PLATAFORMA DIGITAL
“ESTAFETA”
PRESUNÇÃO DE LABORALIDADE - ART.º 12-A DO CT
CONTRATO DE TRABALHO
Sumário


I – Verificando-se as caraterísticas previstas nas alíneas a), b) e e) (esta identificada na decisão recorrida) do n.º 1 do art.º 12-A do CT, está assim preenchida a presunção de existência do contrato de trabalho, sem prejuízo de poder vir a ser ilidida.
II - O estafeta presta a sua atividade de entrega e recolha de mercadorias, para uma organização produtiva que não é sua, mas sim da empresa que gere a plataforma, já que a partir do momento em que se liga à plataforma ele passa a integrar um serviço por ela organizado que não se limita a encomendar a recolha e a entrega da mercadoria, mas estabelece a forma como o deve fazer, controlando diversos aspetos através da aplicação, decidindo quanto ao preço, a forma de pagamento e a taxa de entrega, nada recebendo o estafeta, em regra, do cliente, ficando o processo de faturação a cargo da plataforma.
III - O estafeta está sujeito a diversas formas de controlo e de avaliação algorítmica por parte da plataforma, o que não pode deixar de ser considerado uma manifestação do poder de direção e disciplinar que a empresa que gere a plataforma exerce para com o AA, o que evidência, sem margem para dúvida, a dependência própria da relação laboral, que a Ré não logrou ilidir.

Texto Integral


Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães

I – Relatório:
           
Na sequência de acção inspectiva levado a cabo pela Autoridade para as Condições do Trabalho, no âmbito da qual se deparou com indícios de utilização indevida do contrato de prestação de serviço por parte da EMP01..., UNIPESSOAL, LDA, relativamente a AA deu entrada no Tribunal da Comarca de ..., Juízo do Trabalho de ..., a respetiva participação.
Após o recebimento de tal participação, o MINISTÉRIO PÚBLICO intentou a presente ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, nos termos previstos no art.º 186.º-K, n.º 1 e 186.º-L, n.º 1 do CPT, contra EMP01..., UNIPESSOAL, LDA pedindo que se reconheça a existência de contrato individual de trabalho por tempo indeterminado, com início em 1.06.2021, relativo a AA.
Citada a Ré apresentou contestação defendendo-se por exceção e por impugnação, sustentando, em suma, que o AA desenvolve a sua atividade de estafeta de forma autónoma e nega a existência de factos que possam qualificar o contrato que mantém com o AA como de trabalho. Mais defende que, apesar de explorar uma plataforma de intermediação tecnológica, a relação que mantém com AA ainda que se possa verificar algum indicio da presunção de laboralidade, consagrada no art.º 12-A do CT, tal presunção está ilidida, pois aquele pode ligar-se ou desligar-se livremente à plataforma, pode rejeitar serviço, pode prestar serviço para concorrentes e até pode fazer-se substituir por outra pessoa contratada para o efeito.
O AA foi notificado de que poderia aderir ao articulado apresentado pelo Ministério Público, apresentar articulado próprio e constituir advogado, mas nada veio dizer.

Procedeu-se à realização de audiência de julgamento e por fim foi proferida sentença da qual consta o seguinte dispositivo:

“Em face do exposto, na presente acção especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, decide-se:
a) Julgar improcedente o pedido formulado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO de reconhecimento da existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado que teria sido celebrado entre a EMP01..., UNIPESSOAL, LDA., e AA, absolvendo-se a ré, em conformidade, de tal pretensão;
Registe, notifique e oportunamente dê cumprimento ao disposto no artigo 186.º-O, n.º 9, do C.P.T.”

*
Inconformado com a sentença, o Ministério Público veio interpor recurso de apelação, pugnando pela sua revogação, tendo nas alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões:

“1.O Ministério Público não concorda, quanto ao decidido na sentença de julgar improcedente a acção.
2.Desse modo, importa verificar se resulta dos factos provados a verificação de algumas das características referidas nas alíneas do n.º 1, do referido artigo 12.ºA do Código do Trabalho.
3.Nos termos do art.º 12.º-A, n.º 1, al. a), do C.T., cumpre averiguar se “A plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela”.
4. Conforme resulta dos factos provados, é a plataforma EMP01... que, unilateralmente, fixa a retribuição e, além disso, estabelece também um limite mínimo e um limite máximo para o prestador de atividade/estafeta por cada serviço prestado. O estafeta pode, é verdade, recusar o serviço, mas isso não traduz qualquer possibilidade de negociação da sua parte - contrariamente ao que se lê na sentença, rejeitar o serviço não é, em parte alguma, sinónimo de negociar o preço do mesmo. Se os estafetas aderiram à plataforma para exerceram as funções respetivas, naturalmente não o fizeram para rejeitarem os pedidos por ela submetidos – só o fazem se, v.g., o local de recolha ou o local de entrega se situarem bastante longe do local onde se encontrem.
5. Os “estafetas” podem alterar o chamado multiplicador – por forma a modificarem o limite mínimo do valor de cada serviço. Mas se o fizerem, conforme constitui regra de mercado, poucos ou nenhuns pedidos receberão. E mesmo nesse caso, o “limite mínimo” de cada serviço não deixa de ser fixado unilateralmente pela plataforma – os estafetas apenas lograrão “subir” esse limite mínimo, sem que consigam proceder, inversamente, à redução desse montante (“mínimo”) já previamente determinado pela plataforma.
6. Por isso é a plataforma que fixa o valor da retribuição, uma vez que esta se encontra, na sua totalidade, dependente do seu critério unilateral.
7.Pelo exposto, deve considerar-se preenchida a característica de contrato de trabalho prevista no art. 12.º-A, n.º 1, al. a), do Código do Trabalho.
8.Nos termos do art. 12.º-A, n.º 1, al. b): “A plataforma digital exerce o poder de direção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade”.
9. A nosso ver, a Ré EMP01..., além de estipular as regras (rectius, todas as regras) para acesso/inscrição na plataforma por parte dos “estafetas” – fase que não se pode excluir de todo o processo de prestação da atividade, igualmente dirige, estipula, concretiza e define a forma como toda a atividade deve ser por eles prestada.
10.Citando a sentença proferida no âmbito do processo n.º 1980/23...., do Juízo do Trabalho de ..., em ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho movida contra a plataforma digital “EMP02...”, a qual tem aqui igual aplicação, “O procedimento de entrega da EMP02... encontra-se perfeitamente padronizado e decorrerá da mesma forma, independentemente do local onde é prestado e da pessoa concreta do estafeta, que se limitará a seguir todo um esquema previamente definido pela ré, que assim, segundo se entende, determina as regras especificas quanto à prestação da atividade por parte do estafeta mostrando-se nessa medida também verificado o indicio previsto no artigo 12º-A, nº 2, al. b) do Código do Trabalho.”
11. Já quanto à alínea e) do art. 12.º-A, n.º 1, do Código de Trabalho, é a própria sentença do Tribunal “a quo” que reconhece estar preenchida esta característica de contrato de trabalho.
12. Por fim, diz-se na alínea f) do art. 12.º-A, n.º 1, do Código de Trabalho, que “Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem à plataforma digital ou são por esta explorados através de contrato de locação”.
13.Salvo melhor opinião o principal “instrumento de trabalho” (a aplicação informática EMP01...) é da exclusiva propriedade da Ré, conforme resulta dos factos provados, sendo que, sem ela, seria impossível a prestação da atividade em análise.
14.Socorrendo de novo da fundamentação expressa na mencionada sentença do Juízo do Trabalho de ..., “se os estafetas em questão pretendessem ser verdadeiramente autónomos e não utilizassem a marca de que a ré é titular, estariam condenados ao fracasso, já que o êxito deste tipo de plataformas deve-se à publicidade que elas fazem nas redes sociais e nos motores de busca, sendo estes os sites que os clientes procuram quando querem o tipo de produtos que a plataforma anuncia. Assim para o desenvolvimento da atividade, os meios que o trabalhador usa e de que é proprietário, o veículo ou o telemóvel, têm um valor escasso quando comparado com a plataforma ou com o valor da marca no mercado, que são da titularidade de ré.”
 15. Aqui chegados, não podemos deixar de aludir à conclusão expressa por João Leal Amado(ob. cit. pág. 89) de que “ao olhar para um qualquer estafeta, daqueles que percorrem velozmente as ruas nas suas motos (ou, mais lentamente, pedalando nas suas bicicletas), creio que nenhum de nós se convence, seriamente, de que ali vai um empresário - seja um microempresário, um moto empresário ou um ciclo empresário…Não(…) Ali vai, motorizado ou pedalando, um trabalhador dependente, um trabalhador do século XXI, diferente, decerto, dos seus pais, avós ou bisavós, mas, afinal, ainda um trabalhador dependente um subordinado de novo tipo, com contornos distintos dos tradicionais, mas, em última instância, ainda dependente e subordinado na forma como desenvolve a sua atividade”.
16.Nestes termos, concluindo-se pela verificação das presunções enunciadas nas alíneas a), b), e) e f) do ar.º. 12.º-Ado Código do Trabalho, deverá a douta sentença ser revogada e substituída por outra que condene a Ré no reconhecimento dos contratos de trabalho relativamente ao trabalhador AA, desde ../../2023, data da sua inscrição na plataforma EMP01....
Assim farão V. Exas. a costumada JUSTIÇA.”
A EMP01..., LDA veio responder ao recurso concluindo pela sua total improcedência com a consequente manutenção da decisão recorrida.
Com as contra-alegações foram também juntos pela recorrida 9 documentos, sendo que oito desses documentos correspondem a sentenças proferidas em distintos juízos do Trabalho de Norte ao Sul do país, proferidas entre Abril e Julho de 2024, em que foi Ré a ora aqui recorrida, estando a apreciação de questão jurídica equiparada a que aqui se discute, ou seja estava em causa a qualificação do contrato como de trabalho. Em todas as decisões juntas pela recorrida foram proferidas decisões favoráveis à recorrida.
O documento 9.º junto pela recorrida respeita ao pedido dirigido pela Senhora Provedora de Justiça ao Tribunal Constitucional a requerer a inconstitucionalidade das normas constantes do n.º 3 do art.º 10.º do Código do Trabalho, na redação que foi introduzida pela Lei n.º 13/2023, de 3 de Abril, e dos n.ºs 1 e 2 do artigo 383.º -A do mesmo Código aditado pela Lei n.º 13/2023, de 3 de Abril.
O recurso foi admitido com o modo de subida e efeitos próprios.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II – Do Objeto do Recurso

Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões do Recorrente (artigos 635º, nº 4, 637º n.º 2 e 639º, nºs 1 e 3, todos do Código de Processo Civil), não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, temos que a principal questão a decidir respeita à qualificação do contrato, designadamente apurar se a relação jurídica estabelecida com a EMP01... e o trabalhador AA é de qualificar como contrato de trabalho.
Antes, porém, urge apreciar a questão prévia referente a admissibilidade da junção dos documentos com as contra-alegações de recurso.
Conforme resulta do prescrito no n.º 1 do art.º 63.º do CPT. com os articulados, devem as partes juntar os documentos, apresentar o rol de testemunhas e requer quaisquer outras provas.
Contudo, resulta da aplicação subsidiário do Código do processo civil, designadamente do seu art.º 651.º n.º 1 que as partes podem juntar documentos às alegações em situações excecionais a que se refere o artigo 425.º do CPC, ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância.
Assim, estabelece o art.º 425.º do CPC que “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.”
Como refere, António Abrantes Geraldes, “em sede de recurso, é legítimo às partes juntar documentos com as alegações quando a sua apresentação não tenha sido possível até esse momento (superveniência objetiva e subjetiva).
Podem ainda ser apresentados documentos quando a sua junção apenas se tenha revelado necessária por virtude do julgamento proferido, máxime quando este seja de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos já constantes do processo.”[1]
Da conjugação dos citados preceitos resulta que a junção de documentos na fase de recurso, sendo admitida a título excecional, depende da alegação e da prova pelo interessado em tal junção de uma das seguintes situações:
- a impossibilidade de apresentação do documento anteriormente ao recurso;
- ter o julgamento de primeira instância introduzido na ação um elemento de novidade que torne necessária a consideração de prova documental adicional.
No caso, a Recorrida juntou com as contra-alegações, diversas decisões da 1.ª instância sem justificar o motivo pelo qual sentiu só agora necessidade de o fazer, limitando-se a citar quer na sua contra-alegação, quer nas suas conclusões algumas passagens que entendeu terem pertinência, de algumas dessas decisões e quanto ao requerimento apresentado junto do Tribunal Constitucional pela provedora de justiça, não deu qualquer justificação para a razão pela qual junta tal documento apenas nesta fase processual.
Como é consabido, os documentos são, por definição, meios de prova de factos que se destinam a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa (cfr. artigo 423.º, n.º 1, do CPC).
Ora, as referidas decisões da 1.ª instância não podem ser consideradas de documentos, pois não tem como finalidade a de provar um qualquer facto, mas sim destinam-se a convencer da bondade da posição jurídica defendida na sentença proferida pelo tribunal a quo.
Contudo, cabe ainda referir no que diz respeito aos pareceres de jurisconsultos, o n.º 2 do mesmo art.º 651.º do CPC prevê que as partem podem juntá-los até ao início do prazo para a elaboração do projeto de acórdão.
Porém, as decisões judiciais não devem ser consideradas como pareceres[2], apesar de por vezes nos depararmos com a junção de cópias de acórdãos e decisões judiciais, em alternativa à sua incorporação no corpo da alegação, o que constitui uma prática aceitável (a sua junção com as alegações ou contra-alegações de recurso), pois permite que a peça processual seja mais escorreita. Podemos considerar que se trata de uma questão de estilo funcionando a junção de tais decisões judiciais como um anexo ou complemento da alegação ou da contra-alegação do recurso.
Assim sendo, é de admitir a junção aos autos das decisões judiciais apresentadas com contra-alegação de recurso.
Relativamente ao documento n.º 9, datado de 23.10.2023, para além de poder ter sido apresentado em 1.ª instância, nada foi alegado quanto à sua superveniência subjetiva e o mesmo também não se revela de necessário para o julgamento do recurso, já que a recorrida não ficou vencida em 1.ª instância, nem da leitura do documento se percebe a concreta relevância que pode ter nos presentes autos, sendo certo que a recorrida nada refere.
Destarte, deverá ser desentranhado dos autos, por legalmente inadmissível, o documento n.º 9 apresentado com a contra-alegação de recurso e a Apelada condenada em multa, afigurando-se ajustado o valor de 0,5UC (artigos 443.º, n.º 1, CPC e 27.º, n.º 1, do RCP).

III – Fundamentação de Facto

FACTOS PROVADOS:

1. A ré possui como objecto social:
“Desenvolvimento e exploração de uma plataforma tecnológica, comércio a retalho por via electrónica, comércio não especializado de produtos alimentares e não alimentares, bebidas e tabaco e, de um modo geral, de todos os produtos de grande consumo, comercialização de medicamentos não sujeitos a receita médica, produtos de dermocosmética e de alimentos para animais, a importação de quaisquer produtos, o comércio de refeições prontas a levar para casa e a distribuição ao domicílio de produtos alimentares e não alimentares. Exploração, comercialização, prestação e desenvolvimento de todos os tipos de serviços complementares das actividades constantes do seu objecto social. Realização de actividades de formação, consultoria, assistência técnica, especialização e de pesquisa de mercado relacionadas com o objecto social. Qualquer outra actividade que esteja directa ou indirectamente relacionada com as actividades acima Identificadas”
2. Para efeitos tributários, no ano de 2023, AA declarou ter auferido rendimentos da categoria B (Rendimentos Empresariais e Profissionais), no montante global de €759,15, no âmbito de serviços prestados à ré, tendo ainda declarado, nos anos de 2021, 2022 e 2023, ter auferido rendimentos da categoria B, nos montantes globais de € 585,00, € 1.020,00 e € 960,00, no âmbito de serviços prestados à Junta de Freguesia ..., EMP03..., Unipessoal, Lda. e à EMP03..., Unipessoal, Lda., respectivamente.
3. Para efeitos de Segurança Social, AA encontra-se enquadrado no regime de trabalhadores independentes desde ../../2021.
4. No dia 20/09/2023, pelas 11h56m, decorreu acção inspectiva da A.C.T., no decurso da qual AA foi identificado, quando se encontrava a exercer funções de estafeta, junto do ponto de recolha de pedido na Praça ... Shopping ..., Alameda ..., ... ....
5.(…)  tendo nessa ocasião AA recebido uma oferta de entrega, recolhido uma encomenda e a colocado numa mochila térmica, após o que se retirou daquele local.
6. AA encontra-se registado na plataforma App “EMP01...”  desde ../../2023.
7. Com a adesão à App AA declarou consentir os termos apostos no documento denominado “Termos e Condições de Utilização da Plataforma EMP01... para Estafetas”.
8. No documento com a epígrafe “Termos e Condições de Utilização da Plataforma EMP01... para Estafetas”, com a redacção que lhe foi dada em 04/05/2023, constava:
Condições Gerais:
“(…) Os presentes Termos e Condições de Utilização da Plataforma EMP01... aplicam-se à prestação de todos os serviços tecnológicos oferecidos pela EMP01... Unipessoal Lda. (…) a «Plataforma EMP01...», ou «Nós» consoante o contexto), ao país no qual o Prestador de Serviços (o «Estafeta», o «Utilizador» ou «Você», consoante o contexto) tem de se registar na nossa Plataforma. A principal actividade da EMP01... é o desenvolvimento e a gestão de uma plataforma tecnológica através da qual certos estabelecimentos comerciais locais (adiante designados por «Estabelecimentos Comerciais») de algumas cidades oferecem os seus produtos através de uma aplicação móvel ou da Web (adiante designados por «serviços EMP01...», «Serviços» ou «App»); e, acessoriamente, quando apropriado e se solicitado pelo utilizador cliente final (adiante designado por «Utilizador Cliente») dos referidos estabelecimentos comerciais através da aplicação, podem actuar como intermediários na entrega imediata dos produtos. Os seus objectivos incluem a intermediação nos processos de recolha e/ou pagamento e a aceitação e execução de pedidos para fazer recolhas e receber entregas em nome do cliente Utilizador e dos Estabelecimentos Comerciais. (…)“
2.2. A sua aceitação:
“(…) Ao aceder aos Serviços EMP01... e registar-se pela primeira vez na Plataforma, inserindo os seus dados de identificação de conta (adiante designado por «Dados de Identificação de Conta»), está a aceitar os presentes Termos e Condições, bem como todos os anexos que incluem (…) Tem de aceder à sua conta pessoa (a «Conta») iniciando sessão com o nome de utilizador que escolheu e o código de segurança pessoal (o «Código de Segurança»). Aceita manter a confidencialidade do seu Código de Segurança e alterá-lo frequentemente. Cada Conta é pessoal e única, pelo que está proibido de registar ou ter mais do que uma Conta. Além disso, a Conta é intransmissível, salvo nos países em que legislação local o permita (…) Em caso de utilização ilegítima ou fraude, a EMP01... pode cancelar, suspender ou desactivar duas ou mais Contas com os mesmo dados ou dados relacionados que possa detectar, mediante intervenção humana sempre por parte de um agente da EMP01... e permitindo, em todo o caso, que o Estafeta apresente uma queixa e/ou reclame contra essa decisão em caso de discrepância. Será responsável por todas as transacções realizadas na sua Conta (por Si ou por eventuais substitutos), uma vez que só é possível aceder à mesma com o Código de Segurança e estão sujeitas à aceitação dos nossos Termos e Condições, incluindo, nomeadamente, responsabilidade penal. Aceita notificar imediatamente, através de meios apropriados e seguros, qualquer utilização fraudulenta ou ilegítima da sua Conta, bem como qualquer acesso à mesma por terceiros não autorizados. Para evitar dúvidas, qualquer venda, cessão e transferência da Conta sempre que possa ser considerada ilegal é proibida em quaisquer circunstâncias, salvo nos casos de sublocação/subcontratação da sua conta em conformidade com a regulamentação local aplicável (…)“
3.1 Opções de Serviço:
“(…) No nosso sítio Web encontrará uma descrição das nossas opções de Serviço de Tecnologia e explicaremos que opções de Serviço tem à sua disposição quando cria uma Conta EMP01.... Os presentes Termos e Condições serão aplicáveis a todos os nossos Serviços Tecnológicos se se registar na Plataforma como Utilizador Estafeta.
Serviços incluídos na Taxa de Utilização da Plataforma: - Acesso à plataforma que lhe permitirá oferecer voluntária e livremente os seus serviços de entrega, podendo conectar-se em qualquer altura de acordo com a possibilidade de escolher livremente os pedidos que pretende realizar. Esse acesso inclui a possibilidade de prestar os seus serviços a qualquer um dos Utilizadores da Plataforma (Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, etc.), independentemente da empresa do Grupo EMP01... (EMP01... e/ou as suas filiais e/ou empresas coligadas) que gere a Plataforma à qual se conectou e sempre de acordo com a disponibilidade do país no qual se conecta. - Acesso a cobertura de seguro durante o período de conexão à Plataforma. - Acesso a apoio e serviço de assistência para qualquer inconveniente técnico que possa ocorrer. - Gestão e intermediação no serviço de recolha e pagamentos. - Aquisição e / ou uso de materiais que podem ser solicitados por você. Serviços incluídos dentro da taxa de activação (…) a EMP01... pode oferecer outros Produtos e Serviços não incluídos na Tarifa e que o Estafeta, consoante apropriado de acordo com a legislação de cada país, pode adquirir ou contratar voluntariamente através de um dos nossos canais de venda (…)”

4.1. Quem é o Estafeta?
“(…) Ao aceitar os presentes Termos e Condições, também se torna um utilizador da aplicação EMP01.... Deste modo, pode usar e conectar-se à Plataforma EMP01... de forma flexível e a seu critério. Acede à Plataforma para usar uma tecnologia da Plataforma que lhe permite conectar-se a outros Utilizadores da Plataforma. Os mesmos poderão ser: Estabelecimentos Comerciais, Utilizadores, outros Estafetas ou outros Utilizadores. Se estiver no seu país, usa a EMP01... como: ● Utilizador Estafeta Independente: pode definir os seus próprios horários para se conectar à Plataforma e manter o seu perfil registado. Actuará em seu próprio nome e interesse, também usando os seus próprios equipamentos para exercer a actividade. ● Utilizador Estafeta numa empresa de serviços de logística: enquanto profissional de uma empresa de serviços de logística que usa os Serviços da Plataforma, estará dependente das instruções da sua empresa. A EMP01... não dirigirá, controlará ou será considerada dirigir ou controlar as acções ou conduta da empresa no âmbito dos presentes Termos e Condições, nomeadamente no que diz respeito à prestação dos seus serviços a outros Utilizadores da Plataforma. Reconhece que não existe nenhuma obrigação ou relação de exclusividade entre Si e a EMP01..., de tal modo que pode, a seu exclusivo critério, oferecer serviços ou exercer qualquer outra actividade comercial ou profissional relacionada ou não com o sector de actividades da EMP01.... (…)”
4.2. Cessação de Serviços
“(…) Antes da cessão dos Serviços, as Partes aceitam liquidar qualquer dívida, obrigações pendentes ou quaisquer compromissos previamente acordados. As Partes podem cessar os Serviços pelas seguintes razões: a. Por vontade própria, em qualquer altura sem aviso prévio, salvo se acordado de outro modo por escrito. b. Por violação de qualquer uma das obrigações previstas nos presentes Termos e Condições. c. Em caso de impossibilidade de cumprir qualquer disposição dos presentes Termos e Condições. d. O não cumprimento das Normas de Ética e Conduta Empresarial para Terceiros da EMP01... e/ou de qualquer outra Política da EMP01... aplicável a todos os Utilizadores da Plataforma. e. Por violação da legislação local por parte do Estafeta que possa constituir uma violação do princípio de boa-fé entre as Partes. f. Quaisquer outras circunstâncias resultantes em danos fiscais, de segurança social, financeiros, comerciais, organizacionais ou de reputação para a outra Parte ou um Terceiro, independentemente do montante ou dimensão do dano causado. g. A utilização da Plataforma EMP01... para fins abusivos ou fraudulentos susceptíveis de causar danos materiais e/ou imateriais a qualquer um dos Utilizadores da plataforma. h. Em situações de força maior, de acordo com a cláusula 8.5 destes Termos e Condições. (…)”
5.1.1. A sua Utilização dos Serviços de Tecnologia da EMP01...:
“(…). Para utilizar os Serviços de Tecnologia da EMP01... é necessário registar e criar uma Conta completa, actualizada e activa. Tal inclui, consoante apropriado, mas sem carácter exaustivo, as seguintes obrigações: a. Estar registado correctamente para poder exercer a actividade de entrega para todos os fins legais, de segurança social e fiscais e em conformidade com a regulamentação local em vigor na altura. b. Pagar pontualmente os Serviços acordados com a Plataforma. c. Tem de enviar à EMP01... certas informações, pessoais ou enquanto empresa prestadora de serviços, tais como o seu nome, endereço, número de telemóvel e idade (aplicar-se-á a idade legal da sua jurisdição), bem como, pelo menos, um método de pagamento válido. d. Tem de manter informações exactas, completas e actualizadas na sua Conta. Será responsável por quaisquer inexactidões nas informações fornecidas. e. Será responsável por todas as actividades realizadas na sua Conta, incluindo as que terceiros realizam em seu nome, bem como por manter sempre a segurança e o sigilo do nome de utilizador e da palavra-passe (Código de Segurança) da sua conta. f. Aceita cumprir toda a legislação aplicável, incluindo regulamentação local, nacional e supranacional ao utilizar os Serviços de Tecnologia EMP01... e apenas pode utilizar os Serviços para fins legítimos. g. Aceita não utilizar a Plataforma de Tecnologia EMP01... para causar inconvenientes, fraude ou danos materiais a terceiros. h. Caso decida subcontratar a sua Conta de Utilizador Estafeta, tem de fazê-lo em conformidade com a regulamentação local, sempre que a mesma o permita, e serão aplicados processos internos para adaptar a operação. A EMP01... não será responsável por quaisquer danos ou infracção que você e/ou as suas subcontratações possam cometer. Neste sentido, a EMP01..., a fim de evitar comportamento abusivo e/ou fraudulento, pode pedir documentação relativa à conformidade do Estafeta titular da Conta EMP01... e dos seus subcontratantes. i. Declara que dispõe da capacidade jurídica para celebrar contratos e ser de maioridade no país correspondente. j. Apenas os produtos e serviços que não sejam tácita ou expressamente proibidos nos Termos e Condições e outras políticas da EMP01... ou pela legislação em vigor podem ser incluídos no âmbito dos presentes Termos e Condições. Para mais informações sobre os produtos ou serviços proibidos, consulte as nossas Políticas de Artigos Proibidos nos presentes Termos e Condições ou nos Termos e Condições Gerais de Utilização aplicáveis aos Utilizadores Cliente. k. A EMP01... irá sempre dar prioridade à sua experiência de Utilizador enquanto parte dos seus serviços. A EMP01... pode criar painéis de informação para incluir as suas preferências enquanto Utilizador da Plataforma Digital da EMP01... e melhorar a sua experiência na mesma. l. Você, enquanto profissional e Estafeta, é responsável pela prestação dos seus serviços e pelas vicissitudes da sua actividade. Bem como, se for caso disso, pelos estafetas por si subcontratados. m. O Estafeta compromete-se a verificar e cumprir os requisitos legais pertinentes, em termos de saúde e segurança apropriados para diferentes tipos de produtos (a título de exemplo, mas sem carácter exaustivo: os relacionados com farmácia, álcool e tabaco) e isenta a EMP01... de qualquer responsabilidade caso a regulamentação supracitada não seja respeitada. n. No caso de transporte de alimentos, em conformidade com a regulamentação aplicável a este respeito, o Estafeta compromete-se a transportá-los em meios de transporte e recipientes adequados para os mesmos. o. Declara cumprir a legislação aplicável na prestação dos seus serviços de entrega, tais como legislação fiscal, laboral, civil, penal, de transporte de mercadorias, de saúde, segurança e higiene e a legislação inerente à actividade, nomeadamente apólices de seguro aplicáveis à sua região (como o seguro obrigatório de veículos (…)”
5.1.4.
“(…) Ao aceitar um pedido, o Estafeta reconhece que esse pedido pode incluir a entrega/devolução/serviço de devolução ou conforme a morada/localização/descrição indicado pelo Utilizador Cliente ou o Estabelecimento Comercial com o qual celebrou um contrato (…)”
5.1.5.
“(…) Por força dos acordos alcançados com os Utilizadores Cliente, e para efeitos de evitar fraude, no momento da entrega, os Estafetas e Utilizadores Clientes aguardarão dez minutos antes de cancelar um pedido. (…).”
5.1.6.
“(…) O Estafeta aceita que os Estabelecimentos Comerciais e o Utilizador Cliente peça um serviço de entrega de acordo com o preço e a qualidade em conformidade com as orientações de mercado. (…).”
5.2 Restrições
“(…) Sem prejuízo de quaisquer medidas adicionais que possam ser adoptadas, uma Conta Estafeta pode ser temporária ou permanentemente desactivada se: a. Em conformidade com o Código de Ética que rege todos os Utilizadores da Plataforma, utilizar a Plataforma para insultar, ofender, ameaçar e/ou agredir Terceiros, nomeadamente, Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, outros Estafetas e pessoal da EMP01.... b. Violar a lei ou quaisquer outras disposições dos Termos e Condições Gerais ou outras políticas da EMP01.... c. Participar em actos ou conduta violentos. d. Violar os seus direitos na aplicação da EMP01..., causando danos materiais e/ou imateriais a outro Utilizador da plataforma (Estafetas, Utilizadores Cliente e/ou Estabelecimentos Comerciais). e. Na prevenção de acções fraudulentas, se a identidade do Utilizador da Plataforma e/ou dos seus substitutos ou subcontratantes não puder ser verificada e/ou qualquer informação prestada por si e/ou os seus substitutos ou subcontratantes estiver incorrecta. f. A fim de prevenir a segurança de todos os Utilizadores da Plataforma em caso de violação da Política de Mercadorias (…)”
5.3.1 Facturação e pagamentos
“(…) O processamento dos pagamentos estará sujeito a todas as condições do Processador de Pagamento, às condições e políticas de privacidade e deverá ter sua própria conta individual ou comercial, dependendo do país em questão, junto do Processador de Pagamento. A EMP01..., através de um processador de pagamento, conectar-se-á e actuará como um intermediário nos pagamentos entre Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais e Estafetas (ou empresa de serviços de logística conexa). Aceita e concorda que, dependendo da regulamentação local aplicável, bem como da forma na qual se conecta à Plataforma (directamente ou através de uma empresa de serviços de logística), os serviços que oferece podem e terão de ser facturados ou refaturados ao Cliente Utilizador e/ou ao Estabelecimento Comercial, que em última instância paga o preço dos serviços por si oferecidos. Aceita que a taxa pelos serviços que pagará à EMP01... inclui, se autorizado por si e conforme apropriado de acordo com a legislação local do seu país, bem como da forma como se conecta à Plataforma (directamente ou através de uma empresa de serviços de logística), a gestão e intermediação da facturação correspondente aos seus serviços. Neste caso, estas facturas serão consideradas aceites caso a EMP01... não receba qualquer comunicação da sua parte no prazo de 5 dias a contar da emissão das facturas. O Estafeta reconhece e concorda que a EMP01..., em conformidade com o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), pode proceder a uma revisão periódica dos pagamentos que lhe são efectuados. Tal revisão pode resultar na retenção do imposto sobre o rendimento caso o limite, em conformidade com o disposto no Artigo 53 do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e no Artigo 101 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), seja ultrapassado. O Estafeta reconhece e aceita a sua responsabilidade pelo dinheiro que lhe foi entregue pelos Utilizadores Cliente e que é propriedade dos Estabelecimentos Comerciais. Neste sentido, aceita que, consoante apropriado à forma como se conecta à Plataforma, o preço que lhe foi pago pelo serviço pelo Estabelecimento Comercial inclui o serviço de recolha do dinheiro que tem de ser entregue ao referido Estabelecimento Comercial. (…)”
5.3.2 Pagamento e Taxas da EMP01...
 “(…) Aceita que a sua utilização dos Serviços EMP01... tem um custo associado para os serviços ou produtos que recebe («Encargos»). A EMP01... pode cobrar a seu exclusivo critério uma taxa padrão, uma taxa adicional ou um ajustamento aplicável pela utilização da Plataforma e os custos de activar o Perfil da sua Conta. A taxa que tem de pagar corresponderá à utilização dos serviços contratados por si através da Plataforma, ou aos eventuais produtos/bens que pode adquirir através da mesma. Para que conste, a utilização dos serviços e os produtos podem ser momentânea ou definitivamente suspensos ou desactivados na Plataforma, dependendo do país a partir do qual se conecta. A EMP01... reserva-se o direito de adoptar as medidas judiciais e extrajudiciais que considere apropriadas para obter o pagamento dos montantes em dívida. A EMP01... reserva-se o direito de modificar, alterar, aumentar ou cancelar as taxas actuais em qualquer altura notificando os Utilizadores da sua Plataforma. Além disso, a EMP01... pode temporariamente modificar a Taxa e a Política e as taxas dos seus Serviços em resultado de promoções ou descontos. Estas modificações produzem efeitos quando a promoção é tornada pública ou o Utilizador beneficiário é notificado. Todas as Taxas para Produtos e/ou Serviços contratados à EMP01... serão cobradas imediatamente em conformidade com o método de pagamento permitido no seu país e o método preferencial indicado na sua Conta e disponibilizado aos Serviços EMP01.... Quando carregado, a EMP01... enviar-lhe-á um recibo por e-mail. O pagamento também pode ser efectuado mediante a compensação de facturas pendentes entre as partes. Se o método de pagamento da sua conta principal for considerado expirado, inválido ou indisponível para a cobrança, a EMP01... irá contactá-lo e/ou providenciar outros métodos de pagamento aplicáveis à sua Conta. A EMP01... envidará esforços razoáveis para o informar sobre quaisquer encargos aplicáveis. A EMP01... pode ocasionalmente eliminar e/ou rever quaisquer taxas, ofertas e/ou descontos aplicáveis a todos os Utilizadores da Plataforma, você incluído. A EMP01... pode aplicar taxas de Serviço ou outras taxas previamente anunciadas nas redes sociais aplicáveis, salvo se a EMP01... não a aplicar na sua região, caso no qual não lhe serão cobradas. A forma de cobrança dos Encargos irá sempre depender da forma na qual se conecta à Plataforma, directamente ou através de uma empresa de serviços de logística. (…)”
5.4.1
“(…) Em certos casos, por uma questão de prevenção de fraudes, poderá ter de apresentar prova da sua identidade e/ou, se aplicável nos termos da legislação local, dos seus substitutos ou subcontratantes para aceder ou utilizar os Serviços e aceita que lhe pode ser negado acesso aos Serviços e à utilização dos mesmos se você ou os seus substitutos ou subcontratantes recusarem fornecer essa prova de identidade. A EMP01... pode também recorrer a terceiros fornecedores de serviços para efeitos de verificar a sua identidade ou a dos seus substitutos ou subcontratantes. (…)”
5.4.2
 “(…)  A EMP01... pode, mas não é obrigada, monitorizar, rever e/ou editar a sua Conta. A EMP01... reserva-se o direito de, em qualquer caso, eliminar ou desactivar o acesso a qualquer Conta por qualquer motivo ou sem motivo, até mesmo se considerar, a seu critério exclusivo, que a sua Conta viola os direitos de terceiros ou direitos protegidos pelos Termos e Condições. (…)”
5.4.3
“(…) A EMP01... pode adoptar essa acção sem aviso prévio feito a si ou a um terceiro. A eliminação ou desactivação do acesso à sua Conta de Utilizador será a critério exclusivo da EMP01... e não há qualquer obrigação de eliminar ou desactivar o acesso em relação a Estafetas específicos. (…)”
5.5.1
“(…) Você pode determinar e escolher o preço dos seus serviços através da Plataforma EMP01.... A EMP01..., para fins informativos, com base em informações de mercado, irá sugerir um preço de mercado que poderá ser alterado diariamente pelo Estafeta através do seu Perfil de Utilizador, sem que isso implique garantias de adjudicação do serviço. (…)”
5.7
“(…) O Estafeta terá uma Reputação associada ao seu perfil fácil de usar e consultar. Este sistema é automático e é actualizado periodicamente à medida que os diferentes Utilizadores realizam transacções na Plataforma EMP01... e está sujeito às regra aí contidas e sobre as quais os Utilizadores são informados no presente documento e/ou na APP e/ou através dos canais de comunicação apropriados, para que o conheçam exaustivamente e o considerem útil. O sistema baseia-se em dados objectivos, informação numérica e métricas fornecidas pelos Utilizadores da Plataforma e os clientes do Estafeta: Utilizadores Cliente e Estabelecimentos Comerciais. A EMP01... não manipula ou intervém no processo de formação da Reputação, mas apenas consolida informação objectiva obtida dos Utilizadores Cliente e Estabelecimentos Comerciais, beneficiários dos serviços do Estafeta. A EMP01... não verifica a veracidade ou precisão dos comentários feitos por outros Utilizadores e não é responsável pelo que é expresso no sítio Web ou por outros meios, nomeadamente e-mail. Todas as informações fornecidas pelos Utilizadores serão incluídas no sítio Web sob a exclusiva responsabilidade do seu autor. (…)”
9.2  Dados tratados
“(…) Os dados do Estafeta recolhidos através da Plataforma e das ferramentas tecnológicas que a EMP01... fornece ao Estafeta estarão, regra geral, limitados aos dados necessários para executar a relação entre as Partes e são necessários para a poder desenvolver correctamente (adiante designados por os «Dados»). Não obstante o que precede, é possível que no momento do registo ou da criação da Conta pelo Estafeta ou durante a relação, sejam pedidos dados adicionais, através de campos opcionais na Conta do Estafeta, ou através de campanhas promocionais ou outras acções que a EMP01... possa realizar. Em consonância com o que precede, a EMP01... pode tratar as seguintes categorias de dados, sem prejuízo de outras que possam ser pedidas durante a relação: (…) Os dados relacionados com a geolocalização do Estafeta são necessários para a execução dos Termos e Condições, bem como para utilizar a Plataforma, a fim de permitir aos Consumidores e Estabelecimentos Comerciais saber o estado e localização do Estafeta durante a recolha ou entrega (…)“
9.3. Geolocalização
“(…) Ao utilizar a aplicação fornecida pela EMP01... para a execução da relação e, portanto, para exercer a actividade, a EMP01... pode receber os dados de geolocalização do Estafeta caso o mesmo tenha activado esta função directamente no seu telemóvel. A EMP01... usará os Dados obtidos para prestar os Serviços ao Estafeta e partilhá-los com o Utilizador Cliente e o Estabelecimento Comercial cujo pedido o Estafeta aceitou executar, para que o Utilizador Cliente e o Estabelecimento Comercial possam contactar o Estafeta no caso de algum incidente. É expressamente indicado que o Estafeta tem total liberdade de decisão em relação ao itinerário e/ou percursos escolhidos para a oferta e especificação dos seus serviços e em nenhum caso a EMP01... utilizará esses dados para fins de controlo. (…)”
9.4. Finalidade e base jurídica do tratamento
“(…) Os Dados serão tratados exclusivamente para cumprir a relação estabelecida e, nomeadamente: (…)  A geolocalização é uma informação importante e básica para a prestação do Serviço, porquanto serve apenas para informar o Estabelecimento Comercial ou o Utilizador Cliente da localização do Estafeta e, portanto, calcular o tempo de recolha ou entrega, mas que é também usada pela EMP01... para a oferta de pedidos. A proximidade do ponto de recolha é um dos critérios utilizados no momento da oferta do pedido, pelo que, se não estiver activada, a EMP01... não poderá garantir que são oferecidos pedidos, ou que são razoáveis em termos do tempo previsto de recolha ou entrega. Neste sentido, e sem prejuízo do sistema operativo do dispositivo do Estafeta que pede consentimento para o uso da geolocalização, a utilização desta informação é necessária para correcta execução dos Termos e Condições. Em todo o caso, o Estafeta pode desactivar a geolocalização quando não está a usar a Plataforma, embora a EMP01... não use esta informação fora do âmbito da oferta de pedidos ou fora das horas em que o Estafeta está a usar a Plataforma. De igual modo, é expressamente indicado que o Estafeta tem total liberdade de decisão em relação ao itinerário e/ou percursos escolhidos para a oferta e concretização dos seus serviços e em nenhum caso a EMP01... utilizará esses dados para fins de controlo do Estafeta. Neste sentido, a geolocalização é meramente temporária e não de modo algum exaustiva. A informação de geolocalização pode também ser usado para efeitos de facturação (…)”
9.5 Métricas e outras informações relacionadas com a execução do serviço
“(…)  Em relação ao sistema de Reputação e às avaliações dos Utilizadores Cliente e Estabelecimentos Comerciais sobre o serviço oferecido pelo Estafeta, o mesmo deverá ter em conta que: - Não são estabelecidos perfis ou realizadas avaliações de pessoas, mas sim sobre a execução do serviço. - O Consumidor e o Estabelecimento Comercial podem avaliar a qualidade do serviço prestado. - Todas as métricas obtidas pela EMP01... referem-se sempre, em qualquer caso e exclusivamente, ao serviço prestado. - Não são recolhidos dados relacionados com a vida privada, a personalidade ou os hábitos do Estafeta. De igual modo, no tocante à existência de decisões automatizadas com efeitos legais para o Estafeta, deve ter-se em conta que: - As decisões não são tomadas baseadas exclusivamente no tratamento automatizado dos dados pessoais do Estafeta, mas quando apropriado baseadas numa avaliação da execução do serviço.- Todos os parâmeros a ter em conta foram gerados manualmente pelos Clientes e Estabelecimentos Comerciais. - Todos os parâmetros e métricas usadas para tomar essas decisões referem-se sempre e exclusivamente ao serviço e à execução dos Termos e Condições, independentemente do Estafeta que os executa. - Não são estabelecidos perfis, conforme indicado no ponto anterior. - Em caso algum são tidos em conta características da personalidade ou a esfera não profissional da Parte. - Os resultados dependem de acções anteriores e voluntárias do Estafeta. - Os resultados podem ser corrigidos caso tenha havido um erro e/ou discrepância entre o Estafeta e a EMP01.... - O Estafeta não é impedido de exercer um direito. - O Estafeta não é impedido de aceder a um bem ou serviço. - O Estafeta não é impedido de ser parte num contrato. Com base no que precede, e em conformidade com as disposições do RGPD, não são estabelecidos perfis sobre os Estafetas ou tomadas decisões automatizadas com efeitos legais para o Estafeta com base nos seus dados ou características pessoais, mas apenas são tidas em conta uma avaliação do serviço e características objectivas sobre a capacidade de prestar o serviço pelo Estafeta (…)”
9.O documento com a epígrafe “Termos e Condições de Utilização da Plataforma EMP01... para Estafetas” apresentou a versão datada de 28/12/2023, constante da ref. n.º ...44 (cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
10. Para ter acesso às propostas de entregas, através da App, AA teve de fazer um registo, fornecendo o seu endereço de correio electrónico e criando uma conta.
11. Através da App, AA recebe toda a informação relacionada com a oferta de serviços de entrega, remuneração a receber pela prestação de serviço, destinatário do produto e local de entrega.
12. Mediante a App AA consegue ver o histórico das entregas que fez por dia, semana e no mês, e quanto irá receber pelos serviços prestados.
13. Um estafeta pode recusar, ignorar ou aceitar uma oferta de entrega sugerida pela App.
14. Para ter acesso às ofertas de entregas disponibilizadas pela ré AA necessita ter a App instalada no seu smartphone.
15. Para um estafeta poder receber uma proposta de entrega necessita de ter a geolocalização activa, de forma a poder ser seleccionado de acordo com a proximidade ao local de recolha.
16. Após o pedido de entrega ser aceite, e até os produtos serem disponibilizados aos clientes, a geolocalização pode ser desactivada pelo estafeta.
17. Se a geolocalização permanecer activada, a App permite o acompanhamento do trajecto desenvolvido pelos estafetas entre a recolha e entrega, quer pela ré, quer pelo cliente, quer pelos estabelecimentos comerciais que fornecem os produtos a serem entregues.
18. AA desempenha as funções de estafeta na recolha e entrega de produtos na zona urbana de ....
19. AA pode decidir o local onde presta a sua actividade, desde que se trate de uma zona coberta pela App, sendo livre de alterar a sua zona de actividade.
20. AA é que decide se trabalha num dia em concreto, ou se fica inactivo por alguns períodos e desenvolve a sua actividade em horários que o próprio define, bastando para o efeito colocar-se online na App nos períodos respectivos, sem que esteja sujeito a horários pré-estabelecidos ou a turnos, nem a indicação prévia dos seus horários.
21. A título de contrapartida pela realização dos serviços de entrega o estafeta aufere uma prestação que varia em cada entrega, a qual corresponde ao produto da taxa de entrega por um coeficiente, denominado multiplicador, de acordo com a fórmula taxa de entrega * multiplicador.
22. O montante da taxa de entrega para cada serviço resulta da consideração de valores de referência pré-estabelecidos na App, relevando factores como a distância entre o local de recolha dos produtos e o local onde estes deverão ser entregues, o período em que decorre o serviço de entrega e as eventuais condições atmosféricas adversas que se fazem sentir.
23. Uma vez por dia AA pode definir o valor do multiplicador, o qual poderia oscilar entre 0,9 e 1,1, mas actualmente somente permite escolher entre 1,0 e 1,1.
24. O valor a receber pelo estafeta por serviço não depende do tempo de demora na sua realização, do tempo de ligação à App ou da decisão anterior de aceitar ou recusar entregas.
25. A ré gere a App, a qual permite a ligação entre comerciantes (os que fornecem bens e serviços) e clientes (os que adquirem esses bens e serviços), através de serviços de entregas das mercadorias, assegurados por estafetas, sendo tais serviços de entrega geridos e organizados pela App, designadamente quanto à indicação de locais de recolha e entrega dos produtos, recebendo em contrapartida os estafetas um valor por cada entrega.
26. AA mantém actividade aberta como empresário em nome individual junto da A.T. e emite facturas/recibos pelos serviços de entrega que realizou, que lhe são pagos pela ré.
27. AA pode realizar entregas disponibilizadas por plataformas geridas por outras entidades que não a ré, ou efectuar entregas directamente por sua conta, sem que necessite de disso dar conta à ré.
28. Os contactos telefónicos entre estafeta e clientes que se justificam pelos serviços de entrega, nomeadamente, se não se consegue localizar o endereço de entrega, são assegurados através da plataforma gerida pela ré.
29. Os estafetas são livres de escolherem as suas rotas para realizarem as entregas.
30. O estafeta pode escolher o sistema de navegação que pretende utilizar no serviço de entrega, ou não utilizá-lo, se não necessitar dessa ajuda.
31. Não existem penalizações pelo modo como os estafetas realizam as suas entregas.
32. Os estafetas é que escolhem a roupa com que se apresentam nas entregas.
33. A imposição de utilização de mochila para serem efectuadas entregas de produtos alimentares (a qual não é necessário dispor do logotipo da ré) deve-se à necessidade de serem adoptadas boas práticas de higiene e segurança alimentar, para além de permitirem que o estafeta passa transportar os produtos no veículo utilizado, que poderá ser uma bicicleta ou uma mota.
34. Os estafetas podem substituir-se por outra pessoa na realização de entregas, sem que careçam de autorização da ré.
35. Para realizar as suas entregas AA utiliza o seu veículo, o seu telemóvel e uma mochila que adquiriu.
36. A ré não efectua avaliação da qualidade da actividade dos estafetas, apenas dispondo de uma avaliação de satisfação pelos clientes que não interfere no valor da remuneração devida aos estafetas pelas entregas.

FACTOS NÃO PROVADOS:

1. A área de actuação de AA é determinada pela plataforma digital.
2. O valor da taxa de entrega depende do número de entregas realizadas, do tempo despendido na entrega, da avaliação do cliente e do número total de pedidos concretizados.
3. As ofertas de serviços de entrega que AA recebe na App já vêm com uma retribuição estabelecida, e esse valor não pode ser negociado antes de o estafeta poder aceitar ou recusar através da App.
4. AA só sabe quanto vai receber por cada pedido que lhe seja direccionado pela ré depois de o aceitar.
5. O multiplicador não permite ao estafeta aumentar qualquer rendimento uma vez que, se escolher o valor mais alto do multiplicador, poderá não receber pedidos ou receber em menos quantidade, por os pedidos serem distribuídos por escolha algorítmica a quem tem um multiplicador menor.
6. O número de propostas de entregas por dia a um estafeta depende da ré.
7. A única forma através da qual o estafeta pode aumentar os seus rendimentos consiste em trabalhar mais horas.
8. O trabalho desenvolvido pelo estafeta é permanentemente acompanhado por GPS com recurso ao sistema de geolocalização, utilizando para o efeito o telemóvel da estafeta.
9. AA tem na actividade associada à App a sua única fonte de rendimento.

IV – Fundamentação de Direito

Da qualificação do contrato

Cumpre agora proceder à análise da questão de direito que respeita à qualificação jurídica da relação contratual estabelecida entre a EMP01... e o AA, com início pelo menos desde 11.09.2023 (data do registo da sua inscrição na plataforma EMP01... - ponto 6 dos factos provados) , designadamente apurar se a relação contratual é de trabalho subordinado, como defende o Ministério Público/Recorrente, por força da verificação da presunção de laboralidade que consta do n.º 1 als. a), b) e) e f) do art.º 12.º-A do CT.
Consigna-se que para apreciação do pleito iremos convocar apenas as normas da Código do Trabalho de revisto aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro na sua versão atualizada, designadamente com as alterações introduzidas pela Lei n.º 13/2023, de 13.04 (doravante CT) e do Código Civil, atenta a data de início da relação contratual estabelecida entre as partes (11.09.2023).
Estabelece o artigo 11.º do CT, indo de encontro ao disposto no artigo 1152.º do Código Civil, que o contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas.
Por seu turno prescreve o artigo 1154.º do Código Civil, que contrato de prestação de serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.
Destes conceitos resulta que o contrato de trabalho tem por objecto a prestação de uma actividade e o contrato de prestação de serviço a obtenção de um certo resultado proveniente do trabalho prestado por outrem, sendo certo que apenas o primeiro é necessariamente oneroso.
Quer a doutrina[3], quer a jurisprudência[4] têm vindo ao longo dos anos a salientar, que o que verdadeiramente distingue o contrato de trabalho do contrato de prestação de serviços é a chamada subordinação jurídica de uma das partes em relação à outra, subordinação essa que só no contrato de trabalho existe. Tenha-se presente que a subordinação jurídica atualmente não está apenas associada à sujeição de ordens e instruções, pois as atuais formas de organização laboral que premeiam a autonomia técnica dos trabalhadores, levam a que a subordinação jurídica signifique que o prestador esteja inserido num ciclo de trabalho produtivo alheio, estando vinculado à observação dos parâmetros de organização e funcionamento definidos pelo beneficiário da actividade.
Ora, o contrato de trabalho tem assim como objecto a prestação de uma actividade e como elemento que o distingue dos demais a subordinação jurídica, que se traduz não só no poder que o empregador tem de através de ordens, instruções e directivas, conformar a prestação a que o trabalhador se obrigou, mas também que o prestador do trabalho esteja integrado na estrutura organizativa do beneficiário da actividade.
Por seu turno, o contrato de prestação de serviço visa, apenas, a obtenção de um determinado resultado que a parte sujeita a tal obrigação obterá por si, em regime de autonomia, não sendo este trabalho dominado e organizado pelo beneficiário da actividade (que apenas controla o produto final), mas sim por quem o fornece. Em suma não está sujeita ao poder de direcção e de fiscalização da outra parte.
Nem sempre é fácil distinguir estas duas figuras contratuais, atenta a dificuldade em perceber o que ficou estabelecido e o que era pretendido – se a actividade em si ou se o seu resultado, razão pela qual a subordinação jurídica é, pois, o elemento fundamental e diferenciador do contrato de trabalho e traduz-se numa posição de supremacia do credor da prestação de trabalho (o empregador) e na correspondente sujeição do prestador da actividade (o trabalhador), cuja conduta pessoal, na execução do contrato, está necessariamente dependente das ordens, regras ou orientações ditadas pelo empregador, dentro dos limites do contrato e das normas que o regem.
Podemos assim concluir que o contrato de trabalho se caracteriza essencialmente pelo estado de dependência jurídica em que o trabalhador se coloca face à entidade empregadora e que resulta da circunstância do trabalhador se encontrar inserido na organização produtiva do empregador e submetido à autoridade e direcção deste, enquanto na prestação de serviço não se verifica essa subordinação, considerando-se apenas o resultado da atividade.
Importa salientar que em termos de repartição do ónus da prova, cabe ao trabalhador fazer a prova dos elementos constitutivos do contrato de trabalho, isto é, demonstrar que presta uma actividade remunerada para outrem, sob a autoridade e direcção do beneficiário (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil).
Reconhecendo a dificuldade na identificação em concreto dos dois tipos de contrato, o legislador optou por consagrar no art.º 12.º do Código do Trabalho a presunção de laboralidade, vindo assim a inverter o ónus da prova da existência do contrato de trabalho nos termos do art.º 350.º do Código Civil, dai decorrendo que na presença de alguns dos indícios enunciados no citado art.º 12.º do CT, fica-se dispensado de demonstrar, nos termos gerais do artigo 342.º do Código Civil, que a actividade desenvolvida para o empregador mediante o pagamento de uma importância monetária é prestada numa posição de subordinação (no caso, estando o Ministério Público colocado na posição do trabalhador, beneficia da presunção de laboralidade se ficar demonstrada a respetiva factualidade). Naturalmente esta qualificação pode ser afastada se o empregador lograr provar a autonomia do trabalhador ou a falta de qualquer outro elemento essencial do contrato de trabalho.
Contudo, os novos desafios na área laboral, designadamente o crescer das novas formas de trabalho, na área digital, como seja o trabalho nas plataformas digitais, veio a revelar que a presunção consagrada no artigo 12.º do CT não dava resposta satisfatória, para enfrentar os novos tipos de dependência resultantes da prestação de serviços via plataformas digitais.
Como se refere no “Livro Verde Sobre o Futuro do Trabalho 2021”, a propósito do trabalho nas plataformas digitais «a circunstância de o prestador de serviço utilizar instrumentos de trabalho próprios, bem como o facto de estar dispensado de cumprir deveres de assiduidade, pontualidade e não concorrência, não é incompatível com a existência de uma relação de trabalho dependente entre o prestador e a plataforma digital».
Como salienta Teresa Coelho Moreira e Marco Carvalho Gonçalves[5]  “atualmente há uma app para tudo ou quase tudo, desde atividades mais simples, como entrega de alimentação, até atividades mais complexas, como prestação de serviços jurídicos, surgindo todos os dias novas plataformas digitais. Na verdade, em teoria, qualquer atividade pode ser plataformizada”.
O trabalho prestado com recurso a plataformas digitais, designadamente o que nos proporciona uma alternativa de transporte ao táxi, seja o que nos permite encomendar o almoço ou o jantar através de uma app, tem colocado diversas questões jurídicas a quais cabe destacar a qualificação da relação que se estabelece entre a empresa que opera na plataforma digital e os respetivos prestadores de serviços, designadamente os que se dedicam à recolha e entrega de mercadoria, conhecidos por “estafetas”.
Perante a dificuldade na qualificação da referida relação contratual e a inadequação da presunção de laboralidade, nos moldes estabelecidos pelo CT, para enfrentar os problemas emergentes das novas formas de trabalhar através de plataformas digitais, o legislador português reconheceu a necessidade criar uma presunção de laboralidade, adaptada às novas formas de prestar trabalho via apps e após várias versões foi aprovado o artigo 12º-A, pela Lei n.º 13/2023, de 13.04 (lei que alterou o Código do Trabalho), com a epígrafe Presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital, que entrou em vigor em 1.05.2023. Trata-se de uma presunção legal, o que origina a inversão do ónus da prova nos termos do art.º 344.º do CC, mas é ilidível e, por isso, admite prova em contrário. Contudo basta a verificação de pelo menos duas das caraterísticas elencadas nas alíneas do n.º 1 do citado artigo 12.º-A do CT, para se presumir a existência de contrato de trabalho.
É quanto ao entendimento assumido pelo Tribunal a quo, ao sustentar apenas a verificação do requisito previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 12.º A do CT, concluindo que não se verifica a presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital, julgando, consequentemente, o pedido improcedente, que o Recorrente se insurge.
Sustenta, assim, o Ministério Público que os requisitos que constam das alíneas a), b) e f) do n.º 1 do referido artigo também se verificam estando assim provada a presunção de contrato de trabalho, sendo por isso de revogar a sentença recorrida.
Por seu turno, a Recorrida, veio manifestar a sua concordância com a decisão recorrida e sustenta que para além de não se verificarem pelo menos duas das características de laboralidade constantes das alíneas do n.º 1 do art.º 12.º-A do CT, ainda que as mesmas se verifiquem mostra-se ilidida a presunção, a que acresce ainda o facto da aplicação do art.º 12-A do CT ser ilegal, por violação do disposto nos artigos 13.º, 18.º, n.º 2 e 3 e 61.º da Constituição da Republica Portuguesa.
Como referem Teresa Coelho Moreira e Marco Carvalho Gonçalves[6]o que está na lei é uma presunção e ilidível que visa facilitar e clarificar a distinção entre quem é verdadeiro trabalhador autónomo e quem é um falso trabalhador autónomo perante estas novas formas de prestar trabalho. Não significa que todos que prestam atividade nas plataformas sejam trabalhadores. Quem for verdadeiro autónomo continuará a ser.”

Vejamos se o AA é um verdadeiro ou um falso trabalhador autónomo:
Decorre do disposto no art.º 12.º-A do CT, que se presume a existência de um contrato de trabalho sempre que entre o prestador de atividade e a plataforma digital se verifiquem algumas (pelo menos duas) das seguintes características enunciadas ao longo das seis alíneas que integram o seu n.º 1:
a) A plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela;
b) A plataforma digital exerce o poder de direção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade;
c) A plataforma digital controla e supervisiona a prestação da atividade, incluindo em tempo real, ou verifica a qualidade da atividade prestada, nomeadamente através de meios eletrónicos ou de gestão algorítmica;
d) A plataforma digital restringe a autonomia do prestador de atividade quanto à organização do trabalho, especialmente quanto à escolha do horário de trabalho ou dos períodos de ausência, à possibilidade de aceitar ou recusar tarefas, à utilização de subcontratados ou substitutos, através da aplicação de sanções, à escolha dos clientes ou de prestar atividade a terceiros via plataforma;
e) A plataforma digital exerce poderes laborais sobre o prestador de atividade, nomeadamente o poder disciplinar, incluindo a exclusão de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta;
f) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem à plataforma digital ou são por esta explorados através de contrato de locação.
Por outro lado, resulta dos n.ºs 3 e 4 do citado artigo 12.º A do CT, que o disposto no n.°1 se aplica, independentemente da denominação que as partes tenham atribuído ao respetivo vínculo jurídico (n.° 3); e que a presunção prevista no n.°1 pode ser ilidida nos termos gerais, “nomeadamente se a plataforma digital fizer prova de que o prestador de atividade trabalha com efetiva autonomia, sem estar sujeito ao controlo, poder de direção e poder disciplinar de quem o contrata” (n.° 4).
Acompanhando e subscrevendo a apreciação critica à presunção de laboralidade efetuada pelo Prof. Leal Amado[7] diremos “que aludir, na base da presunção, ao exercício de “poder de direção” (al. b) e de “poder disciplinar” (al. e) por parte da plataforma digital “constitui uma autêntica petição de princípio, já que se o prestador de atividade provar que a plataforma digital exerce sobre ele tanto o poder de direção como o poder disciplinar não parece que tenha nada mais a provar para que o tribunal conclua, diretamente e sem dar um salto no desconhecido, que está perante um contrato de trabalho. Não há, aqui, qualquer ilação, o que há é um mero raciocínio circular.
Por outro lado, o preceito merece também críticas pelo que falta nas suas alíneas, porque cremos que a lei deveria ter concedido atenção, neste âmbito, à circunstância de o prestador não dispor, perante o cliente, de uma organização empresarial própria, encontrando-se inserido numa organização de trabalho alheia. Isto tanto mais quanto se sabe que a própria noção legal de contrato de trabalho, vertida no artigo 11° do CT, deixou de aludir à “direção” patronal, tendo substituído esse termo pela ideia de inserção do trabalhador no “âmbito de organização” da entidade empregadora.”
E mais à frente a propósito dos n.ºs 3 e 4 do art.º 12-A do CT, assertivamente refere o seguinte: “(…) está muito bem, dado que a presunção legal surge como forma de auxiliar o aplicador do direito na tarefa de qualificar corretamente uma dada relação jurídica, aplicando o chamado “princípio da primazia da realidade”, segundo o qual “os contratos são o que são, não o que as partes dizem que são”. Mas, por outro, denota a fraca técnica jurídica do legislador, o qual, a um tempo, se refere ao poder de direção e ao poder disciplinar da plataforma, como base da presunção, e, em simultâneo, usa a ausência de poder de direção e de poder disciplinar como forma de ilidir a presunção por ele estabelecida…”
Aqui chegados, e não se questionando que a Recorrida EMP01... é detentora de uma plataforma digital para efeitos de aplicação do artigo 12º-A do CT, cabe proceder à análise da matéria de facto apurada a fim de se concluir ou não pelo preenchimento de duas ou mais das circunstâncias descritas nas alíneas do n. º1 do art.º 12.º-A do CT
Sustenta a Recorrente que quanto à al. a) do n.º 1 do art.º 12º. -A do CT logrou provar-se que é a ré quem fixa unilateralmente a retribuição, sendo irrelevante que o prestador possa recusar o serviço assim como alterar o multiplicador, de forma a alterar o limite mínimo do valor de cada serviço.
Da factualidade provada resulta, designadamente dos pontos 21 a 24 dos pontos de facto provados, que como contrapartida pela realização dos serviços de entrega o estafeta aufere uma prestação que varia em cada entrega, a qual corresponde ao produto da taxa de entrega por um coeficiente, denominado multiplicador, de acordo com a fórmula taxa de entrega * multiplicador. O montante da taxa de entrega para cada serviço resulta da consideração de valores de referência pré-estabelecidos na App, relevando fatores como a distância entre o local de recolha dos produtos e o local onde estes deverão ser entregues, o período em que decorre o serviço de entrega e as eventuais condições atmosféricas adversas que se fazem sentir. Uma vez por dia AA pode definir o valor do multiplicador, o qual poderia oscilar entre 0,9 e 1,1, mas atualmente somente permite escolher entre 1,0 e 1,1. O valor a receber pelo estafeta por serviço não depende do tempo de demora na sua realização, do tempo de ligação à App ou da decisão anterior de aceitar ou recusar entregas.
Com efeito, desta factualidade resulta inequívoco que o valor auferido pelo estafeta é um valor determinado unilateralmente pela plataforma EMP01..., que estabelece um limite mínimo e máximo por cada serviço prestado, sendo certo que montante da taxa de entrega para cada serviço resulta de valores de referência pré-estabelecidos na plataforma.
Na verdade, é apresentado ao estafeta o preço do serviço quando este lhe é oferecido, calculado de acordo com um valor base, compensação pela distância e pelo tempo de espera, podendo sobre o preço incidir promoções da aplicação. Ou seja, o valor auferido pelo estafeta depende da taxa de entrega a qual é determinada pela Ré, sem que previamente tenha ocorrido qualquer negociação com o estafeta. É certo que o estafeta pode alterar o multiplicador por forma a modificar o limite mínimo do valor de cada serviço, mas tal revela-se de irrelevante, pois tal circunstância é excecional, só se poderá verificar uma vez por dia e os limites do aumento do valor mínimo são tão insignificantes que não afastam  a regra que vigora, que é a de ser a plataforma quem determina a retribuição do trabalho, tal como resulta dos “Termos e Condições de Utilização da Plataforma EMP01... para Estafetas”, que o estafeta está obrigado a aceitar sem qualquer margem de manobra para negociar.
Importa salientar que ao depararmos com as novas formas de organização do trabalho os critérios de determinação da retribuição também se alteraram, importando distinguir quem os dita: o beneficiário da atividade ou se são negociados entre as partes, em pé de igualdade, como é típico do trabalho autónomo.
Acresce dizer que não podemos concordar, nem concluir, que o valor da contrapartida devida ao estafeta por cada entrega seja determinado pela intervenção de três agentes - a ré, o estafeta e o cliente - , pois apesar de no seu cálculo pesar o concreto serviço pedido pelo cliente, bem como o multiplicador escolhido pelo estafeta, o certo é que é a Ré, quem assume o papel determinante na fixação do valor da contrapartida, já que é quem estipula os valores de referência que constam da plataforma e que determina o preço a cobrar por cada serviço, que se reflete no valor que vem a ser liquidado ao estafeta.
Por último, diremos que o facto do estafeta, não estar obrigado a aceitar todas as propostas apresentadas pela app, ou seja, tem à sua disposição a faculdade de recusar qualquer proposta de entrega, designadamente por não concordar com a contrapartida, revela-se de insuficiente para afastar o facto de ser a plataforma quem determina a retribuição do estafeta. Ao invés, reforça até a convicção de que efetivamente há uma fixação unilateral da contrapartida pela prestação do serviço do estafeta determinada pela plataforma, pois este pode, caso assim, o entenda aceitar ou não prestar o serviço, mas daqui não resulta qualquer possibilidade de negociação do seu preço.
Em suma, está verificada a circunstância prevista na alínea a) do n.º 2 do art.º 12-A do CT, ou seja, «a plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efectuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela», uma vez que é a plataforma gerida pela Ré que decide o preço pelos serviços prestados, o que significa que é quem define os critérios que determinam o valor da taxa de entrega para o trabalho a realizar, sem qualquer negociação com o estafeta, sendo este valor que irá determinar o valor a receber pelo estafeta. Por outro lado, revela-se de praticamente irrelevante ou mesmo insignificante, no que respeita à fixação da retribuição, o facto estafeta poder uma vez por dia alterar multiplicador entre 1,0 e 1,1, pois os limites mínimos e máximos continuam a ser estabelecidos pela plataforma.
Em relação à alínea b) defende a Recorrente que a Recorrida para além de estipular as regras de acesso/inscrição na plataforma por parte dos estafetas, também dirige, estipula concretiza e define a forma como toda a atividade deve ser por eles prestada.
Da alínea b) resulta que a plataforma exerça o poder de direcção e determine regras especificas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade.
Da factualidade provada, designadamente dos pontos 7, 8, 10, 11, 15, 25, resulta que o serviço de entregas gerido pela recorrida impõe a observação de algumas regras designadamente o dever dos estafetas se inscreverem na App, a necessidade de ligação à App para poderem receber propostas de entregas e aceitá-las, recurso à geolocalização para poder ser aceite determinada proposta de entrega, sendo também obrigatório possuir mochila isotérmica para o transporte de refeições. Daqui resulta manifesto que existe um procedimento prévio padronizado que está definido para todos os interessados em exercer a atividade em causa e que estes têm de observar, para o acesso/inscrição na plataforma por parte dos estafetas. Trata-se de requisitos prévios ao início da atividade, razão pela qual não podemos falar de regras específicas conformadoras da atividade.
Contudo da referida factualidade também resultou apurado que após a observação do procedimento prévio o estafeta tem ainda que observar outros procedimentos referentes ao exercício concreto da sua atividade.
Assim o estafeta quando aceita o serviço de um cliente tem que cumprir o procedimento instituído pela recorrida, o que significa que tem que se dirigir à morada do estabelecimento, onde recolhe o produto e depois tem de se dirigir à morada do utilizador cliente onde efetua a entrega. Ao estafeta são fornecidos os dados relevantes para fazer a recolha e a entrega do produto, tais nome e morada do estabelecimento e do utilizador como a distância estimada os dados do pagamento, lista dos artigos do pedido e valor do mesmo. Estão também definidos pela recorrida, designadamente nos “Termos e Condições de Utilização da plataforma EMP01... para Estafetas” os procedimentos referentes à recusa de entregas, bem como as regras a observar quanto ao pagamento do preço. Ou seja, a Recorrida organiza e gere através da App, os serviços de entregas de mercadorias, assegurados por estafetas, designadamente quanto à indicação de locais de recolha e entrega dos produtos, recebendo em contrapartida os estafetas um valor por cada entrega, valor este que é determinado por critérios ditados pela Recorrida.
Daqui resulta inequívoco que a recorrida não definiu apenas regras especificas prévias ao início da atividade, mas definiu e regulou o próprio exercício da atividade dos estafetas, através de procedimento padronizado, ou seja, regulou todos os passos essenciais da conduta a observar por qualquer estafeta quer para aceder, quer para executar o serviço proposto pela plataforma gerida pela Recorrida.
 Em suma, Ré atenta a atividade que desenvolve regulou no essencial todo o seu ciclo produtivo nele se incluindo as tarefas e a conduta que o estafeta tem de observar perante o utilizador/cliente, bem como a própria prestação da atividade em si, que é o que basta para podermos concluir pela verificação da alínea b) do n.º 2 do 12.º -A do CT. no segmento que prevê que a ré exerce o poder de direção ao ditar regras especificas quanto à conduta do estafeta perante o utilizador do serviço e quanto à prestação da atividade.
Está assim verificada a característica prevista na al. b), do n.º 1 do art.º 12.º A do CT.
Quanto à alínea f) sustenta o Recorrente que a mesma se encontra verificada porque o principal instrumento de trabalho é a aplicação informática que é propriedade da Ré.
Da factualidade provada designadamente do ponto 35 dos pontos de facto provados, apurou-se que para realizar as suas entregas o AA utiliza o seu veículo, para se transportar ao deslocar-se para fazer entregas aos clientes, o seu telemóvel, que lhe permite aceder à app administrada pela Recorrida para aceitar as propostas de entrega e uma mochila térmica que adquiriu para transporte os produtos disponibilizados pelos estabelecimentos comerciais. 
Todos estes bens são indispensáveis para a realização da atividade levada a cabo pelo estafeta, por isso são por ele usados na prestação da atividade e não são pertença da Recorrida, aliás como também resulta dos “Termos e Condições de Utilização da Plataforma EMP01... para Estafetas“
É certo que no exercício da sua atividade a recorrida gere e desenvolve a aplicação informática, sendo esta também indispensável para o exercício da atividade profissional do estafeta, mas tal não nos permite concluir que os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pelo estafeta pertencem à plataforma digital ou são por esta explorados através de contrato de locação.
Com efeito, entendemos que a plataforma digital que gere os serviços de entrega, não pode ser considerada de instrumento ou equipamento de trabalho, pois para além de não ter existência física, o instrumento de trabalho é o telemóvel que permite aceder à aplicação.
Por outro lado, cabe referir o preenchimento da referida alínea exige que alguns equipamentos/instrumentos pertençam à Ré e não apenas um, pois como se escreve no recente ac. da RE de 12.09.2024, proc. 3848/23.5T8PTM.E1, consultável em www.dgsi.pt “…se fosse suficiente para a verificação da característica que a ré gerisse uma aplicação informática, então seria redundante a existência desta característica, pois a própria atividade em causa, trabalho em plataforma digital, já conteria o requisito/característica da alínea f)”
Não se tendo provado que os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam à plataforma ou são por esta explorados teremos de concluir que não se verifica a circunstância prevista na al. f) do n.º 1 do art.º 12.º A do CT.
Em suma, consideramos que se verificam as caraterísticas previstas nas alíneas a), b) e e) (esta identificada na decisão recorrida) do n.º 1 do art.º 12-A do CT, estando assim preenchida a presunção de existência do contrato de trabalho, sem prejuízo de poder vir a ser ilidida.
Cumpre agora verificar se a factualidade apurada nos permite ilidir a presunção de contrato de trabalho, desde logo demonstrando que o estafeta presta a sua atividade de forma autónoma.
Os factos com relevo para apreciação desta questão são os seguintes:
- Um estafeta pode recusar, ignorar ou aceitar uma oferta de entrega sugerida pela App.
- Para um estafeta poder receber uma proposta de entrega necessita de ter a geolocalização ativa, de forma a poder ser selecionado de acordo com a proximidade ao local de recolha.
- Após o pedido de entrega ser aceite, e até os produtos serem disponibilizados aos clientes, a geolocalização pode ser desativada pelo estafeta.
- AA pode decidir o local onde presta a sua atividade, desde que se trate de uma zona coberta pela App, sendo livre de alterar a sua zona de atividades.
- AA é que decide se trabalha num dia em concreto, ou se fica inativo por alguns períodos e desenvolve a sua atividade em horários que o próprio define, bastando para o efeito colocar-se online na App nos períodos respetivos, sem que esteja sujeito a horários pré-estabelecidos ou a turnos, nem a indicação prévia dos seus horários.
- Uma vez por dia AA pode definir o valor do multiplicador, o qual poderia oscilar entre 0,9 e 1,1, mas atualmente somente permite escolher entre 1,0 e 1,1.
- AA mantém atividade aberta como empresário em nome individual junto da A.T. e emite faturas/recibos pelos serviços de entrega que realizou, que lhe são pagos pela ré.
-  AA pode realizar entregas disponibilizadas por plataformas geridas por outras entidades que não a ré, ou efetuar entregas diretamente por sua conta, sem que necessite de disso dar conta à ré.
- Os estafetas são livres de escolherem as suas rotas para realizarem as entregas.
- O estafeta pode escolher o sistema de navegação que pretende utilizar no serviço de entrega, ou não utilizá-lo, se não necessitar dessa ajuda.
- Não existem penalizações pelo modo como os estafetas realizam as suas entregas.
- Os estafetas podem substituir-se por outra pessoa na realização de entregas, sem que careçam de autorização da ré.
- Para realizar as suas entregas AA utiliza o seu veículo, o seu telemóvel e uma mochila que adquiriu.
- A ré não efectua avaliação da qualidade da atividade dos estafetas, apenas dispondo de uma avaliação de satisfação pelos clientes que não interfere no valor da remuneração devida aos estafetas pelas entregas.
Perante esta factualidade podemos já adiantar que a mesma se revela de insuficiente para afastar a presunção de laboralidade e concluir que o estafeta AA presta a sua atividade com real autónoma, pois o facto de ter alguma autonomia/liberdade designadamente:
- no que respeita à sua disponibilidade para trabalhar (é o AA quem decide se trabalha num dia em concreto, ou se fica inativo por alguns períodos e desenvolve a sua atividade em horários que o próprio define, bastando para o efeito colocar-se online na App nos períodos respetivos, sem que esteja sujeito a horários pré-estabelecidos ou a turnos, nem a indicação prévia dos seus horários)
- poder recusar, ignorar ou aceitar uma oferta de entrega sugerida pela App.;
- poder decidir o local onde presta a sua atividade, desde que se trate de uma zona coberta pela App, sendo livre de alterar a sua zona de atividades;
- poder desligar a geolocalização depois de ter aceite o serviço e poder escolher a sua rota;
- poder fazer substituir-se sem necessitar da autorização da ré (mas dentro de determinadas condições estipuladas pela Ré);
- poder realizar entregas disponibilizadas por plataformas geridas por outras entidades que não a ré, ou efetuar entregas diretamente por sua conta, sem que necessite de disso dar conta à ré, ou seja não está sujeito ao dever de exclusividade e ao dever de não concorrência;
- utilizar instrumentos de trabalho próprios (motorizada e smartphone e mochila)
- não ter penalizações pelo modo como realiza as suas entregas;
- da ré não efectuar avaliação da qualidade da atividade do estafeta dispondo apenas de uma avaliação de satisfação pelos clientes que não interfere no valor da remuneração devida aos estafetas pelas entregas;
- e o facto de o AA manter atividade aberta como empresário em nome individual junto da A.T. e emitir faturas/recibos pelos serviços de entrega que realizou, que lhe são pagos pela ré,
São tudo indícios que conferem alguma autonomia à sua atividade, sem que ponham em causa ou afastem a dependência que mantém a Ré.
Importa salientar que perante as novas formas de trabalhar através das plataformas digitais alguns dos indícios clássicos de subordinação jurídica, não são de considerar operacionais, nem são de valorizar, pois só por si não afastam o novo tipo de dependência resultante de serviços prestados via plataforma digital. Entre os mencionados indícios estão os relativos ao local de trabalho, à propriedade dos instrumentos de trabalho e equipamentos, ao horário de trabalho determinado pelo beneficiário da atividade e o pagamento de retribuição certa, porque efetivamente não se adequam à atividade desempenhada por estes trabalhadores. Nesta nova era digital temos um trabalhador subordinado com contornos distintos dos tradicionais, mas ainda assim dependente e subordinado na forma como desenvolve a sua atividade, sendo certo que a ausência dos mencionados indícios é compensada por outros que são reveladores da subordinação perante a empresa que gere a plataforma, tais como o facto do estafeta estar inserido dentro da estrutura organizativa da empresa que gere a plataforma, recebendo ordens e instruções através do procedimento padronizado que se mostra instituído, estando também sujeito ao regime sancionatório por aquela implementado.
Com efeito, como resulta da factualidade apurada, o AA presta o seu serviço inserido na organização do trabalho da EMP01..., estando submetido às regras e à organização da plataforma, já que é esta que estabelece e regula os aspetos mais relevantes da atividade tais como a forma como desenvolve a sua atividade e o preço.
Cabe referir que a EMP01..., não é uma mera intermediária na contratação de serviços, que se limita a por em contacto os estabelecimentos comerciais, os consumidores e os estafetas, é sim uma verdadeira empresa que realiza uma atividade produtiva, que presta serviços de transporte e entrega dos mais diversos produtos, de forma altamente organizada, pois é quem determina as condições essenciais da prestação dos serviços, o preço e as condições de pagamento, sendo imprescindível para o exercício da sua atividade a contratação de estafetas, sem os quais não poderia prosseguir a sua atividade económica. Estes estafetas, como o AA prestam o seu serviço inserido na estrutura organizativa da Ré EMP01....
Na verdade, a factualidade provada não nos permite concluir que o AA tem o seu próprio negócio, a sua própria empresa ou o seu próprio empreendimento, ou seja, realiza a sua própria atividade económica negociando os preços ou as condições com os donos dos estabelecimentos, nem recebe dos clientes finais a sua retribuição.
Ao invés, a factualidade provada permite-nos concluir que o AA presta trabalho em negócio pertencente à EMP01..., ou seja, é empregado em negócio alheio, não tem clientes, nem fixa preços, nem tem qualquer tipo de responsabilidade perante o cliente, está inserido na organização de trabalho daquela plataforma digital, sujeito às diretrizes organizativas determinadas pela empresa que a gere e impostas, desde logo, no contrato de adesão que teve de assinar para poder desempenhar a sua atividade. Acresce ainda o facto da EMP01... deter o poder sancionar, pois nas condições por ela ditadas, com grande amplitude, pode desativar ou suspender a conta do estafeta, impedindo-o de exercer a sua atividade.
Em suma, o AA está sujeito a diversas formas de controlo e de avaliação algorítmica por parte da plataforma, o que não pode deixar de ser considerado uma manifestação do poder de direção e disciplinar que a empresa que gere a plataforma exerce para com o AA, o que evidência, sem margem para dúvida, a dependência própria da relação laboral, que a Ré não logrou ilidir.
Como se afirma no Acórdão de unificação da doutrina proferido pelo Supremo Tribunal Espanhol, em 25.09.2020 a propósito dos estafetas numa situação equiparada a esta “riders/estafetas não dispõem de uma organização empresarial própria e autónoma, prestam os seus serviços inseridos na organização de trabalho do empregador, submetidos à direcção e organização da plataforma como demonstra o facto de a EMP01... estabelecer todos os aspectos relativos à forma e preço do serviço de recolha e entrega de tais produtos;
Ou seja, tanto a forma de prestação do serviço como o seu preço e forma de pagamento são estabelecidos pela EMP01...; a empresa emite instruções que lhe permitem controlar o processo produtivo e instituiu meios de controlo que incidem sobre a atividade e não apenas sobre o resultado, mediante a gestão algorítimica do serviço, as avaliações dos riders e a geolocalização.”
Em síntese, o AA presta a sua atividade de entrega e recolha de mercadorias, para uma organização produtiva que não é sua, mas sim da EMP01..., já que a partir do momento em que se liga à plataforma ele passa a integrar um serviço por ela organizado que não se limita a encomendar a recolha e a entrega da mercadoria, mas estabelece a forma como o deve fazer, controlando diversos aspetos através da aplicação, decidindo quanto ao preço, a forma de pagamento e a taxa de entrega, nada recebendo o estafeta, em regra, do cliente, ficando o processo de faturação a cargo da plataforma.
Daqui resulta que a Ré não ilidiu a presunção de laboralidade, pelo que mais não resta do que reconhecer a existência do contrato de trabalho e consequentemente será revogada a decisão recorrida, sem que antes se deixe em tom de desabafo, a reflexão assertiva efetuada a este propósito por o Prof. João Leal Amado[8] “ao olhar para um qualquer estafeta, daqueles que percorrem velozmente as ruas nas suas motos (ou, mais lentamente, pedalando nas suas bicicletas), creio que nenhum de nós se convence, seriamente, de que ali vai um empresário – seja um microempresário, um motoempresário ou um cicloempresário...
Não (…) Ali vai, motorizado ou pedalando, um trabalhador dependente, um trabalhador do século XXI, diferente, decerto, dos seus pais, avós ou bisavós, mas, afinal, ainda um trabalhador dependente – um subordinado de novo tipo, com contornos distintos dos tradicionais, mas, em última instância, ainda dependente e subordinado na forma como desenvolve a sua atividade”.
Em face do exposto mais não resta do que julgar o recurso procedente.
Por último apenas uma pequena nota relativamente à questão da inconstitucionalidade da presunção de laboralidade, por violação do disposto nos artigos 13.º, 18.º n.º 2 e 3 e 61.º da CRP. suscitada pela recorrida em sede de contra-alegação, apenas para dizer que não concordamos com o entendimento da recorrida não padecendo assim a nova presunção de laboralidade de qualquer inconstitucionalidade.
Na verdade, as novas formas de prestação de trabalho, designadamente nas plataformas digitais, atentas as suas especificidades, tornaram premente adaptação às regras do direito do trabalho de forma a abranger tais situações, surgindo assim a necessidade de criar um regime próprio em matéria de presunção da laboralidade, não configurando tal regime qualquer discriminação relativamente às plataformas digitais.
A proibição de discriminação não significa uma igualdade absoluta em todas as situações, nem proíbe diferenciação de tratamento[9] e sendo assim, nada impede que realidades diferentes sejam tratadas de forma diferente, sem que tal constitua qualquer violação ao princípio da igualdade.
Quanto à limitação inadmissível à liberdade de iniciativa económica privada que a nova presunção de laboralidade possa constituir, como defende a recorrida, importa atentar noutros direitos/deveres tais como a obrigação que o Estado tem de intervir na organização e desenvolvimento económico (art.º 80 e ss. CRP), designadamente quando surgem situações novas que urge regular por estarem desprovidas e desprotegidas pela lei, designadamente pela lei laboral.
Em face do exposto teremos de concluir que a nova presunção de laboralidade prevista no artigo 12.º - A do CT não viola os mencionados preceitos constitucionais.

V– Decisão

Pelo exposto e nos termos dos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 663.º do Código de Processo Civil, acorda-se, neste Tribunal da Relação de Guimarães:

- em não admitir o documento n.º 9 apresentado com a contra alegação e consequentemente determina-se o seu desentranhamento e a devolução à recorrida, que vai condenada na multa de valor correspondente a 0,5 UC (artigos 443.º, n.º 1, CPC e 27.º, n.º 1, do RCP).)
- em julgar procedente o recurso de apelação interposto pelo Ministério Público, e consequentemente declara-se reconhecido o contrato de trabalho celebrado entre o AA e a Ré, com início em 11.09.2023 (data na sua inscrição na plataforma), por tempo indeterminado, enquadrável no conceito definido no artigo 11.º e 12.º A, do Código do Trabalho.
Custas a cargo da Recorrida.
Notifique.
Guimarães 3 de Outubro de 2024

Vera Maria Sottomayor (relatora)
Maria Leonor Barroso
Francisco Sousa Pereira
***
Voto de esclarecimento:
O voto visa apenas um ponto: vejo de modo diferente o conceito de “equipamentos e instrumentos de trabalho”. O indicador deve adequar-se às novas formas de organização do trabalho, que se socorrem também de diferentes ferramentas de trabalho, menos clássicas porque menos “físicas”, conforme expresso no acórdão que hoje mesmo, 3-10-2024, relatei no processo nº 2838/2023.1T8VRL.G1, para cujo aprofundamento remeto. Ressalvo que este último não trata a presunção de laboralidade em plataforma digital por lhe ser inaplicável.
Contudo, por coerência, deixo expresso que considero o software gerido pela ré EMP02... o instrumento e meio de trabalho mais determinante, a infraestrutura decisiva e essencial da actividade, sem o qual o negócio não se processaria àquela dimensão. A propriedade do smartphone, da motorizada e da mochila por parte do “estafeta” afigura-se subalterna relativamente à importância e dimensão do software.
Concorda-se que não é por simplesmente se utilizar uma plataforma digital que esta se converte no principal instrumento de trabalho, mormente quando nos deparamos com simples sites que apenas anunciam serviços existentes sem os executar. Nestes casos as plataformas digitais serão meras intermediárias na divulgação dos produtos, que depois os próprios utilizadores, por outras vias, que não a plataforma, adquirem.
Contudo os softwares (programas informáticos, aplicativos...) não se reconduzem todos à mesma importância, uns são bem mais complexos e têm mais funcionalidades que outros.
No caso, trata-se de um software complexo, repleto de funcionalidades, permitindo que toda a parte negocial de compra e venda nele se processe, funcionando como uma “loja digital” ao invés de física. Na verdade, é nesse software que são processados os pedidos e as vendas das mercadorias, é através dele que as entregas são distribuías pelos “estafetas, é através do GPS inserido no software que se “escolhem” os “estafetas” e onde também se podem visualizar os tempos de espera e de entrega, é ali que são inseridos os preços, etc..
O meio de produção mais importante parece-me, portanto, a infraestrutura da ré constituída pelo software que esta detém e gere, anotando-se que a ré EMP02... não é uma mera intermediária tecnológica, mas uma empresa que, através da plataforma digital, explora um negócio de recolha e entrega de mercadorias, com um processamento de serviço que só é possível centralizar em si em razão de tal infraestrutura (software).
                          
Maria Leonor Barroso (1ª adjunta)
***
Declaração de voto:

Voto a decisão, porquanto entendo também que no caso funciona a presunção de laboralidade identificada no acórdão, a qual não se mostra ilidida, mas, tendo designadamente em conta o facto provado sob o n.º 31.º, não acompanho a afirmação de que da matéria de facto provada decorre a manifestação do "poder disciplinar"  da ré sobre o prestador de actividade/estafeta em causa.
                  
Francisco Sousa Pereira (2.º Adjunto)


[1] Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2017, 4ª edição, pág. 229.
[2] Neste sentido, veja-se o acórdão do STJ de 02-02-2010, Revista n.º 942/07.2TVPRT.S1 - 1.ª Secção, disponível em www.stj.pt,com o seguinte sumário: “Um acórdão da Relação não constitui nem cumpre a função específica de um verdadeiro documento, que é a de servir de meio de prova de determinados factos que possam constituir fundamento da acção ou da defesa – cf. art. 523.º, n.º 1, do CPC – e não pode ser considerado como parecer – cf. arts. 525.º e 706.º, n.º 2, do CPC –, razão pela qual deve ser indeferida a sua junção, como documento superveniente, após a apresentação das alegações da apelação”.
[3] Maria do Rosário Palma Ramalho, Delimitação do Contrato de Trabalho e Presunção de Laboralidade no Código do Trabalho – Breves Notas, in “Trabalho Subordinado e Trabalho Autónomo: Presunção Legal e Método Indiciário”, 2.ª edição, Selecção Formação Inicial do CEJ, pág 57 e 58. Menezes Cordeiro, in “Manual do Direito do Trabalho” 4.ª edição, pág. 533 e segs.
[4] Ac STJ de 26.09.1990, publicado em Acórdãos doutrinários do STA, n.º 348, págs. 1622 “o elemento essencial para a distinção em concreto deve ser a subordinação pois o tipo de prestação e a retribuição podem ser ambíguos e estar presentes de modo semelhante em ambos os contratos”
[5] “Presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital”: Revista do Ministério Público, n.º 175, pág. 181 e seguintes
[6] “Presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital”: Revista do Ministério Público, n.º 175, pág. 192
[7] As plataformas digitais e o novo artigo 12.°-A do Código do Trabalho: empreendendo ou trabalhando?”, Revista do STJ, n.º 3, disponível em www.arevista.stj.pt, pág. 96 e 97
[8] “As plataformas digitais e o novo artigo 12.°-A do Código do Trabalho: empreendendo ou trabalhando?, Revista do STJ, n.º 3, disponível em www.arevista.stj.pt, pág. 89
[9] Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, pág. 340