REDUÇÃO DO TRABALHO
FÉRIAS
Sumário


Em caso de redução do período de trabalho por força do Lay off simplificado, o trabalhador mantém o direito a férias, com a duração mínima de 22 dias úteis.

Texto Integral



Processo n.º 20790/20.3T8LSB.L1.S1


Origem: Tribunal Relação Lisboa


Recurso de revista


Relator: Conselheiro Domingos Morais


Adjuntos: Conselheiro Mário Belo Morgado


Conselheiro Júlio Gomes


Acordam os Juízes na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça


I.Relatório


SITAVA – Sindicato dos Trabalhadores de Aviação e Aeroportos intentou acção de processo comum, contra


SPDH – Serviços Portugueses de Handling, S.A. pedindo:


A) Reconhecer-se que, aos trabalhadores da Ré, sócios do Autor, cujo contrato de trabalho tenha sido suspenso, ou objeto de redução do período normal de trabalho, nomeadamente nos termos dos arts. 294° e 298° do Código do Trabalho, 6° do Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março, e da Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020 de 06 de junho, desde 3 de Abril de 2020 e que, durante o período da suspensão ou redução, tenham gozado férias - ou cujas férias tenham sido antecedidas dessa situação de redução -, a retribuição devida pelo período de férias cifra-se em montante equivalente àquele que receberiam caso nesse período não ocorresse a suspensão dos contratos de trabalho ou redução do período normal de trabalho.


B) Deve a Ré ser condenada a pagar aos trabalhadores mencionados na alínea anterior, a título de retribuição relativa ao período de férias, a diferença entre a quantia mencionada na alínea anterior, devida a cada um, e as quantias que efetivamente lhes tenha pago a esse título (que pagou com a redução acima mencionada, nos termos do art. 305°, n° 3 do Código do Trabalho)


C) Deve reconhecer-se, relativamente aos trabalhadores da Ré, sócios do Autor, que gozem ou tenham gozado férias durante período para o qual se encontre estabelecida a redução do seu período normal de trabalho, nomeadamente nos termos dos arts. 294° e 298° do Código do Trabalho, 6° do Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março, e da Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020 de 06 de junho, não devem ser contabilizados como dias de férias aqueles em que, por força dessa redução, o trabalhador não iria prestar trabalho, nomeadamente os dias semanais que, no momento do início do gozo das férias, não integrem o seu horário de trabalho.


D) Sendo a Ré condenada a conceder tais dias de férias àqueles ou, caso tal já não seja possível no momento do trânsito em julgado da sentença, ou caso assim não se entenda, a pagar-lhes a respetiva retribuição a título de férias não gozadas, relativa aos dias em apreço.


2. - A Ré contestou, pedindo a absolvição do pedido formulado pelo Autor.


3. - Na 1.ª instância foi decidido:


“(O) tribunal julga a presente ação parcialmente procedente e nessa medida determina que relativamente aos trabalhadores da Ré, sócios do Autor, que gozem ou tenham gozado férias durante período para o qual se encontre estabelecida a redução do seu período normal de trabalho, nomeadamente nos termos dos arts. 294° e 298° do Código do Trabalho, 6° do Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março, e da Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020 de 06 de junho, não devem ser contabilizados como dias de férias aqueles em que, por força dessa redução, o trabalhador não iria prestar trabalho, nomeadamente os dias semanais que, no momento do início do gozo das férias, não integrem o seu horário de trabalho.


Condena ainda o tribunal a R. a conceder tais dias de férias aos trabalhadores ou, caso tal já não seja possível no momento do trânsito em julgado da sentença, ou caso assim não se entenda, a pagar-lhes a respetiva retribuição a título de férias não gozadas, relativa aos dias em apreço, a liquidar em execução de sentença.”.


4. – Autor e Ré apelaram e o Tribunal da Relação acordou:


A - A apelação interposta pelo A. improcedente e, em consequência, confirmar a sentença na parte abrangida.


Sem custas, devendo o Apelante suportar os encargos.


B - A apelação interposta pela R. procedente e, em consequência, revogar a sentença no seu segmento condenatório.


Sem custas, devendo o Apelado suportar os encargos.”.


5. – O Autor interpôs recurso de revista normal e excepcional.


A revista excepcional, relativa às alíneas A) e B) do pedido, não foi admitida pela Formação.


6. – A revista normal é reportada à decisão que incidiu sobre as alíneas C) e D) do pedido.


O Autor concluiu, em síntese:


A cláusula 41.°, n° 8, do AE, exclui expressamente da contabilização como dias de férias aqueles em que o trabalhador não estivesse ao serviço na execução do contrato de trabalho, o que sucede relativamente aos mencionados dias que ficaram excluídos do horário de trabalho com a implementação da redução do período normal de trabalho, decorrente do Lay-off.


Ou seja, no referido AE, as partes restringiram a contabilização de dias de férias àqueles em que efetivamente, por força do horário de trabalho aplicável aquando do gozo das férias, os trabalhadores estão sujeitos à obrigação de prestar trabalho, em termos diferentes do que se determina no art. 238º do Código do Trabalho.


A cláusula reporta-se meramente, e expressamente, aos dias em que pelo horário aplicável o trabalhador estaria ao serviço, o que não sucede nos dias em que, por força da aplicação do regime do Lay-off, os trabalhadores já não iriam trabalhar.


No âmbito do Lay-off, ocorre uma alteração do horário de trabalho, conforme resulta dos factos provados, com efeitos na contabilização de dias de férias a que se reporta a referida cláusula.


Pelo que deveria o douto acórdão ter considerado improcedente o recurso de apelação interposto pela Ré, consequentemente tendo considerado procedentes os pedidos formulados pelo Autor, relativos à contabilização de dias de férias dos trabalhadores associados do Autor- cf. artigos 22.ª a 26.º das conclusões da revista.


7. - A Ré contra-alegou, concluindo pela improcedência da revista.


8. - O Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência da revista.


9. - Cumprido o disposto no artigo 657.º, n.º 2, ex vi do artigo 679.º, ambos do CPC, cumpre apreciar e decidir.


II. - Fundamentação de facto


1. – As Instâncias decidiram sobre a matéria de facto:


Factos Provados:


Em face da posição expressa nos articulados consideraram-se assentes os seguintes factos:


1. Às relações entre a Ré e os seus trabalhadores, sócios do Autor, é aplicável o Acordo de Empresa (AE) publicado no B.T.E. nº 6, de 15 de fevereiro de 2012, com as alterações publicadas no B.T.E. nº 4, de 29 de Janeiro de 2018 (alteração salarial e outras).


2. Com efeitos desde o dia 3 de abril de 2020 e até 31 de julho de 2020, a Ré, invocando a verificação, na sua esfera, da situação de crise empresarial a que se reportam os arts. 298° e seguintes do Código do Trabalho (Lay-off), e 3° do Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março (Lay-off simplificado);


3. Procedeu, quer à suspensão de contratos de trabalho, quer à redução do período normal de trabalho de vários trabalhadores seus, incluindo trabalhadores sócios do Autor, nos termos do art. 6° do referido Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março;


4. Ou seja, recorreu ao chamado regime do "Lay-off", beneficiando, nesse âmbito, dos apoios extraordinários previstos no art. 4° desse diploma;


5. O que transmitiu aos trabalhadores visados mediante comunicação com teor idêntico ao do documento de fls. 11 cujo teor se dá por reproduzido;


6. E com efeitos desde o dia 1 de agosto de 2020, a Ré implementou as medidas previstas na Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020 de 06 de junho, ao abrigo da qual procedeu à redução do período normal de trabalho de vários trabalhadores seus, incluindo igualmente trabalhadores sócios do Autor;


7. O que transmitiu aos trabalhadores visados mediante comunicação com teor idêntico ao do documento de fls. 12 cujo teor se dá por reproduzido;


8. Vigorando assim para a generalidade dos trabalhadores acima mencionados, no momento imediatamente anterior ao do gozo de férias nesse período, a redução do período normal de trabalho, e consequentemente, o vencimento de salário inferior àquele que auferiam em condições normais de trabalho - antes do Lay- off – tendo em conta que o salário dos mesmos passou, no âmbito do Lay-off, a corresponder à compensação retributiva prevista no nº 3 do art. 305º do Código do Trabalho, e não à retribuição que auferiam em condições normais de trabalho (antes do Lay-off);


9. Aos mencionados trabalhadores que gozaram férias nesse período e que imediatamente antes das férias, como se disse, estavam sujeitos à redução do período normal de trabalho, a Ré, pagou-lhes o subsídio de férias que lhes seria devido em condições normais de trabalho;


10. Nessas circunstâncias de gozo de férias antecedido de uma situação de redução do período normal de trabalho, a Ré, a título de retribuição do período de férias, pagou aos trabalhadores, ao invés da sua retribuição normal (a devida por força do art. 264°, n° 1 do Código do Trabalho, ou seja, a que auferiam antes da sujeição à redução), uma quantia liquidada nos termos do referido art. 305°, n°s 1 e 3 do Código do Trabalho, ou seja, quantia equivalente ao montante da compensação retributiva devida aos mesmos pelo trabalho prestado durante aquela redução;


11. A título de exemplo, relativamente a trabalhador que, por hipótese, em 31 de Março de 2020, auferisse uma retribuição mensal de € 1000,00, e que no período de redução do seu período normal trabalho, tenha passado a auferir uma retribuição de €800,00 (compensação retributiva calculada nos termos do art. 305° do CT), a Ré, a título de retribuição de férias que tenham sido antecedidas pela referida situação de redução, pagou uma quantia equivalente, não à referida retribuição de € 1000,00, mas à de €800,00, correspondente à mencionada compensação retributiva.


12. Ou seja, os trabalhadores da Ré, sócios do Autor, a quem no período supra mencionado foi reduzido o período normal de trabalho com fundamento no disposto nos arts. 294° e 298° do Código do Trabalho, 6° do Decreto-Lei n.º 10- G/2020, de 26 de março, e da Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020 de 06 de junho, e que, durante esse período gozaram férias, receberam, a título de retribuição do período de férias, quantia inferior àquela que constitui a retribuição dos mesmos pela prestação de trabalho sem qualquer redução do período normal de trabalho.


13. Resultando assim de tal procedimento da Ré a consideração de que os trabalhadores que iniciem o gozo de férias no período durante o qual lhes determinou a sua sujeição ao regime do Lay-off, devem auferir, a título de retribuição do período de férias, não a sua retribuição normal, mas, como se disse, a compensação retributiva prevista no art. 305°, nº 3 do Código do Trabalho;


14. Sucede ainda que, durante o referido período em que os trabalhadores da Ré sofreram uma redução do período normal de trabalho, ao abrigo do disposto nos arts. 294° e 298° do Código do Trabalho, 6° do Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março, e da Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020 de 06 de junho;


15. Tal redução implicou, para vários desses trabalhadores, a redução do número de dias trabalhados em cada semana;


16. A título de exemplo, sucederam casos em que, tendo o trabalhador um período normal de trabalho consistente na prestação de trabalho em 5 dias por semana, passou, durante a redução desse período normal de trabalho, a trabalhar apenas 3 dias por semana;


17. A R. pagou o subsidio de férias por inteiro aos seus trabalhadores mas a retribuição de férias foi calculada de acordo com a data em que cada trabalhador as gozou;


18. A DGERT e a ACT emitiram, em 30/06/2020, o seguinte esclarecimento:


Esclarecimento DGERT e ACT – Férias gozadas durante o período de aplicação do “lay-off” “Férias gozadas durante o período de aplicação do “lay-off”


Em face das recentes notícias amplamente veiculadas na comunicação social, nomeadamente no sentido de que «não há gozo de férias enquanto o contrato de trabalho está suspenso» e que «empresas impõem férias com corte salarial a pessoal em lay-off», a DGERT, conjuntamente com a ACT, esclarece o seguinte:


1. Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 295.º do Código do Trabalho, durante a redução temporária de período normal de trabalho ou suspensão do contrato de trabalho, mantêm-se os direitos, deveres e garantias das partes que não pressuponham a efetiva prestação de trabalho.


2. A situação de “lay-off” é, porém, excecional no âmbito da relação contratual, pelo que o legislador entendeu necessário regular, especificamente, no artigo 306.º do Código do Trabalho, os efeitos da redução ou suspensão em férias, subsídio de férias ou de Natal.


3. Com efeito, ao contrário do que se verificaria em outras situações de suspensão do contrato de trabalho, o tempo de redução ou suspensão em situação de “lay-off” não afeta o vencimento e a duração do período de férias (n.º 1 do artigo 306.º do Código do Trabalho), nem prejudicam a marcação e o gozo de férias, nos termos gerais (n.º 2 do artigo º 306.º do Código do Trabalho).


4. Em matéria de marcação do período de férias, dentro ou fora da situação de “lay-off”, é necessário atentar nas regras gerais constantes do Código do Trabalho, nomeadamente o n.º 1 do artigo 241.º do Código do Trabalho, que refere que o período de férias é marcado por acordo entre empregador e trabalhador.


5. Na falta de acordo, dentro ou fora da situação de “lay-off”, cumprirá, por outro lado, ao empregador, marcar as férias, nos termos gerais, não podendo estas ter início em dia de descanso semanal do trabalhador, ouvindo para o efeito a comissão de trabalhadores ou, na sua falta, a comissão intersindical ou a comissão sindical representativa do trabalhador interessado (n.º 2 do artigo 241.º do Código do Trabalho).


6. Salienta-se que, em pequena, média ou grande empresa o empregador só pode marcar, sem acordo, o período de férias entre 1 de maio e 31 de outubro, a menos que o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou o parecer dos representantes dos trabalhadores admita época diferente (n.º 3 do artigo 241.º do Código do Trabalho).


7. Em caso de atividade ligada ao turismo, não havendo acordo quanto a marcação do período de férias, o empregador está obrigado a marcar 25% do período de férias a que os trabalhadores têm direito, ou percentagem superior que resulte de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, entre 1 de maio e 31 de outubro, que é gozado de forma consecutiva.


8. Assim, relativamente ao gozo de férias marcadas, mediante acordo entre empregador e trabalhador, poderá manter-se a marcação das férias e as mesmas serem gozadas nos termos gerais, não sendo estas prejudicadas pelo facto de o trabalhador estar abrangido pela redução ou suspensão do contrato de trabalho em situação de “lay-off”, sendo que o mesmo acontecerá no caso de as férias serem marcadas unilateralmente pelo empregador, sem acordo, desde que respeitadas as limitações já referidas.


9. Em qualquer dos casos, no que se refere ao pagamento da retribuição do período de férias e do subsídio de férias, importa notar que, ao invés de se limitar a remeter para a regra geral constante dos números 1 e 2 do artigo 264.º do Código do Trabalho, o legislador – do mesmo modo que fez em relação ao subsídio de natal (e frisou que neste caso é devido por inteiro) – entendeu necessário regular, especificamente, os efeitos da redução ou suspensão e ressalvou que o trabalhador tem direito ao pagamento pelo empregador do subsídio de férias devido em condições normais de trabalho.


10. No entanto, e tratando-se de norma excecional, não se faz qualquer referência ou salvaguarda em relação ao valor da retribuição a receber durante o período das férias.


Assim, será necessário proceder à necessária articulação entre o disposto nos números 1 e 3 do artigo 305.º e no n.º 2 do artigo 306.º do Código do Trabalho, de onde resulta, para o empregador, a obrigação de:


- Assegurar o pagamento da compensação retributiva, sendo que, durante o período de redução ou suspensão, o trabalhador tem direito a auferir mensalmente um montante mínimo igual a dois terços da sua retribuição normal ilíquida, ou o valor da retribuição mínima mensal garantida correspondente ao seu período normal de trabalho, consoante o que for mais elevado – este é o valor da “retribuição” do trabalhador enquanto esteja abrangido por uma medida de “lay-off”, sendo que a Segurança Social comparticipa em 70% o valor da compensação retributiva a que o trabalhador tenha direito;


- Assegurar o pagamento do subsídio de férias, total ou proporcional, que lhe seria devido em condições normais de trabalho, ou seja sem qualquer redução, sendo este suportado integralmente pela entidade empregadora.


Em conclusão:


- Nada impede o gozo ou a marcação de férias durante o período de aplicação do “lay-off”, desde que nos termos decorrentes do Código do Trabalho, podendo haver lugar, na falta de acordo, e com as devidas limitações, à marcação unilateral de férias pelo empregador;


- Durante o período de férias, o trabalhador em “lay-off” tem direito a receber o subsídio de férias que lhe seria devido em condições normais de trabalho, ou seja sem qualquer redução, e sendo integralmente suportado pela empresa;


- Durante o período de férias, o trabalhador em “lay-off” tem direito a receber a receber um montante mínimo igual a dois terços da sua retribuição normal ilíquida, ou o valor da retribuição mínima mensal garantida correspondente ao seu período normal de trabalho, consoante o que for mais elevado.”


(Disponível em https://www.dgert.gov.pt/esclarecimento-dgert-e-act-ferias-gozadasdurante-o-periodo-de-aplicacao-do-lay-off)


19. A DGERT, na sua FAQ mantém o mesmo entendimento:


(consta uma imagem)


20. Na FAQ da Segurança Social, consta como segue:


(consta uma imagem)


21. No GUIA PRÁTICO REGIME DE LAYOFF INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL (página 14), consta que:


“7 – O trabalhador pode gozar férias durante o período em que a empresa está em layoff, seja layoff do Código do Trabalho ou layoff simplificado?


R: Sim. A redução do período normal de trabalho ou a suspensão do contrato de trabalho não prejudica a marcação e o gozo de férias, nos termos gerais, tendo o trabalhador direito ao pagamento pelo empregador do subsídio de férias devido em condições normais de trabalho.


Assim, relativamente ao gozo de férias marcadas, por trabalhador abrangido pela redução ou suspensão do contrato de trabalho, havendo acordo entre empregador e trabalhador, pode manter-se a marcação das férias, e as mesmas serem gozadas, tendo o trabalhador direito a receber durante o período de férias o valor da compensação retributiva acrescido do subsídio de férias, total ou proporcional, que lhe seria devido em condições normais de trabalho, ou seja sem qualquer redução.”.


III. – Fundamentação de direito


1. - Do objeto do recurso de revista


1.1. - Está em causa saber se face ao teor da cláusula 41.ª, n.º 8 do Acordo de Empresa, publicado no B.T.E. nº 6, de 15 de fevereiro de 2012, com as alterações publicadas no B.T.E. nº 4, de 29 de Janeiro de 2018, quando o trabalhador goza férias durante período para o qual se encontre estabelecida a redução do seu período normal de trabalho no âmbito de “lay-off simplificado” (Decreto-Lei n.º 10-G/2020 de 6 de Março) não devem ser contabilizados como dias de férias aqueles em que, por força dessa redução, o trabalhador não iria prestar trabalho.


1.2. - A questão em apreço já foi apreciada e decidida no acórdão desta Secção Social do STJ, de 15 de dezembro de 2022, proc. 17253/20.0T8LSB.L1.S1, in www.dgsi.pt, que, em resumo, considerou:


A questão controvertida passa por saber como devem ser contabilizados os dias de férias dos trabalhadores que as gozaram durante o período do lay off simplificado. Ou seja, se o trabalhador só trabalhava 1, 2 ou 3 dias por semana, na semana só pode beneficiar de um, dois ou três dias úteis de férias?


A solução a adoptar passa, em nosso entender, pela interpretação do art.º 238º do CT, conjugado com o n.º 8 da cláusula 55.ª do AE TAP/SIMA e outros, publicado no BTE n.º 19, 22.05.2007, que assim prescreve: “Uma vez fixado o período de férias, com data de início e data de fim, durante o qual o trabalhador estará de férias será feita a contagem definitiva dos dias úteis, sendo apenas considerados úteis os dias em que pelo horário aplicável o trabalhador estaria ao serviço”.


O Direito a férias, com consagração constitucional (art.º 59º da CRP), está regulamentado nos art.ºs 237º e segs. do CT.


Para o que interessa aos autos, o n.º 3 do art.º 237º prescreve: “O direito a férias é irrenunciável e o seu gozo não pode ser substituído, ainda que com o acordo do trabalhador, por qualquer compensação, económica ou outra, sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo seguinte”.


Logo acrescenta o n.º 4: “O direito a férias deve ser exercido de modo a proporcionar ao trabalhador a recuperação física e psíquica, condições de disponibilidade pessoal, integração na vida familiar e participação social e cultural”.


O art.º 238º, com a epígrafe “Duração do período de férias”, estipula:


“1 - O período anual de férias tem a duração mínima de 22 dias úteis.


2 - Para efeitos de férias, são úteis os dias da semana de segunda-feira a sexta-feira, com excepção de feriados.


3 - Caso os dias de descanso do trabalhador coincidam com dias úteis, são considerados para efeitos do cálculo dos dias de férias, em substituição daqueles, os sábados e os domingos que não sejam feriados.


4 - (revogado)


5 – (...)


6 – (...)


Por seu turno, a cláusula 55.ª do AE TAP/SIMA e outros, publicado no BTE n.º 19, 22.05.2007, estabelece: “Uma vez fixado o período de férias, com data de início e data de fim, durante o qual o trabalhador estará de férias será feita a contagem definitiva dos dias úteis, sendo apenas considerados úteis os dias em que pelo horário aplicável o trabalhador estaria ao serviço”.


Como é sabido, a regra do n.º 2 do art.º 238º do CT foi introduzida no ordenamento jurídico português pelo DL 397/91, de 16/10, em cujo preâmbulo se lê:


“Assim, estando o período mínimo de férias actualmente fixado em dias consecutivos, consideram-se criadas as condições para o fixar em dias úteis, na esteira, aliás, do que já está em vigor nalgumas convenções colectivas e do regime da função pública, solução que evidencia maior equilíbrio de interesses na marcação do período de férias.


Dada a multiplicidade de regimes laborais existentes, sobretudo no que toca à organização da semana de trabalho, considerou-se necessário definir o que, para efeitos do presente diploma, se entende por dias úteis, de modo a estabelecer um regime uniforme para todos os trabalhadores em matéria de contagem do período de férias”.


Em coerência com o espírito do legislador, o n.º 5 do art.º 4º, estipulava: “Para efeitos de férias, a contagem dos dias úteis compreende os dias da semana de segunda-feira a sexta-feira, com a exclusão dos feriados, não sendo como tal considerados o sábado e o domingo”.


Foi esta a regra que passou para o n.º 2 do art.º 238º do CT.


Das normas legais e contratual transcritas, com facilidade se conclui que o trabalhador tem direito a um período anual de férias com a duração mínima de 22 dias úteis.


O que nem é posto em crise nos autos.


A Lei considera como úteis os dias da semana de segunda-feira a sexta-feira, com excepção de feriados.


A dificuldade da interpretação do que se entende por dias úteis, em caso de Lay Off, legitimamente colocada pelo Autor, reside no segmento da cláusula citada, na qual se refere: “sendo apenas considerados úteis os dias em que pelo horário aplicável o trabalhador estaria ao serviço”.


Importa desde já sublinhar que nem o art.º 238º do CT e nem a referida cláusula foram pensadas a partir de uma situação de lay Off, e muito menos de uma situação de Lay Off simplificado.


Como é sabido, e repetindo, nos termos do n.º 2 do art.º 6º do DL 10-G/2020, de 26/03, “Durante a vigência das medidas previstas no presente decreto-lei, em caso de redução do período normal de trabalho, mantêm-se os direitos, deveres e garantias das partes, nos termos previstos no Código do Trabalho”.


Ou seja, os direitos, deveres e garantias das partes previstas no Código de Trabalho são intocáveis.


O n.º 1 do art.º 295º desde Compêndio Legal estipula a mesma regra: “Durante a redução ou suspensão, mantêm-se os direitos, deveres e garantias das partes que não pressuponham a efectiva prestação de trabalho”.


O direito a férias é um direito irrenunciável do trabalhador.


Diz a Lei n.º 1 do art.º 238º do CT -: “O período anual de férias tem a duração mínima de 22 dias úteis.


Acrescenta o n.º 2 “Para efeitos de férias, são úteis os dias da semana de segunda-feira a sexta-feira, com excepção de feriados”.


A Lei não restringe os dias úteis e nem os faz coincidir com os dias de trabalho efectivo do trabalhador.


Antes, os dias úteis são todos os dias da semana, de segunda a sexta-feira, com excepção dos feriados.


Ou seja, são sempre úteis esses dias, independentemente do número de dias semanal em que o trabalhador exerça a sua actividade.


Onde a lei não distingue, não deve o intérprete fazê-lo.


O n.º 8 da claúsula 55ª não se opõe a esta interpretação pois que, apesar da redução do trabalho, o trabalhador não deixa de manter o seu horário normal de trabalho, apesar de suspenso em alguns dias.


Ao invés, a cláusula 6ª do mesmo AE expressamente refere: “Para efeitos de planeamento das férias, nos casos em que o dia de descanso semanal e o dia de descanso complementar não sejam fixos, serão contados como dias úteis os dias de segunda-feira a sexta-feira, com exclusão dos feriados; não são considerados dias úteis o sábado, o domingo e os feriados”.


O que vem de encontro à interpretação que acolhemos.


Mais, e mais importante: na semana em que o trabalhador goza férias, goza-as nos 5 dias úteis da semana. E não apenas em 2 ou 3.


Por isso, como bem refere a Ex.ma PGA, não deverão ser considerados como dias úteis apenas os dias de trabalho correspondentes à redução, por uma tal conclusão inviabilizar completamente o objectivo que se pretende atingir com a redução do período normal de trabalho.


Fazendo interpretação diversa, citando a Ex.ma PGA, “no limite, o tempo de férias prolongar-se-ia indefinidamente”, o que “seria contraditório com a própria redução em curso”.


Sufragamos a interpretação desta Magistrada quando afirma: “a não se entender assim poderia traduzir como refere a Recorrida um tratamento desigual em relação aos trabalhadores que trabalham todos os dias ainda que com a mesma redução do período normal de trabalho já que levaria a que «um trabalhador em regime de lay off que trabalhe por exemplo 20 horas por semana em três dias por semana gozaria efectivamente um período de férias com maior duração do que outro trabalhador que trabalhe o mesmo número de horas, mas repartido por todos os dias da semana»”.


Seguramente não foi isto o querido nem pela Lei e nem pelo AE.


Antes, o espírito do legislador - garantir solvabilidade económica às empresas mantendo os postos de trabalho - seria subvertido por diferente interpretação, pelos maiores custos que acarretaria para as empresas, podendo torná-las inviáveis, situação que a Lei do Lay Off quis evitar.


De resto, tal interpretação violaria o princípio constitucional da igualdade, como facilmente se constata face ao antes referido pois que os trabalhadores não abrangidos pelo Lay Off não gozariam dos direitos acrescidos destes.


O direito a férias visa recuperar física e psicologicamente os trabalhadores e a Lei considera que o gozo dos dias de férias por ela previstos é o suficiente.


De segunda a sexta-feira, 5 dias úteis por semana.” – fim de citação.


1.3. - No caso dos autos, a conjugação interpretativa é entre a cláusula 41.º, n.º 8, do AE aplicável (de igual teor da cláusula 55ª, n.º 8, do AE TAP/SIMA e outros, publicado no BTE n.º 19, 22.05.2007) - "uma vez fixado o período de férias, com data de início e data de fim, durante o qual o trabalhador estará de férias será feita a contagem definitiva dos dias úteis, sendo apenas considerados úteis os dias em que pelo horário aplicável o trabalhador estaria ao serviço” - e o artigo 238.º do CT.


Sobre o problema da contagem dos dias de férias e o texto do n.º 3 do artigo 238.º do CT, Milena Rouxinol, in Prontuário de Direito do Trabalho, 2018-I, CEJ, p. 335 e ss., a propósito da análise de uma situação hipotética de um trabalhador prestar trabalho em seis ou em quatro dias por semana, conclui, recorrendo ao elemento teleológico da interpretação, que deve ser feita uma interpretação restritiva do n.º 3 do artigo 238.º do CT, que só se aplica se os dias de descanso do trabalhador, não sendo o sábado e o domingo, forem dois; já nas restantes situações, aplica-se o n.º 2 daquele artigo, computando-se os vinte e dois dias úteis de férias, excluindo-se apenas o sábado e o domingo.


Improcede, pois, o recurso de revista.


IV. - Decisão


Atento o exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Social julgar improcedente o recurso de revista.


Custas a cargo do Autor.


Lisboa 08 de março de 2023


Domingos José de Morais (Relator)


Mário Belo Morgado


Júlio Gomes