitucionais, como o art. 13.º (Princípio da Igualdade), art. 18.º (Força Jurídica) e art. 20.º (Acesso ao Direito e Tutela Jurisdicional efetiva), a Responsabilização das entidades públicas (art. 22 da CRP), a eficácia das normas relativas às Convenções Coletivas de Trabalho (cfr. art. 56/4 da CRP), a consagração dos direitos relativos ao trabalho e aos trabalhadores (cfr. art. 58.º e 59 .º do CRP), as decisões dos Tribunais (art. 205 da CRP), a necessidade de cuidada e atenta fundamentação das decisões judiciais ( cfr. art. 205.º da CRP), sendo que as disposições legais relativas aos direitos fundamentais são diretamente aplicáveis no ordenamento jurídico português, vinculando ao seu cumprimento as entidades públicas e privadas (cfr. art. 18 da CRP).

10) Reconhecendo que o tribunal da 1.ª instância não admitiu nem analisou ou fundamentou criteriosamente todos os documentos juntos aos autos, nem apreciou devidamente as provas produzidas, bem como as declarações de parte do autor, o que importaria a necessária reapreciação da prova produzida e/ou a admissão de novos meios de prova em sede julgamento no Tribunal da Relação, o que se requereu ao Venerando Tribunal, à luz do disposto no art. 662.º do CPC;

11) Que seja ordenada a realização da audiência prévia, com vista à apreciação e debate sobre os aspetos controversos, em face dos elementos probatórios existentes nos autos, como explanado (doc.5, doc. 19, doc. 11R e docs. Danos).

1.2. O Réu, recorrido, não respondeu.

1.3. No referido incidente de liquidação de sentença que o Autor, ora reclamante deduziu contra S..., Lda. (anteriormente Designada B..., Lda.) foram proferidos despacho saneador e sentença em 26.05.2023, nos quais se decidiu, entre o mais, o seguinte:

“ III. Face ao exposto, julgo manifestamente inadmissível a dedução no presente incidente de liquidação dos pedidos de liquidação:

- das quantias peticionas pelo A. e alegadas nos arts. 4º a 19º, do Requerimento Inicial, no valor global de 2.820,78 €, e juros de mora referente a esse valor no montante de 1.057,81€;

- das quantias peticionadas pelo A. e alegadas nos arts. 25º a 36º, do requerimento inicial, no valor de 11.556,00 €, delas absolvendo a Requerida da instância incidental.

(….)

III. DECISÃO

Face ao exposto, julgo parcialmente improcedente a liquidação e, em consequência, decido:

1.- liquidar em 3.000,00 €, a indemnização por antiguidade a que o requerente tem direito, a que acrescem os juros de mora devidos, à taxa supletiva legal de 4%, desde o dia seguinte ao do trânsito em julgado do acórdão da Relação de Lisboa (ocorrido a 05/09/2022) e até integral e efectivo pagamento, e que, na presente data (26/05/2023), se quantificam já em 86,47 €;

2.- absolver a requerida quanto ao demais pedido contra si.

*

Custas do incidente (tendo por base o único pedido que aqui foi conhecido, no valor de 5.931,62 €) a cargo de requerente e requerida, na proporção do respectivo decaimento, nos termos do disposto no art. 527º, n.º 1, do CPC.

Notifique e registe.

Dê baixa.

Quanto à Litigância de Má Fé requerida pela R. na sua Oposição

Na medida em que o A. ainda não teve oportunidade de se pronunciar quando à litigância de má fé arguida pelo R., na sua oposição (pois apenas se pronunciou quanto à litigância de má fé face à arguição das nulidades processuais, e que já foi decidida, conforme se disse), antes de tomarmos posição definitiva quanto a este aspecto, deve ser aquele notificado para, relativamente a esta questão, exercer o contraditório, nos termos do disposto no art. 3º, n.º 3, do CPC.”.

1.4. Ao incidente de liquidação foi fixado o valor de 21.000€.

1.5. No acórdão de 06.03.2024, proferido no âmbito do recurso de apelação interposto pelo reclamante, foi decidido o seguinte:

“Em face do exposto, decide-se:

I – Declarar irrecorríveis quer o despacho que dispensou a realização de audiência prévia quer o despacho que ordenou a notificação do autor para se pronunciar sobre a litigância de má-fé requerida pela ré;

II – No mais, julgar totalmente improcedente o recurso interposto pelo requerente/autor, confirmando-se os doutos despacho-saneador e saneador-sentença recorridos.”

1.6. Por acórdão do TRL de 06.03.2024 foi decidido o seguinte:

“Em face do exposto, decide-se:

I – Declarar irrecorríveis quer o despacho que dispensou a realização de audiência prévia quer o despacho que ordenou a notificação do autor para se pronunciar sobre a litigância de má-fé requerida pela ré;

II – No mais, julgar totalmente improcedente o recurso interposto pelo requerente/autor, confirmando-se os doutos despacho-saneador e saneador-sentença recorridos.”.

1.7. O Autor, ora reclamante, interpôs recurso de revista, com as seguintes Conclusões:

“1) Impugna-se, para todos os efeitos legais, o douto Acórdão recorrido, devendo o presente recurso ser admitido ao abrigo do disposto no art. 671.º, n.º 4 do CPC;

2) Devendo, relativamente ao Acórdão recorrido, ser reconhecido o mesmo ser incurso nas nulidades invocadas, devendo ser revogado e substituído por decisão que conduza à retificação da sentença e despacho saneador sobre que incide; Com efeito,

3) O douto Acórdão recorrido não reconhece a nulidade do despacho de admissão do recurso de Apelação que, em preterição do disposto no art. 617.º, n.º 1 do CPC, não se pronunciou sobre as nulidades invocadas, como seria legalmente obrigada;

4) Não reconhece a nulidade processual invocada, em função da violação do princípio da plenitude de assistência do juiz, em violação do princípio do “juiz natural” (cfr. art. 605.º e art. 195, n.º 1, ambos do CPC);

5) Não reconhece que não existe suporte documental que justifique a intervenção da magistrada que proferiu o despacho de admissão do recurso de Apelação;

6) Não reconhece que, em virtude do acima referido, incorreram os autos em violação dos princípios da igualdade substancial das partes e do contraditório, da aquisição processual de factos ou admissibilidade de meios probatórios;

7) Não reconhece que, tendo a contraparte apresentado oposição ao incidente de liquidação, a mera invocação por parte do Mm.º juiz, da simplicidade da decisão a proferir, não pode ser justificativo da não fundamentação nos termos legalmente prescritos;

8) Devendo ser reconhecido que o Mm.º juiz apenas pode dispensar a realização da audiência prévia, depois de auscultadas as partes e usando os mecanismos de gestão processual e adequação formal em conformidade com a lei;

9) Devendo ser reconhecida a violação de direitos constitucionais

10) Devendo ser reconhecida a nulidade da não fundamentação de que “não se provaram os danos”, uma vez que tal poderia ter sido indagado pelo Tribunal da Relação;

11) Devendo ser reconhecida a existência de vícios na decisão da matéria de facto, que o Tribunal da Relação deveria ter sanado;

12) Devendo ser reconhecido, à luz dos princípios da economia processual, de que o Tribunal da Relação poderia ter intervindo na indagação sobre a efetiva correção dos cálculos indemnizatórios e dos créditos da Autora sobre a Ré;

13) Devendo assim ser reconhecida a necessidade de realização da audiência prévia, para corrigir a decisão final oportunamente impugnada pelo A/Recorrente;

14) Devendo ser reconhecido igualmente, no concernente à Certidão da Segurança Social enviada aos autos como documento anexo ao requerimento de interposição do Incidente de Liquidação, sem qualquer pronúncia por parte do Mm.º Juiz “a quo”, constituir outra nulidade processual à luz do disposto no art. 615.º, n.º 1, al.d), “ex vi” do art. 608,º, ambos do CPC;

15) Sendo que, já no início da reabertura da Audiência de Discussão e Julgamento e, posteriormente em 12/6/2019 foram entregues nos autos, em formato digital, na primeira instância, os ficheiros RS (11 Recibos), no valor global de € 2.556,00 e o ficheiro RF (3 recibos), no valor global de € 3.000,00, referentes a despesas de saúde e despesas de formação profissional, bem como despesas médicas em suporte de papel no valor de € 3.175,00, reportadas aos art 53.º, 56.º, 60.º, 62.º, 68.º, 69.º, 70.º, 71.º, 72.º, 73.º, 74.º, 75.º, 76.º e 80.º da PI, que suportam a valorização real dos danos materiais sofridos pelo Autor, e que, na sequência da conduta da Ré e inércia do douto Tribunal, foram objeto de falta de pronúncia, constituindo igualmente nulidades não sanadas e que “inquinam”, de forma inevitável, decisões posteriores, porquanto esses documento se têm que considerar admitidos nos autos, uma vez que foram entregues anteriormente e mesmo após a reabertura da Audiência de Julgamento, não tendo sido objeto de contraditório nem do conhecimento do Tribunal de recurso, por “retenção” nos autos de primeira instância;

16) Essa remessa de documentos aos autos, foi efectuada na sequência de 5 recursos que ficaram retidos na 1ª instância, tendo sido necessário ao Autor, recorrer ao CSM.

17) O recurso principal (E) do Autor, interposto em 15/05/2019, integra esse conjunto de Recursos Retidos.

18) Em sequência a empresa Ré, B..., Lda., em 3/06/2019 interpôs um Recurso Subordinado, no qual o Autor, nos termos do art.º 636 do CPC em 03/06/2019, contra-alegou, procedendo então à remessa aos autos desse material Probatório em 12/06/2019, a que o Incidente de Liquidação se deveria reportar.

19) O recurso principal teve Provimento, do qual decorreu o Incidente Liquidação e o Recurso subordinado improcedeu, ficando os Documentos no processo que fundamentam esta Liquidação requerida ao Tribunal.

20) Todo este Material Probatório foi posteriormente objeto de múltiplas Reclamações, Recursos e de várias sentenças visíveis no sistema CITIUS, comprovando o interesse do Autor pela causa, utilizando o seu Direito de agir, de forma a ultrapassar os obstáculos e vícios que decorreram no processo, investindo monetariamente na defesa dos seus direitos e garantias constitucionais.

21) Relativamente às questões não reconhecidas nesse Apenso E ou no Apenso F, entre eles os Danos, os temas irão continuar a ser discutidos noutros procedimentos e noutras instâncias judiciais: a saber, o Tribunal Constitucional e o Tribunal Criminal.

22) Relativamente à necessidade de reapreciação e de retificação dos cálculos concernentes aos créditos laborais do Autor, efetuados na douta sentença nos autos principais, considerou a Mm.ª Juiz, nos seus cálculos, o valor ilíquido de €1.200,00 e não os valores ilíquidos dos recibos constantes no Doc. 5 anexo à PI, e referente ao ponto 6.º do respetivo articulado:

Março: € 1.588,40 ; Abril: € 1.595,52 ; Maio : € 1.588,64

O valor médio destes três meses é de € 1.590,88.

23) O doc. 5 foi entregue em suporte de papel, no conjunto dos 23 documentos que integram a PI;

24) Nos cálculos referentes ao período de 1 a 7 de julho, a decisão da sentença atribui o valor de € 280,00, tem como base € 1.200,00 e não sobre o valor proporcional ilíquido médio de € 1.590,88, a que corresponde o proporcional de € 371,20, superior ao valor decidido pela Mm.ª juíza, evidenciando erro de cálculo, ainda que sem a utilização da fórmula legal para o efeito;

25) A primeira instância não fundamentou a atribuição do valor de € 280,00 que pretendeu atribuir, nem efetuou uma análise cuidada do referido Doc. 5, nem apreciou criteriosamente a matéria de facto disponibilizada nos autos;

26) A primeira instância na sua decisão final relativa à atribuição ao Autor do valor global de créditos laborais no montante de €1.830,09, afirma que, “(...) pelo menos, esses lhe serão devidos.”, fazendo supor falta de segurança jurídica relativamente à decisão aplicada;

27) Com efeito, não se debruçando cuidadosamente sobre o teor do doc. 5, nem sobre o doc.19 e o doc. 11-R (admitido este último nos autos, quando reabertura da audiência de julgamento em 29.04.2019), não dispunha de condições objetivas para que a sentença prolatada fosse baseada numa decisão sem vícios e sem contraditório, pelo que se imporia a realização de audiência prévia;

28) A não realização duma Audiência Prévia nos presentes autos, não permitiu o ajuizamento correto dos valores a aplicar “in casu”.

29) A remuneração diária, para efeitos de remuneração mensal e remuneração proporcional, resultam da fórmula constante no art. 271.º do Cód. Trabalho, através da qual se apurou o custo horário de € 6.92 que, para 8 horas diárias, corresponde a € 55,38;

30) Para a remuneração proporcional de 7 dias, resulta € 387,66 (€ 55,38 x 7 dias);

31) Os créditos reclamados referentes ao subsídio de férias e de Natal (art. 245.º, n.º 3 e art.º 263.º, ambos do CT, resultam do contrato de trabalho do Autor, tendo-se iniciado em 23/03/2012 e cessado em 07/07/2013;

32) O proporcional do subsídio de férias, corresponde a 12 dias com direito a férias, ao custo diário de € 54,55, no valor de e 654,55 (54,55 x 12);

33) Este valor diário de € 54,55, é inferior a € 55,38, porque as rubricas de incidência são distintas das referentes à remuneração mensal/proporcional;

34) O proporcional de Subsídio de Natal é referente a 188 dias, no valor de € 618,08 (€1.200 x 188 );365 dias.

35) Não foram pagos integralmente ao Autor, os créditos laborais de 2012, referentes aos subsídios de férias e de Natal, nos valores respetivos de € 81,72 e de € 29,61, fundamentados nos recibos de 2012 anexos ao Incidente de Liquidação e dos quais a atual sentença não se pronunciou, importando a prática de uma outra nulidade processual (cfr, art. 615.º, n.º 1, al.d), “ex vi” do art. 608,º, ambos do CPC);

36) Encontram-se em dívida 8 dias de férias não gozadas em 2012, no valor de €436,48 (€4,56 x 8 ias), bem como 2 dias de férias não gozadas em 2013, no valor de € 109,12 (€ 54,56 x 2 dias);

37) Globalmente, o Autor é credor de: Ponto 1 a 4 do Requerimento de interposição do Incidente de Liquidação, pág. 5, referente à retribuição salarial de julho de 2013, no valor de € 524,46, incluindo o subsídio de alimentação no valor de €30,72 e as despesas de transporte de € 106,05 (€ 387,69+ € 30,72+ € 106,05);

38) Nos Pontos 5 a 9 do Requerimento de interposição do Incidente de Liquidação, a retribuição proporcional de férias, é a seguinte:

Proporcional do subsídio de férias de 2013: € 654,55 Proporcional de férias não gozadas de 2013: € 109,12 Proporcional de férias não gozadas de 2012: € 436,48 Reposição do subsídio de férias de 2012: € 81,72 Soma: € 1.281,87

39) Nos pontos 10 a 12 do Requerimento de interposição do Incidente de Liquidação, a retribuição proporcional de Natal de 2013 e 2012, é, respetivamente de € 618,08 e de € 29,61, totalizando € 647,69;

40) No Ponto 13 do Requerimento de interposição do Incidente de Liquidação, relativo ao valor dos encargos resultantes da cessação do contrato é de € 366,76, valor coincidente com o valor atribuído pela primeira instância;

41) O valor global dos créditos, conforme fundamentado no Requerimento de interposição do Incidente de Liquidação, é de € 2.820,78;

42) O doc 11 R, relativo à tentativa de acordo da entidade patronal, ficou retido na primeira instância (num total de 12 documentos) até 29.04.2019, onde foi admitido e a empresa Ré não se pronunciou sobre o mesmo, pelo que o Autor o considerou aceite para todos os legais efeitos;

43) A empresa Ré, no doc. 11 R a empresa utilizou um método de cálculo técnico alternativo ao do Autor, concluindo no doc. 11 R pelo valor dos créditos laborais ilíquidos apurados de € 2.057,97, repartidos por diferentes rubricas, superiores aos valores apurados na primeira instância, que aplicaram € 1.830,09;

44) Esta diferença resulta dos erros de cálculo cometidos nos valores iniciais da douta sentença então prolatada;

45) Por sua vez, a empresa não incluía os encargos com a cessação do contrato de trabalho, de € 366,76, que sempre seriam devidos ao trabalhador, houvesse ou não acordo de cessação do contrato, o que resultaria num valor total a pagar ao trabalhador, pela empresa Ré, no montante de € 2.424,73;

46) O Autor/recorrente, demonstrou no Incidente de Liquidação o valor de que se considerou credor, no montante de € 2.820,78;

47) Tendo havido diminuição de € 388,64 na retribuição ilíquida desde maio a junho de 2013 (de € 1.588,64 para € 1.200,00) atribuída unilateralmente pela empresa, o Autor tem um crédito a haver de € 388,64, não tendo a empresa fundamentado essa redução salarial e tendo alterada as contrapartidas remuneratórias;

48) Considerando o valor ilíquido do doc 11 R, corrigido com os encargos da formação profissional e a reposição salarial de € 2.057,97, acrescido dos encargos com a cessação no montante de € 366,76, e adicionando a reposição salarial de € 388,64, resultando num montante global de € 2.813,37;

49) Os créditos reclamados pelo Autor/recorrente, são de € 2.820,78, praticamente idêntico ao oferecido pela empresa.

50) Torna-se assim nítida uma diferença de € 990,69, entre os valores imputados inicialmente pela primeira instância no montante de €1.830,09 e os valores de € 2.820,78, calculados quer pelo Autor, quer pela empresa, após os ajustamentos resultantes do reconhecimento da Justa causa de resolução do contrato de trabalho por parte do Autor/recorrente;

51) No concernente à diuturnidade de 1,29 dias, sendo esta devida, porquanto o Autor/recorrente foi abrangido pela Convenção Coletiva de Trabalho, publicada no BTE n.º 23 de 22/06/2013, pág. 7, cláusula 1.ª, relativamente aos trabalhadores dos serviços de engenharia de software e engenharia de sistemas;

52) À data da publicação da Convenção Coletiva de Trabalho acima referenciada, o Autor, encontrando-se vinculado à empresa até 07/07/2013, estava abrangido pelo direito ao recebimento das diuturnidades resultantes desse dispositivo contratual;

53) Pelo que, o trabalhador tem direito à diuturnidade no valor de € 1.548,00 (1,29 x €54,55);

54) Como a empresa Ré nunca comunicou ao Autor/recorrente, a existência da publicação de CCT, razão de não ter sido invocado esse direito no decurso do processo judicial;

55) Os créditos laborais devidos ao Autor no valor de € 2.820,78, acrescidos de € 1548,00 de diuturnidades, totaliza o montante de € 4.368,78 € (por referência ao ponto T9 da pág. 8 do requerimento de interposição do incidente de liquidação);

56) No ponto T8, referente à indemnização definida no art. 396 do CT, o Autor/recorrente, declarou o montante de € 3.600,00 respeitante a € 1.200,00 mensais, reportados a 3 meses, incluindo a isenção horária de € 200,00 que, para muitos autores se considera dever ser incluída nessa indemnização, por se tratar de valores atribuídos de forma constante do início até final do contrato de trabalho;

57) A contabilização dos juros moratórios, respeita as regras dos juros simples, em cada rubrica e de acordo com o definido nas decisões judiciais;

58) Os cálculos constantes no T11, no valor de € 763,62, forma calculados até 02/09/2022, em atualização até data do efetivo pagamento;

59) O total de créditos a haver, é de € 9.812,21, conforme referenciado no Ponto T13 da pág. 8 do requerimento de interposição do Incidente de Liquidação;

60) No que tange à contabilização dos danos ocorridos, ela decorre da gravidade objetiva, resultante das circunstâncias e do período em que o trabalhador esteve ao serviço da empresa, constando no requerimento de interposição do Incidente de Liquidação (Ponto T8), no montante de € 3.000,00, a título de danos morais e retrocesso profissional, em função do reconhecimento do grau de culpa do empregador, reconhecida na validação da justa causa de resolução do contrato, enfatizada pela prova produzida e aceite pelo douto Tribunal “ad quem” ,de 574 dias sem ocupação efetiva;

61) Os danos patrimoniais invocados, resultam da contabilização das despesas de formação a cargo do trabalhador, no montante de € 3.000,00, dos encargos de saúde documentados nos autos no valor de € 2.556 (Pontos 18 e 19 do Requerimento de interposição do Incidente de Liquidação), e ainda de perda de salários e de subsídio de desemprego do dia 07/07/2013 até à concessão do subsídio de desemprego, no valor de € 3.000,00 (Ponto 20);

62) Sendo o total dos danos patrimoniais, no montante de € 8.556,00, perfazendo um total global de € 11.556,00 (Ponto T10).

63) Pelas razões de facto e de Direito a propósito invocadas, impugnou-se a validade da douta sentença e, por consequência, o douto Acórdão recorrido, proferidos nos presentes autos, devendo ter sido considerados nulos e de nenhum efeito e devendo ter sido considerada pelo TRL a reapreciação da matéria de facto, se necessário com produção de novos meios de prova no TRL (cfr. art. 662 do CPC), o que não aconteceu;

64) Considera-se, antes de mais, que foi violado o Princípio da plenitude da assistência dos juízes, plasmado no art. 605.º do CPC, porquanto o Juiz natural nos presentes autos, só poderia ser o Juiz que presidiu à apreciação e valoração da matéria de facto e do Direito aplicado, sendo o magistrado prolator da presente sentença, absolutamente alheio ao conhecimento do material probatório existente nos autos;

65) Verifica-se que a douta sentença ora proferida pelo Tribunal “a quo” omite ,desde logo, a necessária fundamentação, designadamente detalhando as razões de facto e de Direito porque não se colocaram em debate em sede de Audiência Prévia as questões suscitadas em sede de interposição de Incidente de Liquidação, e porque não foi proferido despacho Pré-saneador, em face da oposição apresentada pela Ré, o que deveria do ponto de vista legal e fático ter sido observado, porque a isso obriga o disposto no art. 154.º do C.P.C., sob pena de nulidade dessa decisão;

66) E essa fundamentação referenciada, reconduz-se à ideia de que a sentença que foi objeto de recurso de Apelação deveria ser considerada nula, assim como o despacho saneador que a precede, incorrendo em claro erro de construção, percurso lógico, apreciação e decisão, bem como do material probatório existente nos autos, por referência, “inter alia”, ao disposto no art. 154.º e art. 607.º, n.º 3 e 4, bem como do art. 615.º, n.º 1 al. b), c) e d), todos do C.P.C., o que não foi reconhecido pelo TRL no douto Acórdão impugnado;

67) Nunca tendo sido admitido debate contraditório sobre a relevância probatória dos documentos aceites nos autos, como comprovante dos danos sofridos pelo Autor nem justificação judicial da respetiva admissão, verifica-se que admitir como fundamento para a liquidação da Indemnização por Justa Causa de resolução do contrato de trabalho, cálculos incorretos sobre os valores em causa, resultantes da não ponderação do material probatório existente nos autos, constitui erro na apreciação da matéria de facto , ocasionando erro de decisão, importando, de igual modo, a nulidade da sentença ora objeto de impugnação e a nulidade do Acórdão que não deu provimento ao recurso de Apelação interposto;

68) Devendo ser reconhecido o ressarcimento do Autor/recorrente pela atribuição de indemnização, pelos danos morais e materiais sofridos pelo trabalhador, dada a reconhecida gravidade dos fundamentos da justa causa de resolução do contrato de trabalho por parte do Autor;

69) Devendo ser, ainda, admitida a retificação dos valores concernentes aos créditos salariais do trabalhador, com fundamento no aduzido;

70) Devendo o despacho saneador proferido, bem como a douta sentença e o douto Acórdão recorrido serem objeto de revogação e/ou anulação, por assentarem em pressupostos de facto e de Direito baseados em erros de apreciação e decisão; Com efeito,

Em suma, com fundamento nas conclusões acima, requerem-se igualmente as seguintes decisões:

Que o Colendo Supremo Tribunal de Justiça, considerando procedente o presente recurso, decida:

1) A interpretação do disposto no art. 358.º, n.º 2 do CPC “in fine”, no sentido de que a instância principal considerada extinta, seja considerada “renovada” para efeitos de apreciação dos erros incursos em decisões anteriores, para que a liquidação possa ser corretamente formulada;

2) O reconhecimento das nulidades invocadas pelo Autor/recorrente, quer no respeitante à douta sentença, quer no concernente ao despacho saneador que a precede e ainda no respeitante ao douto Acórdão recorrido, por se entender que contendem com o necessário respeito pelos princípios da igualdade, do contraditório, com a aquisição processual de factos ou com a admissibilidade de meios probatórios;

3) Que este conjunto de circunstâncias colide frontalmente com o texto da Lei Fundamental, nomeadamente disposições constitucionais, como o art. 13.º (Princípio da Igualdade), art. 18.º (Força Jurídica) e art. 20.º (Acesso ao Direito e Tutela Jurisdicional efetiva), a Responsabilização das entidades públicas (art. 22 da CRP), a eficácia das normas relativas às Convenções Coletivas de Trabalho (cfr. art. 56/4 da CRP), a consagração dos direitos relativos ao trabalho e aos trabalhadores (cfr. art. 58.º e 59 .º do CRP), as decisões dos Tribunais (art. 205 da CRP), a necessidade de cuidada e atenta fundamentação das decisões judiciais ( cfr. art. 205.º da CRP), sendo que as disposições legais relativas aos direitos fundamentais são diretamente aplicáveis no ordenamento jurídico português, vinculando ao seu cumprimento as entidades públicas e privadas (cfr. art. 18 da CRP).

4) O reconhecimento de que o tribunal “a quo” não admitiu nem analisou ou fundamentou criteriosamente todos os documentos juntos aos autos, nem apreciou devidamente as provas produzidas, bem como as declarações de parte do autor, o que importaria a necessária reapreciação da prova produzida e/ou a admissão de novos meios de prova em sede julgamento no Tribunal da Relação, o que se requereu do Venerando Tribunal, à luz do disposto no art. 662.º do CPC;

5) Que seja decidida a anulação/Revogação da douta sentença e do Acórdão sobre ela incidente;

6) Que seja ordenada a realização da audiência prévia, com vista à apreciação e debate sobre os aspetos controversos, em face dos elementos probatórios existentes nos autos, como explanado (doc.5, doc. 19, doc. 11R e docs. Danos);

7) Que da devolução dos autos ao TRL, seja ordenada a reapreciação sobre a matéria de facto, vindo a ser corrigido o valor relativos ao créditos laborais, juros, antiguidade, danos patrimoniais e morais devidos ao A/ Recorrente, ou em alternativa, seja ordenada a realização de audiência de julgamento no Próprio Tribunal da Relação.”

1.8. A Exma. Juíza Relatora do TRL, por despacho de 08.05.2024 consignou o seguinte:

“Não admito o recurso interposto sob a refª. ...94 por não ser admissível face ao disposto no art. 629º, nº 1, do CPC, à não verificação de qualquer das situações previstas nos nºs 2 e 3 deste mesmo preceito legal, à verificação de dupla conforme prevista no art. 671º, nº 3, do mesmo diploma e à não verificação de qualquer situação prevista no invocado art. 671º, nº 4, do CPC. Notifique.”

2. Fundamentação

2.1. Começa por se assinalar que ao contrário do referido pelo reclamante o despacho de não admissão de recurso não padece de qualquer obscuridade. Esta ocorre, como é sabido, quando não se sabe o que o juiz quis dizer, quando a decisão não é perceptível.

Ora, apesar de sintético, resulta do próprio teor literal do despacho reclamado e da concreta indicação das normas aplicáveis, que o Tribunal da Relação não admitiu o recurso com fundamento na falta dos pressupostos a que alude o artigo 629.º n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC); na não verificação das situações elencadas pelo legislador em que o recurso é sempre admissível (revista extraordinária) constantes do aludido art.º 629.º n.ºs 2 e 3; na verificação da dupla conforme (confirmação sem voto de vencido da decisão de 1.ª instância - situação processual esta impeditiva do direito potestativo ao recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, a que se refere o art.º 671.º n.º 3 do CPC) e na não subsunção do recurso às situações previstas no artigo 671.º, n.º 4 do CPC, relativo aos acórdãos interlocutórios.

O despacho em causa é, pois, inteligível, sendo perfeitamente compreensível o seu conteúdo e os fundamentos de não admissão do recurso.

2.2. Posto isto, vejamos então se o recurso de revista interposto pelo reclamante deve ser admitido, como o mesmo sustenta.

O art.º 629.º do CPC estabelece a regra básica da recorribilidade em função do valor da causa, da alçada do tribunal e da sucumbência.

Aí se prescreve, com efeito, que “o recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal (…)”.

Nos termos do art.º 44.º n.º 1, da Lei da Organização do Sistema Judiciário (LOSJ), a alçada do Tribunal da Relação é de 30.000,00 €.

Desta feita, sem prejuízo das decisões que admitem recurso independentemente do valor da causa e da sucumbência (art.º 629.º n.º 2 do CPC), o recurso de revista é admissível apenas quando o valor da causa é superior a 30.000,00 € e a sucumbência é superior a metade deste valor, ou seja, a 15.000,00 €.

No presente caso, uma vez que o valor do incidente de liquidação de sentença, que é o valor que releva (art.º 304.º do CPC) foi definitivamente fixado pelo tribunal de 1.ª instância em 21.000€, é o mesmo inferior a 30.000,00€, pelo que não estando verificado o pressuposto do valor, o recurso só seria admissível se estivesse em causa alguma das situações referidas no mencionado art.º 629.º, ou seja, em que:

“2. Independentemente do valor da causa e da sucumbência é sempre admissível recurso:

a) Com fundamento na violação de regras de competência internacional ou em razão da matéria ou da hierarquia ou na ofensa do caso julgado (pelo Acórdão recorrido e não de qualquer outra decisão);

b) Das decisões respeitantes ao valor da causa ou dos incidentes, com o fundamento de que o seu valor excederia a alçada do tribunal de que se recorre;

c) Das decisões proferidas no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça

d) Do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não coubesse recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se tivesse sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme”.

Sucede que, consoante resulta das conclusões do recurso de revista (que delimitam o objecto do recurso - art.º 639.º do CPC), não está em causa nenhuma das situações acima referidas, pelo que, faltando o valor da causa, o recurso não é admissível.

Importa ainda salientar que o recurso de revista incide sobre segmento do acórdão da Relação onde se decidiu que o despacho relativo à marcação da audiência prévia não é recorrível e no mais sobre a parte em que o Acórdão manteve o despacho saneador e a sentença.

No referente ao despacho de marcação da audiência prévia, o acórdão do TRL (que considerou o despacho irrecorrível) consubstancia um acórdão que aprecia “uma decisão interlocutória que recaiu unicamente sobre a relação processual” (e não uma decisão de mérito ou que coloque termo aos autos) conforme prescreve o art.º 671.º, n.º 2 do CPC.

Ora, os acórdãos que incidam sobre decisões interlocutórias só podem ser objecto de revista nos casos previstos no referido artigo 671.º n º 2 do CPC

a) Nos casos em que o recurso é sempre admissível;

b) Quando estejam em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme

O que não sucede no presente caso.

Assim sendo, nesta parte, o acórdão em causa também não é recorrível.

Quanto ao mais, tão pouco é recorrível o acórdão recorrido visto in casu não ter aplicação o disposto no invocado art.º 671.º n. º 4 do CPC que respeita à recorribilidade de “acórdãos proferidos na pendência do processo na Relação”, “se não houver ou não for admissível recurso de revista das decisões previstas no n.º1” do mesmo preceito, pois estamos perante o recurso de um acórdão proferido nos termos do art.º 671.º, n.º1 (“ (…) acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância, que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos”) e, parcialmente, como supra assinalado, nos termos do seu n.º 2 - sendo que nesta última parte tal acórdão não é sequer recorrível.

Improcede, assim, a presente reclamação.

3. Decisão

Em face do exposto julga-se improcedente a reclamação deduzida pelo Autor, AA, mantendo-se o despacho reclamado de não admissão do recurso de revista.

Custas pelo Reclamante”

2.2. Analisando a presente reclamação do Autor, verifica-se reproduzir esta, no essencial, o que foi por si invocado na reclamação deduzida nos termos do art.º 643.º do CPC.

Insiste o reclamante que o recurso de revista é admissível, invocando, de novo, a “violação do caso julgado”, a ocorrência de nulidades e a inexistência de dupla conforme. Pretende, ainda, que o recurso de revista deve ser julgado procedente, aí se decidindo as questões que elencou na parte final da reclamação (alíneas C – H), o que faz, baseando-se designadamente numa interpretação lata do disposto no art.º 358.º n.º 2, do CPC, onde se prevê que “a instância extinta considera-se renovada”, de modo abarcar um conjunto de questões não integrantes das que foram apreciadas pelo acórdão recorrido.

Cumpre desde já assinar, ao contrário do que parece entender o reclamante, que no presente domínio, cabe apenas aferir da admissibilidade do recurso de revista por si interposto. Por outro lado, constituindo o incidente de liquidação previsto do art.º 358.º, do CPC um incidente da instância declarativa “com estreita e indissociável ligação à acção onde a sentença foi proferida e se reconheceu a existência do crédito, decretando uma condenação genérica, destina-se tal incidente apenas a concretizar o objecto dessa condenação, com respeito pelo caso julgado, não sendo permitido às partes tomar uma posição diferente ou mais favorável do que a já assumida na mesma acção” (Ac. do STJ de 18.02.2022, proc. 3396/14.3T8GMR.2.G1.S1), não faz qualquer sentido, e extrapola o âmbito da presente reclamação, o invocado pelo Autor a esse respeito e que acima se fez referência.

Assim, e em complemento do que já se afirmou na decisão reclamada, importa apenas referir o seguinte:

- Tendo sido fixado ao incidente de liquidação o valor de 21.000 euros, e estando o mesmo definitivamente fixado em virtude de as partes não o terem impugnado, é esse valor que importa tomar em consideração, designadamente para efeitos de recorribilidade da decisão a proferir nos autos (Cfr., entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.06.2021, proc. 90/19.2T8PRG.G1-A.S1, in www.dgsi.pt).

Destarte, uma vez que o valor da causa é inferior ao valor da alçada da Relação que é de 30.000 euros, o presente recurso atento o valor da causa e da sucumbência não é admissível (art.º 629.º n.º 1, do CPC).

- Ao invés do que sustenta o reclamante, é inequívoca, no presente caso, a verificação da dupla conforme (art.º 671.º n.º 3, do CPC), na medida em que o acórdão da Relação confirmou, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, o despacho saneador e a sentença da 1.ª instância. Pelo que, nessa parte, tão pouco é admissível a revista.

- Fazendo menção ao disposto no art.º 629.º n.º 2 alínea a), do CPC (“2 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso: a) Com fundamento na violação das regras de competência internacional, das regras de competência em razão da matéria ou da hierarquia, ou na ofensa de caso julgado”), insiste o reclamante na “violação do caso julgado”, referindo-se ao acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11.05.2022 e às decisões anteriores do mesmo Tribunal da Relação que, no seu modo de ver, não foram cabalmente cumpridas pelo tribunal de 1.ª instância, como sucede com o Acórdão do mesmo Tribunal da Relação de 11.04.2018.

Não lhe assiste razão.

Com efeito, consoante tem sido entendido pelo Supremo Tribunal de Justiça, quando o citado art.º 629.º n.º 2, do CPC se refere à admissibilidade do recurso, fundada na violação do caso julgado, tem como pressuposto ser a própria decisão impugnada a contrariar anterior decisão transitada em julgado, violando-o, ela mesma diretamente e não quaisquer outras decisões (Vd., entre outros, os Acórdãos do STJ de 09-08-2011, proc. 407/04.TBCDR.P2.S1 e de 17-11-15, proc. 34/12.2TBLMG.C1.S1).

Ora, uma vez que a decisão impugnada através do recurso de revista é o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 06.03.2024, e não nenhuma daquelas decisões, o recurso de revista não é admissível, nos termos do citado art.º 629.º n.º 2, alínea a), in fine.

- Doutro passo, baseando-se no disposto no art.º 674.º n.º 1, alínea c), do CPC (onde se preveem como fundamento do recurso de revista as nulidades (da sentença) previstas nos artigos 615.º e 666.º do CPC (e não outras nulidades processuais, que, como é sabido, em regra, estão sujeitas a reclamação – art.º 196.º do CPC), persiste o reclamante na existência de várias nulidades - também invocadas no recurso de apelação – pretendendo, desse modo, que o recurso é admissível ao abrigo do disposto no art.º 671.º n.º 4, do CPC.

Sucede que in casu, o recurso de revista não é admissível, em virtude de o valor da causa ser inferior ao da alçada da Relação, também não o sendo, como já dito, nos termos do art.º 629.º n.º 2, do mesmo diploma legal.

Destarte, consoante é jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal, a invocação de nulidades da sentença nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), 2.ª parte do CPC, não é susceptível de fundar, autonomamente, enquanto fundamento exclusivo, o recurso de revista, só sendo aquelas conhecidas pelo Supremo Tribunal de Justiça se houver lugar ao conhecimento desse mesmo recurso (Neste sentido, podem ver-se, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 10.12.2020, proc. 85/12.7TVLSB.L2.S1, de 18.03. 2021, proc. 2111/12.0TVLSB.L1-A.S1 e de 18.03.2021, proc. 1575/17.0T8PRT.P1.S2, disponíveis em www.dgsi.pt).

Pelo que, salvo a possibilidade de conhecimento com base noutro fundamento, não há fundamento para admitir a revista com a finalidade do conhecimento exclusivo das mencionadas nulidades.

Para além disso, nos termos acima assinalados, as nulidades que foram apontadas pelo reclamante, já tinham sido por este invocadas no recurso de apelação, não assistindo competência a este Supremo Tribunal de Justiça para o conhecimento de nulidades que inquinam decisões de 1.ª instância e não o Tribunal da Relação (Vd. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.12.2021, proc. 2952/15.7T8FNC.L2.S1).

- Quanto ao restante segmento decisório do Acórdão recorrido, igualmente impugnado pelo reclamante, uma vez que nada mais de relevante foi por este invocado, resta apenas remeter para os termos da decisão reclamada, concluindo-se, como aí também referido, pela inaplicabilidade do disposto no art.º 671.º n.º 4 do CPC. Não sendo, como tal, admissível o recurso de revista.

3. Decisão

Em face do exposto, desatende-se a presente reclamação, mantendo-se a decisão reclamada.

Custas pelo Autor

Lisboa, 16 de outubro de 2024.

Albertina Pereira (Relatora)

Mário Morgado (1.º Adjunto)

José Eduardo Sapateiro (2.º Adjunto)