ACORDO DE EMPRESA
PROMOÇÃO
PROGRESSÃO NA CARREIRA
AVALIAÇÃO
TRABALHO IGUAL SALÁRIO IGUAL
ÓNUS DA PROVA
Sumário


I - Estando a promoção profissional dependente da prestação de bom e efetivo serviço pelo trabalhador, cabe-lhe o ónus de alegar e provar a inerente factualidade.

II - O princípio do “trabalho igual, salário igual” pressupõe a mesma retribuição para trabalho prestado em condições de igual natureza, qualidade e quantidade, com proibição da diferenciação arbitrária, materialmente infundada.

III - Cabe ao trabalhador o ónus de alegar e provar a alega discriminação.

Texto Integral



Revista n.º 18474/21.4T8LSB.L1.S1


MBM/RP/JG


Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça


I.


1. AA intentou ação declarativa de condenação, com processo comum, contra Sindicato da Banca, Seguros e Tecnologias – Mais Sindicato.


2. Na 1.ª Instância, a ação foi julgada parcialmente procedente, decidindo-se condenar o réu: a) a reconhecer ao autor a carreira remuneratória correspondente a Técnico de Farmácia do Acordo de Empresa celebrado entre o réu e o Sindicato das Ciências e Tecnologias da Saúde para os Técnicos de Diagnóstico e Terapêutica ao Serviço dos SAMS - Serviços de Assistência Médico-Social do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, publicado no BTE nº 8, 1ª Série, de 22 de Fevereiro de 2001, a pág. 402 a 425, aplicando-lhe também a partir de 01.01.2006 o regime de promoções por antiguidade previsto na clausula 12ª do referido AE, sendo tais promoções, determinação dos níveis salariais aplicáveis e o apuramento das diferenças salariais devidas ao autor daí decorrentes relegado para incidente de liquidação; b) a pagar ao autor os juros de mora computados desde o vencimento de cada parcela das diferenças salariais que sejam apuradas como devidas ao autor, até integral pagamento.


3. O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), concedendo provimento ao recurso de apelação interposto pelo R., absolveu-o do pedido.


4. O autor interpôs recurso de revista.


5. O réu contra-alegou.


6. O Exmº Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido do improvimento do recurso, em parecer a que as partes não responderam.


7. Em face das conclusões da alegação de recurso, e inexistindo quaisquer outras de que se deva conhecer oficiosamente (art. 608.º, n.º 2, in fine, do CPC), as questões a decidir1 são as seguintes:


– Aplicabilidade do Acordo de Empresa publicado no BTE n.º 8, 1.ª Série, de 22 de fevereiro de 2001 à relação jurídico-laboral em apreço.


– Da aplicabilidade das Normas Reguladoras da Prestação de Trabalho dos Técnicos de Diagnóstico e Terapêutica.


– Violação do princípio da igualdade.


– Violação do princípio do tratamento mais favorável.


Decidindo.


II.


8. Com relevo para a decisão, foi fixada pelas instâncias a seguinte matéria de facto:


1 - O Réu é uma associação sindical e tem um departamento de prestação de serviços de cuidados de saúde, o Serviço de Assistência Médico-Social, adiante designado por SAMS.


2 - Autor e o Réu celebraram um Contrato Individual de Trabalho, adiante designado por CIT, a termo certo, com início a 14 de Maio de 1998, com a categoria de Ajudante Técnico de Farmácia, CIT esse que remetia para um Regulamento Interno denominado “Normas Reguladoras da Prestação de Trabalho dos Trabalhadores de Limpeza (…), Ajudantes de Farmácia, Ajudantes Técnicos de Farmácia” (…).


3 - O Autor à data era sindicalizado no SIFAP - Sindicato Nacional dos Profissionais de Farmácia e Paramédicos.


4 - De acordo com o que consta do anexo III, alínea i) das referidas “Normas Reguladoras da Prestação de Trabalho dos Trabalhadores de Limpeza (…) Ajudantes de Farmácia, Ajudantes Técnicos de Farmácia” dos SAMS, o descritivo das funções próprias das categorias de Ajudante de Farmácia e Ajudante Técnico de Farmácia é o seguinte: “é o trabalhador que, nos serviços farmacêuticos, prepara, conserva e fornece medicamentos aos beneficiárias sob a responsabilidade do responsável do Serviço Farmacêutico; colabora na realização de outras tarefas de apoio ao fornecimento de medicamentos procedendo, em particular à requisição, conferência e armazenamento de medicamentos, à conferência de datas de validade, reposição de stocks, devolução de medicamentos, conferência de faturas”.


5 - Com data de 28.01.2000, a Direcção do SIFAP remeteu ao Director de Pessoal dos SAMS do SBSI a comunicação com a referência n.º 0067, do seguinte teor:


"Assunto: Requalificação dos ex-Ajudantes Técnicos de Farmácia dos serviços farmacêuticos do S.A.M.S.


Exmo. Senhor:


Como sabe até setembro de 1999, Ajudantes Técnicos de Farmácia que prestam trabalho nos serviços farmacêuticos do S.A.M.S., quando do seu aparecimento, foram integrados na grelha salarial do S.A.M.S em categorias e carreiras especificamente criadas para o efeito, dado não ter sido possível a sua integração em qualquer das categorias e carreiras que já existiam na grelha salarial.


Sucede, porém, que o Decreto-Lei nº 320/99, de 11 de agosto, ao regulamentar as profissões dos Técnicos de diagnóstico e terapêutica e ao incluir entre estes os Técnicos de Farmácia, profissão cujo conteúdo funcional corresponde ao dos antigos Ajudantes de Farmácia, veio, inequivocamente conceder o estatuto de Técnico aos ex-Ajudantes Técnicos de Farmácia.


Deixa, pois, de existir a figura do Ajudante Técnico de Farmácia, para passar a existir a figura do Técnico de Farmácia.


O que implica a necessidade, juridicamente correta e além do mais justa, de extinguir também no S.A.M.S., a categoria e carreira do Ajudante Técnico de Farmácia e enquadrar os atuais Técnicos de Farmácia na mesma posição da grelha salarial e de carreira dos restantes Técnicos do S.A.M.S. Solicitamos, pois a V. Exas que promovam, no âmbito da grelha do S.A.M.S. e da regulamentação de carreiras, aquelas alterações.”


6 - A esta comunicação do SIFAP de 28.01.2000, o Réu respondeu em 09 de março de 2000, mediante comunicação com a Ref.ª n.º 192/2000-S.G.P., do seguinte teor:


“Relativamente ao teor do vosso ofício nº 0067 de 2000/01/28, informamos que, por decisão do Conselho de Gerência, a eventual reclassificação dos Ajudantes Técnicos de Farmácia desta Instituição, como Técnicos de Farmácia, deverá ficar a aguardar o reconhecimento desse estatuto por parte do Departamento de Recursos Humanos da Saúde.”


7 - O Réu, a 06 de Setembro de 2000, reitera por ofício com a ref.ª 031351, sobre a “Situação dos Ajudantes Técnicos de Farmácia dos S.A.M.S.”, dirigido ao SIFAP - Sindicato Nacional dos Profissionais de Farmácia e Paramédicos, “(…) comunicar que esta Instituição classificará como Técnicos de Farmácia os seus trabalhadores atualmente classificados como Ajudantes Técnicos de Farmácia, quando e se houver reconhecimento dessa situação por parte do Departamento de Recursos Humanos da Saúde (DRHS).


Contudo, caso se verifique o reconhecimento como Técnicos de Farmácia por parte do DRHS, são garantidos no âmbito interno dos SAMS efeitos retroativos, no que diz respeito à categoria profissional e remunerações, à data em que os respetivos requerimentos foram apresentados naquele organismo público.”


8 - Em 02 de Março de 2005, por ofício n.º 008136, o Réu SBSI, em resposta a comunicação do SIFAP de 27 de janeiro de 2005, informa este sindicato “…que o processo de reescalonamento dos Ajudantes Técnicos de Farmácia dos SAMS, foi levado a cabo em 19 de Janeiro de 2005”.


9 - Por ofício de 15 de junho de 2005, o ora Réu, à data denominado SBSI, remeteu ao Director-Geral do Departamento de Modernização e Recursos de Saúde uma comunicação do seguinte teor:


"Assunto: Integração dos Ajudantes Técnicos de Farmácia na carreira de Técnicos de Farmácia


Exmo. Senhor:


Por carta datada de 04 de setembro de 2000, o Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas assumiu com o Sindicato Nacional dos Profissionais de Farmácia e Paramédicos o compromisso de classificar os Ajudantes Técnicos de Farmácia dos Serviços de Assistência Médico-social do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas em Técnicos de Farmácia, se assim fossem reconhecidos pelo Departamento de Recursos Humanos da Saúde. Caso em que a reclassificação teria efeitos retractivos quanto à categoria profissional e remunerações, à data em que os respetivos requerimentos deram entrada naquele organismo público.


Compromisso que o Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas honrou ao reescalonar com efeitos retroativos, nos moldes supra descritos, os trabalhadores que apresentaram a respetiva Cédula Profissional, passada pelo Departamento de Modernização e Recursos da Saúde.


Porém, o Sindicato das Ciências e Tecnologias da Saúde veio, recentemente, em 23 de abril de 2005, pôr em causa a legalidade deste reescalonamento, alegando que a “cédula profissional que eventualmente lhes atribuía o título de Técnicos de Farmácia, foi indevidamente passada pelo Departamento de Modernização e Recursos da Saúde, com base numa interpretação abusiva da lei pois baseada num despacho de simples aplicação interna.


Mais alega este Sindicato que “esse despacho sumariamente preteriu e desbaratou a letra e o espírito das leis reguladoras destas duas diferentes, e diversas profissões, razão pela qual decorre procedimento judicial adequado.


Face ao exposto e ainda considerando que, os então, Ajudantes Técnicos de Farmácia têm conteúdo funcional, grau de responsabilidade e habilitações académicas diferentes dos Técnicos de Farmácia, agradecemos ser informados sobre o que relativamente ao assunto tiverem por conveniente, para que esta entidade possa tomar posição sobre o assunto.


Para os devidos efeitos, anexamos cópias das cédulas dos trabalhadores cujo reescalonamento se discute.”


10 - Em 18.03.2003, o Autor logrou obter a emissão da Cédula Profissional ou Título Profissional de Técnico de Farmácia, emitida pelo Departamento de Recursos Humanos da Saúde do Ministério da Saúde, e, nessa sequência, em julho de 2005, o Réu procedeu à reclassificação profissional do mesmo para a referida categoria profissional de Técnico de Farmácia, fazendo retroagir a reclassificação à data de entrada em vigor do DL nº 320/99, de 11.08, ou seja, a Outubro de 1999.


11 - Por efeito de tal reclassificação profissional, o Réu (…), por acto gestionário, atribuiu ao Autor a remuneração equiparada aos Técnicos de Diagnóstico e Terapêutica, prevista no Acordo de Empresa que havia celebrado em 26 de Janeiro de 2001 com o Sindicato das Ciências e Tecnologias da Saúde para os Técnicos de Diagnóstico e Terapêutica ao Serviço dos SAMS - Serviços de Assistência Médico-Social do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, publicado no BTE n.º 8, 1.ª Série, de 22 de Fevereiro de 2001, a pp. 402 a 425, passando o Autor a auferir em 2005 a retribuição base de € 1.194,80, tendo-lhe sido pagas as diferenças salariais desde Outubro de 1999, de acordo com a categoria de Técnico de Diagnóstico e Terapêutica/Técnico de Farmácia, nos termos previstos na cláusula 12.ª do referido AE, inclusive as promoções por antiguidade aos escalões de retribuição aí previstos.


12 - (…) 2


13 - Com o pagamento das diferenças salariais em julho de 2005, o Réu não efetuou ao Autor mais nenhuma progressão salarial no que respeita aos escalões de retribuição referidos na cláusula 12.ª do referido AE.


14 - Em 26 de Janeiro de 2001, aquando da celebração do Acordo de Empresa entre o Réu e o Sindicato das Ciências e Tecnologias da Saúde para os Técnicos de Diagnóstico e Terapêutica ao Serviço dos SAMS - Serviços de Assistência Médico-Social do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, publicado no BTE n.º 8, 1.ª Série, de 22 de Fevereiro de 2001, a pp. 402 a 425, bem como em Julho de 2005, vigoravam no âmbito do Réu as “Normas Reguladoras da Prestação de Trabalho dos Técnicos de Diagnóstico e Terapêutica”, (…) sendo a descrição de funções do Técnico de Diagnóstico e Terapêutica de Farmácia, constantes do seu Anexo III, as seguintes: “é o técnico de diagnóstico e terapêutica desenvolve as atividades no circuito do medicamento, tais como análises e ensaios farmacológicos, interpreta a prescrição farmacêuticas e fórmulas farmacêuticas, sua preparação, identificação e distribuição, controlo da conservação, distribuição e stocks de medicamentos e outros produtos, informa e aconselha sobre o uso do medicamento;”.


15 - No referido Acordo de Empresa celebrado entre o Réu (à data denominado Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas) e o Sindicato das Ciências e Tecnologias da Saúde para os Técnicos de Diagnóstico e Terapêutica ao Serviço dos SAMS - Serviços de Assistência Médico-Social do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, publicado no BTE n.º 8, 1.ª Série, de 22 de Fevereiro de 2001, a definição de funções dos técnicos na área de Farmácia vem prevista no seu art.º 7.º, n.º 1, al. f) e é a seguinte: “Farmácia — desenvolvimento de atividades no circuito do medicamento, tais como análise e ensaios farmacológicos, interpretação da prescrição terapêutica e de fórmulas farmacêuticas, na sua preparação, identificação e distribuição, controlo da conservação, distribuição e stocks de medicamentos e outros produtos, informação e aconselhamento sobre o uso do medicamento”.


III.

a. Primeira e segunda questões:

9. Sobre a matéria fundamentalmente em litígio, ponderou o acórdão recorrido:


«[D]efende o Apelante que, ao contrário do decidido na sentença recorrida, o Autor não tem direito a promoções e diferenças retributivas nos termos da Cláusula 12.ª do Acordo de Empresa outorgado pelo Réu, publicado no BTE n.º 8, de 22/02/2001.


Sustenta o Recorrente, por um lado, que tal cláusula não é aplicável à relação laboral entre as partes, e, por outro lado, que, ainda que fosse aplicável, o Autor não demonstrou o preenchimento dos requisitos de progressão que ali se exigem.


A questão em apreço já foi apreciada por esta Relação de Lisboa, pelo menos, nos acórdãos proferidos nos processos n.ºs 19322/21.0T8LSB.L1 e 5440/21.9T8LSB.L1 (…), inexistindo quaisquer razões de facto ou de direito para alteração de entendimento.


(…)


Retornando ao caso sub judice, constata-se que (…) está afastada a aplicação do Acordo de Empresa em causa por força da filiação do Autor no Sindicato outorgante ou da sua adesão individual ao mesmo, uma vez que nada foi demonstrado nesse sentido.


(…)


[T]ambém nos presentes autos resulta da factualidade provada que o Réu, em 2005, alterou unilateralmente o contrato de trabalho do Autor, sem oposição e com a aceitação deste, quanto à sua reclassificação profissional e inerente posicionamento salarial nos termos da Cláusula 12.ª daquele Acordo de Empresa, tendo-lhe sido pagos os inerentes retroativos salariais desde outubro de 1999.


Em face do exposto, aplicando-se tal cláusula ao contrato de trabalho vigente entre o Autor e o Réu, por força da sua incorporação no mesmo em resultado da aludida alteração, não há que chamar à colação o Regulamento Interno invocado a título subsidiário.


Não obstante, também a presente ação, como as dos processos acima identificados, tem de ser julgada improcedente.


É que a citada Cláusula 12.ª dispõe que são efetuadas promoções por antiguidade ao escalão imediatamente superior até ao escalão 10 (inclusive), quando o técnico reúna uma das seguintes condições:


a) Ter completado um ano de permanência no escalão mínimo da respetiva categoria profissional e, nos outros casos, ter completado três anos de permanência no mesmo escalão, em ambas as situações, com bom e efetivo serviço, sempre com um horário de trabalho semanal em tempo completo;


b) Ter completado cinco anos de permanência, no mesmo escalão, com bom e efetivo serviço.


Ora, sem prejuízo de os pagamentos em conformidade com o estabelecido na cláusula em apreço estarem regularizados até 2005, como decorre do provado sob o ponto 11, o certo é que o Autor não logrou provar os pressupostos de facto do seu direito quanto à restante parte da pretensão que deduziu, em virtude de, como sublinhado no Acórdão desta Relação já parcialmente transcrito, as promoções ou progressões na carreira de Técnico de Diagnóstico e Terapêutica nos termos de tal Cláusula 12.ª não serem “(…) de funcionamento automático, como parece ser a ideia do trabalhador, mas dependerem antes de uma avaliação quantitativa [efetivo serviço] e qualitativa [bom serviço] por parte do Sindicato Réu, o que se justifica e compreende, pois o nível de abstencionismo laboral - voluntário ou não e justificado ou não -, assim como o desempenho de tal atividade em termos de empenho, conhecimento, zelo e diligência [com eventuais reflexos até no plano disciplinar] devem ser considerados e valorados para efeitos dessa progressão na carreira de Técnico de Diagnóstico e Terapêutica [até pela significativa responsabilidade técnica e humana que as respetivas funções, exercidas no meio hospitalar e clínico, implicam].”


Na verdade, percorrida a factualidade acima elencada como assente, constata-se que, para além de estarem provados os pagamentos devidos até 2005, como se reconheceu na sentença recorrida, nada consta quanto aos aludidos requisitos do direito do Autor relativamente aos anos subsequentes, ficando, consequentemente, prejudicada a sua quantificação em sede de incidente de liquidação e antes se impondo, ipso facto, a improcedência do pedido.»


10. Sobre situação essencialmente idêntica à dos autos, esta Secção Social do STJ já se pronunciou em sentido inteiramente favorável às linhas de raciocínio assim desenvolvidas pelo Tribunal a quo (Ac. de 06.12.2023, Proc. n.º 19322/21.0T8LSB.L1.S1), em termos que integralmente se subscrevem.

b. Terceira e quarta questões:

11. A alegada violação do princípio da igualdade também foi afastada pelo sobredito aresto deste Supremo Tribunal, com a seguinte fundamentação que totalmente se reitera:


«O princípio da igualdade, na perspetiva aqui relevante, (a salarial - a trabalho igual salário igual), encontra suporte no artigo 59.º, n.º 1, a), da Constituição da República Portuguesa (CRP), que concretiza, especificamente, o princípio programático proclamado no artigo 13.º, de que todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a Lei.


O primeiro dos citados normativos preceitua que “todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna” - artigo 59.º, n.º 1).


É pacificamente entendido e aceite que o princípio da igualdade pressupõe uma igualdade material, reportada à realidade social vivida, e não uma igualdade meramente formal, massificadora e uniformizadora, o que implica que se trate por igual o que é essencialmente igual e desigualmente o que é essencialmente desigual.


Trabalho de valor igual é, na definição dada pelo artigo 23.º do Código do Trabalho, “aquele em que as funções desempenhadas ao serviço do mesmo empregador são iguais ou objetivamente semelhantes em natureza, qualidade e quantidade” - n.º 1, al. c). (sublinhado nosso).


O trabalho é igual quanto à natureza, quando abrange as mesmas funções, perigosidade, penosidade ou dificuldade; quanto à quantidade, relativamente ao volume, intensidade e duração; e, quanto à qualidade, se abrange os mesmos conhecimentos dos trabalhadores, a capacidade e a experiência que o trabalho exige, mas também, o zelo, a eficiência e produtividade do trabalhador.


Em termos remuneratórios - tal como definidos pelo artigo 270.º do CT - deve ter-se em conta a quantidade, natureza e qualidade do trabalho, observando-se o princípio de que, para trabalho igual ou de valor igual, salário igual.


Pretendendo o trabalhador que seja reconhecida a violação do princípio “para trabalho igual, salário igual”, cabe-lhe alegar e provar tais pressupostos, que são constitutivos do direito subjetivo que invoca.


(…)


Em suma, pretendendo o trabalhador que seja reconhecida a violação do princípio “para trabalho igual, salário igual”, cabe-lhe alegar e provar que a diferenciação existente é injustificada em virtude de o trabalho por si prestado ser igual aos dos demais trabalhadores quanto à natureza, abrangendo esta a dificuldade, penosidade ou perigosidade na execução laboral; quanto à quantidade do trabalho prestado, aqui cabendo o volume, a intensidade e a duração; e, quanto à qualidade, compreendendo-se nesta os conhecimentos dos trabalhadores, a capacidade e a experiência que o trabalho exige, mas também, o zelo, a eficiência e produtividade do trabalhador – cfr. artigo 342.º, n.º 1, do CC.


No caso dos autos, basta ler os artigos (…) da petição inicial para se concluir que contêm apenas considerações e conclusões jurídicas e não quaisquer factos concretos sobre a alegada violação do princípio da igualdade salarial.»


12. Por fim, quanto à invocada violação do princípio do tratamento mais favorável.


Dispõe o art. 476.º, do CT, a este propósito, que “As disposições de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho só podem ser afastadas por contrato de trabalho quando este estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador”.


Alega o recorrente a violação deste princípio “por não [se] aplicar ao Autor no que concerne à carreira remuneratória o AE publicado no BTE nº 8, 1ª Série, de22 de fevereiro de 2001, a pág. 402 a 425, por ser mais favorável ao Autor, no que respeita ao enquadramento das funções de Técnico e respetivo enquadramento salarial”.


Ora, decorrendo de tudo o já exposto que o Acórdão da Relação considerou aplicável à relação laboral em apreço aquele Acordo de Empresa (embora se tenham por inverificados os requisitos de promoção contemplados na sua cláusula 12ª), não se alcança como poderá considerar-se infringido este princípio.


IV.


13. Em face do exposto, confirmando o acórdão recorrido, acorda-se em negar a revista.


Custas pelo recorrente.


Lisboa, 12 de abril de 2024


Mário Belo Morgado (Relator)


Ramalho Pinto


Júlio Vieira Gomes





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1. O tribunal deve conhecer de todas as questões suscitadas nas conclusões das alegações apresentadas pelo recorrente, excetuadas as que venham a ficar prejudicadas pela solução entretanto dada a outra(s) [cfr. arts. 608.º, 663.º, n.º 2, e 679º, CPC], questões (a resolver) que, como é sabido, não se confundem nem compreendem o dever de responder a todos os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, os quais não vinculam o tribunal, como decorre do disposto no art. 5.º, n.º 3, do mesmo diploma.↩︎

2. Eliminado pelo TRL, sendo a seguinte a redação deste ponto: 12 - Em julho de 2005, a referida reclassificação profissional do Autor foi efetivada pelo Réu sem que tenha havido qualquer aditamento ao contrato individual de trabalho ou renúncia do referido RI que se vinha a aplicar até aí, e sem imposição ao Autor de qualquer outra convenção de trabalho aplicável aos trabalhadores do SBSI, ou mesmo a aplicação do Código do Trabalho.↩︎