NULIDADE
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
SENTENÇA
OMISSÃO
Sumário

- A nulidade consistente na omissão de pronúncia só se verifica quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões ou pretensões que devesse apreciar e cuja apreciação lhe foi colocada.
- Não padece de nulidade por omissão de pronúncia a sentença que conheceu de todas as questões que devia conhecer, resolvendo-as, ainda que a descontento do recorrente.
- A sentença deve conter, além do mais, os factos provados e os não provados e a respectiva fundamentação;
- A completa omissão dos factos não provados sem qualquer referência à razão da sua não elencagem no acervo factual determina a nulidade da sentença.

Texto Integral

Acordam os juízes que compõem a Secção de Propriedade Industrial, Concorrência, Supervisão e Regulação do Tribunal da Relação de Lisboa

I- Relatório
Inconformado com o decidido pelo Tribunal da Propriedade Intelectual em sentença de 15.10.2019, na qual se indeferiu o recurso apresentado pelo Banco de Investimento Global, S.A., mantendo-se o despacho do INPI que concedeu o registo à marca nacional n.º 594424, veio recorrer a este Tribunal da Relação o dito Banco de Investimento Global formulando, após motivações, as seguintes conclusões:
“A. O presente recurso tem como objeto a Sentença do Tribunal da Propriedade Intelectual proferida em 15.10.2019, que indeferiu o recurso interposto do despacho de 22.03.2019, do Diretor da Direção de Marcas e Patentes do INPI, que concedeu o registo da marca nacional n.º 594424 (adiante Decisão Recorrida) e incide sobre matéria de facto e de direito.
B. Como incidente preliminar à apreciação do recurso, requer-se que seja desencadeado o mecanismo de reenvio prejudicial previsto na alínea a), do n.º 1, do artigo 267.º do TFUE, para esclarecimento das questões identificadas no Ponto I, iv) do corpo destas alegações, nos termos e com os fundamentos ali explanados (que aqui se dão por reproduzidos), na medida em que a Decisão Recorrida - que está em contradição com as decisões proferidas pelo EUIPO sobre os mesmos factos e com vasta jurisprudência anterior, do TJUE, sobre as mesmas questões jurídicas - suscita fundadas dúvidas sobre a correta interpretação de normas de Direito da União relevantes para dirimir o litígio.
C. Uma vez que a decisão que vier a ser proferida por este Venerando Tribunal será, em termos ordinários, irrecorrível, este reenvio prejudicial é obrigatório e revela-se essencial para assegurar uma aplicação uniforme do Direito da União no espaço da União Europeia.
DAS CAUSAS DE NULIDADE DA DECISÃO RECORRIDA
D. Ao decidir que não lhe competia apreciar a anulabilidade do despacho emitido pelo INPI (com fundamento em incompetência em razão da hierarquia do seu autor), por entender que essa é uma matéria da competência dos Tribunais Administrativos, o Tribunal a quo deixou de apreciar uma questão que lhe competia conhecer, atenta a natureza de recurso de plena jurisdição dos presentes autos, infringindo, assim, o disposto no n.º 2, do artigo 608.º do CPC, o que determina a nulidade da Decisão Recorrida, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto na alínea d), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC.
E. Ao deixar de apreciar criticamente toda a prova apresentada pelo Recorrente (e também pelo Recorrido) com o fundamento de que não estava vinculado a decidir em conformidade com a mesma (nomeadamente no que respeita aos Estudos de Mercado), o Tribunal a quo infringiu o disposto no n.º 4, do artigo 607.º do CPC e, do mesmo passo, omitiu uma atividade que a lei lhe impõe (analisar criticamente a prova) com manifesta influência na decisão da causa, o que acarreta igualmente a nulidade da Decisão Recorrida, por omissão de pronúncia.
F. Ao omitir na Decisão Recorrida qualquer explicação para não ter incluído os factos alegados pelo Recorrente no elenco dos «Factos Provados» e, bem assim, ao omitir, por completo, a identificação dos factos «não provados» e quais as razões que sustentaram tal "resposta à matéria de facto", o Tribunal a quo impediu o Recorrente de conhecer e sindicar tais razões, pelo que infringiu o disposto no n.º 3 e 4.º do artigo 607.º do CPC, determinando, além do mais, a obscuridade e a complexidade da Decisão Recorrida, e consequentemente a sua nulidade nos termos das alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.
G. Ao impedir o conhecimento de quais os factos que o Tribunal julgou «Não Provados» e respetivos fundamentos (restando ao Recorrente adivinhar/presumir que terá sido dado como «não provado» tudo o que não foi incluído nos «Factos Provados») a Decisão Recorrida infringiu ainda o direito do Recorrente a um processo justo e equitativo e consequentemente o disposto no n.º 1 e n.º 4, do artigo 20.º, no artigo 204.º e no n.º 1, do artigo 205.º todos da CRP. Neste sentido, entre muitos outros, o Acórdão do STJ de 26.02.2019, disponível em www.dgsi.pt de acordo com os excertos do respetivo sumário supra transcritos.
DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
H. Independentemente do vício de nulidade supra invocado, a prova documental junta aos autos impunha ao Tribunal a quo que este desse como provados os factos invocados pelo Recorrente, com clara relevância para a boa decisão da causa - enquanto evidências de confusão entre o Recorrente e o Recorrido e respetivas marcas após o início de utilização do sinal em crise - e que, assim, se presume (por cautela de patrocínio) terem sido incorretamente dados como «não provados»
I. Como circunstanciadamente descrito no ponto III. i), supra (que aqui se dá por integralmente reproduzido), os factos descritos nos artigos 182.º a 201.º da petição do Recorrente deverão ser dados como «provados» uma vez que resultam objetivamente demonstrados pelos documentos juntos como Docs. n.º 24, 25, 26, 27 e 30 com a p.i..
J. Deverá também ser dada como «provada» a matéria alegada nos artigos 206.º a 208.º da p.i. (engano no envio de um formulário bancário para constituição de depósito a prazo, com a marca em crise), pois resulta plenamente demonstrada pelo Doc. n.º 28, com a p.i., conjugado com as regras de experiência comum, uma vez que, inexiste qualquer outra razão plausível para tal documento ter sido entregue ao Recorrente e, bem assim, a matéria dos artigos 212.º a 215.º da p.i. do Recorrente, pois resulta objetivamente do Documento n.º 29, ali junto.
K. Deverá ainda ser dada como provada a matéria alegada nos artigos 164.º e 171.º a 174.º, e 177.º a 179.º da p.i. do Recorrente e, bem assim, a demais transcrita no Ponto III. i), uma vez que constitui evidência da semelhança entre os sinais em crise e se mostra demonstrada pelo Doc. n.º 1, junto com a Contestação do Recorrido no INPI, a fls..do processo administrativo (Estudo DYM), e, bem assim, pelo Doc. 23, com a p.i. do Recorrente (Estudo Marktest).
L. Finalmente, em função de toda a prova acima referida e dos factos que com base na mesma se demonstram, devia também o Tribunal a quo ter dado como provado o alegado nos artigos 80.º e 140.º da p.i., ou, no limite (e sem conceder) que “existem semelhanças entre as marcas em confronto (nomeadamente fonéticas)".
DA ERRADA ANÁLISE DA CONFUNDIBILIDADE ENTRE OS SINAIS EM CONFRONTO
M. Ao concluir pela inexistência de um risco de confusão entre as marcas em crise, com fundamento numa preponderância distintiva do prefixo "Euro" (da marca contestada) que este elemento não detém, e optando por desvalorizar as evidentes semelhanças que existem entre os elementos dominantes "Bic" v "BiG", o Tribunal a quo interpretou e aplicou incorretamente o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 238.º, conjugado com o disposto nas alíneas c) e d), do n.º 1, do artigo 209.º, ambos do CPI, infringindo estes preceitos legais.
N. O vocábulo "euro", utilizado como prefixo de qualquer marca, não é um elemento eficaz de diferenciação que permita afastar um risco de confusão (incluindo o risco de associação com a marca anterior), no espírito do público, que exista em virtude de semelhança/identidade dos demais elementos nominativos.
O. O que facilmente se evidencia, salvo melhor opinião, numa análise comparativa entre as seguintes marcas reais e fictícias:
> "CGD" v "EuroCGD";
> "Banco Santander" v "EuroSantander;
> "BBVA" v "EuroBBVA";
> "BPI" v "EuroBPI".
P. Ao contrário do que resulta da tese sufragada na Decisão Recorrida, todas as marcas fictícias acima elencadas afiguram-se notoriamente confundíveis e susceptíveis de criar risco de confusão com as que as antecedem, pelo que não poderiam ser registadas pelo Recorrido ou por qualquer outro banco (terceiro).
Q.Neste âmbito, cumpre, aliás, questionar se seria sequer discutível a existência de um incomportável risco de confundibilidade com marca prioritária, caso o Recorrido tivesse tentando registar a marca "EuroSantander" ou mesmo "EuroSantanber", ainda que precedido de um embondeiro?
R. A ocorrência reiterada de episódios em que os consumidores, tribunais e meios de comunicação ou mesmo o maior processador de serviços de pagamento em Portugal, confundem o Recorrente com o Recorrido e vice-versa, muito depois da introdução do sinal em crise, constituem factualidade relevante que comprova a existência de um risco de confusão e que o Tribunal a quo estava obrigado a ponderar na sua decisão.
S. A existência de um Estudo de Mercado (Estudo DYM) onde confrontados com as marcas em crise - 78%, 73%, 55,3% ou 52,1% - dos inquiridos (consoante o módulo em causa) pura e simplesmente "Não Sabe" se as marcas em causa pertencem a Bancos diferentes ou se, pelo contrário, são do mesmo Banco, constitui igualmente uma evidência notória de um risco de confusão entre as referidas marcas que não poderia ter sido ignorado, como foi.
T. De igual modo, a existência de um Estudo de Mercado (Estudo Marktest) no qual, após audição das frases "Abra conta no EuroBic" e “Abra conta no BANCO BiG", 54% dos inquiridos (1044 indivíduos) respondeu que "As marcas referidas nas frases são parecidas" e 17% respondeu mesmo que "As frases referem a mesma marca", constitui uma fortíssima evidência de semelhança (fonética) e risco de confusão entre as citadas marcas, que não poderia ter sido totalmente ignorada, como foi, pelo Tribunal a quo.
U. A análise da confundibilidade que foi realizada pelo Tribunal a quo contraria os critérios de apreciação consensuais na doutrina e refletidos na jurisprudência, pois centra-se exclusivamente na regra da apreciação global e ignora: (i) a irrelevância das componentes genéricas ou descritivas; (ii) que se deve privilegiar, na comparação, o elemento predominante de cada marca sendo que, nas marcas mistas, este será, em regra, o elemento nominativo e, ainda, (iii) que a semelhança entre sinais pode reportar-se apenas a um dos seus aspetos para que exista risco de confusão (sendo o fonética o mais relevante neste caso)
- cf. Doutrina e Jurisprudência citada no ponto III. ii), supra.
V. "Euro" é um vocábulo meramente descritivo de uso muitíssimo frequente, ainda para mais na área dos serviços financeiros, com o significado de moeda europeia (€) ou de espaço europeu, pelo que, por si só, não tem qualquer capacidade distintiva (incluindo-se, aliás, nos sinais ou indicações referidos nas alíneas b) a d) do n.º 1 do artigo 209.º do CPI) e, mesmo quanto aposto como prefixo de outro elemento, continuará a não ter capacidade distintiva.
W. Neste sentido, a Decisão proferida no Processo T-359/99, Caso EuroHealth e, em sentido similar, quanto ao vocábulo WORLD, o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27.02.2008, Processo T-325/04, no litígio que opôs a Citigroup, Inc. ao EUIPO e, quanto ao vocábulo "Club", o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11.03.2004, conforme excertos dos mesmos transcritos supra no Ponto I. ii).
X. Assim, o Tribunal a quo errou ao atribuir ao vocábulo "Euro" uma preponderância distintiva, igual e/ou superior à do elemento "BIC", e ao considerar que aquele "atribui uma sonoridade à marca totalmente diversa da marca BIG" do Recorrente, pelo que a Decisão Recorrida está em contradição com a Jurisprudência acima citada.
Y. O Tribunal a quo não tomou também em devida consideração que a expressão EuroBic é entendida, lida e dita, como duas palavras distintas: Euro e Bic, e que a tendência do consumidor será desconsiderar a palavra "Euro" e concentrar a sua atenção no elemento "Bic".
Z. O Tribunal a quo deveria ter considerado que os elementos dominantes das marcas em oposição são os sinais "Bic" vs. "BiG", e que estes são fonética e graficamente/visualmente, muito similares, quase idênticos: (i) a pronúncia destas duas palavras é tão idêntica que a distinção entre eles é imperceptível; e, (ii) todas as letras que compõem as duas palavras são extremamente parecidas, dadas as semelhanças entre a representação gráfica do "C" e do "G".
AA. O Tribunal a quo errou ainda ao atribuir particular relevância distintiva ao elemento figurativo do sinal do Recorrido - o embondeiro - e à sua cor vermelha, uma vez que esse entendimento é contrário ao terceiro critério de apreciação da confundibilidade entre marcas acima descrito, como assinalado, entre outros, por Carlos Olavo e na Sentença do TPI proferida no Processo 201/17.2YHLSB, publicada no Boletim da Propriedade Industrial n.º 2017/12/14 e acima parcialmente transcrita, sendo certo que tal elemento em nada afasta, por exemplo, a confundibilidade fonética.
BB. A Decisão Recorrida fez, assim, uma incorreta aplicação ao caso do disposto na alínea b), do n.º 1, do artigo 232.º, e no n.º 1, do artigo 238.º, conjugados com o disposto nas alíneas c) e d) do n.º 1, do artigo 209.º, todos do CPI, infringindo consequentemente tais preceitos legais e, bem assim, o disposto no n.º 3, do artigo 607.º do CPC.
CC. A Decisão Recorrida infringe ainda o disposto no n.º 4, do artigo 607.º do CPC, na medida em que deixou de realizar a análise crítica da prova que lhe competia e, bem assim, de identificar os factos que julgou como «não provados», como melhor descrito supra no Ponto II. i) e ii), o que, na eventualidade de se entender que não acarreta a nulidade por omissão de pronúncia e por falta de fundamentação (de facto), sempre consubstanciará erro de julgamento, a determinar igualmente a sua revogação.
DA INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DO DISPOSTO NA ALÍNEA B) DO N.º 1, DO ARTIGO 232.º E DA ALÍNEA C), DO N.º 1, DO ARTIGO 238.º, DO CPI, NA INTERPRETAÇÃO REALIZADA NA DECISÃO RECORRIDA
DD. Quando interpretadas no sentido em que foram aplicadas na Decisão Recorrida, segundo o qual o vocábulo "euro" - enquanto elemento que preenche as características indicadas nas alíneas b) a d) do n.º 1 do artigo 209.º - constitui um elemento de diferenciação preponderante (e não secundário e acessório) que torna dissemelhante e garante a inexistência de um risco de confusão entre a marca em crise e as marcas prioritárias do Recorrentes, as normas da alínea b), do n.º 1, do artigo 232.º e da alínea c), do n.º 1, do artigo 238.º, do CPI, são materialmente inconstitucionais por infração do princípio do primado do Direito da União Europeia na ordem jurídica interna e consequentemente do n.º 6 do artigo 7.º e do n.º 4, do artigo 8.º, ambos da CRP.
EE. A interpretação subjacente à Decisão Recorrida segundo a qual uma marca prioritária não goza de proteção legal relativamente a marcas registadas posteriormente, ainda que exista semelhança quanto aos seus elementos predominantes, desde que nestas se coloque um prefixo ou sufixo que não exista na marca prioritária (ainda que não distintivo ou fracamente distintivo), restringe de forma injustificada o direito de propriedade do Recorrente, enquanto titular de marcas prioritárias, pelo que infringe o disposto no artigo 249.º do CPI e, bem assim, o n.º 1, do artigo 62.º da CRP.
FF. Ao ter aplicado os citados preceitos de acordo com as interpretações acima descritas, a Decisão Recorrida infringiu o disposto no artigo 204.º e no n.º 2 do artigo 266.º, da CRP, o que obriga à sua reformulação e substituição por outra que os interprete em conformidade com o direito da União Europeia e com a CRP.
DA INCORREÇÃO DO ARGUMENTO ASSENTE NA DENOMINAÇÃO SOCIAL DO RECORRIDO
GG. Resulta do disposto na alínea d), do n.º 2, do artigo 249.º do CPI, que o titular de marca prioritária tem o direito de impedir a incorporação de sinal proibido (Banco BIC) como parte caraterística de uma denominação social, pelo que, salvo o devido respeito, é totalmente incorrecto afirmar, como se faz na Decisão Recorrida, que o facto de a denominação social do Recorrido ser "Banco Bic Português, S.A." torna inviável "a eliminação total do vocábulo BIC da marca do recorrido
HH. Ao ajuizar que a concessão do registo da marca em crise não permite a prática de actos de concorrência desleal por parte do Recorrido, a Decisão Recorrida interpretou e aplicou incorretamente ao caso o disposto na alínea h) do n.º 1, do artigo 232.º, conjugado com alínea a), do n.º 1, do artigo 311.º, ambos do CPI, devendo, também por esse motivo, ser revogada e substituída por outra que, recuse o registo da marca em crise com esse fundamento.
DA ERRADA CONCLUSÃO DE QUE O RECORRIDO NÃO ACTUOU DE MÁ-FÉ AO DESISTIR DE PEDIDO IDÊNTICO AO DA MARCA EM CRISE
II. Os factos invocados quanto ao registo e desistência da marca nacional n.º 594424, imediatamente precedido do registo da marca em crise (em tudo idêntica), indiciam suficientemente que o Recorrido não pretendeu verdadeiramente desistir do registo daquela marca mas apenas impedir que a Reclamação apresentada pelo Recorrente fosse apreciada pelo INPI e, por outro lado, conseguir realizar um novo registo (de marca idêntica) sem oposição do Recorrente, agindo, assim, de modo consciente e intencional com o intuito de prejudicar o Recorrente.
JJ. Com base em tais factos, deveria a Decisão Recorrida ter entendido que a atuação do Recorrido é especialmente censurável e configura má-fé, o que deveria ter levado à recusa do registo, na medida em que Recorrente e Recorrido são bancos e, como tal, estão obrigados a pautar a sua atuação por elevados padrões éticos e de recíproca correção.
KK. Sendo que, como considerado, por exemplo, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13.09.2011, o registo de uma marca efetuado de má fé, constitui fundamento autónomo de invalidade do registo - cf. sumário do referido acórdão transcrito no Ponto III. iv) supra.
LL. Por tudo o exposto, deve a Decisão Recorrida ser revogada e substituída por outra que, fazendo uma correcta aplicação das normas do CPI, conclua, além do mais, que a marca do Recorrido em crise constitui uma imitação, em parte, das marcas prioritárias do Recorrente que pode induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreende o risco de associação com as marcas prioritárias do Recorrente e cujo registo, deve por isso, ser recusado.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., deverá:
a) Ser determinado o reenvio prejudicial das questões de interpretação acima elencadas no Ponto I. iv);
b) O presente recurso ser julgado procedente, determinando- se, em consequência, a revogação da Decisão Recorrida e a sua substituição por outra que:
(i) Julgue procedentes as nulidades invocadas com as legais consequências; ou,
(ii) Considere provados os factos elencados no ponto III i); e, em qualquer caso,
(iii) Determine a revogação do despacho proferido pelo INPI e a recusa do registo da marca nacional n.º 594424.
Admitido o recurso veio responder ao mesmo Banco BIC Português S.A. concluindo que:
I. A questão central deste recurso — saber se a marca registanda é ou não imitação das marcas prioritárias do Apelante — depende da resposta a uma questão prévia: quais os componentes das marcas que devem ser tidos em conta nessa comparação?
II. Mais concretamente, importa saber se, na comparação de marcas compostas por diversos elementos, deve atender-se à impressão de conjunto resultante da totalidade dos componentes (ainda que alguns deles, isoladamente, não tenham carácter distintivo próprio, como “Euro” e “Banco”); ou se, pelo contrário, a comparação deve ser expurgada desses elementos e limitada àqueles que sejam distintivos, em si mesmos.
III. A resposta a esta questão já foi dada, pelo Tribunal de Justiça e pelo Tribunal Geral, especialmente nos acórdãos LIMONCHELLO, SCHINKEN KING, LAM - LINEAS AEREAS DEL MEDITERRANEO, BEPOST, OHMI.SHAKER e NESTLÉ/OHMI:
— A comparação deve abranger os sinais no seu conjunto. É, consequentemente, incorrecto descartar a comparação de elementos de sinais apenas porque são, por exemplo, mais pequenos que outros elementos dos sinais ou não são distintivos.
— Por isso, só quando todos os outros componentes da marca forem negligenciáveis é que a apreciação da semelhança poderá ser feita exclusivamente com base no elemento dominante.
IV. À luz destes critérios, o despacho do INPI e a douta sentença do TPI fizeram uma impecável aplicação das normas do CPI, tendo atendido à impressão de conjunto de cada uma das marcas em confronto, com todos os seus elementos, dado que nenhum dos seus componentes é negligenciável.
V. Inconformado, o Apelante tenta limitar a análise à comparação de 2 sinais inexistentes: BIG e BIC.
VI. Só que os sinais em confronto não são esses, mas sim os seguintes:


VII. É sabido que a “regra de ouro” da comparação de marcas — unanimemente proclamada pela jurisprudência e doutrina — é a de que os sinais devem ser comparados através de uma impressão de conjunto, sem dissecação de pormenores (cf., v.g., ac. STJ de 18.03.2003, P. 3A545 e acs. RL de 8.02.2018 P. 70/12.2YHLSB e de 26.01.2017, P. 227/12.2YHLSB, in www.dgsi.pt ).
VIII. O facto de as palavras “Banco” e “Euro” terem fraco caráter distintivo não as torna negligenciáveis para efeitos de comparação.
IX. De resto, não se está aqui a discutir se a marca tem carácter distintivo, mas apenas se ela se distingue de outros sinais anteriores, pertencentes ao Apelante.
X. E aí temos de considerar as marcas tal como elas são; tal como constam do registo, ou seja, na sua integralidade
XI. É esta a abordagem definida pela jurisprudência europeia, nomeadamente pelo acórdão do Tribunal Geral de 8/2/2011 (Proc. T-194/09, § 30, marca “LAM - LINEAS AEREAS DEL MEDITERRANEO”): o fraco carácter distintivo de um elemento de uma marca não implica necessariamente, tendo em conta, nomeadamente, a sua dimensão ou a sua posição no sinal, que o referido elemento seja negligenciável na impressão de conjunto produzida pela marca.
XII. No mesmo sentido, no acórdão do Tribunal de Justiça de 12/7/2007 (Proc. C-334/05 P, “LIMONCHELO”, § 41), sublinha-se que no quadro do exame da existência de um risco de confusão, a apreciação da semelhança entre duas marcas não se pode limitar a ter em consideração apenas um componente de uma marca complexa e a compará-lo com outra marca. Pelo contrário, é necessário operar tal comparação mediante o exame das marcas em causa, cada uma delas considerada no seu conjunto (...).
XIII. Por isso, o Tribunal Geral sublinhou que só quando todos os outros componentes da marca forem negligenciáveis é que a apreciação da semelhança poderá ser feita exclusivamente com base no elemento dominante. (ac. de 20/3/2018, “bePost”, T- 118/16, § 36).
XIV. Ora, a imagem do embondeiro não pode ser qualificada como “negligenciável”, assumindo um relevo inegável no conjunto da marca mista do Apelado, e contribuindo decisivamente (a par da palavra “Euro”), para a distinguir das marcas do Apelante.
XV. Importa sublinhar que a marca do Apelante não é “BIG”, o que não acontece por acaso, mas sim porque “BIG”, que significa “GRANDE” em inglês, é uma palavra descritiva (de dimensão) — sendo que o consumidor português dispõe de um conhecimento básico de inglês (ac. RL de 26.01.2017, P. 227/12.2YHLSB, dgsi.pt).
XVI. Por isso, não pode a Apelante arrogar-se direitos sobre uma marca que não tem.
XVII. A sentença recorrida fez uma impecável aplicação dos critérios de comparação das marcas, nas várias dimensões relevantes: visual, fonética e conceptual.
XVIII. Visualmente, a marca registanda contém um destacado elemento figurativo, a figura estilizada de um embondeiro, ausente das marcas do Apelante.
XIX. Acresce que, na marca do Apelado, o elemento dominante é o figurativo (a imagem do embondeiro) enquanto nas marcas do Apelante a prevalência vai para o elemento nominativo (as expressões “BANCO BIG” e “Banco de investimento global”).
XX. Do ponto de vista fonético, as diferenças são evidentes, pois enquanto a marca do Apelado começa com o som da palavra “EURO”, seguida de “BIC”, as marcas do Apelante começam pela palavra “BANCO” (com uma sonoridade completamente diferente de “EURO”), sendo que duas delas ainda incluem a expressão “BANCO DE INVESTIMENTO GLOBAL”.
XXI. Por fim, no domínio semântico ou conceptual a diversidade dos sinais é total: enquanto a expressão “Banco BIG” transmite uma ideia de “banco grande” (ou seja, de dimensão), a expressão “EuroBic” significa “o BIC da Europa”, o que espelha o facto de o Apelado — denominada “Banco BIC Português, SA” — ter uma estrutura accionista idêntica ao Banco BIC, S.A, de Angola.
XXII. Face ao exposto, torna-se inevitável concluir que o grau de semelhança visual, fonético e semântico é muito reduzido, pelo que não há risco de confusão ou associação entre os sinais em confronto.
XXIII. Acrescente-se, ainda, que o tipo de consumidor dos serviços em causa (“população bancarizada”), tem um grau de atenção e informação acima da média, o que reduz ainda mais o risco de confusão ou associação errónea (Neste sentido, cf. ac. TJ de 14/11/2013 (C-524/12 P, “F@air Credit”).
XXIV. Face ao exposto, e tal como concluiu o Professor Luís Couto Gonçalves, no parecer jurídico adiante junto:
A marca mista EUROBIC - atendendo às dissemelhanças relevantes e dominantes, nos termos, níveis e graus assinalados - não é confundível com as marcas registadas anteriores BANCO BIG (nominativas e mistas), nada obstando à confirmação da sentença recorrida e à decisão de concessão do respetivo registo.
XXV. Na verdade, as demais questões suscitadas pelo Apelante mostram-se totalmente irrelevantes.!
XXVI. Desde logo, não faz sentido promover um reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça, pois as questões que o Apelante quer ver esclarecidas — interpretação da alínea b) do n.º 1 do art. 5.º da Diretiva 2015/2436 e da alínea b) do n.º 2 do art. 9.º do Regulamento 2017/2001 — já estão cabalmente explicitadas pela jurisprudência do TJUE.
XXVII. Mais concretamente, a questão específica de saber quais são os elementos a considerar na comparação das marcas (e quais são os elementos a descartar) já foi totalmente esclarecida nos citados acórdãos do Tribunal de Justiça de 12/7/2007 (C-334/05 P, LIMONCHELO) e do Tribunal Geral de 8/2/2011 (Proc. T- 194/09, “LAM - LINEAS AEREAS DEL MEDITERRÂNEO”) e de 13/12/2011 (P. T- 61/09, “Schinken King”), acima referidos.
XXVIII. De resto o facto de o Tribunal a quo (e o INPI) ter proferido uma decisão “diametralmente oposta” àquela que foi tomada pelo EUIPO, a respeito da confundibilidade entre a marca registanda (“EuroBic” mista) e as marcas prioritárias do Apelante (“Banco BIG”), nada tem de anómalo, pois o direito das marcas da UE e o direito nacional de marcas são sistemas jurídicos autónomos (art.º 17.º, n.º 1, do Regulamento 2017/2001, sobre a marca da UE), constituindo jurisprudência assente do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral que o regime de marcas comunitário é um sistema autónomo, constituído por um conjunto de normas e que prossegue objetivos que lhe são específicos, sendo a sua aplicação independente de qualquer sistema nacional.
XXIX. Ora, se o INPI não está vinculado nas suas decisões ao entendimento dos examinadores do IPIUE, menos ainda o estarão os tribunais portugueses, que dispõem de total independência nesta matéria.
XXX. De resto, estando em causa apreciar o risco de confusão de marcas pelos consumidores portugueses, o INPI português e os tribunais portugueses estarão seguramente melhor colocados para o fazer do que os examinadores estrangeiros, do EUIPO...
XXXI. De qualquer modo, essa disparidade de decisões tem origem — não numa distinta interpretação de normas de Direito Europeu — mas apenas numa diferente avaliação de questões de facto, relacionadas com a comparação de sinais distintivos concretos e com a hipotética reação dos consumidores, quando confrontados com as marcas em litígio. O EUIPO achou que estas marcas eram confundíveis. O INPI achou que não.
XXXII. Sendo assim, é manifesto que as normas relevantes de Direito Europeu já foram exaustivamente interpretadas pelo Tribunal, sendo suficientemente claras para não suscitarem dúvidas de interpretação ao julgador, pelo que seria descabido promover neste caso um reenvio prejudicial.
XXXIII. Ao contrário do que alega o Apelante, a sentença recorrida pronunciou-se acerca do invocado vício de incompetência hierárquica de que padeceria o despacho do INPI, pelo que não pode proceder a invocada nulidade por omissão de pronúncia.
XXXIV. De qualquer modo, o art.º 151º/1/a) do CPA apenas impõe que seja feita “menção” da qualidade de delegado ou subdelegado, não exigindo que seja identificado e referenciado o despacho que concedeu tal delegação ou subdelegação.
XXXV. Tão pouco poderá afirmar-se que a decisão recorrida carece de fundamentação em matéria de facto. O que acontece é que, como é normal em recursos de marca, regulados pelo art.º 43.º do CPI, o TPI apenas atendeu à prova documental, tendo- o afirmado expressamente, sob a epígrafe “Fundamentação - matéria de facto provada”, sendo certo que o processo administrativo remetido pelo INPI já continha abundante prova documental apresentada pelas partes.
XXXVI. Tão pouco se vislumbra na sentença recorrida qualquer inconstitucionalidade, quando esta procede à interpretação e aplicação da al. b) do n.º 1 do art.º 232.º do CPI, para saber se a marca registanda é confundível com as anteriores.
XXXVII. O que existiu foram, simplesmente, diferentes leituras de uma situação de facto, pelo EUIPO e pelo INPI, ao analisar as marcas sub judice — o que acontece todos os dias, sem que alguém se lembre de vir brandir a Constituição da República e o Tratado de Lisboa por causa disso…
XXXVIII. Ao contrário do que sustenta o Apelante, o art.º 249.º, n.º 2, al. d) do novo CPI (que nem sequer se aplica a esta lide) configura uma situação inversa daquela que se analisa nos autos: não está em causa saber se a denominação social do Apelado viola ou não o direito de marcas do Apelante; mas sim saber se a marca registanda colide com as marcas prioritárias do Apelante.
XXXIX. A referência feita na sentença recorrida à firma do Apelado — “Banco BIC Português, S.A.” — visou apenas demonstrar a irrazoabilidade da pretensão do Apelante, de impedir completamente o uso do vocábulo BIC, na actividade do Apelado.
XL. Na verdade, tendo naufragado o pedido de anulação da firma do Apelado (no âmbito do Proc. n.º 185/13.6YHLSB), este continua a denominar-se “Banco BIC Português, S.A.”, tendo transitado em julgado a sentença que julgou improcedente esse pedido de anulação.
XLI. Não sendo a marca registanda confundível com as marcas do Apelante — como bem se entendeu na sentença recorrida — não há qualquer fundamento para invocar aqui concorrência desleal.
XLII. De resto, como resulta do Estudo de Mercado elaborado pela DYM (e junto com a contestação da reclamação perante o INPI), o Banco BIC Português, SA tem uma dimensão e uma notoriedade substancialmente superiores às do Banco BIG, SA, pelo que nunca teria qualquer vantagem e confundir-se com este, antes pelo contrário.
XLIII. O Apelante tenta tresler as conclusões do estudo da DYM, para tentar concluir o oposto do que esse estudo especializado concluiu:
O nível de confusão fonética e visual entre as marcas é baixo e não se destaca dentro do sector bancário.
Entre as pessoas mais afastadas do “conhecimento anterior" associado às marcas, este nível de confusão é inferior.
XLIV. O estudo de mercado da MARKTEST, apresentado pelo Apelante, mostra-se completamente enviesado — com resultados “à vontade do freguês” — partindo de pressupostos errados e revelando grande desconhecimento de Direito de Marcas, por parte dos seus autores, como mais detalhadamente se explica nas precedentes contra-alegações.
XLV. Esse questionário tem uma sequência de perguntas claramente indutora das respostas, formulando perguntas irrelevantes — para efeitos de Direito de Marcas — pois a confundibilidade dos sinais é uma questão jurídica, uma conclusão a extrair pelos Juízes e pelos Examinadores, não tendo qualquer interesse saber se um consumidor tem a opinião de que duas marcas são confundíveis, mas antes saber se ele corre o risco de as confundir (independentemente da opinião que tenha).
XLVI. Assim, este estudo, em vez de apurar factos (por exemplo, se os consumidores atribuem erradamente a mesma origem empresarial aos serviços assinalados com as marcas em confronto, como indaga o estudo da DYM), pede-lhes para fazerem juízos de valor, e isto depois de já os ter condicionado e influenciado das mais diversas maneiras, num exemplo flagrante de desonestidade intelectual.
XLVII. Os episódios de alegada confusão narrados pelo Apelante, além de não estarem provados, não assumem a menor relevância para a decisão deste recurso, em que se aprecia, tão só, se um conjunto de sinais distintivos são confundíveis entre si.
XLVIII. Além disso, a forma como terceiros decidem designar o Apelado não pode ser imputável a este, que tem vindo a fazer um enorme investimento publicitário para tornar conhecida a marca “EuroBic” mista, com embondeiro (que é profusamente difundida na TV, nos jogos da 1§ Liga, em outdoors, etc.).
XLIX. De qualquer modo, mesmo que os episódios relatados na PI fossem verdadeiros, sempre seriam insusceptíveis de demonstrar a confundibilidade da marca registanda, dado que tais confusões (a existirem) teriam tido por objecto, não a marca, mas sim a denominação social do Apelante (Banco BIC Português, SA).
L. A ser verdade o alegado, as pessoas teriam confundido as instituições, e as suas denominações, e não as marcas de serviço que cada uma delas usa — pelo que, além de não provada, essa matéria deve ser pura e simplesmente ignorada.
LI. Sendo assim, é forçoso concluir que não existe — entre as marcas em confronto — um risco significativo de confusão ou de associação, e muito menos o risco de que a semelhança entre elas “induza facilmente o consumidor em erro ou confusão” — conforme exige o legislador [art.º 245º/1/c) do CPI].
LII. Persistindo o Apelante em acusar o Apelado de ter registado a sua marca de má-fé, esquece não só que tal fundamento de recusa não existia na lei aplicável a este pedido de registo, mas também, como refere a sentença recorrida, que “nada disso resulta dos autos", baseando-se o Apelante em “meras conjeturas (...) sem suporte factual que tivesse sustentado tal afirmação".
LIII. Não merece, pois, qualquer censura a douta sentença recorrida, que deverá ser integralmente confirmada.
LIV. Pelo que, julgando improcedente a apelação e mantendo o despacho de concessão da marca n.º 594424, far-se-á JUSTIÇA.
O recurso foi admitido e os autos subiram a este Tribunal tendo ido a vistos e a julgamento.
Cumpre decidir.
Porque foi impugnada a matéria de facto iremos aqui transcrever aquela que foi dada como assente na 1ª instância e a respectiva fundamentação.
Assim:
“Com interesse para a decisão da causa, tendo em conta os documentos juntos, têm-se como assentes os seguintes factos:
a) A recorrente é titular das seguintes marcas:
- marca nacional nº 516848 «BANCO BIG», pedida em 25/07/2013 e concedida em 15/10/2013, para assinalar na classe 36 da Classificação Internacional de Nice «negócios financeiros».
- marca nacional nº 446934 «BANCO BIG», pedida em 30/03/2009 e concedida em 29/06/2009 para assinalar na classe 36 da Classificação Internacional de Nice « administração de bens imobiliários; administração de fortunas; administração de imóveis; agências de crédito; aluguer (crédito por -); aluguer de longa duração; alugueres (cobrança de -); análise financeira; avaliações financeiras [seguros,bancos, imobiliário]; bancários (negócios -); banco directo [home-banking]; bens imobiliários (gerência [administração] de - ); bolsa (corretagem na -); bolsa (cotações na -); câmbios (operações de -); capitais (constituição de -); capitais (investimento de -); cartões de crédito (serviços de -); cartões de débito (serviços de -); cauções[garantias]; cheques de viagem (emissão de -); cheques (verificação de -); cobrança de alugueres; cofres-fortes (depósitos em -); colocação de fundos; compensação(operações de -) [câmbio]; constituição de capitais; consultadoria financeira; corretagem na bolsa; cotações na bolsa; crédito; crédito por aluguer; depósito de valores; depósitos em cofres-fortes; emissão de cartões de crédito; emissão de cheques de viagem; emissão de ordens de pagamento de valores; empréstimos[finanças]; empréstimos sobre penhores; fiduciários (serviços - ); financeira(consultadoria -); financeiras (avaliações -) [seguros, bancos, imobiliário]; financeiras(informações -); financeiros (negócios -); financiamento (serviços de -); fortunas(administração de -); fundos (colocação de -); fundos (constituição de -); fundos(transferência electrónica de -); garantias [cauções]; garantias (empréstimos com-); gerência [administração] de bens imobiliários; imobiliários (administração de bens-); imóveis (administração de -); informações financeiras; investimento de capitais; negócios financeiros; operações de câmbios; operações financeiras; ordens de pagamento de valores (emissão de -); patrocínio financeiro; penhores (empréstimos sobre -); poupança [economias]; transações financeiras; transferência electrónica de fundos; valores (depósito de -); verificação de cheques; viagem (emissão de cheques de -) ».
marca nacional nº512902, pedida em 17/04/2013 e concedida em 28/08/2015, para assinalar na classe 36 da Classificação Internacional de Nice, os seguintes produtos e serviços «administração de imóveis; gestão de imobiliário e da habitação; administração de imóveis; gestão de imóveis; agências de crédito; serviços de financiamento aluguer-compra [leasing]; cobrança de alugueres; análise financeira; avaliações financeiras [seguros, bancos, imobiliário]; negócios bancários; banco direto[home-banking]; corretagem; cotações na bolsa; operações de câmbios; constituição de capitais; investimento de capitais; serviços de cartões de crédito; serviços de cartões de débito; garantias [cauções]; emissão de cheques de viagem; verificação de cheques; depósitos em cofres-fortes; colocação de fundos; operações de compensação [câmbio]; consultadoria financeira; depósito de valores; emissão de cartões de crédito; emissão de cheques de viagem; emissão de ordens de pagamento de valores; empréstimos [finanças]; empréstimos sobre penhores; serviços fiduciários; informações financeiras; negócios bancários; serviços de financiamento; transferência eletrónica de fundos; investimento de capitais; fornecimento de informação relacionada com negócios financeiros e monetários; operações financeiras, monetárias e imobiliárias; patrocínio financeiro; gestão de patrimónios; serviços de poupanças bancárias». 
- marca da União Europeia nº 004949871 pedida em 09/03/2006 e concedida em 29/11/2007 para assinalar na classe 36 os seguintes produtos e serviços da Classificação Internacional de Nice: «Seguros; negócios financeiros; negócios monetários; negócios imobiliários.»
- marca da União Europeia nº 014016547 , pedida em 29/04/2015 e concedida em 17/08/2015 para assinalar nas classes e 36 os seguintes produtos e serviços da Classificação Internacional de Nice: « 9 - Cartões de crédito. 36 - Fornecimento de cartões de pré-pago e títulos de valor; Serviços de seguros; Serviços financeiros, monetários, bancários; Serviços de avaliações financeiras; Serviços imobiliários; Administração de imóveis; Administração de negócios financeiros relacionados com bens imobiliários; Empréstimo de títulos; Empréstimos sobre penhores; Serviços de empréstimo e crédito, e de financiamento; Serviços de financiamento e fundos; Serviços de informação, dados, aconselhamento e consultoria financeiros; Serviços de investimento; Transferências e transações financeiras e serviços de pagamento; Troca de moeda e serviços de câmbio; Administração de negócios financeiros; Administração de operações de depósito; Administração financeira; Subscrição financeira e emissão de títulos (serviços bancários de investimento); Aquisição para investimento financeiro; Corretagem de fundos de investimento; Custódia de investimentos; Financiamento de investimentos; Gestão de ativos de investimento; Gestão de carteiras; Gestão de carteiras financeiras; Investimento através de meios eletrónicos; Desenvolvimento de carteiras de investimento; Serviços de cartões; Serviços de ordem de dinheiro, cheque e numerário; Emissão de letras de crédito e certificados de depósito; Organização de transferências monetárias; Serviços bancários para o pagamento de faturas através do telefone; Serviços bancários relacionados com a transferência de fundos a partir de contas bancárias; Serviços bancários relacionados com a transferência electrónica de fundos; Serviços de débito direto; Serviços de transação financeira; Serviços de transferência de dinheiro; Serviços financeiros relacionados com o levantamento e depósito de dinheiro; Serviços para execução de transações financeiras; Serviços de pagamento financeiro; Emissão de cartões de valor armazenado; Emissão de cheques de viagem; Emissão de cheques de viagem e de letras de crédito; Emissão de cheques de viagem e vales de divisas; Emissão de ordens de pagamento de valores; Corretagem; Seguros; Negócios monetários; Banco direto (homebanking); Gestão de investimento imobiliário; Serviços de crédito; Concessão de crédito; Serviços de financiamento; Análise financeira; Negócios bancários; Cotações na bolsa; Operações de câmbios; Constituição de capitais; Investimento de capitais; Serviços de cartões de crédito e de cartões de débito; Garantias [cauções]; Verificação de cheques; Operações de compensação [câmbio]; Consultadoria financeira; Depósito de valores; Emissão de cartões de crédito e de débito; Empréstimos [financiamento]; Serviços fiduciários; Informações financeiras; Transferência electrónica de fundos».
b) A recorrida pediu em 11/01/2018 o registo da marca nº 594424 para assinalar os seguintes produtos e serviços assinalados nas classes 9, 16, 35, 36 e 38 da Classificação Internacional de Nice:
«9- cartões magnéticos de crédito e de débito e cartões magnéticos para operações bancárias; software de comunicação para permitir que os clientes acedam a informações da conta bancária e realizem operações bancárias. 16 - papel e cartão relacionados com a atividade financeira e não compreendidos noutras classes; produtos de impressão; cartões de crédito sem serem magnéticos; impressos designadamente cartões para utilização em transações bancárias; revistas; publicações periódicas. 35 - serviços de publicidade sobre negócios financeiros e bancários; administração no campo da atividade comercial. 36 - seguros; negócios monetários; negócios imobiliários; serviços financeiros incluindo os prestados através da internet ou outro meio de telecomunicação; negócios bancários; serviços de informação e aconselhamento sobre negócios financeiros e bancários. 38 - serviços de telecomunicações e transmissão eletrónica relacionados com a área financeira.».
c) O recorrente apresentou reclamação contra este pedido de registo e o recorrido respondeu.
d) Por despacho do INPI de 22/03/2019, foi deferido o registo da marca recorrida n.º 594424.
e) Por decisão proferida nos autos nºs 185/13.6YHLSB as marcas do recorrido nºs 500559 e 26887 “BANCO BIC” foram anuladas, tendo tal decisão, nessa parte, sido confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
*
Não se deu relevo aos estudos de mercado nem ao parecer fonético juntos pelo recorrente, pois os mesmos não vinculam o tribunal, sendo que esse parecer respeitava ao sinal Banco BIC.
Igualmente não se considerou o rol de testemunhas apresentado pelo recorrente, pois neste tipo de processos não há lugar a prova testemunhal, conforme decorre do art. 43º, 3, do Novo CPI (anterior 44º,3).
***
II - Das questões a decidir
Considerando as questões colocadas no recurso, a necessidade de as colocar em ordem preclusiva de decisão são as seguintes as questões a conhecer:
a) A omissão de pronúncia quanto à competência para apreciar a anulabilidade do despacho do INPI;
b) A omissão de pronuncia quanto à valia dos meios de prova apresentados pelo recorrente;
c) A nulidade da decisão nos termos das alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC por se omitir na Decisão Recorrida qualquer explicação para não ter incluído os factos alegados pelo Recorrente no elenco dos «Factos Provados» e, bem assim, ao omitir, por completo, a identificação dos factos «não provados» e quais as razões que sustentaram tal "resposta à matéria de facto";
d) A impugnação da matéria de facto, nomeadamente a necessidade de dar como provado os factos descritos nos artigos 80º, 140º, 161º, 171º a 174º, 177º a 179º, 182.º a 201.º, 206º a 208º e 212º a 215º da petição do Recorrente e no ponto III i);
e) A possibilidade e necessidade de conhecimento do reenvio prejudicial
f) Conhecer da confundabilidade das marcas em presença;
g) Conhecer da inconstitucionalidade material do disposto na alínea b) do n.º 1, do artigo 232.º e da alínea c), do n.º 1, do artigo 238.º, do CPI, na interpretação realizada na decisão recorrida;
h) Conhecer da má-fé do recorrido;
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III - Enquadramento jurídico
Nos termos do disposto no art.º 663º nº 2 do C.P.C. “O acórdão principia pelo relatório, em que se enunciam sucintamente as questões a decidir no recurso, expõe de seguida os fundamentos e conclui pela decisão, observando-se, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 607.º a 612.º.”
As duas primeiras questões a abordar, por respeitarem a matéria de nulidades, prendem-se com as invocadas omissões de pronúncia.
Como se salientou no Ac. do STJ de 03.10.2017 (revista n.º 2200/10.6TVLSB.P1.S1 - 1.ª Secção, in Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, www.stj.pt ) “I - As causas de nulidade de sentença (ou de outra decisão), taxativamente enumeradas no art.º 615.º do CPC, visam o erro na construção do silogismo judiciário e não o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão ou a não conformidade dela com o direito aplicável. II - A nulidade consistente na omissão de pronúncia ou no desrespeito pelo objecto do recurso, em directa conexão com os comandos ínsitos nos art.ºs 608.º e 609.º do CPC, só se verifica quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões ou pretensões que devesse apreciar e cuja apreciação lhe foi colocada. III - A expressão «questões» prende-se com as pretensões que os litigantes submetem à apreciação do tribunal e as respectivas causas de pedir e não se confunde com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os fundamentos, os motivos, os juízos de valor ou os pressupostos em que as partes fundam a sua posição na controvérsia. IV - É em face do objecto da acção, do conteúdo da decisão impugnada e das conclusões da alegação do recorrente que se determinam as questões concretas controversas que importa resolver”
Ora o recorrente refere existir omissão de pronúncia quanto à competência para apreciar a anulabilidade do despacho do INPI mas não tem, claramente razão.
Como se refere no sumário transcrito “Não padece de nulidade por omissão de pronúncia o acórdão reclamado que conheceu de todas as questões que devia conhecer, resolvendo-as, ainda que a descontento da recorrente/reclamante.”
A questão da competência foi, efectivamente, suscitada. E foi, igualmente, conhecida, ainda que a descontento do recorrente. Na verdade, pode ler-se na decisão recorrida: “No que respeita ao argumento da incompetência em razão da hierarquia que o recorrente refere no seu recurso, nada nos autos indicia que tenha ocorrido alguma incompetência a nível interno do INPI nos termos do que dispõe o art.º 151º,1, a), do CPA.
Por outro lado, nunca seria este o Tribunal competente em razão da matéria para dessa incompetência conhecer, mas sim o Tribunal Administrativo.
Também inexiste qualquer falta de fundamentação na decisão proferida pelo INPI, pois a sua decisão aborda as questões levantadas pelas partes e após ponderação de tais argumentos e análise dos factos em causa concluiu pela inexistência de confusão das marcas e admitiu o registo da marca do recorrido - Banco BIC Português, SA.
Mas, mais, também não competiria a este tribunal anular uma decisão do INPI por falta de fundamentação.
É que nos termos do disposto no art.º 38º do Novo CPI (anterior 39º), «Cabe recurso, de plena jurisdição, para o tribunal competente das decisões do Instituto Nacional da Propriedade Intelectual:
a) Que concedam ou recusem direitos de propriedade industrial;
b) Relativos a transmissões, licenças, declarações de caducidade ou a quaisquer outros actos que afectem, modifiquem ou extingam direitos de propriedade industrial»
Ou seja, o recurso de plena jurisdição implica que este Tribunal tenha de apreciar a legalidade das decisões do INPI em face do que vem disposto sobre os direitos de propriedade industrial, procedendo à confirmação e/ou revogação das mesmas, no âmbito do disposto no artigo 38.º do Novo CPI (anterior 39º). Mas, não implica que aprecie questões de mera legalidade, em que o tribunal se limita a declarar a invalidade do acto impugnado. Aí, a competência caberá aos Tribunais Administrativos, pois trata-se de sindicar um acto administrativo, através de recurso contencioso de anulação.”
Não deixou, pois, o Tribunal de se pronunciar sobre a questão.
Improcede o recurso nesta parte.
O recorrente insurge-se também contra o facto de se omitir na decisão recorrida qualquer explicação para não ter incluído os factos alegados pelo Recorrente no elenco dos «Factos Provados» e, bem assim, ao omitir, por completo, a identificação dos factos «não provados» e quais as razões que sustentaram tal "resposta à matéria de facto".
Dispõe o art.º 607º nº 4 do C.P.C. que “Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.”
A Lei impõe ao juiz que tome posição directa sobre a factualidade especificando os factos provados e não provados. Compreende-se que assim seja. Ao especificar os factos provados e não provados o juiz leva a cabo um exercício interior que se traduz em considerar todos os factos alegados. Externamente a afirmação dos factos provados e não provados (e a sua fundamentação) permitem aos destinatários da sentença compreender e sindicar (se necessário) o que é que o juiz teve em consideração.
Tal é a relevância destas afirmações que nos termos do disposto no art.º 615º nº 1 al. b) do C.P.C. que “É nula a sentença quando: (…) b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”
Há nulidade (no sentido de invalidade, usado pela lei) quando falte em absoluto a indicação dos fundamentos de facto ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão (ac. do STJ de 17.10.90, Roberto Valente, AJ, 12, p. 20: constitui nulidade a falta de discriminação dos factos provados). Não a constitui a mera deficiência de fundamentação (ac. do TRP de 6.1.94, CJ, 1994, I. p 197)
Relativamente à falta de fundamentação de facto, diga-se que, integrando a sentença tanto a decisão sobre a matéria de facto como a fundamentação dessa decisão (art.º 607º, nº3 e 4), “deve considerar-se que a nulidade consagrada na alínea b), do nº1 (falta de especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão) apenas se reporta à primeira, sendo à segunda, diversamente, aplicável o regime do art.º 662, nºs 2-d e 3, alíneas b) e d) (ac. do TRP de 5.3.2015, www.dgsi.pt. proc.1644/11, e Ac. do TRP de 29.6.2015, www.dgsi.pt. proc 839/13).
Ora, no nosso caso, os factos não provados foram, simplesmente, omitidos. Nada se diz quanto aos mesmos. É verdade que no início da fundamentação se diz que “com interesse para a decisão da causa” se prova … Tal afirmação pressupõe uma seriação de factos mas que factos? Tudo o alegado por quem quer que seja está provado? Então e os factos alegados pelo recorrente, designadamente os constantes dos art.ºs 80º, 140º, 161º, 171º a 174º, 177º a 179º, 182.º a 201.º, 206º a 208º e 212º a 215º da sua petição não são mencionados porquê? Não interessam porquê? E se poderiam interessar mas não estão provados então porque não constam do elenco dos factos não provados (elenco, aliás, inexistente).
Sendo nula a decisão, como é, por falta de menção dos factos não provados, não há que conhecer dos demais fundamentos invocados no recurso (ut art.º 608º nº 2 ex-vi artº 663º nº 2, ambos do C.P.C.), havendo apenas que ordenar a baixa dos autos à primeira instância a fim de ser proferida nova decisão que supra a nulidade.
As demais questões suscitadas mostram-se, consequentemente, prejudicadas.
*
IV - Dispositivo
Por todo o exposto, acorda-se nesta Secção de Propriedade Industrial, Concorrência, Supervisão e Regulação do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar provido o recurso interposto e, consequentemente julgar nula a sentença proferida devendo a mesma ser substituída por outra que supra a apontada nulidade.
Sem custas.
Notifique

Acórdão elaborado pelo 1º signatário em processador de texto que o reviu integralmente sendo assinado pelo próprio e pelos Venerandos Juízes Adjuntos

Lisboa e Tribunal da Relação, 26 de Maio de 2020
Rui Miguel de Castro Ferreira Teixeira
Carlos M.G. de Melo Marinho
Ana Isabel Pessoa