EXECUÇÃO DA PENA DE EXPULSÃO
IRRECORRIBILIDADE
Sumário

I - O recurso da decisão do TEP, que determinou a execução da pena acessória de expulsão do território nacional, não se encontra expressamente previsto na lei, pelo que, por aplicação do art. 235.º, n.º 1, do CEPMPL, essa decisão é irrecorrível.
II - Compete ao TEP acompanhar e fiscalizar a execução das penas principais e acessórias, nos termos do n.º 2, do art. 138.º, do CEPMPL, mas já não alterar as decisões transitadas em julgado do Tribunal da condenação.

Texto Integral

L …………, arguido/condenado nos autos, veio reclamar, nos termos do disposto no art. 405.º, do CPP, do despacho judicial proferido em 8/3/2024, que não lhe admitiu o recurso interposto da decisão que determina a execução da pena acessória de expulsão do território nacional no dia 17/3/2024, pedindo que o mesmo seja admitido porquanto “o regime previsto no art. 188.º A do CEP mimica, salvo pontuais exceções, o regime para a execução da expulsão. Isto porque, em ambos os casos, está em causa a ressocialização do condenado e a avaliação do condenado em situação de liberdade, ou quase liberdade, e a sua situação em concreto, não em abstrato.”.
Alega, ainda, o reclamante que “a negação de recurso resultante da conjugação dos artigos 235.º, n.º 1 e 188.º, n.º 6, já mencionados, padece de inconstitucionalidade material.”.
Conhecendo.
Como dispõe o art. 235.º, n.º 1, do CEPMPL, estabelecendo um princípio inverso ao consagrado no art. 399.º, do CPP, para além das decisões recorríveis identificadas no seu n.º 2,
“Das decisões do tribunal de execução das penas cabe recurso para a Relação nos casos expressamente previstos na lei”.
O recurso da decisão do TEP, que determinou a execução da pena acessória de expulsão do território nacional no dia 17/3/2024, ao ora reclamante, não se encontra expressamente previsto na lei, pelo que, por aplicação do art. 235.º, n.º 1, do mesmo diploma, essa decisão é irrecorrível.
Conforme se refere no despacho reclamado compete ao TEP acompanhar e fiscalizar a execução das penas principais e acessórias, nos termos do n.º 2, do art. 138.º, do CEPMPL, mas já não alterar as decisões transitadas em julgado do Tribunal da condenação, como foi o caso.
 A decisão recorrida limitou-se a dar execução à decisão do Tribunal da condenação, em consonância com o determinado na al. e), do n.º 4, deste último preceito legal.
Alega o reclamante que “a negação de recurso resultante da conjugação dos artigos 235.º, n.º 1 e 188.º, n.º 6, já mencionados, padece de inconstitucionalidade material.”
Ora, o art. 188.º, do CEPMPL, diz respeito à adaptação à liberdade condicional, situação manifestamente distinta daquela que está em análise nos presentes autos.
Alega, ainda, o reclamante que a decisão reclamada viola os arts. 20.º e 32.º, da CRP.
Conforme se refere no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 752/2014, o conteúdo significante dos princípios constitucionais enumerados no artigo 32.º, da CRP, reporta-se ao processo penal e não ao processo penitenciário.
E no que respeita à garantia do duplo grau de jurisdição, previsto no n.º 1, desse preceito, para o processo criminal, nem sequer é inteiramente líquido que ele se aplique a todas as fases do processo penal ou a todos os processos sancionatórios.
Como aí se diz, desde há muito que o Tribunal Constitucional identifica reiteradamente o conteúdo do direito ao recurso com o duplo grau de jurisdição apenas “quanto a decisões penais condenatórias e ainda quanto às decisões penais respeitantes à situação do arguido face à privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros direitos fundamentais” (cfr. Acórdãos nºs 31/87, 178/88, 340/90, 401/91, 132/92, 322/93, 265/94, 610/96, 189/2001, 464/2003). Por conseguinte, se não for atingido o núcleo essencial do direito de defesa, não são constitucionalmente ilegítimas restrições ao direito ao recurso de decisões não condenatórias (v.g. decisões interlocutórias) ou que não afetem a liberdade ou outros direitos fundamentais.”
Referindo-se, ainda, nesse acórdão que “A jurisprudência firme do Tribunal Constitucional é no sentido de que não está consagrada uma garantia constitucional do duplo grau de jurisdição como princípio geral, válido para todos os processos. Considera-se que a Constituição garante o acesso aos tribunais para defesa de direitos, mas que tal garantia não abrange a obrigatoriedade da existência, para todas as decisões, de um duplo grau de jurisdição: «o duplo grau de jurisdição em matéria não penal não se acha constitucionalmente garantido, reconhecendo-se ampla liberdade ao legislador para estabelecer requisitos de admissibilidade dos recursos. Com efeito, da Constituição apenas se deduz uma garantia contra violações radicais pelo legislador ordinário do sistema de recursos instituído e da igualdade dos cidadãos na sua utilização. Nessa medida, caberá à lei infraconstitucional definir o acesso aos sucessivos graus de jurisdição, segundo critérios objetivos, ancorados numa ideia de proporcionalidade (relevância das causas, natureza das questões) e que respeitem o princípio da igualdade, tratando de forma igual o que é idêntico e de forma desigual o que é distinto»» (cfr. Acórdão nº 125/98, mas também Acórdãos nºs 65/88, 202/90, 27/95, 225/2005 e 106/06).
Assim, fora de domínios específicos, como as decisões condenatórias em processo penal e as decisões jurisdicionais que imponham restrições a direitos fundamentais, o legislador dispõe de uma ampla margem de liberdade na conformação do direito ao recurso, podendo limitar ou restringir as decisões que admitem recurso em função de determinados fatores, como a natureza do processo, o tipo e objetivo das ações, a relevância das causas e a importância das questões, tendo em vista a racionalização do sistema judiciário.
O que está garantido no artigo 20º da CRP é que o legislador assegure a «todos» os cidadãos o acesso a um grau de jurisdição e que, sempre que estabeleça vários graus de jurisdição, que garanta igualmente a todos, sem discriminação de natureza económica ou outra, o acesso a esses graus. Nesta dimensão normativa, reafirma-se o princípio geral da igualdade consignado no nº 1 do artigo 13º da CRP, pelo que as limitações ou restrições ao direito ao recurso não podem estabelecer diferenciações arbitrárias, sem fundamento material justificativo.”
Ora, no presente caso, a intervenção judicial do Tribunal de Execução de Penas, representa já o acesso do recluso a um grau de jurisdição, ou seja, à tutela jurisdicional mínima que é coberta pelo n.º 1, do artigo 20.º, da CRP.
Pelo exposto, indefere-se a reclamação, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 405.º, n.º 4, do CPP.
Custas a cargo do reclamante.
Notifique-se.

Lisboa, 15 de Abril de 2024
Guilhermina Freitas – Presidente