INEPTIDÃO DA PETIÇÃO
FALTA DE CAUSA DE PEDIR
PEDIDO GENÉRICO
CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO
SANAÇÃO DO VÍCIO
Sumário

I – A petição será inepta por falta de causa pedir, quando ocorre uma omissão do seu núcleo essencial, ou seja, quando não tenham sido indicados os factos que constituem o núcleo essencial dos factos integrantes da previsão das normas de direito substantivo que justificam a concessão do direito em causa; haverá ineptidão da petição inicial por ininteligibilidade de causa de pedir, quando a exposição dos factos é feita de modo confuso, ambíguo ou ininteligível, de tal forma que não seja possível apreender com segurança a causa de pedir.
II – O convite ao aperfeiçoamento só se justifica para completar o que é insuficiente ou corrigir o que é impreciso, na certeza de que a causa de pedir existe (na petição) e é percetível (inteligível); apenas sucede que não foram alegados todos os elementos fácticos que a integram, ou foram-no em termos pouco precisos.
III – O despacho de aperfeiçoamento não tem como fim permitir à parte apresentar um novo quadro fáctico que não existia ou não era percetível, restrição imposta, aliás, pelo nº 6 do artº 590º do  CPC.
IV – Numa ação em que o A. demanda o Estado Português, com base em responsabilidade extracontratual por erro judiciário, referindo que o erro ocorreu na determinação do valor máximo de venda do valor das ações que pretendeu alienar potestativamente, abatendo aos capitais próprios o valor das imparidades, não o devendo fazer, o que se refletiu no valor médio de compra das ações, prejudicando-o na quantia de   31. 396,83, efetuando os cálculos na petição inicial, o A. identifica o erro cometido, pelo que não há falta de causa de pedir por falta de indicação do erro, elemento essencial da causa de pedir.
V – Se o A. não quantifica os danos patrimoniais que reclama com o processo 5100/19, mas diz quais são e não quantifica os danos morais, deve ser proferido despacho de aperfeiçoamento, convidando-o a indicar os danos patrimoniais e morais.
VI – A dedução de pedido genérico fora do condicionalismo legal, reconduz-se a uma exceção dilatória inominada. Mas, tratando-se de vício suscetível de sanação, o efeito de absolvição da instância (artº 278º, nº 1, alínea e)) deve ficar reservado para os casos em que o autor não proceda à reformulação do pedido, na sequência do convite para tal.
(Sumário elaborado pela Relatora)

Texto Integral

Processo 869/22.8T8CBR.C1

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I – Relatório

AA intentou a presente ação contra o Estado Português,  pedindo que «seja o Estado condenado a pagar indemnização ao autor;

“A. Todos os custos com as taxas de justiças, honorários advocatícios e eventuais custas de parte que incorreu e venha ainda a incorrer com o processo 5100/19.... a apurar a posteriori, em sede de execução de sentença e na proporção do erro judiciário verificado no dito processo que ditou o seu decaimento na ação;

B. Todos os danos patrimoniais que resultarem da impossibilidade de alienar potestativamente os valores mobiliários de que é titular ao preço justo, nomeadamente € 31.396,83 no artigo 14 supra;

C. Pelos danos não patrimoniais que resultaram da violação do direito a um processo equitativo perante por parte do tribunal supra identificado e pela razões supra mencionadas, a apurar à posteriori, em sede de execução de sentença. “

            Pediu ainda:

Deve ainda ser revogada a decisão considerada violadora do direito comunitário e da CEDH, nos termos do artigo 13 (2) da Lei 67/2007, convelindo, necessariamente, a confiança, certeza e a jurídicas inerentes ao caso jugado – que embora sendo valores imanentes do ordenamento jurídico interno e também comunitário devem ser abalados perante a violação do Direito da União Europeia cometida pelo tribunal nacional supra identificado, uma vez que não existe outra hipótese de recurso; abalamento esse que é perfeitamente tolerado pela CRP [na dimensão, por exemplo, da uniformização de jurisprudência – vide artigo 688 (1) do CPC] respeitante ao recurso e mesmo até na sua máxima amplitude)».

Para tanto, e em síntese, o Autor alegou que, no âmbito do processo n.º 5100/19...., que correu termos no Juízo de Comércio ... – Juiz ..., no  qual foi Autor, foi cometido um erro judiciário. No referido processo pediu que lhe fosse reconhecido o direito de alienação potestativa dos valores representativos do capital da sociedade A..., S.A., que detinha, nos termos e para os efeitos conjugados nos números 5 e 6, ambos do artigo 490.º, do CSM, e que a ali ré fosse condenada a pagar-lhe o justo valor por esses valores mobiliários.

Com a presente ação pretende ser indemnizado pelos danos decorrentes do erro.

Citado o Ministério Público, foi apresentada contestação, na qual, além do mais, invocou a ineptidão da petição inicial, com base em dois fundamentos:

1. falta de alegação dos factos que constituem e que caracterizam o erro manifesto e/ou um erro grosseiro (artigos 20.º e seguintes da contestação);

2. falta de alegação de factos que demonstrem que a interpretação feita pelo Tribunal configura um erro manifesto ou grosseiro à luz do direito comunitário contido nos artigos 6.º, n.º 1, 13.º e 14.º, da CEDH, e 47.º, n.º 2, da CDFUE (artigos 36.º e seguintes da contestação).

O A. foi notificado para, querendo, se pronunciar relativamente à matéria de exceção, não o tendo feito.

Foi proferido despacho saneador/sentença que julgou inepta a petição inicial e, consequentemente, absolveu o réu da instância.

O A. não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, concluindo as suas alegações do seguinte modo:

1. O autor, ora apelante, notificado da douta decisão proferida nos presentes autos e não se conformando com a mesma, vem interpor RECURSO DE APELAÇÃO, sobre a matéria de direito, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 627, 629 (1), 631, 637, 639, 644 (1,a) e 647 (1), todos do CPC.

2. Da decisão ora recorrida e apenas para o que aqui interessa, o tribunal a quo decidiu julgar: verificada a exceção dilatória de ineptidão inicial, pelo que, em consequência, se absolve o réu da instância.

3. Por muito respeito que mereça o vertido na decisão a quo, com a mesma não se pode concordar e por isso se recorre com os fundamentos de facto e de direito apresentados no §3 que aqui se dão como reproduzidos, mas que infra iremos sumariamente concluir.

4. Ressalvado o devido respeito, que é o maior, a Meritíssima Juíza recorrida decidiu mal, não avaliando convenientemente o caso sub judice quanto à matéria de direito.

5. O objeto do litígio é o que se alude no § 1.3. supra, para onde se remete e aqui se dá como integralmente reproduzido, evitando sermos fastidiosos a repetir o já supra exaustivamente mencionado.

6. Mas que de forma tanto quanto resumida possível se circunscreve ao pedido do autor para que o réu, o Estado Português, seja condenado pelo erro judiciário cometido no processo 5100/19...., com devidas consequências legais, incluindo respetivas indemnizações tal como peticionado.

7. As questões a resolver circunscrevem-se a todas que estão vertidas no §1.4 supra, para onde se remete dando aqui como integralmente reproduzidas, evitando uma mera repetição das mesmas, mas que em jeito de conclusão é apenas saber se:

a. o tribunal a quo podia decidir verificada a exceção dilatória de ineptidão inicial e, em consequência, absolver o réu da instância, sem realizar audiência prévia que permitisse ao autor responder a tal exceção, uma vez que antes não o tinha feito;

b. se a petição inicial é inepta, nas circunstâncias de direito explicadas em §3.3 supra, para onde se remete para a sua completa compreensão.

8. Não foram dados provados ou não provados nenhuns factos, tendo sido apenas apreciados os factos alegados pelo autor.

9. O alegado pelo autor, aqui recorrente, são os que constam na petição inicial e que se resumem aos factos depurados, ao que aqui importa, no

§2 supra, para onde se remete, dando-os aqui como reproduzidos porque questão de proficiência, evitando aqui a sua mera reprodução mecânica.

10. Pelas razões de direito apresentadas no § 3 supra, o apelante, muito respeitosamente, discorda do entendimento do Tribunal a quo, mas que em resumo entende que:

a. a falta de convocação da audiência prévia em estrito cumprimento com o artigo 591 (1, b), do CPC, consubstancia numa irregularidade que, podendo influir no exame ou na decisão da causa, tal como se demonstrou ter influído, [cf. Artigo 195 (1), do CPC] acarreta a nulidade processual, pois foi praticado um ato que a lei não admite (dispensa da audiência prévia quando tal não era legalmente admissível), porque, a contrário, a exige;

b. estando na petição inicial alegados os factos que integram o núcleo essencial da causa de pedir de forma inteligível e sem necessidade de mais densificação ou uma concretização mais depurada em algum aspeto ou nalguma vertente em que a pretensão tem estribo e que não existe contradição entre a causa de pedir e o pedido, a petição inicial não é inepta;

c. tendo a ré contestado a pretensão do autor, designadamente por impugnação e concretizando, de forma especificada, os artigos a impugnar, tem de se ter que terá interpretado conveniente a petição inicial, e por isso a exceção dilatória de ineptidão inicial com o fundamento substancial do artigo 186 (2, a) do CPC, terá de sucumbir perante o disposto no artigo 186 (3) do CPC.

d. por sua vez, o artigo 186 (2, b) do CPC, que seria a frincha da porta para escapar ao disposto no número seguinte do mesmo [artigo 186 (3), do CPC], assenta na contradição do pedido com a causa de pedir, o que de forma alguma acontece e nem a ré o sustentou.

11. Perante estes motivos de facto e de direito, nunca podia a exceção dilatória de nulidade de todo o processado, por ineptidão da petição inicial, suscitada pela ré, ser procedente e muito menos no arco que a sentença recorrida lhe concedeu [artigo 186, 1 e 2 (a), do CPC].

§5 Pedido

Termos, em que deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, ser a sentença julgada nula pelo vício supra referido e ser considerada improcedente a exceção dilatória de ineptidão da petição inicial, com as demais legais consequências, pois que só se assim se permitirá que se faça a imposta e devida justiça.

Destarte, deve ser mandada prosseguir a ação na primeira instância e, se assim Vossas Excelências entenderem que seja a nula a decisão proferida com as legais consequências, nomeadamente para que seja realizada a audiência prévia nos termos previstos na lei.

§6 Valor da causa

A causa tem o valor atribuído na sentença.

O R. contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:

(…).

II – Objeto do recurso

De acordo com as conclusões da apelação que delimitam o objeto do recurso, as questões a conhecer são as seguintes:

.se o tribunal a quo podia decidir pela procedência da exceção dilatória de ineptidão da petição inicial e, em consequência, absolver o réu da instância, sem realizar audiência prévia que permitisse ao autor responder a tal exceção; e,

            . caso se considere não ser necessária a audiência prévia, se a petição inicial é inepta por falta de causa de pedir.

III – Fundamentação

A situação factual é a supra mencionada.

Da falta de convocação da audiência prévia

Entende o apelante que o tribunal deveria ter convocado uma audiência prévia a fim de serem discutidas as exceções, pois não estava obrigado a pronunciar-se antes desse momento, em obediência ao disposto no artº 591º, nº 1, alínea b) do CPC, o que configura uma nulidade processual.

No Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, a regra passou a ser a obrigatoriedade da realização de audiência prévia, agora prevista no artº 591º do CPC., nomeadamente quando o juiz “tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa.” (nº1 b).

Nos preceitos seguintes, mormente nos artºs 592º e 593º do CPC, estipulam-se as exceções à regra acima prevista.

O artigo 592º do CPC estabelece os casos em que a audiência prévia não deve ter lugar: nas ações não contestadas que tenham prosseguido em obediência ao disposto nas alíneas b) a d) do artº 568º do CPC e quando o processo deva findar no saneador pela procedência de uma exceção dilatória já debatida nos articulados (alíneas a) e b) do nº 1).

E o artigo 593º do CPC estabelece os casos em que a audiência prévia pode ser dispensada: quando esta se destina apenas aos fins indicados nas alíneas d), e) e f) do nº 1 do artº 591º do CPC.

É certo que o artº 591º, nº 1, alínea b) do CPC estabelece a convocação de uma audiência prévia nos casos em que ao juiz cumpra apreciar exceções dilatórias, como é o caso da ineptidão da petição, ou quando pretenda conhecer imediatamente, no todo ou em parte do mérito da causa. Mas também estabelece no artº 592º, nº 1, alínea b) que a mesma não tem lugar quando o processo vai findar pela procedência de uma exceção dilatória e a questão já foi debatida nos articulados.

Ora, no caso, o apelante foi expressamente notificado para se pronunciar sobre as exceções arguidas na contestação, o que a Mma. Juíza ordenou ao abrigo dos artºs 3º, nº 3,  6º, nº 1 e 547º, todos do CPC e optou por nada dizer. Foi notificado para exercer o contraditório, mas optou por não se pronunciar.

Assim, tendo sido dada a oportunidade à parte de se pronunciar e, face ao disposto no artº 592º, nº 1, alínea b), a audiência prévia não se deve realizar, não tendo sido cometida qualquer nulidade.

            Da alegada falta de causa de pedir

            Na contestação, o R. veio invocar a ineptidão da petição inicial por o A. se ter limitado a  referir que o Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo do Comércio ... – Juiz ..., “errou na apreciação dos pressupostos de facto, cometendo assim um erro grosseiro de facto e concomitantemente um erro judiciário” … “clamoroso, evidente e indiscutível que qualquer cidadão, enquanto bónus pater familiae, rapidamente notaria o quanto absurdo e claramente arbitrária foi a decisão do Juiz ...”, sem apresentar um único facto que permita identificar o alegado erro judiciário. Mais acrescentando que, relativamente a esta matéria, o A. apenas apresenta considerandos normativos e tece conclusões, não concretizando os factos que constituem e que caraterizam um erro manifesto e/ou um erro grosseiro.

            Alegou ainda que, pretendendo o A. afastar a aplicação do artº 13º, nº 2 da Lei 67/2007, de 31 de dezembro ( diploma que aprovou o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas) a qual  é apenas possível, de acordo com a jurisprudência comunitária, se o tribunal que decide em última instância violar o direito comunitário, não alegou factos que demonstrem que a interpretação feita pelo Tribunal configura um erro manifesto ou grosseiro à luz do direito comunitário contido nos artigos 6.º, n.º 1, 13.º e 14.º, da CEDH, e 47.º, n.º 2, da CDFUE (artigos 36.º e seguintes da contestação).

            A decisão recorrida considerou que o A. contextualizou os factos, mas não explicou em que consistiu o erro que imputa à decisão proferida no processo 5100/19..... Nela se escreveu, a propósito: “(…) no que concerne à alegação dos factos, o Autor contextualiza os factos, só que depois não indica especificadamente em que é que, nesse contexto, consistiu o suposto erro judiciário, nem a maioria dos danos que diz ter sofrido em consequência do mesmo. Não basta alegar que determinado Tribunal cometeu um erro, é necessário motivá-lo, apresentando as razões pelas quais o Autor entende que, no plano dos factos e/ou do direito, aquele Tribunal errou. É, igualmente, necessário dizer quais os concretos danos que teve, por exemplo, quais as custas que pagou e qual o valor que, quanto às mesmas, entende ter sido um dano.

É certo que no artigo 8.º da petição inicial, respeitante à motivação que o aqui Autor apresentou para pedir a ampliação do recurso no âmbito do processo n.º 5100/19...., é feita menção àquela que o Autor entende ser a forma de dever ser calculada a participação social vendida ao aí Ré.

Acontece que, por um lado, aquelas alegações são ambíguas quanto à própria classificação de fazem da circunstância de o Tribunal ter optado por uma forma de cálculo diferente daquela que o Autor entende ser de aplicar. Tanto ali se fala de lapso como de erro, sendo que o primeiro claramente não se coaduna com o erro judiciário que, agora, o Autor alega ter ocorrido.

Por outro lado, tratando-se esta de uma ação de responsabilidade civil, com fundamento em erro judiciário, atentos os contornos do caso, mesmo o que consta do artigo 8.º seria insuficiente para compreender o que está em causa, dada a tecnicidade da questão. Assim, mesmo à luz do artigo 8.º da petição inicial seria de considerar ininteligível a causa de pedir, no que diz respeito ao erro judiciário.       

Com efeito, por se tratar de uma questão que reclama conhecimentos de diversas áreas, como o Direito e a Contabilidade, quer para compreender os conceitos em causa, quer para compreender a sua interligação; por ser necessário compreender a origem dos valores de que parte o Autor; por ser necessário o Autor explicar as razões pelas quais considera, no fundo, ser de inverter a ordem da operação realizada pelo Tribunal no apuramento do valor da participação social; por ser percetível que as contas realizadas pelo Autor, como o próprio refere, para alegadamente explicar o que o Tribunal fez nem sequer vão ao encontro do valor fixado pelo Tribunal (artigo 8.º, parágrafo 12, da petição inicial), sempre é de concluir que mesmo a considerar que no artigo 8.º está explicado o que o Autor considera ter sido o erro do Tribunal, há uma ininteligibilidade da causa de pedir. Sendo que, importa, agora, dizê-lo, era ao Autor que competia, trazer para os autos, com a sua alegação, tudo isto.

Por fim, é de referir que, num caso como o dos autos, as falhas apontadas são de tal forma extensas que, no global, é de concluir que a petição inicial é inepta. Se a questão fosse só um dano carecer de concretização, ter-se-ia que lançar mão do convite ao aperfeiçoamento – artigo 590.º, n.º 2, alínea b), e n.º 4, do Código de Processo Civil. Todavia, no caso em apreço, as falhas são de tal forma extensas que está comprometida a própria definição do objeto dos autos, sendo que a sua sanação passaria necessariamente pela apresentação de uma petição inicial praticamente nova.”

           

            O apelante defende que alegou os factos que integram o núcleo essencial da causa de pedir e que tendo o réu contestado e interpretado convenientemente a petição inicial conforme demonstra o seu articulado processual, a arguição de nulidade do processado por ineptidão da petição inicial, não pode ser julgada procedente, em conformidade com o disposto no artº 186º, nº 3 do CPC.  Efetivamente, o ré contestou a pretensão do autor, designadamente por impugnação (cfr. artigos 57 a 59 da contestação) e concretizando de forma especificada os artigos a impugnar (artº 59º).

            Por sua vez, o apelado pugna pela manutenção da decisão recorrida, reiterando os argumentos que invocou na contestação.

            Vejamos:

            O A. que dirige uma pretensão ao tribunal, está obrigado a expor a situação de facto na qual se fundamenta para reclamar a titularidade de um direito que entende ter sido violado e que pretende lhe seja reconhecido. A causa de pedir consiste, em conformidade com o que resulta do artº 581º, nº 4 do CPC,  nos factos concretos da vida a que se virá a reconhecer (ou não) força jurídica bastante e adequada para desencadear os efeitos pretendidos pelo autor. Trata-se do conjunto de factos que integram o núcleo essencial da previsão da norma ou normas do sistema que estatuem o efeito de direito material pretendido. Factos essenciais são, pois, os factos constitutivos do direito alegado que se incluem no quadro fáctico da norma legal em que se apoia a pretensão do autor e que possam servir para a fundamentar, factos estes que o A. tem o ónus de alegar (cfr. se defende no  Ac do TRL de  04/02/2020, proc. 13977/17.8T8LSB.L1-7, acessível em www.dgsi.pt, sítio onde poderão ser consultados todos os acórdãos que venham a ser citados sem indicação da fonte).

Consequentemente, a petição será inepta por falta de causa pedir, quando ocorra uma omissão do seu núcleo essencial, ou seja, quando não tenham sido indicados os factos que constituem o núcleo essencial dos factos integrantes da previsão das normas de direito substantivo que justificam a concessão do direito em causa; haverá ineptidão da petição inicial por ininteligibilidade de causa de pedir, quando a exposição dos factos é feita de modo confuso, ambíguo ou ininteligível, de tal forma que não seja possível apreender com segurança a causa de pedir (cfr. se defende no Ac. do TRL de 13.07.2021, proc. 23205/20.3YIPRT.L1-7).

Quer a doutrina, quer a jurisprudência, têm distinguido entre a situação de uma petição inepta e a situação de uma petição irregular ou deficiente, no sentido de que só a falta ou a ininteligibilidade absolutas do pedido ou da causa de pedir geram ineptidão.

O convite ao aperfeiçoamento (artº 590º, nº 4 do CPC) só se justifica para completar o que é insuficiente ou corrigir o que é impreciso, na certeza de que a causa de pedir existe (na petição) e é percetível (inteligível); apenas sucede que não foram alegados todos os elementos fácticos que a integram, ou foram-no em termos pouco precisos. Daí o convite ao aperfeiçoamento, destinado a completar ou a corrigir um quadro fáctico já traçado nos autos. O despacho de aperfeiçoamento não tem como fim permitir à parte apresentar um novo quadro fáctico que não existia ou não era percetível, restrição imposta, aliás, pelo nº 6 do artº 590º do  CPC (cfr. Ac. do TRL de 13.07.2021 que se tem vindo a seguir).

            O apelante defende que foram alegados os factos que integram o núcleo essencial da causa de pedir, mas não refere quais os artigos em que se mostra efetuada essa alegação.

            No entanto, o apelante sob a epigrafe “factos provados e não provados” transcreve os factos constantes dos artigos 1º, 2º, 4º, 8º,  9º, 13º, 14º, 15 e 16, referindo que são os relevantes para a apreciação do recurso, pelo que se entenderá que o apelante considera que a causa de pedir está suficientemente concretizada nos referidos pontos da matéria de facto.

             Será assim?

            Da petição inicial resulta que o apelante entende que foi cometido um erro na decisão de 1ª instância proferida no processo 5100/19, sentença que foi confirmada pelo tribunal da Relação, no segmento em que estabelece o valor das ações que o apelante detinha no capital social da sociedade A..., S.A. (sociedade detida em mais de 90% pela R. nessa ação, a B..., SGPS,SA) e que pretendeu alienar potestativamente, erro esse que resulta, no entender do apelante,  de uma operação aritmética incorretamente realizada. Diz o apelante que o erro está  perfeitamente explicado, incluindo na petição inicial  quadros exemplificativos onde constam os cálculos matemáticos que efetuou.

           

Na decisão recorrida é afirmado  que o apelante se limita a contextualizar os danos que diz ter tido, mas que não explica em que consistiu esse erro. A petição inicial permite compreender  que se trata de uma ação proposta na sequência da sentença proferida no âmbito do processo n.º 5100/19...., a qual foi confirmada pelo Tribunal da Relação de Coimbra, processo que dizia respeito ao exercício do direito de alienação potestativa dos valores mobiliários representativos de determinada sociedade, pretendendo o A. a fixação do valor da sua participação social no capital social da R..

Mas, diferentemente do que se entendeu na decisão recorrida, o apelante explica como é que, no seu entender, o tribunal errou, no artº 8º da petição inicial.

Na sentença proferida na 1ª instância escreveu-se[1]:

“Porque, como se referiu, as demonstrações financeiras são apenas o ponto de partida da avaliação, devendo ser corrigidas pela identificação dos ativos e passivos não registados no balanço, entendeu a Sra. Perita ser necessário realizar a correção proposta pelos auditores na sua Opinião com Reservas. Ajustado o valor do capital próprio da sociedade pelo valor da imparidade do ativo a receber não registada no balanço, no montante de 31,8 milhões de euros, corrigiu o valor do capital próprio a 31 de dezembro de 2018 para 46,540 milhares de euros. Considerando que o capital social da sociedade é composto por 1.500.000 ações que, valorizadas pelo capital próprio assim corrigido, apresentam um valor por ação de € 31,03, concluiu a Sra. Perita que o valor da carteira de ações detida pelo autor, de 2.500 ações, poderia partir de um valor de cerca de € 77.567,00 (sublinhado nosso).

A Sra. Perita entendeu ainda efetuar um outro ajustamento, resultante do facto de a sociedade deter, na sua estrutura de ativos, um importante imóvel constituído por um edifício que ocupa um quarteirão inteiro numa zona nobre da cidade, o qual alberga a exploração do C.... Estes ativos fixos tangíveis, considerados na contabilidade pelo valor de 13.167 milhares de euros, foram avaliados por peritos avaliadores e independentes e credenciados pela CMVM em valor substancialmente superior ao indicado no balanço, mais precisamente em cerca de 34.400 milhares de euros. Daí que a Sra. Perita tenha procedido ao ajustamento do valor dos ativos constantes no balanço pelo valor de avaliação, o que, conjugado com a correção pela imparidade, determina a correção do valor do capital próprio da sociedade a 31 de dezembro de 2018 para 67.773 milhares de euros (sublinhado nosso).

Logo, valorizadas as ações que compõem o capital da sociedade pelo capital próprio assim corrigido, teremos que cada ação apresenta um valor de € 45,18, pelo que obteremos um valor para a carteira de ações do autor de cerca de € 112,955,00 (sublinhado nosso).

Consequentemente, considerou a Sra. Perita que o valor da empresa se situaria num intervalo de negociações entre os € 67.773,00 e os € 112.955,00 (sublinhado nosso).

(…)

“Tal como salientado pela Sra. Perita no seu relatório, o processo de avaliação de uma empresa é uma função complexa, não apenas pela diversidade de ativos passíveis de avaliação, mas pela necessária incerteza e subjetividade a ela inerente. Daí que a determinação do exato valor das ações de uma sociedade, alcançado de forma segura através de critérios objetivos, seja considerada uma tarefa impossível. No final da avaliação, obtém-se, não propriamente o valor real, mas apenas uma estimativa do valor da empresa, que procura tão só retratar a realidade da empresa avaliada, em geral assumida como ponto de partida de negociação. E, no caso, a Sra. Perita concluiu que o valor real da participação social do autor na Sociedade A..., S.A. se situará num intervalo de negociações entre os € 67.773,00 e os € 112.955,00 - correspondentes, respetivamente, ao capital próprio da sociedade corrigido pela imparidade, como valor mínimo, e ao capital próprio corrigido pela imparidade e pelo ajustamento do valor dos ativos fixos tangíveis, como valor máximo.

Aceitamos como corretas as conclusões da Sra. Perita, pelas razões anteriormente expostas. Assim, não vislumbrando qualquer outro critério para, dentro do intervalo de negociações proposto por esta, fixar o valor concreto da participação, julgamos que este deve ser fixado no ponto intermédio deste intervalo, por ser o que sacrifica de forma equivalente os interesses das partes e, assim, assegura o seu maior equilíbrio possível dos mesmos.

Deste modo, fixar-se-á o valor da participação social do autor em € 90.364,00.”(sublinhado nosso)

De acordo com a sentença, o valor real da participação social do A. no capital social da R. situa-se entre 67.773,00 e 112.955, dividiu-se a diferença entre estes dois valores, por dois e somou-se a diferença obtida ao valor mínimo, obtendo-se a importância de 90.364,00 (112.955,00-67.773,00=45.182,00/2= 22,591,00+67.773,00= 90.364,00).

Resulta do texto da sentença que o tribunal seguiu o laudo da sra. Perita, como refere o apelante,  que estabeleceu um valor mínimo e máximo de venda para as ações de que o A. era titular.

Assim, como consta da sentença recorrida, ao valor dos capitais próprios da sociedade R., constante do balanço de 2018, no montante de 78.340,00, abateu o valor de imparidades a que se faz referência na certificação legal de contas, emitida com reservas, de 31,800 milhares de euros, obtendo assim o valor de 46.540,00, o qual, tendo em conta o nº de ações em que se divide o capital social da sociedade R.  – 1500 000 - e o nº de ações que o A. pretendeu alienar – 2500 – permite atingir um valor mínimo de venda de 77.567,00 (46500,00 : 1500 000 x 2500). Para obter o  valor de venda mais alto, o tribunal, seguindo as operações efetuadas pela sra. Perita,  adicionou ao montante de 46.540 (capitais próprios de 78.340,00, menos o valor das imparidades de 31,800,00) o aumento do valor dos imóveis de 21.233,00, assim atingindo o valor de 67.773,00), o qual dividido pelo número de ações que compõem o capital social da R. (1500 000) e multiplicado pelo nº de ações tituladas pelo A. (2500), perfaz o valor máximo de venda das ações do A. de  112.955,00 (67.773,00 : 1500 000 x 2500).

            Na perspetiva do A. o erro  ocorre na determinação do valor máximo de venda das ações, porque não deveria ter sido deduzido o valor das imparidades, mas apenas adicionado  o valor resultante da valorização dos imóveis,  ao montante de capitais próprios.

            O  A. parte de um valor mínimo de capitais próprios de 46.540,00 (capitais próprios de 78.340,00 – imparidades de 31.800,00), obtendo o valor mínimo de venda das 2500 ações de que era titular de 77.567,00  (46.540,00 : 1500000x2500), como também  consta na sentença, embora o tribunal acabe por considerar apenas o valor de 67.773,00[2], e  depois não adiciona aos 46.540,00, o aumento de valor dos imóveis,  como foi feito na sentença recorrida, mas sim aos capitais próprios constantes do balanço, obtendo o valor de 99.573,00 (78.340,00  + 21.233,00). Desta forma o valor mínimo de vendas das 2500 ações seria 77.567,00, mas o valor máximo seria de 165.955,00 (=78.340,00 + 21.233,00: 1500 000 x 2500).

            À diferença entre o valor mínimo de venda e o valor máximo seria assim de 98.182,00 (165.955,00 – 77.567,00), em vez de 45.182,00 considerados na sentença recorrida, o qual dividido por dois dá 44.194, que adicionado ao valor mínimo de venda – 77.567,00 -  perfaz o valor reclamado pelo A. de 121.763,83.

            O A., em consequência do que considera ter sido um erro na determinação do valor máximo da venda das ações – pressupostos de facto da decisão - reclama a diferença entre o valor que a sentença lhe atribui - 90.364,00 - e a quantia que entende, lhe devia ter sido arbitrada - 121.760,83 -, ou seja, 31 396,83, identificando assim o erro que diz se ter verificado.

            Relativamente à falta de liquidação dos danos patrimoniais (para além dos 31.396,83):

            É verdade que o A. não quantifica todos os danos patrimoniais que reclama com o processo 5100/19, como se refere na decisão recorrida, mas diz quais são : todos os custos com as taxas de justiça, honorários ao advogado e eventuais custas de parte em que incorreu e venha ainda a incorrer com o processo 5100/19 a apurar a posteriori, em sede de execução de sentença e na proporção do erro judiciário invocado.

            O artº 556º do CPC permite que, em determinados casos, a parte formule pedidos genéricos, designadamente, quando o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artº 569º do CC. A dedução de pedido genérico fora do condicionalismo legal, reconduz-se a uma exceção dilatória inominada. Mas, tratando-se de vício suscetível de sanação, o efeito de absolvição da instância (artº 278º, nº 1, alínea e) do CPC) deve ficar reservado para os casos em que o autor não proceda à reformulação do pedido, na sequência do convite para tal (conforme defende Abrantes Geraldes e outros, Código de Processo Civil Anotado, Almedina, 2019-Reimpressão, volume 1º, pág. 618).

            O A. pode deduzir pedido ilíquido, pelo menos, em caso de dúvida, quanto ao apuramento quantitativo  do dano verificado (cfr. defendem José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 4ª edição, Almedina, pág. 509).

            No caso, o A. não explica porque razão não deduziu já pedido líquido, relativamente às despesas efetuadas com a ação 5100/19 que não teria de suportar, não fora o alegado erro, sendo que não se vislumbra razão para tal, uma vez que o acórdão do TRC já foi proferido em 12 de outubro de 2021, pelo que já tinha transitado em julgado à data da interposição da presente ação[3], sendo que a  parte que tem direito a custas de parte teve de remeter  para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução (quando for aplicável), a nota discriminativa e justificativa, até 10 dias  após o trânsito em julgado, sem prejuízo desta poder vir a ser retificada para todos os efeitos legais até 10 dias após a notificação da conta de custas (artº 25º, nº 1 do RCP).

            Cabia, assim,  ao tribunal proferir despacho de aperfeiçoamento, convidando a  parte a indicar os valores concretos ou a explicar porque razão não foram tais valores liquidados (eventualmente por dedução de uma reclamação à nota justificativa e discriminativa de custas de parte).

            Relativamente aos danos morais, o A. invoca no artigo 35º que  “sofreu com todo o comportamento do Estado, nomeadamente, devido à situação de incerteza, angústia, ansiedade, frustração, sentido de falta de justiça e aborrecimentos”.

            Não se nos afigura que estes “estados de alma” tivessem de ser mais concretizados. Mas, se o tribunal recorrido entendia que o alegado era meramente conclusivo, deveria ter suprido tal deficiência com despacho de aperfeiçoamento, recorrendo ainda a este despacho para convidar o A. liquidar os danos não patrimoniais que já sofreu.

            Acresce que face à contestação do R. é possível concluir que este interpretou convenientemente a petição inicial. Efetivamente, apesar de arguir a ineptidão da petição inicial, o R.  não deixou de impugnar os factos alegados pelo A. - artºs 58º e 59º da contestação - (no sentido que a impugnação dos factos pode ser demonstrativa de que o R. compreendeu a petição inicial, o  Ac. do TRE de  25.11.2011, proc. 99/10.TBMTL-E1.)   e arguiu, além da ineptidão da petição inicial por falta de causa de pedir, também o que qualificou como defesa por exceção perentória, a falta de revogação pelo acórdão do TRC da sentença da 1ª instância, faltando, assim, o pressuposto da responsabilidade por factos ilícitos do Estado, constante do artº 13º, nº 2 da Lei 67/2007, numa contestação com 98   artigos e que é demonstrativa de que o R. bem entendeu a pretensão do A. e que o seu direito de defesa não ficou diminuído pela alegada falta de causa de pedir da petição inicial.

           

            Na contestação é seguido o entendimento de que apenas pode ser afastada o pressuposto de prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente, exigido pelo nº 2 do citado artº 13º, quando a decisão proferida em última instância tenha violado norma de direito comunitário, o que o apelante não concretizou e não alegou na petição inicial.

No entender do R.,  o A não alegou quaisquer factos que demonstrem que suscitou a interpretação de uma norma nacional à luz do direito comunitário perante o Tribunal Judicial da Comarca ...- Juízo do Comércio, Juiz ..., nem alegou factos relativos à interpretação efetuada por aquele Tribunal. Assim, não alegou factos que demonstrassem que a interpretação feita pelo Tribunal configura um erro “manifesto” (quando de direito) ou «grosseiro» (quando de facto), na apreciação dos respetivos pressupostos, à luz do direito comunitário contidos nos artigos 6.º n.º 1, 13.º e 14.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem CEDH e 47.º n.º 2 da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (CDFUE), preceitos que invocou na petição inicial.

Mais defendeu que sobre o A. recai o dever de alegar os factos de forma clara, permitindo ao R. perceber quais os factos constitutivos da situação jurídica que pretende fazer valer e qua a sua pretensão. E, para além das normas profusamente citadas pelo A. quanto às garantias de acesso à justiça, Estado de Direito e princípios basilares, não se descortina (por não existirem) quais as normas de direito comunitário que hajam sido violadas no âmbito do Processo n.º 5100/19.... que correu termos no Juízo de Comércio ... - Juiz .... Raciocínio idêntico se elabora quanto ao douto Acórdão que sobre ela recaiu, confirmando-a. Assim, não conseguindo o R alcançar, através dos factos e Direito alegados, o efeito jurídico pretendido pelo A com a presente ação, a presente ação é inepta.

           

            Sobre esta questão a decisão recorrida não se pronunciou.

           

            Efetivamente, o A. na petição inicial da presente ação faz apelo a diversas normas da Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, repetindo-as em diversos momentos ao longo da petição inicial.

Se a invocação de tais  normas vai permitir que se caraterize a atuação do tribunal que decide em última instância como violadora do direito comunitário ou ainda e previamente, se a violação das normas de direito comunitário tinha de ter sido invocada na ação 5100/19 para poder fundamentar a presente ação de responsabilidade sem prévia revogação da decisão danosa, são questões que têm a ver com o mérito da causa e não com a falta de causa de pedir, sendo que presente recurso apenas está em causa apreciar se a petição inicial é inepta por falta de causa de pedir.

            Não se pode dizer que o apelante não invocou a violação do direito comunitário pela decisão final, o que fez no artº 37º da petição inicial, questão diferente é se os preceitos legais invocados são aptos a configurar uma violação do direito comunitário e, em caso afirmativo, se essa violação ocorreu.

            Assim, tendo o apelante concretizado o erro que entende ter existido na sentença proferida na ação 5100/19, e podendo a falta de liquidação dos danos reclamados a título de taxa de justiça, honorários, custas de parte e danos não patrimoniais,  ser corrigida mediante convite ao aperfeiçoamento, não se entende que a petição inicial seja inepta.

            Face ao exposto, entende-se ser de revogar a decisão recorrida, prosseguindo os autos, sendo caso disso, com recurso ao convite para aperfeiçoamento previsto no n.º 3 e 4 do art. 590º do CPC, sem prejuízo de se entender tal convite desnecessário, por se considerar que, por razão diversa da falta de causa de pedir, a ação deve findar no despacho saneador, designadamente pela procedência de outra exceção.

            Sumário:

(…).

            IV - Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em revogar a decisão recorrida, julgando que não se verifica nos autos a nulidade da ineptidão da petição inicial, e determinar a remessa dos autos à primeira instância para que ali prossigam a sua marcha, nos termos expostos.

Sem custas, por a parte vencida (o R.) estar isenta de custas (artº 4º, nº 1, alínea a) do RCP).

Notifique.

Coimbra, 13 de junho de 2023
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[1] Não se transcreveram as notas de rodapé.
[2] Em vez de 77.567,00 como resultaria da própria fundamentação, afigurando-se ter havido uma confusão entre o valor mínimo da venda (77.567,00) e o valor do capital próprio corrigido pelas imparidades e pela atualização do valor dos ativos fixos tangíveis, esse sim no valor de 67,773,00.
[3] A ação foi autuada no tribunal administrativo em 20 de janeiro de 2022, o qual se declarou incompetente em razão da matéria, tendo sido remetida ao tribunal Judicial da Comarca ... – Juízos locais cíveis, ao abrigo do disposto no artº 14º, nº 2 do CPTA.