NULIDADE DE SENTENÇA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ACTO INÚTIL
ACÇÃO DE REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
DESPESAS
INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DIFERENDO ENTRE OS PAIS RELATIVO A QUESTÃO DE PARTICULAR IMPORTÂNCIA
Sumário

I. Não constitui nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, a falta de consideração de um documento que terá sido apresentado pela parte, e cujo desentranhamento foi determinado pelo tribunal, decisão que transitou em julgado e foi concretizada, porque a decisão não pode considerar elementos que não estão no processo e não são de conhecimento oficioso;
II. Não deve ser admitida impugnação da decisão de facto quando a alteração pretendida realizar se refira a simples modo de redação de um facto, ou de suprimento de imprecisão na formulação do mesmo, sem modificação do respetivo sentido;
III. Não deve ser igualmente admitida a impugnação de facto, por ser inócua para a decisão, quando esta se refira a um simples pedido de acrescento ao facto essencial, dado por provado, de elementos de contextualização ou precisão;
IV. Estando em fase de julgamento ação de regulação das responsabilidades parentais em que a única questão a decidir se reporta à repartição de despesas com os filhos, a decisão de ação tutelar relativa a questão de particular importância, ao abrigo do art.º 44.º do RGPTC, tendo por objeto estrito a escolha de estabelecimentos de ensino para o ano letivo em curso e repartição dos inerentes encargos, deve ser reservada a essa sede definitiva, por questões de oportunidade, coerência na resposta jurídica e estabilidade da vida das crianças;
V. Não é manifestamente desproporcional impor ao pai um pagamento de despesas superior ao da mãe, tendo ambos rendimentos claramente superiores à média, sendo os rendimentos daquele muito superiores aos desta, mesmo quando se apure que o pai tem um nível de despesas muito elevado, mas que fica aquém do seu nível de rendimentos.

Texto Integral

Acordam os Juízes desta 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, o seguinte:

I. Caracterização do recurso:
I.I. Elementos objetivos:
- Tribunal recorrido - Juízo de Família e Menores de Lisboa - Juiz 3;
- Autos - Processo tutelar cível para suprimento da falta de acordo em questão de particular importância (art.º 44.º do RGPTC);
- Apelação – 1 (uma) – Da decisão final;
- Âmbito – Recurso da decisão de facto e de direito. –
I.II. Elementos subjetivos:
- Requerente – (...);
- Requerida - (...);
- Crianças sujeitos do processo:      
- (...);
- (...);
- (...). –
II. Caracterização dos autos:
II.I. Síntese da ação tutelar:
Pediu o requerente, solicitando atribuição de caráter urgente aos autos, que seja suprida falta de consentimento da requerida-mãe quanto à escolha do estabelecimento de ensino a frequentar pelos filhos no ano letivo de 2024/2025, no sentido de passarem a frequentar estabelecimentos de ensino público (Agrupamento de Escolas X… ou Agrupamento de escolas  (...), ou outro, obtido por acordo dos pais).
Disse, em síntese:
- Que requerente e requerido se separaram em setembro de 2022;
- Que, não tendo chegado a acordo de regulação das responsabilidades parentais, foi instaurado processo com esse objeto (apenso A);
- Que nesses autos foi estabelecido regime provisório de regulação das responsabilidades parentais, passando os filhos a residir alternadamente, por períodos de uma semana, com cada um dos progenitores;
- Que foi determinado que as despesas com os menores, designadamente as relativas a educação, fossem suportadas na proporção de 60% para o pai e 40% para a mãe;
- Que a sua situação profissional se alterou, tendo cessado contrato de trabalho em Portugal e iniciado trabalho na Suíça, onde fixa residência nas semanas em que não está com os filhos;
- Que os filhos têm estado matriculados em instituições de ensino privadas, com o que vem despendendo os valores que descreve;
- Que a sua situação económica (que descreve quanto a rendimentos e despesas) não lhe permite continuar a suportar tais valores, sendo que não aceita também a sua repartição desproporcional.
Respondeu a requerida, em síntese, impugnando a invocada situação financeira do requerente e sustentando o seu desafogo económico, além de alegar que os filhos se encontram bem integrados social e educativamente nos estabelecimentos que frequentam ou se preparavam para frequentar, sendo a situação que melhor protege o seu interesse, com a repartição de pagamentos provisoriamente determinada.
Em conferência de pais, estes não chegaram a acordo.
Colhidas as pronúncias das partes e do Ministério Público, foi proferida decisão nos presentes autos, cujo dispositivo tem o seguinte teor:
Por todo o exposto, indefere-se a pretensão trazida a juízo por (...) e decide-se que as crianças (...), (...) e (...), no ano lectivo de 2024/2025, irão frequentar o Colégio (...), confirmando-se a inscrição efectuada pela mãe nesta escola, devendo os progenitores suportar os respectivos encargos de acordo com a proporção determinada na medida provisória de responsabilidades parentais.
 Desta decisão foi interposto o recurso em apreço. –
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II.II. Elementos relevantes do apenso de regulação das responsabilidades parentais:
Correndo, por apenso a estes autos, processo de regulação das responsabilidades, são os seguintes os elementos pertinentes que se retiram do mesmo para a presente decisão:
1. Em sede de conferência de pais realizada no dia 23 de maio de 2023 foi proferida decisão provisória de regulação das responsabilidades parentais, nos seguintes termos:
1ª As responsabilidades parentais sobre os menores são atribuídas a ambos os progenitores como na constância do matrimónio;
2ª Os menores vivem alternadamente à guarda da Mãe e do Pai, em semanas alternadas, com início à sexta-feira de manhã na escola; o progenitor que com elas estiver durante essa semana deixa-os na escola na 6ª feira de manhã, e indo depois o outro progenitor buscá-las à escola, ao fim das atividades de 6ª feira, e aí este entregando-as na 6ª feira de manhã da semana seguinte, com exceção dos números seguintes.
2.1 Na semana em que os menores estão a viver com um progenitor, o outro pernoitará com os menores à 3ª feira: irá buscá-los à escola, ao fim das atividades de 3ª feira, e aí este entregando-as na 4ª feira de manhã do dia seguinte.
2.2. Caso o progenitor, por impedimento, não possa assegurar a pernoita prevista no presente número 2.1., poderá acordar com o outro progenitor a alteração da data para um outro dia de conveniência recíproca, desde que o faça por escrito, com 7 dias de antecedência, e desde que haja acordo nesse sentido. Os pais colaborarão ativamente para que tal aconteça.
3ª O sistema de guarda e residência alternada semanal interrompe-se igualmente nas férias escolares de Verão e de Natal e Ano Novo conforme previsto na presente RRP.
4ª No Verão de 2023 os menores passam a primeira quinzena de agosto com o Pai, e a segunda quinzena de agosto com a Mãe. No ano seguinte inverte-se a ordem.
5ª No Natal de 2023, os menores passam o dia 24 de dezembro com o Pai, até domingo às 12:00 horas; e depois o resto do dia 25 com a Mãe; no ano seguinte, inverte-se a ordem.
6ª Os menores podem deslocar-se para o estrangeiro em férias, desde que na companhia de qualquer dos progenitores.
6.1. O Pai poderá viajar para os Estados Unidos ano sim ano não no Natal, desde que em período de férias escolares, e por período não superior a 14 dias. Nesse caso será pelo mesmo período a Mãe compensada no ano seguinte (por exemplo: se o Pai sair por 7 dias, serão 7 os dias a compensar no ano seguinte).
7ª Nos dias dos aniversários dos filhos, os filhos fazem uma refeição com cada um dos pais, em termos a combinar. Os pais organizarão também uma festa de aniversário aos filhos, com os amigos, também em termos a combinar, onde se juntam os dois, família, amigos, etc.
8ª No dia de aniversário de cada um dos pais, os filhos fazem uma refeição com progenitor aniversariante se for um dia de escola; se for um dia de feriado, passam o dia com esse aniversariante, e pernoitarão com o aniversariante, com entrega na escola (dia semana) ou em casa dou outro progenitor às 10h (quando em fim-de-semana e feriados)
9ª Os menores participarão nas festas familiares de aniversário dos avós, tios, primos direitos (maternos e paternos) quando as mesmas se realizem na área da grande metrópole Da sua residência (Grande Lisboa/Cascais/Sintra). Ambos os pais farão os melhores esforços por comunicar estas ocasiões com 7 dias de antecedência.
9.1. Para os restantes familiares a participação decorrerá mediante disponibilidade do progenitor com quem estão a viver nesse dia de acordo com o vigente regime de guarda e mediante acordo prévio nesse sentido.
10ª Cada um dos progenitores suportará os custos dos menores quando, nos termos desta RRP, estão a seu cargo.
11ª As despesas escolares (inscrição e mensalidades), farda (se aplicável) alimentação escolar (se aplicável), atividades extracurriculares e livros e material escolar, serão pagas pelos progenitores na proporção de 60% para o Pai e 40% para a Mãe.
11.1. As atividades extracurriculares previstas no número anterior são as seguintes:
a)  (...): 5 atividades na escola e ténis
b) (...): 2 atividades na escola e rugby
c)  (...): 2 atividades na escola e rugby
12ª O transporte escolar é assegurado pelo progenitor com quem os menores em cada momento vivam, exceto quando, por razões de impedimento, seja o outro a suprir essa falta, circunstância em que o progenitor faltoso reembolsará o outro das despesas incorridas.
13ª Os progenitores comparticipam respetivamente em 60% (Pai) e 40% (Mãe) nas despesas médicas e medicamentosas não cobertas por seguros de saúde.
14ª Os progenitores partilham o custo da empregada doméstica, que acompanhará sempre os filhos, a 60% pelo Pai e 40% pela Mãe, sendo que a mesma prestará serviço na casa onde os filhos estiverem.
15ª As despesas realizadas por um progenitor que o outro houver de comparticipar, serão reembolsadas mediante entrega dos comprovativos dos pagamentos efetuados no prazo de 8 dias após a interpelação para o pagamento.
2. Em sede de conferência de pais realizada em 10 de janeiro de 2024 os progenitores declararam ter chegado a acordo quanto ao regime de regulação das responsabilidades parentais, com exclusão da questão de repartição das despesas dos filhos;
3. Em tal conferência, foram notificados para apresentar em juízo tal acordo;
4. Por requerimento de 22/1/2024, os requerentes juntaram documento intitulado termo de acordo parcial de mediação familiar sobre o exercício das atividades parentais, com o seguinte teor:
1. As responsabilidades parentais sobre os menores são atribuídas a ambos os progenitores como na constância do matrimónio.
2. Os menores vivem alternadamente à guarda da Mãe e do Pai, em semanas alternadas, com início à sexta-feira de manhã na escola; o progenitor que com elas estiver durante essa semana deixa-os na escola na 6° feira de manhã, e indo depois o outro progenitor buscá-las à escola, ao fim das atividades de 6ª feira, e aí este entregando-as na 6° feira de manhã da semana seguinte.
2.1. Caso um dos progenitores, por impedimento laborai, ou outro motivo justificável, não possa assegurar pontualmente a semana alternada, só haverá tempo de compensação se o mesmo for acordado previamente entre os progenitores.
3. O sistema de guarda e residência alternada semanal interrompe-se nas férias escolares de Verão, Natal e Ano Novo, e da Páscoa, bem como na pausa letiva do Carnaval, conforme previsto no presente acordo.
3.1. No Verão de 2024 os menores passam a primeira quinzena de Agosto com o Pai e a segunda quinzena de Agosto com a Mãe . No ano seguinte inverte-se a ordem. Quando os menores tiverem o mês de Julho de férias, passarão uma quinzena com cada um dos progenitores, salvaguardando a alternância aquando da entrada do mês de Agosto, de modo que não passem um mês seguido só com um progenitor.
3.2. No Natal de 2024, os menores passam o dia 24 de Dezembro com a Mãe, até dia 25 s 12:00 horas; e depois o resto do dia 25 com o Pai; no ano seguinte, inverte-se a ordem.
3.3. Na interrupção letiva do Carnaval, os menores passam, em 2024, esses dias com a Mãe, e no ano seguinte inverte-se a ordem, e assim sucessivamente.
3.4. Na Páscoa, as férias dos menores, são partilhadas com cada um dos progenitores, acordando estes previamente qual a semana que ficam com os mesmos.
4. Os menores podem deslocar-se para o estrangeiro em férias, desde que na companhia de qualquer dos progenitores.
4.1. Na época do Natal, o Pai poderá viajar para os Estados Unidos ano sim ano não, desde que em período de férias escolares, e por período não superior a 14 dias. Nesse caso será pelo mesmo período a Mãe compensada no ano seguinte (por exemplo: se o Pai sair por 7 dias, serão 7 os dias a compensar no ano seguinte). Nos restantes períodos de férias que, durante o ano, caibam ao Pai, este poderá viajar para os Estados Unidos sempre que quiser, desde que informe previamente a Mãe.
5. Nos dias dos aniversários dos filhos, os filhos fazem uma refeição com cada um dos pais, em termos a combinar. No caso de os aniversários serem num dia de semana, haverá uma só refeição com ambos os pais. Os pais organizarão também uma festa de aniversário aos filhos, com os amigos, também em termos a combinar, onde se juntam os dois, família, amigos, etc.
6. No dia de aniversário de cada um dos pais, os filhos fazem uma refeição com o progenitor aniversariante se for um dia de escola; se for um dia de feriado, passam o dia com esse aniversariante, e pernoitarão com o aniversariante, com entrega na escola (dia semana) ou em casa do outro progenitor às 10h (quando em fim-de-semana e feriados).
7. Os menores participarão nas festas familiares de aniversário dos avós, tios, primos direitos (maternos e paternos) quando as mesmas se realizem na área da grande metrópole da sua residência (Grande Lisboa/Cascais/Sintra) e desde que tais festas não conflituem com programas previamente organizados / combinados pelo Progenitor a quem os menores estiverem confiados nesses dias / semanas, devendo tais programas serem combinados e calendarizados por forma a, razoavelmente, não privar os menores de conviveram com a restante família. Ambos os pais darão o seu melhor para cumprirem o que aqui estipulam, devendo comunicar ao outro progenitor estas ocasiões com 7 dias de antecedência.
8. Cada um dos progenitores assegura as despesas correntes dos menores quando os mesmos, nos termos do presente regime, se encontrem a seu cargo.
9. Quanto às seguintes despesas dos menores, e modo de repartição ou comparticipação, os progenitores não chegaram a acordo, pelo que remetem para o Tribunal uma decisão referente a:
despesas escolares, de actividades, curriculares e extracurriculares, fardamento escolar (se aplicável), equipamento desportivo e livros e material escolar; transporte escolar nos dias em que qualquer progenitor tiver de suprir faltas e impedimentos do outro; despesas com o seguro de saúde dos menores (de que presentemente beneficiam sem qualquer custo, mas que pode deixar de acontecer), despesas médicas e medicamentosas não cobertas por seguro de saúde; custo da empregada doméstica que acompanha os filhos.
10. As despesas realizadas por um progenitor que o outro houver de comparticipar, serão reembolsadas mediante entrega dos comprovativos dos pagamentos efetuados no prazo de 50 dias após a interpelação para o pagamento.
11. Os pais comunicam abertamente sobre os filhos, tendo perfeita consciência da necessidade da  (...), (...) e do  (...) em manterem uma relação próxima e presencial, com ambos, assumindo o compromisso de cumprir o que juntos acordaram e privilegiar, à semelhança do que fazem atualmente, o diálogo entre ambos, e a mediação familiar como solução para a resolução de eventuais dificuldades no cumprimento do presente acordo.
5. Tal acordo foi homologado por sentença, proferida nos autos de regulação das responsabilidades parentais em 14/3/2024;
6. Os autos de regulação das responsabilidades parentais prosseguiram para decisão da matéria não objeto de acordo, estando agendada data para audiência final em tal apenso para o corrente mês de outubro de 2024. –
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III. Objeto do recurso (delimitado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente):
Inconformado com a decisão proferida nos autos, recorreu da mesma o recorrente-pai, pedindo revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que decida que os filhos, no ano letivo de 2024/2025, frequentarão o ensino público, ou, em alternativa, a decidir-se pela manutenção dos menores no Colégio (...), que os respetivos encargos sejam suportados por ambos os progenitores, na proporção de 50% para cada um.
Sustenta este pedido nas seguintes conclusões a seguir referidas.
a) Alegações do recorrente (conclusões que se reproduzem, no essencial, sem atualização de grafia e assinalando a “negrito” os pontos cuja apreciação é suscitada):
- O presente Recurso de Apelação vem interposto da douta Sentença proferida em 10 de Julho de 2024, a qual, julgando improcedente a acção, decidiu que os menores (…), no ano letivo de 2024/2025, irão frequentar o Colégio (...), confirmando-se a inscrição efetuada pela Recorrida Mãe nesta escola, devendo os progenitores suportar os respetivos encargos de acordo com a proporção determinada na medida provisória de responsabilidades parentais, a saber, 60% pelo Recorrente Pai e 40% da responsabilidade da Recorrida Mãe.
- O raciocínio perfilhado pelo Exmo. Tribunal a quo não pode proceder, pois uma correta consideração e apreciação da prova produzida ao longo da ação e, bem assim, a adequada subsunção da mesma ao direito aplicável, imporia decisão diversa da que foi tomada.
- Salvo o devido respeito, a Mmª. Juiz considerou – sem qualquer suporte fáctico – e com toda a prova testemunhal e documental efetuada a demonstrar inequivocamente o contrário – factos que nunca poderiam ter sido considerados provados, não tendo também considerado provados factos que inequivocamente o foram.
- Acresce que, ao longo da Decisão recorrida, salvo o devido respeito e melhor entendimento, a Mm.ª Juiz tece várias conclusões de forma algo ligeira, que, segundo o Recorrente, mais não são que suposições e considerações pessoais, sem qualquer suporte fáctico, como por exemplo, quando refere que «(…) Mais, tanto antes como depois da separação dos progenitores, estes acordaram na colocação e consequente contribuição financeira para o pagamento das despesas inerentes ao ensino privado dos seus filhos.», e que «(…) atendendo aos valores mensais auferidos pelo Requerente e despesas apresentadas não pode concluir-se que o mesmo tem um modo de vida frugal. Assim sendo, e sem prejuízo dos esforços e necessidades financeiras que o Requerente tem, é cristalino que o seu nível de vida é consentâneo com a frequência no ensino privado dos seus três filhos. (…)», quando tal circunstância é inequivocamente contrariada pelos factos e prova documental junta aos autos.
- Salvo o devido respeito, esta decisão foi proferida sem o douto Tribunal a quo ter procedido a uma cuidada e ponderada análise da prova produzida, tendo o tribunal a quo, não só deixado de se pronunciar sobre factos alegados pelo Recorrente, relativos à efectiva dimensão das suas despesas mensais e, bem assim, sobre a circunstância de a Recorrida, sem justificação, ter inscrito os menores à revelia do Recorrente numa escola, para a qual este não concordara.
- Por fim, a decisão recorrida padece de erro de julgamento quanto à matéria de facto.
- A decisão recorrida, desfavorável ao Recorrente, é mais um exemplo, num já longo processo de regulação das responsabilidades parentais, que se arrasta desde Abril de 2023, ao longo do qual, com todo o respeito, o Tribunal a quo não tem assegurado um estatuto de igualdade substancial das partes, uma vez que tem proferido incompreensíveis decisões em desfavor do Recorrente, culminando numa situação tremendamente injusta e penosa para este.
- Apesar de o Recorrente, já por várias vezes, ter pedido uma rápida revisão da situação, o tribunal a quo, tem feito tábua rasa das dificuldades alegadas pelo Recorrente e da injusta situação em que o colocou;
- Nessa Conferência de Pais, foi tomada uma decisão de repartição de despesas na proporção de 60% para o Recorrente e 40% para a Recorrida (nele se incluindo verbas que nem deveriam fazer parte do acordo, como seja o custo com a empregada doméstica…), pese embora, no ponto 28. do requerimento inicial na altura apresentado pela Recorrida, se refira que, à data da decisão que fixou o regime provisório, vigorava na prática, há mais de 8 meses, um acordo entre Recorrente e Recorrida para a repartição de todas as despesas com menores na proporção de 50% para cada um dos progenitores.
- Há meses que o Recorrente vem peticionando junto deste douto Tribunal que, com carácter de urgência seja revisto o regime provisório fixado, que se arrasta há quase ano e meio, uma vez que não tem capacidade financeira para continuar a suportar os avultados custos fixados na Conferência de Pais de 23 de Maio de 2023.
- O Recorrente é um cidadão italo-americano, que mal compreende, domina e se exprime na língua portuguesa, razão pela qual nas diligências onde tem participado tem requerido fazer-se acompanhar por um intérprete tradutor.
- Pese embora na Conferência de Pais realizada no dia 09 de Julho tenha estado presente uma tradutora, ao longo da diligência, a mandatária do Recorrente chegou a ter de alertar o Tribunal a quo que o Recorrente não estava a acompanhar o ritmo da diligência e que este deveria ser abrandado;
- No artigo 55.º da Petição Inicial, o Recorrente apresentou um gráfico, onde, acompanhado de vários documentos que o suportam, justifica as suas despesas mensais, que totalizam um valor aproximado de € 12.785,81.
- Durante a Conferência de Pais, a Recorrida alertou, e bem, que o elenco da Rúbrica «Total das despesas partilhadas referentes aos menores» contemplava 100% das despesas dos menores e não apenas 60% das mesmas.
- Após a Conferência de Pais, o Recorrente, ao analisar novamente o gráfico apresentado, de imediato percebeu que, afinal tinha razão, pois, pese embora o elenco das despesas refletisse 100% das mesmas (e não 60%), o total refletia, apenas e tão só, os 60% que tem vindo a pagar.
- Ao perceber o equívoco criado junto do Tribunal, o Recorrente, no dia seguinte deu entrada de um requerimento (Ref.ª 39913350) a esclarecer que ainda que os valores por si elencados na rúbrica «Total das demais despesas partilhadas referentes aos menores» corresponda a 100% das despesas, o valor total de € 2.233,00 indicado no artigo 55.º da Petição Inicial corresponde à despesa média total que o Requerente, mensalmente, paga pelos seus filhos, explicando que suporta apenas 60% do custo apresentado, o que é exato e equivale a €2.070,00/mensais e que a variação de €2.070,00 para €2.233,00 refere-se à circunstância de duas vezes por ano, Recorrente e Recorrida pagarem o subsídio de férias e de Natal da sua empregada doméstica;
 - Na sentença ora recorrida, o Tribunal a quo, fazendo tábua rasa que se tratava de um mero equívoco necessário esclarecer em prol da descoberta da verdade material dos factos, determinou que o requerimento fosse desentranhado, por extemporâneo.
- A questão das despesas mensais suportadas pelo Recorrente reduz-se a uma questão de mero cálculo aritmético e análise dos documentos juntos aos autos pelo que, mesmo que se desconsiderasse o requerimento de esclarecimento do equívoco posteriormente apresentado pelo Recorrente, ao Tribunal a quo bastaria ter somado as rúbricas para entender que os cálculos apresentados pelo Recorrente estavam certos.
- Contudo, ao invés, optou por tomar apenas por certo o valor indicado no elenco das despesas, não cuidando sequer de apurar a soma total das mesmas, pois bastaria fazê-lo para concluir que não alcançam os 100% referidos pela Recorrida.
- Ao não se pronunciar em momento próprio sobre os factos considerados provados, na ponderação que fez da decisão tomada incorreu o tribunal a quo em omissão de pronúncia, enfermando a sentença ora recorrida de nulidade, nos termos e para os efeitos do art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC.
- Nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. c), do CPC, a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
- A sentença a quo ora recorrida, de forma incompreensível, aceita a tese da Recorrida e fundamenta a sua decisão apenas e tão só no (de facto) elevado salário mensal auferido pelo Recorrente e no (não mais do que um mero) lapso incorrido quanto ao valor que consta do elenco da Rúbrica «Total das despesas partilhadas referentes aos menores», fazendo absoluta tábua rasa das avultadas despesas mensais em que o Recorrente incorre para conseguir suportar o custo de vida e rotinas em duas cidades distintas, uma delas, a Suíça, que tem um dos custos de vida mais elevados da Europa.
- Se a própria Sentença reconhece que, chegando ao final do mês ao Recorrente sobram, apenas, € 471,19 mensais, como pode aceitar que o Recorrente tem um nível de vida elevado e folgada capacidade financeira para pagar uma escola provada aos filhos?
- No âmbito deste processo, foi proferido douto Parecer pelo Ministério Público, nos termos do qual: «(…) Do que conseguiu retirar dos autos verifica-se que o requerente também se sente revoltado com a circunstância das despesas estarem divididas na proporção de 60% - 40% e não ser tomada uma atitude no sentido de alterar, ainda que em termos provisórios, esse aspecto. Promovo, assim, que em 1º lugar seja estabelecido que provisoriamente haja repartição igualitária das despesas (50% - 50%) e apenas o direito à inscrição em duas actividades extracurriculares (se algum dos progenitores fizer questão de inscrever em mais alguma actividade terá que suportar sozinho o respectivo valor). (…)»
- O Recorrente considera incorretamente julgado o ponto da matéria de facto correspondente ao facto provado 9. da decisão recorrida («9. O Requerente declarou ter como despesas mensais o valor aproximado de 12.785,81€, tendo em sede de conferência admitido um erro de cálculo quanto ao montante de despesas de educação que suporta quanto aos filhos e também à repartição do salário da empregada.»);
- Os concretos meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão diversa sobre o ponto da matéria de facto correspondente ao facto provado 9. da decisão recorrida são os Docs. n.ºs 5 a 15, juntos com a Petição Inicial do Recorrente e a tabela junta aos autos pela Recorrida, como Doc. n.º 10 do requerimento ref.ª 39618283, que apresentou em 11 de Junho.
- E a decisão que, no entender do Recorrente, deve ser proferida sobre o ponto da matéria de facto correspondente ao facto provado 9. da decisão recorrida, é a de provado que: «9. O Requerente tem despesas mensais no valor aproximado de 12.785,81€»), o que se requer.
- O Recorrente considera incorretamente julgado o ponto da matéria de facto correspondente ao facto provado 10. da decisão recorrida («10. O Requerente deu o seu consentimento para a alteração de escola de (...) para o Colégio (...).»);
- Os concretos meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão diversa sobre o ponto da matéria de facto correspondente ao facto provado 10. da decisão recorrida, são os documentos 18 e 19 da Petição Inicial.
- A decisão que, no entender da Recorrente, deve ser proferida sobre o ponto da matéria de facto correspondente ao facto provado 10. da decisão recorrida, é a de provado que «10. O Requerente deu o seu consentimento para a alteração de escola de (...) para o Colégio (...), em 2023, ainda antes de ficar desempregado e no pressuposto que, futuramente, a Recorrida aceitaria rever a percentagem de contribuição de cada um dos progenitores em tais despesas», o que se requer.
42. Da prova carreada ao processo, é por demais evidente que o Recorrente, várias vezes transmitiu à Recorrida que não tinha capacidade financeira para suportar 60% dos encargos escolares dos filhos numa escola privada tão cara como os  (...).
- De acordo com o artigo 640.º do CPC, foram assim incorretamente julgados os pontos 9 e 10 da matéria de facto dada como provada, por incompletos, tendo a Sentença aqui recorrida ignorado uma série de factos que deveriam ter sido considerados, nomeadamente a soma total das despesas mensais apresentadas pelo Recorrente, bem como o facto de este ter apenas ter dado o seu acordo a que os menores frequentassem o Colégio (...), no exclusivo pressuposto de que se revisse a percentagem de contribuição de cada progenitor e, quando ao (...), numa altura em que o Recorrente não estava desempregado e ainda vivia em Portugal.
- Na ação que intentou, o Recorrente veio invocar a impossibilidade económica de os filhos se manterem no ensino privado no ano letivo de 2024/2025.
- Da factualidade apresentada nos autos, quer através das declarações do Recorrente, quer de documentação junta, conclui-se que este, com a manutenção dos filhos numa escola privada, não consegue fazer face às suas várias despesas mensais.
- Por outro lado, sente o Recorrente que o Ilustre Tribunal a quo continua a ignorar que a Recorrida põe e dispõe da vida dos filhos em geral, e da vida financeira do Recorrente, em particular, sem procurar qualquer alternativa para compensar o Recorrente das decisões que unilateralmente toma.
- A sentença a quo, aceita a tese da Recorrida e fundamenta a sua decisão apenas e tão só no (de facto) elevado salário mensal auferido pelo Recorrente e no (não mais do que um mero) lapso incorrido quanto ao valor que consta do elenco da Rúbrica «Total das despesas partilhadas referentes aos menores», fazendo tábua rasa das avultadas despesas mensais em que o Recorrente incorre para conseguir suportar o custo de vida e rotinas em duas cidades distintas, uma delas, a Suíça, que tem um dos custos de vida mais elevados da Europa.
- O Tribunal a quo está claramente equivocado quando afirma que «atendendo aos valores mensais auferidos pelo Requerente e despesas apresentadas não pode concluir-se que o mesmo tem um modo de vida frugal.
- O Tribunal a quo parece desvalorizar que, atualmente, o Recorrente vive metade do mês num dos Países com custo de vida mais elevado da Europa e, a expensas exclusivamente suas, por força do acordo quanto ao exercício das responsabilidades parentais em vigor, sustenta suas casas, viagens mensais, etc. - Se a própria Sentença se reconhece que, chegando ao final do mês ao Recorrente sobram € 471,19 mensais, como pode aceitar que o Recorrente tem um nível de vida elevado e folgada capacidade financeira para pagar a escola dos filhos?
- Recorrente e Recorrida concordaram que os filhos frequentariam o ensino privado em 2022, quando regressaram a Portugal e a vida financeira do Recorrente era, como acima referido, bastante distinta, pois este ganhava bastante e vivia em Portugal;
- Nunca foi acordado entre Recorrente e Recorrida que os filhos frequentariam o ensino privado a todo o custo
- Não obstante o Recorrente ter apresentado escolas públicas alternativas e boas, em momento algum a Sentença recorrida faz menção às mesmas, não se coibindo de enaltecer, apenas, as inúmeras vantagens de os menores irem para os  (...).
- Consta do Ponto 8 da matéria de facto provada na decisão recorrida, que a Recorrida aufere mensalmente o salário valor líquido de 7.055,83€.
- A Recorrida tem todo o direito de sufragar e defender a solução do ensino privado. O que não é, porém, legítimo nem razoável é a imposição do ensino privado por parte da Recorrida (que paga uma contribuição inferior) e pelo Tribunal a quo ao recorrente, posto que tal solução implica o pagamento de avultadas mensalidades que o Recorrente não pode pagar.
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b) Alegações da recorrida (síntese):
Respondeu a recorrida-mãe, concluindo pela manutenção da decisão objeto de recurso.
Sustenta esta posição, dizendo:
- As referências feitas pelo recorrente nas conclusões do seu recurso à falta de igualdade substantiva do processo de regulação das responsabilidades parentais, na excessiva dilação do seu curso ou das dificuldades de compreensão do ocorrido em diligências processuais são irrelevantes, porque delas não retira o recorrente qualquer consequência processual;
- O regime provisório de regulação das responsabilidades parentais definido não foi objeto de recurso pelo aqui recorrente, estando vigente (também quanto à repartição de despesas dos filhos em 60%-40%);
- A decisão recorrida, nessa parte, limitou-se a remeter para o teor do decidido, fazendo-o vigorar relativamente às despesas escolares do ano letivo 2024-2025;
- O recorrente, apesar de aludir ao mesmo, não interpôs recurso do despacho de não admissão do documento apresentado com o requerimento de 10/7/2024, que, consequentemente, não faz parte do processo e não é objeto do presente recurso;
- É contraditória a posição do recorrente no sentido de não ter capacidade de suportar despesas com ensino privado dos filhos e estar disposto a suportá-las na proporção de 50%;
- Com as escolas em que estão inscritos no ano letivo 2024-2025 as despesas foram reduzidas face ao ano anterior, implicando, para o requerido, uma poupança mensal equivalente a €129;
- A sentença recorrida não padece dos apontados vícios de omissão de pronúncia ou contradição;
- As despesas mensais de €12.785,81 foram erradamente computadas pelo recorrente, tendo contabilizado a totalidade das despesas com os filhos e não apenas 60% das mesmas;
- O recorrente não cumpriu o seu ónus de impugnação da decisão de facto, no que concerne às suas despesas mensais, ao indicar que tal alteração decorre dos documentos que juntou sob n.ºs 5 a 15, que são constituídos por um conjunto 264 páginas, de teor diverso;
- É um exercício de adivinhação extrair aquilo que, nessas 264 páginas dos documentos 5 a 15, o recorrente pretende invocar como fundamento de alteração da decisão de facto;
- Ainda que se trate de processo de jurisdição voluntária, onde critérios de oportunidade se sobrepõem a critérios de legalidade estrita, o tribunal não se pode substituir à parte neste exercício;
- Invocou também que decorre da tabela que faz documento 10 junta à contestação o fundamento do recurso de facto quanto a este mesmo facto 9.
-  Essa tabela contém dados de pagamentos diversos (umas dezenas de números), sem que o recorrente tenha indicado a quais se refere e quais são os que sustentam o fundamento por si alegado, e em que sentido, deixando ao critério do julgador ir entrever ou adivinhar a quais se pretenderia referir;
- O Tribunal parte da consideração que um cidadão que vive em Portugal meio mês e vive na Suíça o outro meio mês, e que ganha líquidos mais de 13.200 euros, tem duas casas, os filhos no ensino privado, despesas com carro e mota, uma casa em Lisboa cuja mensalidade de empréstimo é de mais de 2 mil euros, paga impostos nos Estados Unidos da América, paga a totalidade das suas despesas de casa na Suíça, tem despesas com deslocações por avião e ainda lhe sobra dinheiro desse ordenado todos os meses é, evidentemente, pessoa com elevado nível financeiro e capacidade para pagar as escolas dos filhos;
- Não se verifica omissão de pronúncia na sentença, ao manter a divisão de despesas em 60%-40%, tendo-a o tribunal fundamentado em diferente nível de rendimento do recorrente;
- O tribunal considerou os impostos que  o recorrente irá pagar nos estrangeiro, com um custo de €9.750.00, uma vez que deu por assentes despesas mensais de 12.734,81, onde se  onde incluem tais encargos;
- O recurso relativo à matéria de facto quanto ao ponto 10 não procede;
- Os elementos probatórios invocados (documentos 18 e 19 da petição inicial) não estabelecem a conclusão que o assentimento à mudança de escola dos dois filhos para o Colégio (...) ocorreu “no pressuposto que, futuramente, a Recorrida aceitaria rever a percentagem de contribuição de cada um dos progenitores em tais despesas”.
- Os documentos em causa segundo o Recorrente são e-mails datados de 17 de Abril de 2024, de 18 de Abril de 2024 e de 29 de Abril de 2024.
- Acontece que o Recorrente havia dado o consentimento para a mudança de escola entre o final do ano de 2023 e o mês de janeiro de 2024 e na altura de envio dos referidos e-mail (abril de 2024) já os filhos, por via desse mesmo consentimento, estavam inscritos no novo Colégio, para cumprimento dos prazos definidos para esse efeito;
- Como resulta do documento n.º 6 da petição inicial, quando a progenitora comunicou a Progenitor em Janeiro de 2024, por mensagem, que os filhos,  (...) e  (...), tinham “entrado nos  (...)” dizendo que “estou aliviada”, a resposta do progenitor, por escrito, a ela dirigido, por sms de 19/1/2024, foi a seguinte: “Estou feliz MAS sinto-me mal pela  (...)»;
- Depois, em nova comunicação da Progenitora ao Progenitor do mesmo dia 19/1/ 2024, dizendo-lhe a Progenitora que “Devias estar agradecido por não termos de pagar 1k na escola dela [da filha  (...)] para nada. Porque é isso o que aconteceria se não tivéssemos notícias [da entrada nos  (...)] a tempo”, o Progenitor respondeu: “Eu devia estar grato porque preciso mesmo do dinheiro”. “Caso contrário, eu lutaria para a manter lá (a filha  (...) na escola  (...));
- Os documentos indicados apenas relevam como manifestação posterior, não como verdadeira condição de aceitação;
- Pelo contrário, decorre do documento n.º 6 da contestação, que a questão da mudança de escola foi discutida muito antes do envio dos e-mails, em causa;
- Quanto à substância da decisão, pugna no sentido de dever ser mantida, auferindo o progenitor muito mais do que ganhava aquando da fixação do regime provisório (afirmou que então tinha um vencimento líquido de € 9.670,00/mês e agora em 2023/2024, aufere líquidos € 13.206,00, e bónus e subsídios, aufere um valor líquido mensal de mais de € 18.500,00/mês);
- Quem aufere rendimento de €18.500,00 mensais não pode opor-se, com fundamento em falta de meios, a que os filhos não continuem a estudar no ensino privado;
- As escolas públicas que o recorrente indica não têm a qualidade que o recorrente aponta;
- A  (...), em Lisboa, é uma escola problemática a todos os níveis, em particular a nível disciplinar, drogas, fraca aprendizagem, absentismo, falta de professores, conflitos e outros fatores, o que se reflete no fraco desempenho escolar dos alunos que ali estudam e em disfunções educativas que ali ocorrem;
- A  (...) acolhe crianças do bairro social …, que é um dos bairros sociais mais perigosos de Lisboa, e regista grande problema de indisciplina e de consumo de drogas entre os alunos, e baixa de taxa de sucesso escolar, não aconselhando uma mudança escolar dos menores como pedido;
- O Colégio (...) de Lisboa ficou no 34º lugar nacional no ranking nacional das Escolas enquanto a  (...) ficou no lugar 994, ou quanto a 2023, o Colégio (...) de Lisboa ficou no 34º lugar no ranking das Escolas enquanto a  (...) ficou no lugar 991º;
- Quanto ao Agrupamento de Escolas  (...), sugerido subsidiariamente, já se não levantam tais questões problemáticas, mas o Recorrente não demonstrou, cabendo fazê-lo, que os menores poderiam ser inscritos nesta escola e aí tinham vaga;
- Não existem vagas para os filhos de recorrente e recorrida nestas escolas públicas.
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c) Alegações do Ministério Público:
Alegou o Ministério Público.
Conclui que, a despeito de ter tomado anterior posição nos autos quanto a uma repartição igualitária das despesas escolares dos filhos, relevando os vencimentos atuais de recorrente e recorrido, a decisão deve ser mantida.
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d) A matéria de facto constante da decisão recorrida:
Foi a seguinte a matéria de facto dada por provada na decisão recorrida:
1. As três crianças acima identificadas são filhas do Requerente e da Requerida.
2. Em sede de Conferências de Pais realizada a 23/5/2023, foi fixado regime provisório de regulação das responsabilidades parentais das crianças, fixando-se um regime de residência alternada entre os progenitores e a assunção das despesas - para o que aqui releva - escolares, alimentação escolar e actividades extracurriculares e material escolar necessário, na proporção de 60% para o pai e 40% para a mãe, face aos rendimentos auferido por aqueles.
3. A criança  (...) frequenta, actualmente e desde 2011, o  (...), a criança  (...) frequenta, actualmente e desde 2019, a  (...) e a criança (...) frequenta, actualmente e desde Setembro de 2023, o Colégio (...) de Lisboa;
4. Em Agosto de 2023, o Requerente auferia um vencimento líquido mensal de 9.670,33€;
5. Em 2023, a Requerida um vencimento mensal líquido de 4.627,71€;
6. Actualmente o Requerente reside, alternadamente, em Basileia, Suíça, e Lisboa, Portugal, declarando pagar mensalmente o valor de 1.704,78€ e 2.289,95€, respectivamente, pelas habitações;
7. Desde o ano passado, o Requerente exerce funções na  (...), desempenhando funções de Director Comercial Global auferindo mensalmente o valor líquido de 13.206,00€;
8. A Requerida exerce funções na  (...), S.A, auferindo mensalmente o valor líquido de 7.055,83€;
9. O Requerente declarou ter como despesas mensais o valor aproximado de 12.785,81€, tendo em sede de conferência admitido um erro de cálculo quanto ao montante de despesas de educação que suporta quanto aos filhos e também à repartição do salário da empregada.
10. O Requerente deu o seu consentimento para a alteração de escola de (...) para o Colégio (...);
11. No ano lectivo de 2024/2025, as crianças frequentarão o 5.º ano, 2.º ano e 1.º ano, respectivamente;
12. As crianças estão inscritas no Colégio (...) para a sua frequência no ano lectivo de 2024/2025.
Não existem factos não provados com relevo para a decisão a proferir.
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e) Questões a decidir:
- Das invocadas nulidades de sentença por omissão de pronúncia, contradição e ininteligibilidade;
- Da requerida reapreciação da decisão de facto quanto aos factos provados n.º 9 e 10, respetiva admissibilidade e, verificada esta, sustentação;
- Da sustentação da decisão proferida com referência aos interesses convocáveis: - o superior das crianças sujeitos destes autos e os legítimos interesses dos pais, de grau inferior. -- 
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar.
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III. Apreciação da matéria do recurso:
III.I. Invocadas nulidades por omissão de pronúncia, contradição e ininteligibilidade da decisão:
Não se pronunciou a Mm. Juíza a quo.
Estando, todavia, reunidos todos os elementos necessários ao conhecimento, cumpre fazê-lo de imediato.
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a) Da invocada omissão de pronúncia por desconsideração de elemento apresentado pelo recorrente aos autos, após realização da conferência de pais (e cujo desentranhamento foi determinado):
A arguição assenta, em síntese, na circunstância de a decisão não ter considerado documento que apresentou (e que teria esclarecido um equívoco ocorrido em conferência de pais, relativo às despesas que o recorrente suportaria).
Não estando tal documento junto aos autos, decisão que é definitiva (porque dela o recorrente da decisão final não recorreu), enferma de petição de princípio invocar que o tribunal deveria ter-se pronunciado por algo que não está no processo (questão que está assente e sobre a qual esta instância de recurso, por não ter sido suscitada, não tem jurisdição).
Abstraindo do documento em causa (que, repete-se, não faz parte dos autos), poderá este vício de omissão de pronúncia ser visto, substancialmente, e no que ao facto em causa diz respeito,  olhado-o sob duas perspetivas:
- Verificando se o tribunal a quo se pronunciou, de facto, sobre as invocadas despesas do recorrente, designadamente aquelas diretamente relativas aos filhos;
- Verificando se o cômputo feito pelo tribunal corresponde à prova produzida.
Começando por esta última, por ser a mais evidente, é claro que não se trataria de uma avaliação de existência uma pronúncia sobre uma dada questão, mas de apreciação de uma discordância com a decisão de facto proferida. Assim sendo, relega-se para tal momento qualquer referência que seja pertinente sobre tal questão, assim perspetivada.
De análise menos linear será perspetivar a questão enquanto relativa à existência de uma efetiva e substantiva pronúncia do tribunal quanto às despesas alegadamente suportadas pelo recorrente-pai.
A formulação da decisão de facto não será, diga-se, a mais feliz quanto aos pontos em causa (as despesas do pai-recorrente), ao não aludir à substância da matéria factual, mas ao meio de prova em que assenta - “o Requerente declarou ter como despesas mensais o valor aproximado de 12.785,81€…”.
É uma fórmula que não corresponde, assinale-se, à usada noutros factos provados relativos a despesas ou rendimentos das partes (que não aos gastos com habitação do recorrente, que segue idêntica formulação, sendo apresentado como facto provado o que este declarou).
Considerando que a decisão recorrida expressamente consignou a inexistência de factos não provados e considerando também que a motivação alude expressamente a terem sido consideradas, como meio de prova valorado, as declarações das partes, a conclusão que se impõe é que a formulação usada pelo tribunal traduz uma simples imprecisão, ou uma redação menos clara, devendo o facto em causa ser interpretado por referência à sua materialidade.
Em termos simples, o que releva é o facto substantivo contido na fórmula imprecisa usada e não o meio de prova indicado, ou seja, deve considerar-se que, para efeitos desta ação, foi dado por provado que o recorrente tem aquelas concretas despesas mensais referidas no facto em causa (n.º 9 dos provados), a saber, despesas médias mensais equivalentes a 12.785,81€ e que tal asserção de facto foi retirada a partir das suas declarações.
Entendimento contrário (que a prova não se refere à substância das despesas, mas apenas à perspetiva da parte), levaria a ter que considerar que tais referências não são verdadeiros factos provados, sendo meras referências a um meio de prova e, portanto, elementos de fundamentação da decisão de facto.
Nesse caso, pelo contrário, por ser um facto essencial, teria que constar do elenco dos factos não provados, o que o tribunal a quo, de forma expressa, também afasta (ao dizer que inexistem).
Ainda que seja necessário este trabalho interpretativo, a conclusão que se extrai do teor da decisão é que a questão factual relativa às despesas do recorrente foi expressamente apreciada, de facto e direito, não enfermando a mesma do apontado vício. –
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b) A invocada nulidade por ambiguidade ou contradição na decisão:
Sustenta-a o recorrente dizendo, em resumo, que a desconsideração da sua versão factual, e a preponderância dada na decisão à versão factual da recorrida-mãe, torna a sentença ambígua, obscura ou ininteligível.
Diga-se que esta arguição, ela própria, impõe algum trabalho de interpretação do raciocínio  apresentado pelo recorrente.
Também a este nível, a invocação pode ser entendida de diferentes formas:
- Ou como manifestação de discordância com a decisão de facto (no que concerne a despesas e à alegada desconsideração dos argumentos do recorrente) e, nessa medida, será a sede da sua impugnação a correta para a colocar,
- Ou como repetição do argumento anterior (de não ter o tribunal considerado um elemento apresentado pelo recorrente), caso em que se trataria arguição do mesmo vício, requalificando-o a outra luz. Nesta perspetiva, deve reafirmar-se o antes referido - o vício não ocorre, uma vez que constam da decisão os fundamentos de facto e direito que suportam a decisão,
- Ou, por último, como manifestação de discordância sobre o sentido da decisão.
Neste caso, o recorrente pretenderia afirmar uma conclusão alternativa ao da decisão recorrida, no sentido de que aquele concreto nível de rendimentos e despesas do recorrente deveria implicar uma decisão diversa.
 Essa é uma avaliação também deslocada nesta sede, referindo-se ao próprio sentido da decisão e não a algum vício da mesma.
Quer isto dizer, em conclusão, que não se retiram da decisão os apontados vícios, improcedendo o recurso, nesta parte. –
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IV. Recurso da decisão de facto:
Passando ao recurso de facto, são dois os factos dados por provados que o recorrente pretende alterar: - os factos provados 9 e 10.
a) O facto provado n.º 9:
Diz o recorrente que considera incorretamente julgado este ponto da matéria de facto.
O facto dado por provado tem o seguinte teor:
O Requerente declarou ter como despesas mensais o valor aproximado de 12.785,81€, tendo em sede de conferência admitido um erro de cálculo quanto ao montante de despesas de educação que suporta quanto aos filhos e também à repartição do salário da empregada.;
Sustenta o recorrente que o facto deveria ter sido dado por provado da seguinte forma (mais direta e simples):
 - O Requerente tem despesas mensais no valor aproximado de 12.785,81€;
Indica como meios probatórios para alterar a decisão de facto, nesta parte, os documentos n.º 5 a 15 da petição inicial e a tabela junta aos autos pela recorrida como documento n.º 10 anexo ao requerimento que apresentou em 11 de Junho.
Pronunciou-se a recorrente dizendo que a indicação do meio de prova não satisfaz as exigências de especificação do meio de prova, que os documentos em causa têm uma estrutura incoerente, alargando-se por um total de duzentas e sessenta e seis páginas, com informação dispersa, que o recorrente não assinalou (não permitindo ao tribunal inferir de que meio de prova, em concreto, se estabelece uma diferente conclusão de facto).
Apreciando.
Prévia à avaliação do obstáculo assinalado pela recorrida, está a questão, supra assinalada, do sentido a dar ao facto provado.
Considerando, como referido, que o que se retira da factualidade provada traduz uma simples imprecisão na formulação, o pedido de alteração apresentado não traduz qualquer modificação substantiva do sentido, mas uma simples alteração de redação.
Contendo o facto a substância pretendida sintetizar, não deve admitir-se a requerida alteração, por ser irrelevante ou inócua.
A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa (art.º 662.º n.º 1 do CPC).
A literalidade do preceito refere-se a decisão diversa (de facto), mas a teleologia do preceito implica, necessariamente, que a diversa decisão (de facto), seja suscetível de se repercutir numa diversa decisão da matéria do próprio recurso (neste sentido, designadamente, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9/2/2021, Maria João Vaz Tomé e acórdão desta Relação de 27/10/2022, CARLOS CASTELO BRANCO, ambos em dgsi.pt.).
Tal não sucede, manifestamente, num caso, como o presente, em que a alteração pretendida traduz uma simples clarificação da formulação do facto, sem alterar o sentido a dar ao mesmo.
Neste ponto, por consequência, não se admite a revisão da decisão de facto. –
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b) O recurso de facto quanto ao ponto 10 dos factos provados.
Diz o recorrente que considera incorretamente julgado o ponto 10 da matéria de facto.
Este facto tem o seguinte teor:
O Requerente deu o seu consentimento para a alteração de escola de (...) para o Colégio (...);
Propõe para este ponto a seguinte redação:
- O Requerente deu o seu consentimento para a alteração de escola de (...) para o Colégio (...), em 2023, ainda antes de ficar desempregado e no pressuposto que, futuramente, a Recorrida aceitaria rever a percentagem de contribuição de cada um dos progenitores em tais despesas»
Suscita como meios probatórios que imporiam decisão diversa os documentos 18 e 19 da petição inicial, traduzindo comunicações de correio eletrónico por si enviadas e contendo expressa reserva à necessidade de as despesas com educação dos filhos serem equitativamente repartidas.
Respondeu a recorrida, neste ponto, dizendo que o assentimento foi dado em momento muito anterior àquele em que foram enviadas as comunicações aludidas como fundamento do pedido de modificação, tendo a questão ficado decidida na altura no período de programação de inscrições para o ano letivo seguinte, entre novembro de 2023 e janeiro de 2024, e não, portanto, em abril deste ano (data das comunicações do recorrente com alusão às reservas pretendidas consignar).
Para contrapor, indicou a recorrida também documento contendo transcrição de diversas comunicações entre as partes, no aludido período de decisão (final de 2023/início de 2024), de onde se retiraria o sentido de autorização dado por provado.
Apreciando.
Também neste ponto, a questão prévia a colocar é da admissibilidade da impugnação de facto por referência à sua suscetibilidade de alterar a decisão recorrida.
Ao contrário do anterior, a alteração pretendida introduzir tem, no caso, algum conteúdo material, traduzido na consignação de uma reserva (ou condição) à aceitação da mudança de estabelecimento de ensino do filho (...), ainda que posterior à mesma.
Será, porém, que se pode considerar que tal alteração tem alguma relevância para a decisão?
Antes de avançar, deve referir-se que esta não é a sede de avaliação da justiça substantiva da decisão de compartição nas despesas de educação dos filhos, designadamente quanto à sua repartição proporcionalmente inigualitária, questão que, é claro dos autos e do recurso, é o ponto central de discordância do recorrente.
Em termos simples, como será evidente, o recurso da decisão de facto não é a sede para apreciar se o decidido foi a solução mais correta para a tutela do superior interesse dos filhos ou para a justa composição dos interesses (também legítimos, mesmo que de grau inferior) dos pais.
Essa questão será analisada à frente, no momento próprio.
Neste momento, a questão relevante é apenas a de saber se a introdução de uma reserva do pai à aceitação da inscrição do filho no estabelecimento de ensino é suscetível de causar alguma alteração na decisão.
Se não o for, nos termos supra referidos, mutatis mutandis, a reapreciação não deve sequer ser admitida.
Vejamos.
O recorrente aceita o facto essencial em causa, dado por provado – que assentiu na inscrição do filho no Colégio (...), em final de 2023.
Os seus fundamentos de discordância com a decisão recorrida referem-se apenas à ponderação feita na decisão quanto ao equilíbrio financeiro de ambos os progenitores, traduzido na razão dos respetivos rendimentos e despesas.
É do facto, que invoca, de não ter capacidade financeira para suportar inscrição dos filhos em estabelecimentos de ensino privados, que o recorrente retira, numa primeira hipótese, a pretensão de os inscrever em estabelecimentos públicos e, numa segunda, a pretensão de repartir igualitariamente os encargos respetivos.
Traçando uma bissetriz entre estes dois vetores, considerando que estes autos têm por objeto uma questão de particular importância muito determinada – se os filhos de recorrente e recorrida deverão manter-se no estabelecimento particular que frequentam no ano letivo de 2024-2025 e, mantendo-se nessa situação, se as inerentes despesas devem ser suportadas igual ou assimetricamente entre os progenitores, a conclusão a retirar é que a eventual reserva posterior ao  consentimento manifestado pelo requerido é um facto sem interesse efetivo na decisão.
O consentimento, em todo o caso, foi dado.
O essencial da decisão, a partir daí, é saber se os pais (particularmente o requerido) têm ou não capacidade económica de suportar os encargos do ensino particular dos filhos e, tendo-o, saber se a medida dessa capacidade é equivalente ou desproporcional entre ambos.
A alteração pretendida apresenta-se inócua para a decisão, uma vez que, num ou noutro momento, com maiores ou menores reservas, a questão de particular importância foi, illo tempore, consensualmente definida (no sentido de o filho frequentar aquele estabelecimento particular de ensino).
Diga-se, a latere, que não é sequer objeto dos autos e do recurso saber se essa decisão, em termos de projeto educativo dos filhos, foi a melhor (ainda que a recorrida tenha, a dada altura na sua pronúncia, divergido para considerações desabonadoras de estabelecimentos públicos de ensino).
O que o recorrente argumenta, e a recorrida contra-argumenta, é apenas que não tem capacidade para suportar os pagamentos com os colégios particulares ou, no mínimo, não tem uma capacidade para o fazer a um nível superior ao da mãe.
Estabelecido que o consentimento para a inscrição foi dado, com ou sem reserva, para que filho (...)  siga uma determinada linha educativa, é inócuo acrescentar outros elementos neste contexto decisório.
Assim, fazendo uma simples referência tópica aos critérios de decisão substantiva, por antecipação e apenas para melhor enquadrar o relevo desta questão de facto, torna-se ainda mais evidente que a alteração pretendida introduzir é indiferente à decisão.
Assim, a justiça do caso convoca resposta às seguintes questões:
a) Pode ou não a decisão dos pais relativa à educação dos filhos em instituições de ensino particulares (e pagas) ser alterada, para frequência em instituições públicas e (tendencialmente) gratuitas, e em que circunstâncias de vida daqueles?
b) Como podem ambos os progenitores tomar decisões a tal respeito, sem imposição unilateral de encargos que possam afetar patrimonialmente o outro?
c) Estando a questão a ser apreciada nesta sede recursória relativamente ao ano letivo de 2024/2025 e estando este já em curso, tem alguma atualidade a pretensão do recorrente de fazer inscrever os filhos em instituições de ensino público neste momento?
d) Subsistindo apenas em discussão na regulação das responsabilidades parentais a repartição de despesas dos filhos e sendo as relativas à educação a sua parte de leão, dever-se-á, em sede recursória de questão de particular importância, fazer alterações substantivas de regime, sabendo-se que tal questão tem a sua discussão contraditória programada nos autos de regulação?
Resulta desta apresentação que a alteração pretendida, ou até o aditamento de um novo facto autónomo (no sentido de fazer constar que, por comunicações de abril de 2024, o recorrente declarou que o seu consentimento dependia de uma repartição igualitária de despesas), serão alterações que não representam qualquer utilidade para a decisão em causa.
Por isso, também neste ponto, deve a impugnação ser rejeitada. –
Quer isto dizer, em conclusão, que não se admite, in totum, a impugnação de facto. –
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IV. Recurso relativo ao sentido da decisão tutelar:
Ultrapassadas as questões de facto e, portanto, dando por assente a matéria de decisão estabelecida em 1.ª instância, impõe-se conhecer da correção material da decisão.
Tal análise convoca resposta às questões acima enunciadas, nos termos que se seguem.
a) A relação entre a ação tutelar cível de decisão de questão de particular importância e a ação de regulação das responsabilidades parentais (apenso A):
A primeira questão a assinalar quanto à avaliação do fundo da decisão é que esta foi proferida no contexto de uma ação tutelar muito específica – o processo de resolução de questões de particular importância, previsto pelo art.º 44.º da Lei n.º 141/2015 – Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC).
 Ainda que este processo seja de jurisdição voluntária (art.º 12.º do RGPTC) e, portanto, o tribunal não esteja vinculado a razões de estrita legalidade, podendo seguir critérios de oportunidade, sempre alteráveis no futuro (cf. art.º 987.º e 988.º n.º1 do Código de Processo Civil – CPC), a verdade é que o objeto muito concreto e específico destes autos, especialmente relevante porque corre em paralelo ação de regulação das responsabilidades parentais (que já está definitivamente decidida, exceto, precisamente na questão objeto deste litígio), impõe uma necessária consideração de ambos.
Quer isto dizer que se impunha nos autos, e impôs, uma avaliação que proscreva qualquer risco de contradição, ou até de mera sobreposição, entre o que é decidido nesta ação tutelar e o que foi sendo decidido no processo de regulação.
Essa preocupação, que emerge de preocupações de boa gestão processual, mas, principalmente, de razões de boa tutela do superior interesse das crianças em causa, continua a impor-se em fase de recurso, principalmente considerando que o processo de regulação se encontra em fase de início de julgamento.
Este tribunal deve, assim, considerar-se limitado, não apenas pelo estrito âmbito objetivo recurso, como delimitado pelo recorrente, mas também por essa preocupação de não causar qualquer entropia ou dificuldade à decisão final das responsabilidades parentais.
Traduzindo esta reflexão e harmonizando-a com o princípio de estabilidade de vida das crianças, que é um vetor essencial na defesa do seu superior, toma forma a conclusão de, só ante razões excecionalmente ponderosas, se justificaria, neste momento e nesta sede, alterar a decisão proferida.
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b) A oportunidade da decisão quanto à inscrição dos filhos de recorrente e recorrida em instituições de ensino públicas:
É claro, sem necessidades de grandes considerações sobre a questão, que a possibilidade de as crianças sujeito destes autos serem inscritas e frequentarem estabelecimentos públicos de ensino no ano letivo 2024-2025 está prejudicada, tendo-se este período há muito iniciado, o que, convocando simples critérios de oportunidade, faz improceder o recurso nesta parte.
Mesmo que o recorrente tivesse pretendido fazer tal definição para os anos letivos posteriores (o que não fez, nessa parte limitando o tribunal de recurso a pronunciar-se sobre a questão), sempre teriam que sobrelevar juízos de oportunidade relativos à precedência dos autos de regulação.
Em termos simples, não se justificaria, em todo o caso e à luz de critérios de conveniência e oportunidade, estar a antecipar decisões relativas aos anos letivos subsequentes, antes de a questão da repartição de despesas estar definitivamente resolvida entre os progenitores em sede de regulação de responsabilidades.
Quer isto dizer, em conclusão quanto a este ponto, que improcede o recurso no que concerne ao pedido de decisão de inscrição dos filhos de recorrente e recorrido em estabelecimentos de ensino público, no ano letivo em curso. –
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c) A repartição das despesas de educação dos filhos:
Esta é a questão substantiva que constitui a divisão essencial entre as partes.
A decisão recorrida manteve uma distribuição assimétrica de despesas entre os progenitores, na proporção de 60% para o pai-recorrente e 40% para a recorrida-mãe, definição provisoriamente estabelecida em sede de regulação das responsabilidades parentais.
Existem razões consistentes, apresentadas por ambos os progenitores, para sustentar a perspetiva das respetivas posições.
Da parte do recorrente, a prova de uma alteração relevante da sua vida pessoal e profissional, com fixação de residência em dois países europeus diferentes, com viagens semanais, com necessidade de constituição de duas residências, implicando um nível de despesas elevado e dado por provado.
Ainda que se deva enfatizar que os seus rendimentos são claramente superiores à média (nacional e europeia), a verdade é que a situação financeira pessoal se estabelece com base numa relação entre o dever e o haver e, do apurado, o nível de despesas do recorrente é também muito superior às referidas médias.
Alude-se na decisão recorrida a uma ausência de frugalidade nos gastos de vida do recorrente, mas a verdade é que, na matéria de facto dada por assente, tal juízo não encontra mais suporte que a referência genérica aos aludidos níveis de rendimento e despesas marcadamente superiores à média.
São referidas nos autos despesas com automóveis e motociclos. Alude-se a um custo com viagens aéreas desproporcional (face ao recurso a viagens económicas), mas nada disso foi refletido na decisão de facto e, nessa medida, não pode ser considerado.
O que subsiste, assim, são rendimentos periódicos fixos superiores a €13.000 mensais e despesas periódicas fixas mensais que ultrapassam os €12.500 mensais (computando as suportadas com os filhos e em discussão nestes autos).
Ainda da parte do recorrente, ressalta, por outro lado, uma avaliação pessoal de injustiça, decorrente da desigualdade na comparticipação nas despesas, ligada à assunção de uma certa iniquidade que resulta do que é percecionado como uma posição de sujeição face às escolhas de estabelecimento de ensino promovidas pela mãe, ainda que, nesta parte, a verificar-se tal situação, resultará apenas da dinâmica do relacionamento interpessoal e não do regime de regulação estabelecido (que impõe, clara e inequivocamente, uma decisão conjunta destas questões).
Da parte da recorrida, a afirmação da justiça na desproporção no pagamento de despesas encontra suporte na correspondente desigualdade entre rendimentos do trabalho, sendo que o auferido por esta está também substancialmente acima dos padrões medianos, mas corresponde apenas a cerca de 55% dos valores auferidos pelo recorrente.
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Ponderando estes elementos e a avaliação subjetiva das partes à luz do superior interesse das crianças, cruzando estas considerações com as questões acima apresentadas a propósito da oportunidade e equilíbrio da decisão, entende-se que, nesta sede, sobreleva a necessidade de conferir estabilidade e continuidade ao que vem vigorando, relegando para a sede de regulação das responsabilidades parentais a definição definitiva das despesas de educação dos filhos das partes nos autos.
É a decisão que se impõe com vista ao equilíbrio da situação das crianças, no contexto de uma decisão que terá a possibilidade de fazer uma análise completa de rendimentos e despesas dos progenitores, algo só muito parcial e perfunctoriamente foi feito neste apenso.
Diga-se que esta conclusão teria que soçobrar, mesmo a título excecional, se fosse encontrada uma gritante injustiça no equilíbrio da decisão proferida quanto à repartição de encargos relativos aos filhos, algo que não sucede, ante a factualidade apurada.
Isto não significa que uma decisão justa não pudesse ser encontrada também numa atribuição igualitária de encargos (contrapondo à desigualdade de rendimentos em favor do recorrente a desigualdade na estabilidade de residência, em favor da recorrida). Significa apenas que, no contexto de oportunidade desta decisão, não é manifesta qualquer desproporcionalidade que justifique uma alteração.
Não se encontra, assim, fundamento suficiente para, nestes autos e neste momento, alterar a decisão proferida.
É o que se decide, improcedendo a apelação. --
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V. Dispositivo:
Face ao exposto, acorda-se em negar provimento à apelação, mantendo-se a decisão recorrida.
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Custas pelo recorrente.
Notifique-se, de forma expedita, e registe-se. –
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Lisboa, 24-10-2024,
João Paulo  Vasconcelos Raposo
Pedro Martin Martins
Ana Cristina Clemente