I - Em sede de acidentes rodoviários, o ónus da prova da culpa, que impende sobre o lesado, tem sido jurisprudencialmente atenuado pela intervenção de uma prova de primeira aparência baseada em presunções judiciais simples (artigos 349.º e 351.º, do Código Civil), que permitem inferir que quem viola objectivamente uma regra de trânsito e, por causa disso, provoca danos a terceiros, o faz por razões que lhe são imputáveis, a menos que demonstre que tal violação se mostra alheia à sua vontade.
II – Embora não tenha sido apurada a velocidade a que circulava, há que imputar a responsabilidade pelo acidente ao condutor do veículo (por inobservância das normas estradais previstas nos artigos 18,.º, n.º1 e 24.º, n.º1, ambos do Código da Estrada), que embateu com a frente lateral direita na traseira sobre o lado esquerda do veículo da autora após esta, depois de ter retirado o carro do estacionamento longitudinal existente ao longo da berma direita da via, ter percorrido uma distância num máximo de 7/8 metros.
III – Embora não tenha sido apurada a velocidade a que circulava, o condutor do veículo embatente desrespeitou o dever de adequar a velocidade à circunstância de existir um parque de estacionamento ao longo da berma da estrada (que tornava previsível a saída de veículos e o seu início de marcha nesse trajecto) e de manter entre o seu veículo e o veículo atingido uma distância suficiente para evitar acidentes.
IV – Relativamente ao montante arbitrado pelo tribunal da Relação a título de compensação por danos não patrimoniais, a intervenção do STJ reporta-se à avaliação dos pressupostos normativos do recurso à equidade e dos limites dentro dos quais deve situar-se o juízo equitativo em face da individualidade do caso concreto, não lhe cabendo sindicar o exacto valor indemnizatório fixado.
V- Mostra-se adequado o montante de €10.000,00 para indemnizar os danos não patrimoniais sofridos pela lesada, vítima de acidente, com 55 anos à data do sinistro, que apresentou, em sua decorrência, um quantum doloris de grau 3 numa escala de 1 a 7; persistência de dores na coluna cervical e no ombro direito, que lhe dificultam o dormir e o descanso, necessitando de fazer medicação regularmente.
VI – O STJ tem vindo a perspectivar o dano biológico como um dano à integridade psicofísica do lesado, que afecta de forma relevante a funcionalidade do corpo nas suas vertentes física e mental, cuja ressarcibilidade autónoma tem vindo a ser afirmada independentemente do seu concreto enquadramento nas categorias normativas do dano patrimonial ou do dano não patrimonial.
VII - Quanto ao modo de cálculo do dano biológico, a jurisprudência deste tribunal tem convergido no sentido de que o mesmo deverá assentar num critério de equidade (cfr. artigo 566.º, n.º3, do CC), norteado por um método comparativo, que apresenta como referencial outras decisões judiciais sobre casos análogos (artigo 8.º, n.º3, do CC), sem prejuízo do auxílio de fórmulas matemáticas.
VIII – Há considerar justo e adequado o valor de €15.000,00 fixado pelo tribunal da Relação para ressarcimento de dano biológico onde foram ponderadas as seguintes circunstâncias: a idade da lesada ao tempo do acidente (55 anos), a esperança média de vida (que, para as mulheres se situava, no ano do acidente, 2021, no limiar dos 83 anos), as exigências próprias da sua actividade profissional habitual no confronto com a natureza das sequelas de que padece e a circunstância de ser provável que as mesmas tenham algum impacto negativo a nível das potencialidades de aumento de ganho no exercício da profissão habitual (consultora imobiliária), assim como o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 2,98 atribuído.
1. AA intentou acção declarativa comum contra Generali Companhia de Seguros, S.A,, pedindo a condenação da Ré1 a pagar-lhe o montante de €52.625,98, (acrescidos de juros compulsórios à taxa de 8%, vencidos e vincendos, desde a citação até efetivo integral pagamento, bem como deferido a dispensa pagamento da taxa de justiça e demais encargos), pelos danos decorrentes do acidente de viação causado por culpa do condutor do veículo seguro na Ré.
Alegou, para o efeito, que no dia 12 de Janeiro de 2021, o veículo ..-..-TT, sua propriedade, foi embatido (na traseira , parte lateral esquerda, pela frente direita do veículo ligeiro de mercadorias, matrícula ..-DI-.., conduzido por BB) após ter percorrido uma distância de cerca de 40 metros depois de ter saído do lugar de estacionamento longitudinal à via onde seguia, tendo feito, antes de iniciar a manobra, o sinal luminoso esquerdo e verificado que não circulava ninguém em nenhuma das duas vias de trânsito, atento o seu sentido de marcha.
Invocou, em consequência do acidente, ter sofrido danos que computou nos seguintes termos: não patrimoniais: €22.000,00; patrimoniais: €1836,04; danos futuros: €25.425,94; lucros cessantes: €3.364,00.
2. Após citação, a Ré contestou imputando a responsabilidade do acidente à Autora, impugnando também os danos alegados.
3. Realizado julgamento foi proferida sentença (em 02.05.2023), que julgou a acção improcedente, absolvendo a Ré do pedido.
4. Inconformada a Autora apelou, impugnando a matéria de facto. O tribunal da Relação de Guimarães, por acórdão (de 01.02.2024), rejeitou o recurso da matéria de facto e conhecendo da restante apelação, julgou o recurso parcialmente procedente condenando a Ré a pagar à Autora:
- por “dano biológico”, no sentido de consequências patrimoniais da afetação da capacidade geral ou funcional deste, no montante de €15.000,00, acrescida de acrescida de juros de mora legais civis desde a data da citação até efetivo e integral pagamento;
- pelos danos não patrimoniais no montante de €10.000,00, acrescida de juros de mora civis legais contados desde a data do trânsito em julgado da presente decisão até efeito e integral pagamento;
- pelos danos patrimoniais no montante de € 1.502,54 acrescida de juros de mora civis legais contados desde a citação e até efetivo e integral pagamento. o recurso procedente, condenando a Ré no pedido.
5. Interpôs a Ré recurso de revista, formulando as seguintes conclusões (transcrição):
“1. O recurso ora interposto do douto acórdão proferido é apresentado na firme convicção de que a matéria de facto apurada nestes autos impunha ao Tribunal a quo a adopção de uma decisão diferente da seguida, designadamente, quanto à responsabilidade no sinistro que deveria ter sido imputada de forma única e exclusiva à Apelada Autora.
2. Porque saía de um estacionamento, impunha-se à Autora Apelada que cedesse a passagem ao veículo seguro na Apelante.
3. Ao invés, a Autora Apelada não cedeu a passagem e logo após ter saído do estacionamento e tendo percorrido uma distância não concretamente apurada, mas não superior a 7 a 8 metros, foi embatida na traseira pelo veículo seguro na Apelante.
4. O condutor do veículo seguro na Apelante ainda tentou desviar-se para a esquerda, guinando, mas sem sucesso, face à proximidade que estava do veículo da Apelada Autora, nada mais podendo fazer para evitar o sinistro.
5. A única manobra causal do sinistro foi provocada pela Autora Apelada, pelo que se impõe a absolvição do pedido.
6. O Tribunal a quo na douta Sentença dos Autos, ao decidir como decidiu, violou o preceituado nos artigos 342.º e 487.º e seguintes, todos do Código Civil e, bem assim, o disposto nos artigos 29.º e 31.º do Código da Estrada.
Sem prescindir
7. A jurisprudência não constitui fonte de direito no ordenamento jurídico português, mas é comummente aceite pela comunidade jurídica que as suas decisões revestem a forma de verdadeiras linhas de orientação dos tribunais na formulação das suas decisões, em particular quando se trata da jurisprudência dos tribunais superiores.
8. Deste modo, os elementos objectivos trazidos aos autos pelo caso concreto, a generalidade das decisões dos tribunais, os critérios de orientação previsto na lei, em especial a delimitação aos danos graves, o bom senso e o equilíbrio, apontam como justa e equitativa a quantia de 5.000,00€ a título de danos não patrimoniais e de 4.000,00€ para o dano biológico.
9. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 496.º n.º 1, 562º, n.º 3, 564º, n.º 2 e 566.º n.º3 do Código Civil.
Deste modo,
10. Deve o douto acórdão proferido ser revogado e substituído por douto acórdão que absolva a Apelante do pedido e, no limite, que fixe em 5.000,00€ o montante de indemnização pelos danos sofridos pela Apelada a título de danos morais e em 4.000,00€ para o dano biológico, com as legais consequências.”.
6. Em contra-alegações a Autora defende a improcedência da revista, concluindo:
A - Deverá ser confirmado o Douto Acordão recorrido “in totum”.
B - Deverão julgar-se as sempre Doutas Conclusões proferidas pela Ré/Recorrente manifestamente improcedentes, por extrapolarem a matéria concretamente dada por provada e contida na Sentença com os números 3, 4 e 5, já supra referida.
C - Mantendo-se as indemnizações já fixadas no Acórdão recorrido, por inteiramente justas.”.
II – APRECIAÇÃO DO RECURSO
De acordo com o teor das conclusões das alegações (que delimitam o âmbito do conhecimento por parte do tribunal, na ausência de questões de conhecimento oficioso – artigos 608.º, n.º2, 635.º, n.4 e 639.º, todos do Código de Processo Civil – doravante CPC) impõe-se conhecer as seguintes questões:
• Da responsabilidade pelo acidente
• Do montante indemnizatório arbitrado
1. Os factos
1.1 Provados
1 - Em ... de Janeiro de 2021, pelas 10.25 horas, na Av. ..., em ..., ocorreu um embate, entre o veículo ligeiro, de matrícula ..-..-TT, “propriedade” da Autora e o veículo ligeiro de mercadorias, de matrícula ..-DI-.., “propriedade” de CC, conduzido por BB.
2 - A Av. ... tem quatro vias, duas em cada sentido de trânsito, com separador central e bordejadas por estacionamentos longitudinais para veículos.
3 - O veículo de matrícula ..-..-TT, estava estacionado no estacionamento longitudinal existente ao longo da berma direita da Av. ..., no sentido de trânsito Largo .../Rotunda da Escola ....
4 - A Autora conduziu esse veículo, retirando-o desse estacionamento e, após ter percorrido uma distância indeterminada, num máximo de cerca de 7/8 metros, na faixa mais à direita, foi embatido, na sua traseira, sobre o lado esquerdo, pela frente, sobre o lado direito, do veículo de matrícula ..-DI-..;
5 - Depois de este veículo ainda ter guinado para a sua esquerda.
6 - A Autora foi transportada, pelo INEM, para a urgência do hospital ....
7 - Aí, foram-lhe diagnosticadas: cervicalgia, com ligeiras parestesias na extremidade distal dos dedos.
8 - A Autora fez sessões de fisioterapia.
9 - Em 16-03-2021, a Autora queixava-se de cervicalgia e omalgia direita, irradiando para a omoplata e MSD; dor à palpação do ombro direito, com irradiação para a omoplata direita, diminuição da força segmentar da mão direita e diminuição duvidosa da força do braço e antebraços direitos.
10 – A Autora tem dores, na coluna cervical e no ombro direito, fazendo medicação analgésica, regularmente.
11 - As dores dificultam-lhe o dormir e o descanso.
12 - E tornaram-na uma pessoa mais preocupada, mais sofrida e menos alegre.
13 - Em consequência do embate, a Autora sofreu um período de défice funcional temporário total de 3 dias e um período de défice funcional temporário parcial de 137 dias (até 31-05-2021).
14 - Sofreu um quantum doloris de grau 3/7.
15 - Sofreu uma repercussão permanente nas atividades sociais, desportivas e de lazer de grau 1/7.
16 - Sofreu um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 2,98 pontos.
17 - As sequelas de que ficou a padecer são compatíveis com o exercício da atividade habitual, implicando esforços suplementares.
18 - A Autora nasceu em ...-10-1965.
19 - Trabalhava como consultora imobiliária.
20 - Auferia, anualmente, cerca de € 10.089,66 líquidos.
21 - A reparação dos “danos” sofridos pelo veículo de matrícula ..-..-TT com o embate, importou à Autora em € 1.450,00.
22 - A Autora pagou remédios, que não tomaria não foram as sequelas que lhe advieram do embate, no valor de € 52,54.
23 - A responsabilidade para com terceiros, emergente da circulação do veículo de matrícula ..-DI-.., estava transferida para a Ré, mediante contrato de seguro titulado pela apólice n º ...65.
1.2 Não provados
1 - BB conduzia o veículo de matrícula ..-DI-.. para fazer umas “tarefas, por conta, no interesse e sob as ordens” da sua “proprietária”.
2 – O veículo de matrícula ..-..-TT saiu do segundo ou do sexto lugar de estacionamento.
3 - Antes de sair do estacionamento, a Autora viu que não circulava ninguém em nenhuma das duas vias de trânsito, atento o seu sentido de marcha.
4 - A Autora fez o sinal luminoso esquerdo;
5 - E após percorrer cerca de 40 metros na faixa mais à direita é que foi embatida pelo veículo de matrícula ..-DI-..;
6 - Quando este tinha a hemi-faixa à sua esquerda livre.
7 - E circulava a 50 Km/hora.
8 - O condutor do veículo de matrícula ..-DI-.. não viu o veículo de matrícula ..-..-TT à sua frente.
9 - A Autora teve de deixar a casa onde morava, no 4º andar, e mudar-se para uma casa de rés-do-chão.
10 - Deixou de ter disposição para continuar a escrever livros para crianças e de socializar com correligionários escritores.
11 - Vive deprimida.
12 - Deixou de caminhar e de cozinhar.
13 - Deixou de ganhar qualquer comissão, desde 12-01-2021 até meados de maio desse ano, por não poder deslocar-se aos imóveis que angariava, subir escadas e aceder às suas varandas ou sótãos, para estar documentada e promover a sua venda.
2. O direito
2.1 Da responsabilidade pelo acidente
O acórdão recorrido, ao invés da sentença (que considerou que o acidente se ficou a dever à responsabilidade da Autora por incumprimento do dever de dar cedência de passagem), entendeu que o acidente de viação, do qual resultaram danos para a Autora, se deveu a culpa total e exclusiva do condutor do veículo seguro na Ré.
A sentença, fazendo ênfase no facto da Autora ter acabado de sair de um estacionamento e alicerçada no disposto no n.º 1 do artigo 31.º do Código da Estrada, considerou que, naquelas circunstâncias, a mesma se encontrava obrigada a ceder a passagem aos veículos que transitassem na via em que pretendia passar a circular, dever esse que implicava que, para entrar na via de circulação, não obrigasse os veículos que aí circulassem à alteração da velocidade e da direcção – cfr. artigo 29.º, n.º1, do Código da Estrada.
No seguimento de tal posicionamento concluiu que: “a A. terá violado este dever pois, estando obrigada a ceder a passagem aos veículos que circulassem na via de circulação em causa, deveria ter-se abstido de entrar na mesma, se nela não pudesse entrar sem que essa entrada pudesse obrigar os condutores que aí circulassem, a alterar a sua velocidade ou direção, o que não aconteceu, porquanto, o veículo seguro na R., que circulava nessa via, acabou por embater no veículo conduzido pela A.”, ressalvando que “pese embora não se saiba a exata distância percorrida pelo veículo conduzido pela A., desde que deixou o estacionamento até que foi embatido, essa distância será, no máximo, de 7/8 metros, uma distância “curta” para que, um veículo que circulasse a perto de 50 km/h pudesse reagir, atempadamente, por forma a evitar o embate (o condutor do veículo seguro na R. ainda tentou desviar-se para a esquerda, mas já sem sucesso, muito provavelmente face à proximidade a que estaria do veículo da A., quando esta iniciou a saída do estacionamento).”
Este raciocínio, não foi acompanhado pelo tribunal da Relação, que considerou que a Autora não cometeu qualquer infracção causal, tendo a manobra de saída do espaço de estacionamento de veículos sido efetuada em segurança, posto que o seu veículo passou a circular na via cerca de 7/8 metros antes de ser embatido, em plena faixa de rodagem. Nessa medida, o acórdão recorrido atribui a culpa na produção do acidente ao condutor do veículo seguro na Ré, porquanto: “Já o mesmo não se poderá dizer do veículo seguro na ré, de matrícula DI que, foi embater, na traseira, sobre o lado esquerdo do TT, com a frente, sobre o lado direito, depois de este veículo ainda ter guinado para a sua esquerda. Efetivamente, aquele condutor não adequou a velocidade do seu veículo à circulação que existia na via. Efetivamente, não foi capaz de parar no espaço visível existente à sua frente – os 7/8 metros que o distariam do veículo da autora – e não foi capaz de se desviar para a faixa mais à esquerda que, nada nos autos nos permite concluir, estaria desobstruída.”
Pugnando pela sua absolvição do pedido, contrapõe a Recorrente defendendo que o acidente foi causado pela violação do dever de cedência de passagem ao veículo seguro na Ré, que se impunha à Autora, uma vez que saía de um estacionamento.
O entendimento do tribunal a quo mostra-se alicerçado nas seguintes premissas:
1. não ter a Autora cometido qualquer infracção causal;
2. ter o condutor do veículo seguro na Ré praticado uma infracção causal do sinistro decorrente de não ter adequado a velocidade do seu veículo à circulação que existia na via.
Ambas as premissas decorrem de juízos conclusivos retirados pelo tribunal da Relação face à factualidade provada sob os pontos nºs 3, 4 e 5: ter o veículo da Autora saído de um estacionamento longitudinal, entrado na faixa de rodagem, circulando 7/8 metros antes de ser embatido na traseira do lado esquerdo pela frente, sobre o lado direito do veículo seguro na Ré.
Com efeito, relativamente à primeira premissa - não ter a Autora cometido qualquer infracção causal, não obstante ter saído de um espaço de estacionamento -, considerou o tribunal a quo que a Autora fez a manobra com segurança porque entrou na faixa de rodagem sem que tivesse colocado em perigo qualquer circulação que ali se fizesse.
Na segunda premissa, o tribunal a quo concluiu que o condutor do veículo seguro na Ré não tinha adequado a velocidade do seu veículo à circulação que existia na via (não ter sido capaz de parar no espaço visível existente à sua frente – os 7/8 metros de distância do veículo da Autora).
Há que concordar com tal entendimento.
Vejamos.
2.1.1 Mostra-se incontroverso que o enquadramento jurídico dos factos se situa no domínio do instituto da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos (artigo 483.º, n.º1, do Código Civil – doravante CC).
Como constitui entendimento pacífico, constituem pressupostos (cumulativos) dessa responsabilidade, que impõe ao lesante a obrigação de indemnizar, o facto voluntário; a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
A ilicitude é tratada pela dogmática civil como uma valoração objectiva da conduta enquanto negação dos valores tutelados pela ordem jurídica, sendo a culpa, sob a forma de dolo ou negligência, reconduzida a “todos os aspetos circunstanciais que interessam à maior ou menor censurabilidade da conduta do agente”, relevantes sob a perspectiva subjectiva, individual do facto ilícito - ainda que, na apreciação da negligência, a lei inclua elementos de carácter objectivo2.
Na análise da situação sob apreciação cabe elencar as normas estradais pertinentes.
Dispõe o artigo 11.º, n.º2, do Código da Estrada,3 que os “condutores devem, durante a condução, abster-se da prática de quaisquer atos que sejam suscetíveis de prejudicar o exercício da condução com segurança”, estipulando o n.º 1 do artigo 24.º do mesmo Código, que o “condutor deve regular a velocidade de modo a que, atendendo à presença de outros utilizadores, em particular os vulneráveis, às características e estado da via e do veículo, à carga transportada, às condições meteorológicas ou ambientais, à intensidade do trânsito e a quaisquer outras circunstâncias relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente.”
Preceitua o n.º 1 do artigo 18.º do CE, que o “condutor de um veículo em marcha deve manter entre o seu veículo e o que o precede a distância suficiente para evitar acidentes em caso de súbita paragem ou diminuição de velocidade deste, tendo em especial consideração os utilizadores vulneráveis”.
Por seu turno, o artigo 12.º, n.º1, do CE, estabelece que os “ condutores não podem iniciar ou retomar a marcha sem assinalarem com a necessária antecedência a sua intenção e sem adotarem as precauções necessárias para evitar qualquer acidente”, impendendo sobre o condutor que saia de um parque de estacionamento o dever de ceder a passagem (artigo 31.º, n.º1, alínea a), do CE). Nesse sentido, dispõe, também, o n.º 1 do artigo 29.º do CE, que o “condutor sobre o qual recaia o dever de ceder a passagem deve abrandar a marcha, se necessário parar, ou, em caso de cruzamento de veículos, recuar, por forma a permitir a passagem de outro veículo, sem alteração da velocidade ou direção deste.”
Como frisa Dario Martins de Almeida, “em matéria de acidentes de viação, estará sobretudo em causa a omissão daquelas regras ou cautelas de que a lei procura rodear certa actividade perigosa como é a da circulação rodoviária mecânica; estará também em causa uma perícia e uma destreza mínimas, absolutamente necessárias a essa actividade. Consequentemente, o dever de diligência terá de atingir então um grau maior em face das circunstâncias ou das exigências do caso concreto (…) Por isso, desde que o evento seja previsível e a conduta se mostre adequada (dentro da problemática da causalidade adequada) à produção dele, a omissão do dever de diligência destinado a evitá-lo configura a negligência ou mera culpa.”4.
No âmbito da responsabilidade por factos ilícitos em que nos situamos, na ausência de presunção de culpa – inaplicável in casu -, compete ao lesado provar a culpa do autor da lesão (artigo 487.º, n.º, do CC). Em sede de acidentes rodoviários, como fez notar o acórdão recorrido5, este ónus da prova tem sido jurisprudencialmente atenuado pela intervenção de uma prova de primeira aparência baseada em presunções judiciais simples – artigos 349.º e 351.º, do CC – que permitem inferir que quem viola objectivamente uma regra de trânsito e, por causa disso, provoca danos a terceiros, o faz por razões que lhe são imputáveis, a menos que demonstre que tal violação se mostra alheia à sua vontade.
Como explicita Vaz Serra “a jurisprudência tem facilitado a prova da culpa: basta para provar a culpa que o prejudicado possa estabelecer factos que, segundo os princípios da experiência geral, tornem muito verosímil a culpa. Mas o autor do prejuízo pode afastar a prova “prima facie”, demonstrando, por seu lado, outros factos que tornem verosímil ter-se produzido o dano sem culpa sua. Com isto destrói a aparência a ele contrária e força o prejudicado a demonstrar completamente a culpa, já que ao admitir-se a prova “prima facie”, só se dá uma facilidade para produção do encargo da prova.”6
É neste sentido que se tem pronunciado a jurisprudência do STJ que, a este propósito, tem considerado que “II - A prova da inobservância de leis ou regulamentos de natureza rodoviária faz presumir a culpa na produção dos danos decorrentes de tal inobservância, dispensando a concreta comprovação da falta de diligência. III - É que, embora em matéria de responsabilidade civil extracontratual a culpa do autor da lesão em princípio não se presuma, tendo de ser provada pelo lesado (art.º 487, n.º 1, do CC), a posição deste é frequentemente aliviada por intervir aqui, facilitando-lhe a tarefa, a chamada prova de primeira aparência (presunção simples): se esta prova aponta no sentido da culpa do lesante, passa a caber a este o ónus da contraprova. IV - Para provar a culpa, basta, assim, que o prejudicado possa estabelecer factos que, segundo os princípios da experiência geral, a tornem muito verosímil, cabendo ao lesante fazer a contraprova, no sentido de demonstrar que a actuação foi estranha à sua vontade ou que não foi determinante para o desencadeamento do facto danoso (…)” - acórdão do STJ de 20-11-20037, argumentação também acolhida pelos acórdãos do STJ de 08-04-20108 e de 02-06-20169.
2.1.2 No caso dos autos, não obstante a exiguidade da matéria de facto demonstrada quanto à dinâmica do acidente e o seu carácter lacunar, identifica-se um facto de importância crucial para a determinação da responsabilidade na produção do acidente, que se reconduz à circunstância de o embate ter ocorrido a uma distância não determinada, mas não superior a 7/8 metros após a Autora ter retirado o carro do estacionamento longitudinal existente ao longo da berma direita da via.
Com efeito, esta é uma distância, que se mostra suficientemente longa, que permite suportar as conclusões retiradas pelo tribunal a quo:
i. de que a Autora, na retoma da manobra, entrou na faixa de rodagem sem ter colocado em perigo qualquer circulação que ali se fizesse, não cometendo qualquer infracção causal;
ii. de que o condutor do veículo seguro na Ré, ainda que não tenha sido apurada a velocidade a que circulava, desrespeitou o dever de adequar a velocidade à circunstância de existir um parque de estacionamento ao longo da berma da estrada (que tornava previsível a saída de veículos e o seu início de marcha nesse trajecto) e de manter entre o seu veículo e o veículo atingido uma distância suficiente para evitar acidentes.
Na verdade, se o embate ocorreu após a Autora ter conduzido 7/8 metros, a saída do veículo do estacionamento e o seu início da marcha - de acordo com as regras do normal acontecer – mostra que seria possível evitar a colisão caso o condutor do veículo seguro na Ré tivesse adequado a sua velocidade ao local – reitere-se - presumivelmente marcado por um movimento regular de entrada e saída de viaturas decorrente da existência de estacionamentos longitudinais.
O facto de a Autora ainda ter conduzido durante 7/8 metros antes de ocorrer o embate pressupõe que a mesma permaneceu na via durante um hiato temporal suficiente para possibilitar que o seu veículo, depois de iniciar a marcha, atingisse alguma velocidade para percorrer a referida distância. Esta sucessão de acontecimentos permitiria, com toda a probabilidade, que o condutor do veículo seguro na Ré se tivesse apercebido da presença, na via, do veículo conduzido pela Autora e que, caso seguisse a uma velocidade adequada ao local, evitasse a colisão sem necessidade de alterar a velocidade ou a direcção em que seguia.
Entendemos, por isso, que foi feita prova da inobservância das normas estradais previstas nos artigos 18.º, n.º1 e 24.º, n.º1, ambos do CE, pelo condutor do veículo seguro na Ré. Nesta infracção se poderá fundar, de acordo com as regras da experiência comum, como já se deixou antever, a prova de primeira aparência no sentido da culpa do infractor.
Importa, por fim, sublinhar que, em face da realidade fáctica em causa, para que a Ré se pudesse eximir de responsabilidade sobre as consequências do acidente, cabia-lhe a demonstração de que a actuação do condutor do veículo seguro foi estranha à sua vontade ou não foi determinante para o desencadeamento do facto danoso. Tal prova, porém, não foi feita, sendo que da factualidade apurada, como considerado pelo tribunal a quo, não se descortina na condução da Autora uma conduta que integre uma infracção geral ou específica das normas estradais.
Efectivamente, reitera-se, o facto de a Autora ter conduzido o veículo, após o mesmo ser retirado do estacionamento, numa distância máxima de cerca de 7/8 metros inculca, na linha do defendido pelo tribunal “a quo”, que a mesma não omitiu o seu dever de cedência de passagem e que retomou a sua marcha em condições de segurança. Se não o tivesse feito, o embate teria ocorrido, com elevada probabilidade, em momento anterior, a uma menor distância após a saída do estacionamento.
Por conseguinte, a dinâmica do acidente encontra-se correctamente apreciada pelo acórdão recorrido, pois que o factualismo apurado não permite imputar à Autora culpa na produção do acidente.
Improcedem, assim, nesta parte, as conclusões da revista.
2.2 Da adequação do montante indemnizatório
2.2.1 Dos danos não patrimoniais
Discorda a Ré do montante de €10.000,00 fixado pelo tribunal da Relação a título de compensação por danos não patrimoniais, que considera excessivo, pugnando pelo valor de €5.000,00, que reputa de adequado em face dos critérios legais e do que vem sendo decidido na jurisprudência.
Como é consabido, os danos não patrimoniais correspondem à ofensa de bens de carácter imaterial, sem conteúdo económico, pois que afectam a personalidade nos seus valores específicos como a integridade física, psíquica, a saúde, a angústia, entre outros.
Porque se está perante valores que não são susceptíveis de avaliação em dinheiro, o dano não patrimonial não se estima em termos de uma medida certa, consubstanciando a indemnização uma mera compensação10.
Nos termos da lei, são ressarcíveis os danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (artigo 496.º, n.º1, do CC). Em relação a estes, o princípio é o de que a indemnização se deve calcular de acordo com a equidade (artigo 496.º, n.º4, do CC), funcionando esta como único recurso.
Segundo o n.º 4 do citado artigo 496.º do CC, o montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias elencadas no artigo 494.º, a saber: (i) grau de culpabilidade do agente; (ii) situação económica do agente e do lesado; (iii) e demais circunstâncias do caso, entre as quais não se poderá deixar de contar a natureza, gravidade e dimensão da lesão ou a importância do bem jurídico violado.
Conforme decorre do acórdão recorrido, a fixação da indemnização levada a cabo pelo tribunal da Relação foi alcançada com base num juízo de equidade, que na sequência do já salientado, constitui elemento essencial (não complementar, como é o caso da situação prevista no artigo 566.º, n.º3, do Código Civil) de avaliação deste tipo de danos.
E porque se está no domínio da equidade, não pode ser descurado o que tem vindo a ser entendido pela jurisprudência deste tribunal quanto a considerar que, tratando-se de uma ponderação casuística, das circunstâncias do caso, e não a aplicação de critérios normativos, a apreciação a levar em conta em sede de revista apenas permite que a intervenção do STJ se reporte à verificação dos limites e pressupostos do juízo equitativo formulado pelo tribunal a quo em face da individualidade do caso concreto11.
Nesta medida, não compete ao STJ sindicar o exacto valor indemnizatório fixado, mas tão só proceder ao controle dos pressupostos normativos do recurso à equidade e dos limites dentro dos quais deve situar-se o juízo equitativo, nomeadamente em função dos princípios da proporcionalidade e da igualdade conducentes à razoabilidade do valor encontrado12.
Na verdade, traçando o perímetro dos poderes de sindicância deste tribunal relativamente à fixação equitativa da indemnização, podem os mesmos ser agrupados em quatro planos, como evidenciado pelo acórdão do STJ de 20-11-201913: “Em primeiro lugar, o Supremo Tribunal de Justiça deve averiguar se estavam preenchidos os pressupostos do recurso à equidade [2]. Em segundo lugar, se foram considerados as categorias ou os tipos de danos cuja relevância é admitida e reconhecida. Em terceiro lugar, deve averiguar se, na avaliação dos danos correspondentes a cada categoria ou a cada tipo, foram considerados os critérios que, de acordo com a legislação e a jurisprudência, deveriam ser considerados — se, p. ex., no caso da indemnização por danos não patrimoniais, foram considerados o grau de culpabilidade do agente, a situação económica do lesante e a situação económica do lesado. Em quarto lugar, o Supremo deve averiguar se, na avaliação dos danos correspondentes a cada categoria ou a cada tipo, foram respeitados os limites que, de acordo com a legislação e com a jurisprudência, deveriam ser respeitados. Está em causa fazer com que o juízo equitativo se conforme com os princípios da igualdade e da proporcionalidade — e que, conformando-se com os princípios da igualdade e da proporcionalidade, conduza a uma decisão razoável.”
Refere o acórdão do STJ de 14-02-202314, salientado o consignado no acórdão do STJ de 05-11-200915, o “juízo de equidade das instâncias, assente numa ponderação , prudencial e casuística das circunstâncias do caso – e não na aplicação de critérios normativos – deve ser mantido sempre que – situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida - se não revele colidente com os critérios jurisprudenciais que generalizadamente vêm sendo adoptados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade.”
Numa outra formulação, em sentido idêntico, considerou o acórdão do STJ de 28-10-201016 que “quando o cálculo da indemnização haja assentado decisivamente em juízos de equidade, ao Supremo não compete a determinação exacta do valor pecuniário a arbitrar em função da ponderação das circunstâncias concretas do caso, - já que a aplicação de puros juízos de equidade não traduz, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», - mas tão somente a verificação acerca dos limites e pressupostos dentro dos quais se situou o referido juízo equitativo, formulado pelas instâncias face à ponderação da individualidade do caso concreto «sub juditio».”
Este entendimento mantém-se constante e actual neste tribunal (cfr., entre outros, os acórdãos do STJ de 08-06-201717, de 19-10-202118, de 10-02-202219).
Reportando-nos ao caso dos autos, importa avaliar, no domínio da aplicação do critério da equidade, se o tribunal recorrido, na operação de fixação da compensação dos danos não patrimoniais, infringiu os critérios legais aplicáveis.
Depois de fazer referência a extensa jurisprudência relativa a casos que se pronunciaram sobre danos e lesões semelhantes às dos autos, o acórdão recorrido percorreu o seguinte percurso argumentativo:
“Para a fixação do valor da indemnização por danos não patrimoniais, importa ter em atenção:
a) os tratamentos a que foi sujeita: a autora/recorrente foi transportada, pelo INEM, para a urgência do hospital ..., fez sessões de fisioterapia; faz medicação analgésica, regularmente.
b) as concretas lesões sofridas pela autora no acidente, a saber, em consequência do embate, sofreu: traumatismo lombar e traumatismo coxofemeral esquerda;
c) as dores físicas sofridas pela autora, quantificáveis de grau 3, numa escala de 1 a 7 e que as que continuará a sofrer;
d) período que mediou entre o acidente, ocorrido a 6 de junho de 2019 e a consolidação das lesões, a saber, na data da alta clínica ocorrida a 17 de março de 2021, apresentando, à data, lombalgia;
e) o défice da integridade física e psíquica de 3 pontos de que ficou a padecer permanentemente;
f) a idade da autora à data do acidente, que era de 55 anos;
g) as circunstâncias do acidente do qual não teve qualquer culpa.
Em suma, e tendo em consideração os critérios jurisprudenciais habitualmente seguidos e que supra explanamos (cujos valores variam entre os € 4.000,00 e os € 15.000,00), a necessidade de nos afastarmos de critérios miserabilistas, as circunstâncias do caso concreto e dadas como provadas, designadamente, o longo período que mediou entre o acidente e a alta, considera-se justo e adequado fixar-se em € 10.000,00 a indemnização pelos danos não patrimoniais.”.
Vejamos.
Assumindo os danos sofridos pela Autora uma indiscutível gravidade que justifica a sua tutela pelo direito, verifica-se que o tribunal recorrido mobilizou os critérios legais aplicáveis para sua quantificação, tendo procedido a um exame jurisprudencial comparativo.
Tendo em conta os parâmetros de cognição que neste âmbito se impõem, atendendo ao que vem constituindo a jurisprudência recente do STJ, para além das decisões já referidas pelo Tribunal a quo, cumpre salientar os seguintes arestos, tendo por referência os critérios de comparabilidade (relativa) com o presente caso atinentes à natureza do evento que originou a lesão, à contribuição culposa do lesado para a sua ocorrência, à idade do lesado à data do acidente, à natureza e extensão das lesões sofridas, às sequelas físicas e psíquicas das mesmas decorrentes, aos períodos de internamento, aos períodos de doença, à repercussão das lesões na qualidade de vida do lesado (tendo em conta a sua situação vivencial anterior e posterior) e ao défice de integridade físico-psíquica fixado:
- no acórdão de 28-11-201720 foi considerado justo o montante de € 10 000 para indemnizar os danos não patrimoniais sofridos pelo lesado, vítima de acidente, com 54 anos à data do sinistro, que apresentou, em sua decorrência, um quantum doloris de grau 3 numa escala de 1 a 7; persistência e agravamento das dores na cervical com mudanças de tempo e com esforços e perda de sono;
- no acórdão de 08-03-201821 foi considerada equilibrada e adequada a indemnização de € 9 500 por danos não patrimoniais sofridos por uma das autoras, que, em consequência do acidente, sofreu lesões graves na coluna; esteve internada em hospital; foi sujeita à realização de exame e análises; sofreu dores e ansiedade, temendo pela sua vida; sofre de sequelas permanentes, ficando a padecer ao nível do ráquis de mobilização dolorosa da coluna lombar;
- no acórdão de 14-03-202322 foi considerada equitativa a indemnização de €8.000,00, atribuída a título de danos não patrimoniais num caso em que o autor, vítima de um acidente devido exclusivamente à conduta culposa do lesante, com 32 anos à data do acidente, passou a sofrer de dorso-lombalgia residual com impotência funcional; experienciou um quantum doloris de grau 3 numa escala de 7; realizou vários e dolorosos tratamentos de fisioterapia; teve que ser submetido a várias consultas médicas, exames e de tomar medicação; teve de recorrer a apoio psicológico.
Perante estas situações, a quantia de €10.000,00 arbitrada pelo tribunal a quo a título de danos não patrimoniais não se mostra desajustada levando em linha de conta os critérios jurisprudenciais que vêm sendo adoptados, considerando a lesão objectiva de bens essenciais da personalidade, o facto de as lesões sofridas pela Autora, apesar de não apresentarem elevada extensão e gravidade (reveladas pelo défice funcional de baixo índice) terem tido uma repercussão sensível na sua qualidade de vida (implicando dores e a toma regular de analgésicos e prejudicando o seu descanso) e a circunstância de o acidente ter sido provocado exclusivamente pelo comportamento negligente do condutor do veículo seguro na Ré, ainda que a culpa deste não se nos afigure grave.
Em suma, e à luz da prescrição contida no artigo 8.º, n.º3, do CC, não se descortina que o juízo equitativo adoptado pelo tribunal recorrido contrarie, por excessivo, em termos de colocar em causa a segurança na aplicação do direito, o princípio da igualdade ou o princípio da proporcionalidade dos critérios jurisprudenciais que generalizadamente vêm sendo adoptados quanto à ressarcibilidade dos danos não patrimoniais de natureza análoga aos que estão presentes na situação sob apreciação, pelo que não pode deixar de se manter o montante decidido no acórdão recorrido.
Improcedem, por isso, também, nesta parte, as conclusões das alegações.
2.2.2 Do dano biológico
A Ré rebela-se, igualmente, quanto à indemnização de €15.000,00 atribuída à Autora a título de dano biológico, na vertente de perda de capacidade de ganho, pugnando pela sua redução para o montante de €4.000,00.
O conceito de dano biológico tem sido utilizado na doutrina e na jurisprudência nacionais, de modo polissémico, “com sentidos nem sempre coincidentes” (acórdão do STJ de 28-01-201623).
Como salienta Maria da Graça Trigo, “na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, actualmente o significado com que mais frequentemente tal expressão é usada é aquele correspondente à de consequências patrimoniais da incapacidade geral ou genérica do lesado, aferida em função das Tabelas de Incapacidade Geral Permanente em Direito Civil. Mas este significado coexiste com outros, designadamente com o de dano biológico como consequência não patrimonial de uma lesão psicofísica. É, por isso, conveniente que, ao fazer-se uso da dita expressão (seja num texto de índole doutrinal seja numa decisão judicial), se comece por definir a acepção em que a mesma é utilizada. Mais importante do que a terminologia utilizada é, contudo, a realidade subjacente. Com ou sem a denominação de dano biológico, o que importa, em nome do princípio da reparação integral dos danos, é assegurar que, diversamente do que sucedia no passado, se indemnizam as vítimas não apenas pela perda de capacidade laboral específica para a profissão exercida à data do evento lesivo, mas também pela perda de capacidade laboral geral que as afectará ao longo do resto da vida.”24
Objecto de abundante tratamento por parte da jurisprudência do STJ, o dano biológico é por esta, em traços gerais, perspectivado como um dano à integridade psicofísica do lesado, que afecta de forma relevante a funcionalidade do corpo nas suas vertentes física e mental, cuja ressarcibilidade autónoma tem vindo a ser afirmada independentemente do seu concreto enquadramento nas categorias normativas do dano patrimonial ou do dano não patrimonial (cfr., a este respeito, entre outros, os acórdãos de 03-11-201625, 04-07-202326, de 11-01-202427, de 07-05-202428, 17-01-202329, 07-03-202330, de 14-03-202331, de 21-04-202232).
A jurisprudência, de forma paulatina e evolutiva, passou a conferir tutela, nesta sede, a situações em que os lesados eram afectados, em maior ou menor grau, na sua capacidade laboral genérica, afirmando que também aqui aqueles sofriam de perdas de rendimentos geradoras de danos patrimoniais futuros. Avultam, como casos paradigmáticos desta categoria de lesados, na categorização efetuada por Maria da Graça Trigo, a) os lesados menores de idade que, em razão da idade, não exercem qualquer profissão no momento do evento danoso; b) os lesados que, não sendo afectados na sua capacidade laboral específica, são afectados na sua capacidade laboral genérica; assim como c) os lesados que, em razão de circunstâncias várias de idade, saúde, dedicação à família, etc., não exercem profissão à data de ocorrência da lesão, sendo, contudo, afectados na sua capacidade laboral genérica33.
A situação da Autora corresponde, precisamente, à tipologia de situações descrita sob a alínea b), sendo que, ainda que não se tenha provado que a mesma haja sofrido uma imediata diminuição de rendimentos profissionais, as lesões verificadas são de molde a repercutir-se negativamente no seu projecto de vida profissional – no âmbito de uma carreira que, em face da sua idade, se prolongará por mais de dez anos -, reduzindo a sua capacidade de aumentar rendimentos provenientes de comissões inerentes ao desempenho mais proactivo da sua actual função.
Neste caso, torna-se oportuna a referência ao consignado no acórdão do STJ de 20-05-201034, que, num raciocínio posteriormente retomado por outros acórdãos do STJ (cfr., a título de exemplo, os acórdãos de 13-04-201135, de 03-11-201636, de 13-07-201737 e de 06-02-202438) salientou: “(…) pelo menos para quem não está irremediavelmente afastado do ciclo laboral, a perda relevante de capacidades funcionais – embora não imediatamente reflectida nos rendimentos salariais auferidos na profissão exercida – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» do lesado num mercado laboral em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades de mudança ou reconversão de emprego e o leque de oportunidades profissionais à sua disposição, constituindo, deste modo, fonte actual de possíveis e futuros lucros cessantes, a compensar como verdadeiros danos patrimoniais.”
Quanto ao modo de cálculo do dano biológico, em termos genéricos, a jurisprudência do STJ tem convergido em torno da proposição de que o mesmo deverá assentar num critério de equidade (cfr. artigo. 566.º, n.º3, do CC), norteado por um método comparativo que apresenta como referencial outras decisões judiciais sobre casos análogos (artigo 8.º, n.º3, do CC), sem prejuízo do auxílio de fórmulas matemáticas (cfr., os acórdãos do STJ de 31-01-202439, de 17-01-202340, de 31-01-202341, de 14-03-202342, de 14-03-202343, de 14-03-202344, de 30-03-202345, de 30-03-202346, de 09-05-202347, de 06-06-202348, de 16-01-202449, de 14-09-202350).
Na delimitação do conceito de dano biológico em causa no presente caso verifica-se que o mesmo encontra-se essencialmente valorado na sua vertente patrimonial, sob a óptica da perda de capacidade laboral geral.
No que toca, em particular, à indemnização a atribuir por perda de capacidade geral de trabalho, a jurisprudência do STJ (cfr., entre outros, os acórdãos de 07-04-201651, de 14-12-201652, de 01-03-201853 e de 12-01-202254) tem sublinhado que, não existindo - como sucede no caso dos autos - limites de danos que o tribunal tenha dado como provados, a equidade constitui o único critério legalmente previsto para a fixação da indemnização devida, a qual deverá ter em conta os seguintes factores: i) idade do lesado (a partir da qual se pode determinar a respectiva esperança média de vida à data do acidente); ii) o seu grau de incapacidade geral permanente; iii) as suas potencialidades de aumento de ganho antes da lesão, tanto na profissão habitual, como em profissão ou actividades económicas alternativas, aferidas, em regra, pelas suas qualificações e competências; iv) conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da actividade profissional habitual do lesado e de actividades profissionais ou económicas alternativas (igualmente tendo em conta as suas qualificações e competências).
Como salientou o acórdão do STJ de 12-01-202255, neste âmbito deve atender-se “à esperança média de vida do lesado (à data do acidente) e não à sua previsível idade de reforma, na medida em que a afectação da capacidade geral tem repercussões negativas ao longo de toda a vida do lesado, tanto directas como indirectas.”
Fez notar o tribunal a quo a este respeito: “Ora, no caso em apreço, a mera necessidade de um maior dispêndio de esforço e de energia, mais traduz um sofrimento psicossomático do que, propriamente, um dano patrimonial. Por outro lado, o dano biológico sofrido pela autora/recorrente DD tem uma componente patrimonial (incapacidade permanente geral de 2,8 pontos, face à Tabela Nacional de Incapacidades) e uma tónica não patrimonial, as dores sofridas num grau de 3 numa escala de 1 a 7, sendo acrescidos os esforços despendidos, tanto que as sequelas de que ficou a padecer são compatíveis com o exercício da atividade habitual, implicando esforços suplementares.”
Para alcançar o valor de €15.000,00, o tribunal recorrido procedeu a uma indagação da jurisprudência relativamente a casos análogos de atribuição de dano biológico, não deixando de ter em conta “que a autora/lesada tinha, à data do acidente, 55 anos de idade; que a esperança de vida, à data do acidente, das mulheres nascidas nos anos 60, será de cerca de 83 anos, conforme dados estatísticos; que a autora/lesada ficou a padecer de incapacidade geral permanente de 2,98 pontos; que, em consequência das lesões sofridas com o acidente a mesma continuará a sentir no futuro necessidade de realizar esforços suplementares caso venha a desempenhar a mesma profissão ou similar.”
Em particular, os acórdãos do STJ de 29-12-202056 e de 18-03-202157 seleccionados pelo tribunal a quo analisaram a atribuição de indemnizações a título de dano biológico em situações de lesadas, do sexo feminino, com idades equiparáveis à da Autora, em que as lesões, embora exigindo esforços suplementares, se mostraram compatíveis com o desempenho das profissões habituais. Em causa estavam profissões (de médica, de professora) que, tal como a profissão de consultora imobiliária, requerem mobilidade bastante, ainda que o esforço físico nelas não desempenhe um papel primordial.
Se é certo que os valores de indemnização atribuídos, que oscilam entre os €32.000,00 e os €45.000,00, reflectem défices funcionais permanentes superiores aos verificados nos autos, o exame dos referidos casos permite-nos, de acordo com um critério de comparabilidade relativa, constactar que a indemnização impugnada não colide com o padrão indemnizatório seguido pelo STJ, não se distanciando do mesmo por excesso.
A análise de outros acórdãos reforça, de resto, a bondade desta conclusão.
Com efeito, no acórdão do STJ de 30-06-202058, num caso em que a lesada de acidente, engenheira civil, com 38 anos de idade, sofreu lesões na cervical de que ficaram sequelas que importaram um défice psicofísico de 4 pontos, com interferência na actividade profissional e na vida pessoal, foi considerada ajustada a indemnização de €58 000,00 que foi atribuída pela 1.ª instância, em lugar da indemnização de €15 000,00 fixada pela Relação.
Já no acórdão do STJ de 12-01-202259, considerou-se justo e adequado o montante indemnizatório de €25.000,00 atribuído a título de dano biológico, na sua vertente patrimonial, numa situação de uma lesada com 59 anos à data do acidente do qual foi vítima, num quadro em que não se mostrava provável que tivessem sido afectadas potencialidades de aumento de ganho no exercício da profissão (ou profissões) habituais ou no exercício de outras actividades económicas.
Assim, considerando a idade da lesada ao tempo do acidente (55 anos), a esperança média de vida (que, para as mulheres se situava, no ano do acidente, 2021, no limiar dos 83 anos), as exigências próprias da sua actividade profissional habitual no confronto com a natureza das sequelas de que padece e a circunstância de ser provável que as mesmas tenham algum impacto negativo a nível das potencialidades de aumento de ganho no exercício da profissão habitual, assim como o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 2,98 atribuído, há que considerar que a quantia indemnizatória arbitrada no acórdão recorrido se mostra justa e equitativa, à luz dos padrões indemnizatórios jurisprudencialmente seguidos pelo STJ quanto a casos relativamente equiparáveis.
Por conseguinte, dado que a indemnização fixada no acórdão recorrido obedeceu aos critérios legais vigentes sem se ter desviado dos padrões que, segundo uma jurisprudência actualista e evolutiva, deverão ser seguidos em situações análogas ou equiparáveis, não pode, também, deixar de mantida.
Improcedem, assim, na sua totalidade, as conclusões da revista.
IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam os juízes neste Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente a revista, confirmando o acórdão recorrido.
Custas pela Recorrente.
Lisboa, 1 de Outubro de 2024
Graça Amaral (Relatora)
Luís Correia de Mendonça
Luís Espírito Santo
_____________________________________________
1. Ao tempo do acidente, Companhia de Seguros Tranquilidade, SA.↩︎
2. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, volume 1, 10.ª edição, Coimbra, Almedina, p. 586.↩︎
3. Doravante CE, na versão, em vigor à data da ocorrência do acidente, conferida pelo Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 09 de Dezembro.↩︎
4. Dario Martins de Almeida, Manual de Acidentes de Viação, 2.ª Edição, Coimbra, Almedina, 1980, p. 73.↩︎
5. Citando para o efeito excerto do acórdão da Relação do Porto de 12-10-2023, proferido no Processo n.º 2752/21.5T8AVR.P, acessível através das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
6. Adriano Vaz Serra, “A culpa do devedor ou do agente”, Separata do Boletim do Ministério da Justiça, Lisboa, 1957, pp. 78-79.↩︎
7. Processo n.º 3450/03, publicado em Coletânea de Jurisprudência dos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, tomo III, ano XI, 2003, pp. 149-154.↩︎
8. Processo n.º 608/06.OTBPMS.C1.S1, acessível através das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
9. Processo n.º 3987/10.1TBVFR.P1.S1, a que se pode aceder através das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
10. Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, volume I, 4.ª edição, p. 534.↩︎
11. Acórdão de 17-12-2019, proferido no âmbito do Processo n º 4014/08.4TBLRA.C2.S1, a que se pode aceder através das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
12. Acórdão do STJ de 23-02-2021, Processo n.º 91/13.4TBSCD.C1.S1, a que se pode aceder através das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
13. Processo número 107/17.5T8MMV.C1.S1, , a que se pode aceder através das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
14. Processo n.º 17828/20.8T8LSB.L1.S1, inédito.↩︎
15. Processo n.º 381-2002.S1, acessível através das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
16. Processo n.º 272/06.7TBMTR.P1.S1, acessível através das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
17. Processo n.º 2104/05.4TBPVZ.P1.S1, acessível através das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
18. Processo n.º 2601/19.4T8BRG.G1.S1, acessível das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
19. Processo n.º 12213/15.6T8LSB.L1.S1, acessível das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
20. Processo n.º 127/145.1TJVNF.S1, inédito.↩︎
21. Processo n.º 428/09.0TBVLN.G1.S1, inédito.↩︎
22. Processo n.º 11575/18.8T8LSB.L1.S1, acessível das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
23. Processo n.º 7793/09.8T2SNT.L1.S1, acessível das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
24. Maria da Graça Trigo, “O conceito de dano biológico como concretização jurisprudencial do princípio da reparação integral dos danos – breve contributo”, Julgar, n.º 46, 2022, Coimbra, Almedina, p. 269.↩︎
25. Processo n.º 1971/12.0TBLLE.E1.S1, disponível das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
26. Processo n.º 342/19.1T8PVZ.P1.S1, disponível das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
27. Processo n.º 25713/15.9T8SNT.L1.S1, consultável em https://juris.stj.pt/25713%2F15.9T8SNT.L1.S1/HGTATXacLc3uTZJmT05pMNuf8Ho?search=g9TQTL8AlKq3mnXyXHU.↩︎
28. Processo n.º 807/18.2T8VFR.P1.S1, consultável em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/d1aef8237fcdbb9b80258b17002c6d2f?OpenDocument↩︎
29. Texto integral disponível das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
30. Processo n.º 766/19.4T8PVZ.P1.S1, acessível em https://juris.stj.pt/766%2F19.4T8PVZ.P1.S1/3RYOUYdDROluuKH1Qigvv0sUr8U?search=MwMof6YQ66c_p51nzBM↩︎
31. Processo n.º 11575/18.8T8LSB.L1.S1, disponível em https://juris.stj.pt/11575%2F18.8T8LSB.L1.S1/P0qL6-vOUlSHt314uRAKHRRdmfw?search=qGjh1sHmHZhrjlfenBA↩︎
32. Processo n.º 96/18.9T8PVZ.P1.S1, acessível através das Bases Documentais do ITIJ.↩︎
33. Maria da Graça Trigo, “O conceito de dano biológico como concretização jurisprudencial do princípio da reparação integral dos danos – breve contributo”, Julgar, n.º 46, 2022, Coimbra, Almedina, p. 262.↩︎
34. Processo n.º 103/2002.L1.S1, disponível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
35. Processo n.º 843/07.4TBETR.C1, acessível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
36. Processo n.º 1971/12.0TBLLE.E1.S1, disponível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
37. Processo n.º 3214/11.4TBVIS.C1.S1, disponível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
38. Processo n.º 2012/19.1T8PNF.P1.S1, disponível as Bases Documentais do ITIJ.↩︎
39. Processo n.º 3899/17.8T8GMR.G1.S1, disponível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
40. Processo n.º 5986/18.6T8LRS.L1.S1, acessível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
41. Processo n.º 795/20.5T8LRA.C1.S1, consultável em https://iris.sysresearch.org/jurisprudencia/ecli/ECLI:PT:STJ:2023:795.20.5T8LRA.C1.S1.23?search=yLb3Ab6xMsSmqbJJ2dM↩︎
42. Processo n.º 11575/18.8T8LSB.L1.S1, acessível em https://juris.stj.pt/11575%2F18.8T8LSB.L1.S1/P0qL6-vOUlSHt314uRAKHRRdmfw?search=qGjh1sHmHZhrjlfenBA↩︎
43. Processo n.º 4452/13.0TBVLG.P1.S1, acessível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
44. Processo n.º 309/20.7T8PDL.L1.S1, texto integral disponível em https://juris.stj.pt/309%2F20.7T8PDL.L1.S1/mTBDCFoNSc8M1QzAuCHLjiBc3rE?search=MwMof6YQ66c_p51nzBM↩︎
45. Processo n.º 4160/20.6T8GMR.G1.S1, consultável em https://juris.stj.pt/4160%2F20.6T8GMR.G1.S1/XTN1DiZmPC8uwTDFICyf_Qydhmw↩︎
46. Processo n.º 15945/18.3T8PRT.P1.S1, disponível em https://iris.sysresearch.org/jurisprudencia/15945%2F18.3T8PRT.P1.S1/RAgM5DCGCJFdN57M78_X2YnpoCI?search=XEEBfjXfF-ryGDpNA4E↩︎
47. Processo n.º 7509/19.0T8PRT.P1.S1, disponível em https://juris.stj.pt/7509%2F19.0T8PRT.P1.S1/DVZSI3PWMYFx-ezlLkUvSAB4Mok?search=iZITAECEK5WILvBMbZo↩︎
48. Processo n.º 9934/17.2T8SNT.L1.S1, acessível em https://juris.stj.pt/9934%2F17.2T8SNT.L1.S1/6rb_JSyAXrJw_W1Vf8E5Pzjx97I?search=hA0WWEhRoX5QRIU3hrc↩︎
49. Processo n.º 3571/21.4T8VNG.P1.S1, disponível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
50. Processo n.º 1974/21.3T8PNF.P1.S1, acessível em https://juris.stj.pt/1974%2F21.3T8PNF.P1.S1/Mx4DxM8Y_3oukCNton22Tu1SfXo?search=bm_nUoi5yvSKS5TfJng↩︎
51. Processo n.º 237/13.2TCGMR.G1.S1, acessível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
52. Processo n.º 37/13.0TBMTR.G1.S1, disponível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
53. Processo n.º 773/07.0TBALR.E1.S1, acessível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
54. Processo n.º 6158/18.5T8SNT.L1.S1, disponível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
55. Processo n.º 6158/18.5T8SNT.L1.S1, disponível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
56. Processo n.º 111/17.3T8MAC.G1.S1, disponível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
57. Processo n.º 1337/18.8T8PDL.L1.S1, disponível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
58. Processo n.º 730/17.8T8PVZ.P1.S1, acessível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎
59. Processo n.º 6158/18.5T8SNT.L1.S1, acessível nas Bases Documentais do ITIJ.↩︎