RECURSO DE REVISÃO
SENTENÇA
DOCUMENTO SUPERVENIENTE
INDEFERIMENTO LIMINAR
VIOLAÇÃO DE LEI
PRESSUPOSTOS
ESCRITURA PÚBLICA
FORÇA PROBATÓRIA
FALSIDADE
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
JUNÇÃO DE DOCUMENTO
CERTIDÃO
PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO
PRINCÍPIO DA AUTO-RESPONSABILIZAÇÃO DAS PARTES
ATO INÚTIL
Sumário


I - Tendo a Autora requerido prazo para a junção de documento que está em poder de uma entidade terceira, e concedido este, vindo aquele depois solicitar a intenvenção do tribunal junto de tal entidade, para tanto invocando motivos que não comprova, não é o tribunal obrigado a substituir-se à parte na junção de tal documento
II - Tal exigência de intervenção do tribunal na remoção do obstáculo invocado pela Autora só se justifica numa das situações previstas no art. 6º nº 4 do CPC, ou seja, quando e se a parte alegar justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade ou o cumprimento de ónus ou dever processual,
III - De facto, não pode a parte faltosa exigir a intervenção do tribunal em sua substituição, quando foi manifesta a sua inépcia, inabilidade ou desinteresse em promover os termos do processo, nem se podendo esperar que o tribunal volte, em redobrada e eventualmente excessiva atitude de cooperação voltar a questionar a parte sobre os elementos probatórios que não juntou ou voltar a incentivá-la nesse sentido.
IV - Fundando-se o recurso de revisão de sentença em documento junto pela requerente, nos termos do art. 696º al. c) do CPC, deverá esse documento ser novo e superveniente para o processo, nunca antes nele apresentado, e, de forma autónoma e independente dos demais meios de prova, ter a virtualidade de modificar a decisão a favor da requerente, revelando-se como prova auto-suficiente para destruir a prova que constituiu fundamento decisivo da decisão revidenda. Se assim não for, ou seja, se aquele documento não por, “por si só”, prova bastante para o efeito, não tem o mesmo validade como fundamento da requerida revisão.
V - Em ordem à arguição de falsidade de uma escritura pública, para os efeitos do art. 372º nº 2 do CC, deverá ser invocado que na mesma são atestados factos que não foram percepcionados pela autoridade ou oficial público, qualquer facto que na realidade se não verificou, ou como tendo sido praticado pela entidade responsável qualquer acto que na realidade o não foi, não bastando fazer sugestões, juízos de valor e de dúvida, ou conjecturas a respeito do que eventualmente se terá verificado, de onde não resulte qualquer imputação de falsidade do aludido documento.

Texto Integral


REVISTA 6381/19.5T8ALM.L1-A-2.S1


Em 21/09/2019, AA e BB intentaram uma acção declarativa de reconhecimento de união de facto, sob a forma de processo ordinário contra o Estado português, representado pelo Ministério Público.

Os dois requerentes estavam representados por uma mesma advogada.

Essa acção veio a ser julgada procedente por decisão sumária do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) proferida a 24/02/2021 (por relator que não foi o do acórdão recorrido) no recurso contra a sentença de 1.ª instância que a tinha julgado improcedente.

Tal decisão singular está transitada desde 19/03/2021 (foi notificada por carta elaborada a 02/03/2021).

O TRL aditou factos aos que vinham dados como provados na decisão da 1.ª instância. Os factos aditados, para além da transcrição integral das cláusulas constantes da escritura pública, foram os relativos à união de facto desde 01/12/2012: “E) Os autores passaram a viver em comunhão de mesa, cama e habitação, um com o outro, como se fossem casados, de forma pública, contínua e duradoura, com o objectivo de constituir família, desde o dia 01/12/2012, no Brasil, relação essa que continua nos mesmos moldes, agora que residem em Portugal”.

O TRL aditou tais factos provados com base na conjugação da escritura pública declaratória da união estável com pacto de separação total de bens, celebrada entre os requerentes a 03/01/2019, com a prova testemunhal por eles produzida no decurso do processo.

Em relação à escritura pública explicou-se: “Estão provadas as declarações feitas na escritura, mas a escritura não prova que sejam verdadeiras as declarações produzidas. Daí a necessidade de haver um complemento de prova. O teor da escritura pública não foi posto em causa pela prova testemunhal produzida, nem pela demais prova documental carreada. Não se pode dizer que dessa escritura constam palavras assertivas e nada mais, uma vez que, como vimos, com esse acto os autores ingressaram no instituto da união estável, de tal fazendo prova o acto público, assumindo a titularidade de direitos e de obrigações.

A 31/10/2023, CC, na alegada qualidade de cabeça-de-casal da herança de BB, apresentou, ao abrigo do artigo 696º al. b) e c) do CPC, recurso de revisão do acórdão do TRL.

Alegou para o efeito, no que importa, o seguinte:

- Teve conhecimento do acórdão por parte de um irmão seu que foi citado na providência cautelar de alimentos provisórios requeridos por AA (convivente e requerente na acção de reconhecimento); conhecimento que ocorreu no período de férias judiciais após 21/07/2023, data em que o seu irmão foi citado da referida providência porque esse acórdão [sic], acompanhava os documentos da mesma; o prazo terminaria a 30/10/2023 (porque se suspendia em férias judiciais); ela própria só foi citada da referida providência a 09/10/2023 e neste caso o prazo terminaria a 08/12/2023. No entanto por cautela processual, invoca a possibilidade da remessa da peça até três dias úteis após a data de 30/10/2023 ao abrigo do art. 139/5 do CPC

O pressuposto para a revisão estriba-se nos termos do art. 696/-b-c do CPC:

- In casu, a falsidade de documento (por falsidade da assinatura) na parte em que teve intervenção o falecido BB na escritura pública de 03/01/2019.

-Falsidade também de depoimento face ao que podia ou não podia depor na referida escritura.

- E ainda o documento/escritura não podia ser do conhecimento sério e esclarecido do falecido. E tal se funda na incapacidade de discernimento, de bem-estar psíquico e capacidade motora para assinar que pode e deve ser provada por documento médico [fotocópia simples - TRL] e por testemunhas o que se junta como prova neste recurso.

I: ALEGAÇÃO EM SEDE DE REVISÃO:

No acórdão [sic] é suscitada uma união estável de Direito brasileiro. No entanto, a recorrente desconhece como o seu pai na altura poderia assinar e conhecer com discernimento o que estava a assinar na escritura. A alegada celebração de uma união estável, também alegadamente existente desde 2012, pode ter sido um facto consumado lavrado em escrito perante alguém que dificilmente poderia assinar tendo em conta a sua debilidade motora e psíquica e dificilmente poderia discernir e conhecer o que assinava, pode ter sido contextualmente criada encenada para que a AA obtivesse um efeito desejado: o seu reconhecimento como convivente de uma união estável com o falecido.

Não se sabe foi o que se passou aquando dessa celebração porque o seu pai não estava em condições de conhecer o conteúdo do que assinou ou mesmo em condições de assinar. Mas pode a mesma pessoa ter lá sido colocada para assinar independentemente da condição em que se encontrava. O seu falecido pai já tinha 70 anos e já se encontrava debilitado fisicamente, tendo se deteriorado bastante o seu estado de saúde. O mesmo deixou de andar, circulava de cadeira de rodas, não mexia o punho direito e não conseguia assinar. O que sucedia já em 2019. Sobre a sua condição psicológica, após ter contraído o vírus “Zica” no Brasil e face à sua idade, contraiu um estado clínico de demência que se foi agravando, conforme relatório médico obtido em Portugal, doc. que se junta como doc. 4 na sequência de uma perícia médica efectuada ao seu pai, no processo de maior acompanhado movido pelo seu irmão que entretanto se extinguiu sem que tenha sido decretado o seu acompanhamento, pelo facto de ter falecido na pendência do processo. Este relatório, de 26/07/2022 merece algumas observações: contém falsidades quanto à propriedade de bens e outras situações relatadas, como o título da AA como companheira, quando é de facto cuidadora, dado que foi esta que acompanhou o seu pai às consultas. É, no entanto, revelador do debilitadíssimo estado de saúde do seu pai (também em 2019), principalmente no foro psicológico e quanto à sua autonomia, quando a requerente intentou o processo para que fosse reconhecida a união de facto. Estranhamente, o acórdão [sic] do TRL reconhece a união de facto desde 2012, quando o averbamento do divórcio do seu pai com a sua segunda mulher só foi reconhecido em Portugal no ano de 2014, haverá, pois, aqui, uma quebra de informação sobre o divórcio do seu pai ao mesmo TRL que erradamente decidiu a favor do reconhecimento da união de facto. No entanto, nessa mesma decisão do TRL consta um documento do seu pai a instruir o pedido, dizendo que vivia em união de facto com a AA.

A 06/12/2023, o Ex.mo titular do processo no TLR proferiu o seguinte despacho na parte que ainda importa:

[…]

A autora deve ainda ser notificada para que, no mesmo prazo, junte aos autos certidão do relatório médico em que também funda o pedido com base no art. 696/-c do CPC.

Deve ainda a autora identificar expressamente a parte contrária, com as indicações legais necessárias.

A 21/12/2023, a recorrente veio dizer o seguinte: […]

Quanto à certidão do documento relatório médico:

7 - Com efeito a recorrente não consegue em tempo útil obter a certidão desse mesmo documento, não só porque só logrou obter esse documento por via de um dos herdeiros e irmão no processo de herança do falecido, como também porque neste momento não conseguiria obter presencialmente o documento porque reside na ... há vários anos.

8 - No entanto, juntou o documento que é válido como cópia.

9 - Se é imprescindível a obtenção da certidão do documento, o que se pede ora ao Tribunal é o seguinte:

10 - Junta-se um documento comprovativo do processo de maior acompanhado onde o acompanhante e irmão obteve o documento.

11 - Esse documento nos diz que o processo onde se encontra aquele relatório médico correu termos no Tribunal de Comarca de Lisboa, Juízo local cível de ..., ... 2 processo 4509/21.4... (cf. documento junto).

12 - Donde, para extrair certidão, ao abrigo de um princípio de cooperação judicial processual para a descoberta da verdade, se requer que o TRL oficie àquele tribunal para lhe enviar certidão electrónica do documento.

13 - Ou então, usando a autoridade do TRL, se requer em alternativa que oficie o estabelecimento de saúde em causa que lhe envie certidão do documento em causa, porque por ora só se logrou juntar aquela cópia do documento.

Quanto à identificação da parte contrária:

15 - A identificação da parte contrária nos termos legais é a seguinte: AA […]

A 19/01/2024, por decisão singular do relator, foi indeferido o requerimento de recurso de revisão, quer por não vir instruído com a certidão do documento médico invocado como seu fundamento, quer porque esse documento é inócuo para os efeitos do 696/-c, parte final, do CPC, quer porque a recorrente não alega factos necessários ao preenchimento da previsão da falsidade da escritura pública como pressuposto no art. 696/-b, 1.ª alternativa, do CPC.

Formulada reclamação para a conferência, nos termos do art. 653º nº 2 do CPC, veio a ser proferido Acórdão que indeferiu a mesma, confirmando aquela decisão singular.

REVISTA

Inconformada, veio a autora interpor o presente recurso de revista, oferecendo alegações, cujas conclusões são as seguintes:

1) A Recorrente não pode concordar com a posição da conferência do Tribunal da Relação sobre a questão da certidão, da mesma maneira que não se concordava com a decisão singular.

2) Recorrente não conseguia em tempo útil obter a certidão desse mesmo documento.

3) A Recorrente logrou obter o documento em causa documento por via de um dos herdeiros e irmão no processo de herança do falecido BB, ou seja, não o tinha como certidão ou original na sua mão porque não tem uma relação com o seu irmão de proximidade territorial, por forma a que a ele tivesse acesso de forma rápida ou imediata;

4) Só teve conhecimento deste documento como parte de um processo de maior acompanhado e não o obteve nem tratou dele junto de um Hospital;

5) A junção deste documento ocorre na sequência do conhecimento que a cabeça de casal teve sobre uma providência cautelar de alimentos provisórios, a qual na prática, impôs a interposição de um recurso de revisão de uma sentença estrangeira reconhecida em Portugal, uma vez que discordava dos fundamentos daquela providência.

6) Impunha-se esse recurso de revisão na decorrência da mesma razão de discórdia que a opõe à requerente de alimentos: O não reconhecimento da requerente como legítima “companheira” de cama e mesa do seu falecido pai, o qual não teria o discernimento nem a autonomia suficiente para reconhecer a requerente de alimentos com tal;

7) só através do processo judicial poderia obter a certidão necessária - uma certidão de processo judicial - De valor e contexto diferente daquela obtida no hospital;

8) mesmo que a Cabeça-de-casal e ora Recorrente quisesse, não conseguiria obter a certidão junta do Hospital ... sem que a mesma fosse ordenada por um Tribunal Judicial.

9) Este documento (cópia) foi obtido por via do seu irmão (da Recorrente) DD no tal processo de maior acompanhado identificado pelo número de Processo: 4509/21.4... que corre termos na Comarca de Lisboa, Tribunal de ..., Juízo local cível, Juízo: ... 2

10) Até hoje o Tribunal não se dignou a responder esse pedido de certidão feito a 5 de Fevereiro de 2024 por forma a suprir a falta de certidão.

11) A Recorrente tentou junto do Hospital ... em vão, obter a certidão, que lhe foi negada por referência ao RGPD.

12) E nisto, nem conseguiu obter a certidão deslocando-se ao Hospital, nem conseguiu pedindo directamente ao processo, ou seja, foi administrativamente (e judicialmente) impedida de a obter em tempo útil.

13) Só o Tribunal como requerido poderia obter a mesma certidão e não a Recorrente e mesmo assim, por causa de um ataque informático (A agravar toda a situação) a mesma não teria acesso aos relatórios e exames mas teria acesso à certidão do documento que juntou.

14) A Recorrente fez o que lhe deixaram fazer--Entidades administrativas e judiciais e o Tribunal “A quo” eximiu-se ou recusou-se a prestar oficiosamente e a pedido a sua cooperação em obter a tal certidão.

15) a Recorrente recorreu com toda a legitimidade ao Tribunal da Relação para oficiar o Tribunal onde corria o processo de maior acompanhado para a obter, o que salvo melhor opinião não lhe é vedado por nenhuma disposição processual.

16) Obter a certidão em tempo útil é algo que se coloca também à recorrente pelo facto de não conseguir obter presencialmente no Hospital - O que seria por regras de experiência, o expediente mais rápido - porque reside na ... há vários anos e teria a dificuldade de se deslocar ao Hospital para tratar dessa certidão.

17) Mesmo tendo-o feito, foi-lhe recusada a certidão.

18) E discordando novamente, do Acórdão, entende que não há violação dos art.º 698.º 2 e 699.º n.º 1 do CPC uma vez que estes mesmos dois artigos não proíbem expressamente que a Recorrente requeira esse mesmo pedido de certidão ao Tribunal quando não o possa (pelas razões expendidas) fazer pelos seus meios ou quando estes acarretem demora ou a necessidade da prática de actos morosos ou que aumentem o recurso desnecessário a mais expediente.

19) Essas duas normas e o demais previsto no CPC não proíbem o recurso a este pedido.

27) O Tribunal da Relação viola com esta decisão não só o prescrito nos termos do arts. 6.º n.º 1 e 2.º do CPC e ainda o art.º 7.º n.º 1 e n.º 4 do CPC.

28) E com esta decisão não respeita o prescrito sobre esta matéria no RGPD e ainda na Lei n.º 26/2016 de 22 de Agosto”.

29) Suscitam-se expressamente as nulidades atinentes aplicáveis a esta matéria, nos artigos 615.º n.º 1 b), d) do CPC e 666.º do CPC.

30) Sobre a inocuidade do documento médico e a alegação de falsidade de assinatura e de teor do documento-escritura de reconhecimento da união estável repete-se a discórdia de todos os argumentos de facto e de Direito que o M.mo relator proferiu a este respeito e a parte Recorrente mantém tudo o que alegou no seu Recurso, neste aspecto, devendo o mesmo ser apreciado nos fundamentos que expôs.

A recorrida contra-alegou, assim concluindo:

61.Por excepção requer a não admissibilidade da Reclamação, por ser este intempestivo nos termos do artigo 643º CPC e diante da decisão semelhante no acordão do STJ por unanimidade em 15-12-2022, no processo 31803/15.0T8LSB.L1-A-A.S1.

62. Ora, restou comprovado que a Recorrente intentou a presente Revisão com fulcro no artigo 615 nº1 b), d) do CPC sem que conseguisse provar qualquer ato de debilidade ou suposta incapacidade mental do Sr. BB. Ou qualquer nulidade.

A Recorrente já tinha ciência do documento (Relatório pericial) desde no mínimo Agosto-2022, quando o Sr. irmão DD juntou no processo simulação de venda de imóvel do pai para a Recorrente e sua irmã.

Facto de residir na ... não seria óbice de requerer a irmã a qual contratou o advogado para defender o pai no processo de acompanhamento de maior, e solicitá-lo para requerer uma certidão.

63. Mesmo se a Recorrente tivesse juntado a certidão do laudo pericial, este atesta que a incapacidade absoluta do Sr. BB se inicia em dezembro de 2021. A Escritura foi lavrada pelo tabelião brasileiro em 2019. A Decisão da declaração da união de facto, no Acordão transitou em julgado em 21/4/2021. O documento é inócuo pois não atesta que o Sr. BB em 2019 estava incapacitado para assinar a escritura notarial, pela lógica do raciocínio, ao contrário afirma que estava capacitado em 2019.

64. Não se trata de Revisão de uma sentença estrangeira, e sim de uma acção declarativa de Reconhecimento de União defacto. A escritura serviu como um dos elementos de provas, junto com as testemunhas, fotos e outras provas documentais.

65. Para além disso, a Recorrente não contestou a procuração forense assinada em 17 de novembro de 2021, por seu pai no Processo n. º 3516/21.1..., nem mesmo quando o Sr. DD alegou a suposta incapacidade do pai, ao contrário impugnou que o Sr. DD não provou que o pai não poderia ser representado em juízo.

66. A Recorrente não contestou quando a sua irmã D.ra EE, usou dos poderes da procuração até à data de óbito, para administrar o patrimônio, contratar advogado, etc. Gravação)

65. Portanto, não há qualquer fundamento que prove que Sr. BB em 2019 seria incapacitado para assinar a escritura pública em tabelião brasileiro, e portanto não há qualquer nulidade para revisar a decisão no acordão processo n.

66. A Recorrente nunca intentou qualquer acção de falsidade de documento nem em Portugal, nem no Brasil.

67. Além do mais, a Recorrente omitiu e alterou a verdade dos factos, tentando induzir a erro, o Tribunal, ao não impugnar em nenhum momento, a procuração assinada pelo Sr. BB em 17 de novembro de 2021, ao aceitar que a irmão continuasse a usar os poderes da procuração para gerir o património do Sr. BB.

68. Na sua contestação pag. 35 e 36, impuguna que o irmão Sr. DD não logrou em demonstrar que o pai estava supostamente incapacitado para estar em juízo, no processo de simulação de venda de imóvel do pai para a Recorrente e sua irmã.

69. No presente caso, resulta patente a alteração consciente da verdade dos factos pela Recorrente, pelo que imperiosa, a sua condenação como litigante de má-fé, devendo ser condenada em multa e indemnização em favor da Recorrida.

70. Portanto, a Recorrente deduziu a pretensão da Revisão do Acordão cuja falta de fundamento não devida ignorar, conforme preceitua o artigo 542 nº 2, al. a) do Código de Processo Civil;

A Recorrente alterou a verdade dos factos relevantes para a decisão da causa, conforme preceitua o art. 542.º, n.º2, al. b) do Código de Processo Civil;.

71. Assim, na forma dos artigos 542.º e artigo 543.º do Código de Processo Civil, requer ao douto Tribunal que declare o A. litigante de má-fé, condenando-o no pagamento de multa a ser arbitrada pelo douto Tribunal, bem como no pagamento de indemnização consistente: a) no pagamento do reembolso das despesas efetuadadas pela Recorrida no presente processo; b) no pagamento de honorários advocatícios da mandatário da Recorrida.; c) na satisfação dos restantes prejuízos sofridos pela Recorrida, em valor que seja adequado à conduta do litigante de má-fé.

72. Diante do exposto, o laudo documento juntado pela Recorrente trata se de um documento imprestável e inócuo para anular a escritura pública de união estável e

consequentemente anular ou Revisar a decisão do Tribunal da Relação, este documento somente comprova que o Sr BB em 2019 era capaz de assinar a escritura notarial.

Termos em que, nestes e nos demais termos do Direito requer a V. Excelência a não admissibilidade da Reclamação nos termos do artigo 643.º1 do CPC, mantendo a decisão do acordão do Tribunal da Relação de Lisboa.

Se não entender pela intempestividade da Reclamação, requer a V.Exa que sejam integralmente rejeitadas as alegações do Recorrente com o indeferimento da presente reclamação.

Requer a condenação da Recorrente nos termos dos artigos 542.º e artigo 543.º do Código de Processo Civil

Admitida a revista, porquanto a decisão recorrida põe termo ao processo, cumpre decidir, tendo presente que são as conclusões das alegações recursivas que delimitam o objeto do recurso, estando vedado ao tribunal de recurso conhecer de matérias ou questões nelas não incluídas, com excepção daquelas que são de conhecimento oficioso (cfr. art. 635º nº 4, 639º nº 1, 608º nº 2, ex vi art. 679º, todos do CPC).

Apreciando:

A decisão recorrida constitui Acórdão do tribunal da Relação de Lisboa que confirmou a decisão singular de indeferimento do recurso de revisão, proferida em 19/01/2024, “quer por não vir instruído com a certidão do documento médico invocado como seu fundamento, quer porque esse documento é inócuo para os efeitos do 696 al. c), parte final, do CPC, quer porque a recorrente não alega factos necessários ao preenchimento da previsão da falsidade da escritura pública como pressuposto no art. 696/-b, 1.ª alternativa, do CPC.”

Vejamos o objecto do recurso:

1. Num primeiro momento saber se, face à informação dada ao processo pela requerente de que não conseguiu juntar o documento em causa aos autos, se impunha ao tribunal oficiar nesse sentido à entidade sua detentora, primeiramente junto do Tribunal de Comarca de Lisboa, Juízo local cível de ..., ... 2 processo 4509/21.4..., onde comprovadamente correu termos o processo de maior acompanhado, onde se encontra aquele relatório médico, ou, em alternativa, ao estabelecimento de saúde, Hospital ..., onde tal relatório foi elaborado, a fim de os autos integrarem a certidão do documento em causa, pese embora já se encontre junta a respectiva cópia, dessa forma, por cooperação do tribunal, se colmatando a carência probatória que ele próprio entendeu por bem assinalar.

Concomitantemente com a questão apontada, haverá que ponderar se a certidão em apreço constitui documento que, por si só, se revela suficiente para modificar a decisão revidenda em sentido mais favorável à parte vencida (no caso a requerente);

2. Por último, apreciar se a requerente arguiu de forma correcta a falsidade da escritura pública de união estável com pacto de separação total de bens, celebrada entre os requerentes a 03/01/2019, escritura esta que constituiu fundamento da decisão sumária proferida no Tribunal da Relação de Lisboa, em 24/02/2021 transitada desde 19/03/2021, porquanto este Tribunal considerou, na matéria de facto provada, a transcrição integral das cláusulas constantes daquela escritura pública, relativos à união de facto desde 01/12/2012, nos termos seguintes: “E) Os autores passaram a viver em comunhão de mesa, cama e habitação, um com o outro, como se fossem casados, de forma pública, contínua e duradoura, com o objectivo de constituir família, desde o dia 01/12/2012, no Brasil, relação essa que continua nos mesmos moldes, agora que residem em Portugal”.

[Sendo que o aditamento de tais factos pela relação, foi feito “com base na conjugação da escritura pública declaratória da união estável com pacto de separação total de bens, celebrada entre os requerentes a 03/01/2019, com a prova testemunhal por eles produzida no decurso do processo]

Vejamos o ponto 1:

Na sua pretensão recursiva de revisão do Acórdão do TRL de 24/02/2021, que julgou procedente a acção declarativa de reconhecimento de união de facto instaurada em 21/09/2019, AA e BB contra o Estado Português, a requerente, para além do mais, e de forma confusa, sustenta desconhecer “como o seu pai na altura poderia assinar e conhecer com discernimento o que estava a assinar na escritura” [de união estável outorgada em 03/01/2019], segundo a qual os outorgante viveriam em união estável desde 2012, porque já nessa altura o mesmo sofria de debilidade motora e psíquica, dificilmente tendo capacidade para discernir e conhecer o que assinava, podendo ter ocorrido “encenação” “contextualmente criada… para que a AA obtivesse um efeito desejado: o seu reconhecimento como convivente de uma união estável com o falecido”.

Mais dizendo que o seu pai pode ali ter sido colocado “para assinar independentemente da condição em que se encontrava”, quando “já tinha 70 anos e já se encontrava debilitado fisicamente, tendo se deteriorado bastante o seu estado de saúde. O mesmo deixou de andar, circulava de cadeira de rodas, não mexia o punho direito e não conseguia assinar. O que sucedia já em 2019.”

Adiantando ainda que “sobre a sua condição psicológica, após ter contraído o vírus “Zica” no Brasil e face à sua idade, contraiu um estado clínico de demência que se foi agravando, conforme relatório médico obtido em Portugal, doc. que se junta como doc. 4 na sequência de uma perícia médica efectuada ao seu pai, no processo de maior acompanhado movido pelo seu irmão que entretanto se extinguiu sem que tenha sido decretado o seu acompanhamento, pelo facto de ter falecido na pendência do processo

Esclarecendo que “este relatório, de 26/07/2022 merece algumas observações: contém falsidades quanto à propriedade de bens e outras situações relatadas, como o título da AA como companheira, quando é de facto cuidadora, dado que foi esta que acompanhou o seu pai às consultas. É, no entanto, revelador do debilitadíssimo estado de saúde do seu pai (também em 2019), principalmente no foro psicológico e quanto à sua autonomia, quando a requerente intentou o processo para que fosse reconhecida a união de facto.

É esta última parte do dito relatório, que deixámos sublinhada, que nos presentes autos se considerou ter interesse para a decisão da causa, a ponto de o tribunal ter ordenado a notificação da requerente para juntar a respectiva certidão.

E a questão em apreço reside fundamentalmente na circunstância de a requerente, aduzindo diversos argumentos, ter dito ser-lhe impossível ou muito difícil proceder à junção da dita certidão do mencionado relatório hospitalar,

Quer por solicitação do mesmo ao Tribunal de Comarca de Lisboa, Juízo local cível de ..., ... 2 processo 4509/21.4... onde comprovadamente correu termos o processo de maior acompanhado em que foi requerido o pai da recorrente, onde se encontra aquele relatório médico, quer junto do estabelecimento de saúde, Hospital ..., onde tal relatório foi elaborado, a fim de os autos integrarem a certidão do documento em causa.

Acabando por solicitar a cooperação do tribunal nesse sentido, ou seja, pedindo ao tribunal que oficiasse àquele processo ou à dita unidade hospitalar, entidades que têm em seu poder o dito o relatório, para que procedesse ao envio desse mesmo relatório.

Tendo sido em resposta a esta solicitação da parte que o Senhor juiz titular proferiu o despacho que depois veio a merecer a confirmação do colectivo de Desembargadores, no Acórdão ora sob revista.

Apreciando:

O Acórdão recorrido pronuncia-se alargada e muito acertadamente a respeito da natureza e características de que deve revestir-se o documento superveniente como elemento crucialmente fundamentador da revisão extraordinária da decisão transitada, elucidando, para lograr o desiderato revidendo, terá o mesmo de, por si só, ter a virtualidade modificar tal decisão em sentido mais favorável à recorrente.

Incumbindo à mesma, em sede de instrução do processo, o ónus de juntar tal documento ao processo, para tando envidando todos os esforços que estiverem ao seu alcance, mediante actividade investigatória própria, quando o documento estiver ao seu alcance, ou seja, quando se tratar de documento que não seja desconhecido, por não se encontrar em poder da parte contrária, que naturalmente não tem interesse na sua junção, ou mesmo de terceiro, ou porque, por circunstâncias diversas, se verifique a impossibilidade de o requerente o juntar em tempo útil, a tempo de ter sido utilizado na acção revidenda.

Propugna também o Acórdão recorrido que, devendo ser imputada à parte a responsabilidade pela não obtenção de documentos a que poderia aceder através de certidão emitida por entidade ou repartição pública, também no tocante à junção de uma certidão de um relatório médico-hospitalar, não há dúvida de que dele pode ser emitida uma certidão.

Mais sustentando que não cumprindo o requerente o ónus de junção de uma certidão, mesmo depois de o tribunal o convidar a tanto, para tanto concedendo prazo acrescido, importa tal omissão a rejeição do recurso excepcional de revista apresentado, pois que não pode o tribunal suprir tal omissão, seja por que meio for, mesmo através dos meios informáticos de suporte à sua actividade.

Existe, pois, um ónus sobre o recorrente, em observância do princípio da auto-responsabilização das partes, como do princípio do dispositivo, só dessa forma ficando também respeitada a imperiosa equidistância do tribunal em relação aos interesses dos contendores.

Ora, se tudo o que vem de ser dito é inquestionável, já questionável será quando o documento se encontra em pode der uma entidade terceira e a mesma rejeita o pedido da requerente no sentido de lhe emitir a respectiva certidão, com vista à sua junção ao processo de recurso de revisão extraordinário de sentença.

Ou seja, se, de todo em todo, a parte se vê impotente para lograr a certidão que pretende juntar ao processo, por inércia, má vontade ou rejeição da entidade emitente da certidão (designadamente pelo invocado motivo ligado ao no RGPD), será que o tribunal, em tal situação extrema, não tem a obrigação de intervir e solicitar (ou ordenar) oficiosamente a dita certidão?

O princípio da cooperação processual encontra-se consagrado no artigo 7º do CPC, como pedra angular de toda a estrutura do direito processual civil, como tal proclamado no diploma preambular do DL n.º 329-A/95 de 12 de Dezembro, referindo o nº 1 daquele normativo que, na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio.

Trata-se de princípio estruturante na dinâmica processial entre todos os seus intervenientes, estando intimamente ligado ao dever de gestão processual de que fala o artigo 6º do CPC, tanto quanto é certo que o ... assume o encargo de gestão do processo, operando no sentido da sua melhor agilização, colaborando no sentido de os eventuais entraves sejam benignamente (no sentido de ser imparcial e justo, de não ferir quaisquer interesses) ultrapassados, competindo-lhe eliminar formalismos que se revelem desnecessários ou inúteis, assim como promovendo e colaborando no envolvimento das partes de forma urbana e com toda a lisura, podendo e devendo também ser proactivo na sede do melhor esclarecimento das partes quanto às questões vertidas no processo, assim garantindo que o processo seja equitativo e justo, na senda do alcance da justa composição do litígio, em tempo breve e de modo eficaz.

Teixeira de Sousa (in “Introdução ao Processo Civil”, 2000, páginas 56/57) afirma que, do ponto de vista do tribunal, o princípio da cooperação impõe quatro poderes-deveres ou deveres funcionais: de esclarecimento [artigo 7º, n.º 2, do CPC]; de prevenção [artigos 590º, n.º 2, alínea b) e artigo 591º, n.º 1, alínea c)]; de consulta [artigo 3º, n.º 3, do CPC]; e de auxílio das partes [artigo 7º, n.º 4, artigo 418º, n.º 1, e artigo 754º, n.º 1, alínea a), do CPC].

No caso vertente, competindo à requerente, querendo fazer-se valer da força probatória de um documento, que só por si, pudesse ter a valia de alterar a decisão revidenda a seu favor, a mesma veio requerer a junção de certidão hospitalar para demonstrar que à data da escritura de união estável, já o ali outorgante BB não reunia condições psicológicas e mentais para compreender o sentido do que fora exarado ter sido declarado pelo mesmo.

Não obstante toda a prova dever ser junta com o requerimento inicial no recurso extraordinário de revisão, o tribunal acedeu ao requerido, concedendo prazo para que a requerente juntasse tal certidão hospitalar, assim dando expressão ao dito princípio de cooperação processual.

Veio mais tarde a mesma, aduzindo um conjunto de argumentos de diversa índole, desde a sua residência na ..., até à negação por parte da unidade hospitalar G..... .. ..... de lhe passar a dita certidão do relatório médico, por tal violar as normas de protecção de dados pessoais (RGPD), mas nada disto demonstrando (quando tal demonstração se lhe impunha), assim como a mesma negação por parte do tribunal onde pendeu o processo de acompanhamento de maior (que também não comprovou), veio requerer a intervenção do tribunal, solicitando que este oficiasse ao dito Hospital, no sentido de a dita certidão ser junta aos autos.

E aqui o Tribunal considerou que não tinha de assim proceder, quanto a nós com razão.

Desde logo porque o tribunal, pese embora deva observar e ser exemplar no tocante ao cumprimento daquele princípio de cooperação processual, não pode estar sujeito às omissões das partes no que toca às suas obrigações e ónus processuais, mormente em termos de carreamento para o processo de meios de prova, de forma expedita e atempada.

Com efeito, entendendo a requerente que o dito documento médico se revestia de força probatória bastante para “dar a volta” à decisão revidenda, deveria atempada e cuidadosamente ter cumprido com a obrigação de se munir do mesmo, não se satisfazendo com uma mera fotocópia, cuja força probatória diminuta não pode deixar de ignorar, bastando que a contraparte a impugne por desconhecimento.

Ora, face a tal omissão grave da requerente, e depois de lhe ter sido concedido prazo para a junção, que não cumpriu, vindo com uma série de “desculpas”, que nunca comprovou, o tribunal não era obrigado a substituir-se à parte no cumprimento dos seus deveres legais, máxime os probatórios determinantes do sucesso da sua pretensão.

Ao tribunal é exigível agir num quadro desta natureza, removendo o obstáculo referido pela parte, apenas quando se verifique uma das situações previstas no art. 6º nº 4 do CPC, ou seja, quando e se a parte alegar justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade ou o cumprimento de ónus ou dever processual,

Ora, como referido acima, não é essa a situação dos autos, porquanto a requerente não demonstrou, como lhe competia, tais obstáculos.

Contudo, nem por isso estava o tribunal de, mais uma vez, se assim o entendesse, oficiar no sentido requerido pela requerente, num gesto que não poderia a parte contrária de considerar já excessivo e desajustado ao equilíbrio processual e à justa composição dos interesses em jogo, de alguma forma, em tal caso, ficando contrariado ou algo afectado o princípio do dispositivo e também o princípio da autorresponsabilização das partes, já referidos, em termos da formulação das suas pretensões em juízo, e dos respetivos ónus que sobre as mesmas possam impender.

Mas não acedeu ao requerido, actuando dentro do seu poder discricionário de ponderação da situação.

De facto, não pode a parte faltosa exigir a intervenção do tribunal em sua substituição, quando foi manifesta a sua inépcia, inabilidade ou desinteresse em promover os termos do processo, nem se podendo esperar que o tribunal volte, em redobrada e excessiva atitude de cooperação voltar a questionar a parte sobre os elementos probatórios que não juntou ou voltar a incentivá-la nesse sentido.

Como se escreveu no Acórdão do STJ de 14/05/2019 (Processo n. 3422/15.9T8LSB.L1.S2), “Tal como refere, neste particular, Paulo Ramos de Faria (ob. cit., p. 15), se ao sistema de justiça estadual repugna a paragem negligente dos termos do processo, (…) também repugna a extinção deste, quando ainda é útil, com o consequente desaproveitamento de toda a actividade processual pretérita, obrigando (desnecessariamente) a que nova demanda seja instaurada. Deve, por isso, aceitar-se que a genérica proibição de comportamentos contraditórios abrange igualmente o Estado-tribunal e que, nessa justa medida, estando o juiz vinculado, desde logo, pelas suas próprias decisões, deve ser coerente e consequente com a sua atividade pretérita, sendo que esta proibição mais não é do que uma manifestação do princípio da confiança que decorre, por sua vez, do princípio da segurança jurídica plasmado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa (CRP).

De resto, o próprio Tribunal Constitucional vem utilizando tal princípio como parâmetro de organização ou disciplina do processo, afirmando que a garantia do processo equitativo comporta uma dimensão de segurança e previsibilidade dos comportamentos processuais, tutelando adequadamente a possibilidade de conhecimento das normas com base nas quais são praticados os atos e formalidades processuais, assim como as expectativas em que as partes fazem assentar a sua estratégia processual. Com efeito, o processo surge como um imperativo de segurança jurídica ligado a duas exigências: a determinabilidade da lei e a previsibilidade do direito. O processo justo e equitativo é também aquele cuja regulação prevê que a sequência de actos que formam o processo esteja pré-determinada ao pormenor pelo legislador, em termos de ser possível assegurar com previsibilidade que as partes são titulares de poderes, deveres, ónus e faculdades processuais e que o processo é destinado a finalizar certo tipo de decisão final. Os dois elementos são indissociáveis: a previsibilidade das consequências da prática dos atos processuais pressupõe que as normas processuais sejam claras e suficientemente densas, atributos sem os quais ficará violado o princípio da segurança jurídica.

Um processo equitativo é também um processo previsível. Uma forma processual só é justa quando o conjunto ordenado de atos a praticar, bem como as finalidades a cumprir, tanto na propositura, como especialmente no desenvolvimento da ação, seja expresso por meio de normas cujos resultados sejam previsíveis e cuja aplicação potencie essa previsibilidade. Para que haja previsibilidade são, porém, necessárias duas condições: que o esquema processual fixado na lei seja capaz de permitir aos sujeitos do processo conhecer os poderes e deveres que conformam a relação processual; e que haja univocidade de interpretação das normas processuais. É que se os sujeitos do processo não se encontram em condições de compreender e calcular previamente as consequências das suas acções, o processo é inidóneo à realização da tutela jurídica. A idoneidade funcional do processo implica, pois, que ele seja construído em termos de possibilitar aos sujeitos processuais o conhecimento das normas com base nas quais calculam o seu modo de agir (cf. Ac. do TC n.º 604/2018, disponível em www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ e no mesmo sentido Acórdãos do TC n.ºs 678/98, 485/2000, 183/2006, 335/2006 e 56/2003, todos disponíveis no mesmo sítio).

Ora, dir-se-á, desde logo, transpondo estas considerações para o caso dos autos, que as normas que impõem às partes o ónus de junção atempada dos elementos probatórios decisivos para o julgamento do pleito e que estipulam para a sua inobservância uma consequência processual não são inovatórias e nem sequer inesperadas, quer porque se encontram previstas na lei processual desde o Código de Processo Civil de 1939, quer porque, sendo claras, permitem que as partes saibam, de antemão, que a sua omissão terá a aludida consequência.

Foi o que se passou no caso vertente, pois que a requerente não podia esperar do tribunal outra reacção, se não a de cominar com o indeferimento do processo de revisão a falta de junção do dito relatório médico, que então, e só então numa leitura breve e menos atenta, se revelava essencial para o desencadear decisório.

Contudo, e aqui entramos na segunda face da moeda, a nosso ver, bem esteve o tribunal em negar tal intervenção oficiosa, porque, para além da inépcia probatória da recorrente, já melhor analisado o documento e a sua novidade, tal gesto se revelaria de todo inútil para o resultado do pleito a favor da requerente, porquanto, afinal, tal certidão, cujo conteúdo se encontrava patenteado no processo através de mera fotocópia, de nenhuma valia probatória se revestia para o desiderato pretendido pela requerente, nenhum mérito teria para alterar a decisão revidenda.

Ordenar a sua junção seria mesmo um acto que mal ficaria ao tribunal, porque de todo inútil, e como tal processualmente proibido.

De facto, explicando por que ordem de razões a dita certidão em nada interessaria à decisão, o Acórdão recorrido foi bem explícito quando referiu que, querendo a requerente colocar em causa a sanidade do pai à data da escritura de união estável (3 de Dezembro de 2019), e dessa forma abalar os alicerces probatórios da decisão revidenda ora sob revisão, dizendo a requerente que esse documento médico tem o mesmo teor da cópia junta aos autos cuja certidão não conseguiu obter, verifica-se, então o total despropósito de tal documento para abalar a força probatória da escritura de união estável de 2019, porquanto, datando esse relatório médico de 26/07/2022, e limitando-se o mesmo a reportar a data da incapacidade absoluta, total e permanente a Dezembro de 2021, ou seja, 3 anos depois daquela escritura, por ser aquela a primeira consulta de neurologia, na qual são descritas as repercussões a vários níveis da doença, tendo em consideração a escassez de informação clínica credível do acompanhamento médico prévio, de tudo resulta que, melhor avaliado o dito relatório médico, nenhuma força probatória o mesmo encerra para pôr em causa a sanidade mental do pai da Autora à data da escritura da união estável.

Tal documento, quando muito evidencia um estado de doença de um tempo muito posterior àquele que a requerente pretende demonstrar como estando já seu pai diminuído sob o ponto de vista mental, como tal de nada valendo para abalar os alicerces probatórios subjacentes à escritura de união estável.

Jamais logrando, por si só, alterar a decisão a favor da requerente.

Ora, tal circunstância, o total desvalor probatório do documento em apreço, ainda mais no contexto específico do recurso extraordinário de revisão, como veremos, em que o documento assume essencialidade probatória exclusiva, revelou-se, assim, e diremos principalmente, para além da inércia instrutória da requerente, a razão determinante do indeferimento liminar do recurso de revisão extraordinário em causa, já que o mesmo não é, por si só, suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida, como impõe o art. 696º nº 1 al. c) do CPC, impondo-se, pois, o indeferimento liminar do recurso.

Neste sentido se pronunciou o acórdão do STJ de 30/11/2023 (processo 1079/08.2TYLSB-X.L1-A.S1), postulando que : I - Não é de admitir liminarmente recurso extraordinário de revisão, tendo como fundamento a al. c) do art. 696.º do CPC […], condicionado cumulativamente aos requisitos da novidade (objectiva e subjectiva) e da suficiência, se, tendo em vista inverter a decisão transitada em julgado [….] a parte não demonstra nem alega ter empregue a diligência devida na obtenção prévia dos documentos invocados, preexistentes e cuja localização era conhecida, e se tais documentos trazidos a juízo não são suficientes para permitir a conclusão de que, se previamente apresentados, levariam o tribunal a uma decisão diversa da atingida na decisão cuja revisão se pretende.;

No mesmo sentido o Acórdão de 11/07/2023, proc. 20348/15.9T8LSB-D.P1.S1, segundo o qual “no recurso de revisão interposto com fundamento na alínea c) do artigo 696.º do CPC, a jurisprudência constante do STJ considera que a apresentação de documento só será admissível, quando: (i) o documento, por si só, e sem apelo a demais elementos probatórios, seja capaz de destruir o juízo probatório realizado em sede da decisão revidenda e imponha uma decisão mais favorável ao recorrente (requisito da suficiência); (ii) e quando o recorrente não tenha podido fazer uso do documento por desconhecimento da sua existência ou pela sua inexistência (requisito da novidade); iii) o documento deve visar a demonstração ou a impugnação de factos alegados pelas partes ou adquiridos para o processo que tenham sido essenciais para a decisão de mérito colocada em crise, não podendo em caso algum visar a prova de factos novos (requisito da prealegação).

Identicamente os Acórdãos de 22/06/2023 (proc. 2593/19.0T8VLG.P1.S1-A), de 29/09/2022 (processo 8325/17.0T8VNG.P1-A.S1) e de 02/02/2022 (processo 7361/15.5T8CBR-D.C1.S1), de 09/03/2021 (proc. 850/14.0YRLSB.S3, de 19/10/2017, 181/09.8TBAVV-A.G1.S1, de 29/06/2017 (proc. 90/13.6T2VGS-A.P1.S1), de 09/10/2013, proc. 4677/08.0TTLSB.L1-B.S1, de 19/09/2013 (processo 663/09.1TVLSB.S1), de 13/07/2010, 480/03.2TBVLC-E.P1.S1, de 17/09/2009 (processo 09S0318).

Jurisprudência esta, diga-se por ser de inteira justiça o reconhecimento do mérito, toda referida no Acórdão recorrido.

Do mesmo modo ali referida amplamente a jurisprudência das Relações, que aqui nos abstemos de consignar.

No referido Acórdão do STJ de 09/03/21, afirma-se o seguinte:

«A locução “por si só” constante da alínea c) do art. 696.º do CPCivil significa que o documento tem de ter força própria suficiente para levar à modificação da decisão a rever. Terá de se tratar de um documento decisivo ou crucial, no sentido de que a decisão revidenda teria sido diferente se o documento houvesse sido levado em consideração pelo julgador.

Compreende-se aqui o rigor da lei. A revisão vai colocar em causa o caso julgado. E o caso julgado é um valor que deve ser preservado. Parafraseando Teixeira de Sousa (Estudos Sobre o Novo Processo Civil, p. 568), diremos que “o caso julgado é uma exigência da boa administração da justiça, da funcionalidade dos tribunais e da salvaguarda da paz social (…) e garante a resolução definitiva dos litígios que os tribunais são chamados a dirimir. Ele é, por isso, expressão dos valores de segurança e certeza que são imanentes a qualquer ordem jurídica”. Por isso, só em situações que conflituam manifestamente com a justiça da decisão é que, na perspectiva da lei, o caso julgado deve poder ser postergado.

Fundando-se a revisão em documento, não basta, portanto, que se trate de um documento que, conjugado com a demais prova suplementar de livre apreciação, possa ou não interferir no juízo do julgador. Para isso qualquer documento sempre serviria. Muito ao invés, é preciso que se verifique que o documento, por si só (portanto sem o concurso adjuvante de outras provas), tem a virtualidade de levar à modificação da decisão a rever. Por isso dizem Fernando Amâncio Ferreira (Manual dos Recursos em Processo Civil, 8.ª ed., p. 316) e Francisco Ferreira de Almeida (Direito Processual Civil, II, p. 573) que se o documento não tiver a força suficiente para destruir a prova em que se fundou a decisão revidenda, não vale como fundamento para a revisão.

E como se aponta no acórdão deste Supremo de 19 de Setembro de 2013 (processo n.º 663/09.1TVLSB.S1, disponível em www.dgsi.pt) “o documento novo deve, por si só, assegurar uma decisão favorável, ou seja, se apresentado a tempo, criaria no Tribunal uma convicção diversa daquela a que chegou; daí que se possa afirmar que tem de existir nexo de causalidade entre a não apresentação desse documento e o de ter julgado como se julgou.”».

No mesmo sentido, lê-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14-01-2021, proc. n.º 1012/15.5T8VRL-AU.G1-A.S1, in www.dgsi.pt, o seguinte:

«[…] há-de tratar-se de documento que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a sentença se fundou; isto é, o documento deve impor um estado de facto diverso daquele em que a sentença assentou. Não basta que o documento tenha qualquer relação com a causa já decidida; há-de ser tal que persuada o juiz de que por outro meio dele a causa poderá ter solução diversa da que teve.

[…] Louvando-nos ainda no acórdão do STJ de 17.01.2006, “para servir de fundamento à revisão “é necessário que o documento, além do carácter da superveniência, faça prova de um facto inconciliável com a decisão a rever, isto é, que só por ele se verifique ter esta assentado numa errada averiguação de facto relevante para o julgamento de direito “(Rodrigues Bastos, Notas ao Código do Processo Civil, Vol. III, 3ª ed., pág. 319).

Alberto dos Reis (Código do Processo Civil Anotado, Vol. Vi, pág. 357) também ensina: “O magistrado para julgar se o documento é decisivo, deverá pô-lo em relação com o mérito da causa, deverá proceder ao exame do mérito e indagar qual teria sido o êxito da causa se o documento houvesse sido apresentado. Feito este exame, ou o magistrado se convence de que se o documento estivesse no processo, a sentença teria sido diversa e, neste caso, deve admitir a revogação; ou se convence de que, não obstante a produção do documento, a sentença seria a mesma, porque assenta sobre outras bases e está apoiada em razões independentes do documento - e neste caso deve repelir a revogação”.

O documento a que se refere o alª c) daquele artº 771º tem de corporizar uma declaração de verdade ou ciência, isto é, uma declaração destinada a corporizar um estado de coisas, pelo que deve ser um documento em sentido estrito. Terá ainda de ser um documento decisivo, dotado, em si mesmo, de uma força tal que possa conduzir o Juiz à persuasão de que, só através dele, a causa poderá ter solução diversa da que teve.»

Existe um outro aspecto que é igualmente de chamar à colação.

Se no processo onde foi proferida a decisão a rever o tribunal não podia, com as excepções legais, conhecer de factos não alegados, parece tautológico que a parte não pode fazer-se valer do recurso de revisão para introduzir na discussão factos novos e fundar nestes a modificação da decisão. O recurso de revisão não constituiu uma forma válida de suscitar questões, formular pretensões ou arguir excepções dotadas de novidade em relação à lide decida com trânsito em julgado.

Portanto, a suficiência do documento tem por referência as questões que cabia conhecer na decisão a rever e os factos que podiam servir de fundamento a essa decisão. O que significa que o documento em causa terá de representar um meio de prova que só por si permita decidir diferentemente factos de que o tribunal podia conhecer e de cuja nova decisão decorra só por si a alteração do dispositivo relativamente a questões de que houvesse de conhecer nos autos.”

Aqui chegados, impõe-se concluir no sentido da plena adequação formal e substantiva da decisão recorrida no tocante ao indeferimento liminar do recurso extraordinário de revisão, assim improcedendo a revista nessa parte.

II – Passando à segunda questão do objecto do recurso, apreciemos se a requerente arguiu de forma correcta a falsidade da escritura pública de união estável com pacto de separação total de bens, celebrada entre os requerentes a 03/01/2019.

Tendo aquela escritura pública constituído um dos fundamentos probatórios da factualidade provada, máxime a que nela se fez constar como sendo as declarações dos outorgantes, vem a requerente atacar a falsidade daquele documento, ao abrigo do art. 696º al. b) do CPC que estipula que a decisão transitada em julgado possa ser objecto de revisão quando “se verifique a falsidade de documento ou acto judicial, de depoimento…, que possam, em qualquer dos casos, ter determinado a decisão a rever, não tendo a matéria sido objecto de discussão no processo em que foi proferida”.

Vejamos:

Nos termos do art. 371º do Código Civil, “Os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora; os meros juízos pessoais do documentador só valem como elementos sujeitos à livre apreciação do julgador”.

Por seu turno, dispõe o art. 372º nº 1 do CC que “a força probatória dos documentos autênticos só pode ser ilidida com base na sua falsidade”, resultando do nº 2 que” O documento é falso, quando nele se atesta como tendo sido objecto da percepção da autoridade ou oficial público qualquer facto que na realidade se não verificou, ou como tendo sido praticado pela entidade responsável qualquer acto que na realidade o não foi.”

Assim, a força probatória concedida aos documentos autênticos por aquele normativo não se estende à veracidade ou verosimilhança, ou seja a correspondência com a realidade dos factos das declarações dos outorgantes-intervenientes.

Se, no documento, o notário afirma que, perante ele, o outorgante disse isto ou aquilo, fica plenamente provado que o outorgante o disse, mas não fica provado que seja verdadeira a afirmação do outorgante, ou que esta não tenha sido viciada por erro, dolo ou coacção, ou que o acto não seja simulado (ver Pires de Lima e Antunes Varela, «Código Civil Anotado», vol. 1, 4ª ed, pag. 328).
E a prova de que as declarações produzidas pelos particulares em presença do oficial público (notário) não correspondem à verdade não implica a necessidade de arguir a falsidade do documento por ele elaborado, tal como vem sendo geralmente entendido pela jurisprudência.

Reportando-nos à escritura pública de união estável celebrada perante o tabelião brasileiro, cuja falsidade a requerente diz imputar à mesma, haverá que reconhecer que a mesma, no fundamental, para o efeito pretendido, aduziu, no fundamental o seguinte:

- Desconhecer como o seu pai na altura poderia assinar e conhecer com discernimento o que estava a assinar na escritura.

- A alegada celebração de uma união estável, também alegadamente existente desde 2012, pode ter sido um facto consumado lavrado em escrito perante alguém que dificilmente poderia assinar tendo em conta a sua debilidade motora e psíquica e dificilmente poderia discernir e conhecer o que assinava, pode ter sido contextualmente criada encenada para que a AA obtivesse um efeito desejado: o seu reconhecimento como convivente de uma união estável com o falecido.

- Não se sabe foi o que se passou aquando dessa celebração porque o seu pai não estava em condições de conhecer o conteúdo do que assinou ou mesmo em condições de assinar.

- Mas pode a mesma pessoa ter lá sido colocada para assinar independentemente da condição em que se encontrava.

- O seu falecido pai já tinha 70 anos e já se encontrava debilitado fisicamente, tendo se deteriorado bastante o seu estado de saúde.

- O mesmo deixou de andar, circulava de cadeira de rodas, não mexia o punho direito e não conseguia assinar. O que sucedia já em 2019.

Ora, em ordem à arguição de falsidade da escritura em apreço, a recorrente não alega que na mesma seja atestada como tendo sido sido objecto da percepção da autoridade ou oficial público qualquer facto que na realidade se não verificou, ou como tendo sido praticado pela entidade responsável qualquer acto que na realidade o não foi, pelo que não cumpre a mesma o preceituado no transcrito art. 372º nº 2 do CC.

Bem diz o Acórdão recorrido que a recorrente se limitou a fazer sugestões, diremos nós conjecturas, de que “o falecido não teria podido estar presente na escritura, ou ter declarado o que é dito que declarou por não ter condições mentais para o efeito ou ter assinado o que dela consta por não ter condições físicas para o efeito. Mas não o afirma, limitando-se a pôr isso em dúvida. Não diz, realmente, que o falecido não esteve presente, não declarou e não assinou a escritura.

A recorrente limitou-se neste âmbito a debitar especulações das quais não resulta qualquer imputação de falsidade do aludido documento, pois que, para tanto, deveria ter alegado que o tabelião brasileiro atestou qualquer facto que na realidade não percepcionou naquele acto por si formalizado, a fim de ulteriormente sujeitar tais afirmações à filtragem dos meios de prova, não se limitando a emitir juízos de valor e de dúvida, suposições e conjecturas, sobre o que eventualmente terá sucedido, designadamente se o seu pai lá terá estado, se terá para lá sido levado e convencido a assinar o documento em apreço, para tanto se baseando num documento médico, cuja certidão nunca juntou aos autos e que, afinal, como acima deixámos bem evidenciado, de nenhum valor se revestia para pôr em causa a validade daquela escritura e por consequência da decisão revidenda.

De facto, nunca chegando a afirmar que o seu pai não esteve presente na escritura presidida pelo tabelião brasileiro, nem chegando a afirmar que ele seu pai não declarou o que o tabelião exarou que tenha pelo mesmo sido declarado, nem, ao contrário do que o tabelião disse, que ele nada assinou, a recorrente acaba por reconhecer que “não sabe o que se passou”, jamais, no contexto imaginativo-impugnatório por si aduzido, fazendo qualquer afirmação clara, categórica e peremptória, como era sua obrigação, que em si tivesse fáctico-jurídica para conduzir o tribunal a concluir no sentido da falsidade da escritura pública.

Aliás, como bem refere o Acórdão recorrido a recorrente “admite claramente que, embora com dificuldade, o falecido pode ter assinado a escritura e, por isso, implicitamente, que pode ter estado presente e ter declarado aquilo que foi dito que declarou.”

Bem concluindo a Relação quando assevera que “perante tudo isto este TRL não poderia adaptar outras afirmações feitas pela recorrente para lhes alterar o sentido que resulta de tudo o que consta da petição e lhes dar uma forma positiva de modo a poderem vir a constar factos que, provados, permitissem concluir pela falsidade da escritura em causa.

Isto é, sabendo que a recorrente não sabe o que se passou na escritura pública de união estável e nada de inequívoco, por isso, alegou no sentido da falsidade dela, o tribunal não pode dar seguimento à acção/recurso que teria que basear-se, nesta parte, na falsidade dessa mesma escritura pública.”

Enfim, em plena concordância com o Acórdão recorrido, improcede totalmente a pretensão de falsidade da escritura pública em causa.

Assim improcedendo a revista na sua totalidade.

DECISÃO

Por todo o exposto, Acordam os Juízes que integram a 7ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça em julgar a revista improcedente, confirmando-se o Acórdão recorrido.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 3 de Outubro de 2024

Relator - Nuno Ataíde das Neves

1ª Adjunta – Senhora Conselheira Fátima Gomes

2º Adjunto – Senhor Conselheiro Nuno Pinto Oliveira