EXPROPRIAÇÃO
ROL DE TESTEMUNHAS
ALTERAÇÃO DO ROL DE TESTEMUNHAS
PRAZO
Sumário


1. O prazo para alteração ou aditamento do rol de testemunhas previsto no artigo 598.º, n.º 2, do CPC, é de 20 dias antes da data em que se efetiva a realização da audiência de julgamento, mesmo que tenha havido adiamento do julgamento, sem o mesmo se ter iniciado na data primeiramente designada.
2. Ao processo especial de expropriação, aplicam-se subsidiariamente e mutatis mutandis as regras do processo comum previstas no Código de Processo Civil, mormente o disposto no artigo 598.º, n.º 2, do CPC.
3. Como na fase jurisdicional do processo expropriativo não existe propriamente uma diligência designada audiência final ou audiência de discussão e julgamento, como sucede na tramitação do processo comum, o prazo previsto no artigo 598.º, n.º 2, do CPC deve ser contado tendo em consideração a data designada para o início da realização efetiva da produção de prova (diligências instrutórias previstas no artigo 61.º do Código das Expropriações), ressalvada a avaliação.
(Sumário elaborado pela Relatora)

Texto Integral

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Évora

I – RELATÓRIO
SOCIEDADE AGRÍCOLA COVA DAS DONAS, LDª, Expropriada no processo principal, em que é Entidade Expropriante INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A., veio interpor recurso do despacho proferido em 12-12-2022 (Ref.ª 32444289) que decidiu «(…) indeferir a pretendida alteração do rol de testemunhas apresentada pela expropriada, por extemporaneidade.»
O despacho recorrido foi proferido na sequência da seguinte tramitação processual:
Em 13-10-22 (Ref.ª 8069979), no Apenso D, o Tribunal da Relação de Évora proferiu Acórdão que decidiu, para além do mais, que não releva para o presente recurso, o seguinte:
«(…) julgar parcialmente procedente o presente recurso, revogando parcialmente o despacho recorrido, e determinando, em sua substituição, que o tribunal a quo admita a depor sobre a matéria de facto constante nos artigos 10.º a 19.º do requerimento de recurso, as identificadas testemunhas AA, BB e CC (…).»
Em obediência ao determinado no referido aresto, a 1.ª instância proferiu despacho, em 30-11-2022, a designar o dia 13-12-2022 para a inquirição daquelas testemunhas.
Em 09-12-2022, o I. Mandatário da Expropriada veio informar que estava impedido de comparecer na data designada por já ter, na mesma data, outra diligência judicial, mencionado as datas em que estava disponível, após ter conferenciado com o I. Mandatário da Entidade Expropriante e, simultaneamente, prescindiu de uma das testemunhas a inquirir e requereu o aditamento ao rol de três testemunhas, ao abrigo do artigo 598.º, n.º 2, do CPC.

CONCLUSÕES DA APELAÇÃO:
«1ª O Despacho recorrido interpretou incorretamente o art. 598º, nº 2, do CPC porque deste preceito não se pode retirar que o regime aí prescrito só se aplique à primeira marcação da respetiva audiência, não se aplicando já a uma segunda marcação da mesma em caso de adiamento.
De facto, sem qualquer dúvida o critério legal estabelecido nesse preceito é o da realização da audiência e não o da marcação dessa audiência.
Deste modo, porque no nosso caso a audiência não se realizou em 13.12.2022 (nem sequer se iniciou), tendo sido entretanto reagendada para 17.01.2023, não existe qualquer dúvida que o Rol de testemunhas foi alterado nos termos do referido art. 598º, nº 2, do CPC, isto é, 20 dias antes da realização da audiência. Como se viu no nº 6 destas Alegações, é esta interpretação que todos os Acórdãos dos nossos Tribunais superiores sufragam.
O Despacho recorrido interpretou incorretamente o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 17.12.2020 que invoca
A situação analisada e decidida nesse Acórdão tinha os seguintes traços essenciais que aqui relevam: (i) na sequência de um recurso interposto da sentença final que havia sido proferida, o Tribunal ad quem já havia anulado essa sentença e determinado a reabertura da audiência final com objetivos instrutórios específicos; (ii) nos 20 dias antes dessa reabertura da audiência, uma das partes requereu a alteração do rol de testemunhas; (iii) o Acórdão TRE de 17.12.2020 entendeu não ser de admitir a alteração do art. 598º, nº 2, do CPC, dado que “a possibilidade de as partes aditarem ou alterarem o seu rol de testemunhas em tais circunstâncias contenderia com a finalidade da reabertura da audiência final, que é o tribunal a quo proceder a uma alteração “cirúrgica” da decisão anteriormente proferida (…)”.
Deste contexto e decisão podemos seguramente concluir que (i) a situação aí julgada não foi a mesma que aqui se nos depara e que (ii) a ratio legis dessa decisão nada tem que ver com o que aqui se discute, pois, para além do mais, no nosso caso não se verificou a reabertura de uma audiência que já tivesse decorrido.
Assim, a solução aí preconizada (não admissão de aditamento ao rol de testemunhas no caso de reabertura da audiência final com objetivos definidos e circunscritos) não pode ser aplicada para outros tipos de situações.
Em suma, o Despacho recorrido interpretou incorretamente o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 17.12.2020 que invoca, não se tento apercebido que a situação aí julgada não foi a mesma que aqui se discute, ficando assim distorcida e descontextualizada a decisão do Despacho recorrido.
O Despacho recorrido não cuidou de verificar que a jurisprudência unânime dos nossos Tribunais superiores quanto à questão que nos ocupa é precisamente aquela que a Recorrente defende.
Ao contrário do que se faz entender no Despacho recorrido, é entendimento jurisprudencial unânime dos nossos Tribunais superiores que o critério para aferir a tempestividade da alteração do rol testemunhal é o da realização da audiência em causa (cfr., supra, nº 6).
Assim, é consensual na nossa jurisprudência que os 20 dias estabelecidos no art. 598º, nº 2, do CPC se contam a partir da data da efetiva realização da audiência final e não, como entendeu o Despacho recorrido, a partir da primeira data marcada para a realização dessa audiência.»

A Apelada respondeu ao recurso defendendo a improcedência do mesmo, alegando ainda e, em suma, que a admissão das testemunhas aditadas depende de decisão judicial que pondere da relevância dos seus depoimentos para o processo nos termos do artigo 61.º, n.º 1, do Código das Expropriações, sendo que Expropriada não invocou os fundamentos que permitam aferir dessa relevância.
A Apelante, através do requerimento com data de 08-02-2023 (Ref.ª Citius 3525716), invocando os artigos 3.º, n.º 3, e 4.º, do CPC, veio apresentar requerimento em que se pronuncia sobre o alegado pela Apelada em relação à questão suscitada e acima referida.
O Tribunal recorrido admitiu o recurso e pronunciou-se no sentido deste requerimento dever ser objeto de apreciação pelo tribunal de recurso.

II- FUNDAMENTAÇÃO
A- Objeto do Recurso
Considerando as conclusões das alegações, as quais delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC), não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do CPC), no caso, impõe-se apreciar:
- Questão previa: da admissibilidade do requerimento da Apelante com data de 08-02-2023 (Ref.ª Citius 3525716);
- Da tempestividade do pedido de aditamento do rol de testemunhas.

B- De Facto
Os factos e ocorrências processuais relevantes para a apreciação do recurso consta do antecedente recurso.

C- Do conhecimento do objeto do recurso

1. Questão previa: da admissibilidade do requerimento da Apelante com data de 08-02-2023 (Ref.ª Citius 3525716)
A instância recorrida entendeu que deveria ser o tribunal de recurso a apreciar este requerimento.
Embora se entenda que a questão da admissibilidade do requerimento deveria ter sido apreciada pela instância recorrida, porquanto a mesma se insere na tramitação do recurso que corre na 1.ª instância e, consequentemente, cai sob a alçada da instância recorrida, também é claro que a apreciação do mérito do alegado se coloca em termos de apreciação das questões a decidir em sede de recurso a apreciar nesta sede.
E sendo assim, ainda que se pudesse configurar uma nulidade secundária por não haver pronúncia pela instância recorrida sobre a admissibilidade, ou não, do requerimento, a mesma encontra-se ultrapassada pela não reação das partes em relação ao teor do despacho (cfr. artigos 195.º e 199.º do CPC).
O que não contende com a apreciação que nesta sede se faça sobre a admissibilidade do requerimento, uma vez que ainda não foi proferida decisão sobre a mesma.
Vejamos, então.
Invocando que a questão suscitada pela Apelada na resposta ao recurso é uma questão nova, a Apelante entende que, em face dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, previstos nos artigos 3.º, n.º 3, e 4.º, do CPC, tem direito de se pronunciar.
Mas não lhe assiste razão.
A tramitação dos recursos em processo civil (aplicável subsidiariamente ao processo de expropriação nos termos do artigo 549.º, n.º 1, do CPC, sem prejuízo das normas especiais inseridas no Código das Expropriações em matéria de recursos) encontra-se especificamente prevista na lei e visa agilizar a decisão a proferir, evitando a eternização do dissídio, porquanto as questões decidendas já foram discutidas no processo de acordo com as regras e princípios processuais que regem o processo especial aplicável e o processo civil em geral.
Assim, interposto o recurso nos termos do artigo 637.º do CPC, a parte recorrida pode responder à alegação do recorrente (n.º 5 do artigo 638.º do CPC), não prevendo a lei qualquer outro articulado subsequente, ainda que sejam invocados os princípios processuais mencionados pela Apelante. Na verdade, se assim fosse, a tramitação do recurso eternizava-se, pois, à luz dos mesmos princípios sempre poderia a parte contrária invocar o direito de pronunciar e assim por diante.
As regras processuais quanto à delimitação do objeto do recurso têm aqui plena aplicação. Estando em causa apenas a apreciação de um recurso (principal) interposto por uma parte, cabe à mesma definir o objeto do recurso em face dos fundamentos insertos na decisão de que recorre, gizando as conclusões recursivas em função da impugnação que apresenta (artigos 631.º, n.ºs 1 e 2, 639.º do CPC).
No caso, o despacho recorrido apenas se pronunciou pela extemporaneidade do requerimento de aditamento do rol de testemunhas.
Portanto, a questão a decidir é apenas essa; só poderia estender-se a outras se fossem de conhecimento oficioso, como estipula o artigo 608.º, n.º 2, in fine, do CPC.
E se assim fosse, então aí sim, justificava-se o exercício do contraditório ao abrigo do artigo 3.º, n.º 3, do CPC (cfr. a propósito, o Acórdão do TC n.º 77/2023, publicado no Diário da República n.º 82/2023, Série II de 2023-04-27[1]).
Mas a questão suscitada pela Apelada não é de conhecimento oficioso e não se insere nem nos fundamentos da decisão recorrida, nem no objeto do recurso, pelo que é uma questão nova, insuscetível de ser apreciada nesta sede.
Nestes termos, decide-se não apreciar a questão nova suscitada na resposta às alegações, como decorre do acima exposto.

2. Da tempestividade do pedido de aditamento do rol de testemunhas.
O despacho recorrido indeferiu por extemporâneo o pedido de alteração do rol de testemunhas, por interpretar o disposto no n.º do artigo 598.º do CPC nos seguintes termos:
«Ao abrigo do disposto no artigo 58.º do Código das Expropriações, [n]o requerimento da interposição do recurso da decisão arbitral, o recorrente deve expor logo as razões da discordância, oferecer todos os documentos, requerer as demais provas, incluindo a prova testemunhal (…).
Por sua vez, nos termos do artigo 598.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, [o] rol de
testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de cinco dias.
Entendemos que este último preceito legal deve ser aplicado, mutatis mutandis, ao processo judicial expropriativo, tendo, desde logo, em consideração que, em tal espécie processual, inexiste uma audiência final per se, mas sim a realização de diligências de prova necessárias e pertinentes, seguidas de alegações finais escritas – artigo 64.º do Código das Expropriações.
Entendendo-se de tal forma, extrai-se a possibilidade de as partes procederem à alteração dos respectivos róis testemunhais até 20 dias antes da data que se realize a produção de prova, para além da prova pericial.
Discutida a questão, comunga-se do entendimento de que a data prevista neste preceito – e relevante para aferir da tempestividade da alteração do rol testemunhal - coincide com a primeira data designada e não com qualquer segunda data que surja em virtude de qualquer adiamento – neste sentido, vide, entre o mais, Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, relatado por Vítor Sequinho, Processo n.º 2983/16.0T8LLE-A.E1, de 17.12.2020, e disponível em www.dgsi.pt, e Abrantes Geraldes et al., in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Parte Geral e Processo de Declaração – Artigos 1.º a 702.º, 2018, Almedina, p. 705.
Compulsados os autos, retira-se que se encontrava designado o dia 13 de Dezembro de 2022 para a inquirição das testemunhas indicadas, pelo que o requerimento de alteração ao rol testemunhal apresentado em 09.12.2022 é manifestamente extemporâneo.
Mais se tenha em consideração que o despacho que indeferiu inicialmente a requerida produção de prova testemunhal foi parcialmente revogado por Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 13.10.2022, tendo aí sido determinada a inquirição das testemunhas AA, BB e CC, pelo que a expropriada dispôs de lapso temporal suficiente para proceder tempestivamente à ora solicitada alteração.
Face a todo o exposto, decide-se indeferir a pretendida alteração ao rol testemunhal apresentado pela expropriada, por extemporaneidade
Vejamos.
A Apelante não questiona, e bem, o despacho recorrido em relação à aplicabilidade mutatis mutandis do regime do artigo 598.º, n.º 2, do CPC, ao processo especial de expropriação, embora na fase jurisdicional não exista propriamente uma diligência designada por audiência final ou audiência de discussão e julgamento como sucede na tramitação do processo comum. A razão prende-se com o facto da impugnação da decisão arbitral se efetuar através de um recurso dessa decisão para o tribunal judicial, encetando-se a fase jurisdicional do processo expropriativo, que tem uma tramitação específica, apresentando-se o objeto do recurso da arbitragem como um «misto de impugnação e de ação».[2]
As diligências instrutórias, que podem incluir a produção de prova testemunhal, são as requeridas no requerimento de interposição do recurso da decisão arbitral (artigo 58.º do Código das Expropriações) e admitidas pelo tribunal se assim as tiver como úteis à causa, embora a avaliação seja obrigatória (artigos 61.º, n.ºs 1 e 2, do Código das Expropriações).
A decisão final é proferida após conclusão das diligências de prova e após a produção das alegações das partes (artigos 65.º e 66.º do Código das Expropriações).
O Código das Expropriações não prevê a alteração e/ou aditamento do rol de testemunhas.
Contudo, o intérprete tem de considerar que, sendo aplicável subsidiariamente as regras processuais civis ao processo especial expropriativo (artigo 549.º, n.º 1, do CPC), é admissível a alteração ou aditamento do rol de testemunhas nos termos previstos no CPC.
O Acórdão do STJ, de 11-02-2010[3], pronunciou-se precisamente no sentido de ser admissível neste processo especial o aditamento ou alteração do rol de testemunhas ao abrigo do artigo 512.º-A, do CPC 1961, que corresponde ao artigo 598.º do CPC vigente.
O n.º 2 do artigo 598.º do CPC estipula: «O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de cinco dias».
Como se refere no Acórdão da Relação de Lisboa de 26-09-2019:
«A redação do preceito corresponde ao texto do anterior artigo.º 512.º-A do CPC de 1961, na versão que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 180/96 de 25.9, verificando-se uma clara intenção do legislador de flexibilizar o regime do artigo 619.º do CPC, o qual só permitia a alteração do rol dentro do prazo para a sua apresentação (salvo casos excecionais).

Em jeito de comentário, Lopes do Rego aplaudiu tal normativo por afastar um regime que se configurava como excessivamente restritivo, amarrando as partes, sem justificação plausível, a provas que foram indicadas com enorme antecedência (cf. Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, 2.ª ed., Coimbra: Almedina, p. 448). Apenas alertou para os limites decorrentes de dois parâmetros fundamentais: a necessidade de atuação da regra do contraditório; e a necessidade de evitar que o exercício de tal direito colida com a realização da audiência, não devendo constituir em nenhum caso, nova causa de adiamento.

Tem sido entendido que o prazo de 20 dias previsto no artigo 598.º, n.º 2, do CPC, para aditamento ou alteração do rol de testemunhas, deve ser contado tendo como referência a realização efetiva da audiência e não a simples abertura desta.

Esta tese, que nos parece maioritária na doutrina e na jurisprudência, encontra, aliás, afinidade com o que foi defendido na vigência do anterior Código de Processo Civil relativamente ao artigo 512.º-A.»

Concorda-se por ser essa interpretação que resulta das regras do artigo 9.º do Código Civil. Desde logo, a letra do artigo 598.º, n.º 2, do CPC, ao invocar que o aditamento ou alteração pode ocorrer no prazo de 20 dias antes da data em que se realize a audiência de julgamento, indica claramente que o legislador se quis reportar ao momento em que se inicia a produção de prova em sede de julgamento e não ao ato de designação do dia da sua realização.

Mas não só a letra do preceito sustenta essa interpretação, pois o elemento histórico e a ratio legis também militam nesse sentido, porquanto, como supra referido, o aditamento ou alteração do rol até 20 dias antes da realização da audiência já provém do CPC anterior e visou flexibilizar o momento da atualização do requerimento probatório, considerando que muitas vezes se verifica algum distanciamento entre o momento da apresentação e produção das provas.

Também a doutrina e jurisprudência, em termos amplamente consensuais, têm defendido que o prazo de 20 dias previsto no nº 2 do artigo 598º do CPC para aditamento ou alteração do rol de testemunhas, deve ser contado tendo como referência a realização efetiva da audiência final, excluindo-se até situações em que ocorre a mera abertura da audiência e adiamento da mesma ou suspensão da instância.

Veja-se, assim, LEBRE DE FREITAS e ISABEL ALEXANDRE, em anotação ao artigo 598.º, quando referem:
«O n.º 2 permite o adiamento ou a alteração (…) do rol de testemunhas até 20 dias antes da data em que efetivamente se realize a audiência final. A fixação duma primeira data, havendo depois adiamento da audiência, ainda que depois de aberta, nos termos do art. 151-4 ou do art. 603-1, ou a suspensão da instância, nos termos do art. 269, não releva para o efeito, uma vez verificado o adiamento ou a suspensão»[5].

Na jurisprudência, para além do Acórdão da Relação de Lisboa de 26-09-2019 já supra citado, e a título exemplificativo, vejam-se os seguintes arestos:

Acórdão da Relação de Coimbra de 20-02-2019[6], com o seguinte sumário:
«A norma do n.º 2 do artigo 598.º (Alteração do requerimento probatório e aditamento ou alteração ao rol de testemunhas) do Código de Processo Civil, onde se determina que «O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final» deve ser interpretada no sentido de que esses 20 dias se contam impreterivelmente até à audiência que dá efetivamente início à discussão da causa, não se aplicando aos casos em que a audiência designada para um certo dia acaba por ser adiada, como ocorre quando existe impedimento do tribunal ou falta algum advogado (n.º 1 do artigo 603.º do CPC) ou a instância é suspensa.»

Acórdão da Relação de Évora de 28-06-2018[7], com o seguinte sumário:
«I - O prazo de 20 dias previsto no nº 2 do artigo 598º do CPC, para aditamento ou alteração do rol de testemunhas, deve ser contado tendo como referência a realização efetiva da audiência final e não a simples abertura desta.»

Acórdão da Relação do Porto de 15-11-2018[8], com o seguinte sumário:
«O prazo limite para a apresentação de documentos (bem como o da alteração do rol de testemunhas) tem por referência não a data inicialmente designada para a audiência final mas a data da efetiva realização da audiência, quer haja adiamento ou continuação da audiência.»

Acórdão da Relação de Coimbra, de 14-12-2016, com o seguinte sumário:
«O prazo de vinte dias, previsto no artº 598º, nº 2, do NCPC, para aditamento ao rol de testemunhas tem como referência a efetiva realização do julgamento, ainda que anteriormente, tenha ocorrido abertura da audiência final, com tentativa de conciliação, seguida de suspensão, sem produção de quaisquer provas, para conclusão das negociações entre as partes e designação da audiência».

Acórdão da Relação de Coimbra, de 08-09-2015, com o seguinte sumário:

«O prazo de 20 dias a que alude o artº 598, nº 2, do CPC, refere-se à data da efetiva realização da audiência de discussão e julgamento, pelo que a possibilidade de alteração ou aditamento do rol de testemunhas como que se “renova” relativamente a cada uma das novas marcações que venham a ter lugar.»

Acórdão da Relação de Guimarães de 17-12-2015[11], com o seguinte sumário:

«1- Prevendo o artº 598º, nº 2, do CPC, que o rol de testemunhas pode ser alterado ou aditado até vinte dias antes da data em que se realize a audiência de julgamento, refere-se o texto legal á realização efetiva da audiência.

II- Assim, uma vez adiada a mesma, será tempestivo tal aditamento se ocorrer até vinte dias antes da sua efetiva realização na nova data designada para o início do julgamento.»

Voltando, agora, ao caso sub judice, e em face da interpretação do artigo 598.º, n.º 2, do CPC que vem sendo referida, impõe-se que se conclua que o requerimento de aditamento do rol de testemunhas é tempestivo por ter sido apresentado 20 dias antes da nova data designada para a realização das diligências instrutórias, ressalvada a avaliação, por a sua realização não se ter efetivado na data inicialmente designada.

Donde decorre que não se pode manter o despacho recorrido.

Acrescentando-se, como mencionado na resposta às alegações, que o aresto em que se louvou a decisão recorrida[12] tem como pano de fundo uma situação muito específica, que é a da reabertura da audiência final por determinação do tribunal ad quem, ou seja, para que sejam produzidos novos meios de prova e ampliação da decisão de facto, com salvaguarda da prova já produzida. Ou seja, a produção de prova já se tinha iniciado por já ter havido audiência de discussão e julgamento. Pelo que o decidido nem sequer contraria o que temos vindo a mencionar quando ao modo de contagem do prazo de 20 dias.

Relembrando-se que, no caso destes autos, o tribunal a quo tinha indeferido a audição da prova (declarações de parte e prova testemunhal), sem que se tenha iniciado qualquer produção de prova (salvo a avaliação) e foi em consequência do Acórdão de 13-10-2022, proferido no Apenso D, que a requerida produção de prova testemunhal foi admitida e ordenada a sua produção.

Em conclusão, o requerimento apresentado em 09-12-2022 pela Expropriada onde requer o aditamento do rol de testemunhas, foi apresentado tempestivamente.

Assim, procede a apelação.


Dado o decaimento, as custas ficam a cargo da Apelada (Entidade Expropriante), que respondeu ao recurso (artigo 527.º do CPC), sendo a taxa de justiça do recurso fixada pela tabela referida no n.º 2 do artigo 6.º do RCP.

III- DECISÃO
Nos termos e pelas razões expostas, acordam em julgar procedente a apelação e, consequentemente, revogam a decisão recorrida, declarando tempestivo o pedido de alteração do rol de testemunhas.
Custas nos termos sobreditos.
Évora, 11-05-2023
Maria Adelaide Domingos (Relatora)
José Lúcio (1.º Adjunto)
Manuel Bargado (2.º Adjunto)

__________________________________________________
[1] «Julga inconstitucional a norma contida no artigo 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, interpretado no sentido segundo o qual não é obrigatória a audição prévia do recorrente relativamente a um fundamento de conhecimento oficioso que foi somente suscitado pelo recorrido nas contra-alegações, quando o tribunal de recurso venha a decidir a causa com esse fundamento, sem que o recorrente se tenha pronunciado espontaneamente quanto ao mesmo».
[2] SALVADOR DA COSTA, Código das Expropriações e Estatuto dos Peritos Avaliadores, Almedina, 2010, p. 355 (1).
[3] Proferido no proc. n.º 09B0280, disponível em www.dgsi.pt
[4] Proferido no proc. n.º 939/16.1T8LSB-G.L1-2, disponível em www.dgsi.pt.
[5] Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3.ª ed., Almedina, p. 675.
[6] Proferido no proc. n.º 7535/15.9T8VIS-B.C1, disponível em www.ddgsi.pt
[7] Proferido no proc. n.º 922/15.4T8PTM-A.E1, disponível em www.dgsi.pt.
[8] Proferido no proc. n.º 11465/17.1T8PTR-B.P1, disponível em www.dgsi.pt.
[9] Proferido no proc. n.º 3669/14.5T8VIS.C1, disponível em www.dgsi.pt.
[10] Proferido no proc. n.º 2035/09.9TBPMS-A.C1, disponível em www.dgsi.pt.
[11] Proferido no proc. n.º 3070/09TJVNF-B.G1, disponível em www.dgsi.pt.
[12] Acórdão da Relação de Évora de 17-12-2020, proferido no proc. n.º 2983/16.0T8LLE-A.E1, disponível em www.dgsi.pt, com o seguinte sumário:
«1. O prazo de 20 dias estabelecido pelo artigo 598.º, n.º 2, do CPC, para o aditamento ou a alteração do rol de testemunhas, tem por referência a data inicialmente designada para a realização da audiência final ou da primeira sessão desta.
2. Tal possibilidade de aditamento ou alteração do rol de testemunhas não existe na hipótese de o tribunal ad quem determinar que o tribunal a quo reabra a audiência final com a finalidade de produção de determinado(s) meio(s) de prova e ampliação da matéria de facto.»