INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO
PERÍCIA
NULIDADE DA SENTENÇA
EQUIDADE
Sumário


I - A perícia constitui um meio de prova que recai sobre factos para cuja análise, interpretação e valoração são necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem (artigo 388.º, nº 1, do Código Civil).
II – Deferir a ampliação do objeto da perícia requerido por uma parte e indeferir o requerido pela outra, justificadamente, não constitui violação do principio da igualdade das partes, na medida em que o principio tem ínsito um tratamento privilegiado de uma parte, assistindo-se a um tratamento desigual sem uma justificação material da desigualdade.
III - O incidente de liquidação de sentença visa quantificar uma condenação genérica anterior.
IV - Tratando-se de liquidação que não depende de simples cálculo aritmético, vigora para o requerente o ónus de proceder à liquidação no âmbito do verdadeiro processo de declaração ulterior que o incidente de liquidação constitui, com a alegação e prova dos factos que fundamentam a pretendida liquidação.
V - Não se demonstrando os fundamentos fácticos da quantia certa, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados, como lhe impõe o artigo 566.º, nº 3, do Código Civil.

Texto Integral


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I - RELATÓRIO

EMP01..., Unipessoal, Lda. veio propor contra EMP02... – Sociedade Comercial de Madeiras de ..., Lda. o presente incidente de liquidação, peticionando: “a) considerar-se a inexistência de qualquer importância a liquidar pela Autora à Ré como “usos da praça”, por referência à inexistência de um qualquer suposto contrato de depósito mercantil. Mais ainda, declarar a Decisão, que mesmo que se entendesse ter ocorrido qualquer contrato, à data em que a mercadoria foi colocada nas instalações da Ré, sempre se diria não ter a Autora que reembolsar a Ré desse serviço, pois que os usos da praça à data eram que não se cobrava tal serviço. (…) b) na eventualidade de ter por procedente a verificação da existência ou ocorrência do depósito mercantil, dever ser considerado na douta sentença, que ainda que assim se pudesse ter entendido a existência de um suposto contrato de depósito mercantil e, alusivo aquele ao período mencionado na Decisão, a saber, no período compreendido de Julho de 2007 a ../../2015 e ainda, por referência aos bens da Autora e aos usos praticados pela ..., à data, que a existir qualquer compensação sempre se teria aquela por nula e, por consequência, nada deveria a Autora à Ré. (…) c) caso e porém se venha a entender ter ocorrido a alegada celebração, outorga e suposta existência de um qualquer contrato de depósito mercantil, correspondente aquele ao depósito, estacionamento e armazenagem das mercadorias propriedade da Autora (e, referente aquele ao depósito nos 1.000m3 em espaço descoberto e, a 28m3 em espaço coberto), ser o mesmo declarado nulo por incumprimento contratual da Ré e, não entrega da contrapartida recebida por aquele, daí dever ser Ré condenada por ter procedido à venda não consentida e não entrega do montante devido à Autora e, ser ainda aquela condenada a liquidar à Autora e, por compensação, dos factos ínsitos na vertente decisória, o referente ao custo da mercadoria (já decidido), ao lucro obtido pela venda da mercadoria da Autora e em depósito mercantil e da Autora (enriquecimento sem causa) e, declarar ainda ser a Ré condenada a liquidar à Autora o montante indemnizatório que se venha a provar ter ocorrido na Autora, correspondente aquele aos danos e prejuízos que dolosamente causou a Ré à Autora com o seu comportamento, designadamente o fazer seus os dinheiros da Autora e ainda, condenada a devolver o enriquecimento sem causa obtido com a venda dos bens da Autora. Factos estes a serem determinados em execução de sentença”.
Notificada para se opor, a EMP02... apresentou articulado, opondo-se à liquidação da requerente, pugnando pela rejeição liminar do requerimento inicial, invocando a figura de caso julgado para parte do peticionado pela requerente, impugnando a factualidade alegada por esta e deduzindo reconvenção por via da qual peticionou “ser a Autora condenada a pagar à Ré a quantia d e 382.106,00 € (correspondente a 50% da liquidação nos termos supra indicados e cujo valor total ascende 764.212,00€), acrescida de juros de mora, até efectivo e integral pagamento”.
Em sede de audiência prévia foi cumprido o contraditório, foi proferido despacho de aperfeiçoamento dirigido à requerente que esta acatou reformulando o peticionado [“na eventualidade de ter por procedente a verificação da existência ou ocorrência do depósito mercantil, dever ser considerado na douta sentença, que ainda que assim se pudesse ter entendido a existência de um suposto contrato de depósito mercantil e, alusivo aquele ao período mencionado na Decisão, a saber, no período compreendido de Julho de 2007 a ../../2015 e ainda, por referência aos bens da Autora e aos usos praticados pela ..., à data, que a existir qualquer compensação sempre se teria aquela por Nula e, por consequência, nada deveria a Autora à Ré, se assim não se entender o valor devido corresponde a € 6.579,31 (a liquidar a meação desta quantia de acordo com a sentença já proferida)”], foi proferido despacho saneador, admitindo-se a reconvenção deduzida pela requerida, definiu-se o Objecto do Processo e procedeu-se à selecção dos Temas de Prova.
Foi produzida prova pericial.

*
A final foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:

«Em face do exposto:
• Julgo o incidente de liquidação proposto por EMP01..., Unipessoal, Lda. contra EMP02... – Sociedade Comercial de Madeiras de ..., Lda., parcialmente procedente, por parcialmente provado;
• Julgo o incidente proposto por EMP02... – Sociedade Comercial de Madeiras de ..., Lda. contra EMP01..., Unipessoal, Lda., parcialmente procedente, por parcialmente provado;
• Liquido em € 28.837,30 a metade da quantia que corresponde aos usos da praça, nos termos do artigo 404º do Código Comercial, aplicáveis ao depósito cujas características constam das alíneas k) a m), p) e r) do Ponto II - 1, da sentença proferida nos autos da acção declarativa;
• Consequentemente, e na compensação dos créditos recíprocos, condeno a requerida a pagar à requerente a quantia global de € 187.739,45, acrescida de juros de mora a contar desde 21.08.2015 sobre esta quantia, à taxa legal aplicável às operações comerciais, até integral e efectivo pagamento.»
*
Inconformada com a sentença, a ré EMP02... – Sociedade Comercial de Madeiras de ..., Lda, interpôs recurso, finalizando com as seguintes conclusões (transcrição):

1. O presente recurso vem interposto
- do despacho recorrido de fls. (refª 443 508 26) o qual não deferiu o requerido (refª ...39) quanto às questões a acrescentar na perícia, o qual padece de erro de julgamento e violação da lei, com as legais consequências.
- do incumprimento e da omissão quanto aos despachos (486 089 97, de 16.05.2022) (refª ...21, de 27.06.2022; refª 489 905 91,de 26.07.2022), da nulidade e do erro de julgamento e violação da lei, com as legais consequências.
- da sentença proferida a fls. (refª ...12 / ...97), porquanto, padecem de nulidades, violação da lei, erro de julgamento (quer quanto à matéria de facto, alteração da matéria de facto provada e não provada em face da prova e da reapreciação da prova gravada, quer quanto à matéria de direito).
2. Impõe-se, alteração da matéria de facto provada e não provada, em face da reapreciação    da prova gravada e da demais prova     produzida, a qual demonstrará que a sentença recorrida errou na apreciação que fez da prova e dos factos e há nulidade e erro de julgamento na interpretação e aplicação dos factos e do direito.
3. A finalidade da liquidação da sentença, por determinação da sentença liquidanda foi apurar o valor devido pelo depósito segundo os “usos da praça” nos termos do artigo 404º do Código Comercial
4. E, tanto assim é que “O objecto do presente litígio consubstancia-se em liquidar a quantia a que corresponder aos usos da praça, nos termos do artigo 404º do     Código Comercial, aplicáveis ao depósito cujas características constam das alíneas k) a m), p) e r) do Ponto II - 1, da sentença proferida nos autos da acção declarativa” e, os temas da prova dividiram-se basicamente em dois temas: as áreas ocupadas pela madeira e o preço
5.O Mmº Juiz “a quo” entendeu que a matéria em causa e objecto do litígio deveria ser objecto de perícia e, por despacho de fls. (30.05.2019, refª ...34 57) “a  quo” determinou oficiosamente a realização de perícia.
6.O despacho recorrido de fls. (refª 443 508 26) o qual não deferiu o requerido (refª ...39) quanto às questões a acrescentar na perícia, padece violação do princípio da igualdade, de erro de julgamento e violação da lei, com as legais consequências.
7. O Mmº Juiz “a quo”, no cumprimento dos seus deveres de busca da verdade material, do inquisitório, da  legalidade e da obrigatoriedade do conhecimento desta matéria, tinha o dever de assegurar que o Sr. Perito dava cumprimento ao por si ordenado
8. O Mmº Juiz “a quo” omitiu pronúncia quanto ao nosso requerimento (refª...21, de 27.06.2022) o que consubstancia nulidade que expressamente se argui
9.O Sr. Perito não deu cumprimento ao determinado nesse despacho, nem o relatório que apresentou dá cabal resposta ao objecto da pericia
10. E, apesar do Sr. Perito não ter dado resposta e  a Recorrente ter apresentado o requerimento (refª ...21, de 27.06.2022), porque a perícia continuava a não dar cabal resposta ao objecto da mesma, nem dava cumprimento ao determinado no despacho de fls.
11. A Mmº Juiz “a quo”, apesar de saber que a perícia estava incompleta, em vez de determinar o cumprimento do seu despacho de fls. e de assegurar que a perícia cumpria o ordenado, nada fez e ficou-se pelo despacho (refª 489 905 91,de 26.07.2022)
12. E, assim, em vez de o Tribunal ter uma perícia completa, que podia e devia responder à questão central que justificou que fosse ordenado – qual o valor de acordo com os usos da praça, ficou uma perícia, que não responde de todo à questão central e essencial
13. E, na questão central do valor segundo os usos da Praça, não responde de todo, porquanto se fica pelos usos do tarifária do Porto ....
14. Estava, pois, o Mmº Juiz “a quo”, obrigado a apreciar e decidir o nosso requerimento de fls. e ao não o fazer, omitiu pronúncia e incorreu em nulidade e violação do artigo 348º, nºs 1 e 2 do Código Civil,
15.Além de que estava obrigado a assegurar o cumprimento do por si ordenado e que passava pelo facto do perito apreciar a questão do valor praticado pelas empresas e/ou à luz dos usos do comércio da praça.
16.Incorrendo, também aqui, em omissão, nulidade e ilegalidade, o que expressamente se invoca para os devidos efeitos legais.
17.Naturalmente, que, tanto o indeferimento das questões a incluir na perícia, como, a atitude passiva de não assegurar o cumprimento do ordenado quanto à perícia, se traduziram, numa perícia incompleta, e, incompleta nos aspetos da maior relevância probatória, com inequívoco prejuízo para a defesa da Recorrente, que por estes motivos viu serem-lhe coartadas as possibilidades da perícia responder ao que era mais importante para o processo – qual o valor do depósito à luz dos usos do comércio, dos usos da praça.
18. O que fere, tais despachos, omissões e os actos que se lhe seguiram incluindo a sentença recorrida, de nulidade e erro de julgamento violação dos artigos 348º, nºs 1 e 2 do CC; 4º, 5º, nº 3, 6º, 152º, 195º, 196º, 411º, 469º, nºs 1 e 2, 477º, 481º e 487º, nº 2 do CPC, com as legais consequências.
19. Tivesse o Mmº Juiz “a quo” cumprido e feito cumprir o que havia determinado no âmbito da perícia, e, a sentença seria outra em vez de desaguar numa sentença onde diz que não determinou quantitativamente, além de que, teria contribuída para uma justa decisão e para a descoberta da verdade material,
20. A liquidação da sentença visa concretizar o objecto da condenação, com respeito pelo caso julgado decorrente da acção declarativa.
21. O Tribunal por sentença transitada em julgado circunscreveu a actuação do Tribunal em fase de liquidação apenas ao seguinte:
- valor do depósito entre ../../2007 e ../../2015 com as características do armazenamento constam das alíneas k) a m), p) e r) do ponto II.1
- valor que for liquidado posteriormente em quantia cuja fixação se remete para decisão ulterior, nos termos do disposto no artigo 609º, nº 2, do Código de Processo Civil, e que corresponder aos “usos da praça” nos termos do artigo 404º do Código Comercial
22. Impunha-se, assim, que o Mmº Juiz “a quo” em sede de liquidação proferisse decisão de liquidação quanto ao valor do depósito com base nos usos da praça, o que não fez e, na verdade, a douta sentença de que agora se recorre, não dá cumprimento ao que foi determinado na sentença liquidanda, viola o objeto de litigio extravasando-o, e, padece de nulidade por isso e por ofensa de caso julgado.
23.A sentença liquidanda e que constitui caso julgado obriga a liquidar de acordo com os usos da praça, nos termos do artigo 404º do Código Comercial, mas, o Mmº Juiz “a quo” desistiu (erradamente) de liquidar de acordo com os usos da praça, e, não deu cumprimento, nem ao determinado pela sentença liquidanda, nem respeitou o objecto do litigio (com as legais consequências) e ofendeu o caso julgado, ferindo a sentença de nulidade (artigo 615º, d) do CPC)
24. Na verdade, em face da sentença liquidanda o Mmº Juiz “a quo” estava obrigado a liquidar o valor devido pelo depósito segundo os usos da praça, mas, não foi isso que fez,
25. Usou como base para a liquidação, intervalos de valores que não decorrem dos usos da praça, mas apenas e tão só dos putativos usos do porto de mar de ... e, mesmo em relação a esses, o perito, diz que não são conclusivos.
26. Decorre do regime do artigo 404º do Código Comercial a obrigação de só se poder recorrer ao arbitramento, na falta de usos da praça, ora, nem há, no caso, falta de usos da praça, nem resulta da fundamentação da douta sentença recorrida, nem nos factos provados essa falta de usos da praça.
27.O que impedia a via do arbitramento e impunha ao Tribunal “a quo” proceder à obtenção, produção da prova e análise da mesma, à luz dos ”usos da praça”, e não o fez
28.O Mmº Juiz “a quo” em vez de determinar ao perito que mesmo se socorresse dos meios necessários para o efeito (artigo 481º do CPC) ou em vez de determinar uma segunda perícia, preferiu, não o fazer (em violação da sentença liquidanda e do artigo 404º do C.Comercial) e estribar a sua sentença em valores que nada têm que ver com os “usos da praça”, além de que, vai buscar esses valores à perícia que não só não é conclusiva como não se fundou nos usos da praça, tudo em violação da sentença liquidanda e do caso julgado e em violação do regime previsto no artigo 404º do C.Comercial.
29. O caso em apreço nasce da relações juscomerciais entre duas empresas privadas – a Recorrente sita em ... e a Recorrida sita em ... - a actividade da Recorrida é no âmbito da importação de madeiras e compra e venda de madeiras, a actividade da Recorrente é no sector da serração de madeira, e, além disso, depósito/armazenamento de madeira.
30. Os valores que se pretendem apurar, são referentes a um período (2007-2015), e, nesse período a Recorrida teve depositada nas instalações da Recorrente AA, o que implicava a recepção dos stocks, a carga e descarga dos mesmos, empilhamento, guarda, portanto atividade de logística.
31. À luz da sentença liquidanda e do artigo 404º do CComercial, impunha-se apurar quais os preços praticados pelas empresas privadas desse sector na região.
32. Não corresponde, de todo, aos usos da praça, e, portanto, viola a sentença liquidanda e o disposto no arigo 404º do C.Comercial, basear e sustentar o valor liquidando num intervalo de preços praticado pelo Porto ... como fez a sentença recorrida.
33.A actividade dos Portos de Mar é completamente diferente do sector das empresas privadas que desenvolvem a atividade de logística, sendo os mesmos entidade de direito administrativo, na dependência do Governo. e, cuja atividade que o Porto desenvolve é objecto de normas administrativas, de politicas públicas, que nada têm a haver com a lógica do escopo lucrativo das empresas privadas.
34. São dois mundos completamente distintos, com atividades diferentes e com valores praticados completamente diferentes.
35. Nos Portos de Mar, incluindo no então Porto ..., há valores tabelados, impostos pelo Governo, e que são taxas, contrapartidas que o Estado cobra por um serviço que o Estado presta, as quais não visam nem têm incorporado qualquer lucro.
36. Não é possível fazer num Porto de Mar a mesma actividade de logística praticada pelos privados, aliás, se assim não fosse, então não havia razão de ser para quantidade que empresas privadas que se dedicam à actividade de logística, com espaços próprios (abertos ou       fechados) onde têm as mercadorias dos clientes depositadas.
37. A Recorrente e a Recorrida são empresas privadas, que têm como escopo o lucro, logo o preço que praticam tem sempre presente esse fim que é o lucro. (o que não acontece nos preços praticados pelos Portos)
38. Equivale a pretender-se encontrar o preço praticado pelo mercado de arrendamento para habitação praticado pelos privados, e, ir procurar essa valor aos preços praticados pelos Municípios nos arrendamentos sociais.
39.A ... respondeu de forma lapidar e clarividente da seguinte forma (08.04.2019, refª ...73)
- os valores que os portos praticam são determinados pela tutela, ou seja, não resulta do mercado, nem dos usos da praça
- o armazenamento de madeira fora dos portos é um negócio privado com preços diferentes dos praticados pelos Portos e por isso a ... desconhece os valores médios de acordo com os usos da praça
40. Este oficio da ... está em consonância com o documento “estudo da “Triconsulte” (refª ...42) que a Recorrente juntou a fls., o qual também refere que os valores praticados pelos portos são diferentes dos praticados pelas empresas privadas e, os regulamentos da ... juntos pela Recorrente e citados no dito estudo da Triconsulte, são idênticos ao regulamento que a ... veio juntar (08.04.2019, refª ...73) (cfr. capitulo VI, artigos 18º e 19º do regulamento da ...)
41. Isto mesmo, é de conhecimento público e notório e também resulta de forma evidente do oficio enviado pela ... ao Tribunal (junto a fls.), do relatório da Triconsulte (junto na audiência prévia), do depoimento da testemunha BB (consultor do Banco Mundial e que trabalhou também neste sector das medeiras) do depoimento da testemunha CC (o qual trabalhou num empresa privada de logística “EMP03..., Lda” a qual teve a Recorrida como cliente que nela armazenou madeiras), da testemunhal DD (despachante oficial e com profundo conhecimento do funcionamento dos Portos e da diferença das atividades entre o mundo privado da Logistica e a actividade dos Portos), EE (funcionárío de um empresa privada de referência no sector da Logistica e com profundo conhecimento do sector) e ainda os depoimentos das testemunhas FF e GG) (depoimentos que se indicaram em concreto)
42. O Sr. Perito viria a esclarecer a fls: “No âmbito desta peritagem não se considerou os preços de armazenagem praticados por empresas privadas, nomeadamente operadores portuários, importadores e outras empresas comercializadoras de madeiras. Apenas se recolheu informação, analisou e considerou, nos cálculos efetuados, os preços (taxas) aplicadas pela autoridade portuária do Porto ...    (...) sobre o armazenamento no seu porto comercial”, e, o Mmº Juiz “a quo” proferiu o despacho (486 089 97, de 16.05.2022)
“Facultando-lhe cópia do requerimento supra-epigrafado, notifique o Sr. perito para, no prazo de 20 dias:
a) Encetar as diligências necessárias para identificar, num raio de cerca de 20 quilómetros, tendo como ponto de referência o porto comercial de ..., as empresas privadas – caso existam - com vocação e capacidade para procederem a um depósito/armazenamento do tipo que é discutido nos presentes autos, e os preços por elas praticados no período em análise;
43.O tribunal “a quo”, sabia que para cumprir a lei (artigo 404º do C.Comercial) e o determinado na sentença liquidanda tinha que perceber que valores eram esses os praticados pelo sector da logística privada naquela região e errou, porque encontrou o valor, desconsiderando totalmente os valores praticados pelas empresas privadas, e, baseando-se apenas em intervalos de valores que nada têm a haver com os usos da praça além do aspeto já referido de que esses intervalos de valores decorrem de uma perícia que nessa matéria até foi inconclusiva.
44. O Tribunal “a quo”, tinha que estabelecer o valor segundo os usos praça e só na falta dos usos por arbitramento e, a sentença recorrida errou por que não fez, nem uma coisa, nem outra
45. O Tribunal tinha o seu âmbito de decisão circunscrito pela sentença liquidanda e pelo objeto do litígio logo, estava vedado ao Tribunal “a quo” decidir quanto à matéria de compensação como decidiu a “…compensação dos créditos recíprocos, condeno a requerida a pagar à requerente a quantia global de € 187.739,45, acrescida de juros de mora a contar desde 21.08.2015 sobre esta quantia, à taxa legal aplicável às operações comerciais, até integral e efectivo pagamento
46. Nessa parte a Sentença recorrida extravasa o âmbito do processo e objecto do mesmo, não podendo no seu âmbito de actuação decidir quanto a compensação (a qual aliás já tinha sido decidida na sentença liquidanda formando caso julgado) incorrendo aí em nulidade nos termos do disposto na alínea d) do nº 1 do artigo 615º do CPC.
47.O Juiz “a quo” também errou quando na sentença recorrida decidiu julgar parcialmente procedente o incidente de liquidação proposto por EMP01..., Unipessoal, Lda. contra EMP02... – Sociedade Comercial de Madeiras de ..., Lda, quando na verdade tinha que ter julgado totalmente improcedente o incidente de liquidação proposto por EMP01..., Unipessoal, Lda. contra EMP02... – Sociedade Comercial de Madeiras de ..., Lda.
48. Pois que, a Recorrida EMP01... no pedido que formulou, que na realidade é um pedido inidóneo e quase incompreensível, peticionou que nada havia a pagar, ou seja, que o valor da liquidação era 0€ ou, se assim não fosse entendido então limita ao valor de 3.289,65€
49.O Juiz “a quo”, errou na sentença recorrida, pois tinha que ter julgado totalmente improcedente o incidente de liquidação proposto por EMP01..., Unipessoal, Lda. contra EMP02... – Sociedade Comercial de Madeiras de ..., Lda além de que, não podia ter decidido qualquer matéria de compensação, assim a sentença recorrida decidiu em erro de julgamento e incorreu em nulidade, como já referido, o que se requer, com as legais consequências.
50. E, em clara violação dos limites decisórios a que estava submetido o Tribunal “a quo”, o mesmo na sentença recorrida extravasou os mesmos e ofendeu caso julgado, ferindo a sentença recorrida de nulidade e de ilegalidade, com as legais consequências
51.e a sentença recorrida não cumpriu a sentença liquidanda pois que não se limitou a procedeu à fixação de metade da quantia que corresponder aos usos da praça nos termos do artigo 404º do C. Comercial, ofendendo, desde feita, a sentença recorrida o caso julgado, e decidindo em violação da sentença liquidanda a para além dos limites definidos para o efeito, com as legais consequências além da nulidade da mesma.
52. A sentença recorrida decidiu “Liquído em € 28.837,30 a metade da quantia que corresponde aos usos da praça, nos termos do artigo 404º do Código Comercial, aplicáveis ao depósito cujas características constam das alíneas k) a m), p) e r) do Ponto II - 1, da sentença proferida nos autos da acção declarativa mas, é caso para perguntar onde foi o Mmº Juiz “a quo” buscar o valor “Liquído em € 28.837,30 a metade da quantia que corresponde aos usos da praça…
53. Na verdade esse valor, à luz dos factos provados e da prova produzida, não corresponde a metade da quantia que corresponde aos usos da praça.
54. A sentença liquidanda mandou apurar o valor (100%) e depois o mesmo é reduzido a 50%, não é o que aqui sucede, pois que, o Mmº Juiz “a quo” aplicou metade nos factos provados f) e g) e em cima dessa metade ainda aplicou mais uma redução de metade. (ou seja reduziu o valor a 1/4)
55. O que, contraria e ofende o determinado na sentença liquidanda e no objecto do litígio, consubstancia violação da sentença liquidanda, ofensa de caso   julgado, posição entre            os fundamentos e a decisão e   erro de julgamento, ferindo a sentença recorrida de nulidade (artigo 615º, nº 1, c) e d) do CPC, o que se requer.
56. Tanto a prova documental como a reapreciação da prova testemunhal (gravada) determinam, que a sentença recorrida padece de        erro de julgamento quer quanto aos factos e à interpretação e aplicação do mesmo, quer quanto à matéria de facto provada e não provada, a qual deverá ser, também aí alterada.
57. Têm de ser removidos dos factos provados a matéria vertida nas alíneas “f) De Julho de 2007 a ../../2015, metade do valor de mercado do depósito da madeira referida em d), oscila,   consoante o fluxo quantitativo,  o tempo de  permanência e mediante aplicação do tarifário 1 e do tarifário 2 da ... (porto de mar de ...), entre o valor  mínimo de € 2.802,86 e  € 64,443,36,  conforme explicitado no relatório pericial e respectivos anexos constantes de fls. 1137 a  115  e cujos teores se     dão aqui por integralmente reproduzidos;
g) De Julho de 2007 a ../../2015, metade do valor de mercado do depósito da madeira referida em e), oscila, consoante o fluxo quantitativo,          o tempo d permanência         e mediante aplicação do tarifário 1 e do tarifário 2 da ... (porto de mar de ...), entre o valor mínimo de € 429,91 e € 9.832,12, conforme explicitado no relatório pericial e respectivos anexos constantes de fls. 1137 a 1151 e cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos;
58. Do relatório pericial e dos esclarecimentos prestados pelo Perito (por escrito e gravados) não resulta o que está vertido nas alíneas f) e g) dos factos provados.
59. Não diz, nem se pode retirar do relatório pericial (e o Mmº Juiz “a quo” aí fez uma manifesta e errada interpretação e aplicação do mesmo)
*que de Julho de 2007 a ../../2015, metade do valor de mercado do depósito da madeira referida em d), oscila, consoante o fluxo quantitativo, o tempo de permanência e mediante aplicação do tarifário 1 e do tarifário 2 da ... (porto de mar de ...), entre o valor     mínimo de € 2.802,86 e  €  64,443,36, conforme explicitado no relatório pericial e respectivos anexos constantes de fls. 1137 a 1151 e cujos teores se dão aqui por     integralmente reproduzidos;
*que de Julho de 2007 a ../../2015, metade do valor de mercado do depósito da madeira referida em e), oscila, consoante o fluxo quantitativo,     o tempo de permanência  e mediante aplicação do tarifário 1 e do tarifário 2 da ... (porto de mar de ...), entre o valor mínimo de € 429,91 e € 9.832,12
60. É inteiramente falso e errado que da perícia resulte como o Mmº Juiz “a quo” verteu nos factos provados f) e g) que metade do valor de mercado do depósito  da madeira referido em d) e em e) oscila, consoante fluxo quantitativo, tempo de permanência e mediante a aplicação do tarifário 1 e 2 da ...
61.E, isso também assim decorre porque
- a perícia, não logrou apurar o valor de mercado (como o próprio perito reconhece no relatório que apresentou e no depoimento gravado que se transcreve infra).
- o depoimento gravado do sr. Perito na sessão de julgamento de 13.06.2023, resulta na comprovação de que o mesmo refere que não sabe, não é perito para estas matérias e que não apurou os valores dos usos da praça (cfr. excerto do depoimento nos minutos 02:51 a 04.11)
- a resposta que a ... deu ao despacho refª ...40 por ofício (08.04.2019, refª ...73)
- o “estudo da “Triconsulte” (refª ...42) que a Recorrente juntou a fls., vão no sentido de que os valores praticados pelos portos são diferentes dos praticados pelas empresas privadas
62.Além de que,
- na perícia também não se diz que o valor de mercado do depósito da madeira referido em d) e em e) oscila, consoante fluxo quantitativo, tempo de permanência e mediante a aplicação do tarifário 1 e 2.
- em lado algum da perícia se pode retirar, como o Mmº Juiz “a quo” retirou que o valor mínimo é de 429,91€ e 9.832,12€ para o depósito em e) e 2.802,86€ e 64.443,36€ para o depósito em parque aberto;
63. Resulta do relatório pericial que as questões que o Sr. Perito indica e que tiveram as seguintes respostas:
1.Qual a área em metros quadrados que a madeira apurada na sentença ocupava no parque exterior da ré? Resposta: 1.058m2
2. Qual a área em metros quadrados que a madeira apurada na sentença ocupava no armazém fechado com cobertura da ré? Resposta 27m2
3. Qual o preço unitário em metros quadrados para o depósito com as características apuradas na sentença em parque fechado ao ar livre? Resposta Não conclusiva
4. Qual o preço unitário em metros quadrados para o depósito com as características apuradas na  sentença no armazém fechado com cobertura? Resposta: Não conclusiva
5. Qual o valor que corresponde ao cálculo aritmético referente a metade do quantum calculado nos termos dos pontos anteriores, sendo que tal cálculo deverá ser sempre por referência em função dos usos e costumes da praça de ...? Resposta Não Conclusiva
a. Caso da madeira apurada no parque a descoberto (ar livre); Resposta Não Conclusiva
b. Caso da madeira apurada no armazém fechado com cobertura. Resposta Não Conclusiva
64. Se o próprio perito diz que não é perito estas matérias e diz que não conseguiu determinar o valor de mercado, não pode o Tribunal “a quo” levar aos factos provados matéria como sendo valor de mercado, que o próprio perito não dá por assente e que além disso reconhece que ele não é perito nessas matérias,
65. E o Perito refere na perícia e nos esclarecimentos prestados que os tarifários usados no porto não tinham valores para cenários de depósito por período temporal como o que está em apreciação.
66. O perito fala em diversos cenários hipotéticos, mas, não conseguiu apurar, nem apurou os valores de mercado praticados para um depósito com a características do que está em causa, com a duração de 2892 dias de 2007 a 2015 – até porque que todos os tarifários usados pelo Sr. Perito são para períodos não superiores a 90 dias) e mais, resulta da perícia que esses valores dos Portos tinham de constar de despacho, regulamento, portaria, e, no caso, o Sr. Perito não logrou obter qualquer documentação lhe permitisse saber quais os valores praticados para depósito por período superior a 90 dias (2.892 dias) no período em causa (2007 a 2015). Na verdade, não conseguiu qualquer despacho interno que lhe permitisse saber se aplicava o Tarifário 2, e quanto ao Tarifário 1, o Sr. Perito diz que provavelmente não seria aplicado, mas não explica porque é que considerou que provavelmente não seria aplicado.
67. Os cenários A2, A3, B2, e B3 não são sequer aplicáveis ao caso dos autos, pois que se baseiam em pressupostos que não decorem dos dados factuais da sentença liquidanda, ou seja, um depósito constante de uma mesma determinada quantidade de madeira durante o período de 2007 a 2015.
68. No caso da sentença liquidanda, nem há fluxos de madeira, nem tempos médios de permanência.
69.Em face dos factos assentes na sentença liquidanda, o cenário suscitado pelo perito mais próximo da realidade do deposito liquidando seria apenas o A1 e o B1, das respostas às questões 5A e 5B e que se traduzem nos seguintes valores
*2,892 dias (2007 a 2015) numa área de 1.058m2= 128.886,72€ (cenário A1)
*2,892 dias (2007 a 2015) numa área de 27m2 = 19.737,19€ (cenário B1)
e, jamais nos valores que constam em f) de 2.802,86€ /64.443,36 e em g) de 429,91€ e 9.832,12€ da sentença recorrida.
70. Portanto, ao contrário do que a sentença recorrida fez erradamente verter nos factos provados f) e g), a perícia não só não apurou o valor de mercado, como também não concluiu que o valor do depósito oscila consoante o fluxo quantitativo, o tempo de permanência e mediante aplicação do tarifário 1 e do tarifário 2 da ..., nem concluiu que o valor é entre o valor mínimo de € 2.802,86 e € 64,443,36 (do deposito em d) e o valor mínimo de € 429,91 e € 9.832,12€ (do depósito em e).
71. Desta feita, importa alterar a matéria de facto provada e retirar da mesma a matéria vertida nas alíneas f) e g)
“f) De Julho de 2007 a ../../2015, metade do valor de mercado do depósito da madeira   referida em d), oscila,  consoante o fluxo quantitativo, o tempo de permanência e mediante aplicação do tarifário 1 e do tarifário 2 da ... (porto de mar de ...), entre o valor mínimo de € 2.802,86 e €64,443,36, conforme explicitado no relatório pericial e respectivos anexos constantes de fls. 1137 a 1151 e cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos;
g) De Julho de 2007 a ../../2015, metade do valor de mercado do depósito da madeira referida em e), oscila, consoante       o fluxo quantitativo,  o tempo de permanência e mediante aplicação do tarifário 1 e do tarifário 2 da ... (porto de mar de ...), entre o valor mínimo de € 429,91 e € 9.832,12, conforme explicitado no relatório pericial e respectivos anexos constantes de fls. 1137 a 1151 e cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos;
72. A sentença recorrida deve ser alterada e os factos dados como provados em f) e g) devem ser retirados dos factos provados, porquanto não se enquadram no objeto do litigio, nem nos respetivos temas da prova, além de que, a prova produzida (documental - oficio da ..., relatório da Triconsulte, depoimento gravado do Perito, e relatório pericial) assim o determina como acima se explanou.
73. Em face da citada prova (oficio da ..., relatório da Triconsulte, depoimento gravado do Perito acima indicado e relatório pericial) deve ser levada à matéria de facto provada apenas e tão só o seguinte:
f) O relatório pericial de fls. não apurou o valor de mercado e não foi conclusivo quanto ao aspeto quantitativo do depósito d) e e) g) De acordo com o relatório pericial de fls., o cenário quantitativo mais próximo da do depósito d) e e) é o constante do cenário 5 A1 e 5 B1, das respostas às questões 5A e 5B e que se traduzem nos seguintes valores
*2,892 dias (2007 a 2015) numa área de 1.058m2= 128.886,72€ (cenário A1)
*2,892 dias (2007 a 2015) numa área de 27m2 = 19.737,19€ (cenário B1)
74. A douta sentença recorrida também errou ao dar como provado o facto vertido sob a alínea h) pois que,
- não consta dos autos nenhuma documentação que demonstra que a EMP01... importou madeira através do Porto ... até 2007 tendo a partir desse ano passado a fazê-lo através do porto comercial de ....
- o contabilista da Recorrida, HH e Sá, e que era contabilista da Recorrida desde o início da mesma, declarou ao Tribunal que no período 2011 a           2016 a Recorrida não fez qualquer importação de madeiras (cfr. depoimento gravado de II, testemunha da Recorrida, sessão de 13.06.2023, 15h08 a 15h.32, concretamente nos minutos 1.20 a 2.54; 6.25 a 6.57, 16.20 a 16.35).
- a testemunha CC (sessão de julgamento de 13.06.2023 – 14.16 a 14.57) transmitiu ao Tribunal que a recorrida no período 2007 a 2011 importava madeiras pelo Porto ... (cfr. extracto do depoimento gravada, minutos 3.26 a 5.10; 5.16 a 5.39)
- portanto, nem a Recorrido juntou quaisquer documentos demonstrativos de importar madeira e de fazer qualquer uso do Porto ..., com até resulta da produção de prova testemunhal (depoimento gravado de II, testemunha da Recorrida, sessão de 13.06.2023, 15h08 a 15h.32, concretamente nos minutos 1.20 a 2.54; 6.25 a 6.57, 16.20 a 16.35 / CC (sessão de julgamento de 13.06.2023 – 14.16 a 14.57, minutos 3.26 a 5.10; 5.16 a 5.39) que no período em causa nos autos (2007 a 2015), a Recorrida não usou o Porto ..., pois que de 2011 em diante não fez qualquer importação de madeiras e antes de 2011 usou o Porto ....
75.Pelo que, a sentença recorrida revelou uma errada apreciação da prova produzida, na verdade, a prova produzida e a falta dela, impõem que o facto provado na sentença recorrida sob a alínea h) “A Requerente importou madeira através do porto comercial de ... até 2007, tendo a partir desse ano a fazê-lo através do porto comercial de ...”, seja retirado dos factos provados.
76. Não há qualquer prova produzida que justifique esse facto dado como provado sob a alínea h) da sentença recorrida.
77. Por força da prova testemunhal produzida e da não junção de documentos que a infirmem, deve a sentença recorrida também ser alterada quanto à matéria de facto e passar a constar dos factos provados da mesma, o seguinte:
“h) A Recorrida no período de 2007 a 2015 não usou o Porto ..., e no período de 2011 em diante não fez qualquer importação de madeiras” (cfr. depoimento gravado de II, testemunha da Recorrida, sessão de 13.06.2023, 15h08 a 15h.32, concretamente nos minutos 1.20 a 2.54; 6.25 a 6.57, 16.20 a 16.35; e depoimento da testemunha CC sessão de julgamento de 13.06.2023 – 14.16 a 14.57, depoimento gravada, minutos 3.26 a 5.10; 5.16 a 5.39)
78. A Recorrente juntou aos autos os regulamentos com o tarifário praticado pela ..., no período em causa, 2007 a 2015) e, não há sombra de dúvida que os referidos documentos (docs. ... a ...4) contêm os tarifários praticados no porto de mar para aqueles períodos.
79. Do teor desses documentos resulta que:
*em 2007 o custo de armazenagem praticado pela ... era de 2.60 €/m2 por mês o que corresponde a 2.600,00 €/mês + iva, para 1000 m2. (cfr. tarifário junto como doc. ...)
*em 2013 o valor diário por m2 entre o 19º e o 20º dia de armazenamento é de 0.1602 €/m2/dia o que corresponde ao valor mensal de 4.806,00€+iva para 1000 m2. (preços também praticados pela ..., cfr. tarifário doc. ...)
*para   prazos de armazenamento superiores a 20 dias a ... apresenta um valor de 0.6404 €/m2/dia o que corresponde a 19,212.00 €+iva (Dezanove mil duzentos e doze euros) mensais por 1000 m2. (doc. ...)
*o  valor total  do  depósito das madeiras em parque fechado descoberto, no período em causa (de 2007 a 2015), de acordo com os preços praticados pela ..., ascende ao valor total de 728.748,00 € +iva (docs. ... a ...)
(cfr. pág. 1, tarifário ... 2005, pág. 2, art. 19º - 2 do Tarifário ... 2013; pág. 18, art. 20º - 2 do Tarifário ... 2014, pág. 16, art. 19º - 2 do Tarifário ... 2015)
* no que concerne ao armazenamento em armazém fechado, de acordo com os preços praticados pela ... (que inclui o Porto ...), constatamos que 2015 cobrava, 36*ZM= 36x0.0745 €/10 m2/dia, assim, este valor corresponde a 2.682 €/m2/dia. (doc. ...)
80. Desta feita, impõe-se, também por aqui alteração da sentença quanto à matéria de facto provada e não provada, aditando à matéria de facto provada, a seguinte:
i) o valor total  do depósito das madeiras em           parque fechado descoberto, no período em causa (de 2007 a 2015), de acordo com os preços praticados pela ..., ascende ao valor total de 728.748,00 € + iva e o armazenamento em armazém fechado, de acordo com os preços praticados pela ... (que inclui o Porto ...) ascende a 36*ZM= 36x0.0745 €/10 m2/dia, assim, este valor corresponde a 2.682 €/m2/dia (provado pelos docs. ... a ..., e pág. 1, tarifário ... 2005, pág. 2, art. 19º - 2 do Tarifário ... 2013; pág. 18, art. 20º - 2 do Tarifário ... 2014, pág. 16, art. 19º - 2 do Tarifário ... 2015)
81. Resultou da seguinte prova documental e testemunhal produzida, que há um mercado competitivo de empesas privadas, que se dedicam à atividade de armazenamento / depósito comercial (tal qual o depósito em causa nos autos) o qual é completamente distinto do negócio e atividades dos portos de mar (no caso ... e ...):
- do documento da ... de fls., em resposta ao despacho refª ...40 por ofício (08.04.2019, refª ...73)
- relatório da Triconsulte (junto a 16.01.2019, refª ...42)
- da posição do perito, do despacho judicial de fls, e da resposta do perito “No âmbito desta peritagem não se considerou os preços de armazenagem praticados por empresas privadas, nomeadamente operadores portuários, importadores e outras empresas comercializadoras de madeiras. Apenas se recolheu informação, analisou e considerou, nos cálculos efetuados, os preços (taxas) aplicadas pela autoridade portuária do Porto ... (...) sobre o armazenamento no seu porto comercial.”
- do despacho (486 089 97, de 16.05.2022)
- dos regulamentos e quadro legislativo dos portos juntos a fls. e
- dos    seguintes depoimentos, cujos excertos relevantes constam das seguintes passagens
*Depoimento da testemunha DD, sessão de julgamento 16.06.2023, 14h23 – 14h54, minutos 00:04 a 00:24; 02:09 a 07:43; 10:15 a 12:58; 15:39 a 18:22; 26:46 a 28:15
*Depoimento da testemunha EE, sessão de julgamento de 16.06.2023, 10h44-11h01, minutos 10:49 a 11:46
*Depoimento de FF, sessão de julgamento 13.06.2023, 11h16 – 11h35, minutos 17:07 a 18:17
* Depoimento/esclarecimento do perito Eng.º JJ,  sessão de julgamento 13.06.2023, 11h00-10h15, minutos 02:51 a 04:11
*Depoimento da testemunha CC, sessão de julgamento de 13.06.2023, excerto dos minutos seguintes 26:09; 27.41; 28:09 a 28,48; 30:06 a 33:04; 35:15 a 39:35
*Depoimento da testemunha BB, sessão de julgamento de 28.06.2023, nos minutos seguintes 00:59 a 02:48; 09:26 a 13:57;
82. Em face da prova documental supra referida e da reapreciação da prova gravada cujos excertos acima transcrevemos e indicamos, resulta provado e importa alterar a sentença recorrida na matéria de facto provada e não provada, aditando aos factos provados, os seguintes:
j) A actividade dos portos de mar tem regras próprias e funciona com preços, pressupostos e condições diferentes        do mercado das empresas privadas
k) Há um mercado competitivo de empesas privadas, que se dedicam à atividade de armazenamento/depósito comercial o qual é completamente distinto do negócio e atividades dos portos de mar (no caso ... e ...)
83. O objecto do presente litígio consubstancia-se em liquidar a quantia a que corresponder aos usos da praça, nos termos do artigo 404º do Código Comercial, aplicáveis ao depósito cujas características constam das alíneas k) a m), p) e r) do Ponto II - 1, da sentença proferida nos autos da acção declarativa, portanto, o aspeto importante a apurar são os preços que são praticados pelas empresas privadas do mesmo sector/ na mesma atividade e na zona da Recorrente e Recorrida.
84. Tanto o perito como o Mmº Juiz “a quo”, reconheceram que os valores praticados por essas empresas privadas é diferente da atividade dos portos de mar, considerando o Juiz importante (despacho refª 486 089 97, de 16.05.2022) o perito a) Encetar as diligências necessárias para identificar, num raio de cerca de 20 quilómetros, tendo como ponto de referência o porto comercial de ..., as empresas privadas – caso existam - com vocação e capacidade para procederem a um depósito/armazenamento do tipo que é discutido nos presentes autos, e os preços por elas praticados no período em análise;”
85.O Mmº Juiz “a quo”, como já referimos, errou ao não determinar ao sr, Perito para que o mesmo se munisse dos meios próprios para dar resposta aquela matéria.
86. Ainda assim temos prova produzida, que permite ao Tribunal “a quo” dar como provada matéria da maior relevância para a boa decisão da causa.
87. Em face da referida prova documental e testemunhal supra plasmada o Mmº Juiz “a quo” tinha que ter levado aos factos provados a seguinte matéria L) Para o depósito de madeira no exterior com as características do depósito objeto dos autos, os valores unitários praticados pelas empresas privadas do sector na mesma actividade e região, são:
Transportes ... 4,70€
EMP04... 3,00€
EMP05... 3,40€
M) E, a média dos valores unitários praticados pelas empresas privadas do sector na mesma actividade e região da Recorrente são os seguintes:
Depósito em parque aberto – 3,70€
Depósito em parque coberto – 6,34€
88.matéria que resulta provada dos seguintes excertos dos depoimentos gravados
*Depoimento   de GG na sessão de 16.06.2023, excertos dos minutos seguintes, 08:54 a 09:26; 10:29; 11.30 a 13:52
*Depoimento da testemunha BB na sessão de julgamento de 28.06.2023, nos minutos seguintes 00:59 a 13:57;
*Depoimento de FF, sessão de julgamento 13.06.2023, 11h16– 11h35, nos minutos seguintes 17:07 a 18:17;
*Depoimento da testemunha EE, sessão de julgamento de 16.06.2023, 10h44-11h01, nos minutos seguintes 02:20 a 03:15; 03:51 a 03:56; 04:06 a 06:52; 09:58 a 10:47; 13:36 a 14:24;
89. E do relatório elaborado por consultor do Banco Mundial (16.01.2019, refª ...42) e, estes valores correspondem e comparam com os valores que constam dos documentos (orçamentos) de empresas do sector juntos pela Recorrente a 16.01.2019, refª ...42
90. Em face da prova documental e testemunhal acima referidas (que por maior facilidade de exposição se dão aqui por integralmente reproduzidos) deve a sentença recorrida ser alterada quanto aos factos provados e não provados, aditando-se à mesma os seguintes factos provados
L) Para o depósito de madeira no exterior com as características do depósito objeto dos autos, os valores unitários praticados pelas empresas privadas do sector na mesma actividade e região, são: Transportes ... 4,70€; EMP04... 3,00€ ; EMP05... 3,40€
M) E,   a média dos valores unitários praticados pelas empresas privadas do sector na mesma actividade e região da Recorrente são os seguintes:
Depósito em parque aberto – 3,70€; Depósito em parque coberto – 6,34€
91. A sentença recorrida decidiu e julgou erradamente a matéria de facto provada e não provada e carece de ser revogada conforme alegado.
*
A recorrida EMP01... Unipessoal, Lda apresentou contra-alegações defendendo a improcedência do recurso e a manutenção do decidido.
*
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
*
II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

São as seguintes as questões jurídicas a apreciar:

- A) Quanto ao despacho com a refª ...26 se deve ser ampliado o objeto da perícia;
- B) Quanto aos despachos com a refª. ...97, de 16.05.2022 e refª ...91, de 26.07.2022, se devem ser revogados e mandada completar a perícia;
C) Quanto à sentença proferida, saber se a mesma é nula e se deve ser alterada a matéria de facto e consequentemente os termos da liquidação no sentido proposto pela recorrente.
*
*
III - FUNDAMENTAÇÃO

A) Ampliação do objeto da perícia
No âmbito do presente incidente de liquidação foi determinada a realização de uma perícia, com o seguinte objeto:
- qual a área em metros quadrados que a madeira apurada na sentença ocupava no parque exterior da ré?
- qual a área em metros quadrados que a madeira apurada na sentença ocupava no armazém fechado com cobertura da ré?
- qual o preço unitário em metros quadrados para o depósito com as características apuradas na sentença em parque fechado ao ar livre?
- qual o preço unitário em metros quadrados para o depósito com as características      apuradas            na        sentença         no        armazém        fechado com cobertura?
A aqui Recorrente apresentou requerimento para ampliação do objeto da perícia pretendendo ver respondidas as seguintes questões:
*Qual a volumetria ocupada pela madeira da EMP01..., nomeadamente, altura, largura, cumprimento da madeira empilhada?
* Qual a largura, altura, cumprimento da madeira, das paletes/atados que estiveram guardados            nas instalações da EMP02... e que pertenciam à EMP01...?
*Qual a área em metros quadrados e/ou em metros cúbicos ocupados pela madeira apurada na sentença no parque exterior e no parque interno(armazém)?
* Quantos funcionários e máquinas da EMP02... foram envolvidos nos trabalhos de carga, descarga, empilhamento e vigilância?
* Quantas horas e quais as despesas suportadas pela EMP02... nas operações e carga,            descarga, distribuição            e empilhamento das madeiras da EMP01...?

Sobre a requerida ampliação recaiu o seguinte despacho:
“As questões que a requerida pretende transformar em quesitos são irrespondíveis pelos peritos, situando-se, claramente, fora do objecto  da perícia do incidente de liquidação, devendo recordar-se aqui o disposto no artigo 388º, nº 1, do Código Civil: “a prova pericial tem por fim a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos as pessoas, não devam ser objecto de inspecção judicial”. Indefere-se, pois, o requerido alargamento do objecto da perícia, pretendido pela requerida, uma vez que tal demonstração não necessita de conhecimentos especiais.”
É contra este despacho a recorrente aqui se insurge considerando que o mesmo viola o princípio da igualdade, uma vez que a ampliação requerida pela contraparte foi parcialmente atendida e enferma de erro de julgamento e violação da lei.
Ressalvado o devido respeito, não lhe assiste razão.
A finalidade da liquidação da sentença, por determinação da sentença liquidanda, é apurar o valor devido pelo depósito segundo os “usos da praça” nos termos do artigo 404º do Código Comercial.
A natureza das questões enunciadas com vista à ampliação do objeto da perícia situa-se claramente fora do objeto do litigio do incidente de liquidação.
Ademais, como resulta do artigo 388.º, nº 1, do Código Civil, a perícia constitui um meio de prova que recai sobre factos para cuja análise, interpretação e valoração são necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem.
Ora, para a demonstração pretendida não são necessários conhecimentos especiais.
Alega, ainda, a Recorrente, que houve uma violação do principio da igualdade ao ser admitida a ampliação proposta pela recorrida e já não a formulada pela recorrente.
A violação do principio da igualdade das partes, tem ínsito um tratamento privilegiado de uma parte, assistindo-se a um tratamento desigual sem uma justificação material da desigualdade.
A questão circunscreve-se em saber se o tribunal garantiu um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no uso de meios de defesa.
O princípio da igualdade das partes é fonte do subprincípio do contraditório e encontra consagração no artigo 4.º do Código de Processo Civil, que dispõe que o tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais.
É daqui que deriva o denominado princípio da igualdade de armas que impõe o equilíbrio entre as partes ao logo de todo o processo, na perspetiva de permitir às partes idênticas oportunidades para expor as suas razões e convencer o tribunal a proferir uma decisão que lhes seja favorável.
Sucede, no entanto, como afirma Lebre de Freitas “O princípio da igualdade de armas, tal como o do contraditório, constitui manifestação do princípio mais geral da igualdade das partes, que implica a paridade simétrica das suas posições perante o tribunal. No que particularmente lhe respeita, impõe o equilíbrio entre as partes ao longo de todo o processo, na perspetiva dos meios processuais de que dispõem para apresentar e fazer vingar as respetivas teses: não implicando uma identidade formal absoluta de todos os meios, que a diversidade das posições das partes possibilita, exige, porém, a identidade de faculdades e meios de defesa processuais das partes e a sua sujeição a ónus e cominações idênticos, sempre que a sua posição perante o processo é equiparável, e um jogo de compensações gerador do equilíbrio global do processo, quando a desigualdade intrínseca de certas posições processuais leva a atribuir a uma parte meios processuais não atribuíveis à outra.”[1]
Ora no caso, nenhuma faculdade foi concedida à contraparte (recorrida) que não tenha sido observada à recorrente. Não foi, em momento algum, infringido o principio da igualdade, já que não foi posta em causa a paridade simétrica da posição das partes perante o tribunal.
À recorrente foi-lhe facultada a oportunidade de apresentar o seu requerimento de ampliação do objeto da perícia. O que sucedeu foi tão só que, em termos substantivos, o mesmo não foi deferido.
Por conseguinte, o indeferimento do alargamento da perícia nos termos pretendidos pela recorrente, não viola o principio da igualdade.
Por outro lado, não se alcance nem a recorrente esclarece em que se assenta o imputado erro de julgamento ou violação da lei, pois que nenhuma norma legal se mostra violada.
Termos em que, nesta parte, improcede o recurso.
*
B) Quanto aos despachos ref. ...97, de 16.05.2022 e refª ...91, de 26.07.2022.

O Sr. Perito apresentou o relatório pericial.
Por diversas vezes ao senhor perito foram colocadas questões e esclarecimentos.
O Sr. Perito foi respondendo.
No seguimento de requerimento apresentado pela recorrente, recaiu o primeiro despacho em 16.05.2022, com o seguinte teor: “Facultando-lhe cópia do requerimento supra-epigrafado, notifique o Sr. perito para, no prazo de 20 dias:
a) Encetar as diligências necessárias para identificar, num raio de cerca de 20 quilómetros, tendo como ponto de referência o porto comercial de ..., as empresas privadas – caso existam – com vocação e capacidade para procederem a um depósito/armazenamento do tipo que é discutido nos presentes autos, e os preços por elas praticados no período em análise;
b) Identifique o representante da ... junto do qual recolheu as informações com base na qual respondeu a parte da perícia;
c) Preste os esclarecimentos formulados nos artigos 7º a 16º do requerimento supra-epigrafado.”
O Sr. Perito não apresentou, em tempo útil, resposta ao ordenado.
Nessa sequência foi proferido o seguinte despacho em 26.07.2022:
“Com o objetivo de não protelar o prosseguimento dos autos, e uma vez que os esclarecimentos pretendidos pelo Tribunal não carecem de conhecimentos especiais, o Sr. Perito comparecerá em sede de audiência de julgamento a fim de prestar os esclarecimentos tidos por necessários – cfr. artigo 486º, do Código de Processo Civil.”
Insurge-se o recorrente contra esta decisão, por considerar ter ocorrido omissão de pronuncia e violação do disposto no artigo 348º, nº2, do Código Civil.
Quanto à omissão de pronuncia, estabelece o artigo 615.º, nº1, al. d) do CPC , que é nula a sentença quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”.
Ressalvado o devido respeito, sobre o requerido pela parte o tribunal pronunciou-se, fê-lo foi num sentido que com a parte não concorda.
Porém, como é entendimento doutrinário e jurisprudencial pacifico, a omissão de pronúncia só ocorre quando o tribunal deixe de se pronunciar de todo sobre a questão, em termos de inviabilizar qualquer apreciação de mérito ou demérito, e não já quando se trata de apreciação insuficiente.
Nestes termos, forçoso é concluir que não ocorre omissão de pronuncia.
E também não ocorre erro de julgamento ou violação do disposto no artigo 348º, nº2, do Código Civil, pois que em causa não está a tomada de posição sobre o mérito das questões relativas à perícia, antes a decisão sobre o modo como os esclarecimentos iriam ser prestados.
Por força do disposto no artigo 6.º, nº1, do CPC, ao juiz cumpre dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação e adotando mecanismos de agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável. Em suma, o dever de gestão do processo determina que o juiz tem o dever de condução ativa do processo de forma a obter com eficiência a composição justa e célere do litígio.
O dever de gestão processual é um instrumento para se alcançar uma resolução do litígio em prazo razoável, em obediência aos princípios ínsitos no artigo 20.º, nº4 da Constituição e artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
Termos, em que, também, nesta parte improcede o recurso.
*
C) Quanto à sentença proferida, saber se a mesma é nula, se deve alterada a matéria de facto e consequentemente os termos da liquidação.

Os factos

Factos Provados

Foram dados como assentes na primeira instância os seguintes factos:
a) Dão-se aqui por reproduzidos os factos dados por provados na acção declarativa;
b) Na acção declarativa que precede o presente incidente constam, como factos provados, designadamente, os seguintes:
“k) Desde ../../2007 até ../../2015, a Autora utilizou as instalações da Ré para depositar madeira, sendo que a maior parte da madeira era depositada num espaço ao ar livre (parque exterior) e a restante, a madeira que necessitava de estar abrigada do ar livre, em espaço coberto e fechado (armazém);
l) Durante este período de tempo, a quantidade média de madeira armazenada ascendeu a 1000 m3 em parque fechado ao ar livre e a uma área de 28 m3 em armazém fechado com cobertura;
m) O parque fechado descoberto tem de área cerca de 4.000 m2, as madeiras da Autora estavam empilhadas e não ultrapassavam uma altura de 4 metros;
(…)
p) Durante este período de tempo a Ré, em cargas e descargas da madeira depositada, despendeu 160 horas de trabalho;
(…)
r) A madeira guardada pela Ré pertencente à Autora, para além de ser vendida a terceiros, também era utilizada pela Ré, depois de lhe ser vendida pela Autora, no exercício da sua actividade;”
c) Na acção declarativa que precede o presente incidente foi proferida decisão, já transitada em julgado, nos seguintes termos: “Em face do exposto, julgo a acção proposta por EMP01..., Unipessoal, Lda. contra EMP02... – Sociedade Comercial de Madeiras de ..., Lda., procedente, por provada, e, consequentemente, condeno a Ré a pagar à Autora a quantia de € 279.159,52, acrescida de juros de mora a contar desde 21.08.2015 sobre esta quantia, à taxa legal aplicável às operações comerciais, até integral e efectivo pagamento. (…) Mais julgo a reconvenção deduzida pela Ré contra a Autora, parcialmente procedente, por parcialmente provada e, consequentemente, condeno a Autora a pagar à Ré a quantia de € 62.582,77, acrescido de juros de mora à taxa legal aplicável às operações comerciais contados desde ../../2015 sobre esse capital até integral e efectivo pagamento, e ainda, metade da quantia cuja fixação se remete para decisão ulterior, nos termos do disposto no artigo 609º, nº 2, do Código de Processo Civil, e que corresponder aos “usos da praça” nos termos do artigo 404º do Código Comercial, aplicáveis ao depósito cujas características constam das alíneas k) a m), p) e r) do ponto II.1., acrescida de juros de mora à taxa legal aplicável às operações comerciais contados desde ../../2015 sobre esse capital até integral e efectivo pagamento. (…) Operando-se a compensação, nos termos do artigo 847º do Código de Processo Civil, julgo parcialmente extinto o crédito da Autora sobre a Ré no valor de € 62.582,77 (€ 279.159,52 - € 62.582,77) e no valor que resultar da liquidação supra determinada, condenando a Ré a pagar à Autora o remanescente (acrescido de juros de mora a contar desde 21.08.2015 sobre esta quantia, à taxa legal aplicável às operações comerciais, até integral e efectivo pagamento) ou, no caso do montante a liquidar, juntamente com a parte já líquida, exceder o crédito da Autora, condenando esta a pagar à Ré o excedente (acrescido juros de mora à taxa legal aplicável às operações comerciais contados desde ../../2015 sobre esse capital até integral e efectivo pagamento)”;
d) A madeira armazenada em parque fechado ao ar livre (parque exterior) ocupava uma área de 1.058 m2;
e) A madeira armazenada em armazém fechado com cobertura ocupava uma área de 27 m2;
f) De Julho de 2007 a ../../2015, metade do valor de mercado do depósito da madeira referida em d), oscila, consoante o fluxo quantitativo, o tempo de permanência e mediante aplicação do tarifário 1 e do tarifário 2 da ... (porto de mar de ...), entre o valor mínimo de € 2.802,86 e € 64,443,36, conforme explicitado no relatório pericial e respectivos anexos constantes de fls. 1137 a 1151 e cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos;
g) De Julho de 2007 a ../../2015, metade do valor de mercado do depósito da madeira referida em e), oscila, consoante o fluxo quantitativo, o tempo de permanência e mediante aplicação do tarifário 1 e do tarifário 2 da ... (porto de mar de ...), entre o valor mínimo de € 429,91 e € 9.832,12, conforme explicitado no relatório pericial e respectivos anexos constantes de fls. 1137 a 1151 e cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos;
h) A requerente importou madeira através do porto comercial de ... até 2007, tendo a partir desse ano a fazê-lo através do porto comercial de ....
*
Factos Não Provados

Do requerimento inicial da requerente EMP01...: artigos 23º, 33º e 34º, 36º e 38º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas f) e g), 38º a 46º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas d) a g).
Da oposição da requerida EMP02...: 38º, 40º, 42º, 45º, 46º, 63º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea d), 65º a 77º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas f) e g), 89º, segunda parte, 90º e 91º, 94º a 113º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas d) a g).
Do articulado da requerente EMP01... em resposta à reconvenção: inexistem enunciados fácticos a que cumpra responder.
Do articulado da requerente EMP02... apresentado em sede de audiência prévia: inexistem enunciados fácticos a que cumpra responder.
*
C.1. Da nulidade da sentença

Considera o recorrente que o tribunal tinha o âmbito de decisão circunscrito pela sentença liquidanda e pelo objeto do litígio logo, estava-lhe vedado decidir quanto à matéria de compensação como decidiu.
Imputa, assim, à sentença o vicio de excesso de pronuncia.
As causas de nulidade da sentença vêm taxativamente enunciadas no artigo 615º nº 1 do Código de Processo Civil, onde se estabelece, além do mais, que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento ((al.d)).
O Prof. Castro Mendes[2], após a análise dos vícios da sentença, conclui que uma sentença é nula quando “não contém tudo o que devia, ou contém mais do que devia”.
No caso, diz-se que contém mais do que devia.
Sem razão, porém.
O dispositivo da sentença liquidanda é do seguinte teor:
«Em face do exposto, julgo a acção proposta por EMP01..., Unipessoal, Lda. contra EMP02... – Sociedade Comercial de Madeiras de ..., Lda., procedente, por provada, e, consequentemente, condeno a Ré a pagar à Autora a quantia de € 279.159,52, acrescida de juros de mora a contar desde 21.08.2015 sobre esta quantia, à taxa legal aplicável às operações comerciais, até integral e efectivo pagamento. (…) Mais julgo a reconvenção deduzida pela Ré contra a Autora, parcialmente procedente, por parcialmente provada e, consequentemente, condeno a Autora a pagar à Ré a quantia de € 62.582,77, acrescido de juros de mora à taxa legal aplicável às operações comerciais contados desde ../../2015 sobre esse capital até integral e efectivo pagamento, e ainda, metade da quantia cuja fixação se remete para decisão ulterior, nos termos do disposto no artigo 609º, nº 2, do Código de Processo Civil, e que corresponder aos “usos da praça” nos termos do artigo 404º do Código Comercial, aplicáveis ao depósito cujas características constam das alíneas k) a m), p) e r) do ponto II.1., acrescida de juros de mora à taxa legal aplicável às operações comerciais contados desde ../../2015 sobre esse capital até integral e efectivo pagamento. (…) Operando-se a compensação, nos termos do artigo 847º do Código de Processo Civil, julgo parcialmente extinto o crédito da Autora sobre a Ré no valor de € 62.582,77 (€ 279.159,52 - € 62.582,77) e no valor que resultar da liquidação supra determinada, condenando a Ré a pagar à Autora o remanescente (acrescido de juros de mora a contar desde 21.08.2015 sobre esta quantia, à taxa legal aplicável às operações comerciais, até integral e efectivo pagamento) ou, no caso do montante a liquidar, juntamente com a parte já líquida, exceder o crédito da Autora, condenando esta a pagar à Ré o excedente (acrescido juros de mora à taxa legal aplicável às operações comerciais contados desde ../../2015 sobre esse capital até integral e efectivo pagamento)». O dispositivo da sentença de liquidação, por sua vez, tem o seguinte teor:
«Em face do exposto:
• Julgo o incidente de liquidação proposto por EMP01..., Unipessoal, Lda. contra EMP02... – Sociedade Comercial de Madeiras de ..., Lda., parcialmente procedente, por parcialmente provado;
• Julgo o incidente proposto por EMP02... – Sociedade Comercial de Madeiras de ..., Lda. contra EMP01..., Unipessoal, Lda., parcialmente procedente, por parcialmente provado;
• Liquido em € 28.837,30 a metade da quantia que corresponde aos usos da praça, nos termos do artigo 404º do Código Comercial, aplicáveis ao depósito cujas características constam das alíneas k) a m), p) e r) do Ponto II - 1, da sentença proferida nos autos da acção declarativa;
• Consequentemente, e na compensação dos créditos recíprocos, condeno a requerida a pagar à requerente a quantia global de € 187.739,45, acrescida de juros de mora a contar desde 21.08.2015 sobre esta quantia, à taxa legal aplicável às operações comerciais, até integral e efectivo pagamento.»
A sentença proferida no âmbito do incidente de liquidação mais não fez que operar a compensação de créditos resultantes da liquidação em obediência e nos limites constantes da decisão liquidanda.
Donde, não houve excesso de pronuncia.
Sustenta, ainda o recorrente que a sentença é nula por os fundamentos estarem em oposição com a decisão.
Concretiza que a sentença liquidanda mandou apurar o valor (100%) e depois o mesmo é reduzido a 50%, o que não sucede na liquidação na medida em que o tribunal aplicou metade nos factos provados f) e g) e em cima dessa metade ainda aplicou mais uma redução de metade. (ou seja, reduziu o valor a 1/4).
Não está correta esta asserção.
Consignou-se expressamente na sentença de liquidação que o Tribunal não logrou determinar de forma quantitativamente certa o valor do contrato de depósito celebrado entre as partes, tendo apenas logrado estabelecer um arco quantitativo quanto ao depósito da madeira em espaço descoberto e um arco quantitativo quanto ao depósito da madeira em espaço coberto – cfr. alíneas f) e g), do ponto II.1. –, em face da incerteza quanto aos factores (i) fluxo quantitativo, (ii) tempo de permanência e, igualmente, quanto (iii) à relativa incerteza no que concerne à aplicação do tarifário 1 ou do tarifário 2.
Este segmento da sentença baseou-se precisamente no teor dos factos f) e g),
Por tal razão, o Tribunal recorreu à equidade, fazendo-o dentro dos limites dados por provados, com base na média aritmética dos valores encontrados nos referidos arcos quantitativos, considerando, ainda, as prestações em causa na lógica económica do contrato celebrado.
Assim, quanto ao valor do depósito da madeira em espaço aberto, em parque exterior, considerou-se equitativamente justo um valor de € 25.555,72 e quanto ao valor do depósito da madeira em espaço fechado, em armazém coberto, considerou-se equitativamente justo um valor de € 3.281,58.
O total deste valor foi o considerado na decisão final que aí liquidou em € 28.837,30 a metade da quantia que corresponde aos usos da praça, nos termos do artigo 404º do Código Comercial, aplicáveis ao depósito em causa.
Para se afirmar a contradição tem de ocorrer um erro de raciocínio lógico consistente em a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la. Este vicio ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto, o mesmo é dizer, quando a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direção diferente.
Não é o que ocorre no caso, não se verificando qualquer vício real de raciocínio do julgador.
Nestes termos, se conclui que a sentença não é nula por não padecer dos vícios de que lhe são imputados.
*
C.2. Da impugnação da matéria de facto

Existem requisitos específicos para a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, os quais, se não observados conduzem à sua rejeição.
Assim, o artigo 640º, CPC impõe ao recorrente o ónus de:
a) especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) especificar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
c) especificar a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Impõe-se que nas conclusões o recorrente indique concretamente os pontos da matéria de facto que impugna e o que entende que deve ser assente, apresentando a sua pretensão de forma inequívoca, de forma a que se possa, com clareza, separar a mera exposição da sua apreciação sobre a prova da reivindicação da alteração da matéria de facto, e saber claramente em que sentido pretende que a matéria de facto provada seja alterada.
No caso, considera a recorrente que houve erro na decisão da matéria de facto quanto aos factos provados f), g), h) e que deveriam ser aditados outros factos.
Quanto aos factos provados f) e g), defende a sua alteração para a seguinte redação:
f) O relatório pericial de fls. não apurou o valor de mercado e não foi conclusivo quanto ao aspeto quantitativo do depósito d) e e)
 g) De acordo com o relatório pericial de fls., o cenário quantitativo mais próximo da do depósito d) e e) é o constante do cenário 5 A1 e 5 B1, das respostas às questões 5A e 5B e que se traduzem nos seguintes valores
*2,892 dias (2007 a 2015) numa área de 1.058m2= 128.886,72€ (cenário A1)
*2,892 dias (2007 a 2015) numa área de 27m2 = 19.737,19€ (cenário B1).
Baseia a pretendida alteração na falta de qualificação do perito, nas respostas não conclusivas do relatório pericial, no ofício da ... de 08.04.2019 e no “estudo da “Triconsulte” que a Recorrente juntou aos autos.
O tribunal a quo fundamentou a factualidade em causa nos termos seguintes: «A convicção do Tribunal relativamente à factualidade dada por provada nas alíneas d) a g) assentou no teor do relatório pericial junto aos autos de fls. 1137 a 1151, nos esclarecimentos escritos de fls. 1135 a 1136, bem como nos esclarecimentos prestados em sede de audiência de julgamento pelo Sr. perito, sendo que quanto ao dado por provado nas alíneas f) e g), o arco de valor quantitativo reflecte a incerteza quanto aos factores (i) fluxo quantitativo, (ii) tempo de permanência e, igualmente, quanto (iii) à relativa incerteza no que concerne à aplicação do tarifário 1 ou do tarifário 2, ainda que o relatório pericial afirme a maior probabilidade de aplicação do tarifário 2 (cfr. p. 6 do relatório pericial e fl. 1139v dos autos).»
Sufragamos inteiramente a valoração da prova pericial feito pelo tribunal a quo, e os termos do enunciado fáctico que da mesma se logrou extrair, fixando um arco de valor quantitativo face à incerteza de determinados fatores.
Atenta a natureza das questões em análise, o meio de prova fundamental é, indubitavelmente, a prova pericial.          
A prova pericial caracteriza-se pela singularidade do seu objeto: a perceção e indagação de factos que, atenta a sua especificidade técnica, o julgador não domina. É certo que o juiz não está vinculado às conclusões alcançadas pelo perito, nem está impedido de afastar os esclarecimentos por aquele prestados, dado que a perícia não está subtraída ao princípio da livre apreciação da prova (artigo 389º do Código Civil). Ainda assim, somos do entendimento que, se julgou a prova pericial como necessária para suprir as insuficiências do seu conhecimento técnico, não pode o julgador substituir-se ao perito, e, assim, extrair por si conclusões diversas daquelas assentes em (presume-se) conhecimento científico comprovado.
Tendo por base as conclusões insertas no relatório pericial, algumas das incertezas ali refletidas foram ultrapassadas pelos esclarecimentos prestados pelo perito quer por escrito quer na audiência de julgamento, tendo possibilitado afirmar com segurança (judiciariamente possível) o valor de mercado do depósito de madeira, em espaço aberto e em espaço fechado, no período compreendido entre ../../2007 a ../../2015,
A critica feita ao relatório pericial por se ter baseado somente nos tarifários do Porto ..., não cremos que deva colher.
Como se explica na decisão recorrida, esses foram os tarifários que foram apresentados de forma credível e exaustiva, não tendo o Tribunal ficado convencido da realidade numérica de qualquer cotação de um qualquer operador privado, porque tais cotações, para o período em questão, não foram apresentadas através de meios de prova credíveis e exaustivos. Apenas os depoimentos das testemunhas EE e DD a eles se referiram (tarifários de operadores privados), mas não abordaram o tema de forma exaustiva e credível para o período em questão e, fundamentalmente, para a área geográfica em causa, ou seja, a área do porto comercial de ....
Acresce que, como com clareza e assertividade demonstrou a testemunha KK, funcionário (reformado) da ..., o porto comercial de ..., no período de tempo em questão, tentava atrair operadores para a sua praça através de tarifas altamente concorrenciais, numa atividade que, na zona geográfica em causa, era nova, pelo que, na praça eram poucos ou inexistentes os operadores privados que pudessem concorrer com o tarifário do porto comercial. A razão de ciência da testemunha, trabalhador da ..., revela uma fonte de conhecimento dos factos privilegiada, sendo como tal um elemento a tomar em consideração quer na apreciação do valor do seu depoimento quer na demonstração da realidade por si descrita.
Donde, os factos f) e g) devem manter-se inalterado.
Quanto ao facto h) o mesmo tem a seguinte redação: «A requerente importou madeira através do porto comercial de ... até 2007, tendo a partir desse ano a fazê-lo através do porto comercial de ...».
Defende a recorrente a sua alteração para o seguinte: «A Recorrida no período de 2007 a 2015 não usou o Porto ..., e no período de 2011 em diante não fez qualquer importação de madeiras».
Sem necessidade de outras considerações, não pode proceder a pretensão da impugnante na medida em que está em contradição com factualidade já assente, na sentença da ação declarativa, como seja os factos:
 “k) Desde ../../2007 até ../../2015, a Autora utilizou as instalações da Ré para depositar madeira, sendo que a maior parte da madeira era depositada num espaço ao ar livre (parque exterior) e a restante, a madeira que necessitava de estar abrigada do ar livre, em espaço coberto e fechado (armazém);
l) Durante este período de tempo, a quantidade média de madeira armazenada ascendeu a 1000 m3 em parque fechado ao ar livre e a uma área de 28 m3 em armazém fechado com cobertura;
m) O parque fechado descoberto tem de área cerca de 4.000 m2, as madeiras da Autora estavam empilhadas e não ultrapassavam uma altura de 4 metros;
(…)
p) Durante este período de tempo a Ré, em cargas e descargas da madeira depositada, despendeu 160 horas de trabalho.
Ora, a existência do contrato de depósito e suas características é indiscutível, teve lugar na ação declarativa, não podendo, nesta sede, voltar a discuti-lo, não só porque tal violaria o caso julgado constituído pela decisão anterior, como contrariaria o próprio escopo do incidente de liquidação. Este incidente tem por finalidade, única, liquidar.
Termos em que o facto h) deve manter-se inalterado.
Pretende, ainda, a recorrente o aditamento dos seguintes factos:
i) O valor total do depósito das madeiras em parque fechado descoberto, no período em causa (de 2007 a 2015), de acordo com os preços praticados pela ..., ascende ao valor total de 728.748,00 € + iva e o armazenamento em armazém fechado, de acordo com os preços praticados pela ... (que inclui o Porto ...) ascende a 36*ZM= 36x0.0745 €/10 m2/dia, assim, este valor corresponde a 2.682 €/m2/dia (provado pelos docs. ... a ..., e pág. 1, tarifário ... 2005, pág. 2, art. 19º - 2 do Tarifário ... 2013; pág. 18, art. 20º - 2 do Tarifário ... 2014, pág. 16, art. 19º - 2 do Tarifário ... 2015);
j) A actividade dos portos de mar tem regras próprias e funciona com preços, pressupostos e condições diferentes        do mercado das empresas privadas.
k) Há um mercado competitivo de empesas privadas, que se dedicam à atividade de armazenamento/depósito comercial o qual é completamente distinto do negócio e atividades dos portos de mar (no caso ... e ...).
Em face do que se deixou explanado aquando da apreciação da impugnação à decisão dos factos f) e g), onde se apuraram os valores e se fundamentou o recurso aos tarifários do Porto ..., o aditamento ora pretendido não pode proceder.
Por todo o exposto, a impugnação da decisão da matéria de facto terá de improceder.
*
C.3. Os critérios da liquidação

O instituto da liquidação de sentença visa quantificar uma condenação anterior, estribada, por um lado, nos pedidos e causa de pedir enunciados pelo autor ou pelo réu, e, por outro, pela factualidade dada como provada e não provada e pela aplicação à mesma do direito, sendo dentro dessas precisas e estritas fronteiras que a determinação quantitativa perseguida pelo incidente de liquidação se pode movimentar e emergir, não podendo tal figura ter uma abrangência tal que, apesar da sua índole declarativa, se permita discutir, de novo e com idêntica amplitude, matéria essencial e constitutiva de direitos, que deveria ter sido debatida e demonstrada na ação declarativa propriamente dita e não foi[3].
O recurso ao incidente de liquidação depende da verificação na sentença de elementos fácticos relativos ao dano, e da incerteza da sua dimensão quantitativa, cuja concretização não pode exceder o pedido formulado nos articulados da ação.
Ressalvadas as situações em que a liquidação dependa de simples cálculo aritmético, atualmente o incidente de liquidação é o único meio para tornar líquida a obrigação em cujo cumprimento o devedor tenha sido condenado, constituindo assim um incidente da instância posterior ou subsequente à decisão judicial de condenação, enxertado no processo declaratório que nela culminou, e com a virtualidade de inclusivamente determinar a renovação da instância declarativa, já extinta[4].
É assim que no artigo 358º, nº 2, do CPC se estatui que “o incidente de liquidação pode ser deduzido depois de proferida sentença de condenação genérica, nos termos do nº 2 do artigo 609º, e, caso seja admitido, a instância extinta considera-se renovada”.
Na situação em apreço, no cumprimento do decidido na ação declarativa, visa-se liquidar a quantia que corresponder aos usos da praça aplicáveis ao contrato de depósito mercantil, cujas características ficaram definidas na sentença.
            As partes indicaram valores substancialmente divergentes para liquidação.
Tratando-se de liquidação que não depende de simples cálculo aritmético, vigora para as partes o ónus de proceder à liquidação no âmbito do verdadeiro processo de declaração ulterior que o incidente de liquidação constitui, com a alegação e prova dos factos que fundamentam a pretendida liquidação.
Não demonstrando os fundamentos fácticos daquela quantia certa, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados, como lhe impõe o  artigo 566º, nº 3, do Código Civil.
Ora, no presente caso, o tribunal não logrou determinar de forma quantitativamente certa o valor do contrato de depósito celebrado entre as partes e com as características constam das alíneas k) a m), p) e r) do ponto II.1., da sentença proferida nos autos da ação declarativa. Apenas logrou estabelecer um arco quantitativo quanto ao depósito da madeira em espaço descoberto e um arco quantitativo quanto ao depósito da madeira em espaço coberto, em face da incerteza quanto aos factores (i) fluxo quantitativo, (ii) tempo de permanência e, igualmente, quanto (iii) à relativa incerteza no que concerne à aplicação do tarifário 1 ou do tarifário 2, ainda que o relatório pericial afirme a maior probabilidade de aplicação do tarifário 2.
Recorreu e bem à equidade.
Fê-lo dentro dos limites dados por provados, tendo os valores em causa sido obtidos com base na média aritmética dos valores encontrados nos arcos quantitativos apurados, levando ainda em consideração as prestações em causa na lógica económica do contrato celebrado.
Justifica-se ainda considerar apenas os tarifários do porto comercial de ... e não os de outros operadores privados porque, como se refere na decisão, para além de serem os (i) os tarifários que o Tribunal deu como provado existirem durante o período temporal em questão e (ii) saber que a requerente tinha a efectiva possibilidade de a tais serviços recorrer, (iii) o facto de o porto comercial de ... aplicar esses tarifários inseria um factor relevante na fixação de preços no mercado, mediante o mecanismo da oferta e da procura, não sendo adequado, em face da matéria de facto dada por provada, considerar hipotéticos valores mais elevados.
Nestes termos, os valores alcançados para o depósito apresentam-se equitativamente adequados e justos.
Deverá, por conseguinte, manter-se a decisão.
*
SUMÁRIO (artigo 663º n º7 do Código do Processo Civil)

I - A perícia constitui um meio de prova que recai sobre factos para cuja análise, interpretação e valoração são necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem (artigo 388.º, nº 1, do Código Civil).
II – Deferir a ampliação do objeto da perícia requerido por uma parte e indeferir o requerido pela outra, justificadamente, não constitui violação do principio da igualdade das partes, na medida em que o principio tem ínsito um tratamento privilegiado de uma parte, assistindo-se a um tratamento desigual sem uma justificação material da desigualdade.
III - O incidente de liquidação de sentença visa quantificar uma condenação genérica anterior.
IV - Tratando-se de liquidação que não depende de simples cálculo aritmético, vigora para o requerente o ónus de proceder à liquidação no âmbito do verdadeiro processo de declaração ulterior que o incidente de liquidação constitui, com a alegação e prova dos factos que fundamentam a pretendida liquidação.
V - Não se demonstrando os fundamentos fácticos da quantia certa, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados, como lhe impõe o artigo 566.º, nº 3, do Código Civil.
*
IV - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, mantendo a decisão recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
Guimarães, 18 de Abril de 2024.

Assinado digitalmente por:                                                   
Rel. – Des. Conceição Sampaio
1º Adj. - Des. Sandra Melo
2º Adj. - Des. Anizabel Sousa Pereira



[1] In Introdução ao Processo Civil, Conceito e Princípios Gerais à Luz do Código Revisto, Ed. 1996, p. 105.
[2] In “Direito Processual Civil”, Vol. III, p. 308.
[3] Neste sentido, o Ac. da Relação de Lisboa de 24.06.2012, proferido no processo n.º 2562/04.4TVLSB.L1-6, disponível em www.dgsi.pt.
[4] Cfr. Ac. da Relação de Évora de 08/02/2018, proferido no processo nº 933/03.2TBSTB-F.E1, disponível em www.dgsi.pt.