1–A representação, em juízo e fora dele, de uma associação sem fins lucrativos, pessoa colectiva, cabe a quem os estatutos determinarem ou, na falta de disposição estatutária, à administração ou a quem por ela for designado.
2–Definindo os estatutos da associação que a sua representação em juízo e fora dele compete à sua direcção, a presidente da mesa da assembleia geral, não fazendo parte da direcção, não tem poderes de representação daquela entidade, ainda que possa designar o presidente da direcção e metade dos seus membros.
3–A presença de uma influência dominante por parte de uma associada, com o poder de influir na gestão da entidade participada, não afecta a existência formal desta como pessoa jurídica distinta daquela, representada pelos respectivos órgãos próprios.
4–A razão de ser da inabilidade para depor como testemunha de quem pode depor como parte justifica-se pela suspeição que se presume relativamente a quem depõe sobre factos que lhe interessam, ou seja, por quem é um dos titulares do conflito de interesses.
5–Há que distinguir o depoimento de parte e a confissão: o primeiro é apenas o meio processual de provar a segunda; pode existir depoimento sem haver confissão, assim como pode haver reconhecimento da realidade de factos desfavoráveis ao depoente e favoráveis à parte contrária, a que não possa atribuir-se eficácia confessória específica, o que sucede se o depoente não tiver a necessária capacidade jurídica para dispor do correspondente direito.
6–Quem exerce as funções de vogal da direcção de uma associação, órgão que estatutariamente representa a entidade, ainda que, por si só, não a possa obrigar, não pode depor como testemunha, porque pode depor como parte.
7–A alteração do requerimento probatório na audiência prévia tanto pode corresponder a uma substituição de provas anteriormente requeridas como a um aditamento de provas novas, não estando este limitado à prova testemunhal.
8–A apresentação de um requerimento de alteração do rol de testemunhas, ao abrigo do disposto no artigo 598º, n.º 2 do Código de Processo Civil, não implica, no silêncio quanto aos demais meios de prova anteriormente propostos, renúncia a qualquer um deles.
9–Concedido prazo para a reformulação dos requerimentos probatórios aduzidos nos articulados pelas partes, findo tal prazo, incumbe ao Tribunal, antes de agendar a audiência final e fixar a respectiva programação, proferir decisão sobre a admissão ou não admissão dos meios de prova propostos, sejam os inicialmente apresentados, sejam os que tenham sido objecto de alteração.
10–Sendo proferido tal despacho sem que tenha existido pronúncia do Tribunal sobre um dos meios de prova requeridos, tal decisão é nula por omissão de pronúncia, nulidade apenas susceptível de ser invocada no âmbito de recurso de apelação autónomo a que há lugar, pelo que, não sendo o despacho impugnado, se consolida com carácter definitivo no processo.
I–RELATÓRIO
A, NIF 1........, residente na Rua ..... ....., Nº..., ...º Esq.-L_____ intenta contra B, NIF 5........, com sede na Av. ..... ..... ....., E... I.....-I....., .....-..... - L_____ acção declarativa de condenação, com processo comum formulando os seguintes pedidos:
a)-A condenação da ré no pagamento ao autor de uma indemnização, a título de danos patrimoniais (danos emergentes e lucros cessantes), cujo quantitativo se relega para liquidação em execução de sentença e uma indemnização a título de danos não patrimoniais, de valor nunca inferior a 50 000,00 € (cinquenta mil euros), tudo acrescido de juros de mora vencidos e vincendos, calculados à taxa legal de 4%, até efectivo e integral pagamento.
Alega, muito em síntese, o seguinte (cf. Ref. Elect. 24347333 dos autos principais):
– A B, anteriormente designada ....., é uma associação sem fins lucrativos criada pelo I...../I....., instituto universitário público, onde o autor é docente de carreira, desde Setembro de 2008, tendo exercido funções em regime de exclusividade, até Abril de 2013;
– No dia 14/11/2014, em Assembleia-geral Extraordinária, foram empossados, por unanimidade, dois novos elementos da Direcção da Associação I...../I.....: o autor, Presidente, e N.A., vogal;
– No dia 18/04/2013, teve lugar a assembleia geral ordinária (anual), com a eleição de novos Órgãos Sociais, na qual o autor foi empossado como Presidente da Direcção da Associação I...../I....., para um primeiro mandato de quatro anos, ficando o autor afectado a 100% a tais funções, sem funções lectivas;
– Em 2016 o autor foi proposto aos associados para um segundo mandato de 4 anos, para o quadriénio 2017-20 e foi aprovada a retribuição devida, com um aumento de 8%, assim como a manutenção da compensação integral do I...../I..... pelos encargos proporcionais à afectação dos seus docentes de carreira, sendo aprovado o modelo de remuneração variável da Comissão Executiva em 3-05-2017;
– No dia 24/10/2018 teve lugar uma assembleia geral extraordinária, promovida pelo Associado I...../I....., para alteração dos estatutos da associação I...../I....., que, aprovada, implicou a dissolução dos órgãos sociais;
– No dia 08/11/2018 teve lugar a assembleia geral extraordinária, na qual foram eleitos os novos órgãos sociais da associação I...../I....., sendo que todos os membros dos órgãos sociais foram reconduzidos, com excepção dos cinco elementos da Direcção que constituíam a Comissão Executiva e haviam sido indicados a 05/01/2017 pelo I...../I....., sendo agendada a passagem de pastas para o dia 8-11-2018, altura em que a Comissão Executiva Cessante, questionou a Comissão Executiva Empossada sobre as compensações daqueles que acabavam de ver o seu mandato interrompido, que disse nada conhecer sobre o tema;
– A Comissão Executiva interina (Comissão Executiva Empossada) foi substituída no dia 31/01/2019 e nunca deu qualquer indicação sobre o assunto das compensações, vindo mais tarde a considerar não aplicável a atribuição de prémios deliberada em assembleia geral;
– Veio a verificar-se que toda a informação relativa ao autor, desde 1987, esteve exposta a qualquer utilizador do I...../I..... (cerca de 10.000 pessoas), do que o autor apresentou queixa-crime contra desconhecidos na Polícia Judiciária (Processo 73/19.2JGLSB);
– Não foram efectuados os pagamentos de coordenação de EMBA em que o autor estava envolvido e em Fevereiro de 2019, verificou que deixou de figurar como docente das Unidade Curriculares Tópicos Avançados de Empreendedorismo e Tópicos Avançados de Gestão do EMBA, que coordenava e leccionava com professores estrangeiros, assim como deixou de figurar na direcção do Mestrado Executivo em Gestão Empresarial;
–Tendo recusado renunciar ao cargo de Administrador não-Executivo da Transcom, para o qual tinha sido eleito para o período 2017-20, o seu afastamento foi aprovado em 28-03-2019;
–Contra o autor foi encetada uma campanha difamatória, desestabilizadora e intimidatória, pelo menos entre a primeira semana de Novembro de 2017 e Junho de 2018, com o envio de SMS anónimos para docentes do I...../I....., para a esposa e para o próprio autor, de que apresentou uma queixa;
– Foi vítima de assédio moral, consubstanciada na execução de uma estratégia integrada e persecutória, com efeitos diversos, com implicações directas na sua pessoa, nas suas relações profissionais, familiares e a nível psicológico, o que causou prejuízos na sua esfera pessoal, material e profissional, vendo afectada a sua credibilidade profissional;
– Não é possível prever o valor que os membros das Comissões Executivas da associação I...../I..... e da associação I...../I..... PROJECTOS iriam receber relativamente a 2018, 2019, 2020, nem se haveria lugar ao pagamento dos prémios de mandatos, mas seria expectável pelo menos 30 000 € relativos à associação I...../I..... e 10 500 € referentes à Associação I...../I..... PROJECTOS, para além de dos valores que deixou de auferir pelo seu afastamento dos diversos cargos de direcção que ocupou;
– Nos anos em que presidiu à Associação I...../I..... e à Associação I...../I..... PROJECTOS, o autor obteve sempre a classificação máxima na avaliação anual de desempenho do I...../I....., sendo que o afastamento do cargo de Presidente e das direcções dos programas implica também perda em termos dessa avaliação;
– A forma com o autor foi afastado, primeiro com recurso a uma campanha anónima desacreditando a sua idoneidade, a que se seguiram meses de assédio moral e, por fim, um afastamento intempestivo e impeditivo de uma saída comunicada, gerou danos reputacionais que são de especial gravidade;
– O afastamento prematuro do autor é suscetível de gerar, no círculo académico e profissional, incompreensão que suscita a suspeita quanto a comportamentos que àquele fossem imputáveis, com impacto no futuro profissional, na sua reputação social e até mesmo ao nível da auto-estima pessoal, o que se repercutiu na sua saúde psíquica.
Na sua petição inicial o autor apresentou o seguinte requerimento de prova:
“Prova:
A)–Testemunhas:
1)–Álvaro....., a notificar na Ordem dos E....., Avª. ..... ..... ....., N.º .....-D, .....-..... - L_____;
2)–Gonçalo....., a notificar na Altice, Avª. ..... ..... ....., Nº..., .....-.... - L_____;
3)–José....., a notificar nos CTT, Avª. D. ..... ...., L... ....-....-...., .....-... - L_____;
4)–Luís....., a notificar na Rua ....., N.º ..., .....-... - L____;
5)–Márcio....., a notificar na Rua ..... ..... ....., Nº..., R/C ..., .....-.... - P____.
6)–Pedro....., a notificar no M..... do A..... de C....., .....-... -M______-...-N_____.
7)–Tarcísio ....., a notificar no M..... - BCP, Avª. ... ..... ..... (T____), E____. Nº..., -.....-..... - P_____ S_____.
B)–Requer a prestação de Depoimento de Parte pela Ré, aos factos alegados nos artigos 1 a 117 e 122 a 150 do presente articulado;
C)–Requer a prestação de Declarações de Parte do A., aos 3 a 117,122 a 150, 165, 169, 170 e 179 deste articulado.
D)–Requer a notificação da Ré para juntar aos autos:
1)-Acta da Assembleia-geral realizada em14/11/ 2012;
2)-Acta da Assembleia-geral realizada em 04/04/2013;
3)-Acta da Assembleia-geral realizada em 18/04/2013;
4)-Acta da Assembleia-geral realizada em 05/01/2017;
5)-Acta da Assembleia-geral realizada em 03/05/2017
6)-Acta da Assembleia-geral realizada em 14/06/2018
7)-Acta da Assembleia-geral realizada em 24/10/2018
8)-Acta da Assembleia-geral realizada em 08/11/2018
9)-Acta da Direcção realizada em 24/04/2018.”
A ré contestou suscitando a sua ilegitimidade passiva para ser parte nesta acção pela circunstância de, apesar de o autor ter sido presidente da Comissão Executiva da ré, tudo o que serve de fundamento à acção não é responsabilidade desta, que não dispõe de poder para indigitar ou demitir o seu presidente e a sua Comissão Executiva, pelo que os factos não lhe são imputáveis.
Mais impugnou parcialmente o alegado na petição inicial, reiterando que a destituição do autor foi legal e válida, não tendo por ele sido impugnada; o autor tinha conhecimento dos motivos objectivos e concretos invocados para que que tivesse perdido a confiança de quem tinha/tem legitimidade para o nomear e destituir, relativamente ao que a ré não tem qualquer poder, pelo que a presente acção não tem qualquer fundamento; mais argumentou que a nova comissão executiva se deparou com uma situação de descontrolo operacional, financeiro e fiscal, o que exigiu uma resolução urgente dos problemas e devido aos resultados negativos decidiu não pagar prémios aos funcionários e à comissão executiva cessante do I.....; em síntese, a decisão de destituição do autor não padece de qualquer vício e foi tomada por quem para tanto tinha legitimidade, assim como o autor a não contestou, pelo que não tem fundamento a pretensão de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais por ela causados.
Conclui pugnando pela procedência da excepção dilatória e, assim se não entendendo, pela improcedência da acção (cf. Ref. Elect. 24730827 dos autos principais).
Na sua contestação a ré apresentou o seguinte requerimento probatório:
“Prova
I–Documental:
Os 6 documentos ora juntos.
II–Testemunhal:
Ana....., vogal da Direcção, I...../I....., Avª. ..... ..... ....., .....-... - L_____.
João....., docente universitário, I...../I....., Avª. ..... ..... ....., .....-..... - L_____.
Susana....., docente universitário, I....., Av.ª das ..... ....., .....-...- L_____.
Maria....., Reitora, I....., Av.ª das ..... ....., .....-..... - L_____.
José....., Vice-Reitor, I....., Av.ª das ..... ....., ....-... - L_____.
Celeste....., Gestora de Programa, I...../I....., Avª. ..... ..... ....., ....-... - L_____.
Duarte....., Rua D. ..... ..... ....., nº..., c/esq., ....-... - L_____.
Paulo....., CGD, ..... ..... ...., Nº ..., ...º piso, ....., .....-.... - L_____.
Jorge....., EDP, Avª. ...... ....., Nº ...., 2º, .....-..... - L_____.
José....., CTT, Avª. D. ..... II, Nº ...., ...º piso, ....-... - L_____.
Requer-se desde já a gravação da prova e notificação das testemunhas arroladas.”
Em 20 de Janeiro de 2020 foi proferido despacho que ordenou a notificação do autor para identificar os factos cuja prova pretende efectuar através da junção das actas que identifica na petição inicial, o que este veio fazer por requerimento de 31 de Janeiro de 2020 (cf. Ref. Elect. 393571102 e 25389437 dos autos principais).
Por requerimento de 26 de Dezembro de 2019, o autor pugnou pela improcedência da excepção (cf. Ref. Elect. 25037920 dos autos principais).
Em 15 de Outubro de 2020 teve lugar a realização da audiência prévia, tendo sido efectuado o saneamento dos autos, julgando-se, entre o mais, improcedente a excepção de ilegitimidade passiva, foi fixado o objecto do litígio, elencaram-se factos já considerados assentes e foram enunciados os temas da prova (cf. Ref. Elect. 399616192 dos autos principais).
Foram ainda apreciados os requerimentos de prova indicados pelas partes nos seus articulados, sendo proferido o seguinte despacho:
III- Admitem-se os róis de fls. 24 (7) e de fls. 50 verso e 51 (10).
***
Dada a palavra aos ilustres mandatários das partes, para querendo, alterarem os seus meios de prova, os mesmos requereram o prazo de dez dias para virem reorganizar os meios de prova. Este pedido foi deferido, em face do que o agendamento da audiência ficou reservado para o momento ulterior à indicação dos aludidos meios.”
Na sequência da audiência prévia e do prazo que ali lhes foi concedido para o efeito de reorganização dos meios de prova, a ré apresentou o seu requerimento probatório em 26 de Outubro de 2020, com o seguinte teor (cf. Ref. Elect. 27510157 dos autos principais):
“Prescinde da testemunha Susana...... .
Por outro lado, requer que em substituição da supra referida testemunha, seja aditada ao rol de testemunhas
- Rui....., Avª. ..... ..... ....., E____ I.....-I....., .....-... - L____.
Requer ainda, ao abrigo do disposto no art.º 466º do Código de Processo Civil, as declarações de parte do seu legal representante aos seguintes números dos temas da prova: 1, 2, 3 e 11 a 28.”
Por sua vez, o autor apresentou o requerimento de 27 de Outubro de 2020, com o seguinte teor (cf. Ref. Elect. 27514299 dos autos principais):
“A , A. nos autos do processo à margem identificado, em que é Ré a B, vem indicar o rol de testemunhas, nos termos do art.º 598.º, nº2 do C.P.C.:
1-Paulo....., Professor Universitário, a notificar na Av.ª ..... ....., em .....-... - L_____; pontos 1, 2, 11 a 13, 15 a 17 e 21 a 28 dos temas da prova;
2-Luís ......., Professor ....., a notificar na Rua ..., Nº..., em ....-... - L_____; pontos 4, 7 a 10 e 12 a 20 dos temas da prova;
3-Rogério....., Professor ....., a notificar na Praceta ..... ....., Nº..., em ....-... - C_____; pontos, 2, 7, 9, 11, 15 a 20 e 26 a 28;
4-Márcio....., Professor ....., a notificar na Rua ..... ..... ....., Nº..., r/c B, em ....-... - P_____; pontos 1, 2, 7, 11 a 14 e 18 a 28 dos temas da prova;
5-Maria....., Consultora, a notificar na Rua ..... ......, Nº..., ...º Esq., em ....-... - L_____; pontos 3 a 6, 9 e 10 dos temas da prova;
6-Pedro....., Diretor ....., a notificar no ..... ..... ....., em ....-... - M_____- N_____; pontos 3, 4 e 14 dos temas da prova;
7-José....., Farmacêutico, a notificar na Rua ..... ....., Nº..., ...º Dto., em ....-... - L_____; pontos 1 e 25 dos temas da prova;
8-Dr. Custódio....., Médico ....., a notificar na ..... das ..... de ....., Nº..., em ....-... - L_____; ponto 10 dos temas da prova.”
Em 29 de Outubro de 2020 foi proferido despacho que, para além da marcação da audiência de julgamento, se pronunciou sobre os requerimentos de 26 e 27 de Outubro de 2020, nos seguintes termos (cf. Ref. Elect. 400004797 dos autos principais):
“II– Admitem-se os róis e as declarações de parte do legal representante da R.”
Em 8 de Junho de 2021 o autor dirigiu aos autos um requerimento com o seguinte teor (cf. Ref. Elect. 2948633 dos autos principais 4):
“Paulo....., A. nos autos do processo à margem identificados, em que é Ré a Associação I_____/I_____ Executivo Education, vem expor e requerer:
1.- Em 18/10/2019, o A. na PI requereu:
“a)- a prestação de depoimento de parte pela Ré, aos factos alegados nos artigos 1 a 117 e 122 a 150 do presente articulado;
b)- a prestação de declarações de parte do A., aos 3 a 117, 122 a 150, 165, 169, 170 e 179 deste articulado”.
2.-Em 15/10/2020, foi proferido despacho saneador: “… Admitem-se os róis de fls. 24 (7) e de fls. 50 verso e 51 (10).” E
“… Dada a palavra aos ilustres mandatários das partes, para querendo, alterarem os seus meios de prova, os mesmos requereram o prazo de dez dias para virem reorganizar os meios de prova.”
3.-Em 27/10/2020, o A. apresentou novo rol de testemunhas reorganizado.
4.-Manteve o requerimento para a prestação de declarações de parte do A. e depoimento de parte do representante da R., apresentado anteriormente.
5.-Em 29/10/2020, foi proferido despacho que admitiu “… os róis e as declarações de parte do legal representante da R.”
6.-Certamente por lapso, não proferido despacho quanto às requeridas declarações de parte do A. e depoimento de parte do representante da R..
7.-O A. mantém interesse na prestação de declarações de parte do A. e no depoimento de parte do representante da R., requeridas em 18/10/2019.
8.-O representante legal da R. está notificado para comparecer, por terem sido admitidas as suas declarações de parte, não sendo necessário expedir nova notificação.
9.-O mesmo se diga do A., que estará presente no início da audiência de julgamento.
Termos em que se reitera o interesse do A. nas requeridas diligências probatórias.”
Em 9 de Junho de 2021 teve início a realização da audiência final (cf. Ref. Elect. 406281254 e 406307818 dos autos principais), que prosseguiu no dia 16 de Junho de 2021 (cf. Ref. Elect. 406464719 dos autos principais), sessão em que pelo ilustre mandatário do autor foi suscitada a inabilidade da testemunha Maria....., alegando que esta é a reitora da instituição I....., estando a ré identificada como I...../I....., logo, como uma única entidade, pelo que aquela representa a ré e como tal é inábil para depor como testemunha.
Sobre esta matéria pronunciou-se o ilustre mandatário da ré referindo que estão em causa duas instituições diferentes, sendo que a ré, escola privada que ministra mestrados, tem obviamente uma ligação com o I....., mas a testemunha é apenas e tão-só reitora do I....., uma escola pública e representa exatamente a instituição I..... na assembleia geral da qual o I..... faz parte.
De seguida, foi proferido o seguinte despacho:
“Suscitada a questão da inabilidade da testemunha Maria..... para depor enquanto testemunha, constata-se que a mesma não detém poderes para representar a R.. Trata-se, aliás, de questão já suscitada nos autos.
Questionada Maria..... sobre a mesma questão, por esta foi dito que, efetivamente, não detém essa capacidade.
Assim, entende-se que é hábil para depor enquanto testemunha, indeferindo-se o requerido pelo A..”
Aquando do início da inquirição da testemunha Ana Maria..... e após a sua identificação, pelo ilustre mandatário do autor foi elaborado requerimento a suscitar a sua inabilidade com fundamento no facto de ter a qualidade de membro da comissão executiva, pertencer a um dos órgãos sociais do I....., pelo que, face ao que a própria declarou, se verifica a inabilidade para depor na qualidade de testemunha.
A ré respondeu referindo que o seu rol foi apresentado em 2019, todas as testemunhas são conhecidas, sabe-se quais são as suas funções e sabe-se o que representam e como tal são testemunhas que à face da lei podem ser arroladas; admitiu que a testemunha Ana..... é efetivamente um dos membros da comissão executiva que tomou posse após a destituição do autor e que vem prestar declarações enquanto testemunha e com conhecimento dos factos, sendo que quem representa a ré e vem prestar declarações de parte é o presidente da comissão executiva, pelo que a testemunha não é inábil.
Foi então proferido o seguinte despacho:
“Não se alcança que a testemunha possa depor como parte, pelo que se entende ser hábil para depor. Assim indefere-se o requerido.”
Em 16 de Junho de 2021 foi ainda proferido o seguinte despacho (cf. Ref. Elect. 406505334 dos autos principais):
“O A. carreou para os autos requerimento datado de 8-6-2021, às 18.18 h, em que termina dizendo que reitera o seu interesse nas requeridas diligências probatórias.
Aduz:
- que na petição inicial requereu:
a)- a prestação de depoimento de parte pela Ré, aos factos alegados nos artigos 1 a 117 e 122 a 150 do articulado;
b)- a prestação de declarações de parte do A., aos 3 a 117, 122 a 150, 165, 169, 170 e 179 do articulado;
- que em 15/10/2020, foi proferido despacho em que se admitiram os róis de fls. 24 e 51 e em que se concedeu o prazo de dez dias para as partes virem reorganizar os meios de prova.
- que em 27/10/2020, apresentou novo rol de testemunhas reorganizado;
- que manteve o requerimento para a prestação de declarações de parte do A. e depoimento de parte do representante da R., apresentado anteriormente;
- que em 29/10/2020 foi proferido despacho que admitiu os róis e as declarações de parte do legal representante da R.;
- que, certamente por lapso, não foi proferido despacho quanto às requeridas declarações de parte do A. e depoimento de parte do representante da R..
Termina reiterando o seu interesse nas diligências probatórias indicadas.
***
O alegado pelo A. é factual, excepto no que se reporta à alegação de que manteve o requerimento para a prestação de declarações de parte do A. e depoimento de parte do representante da R., apresentado anteriormente.
O A. apresentou novo rol e nada disse no que se refere ao depoimento de parte do R.. Deixou, assim, precludir a possibilidade que lhe é conferida pelo disposto no art.º 598.º/1 do C.P.C..
Aquando da produção da petição inicial o autor não tem meios de saber se a matéria alegada, ou parte dela, será confessada, nem qual a matéria que será selecionada para efeitos de temas da prova. Assim, o requerimento da prestação de depoimento de parte poderá deixar de ter interesse: porque a matéria indicada foi confessada ou porque não foi selecionada para integrar a matéria sobre a qual deverá ser produzida prova.
No caso vertente foi concedido prazo para reorganização de meios de prova. O A. reorganizou o rol de testemunhas e nada mais disse.
Em todo o caso, mesmo a entender-se que houve omissão por parte do tribunal, ao não ter decidido a propósito da admissibilidade do depoimento de parte do R. por remissão para a petição inicial, o despacho que admitiu os meios de prova - e que admitiu as declarações de parte do R., por terem sido expressamente pedidas pelo R. - foi proferido em 29-10-2020.
A ter existido nulidade, o prazo para a respectiva arguição é de 10 dias (art.º 199.º e art.º 149.º/1, ambos do C.P.C.).
Assim, por um lado, o A. deixou cair os pedidos de produção de prova referidos. Por outro, ficou precludida a possibilidade de arguir eventual nulidade de omissão de despacho.
No que se refere à prestação de declarações de parte do A., por poderem ser requeridas até ao início das alegações orais em 1.ª instância (art.º 466.º/1 do C.P.C.), admitem-se as mesmas.
***
Notifique.”
Em 23 de Junho de 2021 o autor apresentou recurso de apelação insurgindo-se contra os despachos proferidos em 16 de Junho de 2021 que indeferiram o requerimento por si deduzido de inabilidade das testemunhas Maria..... e Ana....., concluindo do seguinte modo as suas alegações (cf. Ref. Elect. 29621749):
A.–Em 16/06/2021, pelas 09h30m e continuação às 13h45, realizou-se uma das sessões de julgamento, na qual foram inquiridas várias testemunhas, a Reitora do I...../I....., - Maria..... e a Vogal da Comissão Executiva da R., Ana Maria......
B.–O A. requereu que fosse declarada a inabilidade de ambas as testemunhas para depor, o que foi inferido pelo Tribunal a quo, tendo as identificadas testemunhas prestaram o seu depoimento.
C.–A R. é uma associação sem fins lucrativos criada pelo I...../I....., do qual a Reitora é o órgão superior de governo e de representação externa (art. 22º dos Estatutos do I.....).
D.–O art. 486º, n.º 2, do CSC estabelece que existe uma presunção de domínio se uma sociedade tiver a possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão de administração ou do órgão de fiscalização de outra sociedade.
E.–O ISCTE-IUL exerce uma relação de domínio direto sobre a R., na medida em que a sua posição na Assembleia-Geral influirá, direta ou indirectamente, na designação que por esse modo possa fazer de membros dos corpos sociais ou através da pressão que (ainda que ilegitimamente; ou nem tanto…) possa exercer sobre estes, devido à posição que ocupe na sociedade.
F.–Pelo que, objetivamente, a Reitora do I...../I....., representando o I..... que, por sua vez, domina a R., representa, também, a Associação I...../I....., ora R.
G.–No minuto 22m26s do seu depoimento, a testemunha Maria ..... assume, expressamente, a existência de uma relação de domínio do I....., de que é Reitora, sobre o R., que determina a existência, inclusive, de “um dever de prestação de contas.”
H.–Cfr. Ac. do STJ de 15/11/1990, Proc. Nº 079739, a inabilidade para depor como testemunha resulta de motivos de ordem moral, sendo «inábil, para depor como testemunha, num processo em que é parte, a sociedade comercial onde trabalha o administrador, tesoureiro da mesma, pois que a sua qualidade de administrador é que é relevante para a representação da sociedade e não o facto de não exercer funções de gerência».
I.–Se a pessoa singular, relativamente à pessoa colectiva, tem poderes para a prática de actos de apenas eficácia interna, estamos perante poderes de administração ou gestão; Se o acto tem eficácia sobre terceiros, verifica-se o exercício de poderes de representação.
J.–A este propósito, o art. 496º do CPC estabelece que “estão impedidos de depor como testemunhas os que na causa possam depor como partes”, não esclarecendo os artigos 452º a 465º a quem, tratando-se de pessoas colectivas, pode ser exigido o depoimento de parte, na medida em que art.º 453º apenas esclarece que «o depoimento só tem valor de confissão nos precisos termos em que (…) estes possam obrigar os seus representados».
K.–Se do Artigo 163.º, nº 1, do Código Civil decorre que o depoimento de parte poderá sempre ser exigido a quem represente a pessoa colectiva, obrigando-a, em termos estatutários, não resulta do normativo indicado que o depoimento de parte possa ser, também, exigido aos que, em termos de facto, «possam obrigar» a pessoa colectiva na acepção do art.º 453º do CPC.
L.–Não existindo norma legal que, de forma expressa, permita estabelecer uma relação de grupo ou domínio entre sociedades comerciais e associações sem fins lucrativos, deve ser aplicado, por analogia, o disposto no art. 486.º do Código das Sociedades Comerciais, que no seu nº 2 dispõe que «Presume-se que uma sociedade é dependente de uma outra se esta, directa ou indirectamente: (…) c) Tem a possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão de administração ou do órgão de fiscalização”.
M.–Retornando ao caso concreto, o art. 16º, n.º 2, dos estatutos do R., prevê que “o Reitor do I..... designa o Presidente da Direção (...)” e o n.º 3 prevê que “o Reitor do I...../I..... designa metade dos restantes membros da Direção, sendo a outra metade eleita pela Assembleia Geral”, assim se estabelecendo (também) uma relação de domínio (dupla), em que a R. é a sociedade (Associação) dominada e o I..... a dominante, na medida em que o I..... comanda/dirige/orienta diretamente a R. - I....., que tem inclusive um dever de prestação de contas, e na medida em que a sua posição na Assembleia-Geral influirá, direta ou indirectamente, na designação que por esse modo possa fazer de membros dos corpos sociais ou através da pressão que (ainda que ilegitimamente; ou nem tanto…) possa exercer sobre estes, devido à posição que ocupe na sociedade.
N.–O que determina a inabilidade da “testemunha” Maria de Lurdes ..... para depor como testemunha.
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O.–A mera consulta à certidão permanente da R. (Código de acesso: 7222-8321-6033), permite constatar que é a Direção que representa a Associação e que esta se obriga pela assinatura conjunta de dois membros da Direção.
P.– À Direção compete exercer todos os poderes necessários à execução das atividades que se enquadrem nos objetivos do I...../I......, designadamente representar o I...../I..... em juízo e fora dele (art. 17º, n.º 1, al. a) dos Estatutos da R.).
Q.–Após consulta do organograma disponível no sítio eletrónico https://execed.iscte-iul.pt/iscte-eeexperience, constata-se que a testemunha Ana..... integra a Direção da R.
R.–Se quem administra a sociedade está impedido de prestar o seu depoimento como testemunha num processo judicial em que a mesma é interveniente, então, significa que a testemunha Ana..... estava material e objetivamente impedida de o fazer, apesar de o ter feito…
S.–De acordo com as normas estatutárias que regem a atividade da R., a Vogal da Comissão Executiva, enquanto membro da Direção, tem poderes para representar a sociedade e, nesse conspecto, não podia ter prestado o seu testemunho, nos termos do art. 496º do CPC, porquanto poderia ser parte na ação.
T.–Embora não tenham sido juntos aos autos as actas de nomeação da direcção do R., basta consultar a página WEB do R. (https://....././.....-..../.pt/..../-...-.....) para verificar que, quer a “testemunha” Rui....., quer a “testemunha” Ana....., que assinaram a procuração junta aos autos e a ratificação do processado pelo faltoso mandatário do R., são efectivamente seus directores (Vogais da Direcção de que é presidente José.....).
U.–Nos termos do Artigo 163.º, nº 1, do Código Civil, (aplicável às Associações, cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26-10-2017, tirado no Processo 97231/15.8YIPRT.L1-8): «A representação da pessoa colectiva, em juízo e fora dele, cabe a quem os estatutos determinarem ou, na falta de disposição estatutária, à administração ou a quem por ela for designado.».
V.–Na ata de audiência de partes de 25/09/2019 (proc n.º 1528/19.4T8EVR) consta que “(…) verificando estar presente o Autor acompanhado do Il. Mandatário, Dr. VM (…), o legal Representante da Ré, Ana..... (…)”.
W.–E nos presentes autos, em 17/03/2020, a R. juntou aos autos procuração forense e a declaração de ratificação do processado (ref. Citius n.º 25858785), documentos que foram assinados pela ora “testemunha” Ana.....; Ou seja, bastaria a verificação da procuração forense e da declaração de ratificação para constatar que a aludida testemunha poderia ser parte no processo, porquanto constituiu mandatário para assumir a sua representação em juízo.
X.–Pelo exposto, ao admitir o depoimento da “Testemunha” Ana ....., o tribunal a quo violou o art.º 163.º, nº 1, do Código Civil, bem como, o art.º 496º do CPC
Y.–De qualquer forma, o despacho recorrido está viciado a montante, não apenas por ter omitido, face ao que consta da procuração e ratificação do processado, juntos aos autos, qualquer diligência a fim de apurar previamente da identidade das pessoas singulares que representam legalmente o R., como, ao não fazer a mais breve referência a qualquer facto concreto, na rejeição da inabilidade pelo A. suscitada, está ferido de nulidade, por falta de fundamentação,
Z.–Justificando, até por esse motivo, a junção aos autos dos documentos relevantes para o esclarecimento das qualidades apresentadas pelas “Testemunhas” supra identificadas relativamente ao R. enquanto Pessoa Colectiva, cuja junção deveria o tribunal a quo ter oficiosamente efectuado a fim de permitir a instrução do processo.
Conclui pela procedência do recurso com a consequente revogação do despacho recorrido e sua substituição por outro que declare a inabilidade das “testemunhas” Maria..... (Reitora do I.....) e Ana..... (Vogal da Comissão Executiva da R.) para prestar depoimento, e a consequente nulidade dos testemunhos prestados.
A ré/recorrida contra-alegou concluindo as suas alegações do seguinte modo (cf. Ref. Elect. 29816991):
Veio o A. ora Recorrente/Apelante colocar em causa, dois despachos do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo Central Cível de Lisboa, Juiz 8, que indeferiram os requerimentos por aquele apresentados, relativos à pretensa declaração de inabilidade das testemunhas da Ré, Maria..... e Ana..... .
B.–Ora, sendo do perfeito conhecimento do A. e ora Recorrente, que o acto por este praticado – recurso de apelação – se encontra sujeito ao pagamento de taxa de justiça, o mesmo não o fez,
C.–Nem aquando da prática do acto em si mesmo – no dia 23 de Junho de 2021 – nem tão-pouco o fez até ao presente momento,
D.–Razão pela qual, face ao inequívoco incumprimento por parte do A. e ora Recorrente, devem as suas alegações ser desentranhadas.
E.–No entanto, e no caso de assim não ser entendido por V.ª Exas., sempre se dirá que:
F.–Face aos dois requerimentos apresentados pelo ora Recorrente a suscitar a inabilidade para depor das testemunhas Maria..... e Ana Maria....., e em consequência, dos dois despachos proferidos pela Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, no sentido de considerar as referidas testemunhas como hábeis, interpôs o Recorrente o presente recurso.
G.–Dividindo as conclusões por cada uma das matérias em causa, e no que respeita à pretensa inabilidade da testemunha Maria....., importa começar por afirmar, conforme fica provado pelas transcrições supra expostas, que o Recorrente falta à verdade quando afirma que, aos costumes, a testemunha afirmou que o I..... só existe por vontade do I.....,
H.–Tal como fica igualmente inequívoco não existir nenhum tipo de inabilidade por parte da testemunha, conforme doutamente foi decidido pela Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, uma vez que a testemunha, não sendo membro da direcção da Recorrida, nunca a poderá representar nem em juízo, nem fora dele.
I.–Acresce ter a testemunha, Reitora do I..... e enquanto Presidente da Mesa da Assembleia Geral, praticados actos dentro dos poderes que lhe estão conferidos, situação que não lhe confere poderes especiais ou a torna representante da Recorrida, o que efectivamente não é, nunca foi, nem poderá ser.
J.–A Recorrida tem um dever de reporte perante o I....., desde logo porque o este se encontra obrigado a reportar e a prestar contas perante o Tribunal de Contas
K.–Tal dever, conforme devidamente exposto ao longo das presentes alegações, não evidenciam a existência de qualquer relação de domínio do I..... sobre a Recorrida, muito pelo contrário,
L.–Sendo que a não existência de qualquer relação de domínio ficam bem claras através dos depoimentos das testemunhas Maria ....., Jorge....., representante da EDP e Paulo....., representante da CGD, declarações transcritas nas presentes alegações e para onde, por uma questão de economia processual, se remete,
M.–Podendo-se concluir, face ao que releva no presente recurso, a não existência de qualquer fundamento para que a testemunha seja considerada inábil para depor como testemunha
N.–No que concerne à pretensa inabilidade da testemunha Ana ..... Docente Universitária no I..... há 27 anos, e vogal da Comissão Executiva do I..... desde Novembro de 2018, a mesma, no presente processo, não representa a Recorrida, logo não pode depor como parte.
O.–Assim e independentemente do poder que é conferido pelos Estatutos da Ré e ora Recorrida – art.º 17º - de que todos os membros da CE a podem representar, a verdade é que, quem neste processo representa a Recorrida em Juízo, conforme atempadamente foi dado conhecimento aos autos, é exclusivamente o seu Presidente, concretamente o Prof.º JC.....,
P.–Fundamento pelo qual, uma vez apurado quem efectivamente representa a Pessoa Colectiva, e não se encontrando a testemunha Ana..... nessa condição, tal como o foi o do Tribunal a quo, não existe qualquer impedimento de que esta pudesse prestar o seu depoimento enquanto testemunha.
Q.–Pelo que, no que concerne ao facto invocado pelo Recorrente referente à testemunha Ana..... ter sido representante legal da Ré num outro processo, tal mais não demonstra do que a certeza dos argumentos expostos pela Recorrida, uma vez que, esse exemplo, demonstra na perfeição que a direcção da Recorrida, ao abrigo do que os seus estatutos definem, mandata quem efectivamente a representa, não podendo os seus outros membros, que na situação em concreto não a representam, ficar privadas do direito de ser admitidas como testemunhas.
R.–Desta forma, e tendo em consideração tudo o supra arguido, o alcance da posição assumida pelo A. e ora Recorrente relativamente ao expresso no artigo 496º do CPC, encontra-se em larga medida esvaziada por força da consagração da prova por declarações de parte estatuída no art.º 466º do CPC, conforme é referido pelo Prof. Doutor. Luís Manuel Teles de Menezes Leitão (in Código de Processo Civil Anotado, Livro II, 356, de José Lebre de Freitas),
S.–Existindo pois, face ao exposto, e segundo o mesmo autor referenciado no ponto anterior, uma evidente contradição ao pretender-se continuar a qualificar as partes com impedidas de depor como testemunhas [veja-se Sr. Prof. Doutor. Luís Manuel Teles de Menezes Leitão – Notas breves sobre o Código de Processo Civil de 2013, ROA, 2013, II/III, ps.423-434 (428)],
T.–Posição que a Recorrida corrobora em pleno.
U.–Termos em que, com base no supra expresso, é entendimento da Recorrida dever, também na parte referente à testemunha Ana ....., ser negado provimento ao recurso apresentado pelo Recorrente, devendo a referida testemunha ser igualmente declarada como hábil para depor como testemunha.
V.–Por tudo o acima exposto, devem os despachos recorridos ser integralmente mantidos pelo Venerando Tribunal ad quem, com a consequente improcedência, in totum, do recurso de apelação interposto pelo A. e ora Recorrente.
Termina pedindo o desentranhamento do recurso por falta de pagamento da taxa de justiça ou, caso assim não seja entendido, a negação de provimento.
***
Inconformado ainda com o despacho, proferido também em 16 de Junho de 2021, que não admitiu o depoimento de parte do legal representante da ré, o autor interpôs recurso de apelação concluindo as suas alegações do seguinte modo (cf. Ref. Elect. 29632762):
A.–Em 15/10/2020, em audiência prévia, a Mma. Juiz concedeu 10 (dez) dias de prazo para as partes reorganizarem os seus meios de prova.
B.–Em 26/10/2020, o R. reorganizou os seus meios de prova (ref. CITIUS n.º 27510157).
C.–Em 27/10/2020, o A. alterou o rol de testemunhas (ref. CITIUS n.º 27406377), requerendo nos seguintes termos: “A , A. nos autos do processo à margem identificado, em que é Ré a Associação I...../I..... Executivo Education, vem indicar o rol de testemunhas, nos termos do art.º 598.º, nº2 do C.P.C”
D.–Em 29/10/2020, foi proferido o seguinte despacho: “Admitem-se os róis e as declarações de parte do legal representante da R.”.
E.–Em 16/06/2021, atenta a proximidade da última audiência de julgamento (e da consequente realização das declarações de parte e do (eventual) depoimento de parte), o A. questionou a Mma. Juiz se já tinha proferido despacho acerca da admissibilidade do depoimento de parte requerido.
F.–O despacho recorrido, proferido em 17/06/2021, resulta na obliteração do depoimento de parte da Ré, tempestivamente requerido – na Petição Inicial – com uma fundamentação que se divide em dois segmentos;
G.–O primeiro segmento: «O A. apresentou novo rol e nada disse no que se refere ao depoimento de parte do R.. Deixou, assim, precludir a possibilidade que lhe é conferida pelo disposto no art.º 598.º/1 do C.P.C.».
H.–O segundo semento: «Em todo o caso, mesmo a entender-se que houve omissão por parte do tribunal, ao não ter decidido a propósito da admissibilidade do depoimento de parte do R. por remissão para a petição inicial, o despacho que admitiu os meios de prova - e que admitiu as declarações de parte do R., por terem sido expressamente pedidas pelo R. - foi proferido em 29-10-2020.
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I.–O A. não alterou o requerimento probatório nos termos do art. 598º, n.º 1 do CPC; Em consequência, não apresentou novo rol; Alterou o rol de testemunhas anteriormente apresentado, nos termos do art. 598º, n.º 2 do CPC.
J.–A alteração do rol de testemunhas não “revoga” o requerimento probatório constante dos articulados; nem quando é efectuado ao abrigo do art.º 598.º, nº2 do C.P.C.; Nem quando a alteração ocorre no momento a que se refere o nº 1 do mesmo artigo.
K.–Não se tratou de qualquer lapso, mas sim de indicação clara e expressa relativamente à restrição da alteração ao Rol de Testemunhas; E querendo reorganizar, somente, a prova testemunhal, o meio processual adequado é o requerimento para alteração do rol de testemunhas do art. 598º, n.º 2 do CPC.
L.–De resto, a alteração ao Requerimento probatório apresentado com a P.I. é admissível mesmo quando a parte se tenha limitado, na Petição Inicial, a fazer juntar um único documento, situação em que, caso ao alterar o seu requerimento probatório, ao abrigo do art. 598º, n.º 1 do CPC, a parte não faça referência aos documentos juntos com a P.I., nem por isso fica sem efeito sua junção!
M.–A alteração do rol de testemunhas não “revoga” o requerimento probatório constante dos articulados e em momento algum o A. prescindiu do Depoimento de Parte logo com a P.I. requerido, o que significa que o despacho que admitiu os meios de prova, proferido em 29-10-2020, é nulo, por omissão de pronúncia sobre os meios de prova requeridos.
***
N.–Questão diversa, é a sanação de uma tal nulidade, por falta de “tempestiva” arguição, considerando o Tribunal que, ainda que tenha havido omissão de pronúncia sobre a admissão de algum meio de prova, o A. deveria ter arguido essa nulidade no prazo de 10 (dez) dias.
O.–A solução da sanação da irregularidade, por falta de arguição tempestiva, leva à consequência de, pelo mecanismo da sanação de irregularidades processuais, se transferir para partes as consequências de um erro material da responsabilidade do tribunal.
P.–Uma tal interpretação do art.º 199º, n.º 1 e 149º, n.º 1, ambos do CPC, inculcaria numa obrigação de verificar um lapso implícito do tribunal (omissão) e a arguir a irregularidade daí resultante no prazo de 10 dias, sob pena de preclusão total do direito à produção de prova, tempestivamente requerida.
Q.–No caso vertente, a tal entendimento obsta, desde logo, o princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, na vertente do direito à produção de prova, violando também o princípio da proporcionalidade, ao impor à parte um ónus manifestamente excessivo, senão mesmo, objectivamente desrazoável, por ter como consequência uma restrição injustificada do direito à prova.
R.–Nos termos do art. 6º, nº 1 e 2 do CPC, caiba ao Tribunal dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação, adotando mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável e determinando a realização dos atos necessários à regularização da instância.
S.–Tais normas, impõe o dever de gestão processual, que o Tribunal a quo, simplesmente, obliterou, ao declarar “sanada” a omissão de despacho sobre um requerimento probatório tempestivamente formulado, que pode ser suscitada, e sanada, até ao final da audiência de julgamento.
T.–E tudo isto, sem olvidar que, no domínio da prova, o processo civil assume aliás claramente natureza inquisitória, em face do disposto no artigo 411.º do CPC, nos termos do qual se atribui ao juiz uma iniciativa probatória genérica.
U.–Aliás, sempre seria impossível definir o é o termo inicial deste prazo de 10 (dez) dias, e desde logo, porque o momento em que a prova requerida é admitida, não está legalmente fixado.
V.–Acresce ainda que, a irregularidade em causa, não foi cometida na presença das partes, pelo que, o prazo de 10 (dez) dias para arguir nulidades conta-se, nos termos do art. 199º, n.º 1, in fine, desde que “(…) deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer (…)”.
W.–Tendo pois em conta que só em consequência da interpelação do A. ao Tribunal, relativa à prolação de despacho acerca da admissibilidade do depoimento de parte requerido 16/06/2021, sendo em 17/06/2021, o A. notificado do despacho que indefere a prestação de depoimento de parte, foi apenas nesta data que o A. apenas tomou conhecimento da omissão de pronúncia acerca do depoimento de parte requerido e da consequente nulidade do despacho de 29/10/2020, estando consequentemente em prazo para arguir a nulidade que advém da omissão de pronúncia quanto à realização de diligências probatórias requeridas pelas partes.
Concluiu pela procedência do recurso com a revogação do despacho e sua substituição por outro que determine a prestação do depoimento de parte.
Não foram apresentadas contra-alegações.
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II–OBJECTO DOS RECURSOS
Nos termos dos art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil[1], é pelas conclusões do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do presente recurso, sem prejuízo das questões de que este tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. De notar, também, que o tribunal de recurso deve desatender as conclusões que não encontrem correspondência com a motivação - cf. A. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2016, 3ª edição, pág. 95.
Assim, perante as conclusões da alegação do recorrente há que apreciar as seguintes questões:
I– Recurso incidente sobre os despachos de indeferimento da declaração de inabilidade das testemunhas:
a)-Admissibilidade da junção de documentos;
b)-Nulidade da decisão por falta de fundamentação;
c)-Inabilidade para depor da testemunha Maria ...., por representar a ré;
d)-Inabilidade para depor da testemunha Ana ....., por poder depor como parte;
II–Recurso incidente sobre o despacho de indeferimento do depoimento de parte do legal representante da ré:
a)-Da revogação do requerimento probatório aduzido em sede de articulado pela alteração subsequente do rol de testemunhas;
b)-Da omissão de pronúncia sobre o pretendido meio de prova.
Colhidos que se mostram os vistos, cumpre apreciar e decidir.
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III–FUNDAMENTAÇÃO
3.1.– FUNDAMENTOS DE FACTO
Com interesse para a decisão relevam as ocorrências processuais que se evidenciam do relatório supra.
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3.2.– APRECIAÇÃO DO MÉRITO DOS RECURSOS
3.2.1.-A – Recurso incidente sobre os despachos de indeferimento da declaração de inabilidade das testemunhas
Questão Prévia – Da falta de pagamento da taxa de justiça
Nas suas contra-alegações a ré/recorrida vem referir que o recurso de apelação interposto pelo autor no dia 23 de Junho de 2021 deve ser desentranhado, porquanto, nem no dia da sua interposição, nem nos dez dias subsequentes o recorrente procedeu ao pagamento da taxa de justiça devida.
Nos termos do art.º 530º, n.º 1 do CPC a taxa de justiça é paga pelo recorrente, nos termos do disposto no Regulamento das Custas Processuais[2].
Todos os processos estão sujeitos a custas, considerando-se cada recurso como processo autónomo – cf. art. 1º do RCP.
Nos termos do art.º 145º, n.º 1 do CPC, quando a prática de um acto processual exija o pagamento de taxa de justiça, nos termos fixados pelo Regulamento das Custas Processuais, deve ser comprovado o seu prévio pagamento ou a concessão do benefício do apoio judiciário, salvo se, neste último caso, essa concessão já se encontrar comprovada nos autos.
Quando o acto processual seja praticado por via electrónica, o prévio pagamento da taxa de justiça é comprovado nos termos definidos na portaria prevista no n.º 2 do artigo 132.º do CPC, ou seja, de acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 9º da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto, com a redacção que lhe foi dada pela Portaria n.º 170/2017, de 25 de Maio, o responsável pelo prévio pagamento da taxa de justiça indica, em campo próprio dos formulários de apresentação de peça processual constantes do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais, a referência que consta do documento único de cobrança (DUC), encontrando-se dispensado de juntar ao processo o respetivo documento comprovativo do pagamento.
Analisado o formulário de apresentação do requerimento de interposição de recurso aqui em causa, com data de 23 de Junho de 2021, verifica-se que o recorrente indicou, na parte atinente a “Custas Judiciais” o seguinte: Autor: A; Descrição: Taxa de Justiça; Ref.ª (DUC): 702980077524756; Valor: 357,00 €, o que revela ter cumprido a exigência decorrente das normas supramencionadas, sem necessidade de junção do documento comprovativo do pagamento, sendo que a comprovação do prévio pagamento é efetuada automaticamente por comunicação entre o Sistema de Cobranças do Estado, o sistema informático de registo das custas processuais e o sistema informático de suporte à atividade dos tribunais, conforme decorre do n. 2 do mencionado art.º 9º da Portaria n.º 280/2013.
Ademais, acaso o pagamento da taxa de justiça devida não tivesse sido comprovado no momento definido para esse efeito, a secretaria teria de notificar o interessado para, em 10 dias, efetuar o pagamento omitido, acrescido de multa de igual montante, nos termos do art.º 642º, n.º 1 do CPC, do que não há notícia nos autos.
Constata-se, pois, o cabal cumprimento da obrigação de pagamento da taxa de justiça devida pela prática do acto (interposição do recurso).
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Da admissibilidade da junção de documentos
Juntamente com a interposição deste recurso, o recorrente, louvando-se na “manifesta relevância para o apuramento da identidade das pessoas que são formalmente legais representantes da ré”, requereu a junção dos seguintes documentos:
1.-Acta da audiência de partes do processo n.º 1528/19.4T8EVR de 25/09/2019;
2.-Procuração forense outorgada no processo n.º 1528/19.4T8EVR, com data de 19 de Novembro de 2019;
3.-Acta n.º 38/2018 da Associação INDEG/ISCTE Executive Education, que data de 8 de novembro de 2018;
4.-Escritura pública de alteração de estatutos da R. de 08/06/2021.
5.-Certidão permanente da R. (Código de acesso: 7222-8321-6033).
Os momentos normais para a junção dos documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção e da defesa são: 1) com o articulado respectivo (cf. art. 423º, n.º 1 do CPC); 2) até ao encerramento da discussão em 1ª instância com multa (ou sem ela, se feita a prova da indisponibilidade no primeiro momento) – cf. n.º 2 do art. 423º.
Depois do encerramento da causa, a junção de documentos apenas é admissível para aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior (art. 425º do CPC).
Dispõe o art.º 651º, n.º 1 do CPC: “As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância.”
Por sua vez, o art.º 425º do CPC estatui que “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.”
Da conjugação destas normas resulta que a junção de documentos em sede de recurso (junção que é considerada apenas a título excepcional) depende da alegação e da prova pelo interessado nessa junção de uma de duas situações:
a)-a impossibilidade de apresentação do documento anteriormente ao recurso, valendo aqui a remissão do artigo 651º, n.º 1 para o artigo 425º;
b)- o ter o julgamento da primeira instância introduzido na acção um elemento de novidade que torne necessária a consideração de prova documental adicional, que até aí – até ao julgamento em primeira instância – se mostrava desfasada do objecto da acção ou inútil relativamente a este.
A impossibilidade de apresentação anterior legitima as partes a utilizar no recurso, juntando-os com a motivação deste, documentos cuja apresentação não tenha sido possível até esse momento, ou seja, até ao julgamento em primeira instância, o que pressupõe aquilo que se refere como superveniência objectiva ou subjectiva do documento pretendido juntar, impondo-se que a parte demonstre a referida superveniência – cf. Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume II, 2018, pág. 313; cf. acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 5-05-2016, processo n.º 788/13.9TBSTR.E1[3].
Quanto à impossibilidade de apresentação anterior, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre referem que “Constituem exemplos de impossibilidade de apresentação (n.ºs 2 e 3) o de o documento se encontrar em poder da parte ou de terceiro, que, apesar de lhe ser feita a notificação nos termos do art. 429 ou 432, só posteriormente o disponibiliza, de a certidão de documento arquivado em notário ou outra repartição pública, atempadamente requerida, só posteriormente ser emitida [superveniência objectiva] ou de a parte só posteriormente ter conhecimento da existência do documento [superveniência subjectiva]. Acresce o caso em que o documento, com que se visa provar um facto já ocorrido e alegado, só posteriormente se tenha formado (contendo, por exemplo, uma declaração confessória extrajudicial desse facto).” – cf. Código de Processo Civil Anotado, Volume 2º, 3ª edição, pp. 240 e 241.
No que tange à necessidade da junção em virtude do julgamento da primeira instância “a lei não abrange a hipótese de a parte se afirmar surpreendida com o desfecho da ação (ter perdido, quando esperava obter ganho de causa) e pretender, com tal fundamento, juntar à alegação documento que já poderia e deveria ter apresentado em primeira instância. O legislador quis manifestamente cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão ser proferida» - cf. Antunes Varela et al, Manual de Processo Civil, 2ª edição, pp. 533-534.
Como tal, não é admissível a junção, com a alegação de recurso, de um documento potencialmente útil à causa ab initio e não apenas após a sentença, ou seja, não é admissível a junção de documentos para provar factos que já antes da decisão a parte sabia estarem sujeitos a prova, não podendo servir de pretexto a mera surpresa quanto ao resultado.
Por outro lado, uma vez que a junção de documentos tem em vista a prova de factos que hajam sido alegados, a possibilidade de junção de documentos, em sede de recurso, não poderá ter como objectivo ou finalidade a prova de factos que não hajam sido alegados. “Se os documentos visam a prova de factos alegados apenas no recurso e se, neste, o tribunal ad quem não pode atender a esses factos, não se vê qualquer utilidade na junção dos documentos com o recurso.” – cf. acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13-09-2010, relatora Paula Leal de Carvalho, processo n.º 304/08.4TTPRT.P1 disponível em www.colectaneadejurisprudencia.com
Estas considerações devem, como é evidente, ser aplicáveis mutatis mutandis à admissibilidade da junção de documentos com o recurso interposto da decisão proferida no contexto da relação processual, como é o caso.
Na situação em apreço, é patente que os documentos oferecidos pelo apelante não são objectivamente supervenientes, pois que foram produzidos antes da decisão objecto de recurso (proferida em 16 de Junho de 2021). Por outro lado, o recorrente não alegou qualquer desconhecimento sobre a existência de tais documentos para justificar a sua junção apenas em sede de recurso, referindo singelamente que são relevantes para o apuramento da identidade das pessoas que são formalmente representantes da ré.
Logo, a admissibilidade da junção só poderá fundar-se no facto de a apresentação ser necessária por virtude do julgamento proferido na 1ª instância – cf. art. 651º, n.º 1, segunda parte do CPC.
Alguma doutrina sustenta que a junção do documento será admissível sempre que a decisão se baseie numa norma jurídica com cuja aplicação as partes não tivessem contado.
De acordo com outra, a admissibilidade da junção dos documentos prevista na norma referida destina-se a contraditar, pelo documento, meios probatórios introduzidos de surpresa no processo, que venham a pesar na decisão, que determinem, embora não necessariamente de forma exclusiva, o seu sentido; ou seja, considerando a amplitude do Tribunal no tocante à indagação e interpretação das regras de direito, a junção é admissível sempre que a aplicação da norma jurídica com que as partes justificadamente não contavam seja o reflexo da introdução no processo, pelo juiz, de um meio de prova com que as partes foram, inesperadamente, surpreendidas (cf. art.º 5, n.º 3 do CPC). Quando isso suceda, a junção será sempre possível; se, pelo contrário, a aplicação, pela sentença, de norma com que as partes não contavam, não resulta da consideração de um novo meio de prova, a apresentação deve ter-se por inadmissível.
Uma outra doutrina defende que o legislador quis cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário fazer a prova de um facto ou factos com cuja relevância a parte não podia, razoavelmente, contar antes do proferimento da decisão.
Um ponto comum em todas estas orientações é o de que aquela previsão não abrange o caso de a parte se afirmar surpreendida com o desfecho da causa e visar, com esse fundamento, juntar à alegação documento que já poderia e de deveria ter oferecido na 1ª instância – cf. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 20-01-2015, relator Henrique Antunes, processo n.º 2996/12.0TBFIG.C1.
No caso em apreço, verifica-se que a situação que determinou a junção destes documentos não se enquadra em qualquer uma dessas doutrinas, desde logo, porque a decisão recorrida, no que concerne à admissão do depoimento da testemunha Ana ....., não só não fez qualquer alusão às normas jurídicas aplicadas, assim como não mencionou qualquer meio probatório em que se tivesse louvado para concluir pela não verificação da inabilidade da testemunha.
Note-se que o impedimento a que alude o art.º 496º do CPC reporta-se ao momento de prestar depoimento. É o momento da inquirição, na audiência de julgamento, que determina a possibilidade de se depor ou não como testemunha, pelo que é irrelevante que aquando da apresentação do rol de testemunhas e sua admissão nada tenha sido dito pela parte contrária ou pelo tribunal sobre a eventual inabilidade para depor de alguma das testemunhas.
Além disso, de acordo com o disposto no art. 515º, n.º 1 do CPC, existindo um dos indicados fundamentos para impugnação da testemunha, o respectivo incidente deve ser deduzido quanto terminar o interrogatório preliminar.
A parte que suscita o incidente deve alegar os concretos factos que integram o fundamento de inabilidade, caso a testemunha os tenha omitido no interrogatório preliminar e se a testemunha os tiver mencionado e o juiz não tiver obstado ao seu depoimento (cf. art.º 513º, n.º 2 do CPC), deve também a parte suscitar o incidente, sendo que neste caso a testemunha declarou ser membro da comissão executiva do I..... .
O juiz deve ouvir a parte que indicou a testemunha sobre os fundamentos invocados no incidente de impugnação (cf. art.º 3º, n.º 3 do CPC), logo admitindo ou rejeitando o incidente.
Admitido o incidente, o juiz deve convidar a testemunha a pronunciar-se sobre os fundamentos da impugnação. Se a testemunha os confirmar, sem impugnação pela parte que a arrolou, não deve ser admitido o depoimento; não sendo confirmados, inicia-se então uma fase de produção de prova com proposição de prova documental ou testemunhal pela parte que suscitou o incidente; inquirição das testemunhas (com o limite de três); decisão final sobre o incidente registada em acta – cf. art.ºs 515º e 153º do CPC.
Como referem J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre “Os prazos que têm de mediar entre o oferecimento da testemunha e a sua inquirição (cf., designadamente, os arts. 598-2 e 510-1) visam assegurar à parte contrária tempo suficiente para indagar da admissibilidade – e também da credibilidade – da testemunha, pelo que é seu ónus de estar preparada, no momento da inquirição e antes de iniciado o depoimento, para impugnar a admissibilidade deste, oferecendo e produzindo as respectivas provas.”- cf. op. cit., pág. 392.
Significa isto que era no momento em que suscitou a impugnação da admissão do depoimento que o recorrente deveria ter apresentado a prova documental passível de sustentar a invocada inabilidade, não podendo fazê-lo, agora, apenas em sede de recurso, sobremaneira quando estão em causa documentos a que poderia ter tido acesso em momento anterior à inquirição da testemunha já inicialmente arrolada, aquando da apresentação da contestação, sendo certo que nem invocou, aliás, qualquer impossibilidade de os ter apresentado antes.
Ademais, o ponto fulcral da questão reside na circunstância de a testemunha ser vogal da comissão executiva da ré, integrando a sua direcção, órgão estatutário que a representa, factos que não surgem contestados pela parte.
De todo o modo, há que ter em conta que a regra preclusiva do art.º 651º do CPC é de algum modo atenuada pela possibilidade que o art.º 662º, n.º 2, b) do mesmo diploma legal confere à Relação quanto à produção de novos meios de prova, o que abrange, seguramente, a prova documental que possa ter a virtualidade de sanar dúvidas sobre factos essenciais para a decisão.
Esta possibilidade, porém, não pode corresponder a uma supressão do ónus de proposição de meios de prova que recai sobre as partes, mas na utilização deste poder/dever a Relação deve efectuar, como refere, Abrantes Geraldes, uma apreciação crítica da acuação que o juiz de 1ª instância teve ou deveria ter tido aquando da realização da audiência, em face daquilo que lhe cumpria decidir e da amplitude dos poderes de averiguação que a lei lhe confere (cf. art.º 411ºdoCPC) – cf. op. cit., pp. 253-254.
Ora, neste caso, incumbia à senhora juíza a quo averiguar em face da resposta da testemunha ao interrogatório preliminar se ocorria efectivamente o invocado motivo para a sua inabilidade, relevando, nesse ponto, as funções de vogal da comissão executiva por aquelas mencionadas e, mais do que isso, as competências da direcção à luz dos estatutos da ré.
Por esta razão, decide-se admitir nos autos a escritura pública de alteração de estatutos da ré, não admitindo, com os fundamentos supra mencionados, os demais documentos juntos com as alegações do recurso.
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Da nulidade da decisão por falta de fundamentação
Apenas no final do corpo das alegações de recurso o autor/apelante, no seu artigo 119º, vem suscitar a nulidade do despacho recorrido – presume-se, atenta a sequência em que o artigo surge, que está em causa o despacho atinente à testemunha Ana..... – com o fundamento de nele não se fazer a mais breve referência a qualquer facto concreto para rejeitar a suscitada inabilidade da testemunha.
A senhora juíza a quo proferiu despacho admitindo o recurso interposto mas não se pronunciou sobre a arguida nulidade, como se lhe impunha, atento o disposto nos art.ºs 641º, n.º 1 e 617º do CPC (cf. Ref. Elect. 408168467dos autos principais).
A omissão de despacho do juiz a quo sobre as nulidades arguidas não determina necessariamente a remessa dos autos à 1ª instância para tal efeito, cabendo ao relator apreciar se essa intervenção se mostra ou não indispensável – cf. A. Abrantes Geraldes, op. cit., pág. 149.
Tendo presente a natureza da questão suscitada e o enquadramento que deve merecer, não se justifica a baixa do processo para a pronúncia em falta, passando-se desde já ao conhecimento da suscitada nulidade.
O despacho em referência é o seguinte:
“Não se alcança que a testemunha possa depor como parte, pelo que se entende ser hábil para depor. Assim indefere-se o requerido.”
As decisões judiciais podem estar feridas na sua eficácia ou validade por duas ordens de razões: por erro de julgamento dos factos e do direito; por violação das regras próprias da sua elaboração e estruturação ou das que delimitam o respectivo conteúdo e limites, que determinam a sua nulidade, nos termos do art. 615.º do CPC.
Dispõe o art. 615º, n.º 1 do CPC o seguinte:
“1- É nula a sentença quando:
a)- Não contenha a assinatura do juiz;
b)- Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c)- Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d)- O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e)- O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.”
Estas invalidades são aplicáveis, com as necessárias adaptações, aos despachos – cf. art.º 613º, n.º 3 do CPC.
A nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do art. 615º do CPC é reconduzida à falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito ou a sua ininteligibilidade, o que tem sido uniformemente entendido pela jurisprudência como abrangendo apenas a absoluta falta de fundamentação e não a fundamentação alegadamente insuficiente ou o desacerto da decisão.
“As causas de nulidade tipificadas nas alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 615º […] ocorrem quando não se especifiquem os fundamentos de facto e de direito em que se funda a decisão (al. b)) ou quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou se verifique alguma ambiguidade ou obscuridade que a torne ininteligível (c)). O dever de fundamentar as decisões tem consagração expressa no artigo 154º do Código de Processo Civil e impõe-se por razões de ordem substancial, cumprindo ao juiz demonstrar que da norma geral e abstracta soube extrair a disciplina ajustada ao caso concreto, e de ordem prática, posto que as partes precisam de conhecer os motivos da decisão, em particular a parte vencida, a fim de, sendo admissível o recurso, poder impugnar o respectivo fundamento ou fundamentos […] Não pode, porém, confundir-se a falta absoluta de fundamentação com a fundamentação insuficiente, errada ou medíocre, sendo que só a falta absoluta de motivação constitui a causa de nulidade prevista na al. b) do nº 1 do artigo 668º citado, como dão nota A. Varela, M. Bezerra e S. Nora (Manual de Processo Civil, 2ª ed., 1985, p. 670/672), ao escreverem “Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”. Só a total omissão dos fundamentos, a completa ausência de motivação da decisão pode conduzir à nulidade suscitada.” – cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2-06-2016, relatora Fernanda Isabel Pereira, processo n.º 781/11.6TBMTJ.L1.S1.
A figura da nulidade da sentença por falta de fundamentação constitui, assim, uma figura de muito difícil verificação, dado que a doutrina e a jurisprudência têm salientado que tal só se verifica em situações de falta absoluta de indicação das razões de facto e de direito que justificam a decisão e não também quando tais razões constem da sentença, mas de tal forma que pela sua insuficiência ou laconismo, se deve considerar a fundamentação deficiente.
Já o Prof. José Alberto dos Reis esclarecia que «Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto.» - cf. Código de Processo Civil Anotado, V Volume, 3ª Edição, Coimbra Editora, pág. 140.
Significa isto que o vício da nulidade da sentença por falta de fundamentação não ocorre em situações de escassez, deficiência, ou implausibilidade das razões de facto e/ou direito indicadas para justificar a decisão, mas apenas quando se verifique uma total falta de motivação que impossibilite o escrutínio das razões que conduziram à decisão proferida a final – cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-12-2011, relator Pereira Rodrigues, processo n.º 2/08.9TTLMG.P1.
O dever de fundamentação insere-se no dever constitucional e infraconstitucional de fundamentação de decisões judiciais – cf. art.º 205º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e art.º 154º do CPC -, sendo apenas dispensável no caso de decisões de mero expediente, de modo que, ainda que a questão não suscite especiais dúvidas, a respectiva decisão deve ser fundamentada nos termos que se apresentem ajustados ao caso.
O grau máximo da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais é representado pela sentença em acção contestada (cf. art.º 607º, n.ºs 3 e 4 do CPC), sendo a lei processual menos exigente, por exemplo, no caso das acções não contestadas (cf. art.º 567º, n.º 3 do CPC), nas decisões relativas aos incidentes da instância e procedimentos cautelares (art.ºs 295º e 365º, n.º 2 do CPC), e nos despachos interlocutórios em que não tenha sido deduzida oposição e a questão a proferir seja manifestamente simples (art. 154º, n.º 2 do CPC).
A qualidade da fundamentação há-de ser aferida em função do seu conteúdo substancial e não por via da sua extensão.
No presente caso, a decisão recorrida não constitui a decisão final do processo e tão-pouco de incidente com estrutura de uma causa, pois que se está na presença de um incidente de impugnação da admissão de uma testemunha deduzido pelo autor/recorrente, que segue os trâmites previstos nos art.ºs 514º e 515º do CPC, ou seja, logo que liminarmente admitido o incidente, ouvida a parte que ofereceu a testemunha e esta própria, se os factos susceptíveis de fundamentar a impugnação não forem admitidos, é oferecida a prova documental ou testemunhal que se imponha, devendo o tribunal decidir, logo de seguida, se a testemunha deve depor.
Ora, esta decisão, ainda que possa dispensar uma fundamentação profunda, não pode deixar de revelar, necessariamente, quais de entre os factos alegados se comprovaram ou não, para justificar a decisão de admissão ou não admissão da testemunha a depor.
O despacho ora colocado em crise não enunciou, como bem argumenta o recorrente, qualquer facto provado ou não provado, de entre os que hajam sido alegados para o efeito da impugnação, limitando-se a afirmar que não se alcança que a testemunha possa depor como parte, nem indicando de que modo e com base em que dados factuais se baseou o tribunal para aportar a tal conclusão.
Ainda que, como se referiu, apenas a absoluta falta de fundamentação conduza à nulidade da decisão, não se pode deixar de reconhecer que, neste caso, a total ausência de enunciados de facto ou de direito impossibilita o conhecimento e análise das razões subjacentes à decisão proferida, daí que a decisão padeça do vício de nulidade por falta de fundamentação de facto e de direito –cf. art.ºs 613º, n.º 3 e 615º, n.º 1, b) do CPC.
Não obstante se afirme positivamente a nulidade invocada, não há que determinar, de imediato, o reenvio do processo para o tribunal a quo.
Como decorre do estatuído no art. 665º, n.º 1 do CPC, deve a Relação prosseguir com a apreciação das demais questões suscitadas, conhecendo do mérito da apelação, salvo se não dispuser dos elementos necessários para o efeito – cf. Abrantes Geraldes, op. cit., pág. 289.
Assim, prossegue-se na apreciação do objecto do recurso conhecendo das questões suscitadas, em face dos elementos que os autos fornecem, sendo que infra se apreciará da suscitada inabilidade da testemunha Ana Maria..... .
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Da inabilidade da testemunha Maria de..... .
Sustenta o apelante que, ao contrário do que foi entendido pela 1ª instância, a testemunha Maria..... não podia ter sido admitida a depor nessa qualidade porque poderia depor como parte.
Fundamenta este seu entendimento pela seguinte ordem de razões:
– Maria de..... é reitora do I...../I....., entidade fundadora da associação ré, é presidente da mesa da assembleia geral desta e na qualidade de reitora designa o presidente e metade dos restantes membros da direcção da ré;
– O depoimento de parte pode ser exigido a quem represente a pessoa colectiva, obrigando-a, em termos estatutários, de acordo com o disposto no art.º 163º, n.º 1 do Código Civil;
– Atendendo à similitude das situações, importa atentar na relação existente entre o I...../..... e a ré, aferindo-se uma relação de domínio própria das sociedades comerciais, atento o estatuído no art.º 486º, n.º 2, c) do Código das Sociedades Comerciais[4], dado que a reitora tem a possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão de administração, tal significa que a testemunha Maria..... comanda e orienta directamente a ré através da nomeação dos membros dos corpos sociais e, como tal, representa também a associação I...../I....., Executive Education, pelo que, podendo depor como parte não pode depor como testemunha.
Nas suas contra-alegações a ré/recorrida pugna pela manutenção do despacho recorrido referindo que, ao contrário do sustentado pelo recorrente, Maria..... declarou aos costumes ser reitora do I....., desde Fevereiro/Março de 2018 e que este é uma das entidades que participa, uma das associadas do I....., sendo esta uma associação que envolve várias instituições; disse ainda que os vários associados têm peso igual estatutariamente, apesar de a ré consolidar contas com as contas do I..... e daí existir uma preocupação de acompanhamento daquela, tratando-se, porém, de instituições totalmente autónomas, representadas por si próprias, pelos seus órgãos de gestão; mais refere que a ré goza de total autonomia, devendo, contudo, prestar contas aos seus associados, não existindo qualquer relação de domínio entre o I..... e o I..... .
Em conformidade com o acima já expendido a propósito da admissibilidade da junção de documentos nesta sede, compete à parte que suscita a impugnação da admissão da testemunha alegar os factos concretos que integram o fundamento da inabilidade.
Aquando da dedução do incidente, o autor/recorrente limitou-se a mencionar que a testemunha Maria..... é a reitora da instituição da I....., e que esta forma com a ré, I...../I....., Executive Education, uma única entidade, remetendo para o que consta da acta da base instrutória (?), e concluiu ser manifesto que a testemunha representa a ré e, como tal, é inábil para depor como testemunha.
Foi concedida à ré/recorrida a oportunidade de se pronunciar sobre tal incidente, que referiu ser do conhecimento do tribunal e da parte contrária, que intentou a acção contra o I...../I....., apondo o número de identificação fiscal deste, ou seja, que se trata de duas instituições que, tendo uma ligação, são diferentes; uma, o I....., é uma escola privada que ministra mestrados, que tem obviamente uma ligação com o I....., mas não tem nada a ver com esta parte; a testemunha é apenas e tão-só reitora do I....., uma escola pública, e representa exactamente a instituição I..... na assembleia geral da qual o I..... faz parte; concluiu que não há inabilidade; mais referiu que foi pedido pela ré I..... para que houvesse declarações de parte e foi indicada a pessoa que esteve na última sessão.
Seguidamente o Tribunal proferiu a seguinte decisão:
“Suscitada a questão da inabilidade da testemunha Maria..... para depor enquanto testemunha, constata-se que a mesma não detém poderes para representar a R.. Trata-se, aliás, de questão já suscitada nos autos.
Questionada Maria..... sobre a mesma questão, por esta foi dito que, efetivamente, não detém essa capacidade.
Assim, entende-se que é hábil para depor enquanto testemunha, indeferindo-se o requerido pelo A..
Afere-se, deste modo, que o autor/recorrente, aquando da dedução do incidente, se limitou a convocar a qualidade de reitora do I..... da testemunha Maria..... e uma alegada “unidade de instituições” entre o I..... e o I....., não tendo mencionado a circunstância de ser a testemunha quem designa o presidente da direcção da ré e metade dos elementos desta, tão-pouco convocando a aplicabilidade das regras atinentes às sociedades coligadas com vista a concluir pela inadmissibilidade do depoimento.
Estas são, pois, questões novas apenas suscitadas em sede de recurso.
Ora, é sabido que como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão-só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando, assim, ius novarum, ou seja, a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo (cf. os art.ºs 627.º, n.º 1, 631, n.º1 e 639.º, do CPC) – cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7-07-2016, processo n.º 156/12.0TTCSC.L1.S1 – “[…] não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objecto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação, podendo ver-se neste sentido os acórdãos do S.T.J. de 1.12.1998, in BMJ n.º 482/150; 12.12.1995, CJSTJ, Tomo III, pág 156; e os acórdãos de 24/2/2015, processo nº 1866/11.4TTPRT.P1.S1, e de 14/5/2015, 2428/09.1TTLSB.L1.S1”.
De todo o modo, ainda que se trate de questões não apreciadas pelo tribunal recorrido, sempre se tecerão as considerações que seguem.
Nos termos do art.º 496º do CPC estão impedidos de depor como testemunhas os que na causa possam depor como partes.
As partes são as pessoas que deduzem ou contra quem é deduzida uma pretensão judicial, sendo, como tal, os titulares dos interesses em conflito, ou seja, não apenas o autor e o réu, originários ou habilitados ou intervenientes, mas também o representante do incapaz ou pessoa colectiva – cf. art.ºs 452º, n.º 1, 453º, n.ºs 2 e 3 do CPC -, onde não se integra, porém, o representante voluntário, a menos que detenha poderes para confessar – cf. J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, op. cit., pp. 356-357.
Estão, assim, impedidos de depor como testemunhas, por inabilidade legal, as partes, os seus representantes legais, e quem dispuser de poderes para confessar na acção.
A inabilidade legal é apreciada no momento em que deve ser prestado o depoimento – cf. art.º 513º, n.º 2 do CPC.
Quando uma das partes é uma pessoa colectiva suscitam-se, por vezes, dificuldades quanto à determinação de quem pode depor, dado que aquela só poderá estar em juízo através dos seus representantes, havendo que apurar, na altura do depoimento, quem efectivamente representa a pessoa colectiva, para o que não releva para efeitos de inabilidade legal para depor como testemunha a circunstância de, em momento anterior, mesmo na pendência da causa, a pessoa singular que vai prestar depoimento ter sido representante legal da pessoa colectiva, mas tendo deixado de o ser – cf. neste sentido, acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 28-09-2006, processo n.º 0634627.
Determina o n.º 1 do art.º 163º do Código Civil que a representação da pessoa colectiva, em juízo e fora dele, cabe a quem os estatutos determinarem ou, na falta de disposição estatutária, à administração ou a quem por ela for designado.
O I..... – I... S... C... T... E... foi criado através do DL n.º 522/72, de 15 de Dezembro.
A Lei n.º 62/2007, de 10 de Setembro que aprovou o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior estipulou no seu art.º 9º, n.º 1 que “As instituições de ensino superior públicas são pessoas colectivas de direito público, podendo, porém, revestir também a forma de fundações públicas com regime de direito privado, nos termos previstos no capítulo vi do título iii.”
O art. 129º integrado no capítulo VI do Título III do mencionado regime estipula:
“1- Mediante proposta fundamentada do reitor ou presidente, aprovada pelo conselho geral, por maioria absoluta dos seus membros, as instituições de ensino superior públicas podem requerer ao Governo a sua transformação em fundações públicas com regime de direito privado. […]
6 - A transformação de uma escola em fundação deve ocorrer no quadro da criação de uma entidade mais ampla, com a natureza de consórcio, envolvendo a fundação, e a instituição de origem, ou as suas escolas, podendo agregar igualmente outras instituições de ensino, investigação e desenvolvimento, independentemente da sua natureza jurídica.”
Por sua vez, o art.º 132º estatui:
1- As instituições de ensino superior públicas de natureza fundacional dispõem de autonomia nos mesmos termos das demais instituições de ensino superior públicas, com as devidas adaptações decorrentes daquela natureza.
2- Os estabelecimentos têm estatutos próprios, aprovados pelo conselho de curadores da fundação, sob proposta de uma assembleia com a composição prevista no artigo 172.º
3- Os estatutos estão sujeitos a homologação governamental, nos mesmos termos que os estatutos das demais instituições de ensino superior públicas. […]”
E o art. 134º dispõe:
“1- As fundações regem-se pelo direito privado, nomeadamente no que respeita à sua gestão financeira, patrimonial e de pessoal, com as ressalvas estabelecidas nos números seguintes.
2- O regime de direito privado não prejudica a aplicação dos princípios constitucionais respeitantes à Administração Pública, nomeadamente a prossecução do interesse público, bem como os princípios da igualdade, da imparcialidade, da justiça e da proporcionalidade. […]”
O DL 95/2009, de 27 de Abril aprovou a passagem do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa para o regime fundacional previsto na Lei n.º 62/2007, de 10 de Setembro, sendo instituída pelo Estado, conforme o respectivo art.º 1º, uma fundação pública com regime de direito privado denominada por I..... – I... U... L... (I...../I.....), que se rege pelos Estatutos aprovados em anexo àquele diploma legal, sendo que os Estatutos do estabelecimento de ensino são aprovados por uma assembleia com a composição prevista no artigo 172.º da Lei n.º 62/2007, de 10 de Setembro, e sujeitos a homologação, de acordo com o disposto no art.º 3º.
Os Estatutos do I... S... C... T... E... – (I..... - I... U... L...), aprovados por uma assembleia com a composição prevista no artigo 172.º da Lei 62/2007, de 10 de Setembro, foram homologados pelo Despacho Normativo 18/2009, de 30 de Abril, depois objecto de alteração com subsequente homologação pelo Despacho Normativo n.º 11/2011, de 14 de Abril e, mais recentemente, pelo Despacho Normativo n.º 20/2019, de 22 de Julho (publicado na 2ª Série do Diário da República de 11 de Setembro de 2019, com entrada em vigor no dia seguinte ao da sua publicação – cf. ponto 2).
De acordo com o art.º 5º, n.º 1, a) dos Estatutos do I..... – I... U... L... (conforme redacção homologada pelo Despacho Normativo n.º 11/2011), o I.....-I... U... L... pode, nos termos da lei, livremente, por si ou por intermédio das suas unidades orgânicas: “a) Criar, isoladamente ou em conjunto com outras entidades, públicas ou privadas, no País ou no estrangeiro, incluindo através de consórcio, fazer parte de, ou incorporar no seu âmbito, entidades subsidiárias de direito privado, como fundações, associações e sociedades”[5]
São órgãos de governo do I...../I... U... L...: a) O conselho geral; b) O reitor; c) O conselho de gestão – cf. art. 14º dos Estatutos.
Nos termos do art.º 22.º dos Estatutos, o reitor, que é eleito pelo conselho geral, é o órgão superior de governo e de representação externa do I...../I... U... L... .
Tal como consta da acta da audiência prévia realizada em 15 de Outubro de 2020, está já assente que a Associação I...../I..... Executive Education é uma associação sem fins lucrativos, sendo que as partes não dissentem quanto à circunstância de o I...../I... U... L... ser uma das entidades associadas daquela associação.
De igual modo, também não resulta controvertido que o reitor do I...../I... U... L... será sempre o presidente da mesa da assembleia geral da associação ré, como a própria testemunha Maria..... referiu, incumbindo-lhe designar o presidente da direcção da ré e metade dos restantes membros.
Independentemente da circunstância de parte das actividades de ensino da ré ser exercida por delegação de competências, como referiu a testemunha, e, bem assim, a necessidade de consolidação de contas com as constas do I...../I... U... L..., podendo até admitir-se uma dependência financeira ou uma orientação por parte do I..... na gestão da ré, atenta a circunstância de o reitor designar parte dos membros da direcção, aquilo que importa ter presente é que se está perante duas pessoas colectivas, distintas e com personalidade jurídica diversa, conforme decorre, desde logo, do estatuído no art.º 158º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil.
Com efeito, o Capítulo II do Subtítulo I (Das pessoas), do Título II (Das Relações Jurídicas), do Livro I (Parte Geral) do Código Civil é dedicado às pessoas colectivas, sendo certo que em Direito, tal como refere António Menezes Cordeiro, “pessoa é sempre, um centro de imputação de normas jurídicas. A pessoa é singular, quando esse centro corresponda a um ser humano; é coletiva […] em todos os outros casos.” – cf. Código Civil Comentado – I – Parte Geral, Coordenação António Menezes Cordeiro, 2020, pág. 421.
As pessoas colectivas serão privadas quando se regem pelo Direito civil ou comercial, assumindo a forma de sociedades comerciais, de cooperativas, de associações, de fundações ou de sociedades civis; as restantes são públicas, sendo que estas podem reger-se, em parte ou totalmente, pelo Direito privado.
As pessoas associativas e fundacionais distinguem-se pelo substrato que lhes é subjacente; na associativa, o substrato é constituído por uma agremiação de pessoas, que juntam esforços para um objectivo comum; na fundacional, o substrato redunda num valor ou num acervo de bens, que potencia a actuação da pessoa considerada –cf. art.ºs 167ºe seguintes e 185ºe seguintes do Código Civil.
As associações sem fins lucrativos e as fundações regem-se pelas normas previstas nos art.ºs 157º e seguintes do Código Civil, que constituem a base comum das diversas pessoas colectivas.
Para além daquilo que é consignado nos respectivos estatutos, indaga-se se existe algum Direito subsidiariamente aplicável às pessoas colectivas da Parte Geral do Código Civil.
O Prof. António Menezes Cordeiro refere que o Direito comercial, onde se inclui o Direito das sociedades comerciais, não é excepcional e, como tal, admite a possibilidade da sua aplicação analógica, no campo civil, pressupondo que exista um caso omisso, que esse caso deva ter, à luz do sistema, uma solução jurídico-normativa e que a analogia das situações o permita e, bem assim, pela presença de uma norma comercial aplicável ao caso análogo – cf. op. cit., pp. 434-435.
O art. 163º, n.º 1 do Código Civil determina que a representação da pessoa colectiva, em juízo e fora dele, cabe a quem os estatutos determinarem ou, na falta de disposição estatutária, à administração ou a quem por ela for designado.
O poder fundamental da administração é o da gestão, ou seja, o poder de dirigir os assuntos próprios da pessoa colectiva, tomando todas as decisões concretas necessárias e orientando a actividade para a prossecução dos seus fins; esse poder de gestão abrange a possibilidade de praticar os mais diversos actos materiais, dar instruções internas e praticar actos jurídicos, internos e externos.
A gestão apenas poderá ser eficaz se assentar em poderes de representação, daí que a regra seja a administração deter o poder de representar, para que possa praticar os mais diversos actos jurídicos.
Não obstante, a parte final do n.º 1 do art. 163º do Código Civil admite que a própria administração designe representantes, o que sucede normalmente para negócios específicos ou determinadas situações que o exijam.
Existindo uma pluralidade de administradores, a representação e a gestão podem ter lugar em exercício conjunto ou em exercício isolado, sendo que quando os estatutos nada digam, o exercício é conjunto – cf. A. Menezes Cordeiro, op. cit., pág. 465.
Em face deste regime, e sabendo que quer o I...../I... U... L..., quer a associação ré, são pessoas colectivas autónomas, com personalidade jurídica distinta, não se pode deixar de reconhecer que cada uma delas é representada por quem os respectivos estatutos determinam.
No caso da ré, a representação da associação, em juízo e fora dele, cabe à sua direcção, como é reconhecido por ambas as partes e resulta do conteúdo do Artigo Décimo Sétimo, Um, alínea a) dos seus estatutos.
Sustenta o recorrente que a circunstância de o presidente da direcção e metade dos seus membros ser designada pelo reitor do I...../I... U... L... significa que, em termos de facto, quem controla e tutela a ré é este último, por intermédio da sua reitora, o que revela uma relação de domínio do primeiro sobre a segunda, de modo que, em termos de facto, a reitora pode obrigar a pessoa colectiva ré. Com base nisto, considera que se impõe regular tal situação, não prevista na lei, para o que convoca as relações de domínio próprias das sociedades comerciais para, concluindo que a reitora comanda, dirige e orienta a ré através da sua posição na assembleia geral, onde influi na designação dos membros dos corpos sociais, reconhecer o poder daquela representar a associação.
Ora, ainda que se tenha mencionado a possibilidade de convocar as normas do Direito comercial para, em situações não expressamente reguladas no Direito civil das pessoas coletivas, perante um caso omisso carecido de regulação, encontrar uma norma jurídica que colmate essa lacuna, importa ter presente, desde logo, que não se está perante uma situação que se possa considerar caso omisso.
Com efeito, o que está em causa é a representação em juízo de uma pessoa coletiva autónoma, independente e com personalidade jurídica, cuja representação, em juízo e fora dele, está fixada nos respectivos estatutos, sendo seguro que a testemunha Maria..... não é um elemento da direcção da ré, nem tem os poderes representativos que a esta compete, porque assume apenas a posição de presidente da mesa assembleia geral.
Por outro lado, ainda que se houvesse de entender que a possibilidade de designação de metade dos membros da direcção e do seu presidente implica um controlo total da gestão da associação ré sempre não se poderia concluir pela perda da personalidade jurídica da ré e dos termos em que esta é representada e se obriga perante terceiros, pois que tal não se verifica no contexto do regime legal aplicável às sociedades coligadas, ou seja, entendidas estas como a junção de duas ou mais sociedades que estejam sujeitas a uma influência comum, porque uma participa na outra, ou nas demais ou porque todas se subordinam à orientação de uma delas ou de uma terceira entidade – cf. Paulo Olavo Cunha, Direito Comercial apud A Responsabilidade nas Relações de Grupo, Bibiana Soraia Oliveira Amorim, Porto 2016, acessível em https://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/21941/1/Bibiana%20Soraia%20Oliveira%20Amorim.pdf.
Em primeiro lugar, cumpre notar que o art. 481º, n.º 1 do CSC define o âmbito de aplicação pessoal das regras atinentes a sociedades coligadas, limitando-o a sociedades por quotas, sociedades anónimas e sociedades em comandita por acções[6].
O art. 486º do CSC identifica os casos de sociedades coligadas figurando entre elas as sociedades em relação de domínio (alínea c)), ou seja, quando uma das sociedades, dita dominante, pode exercer, directamente ou por sociedades ou pessoas que preencham os requisitos do n.º 2 do art.º 483ºdo CSC, sobre a outra, dita dependente, uma influência dominante, presumindo-se essa dependência, entre outras situações, quando a primeira tem a possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão da administração ou do órgão de fiscalização – cf. art. 486º do CSC.
Importa notar, contudo, que as regras em referência se reportam a modalidades de coligação societária expressamente consignadas, que se caracterizam pela direcção económica unitária de duas ou mais sociedades, que conservam a sua personalidade jurídica autónoma, e ainda, formalmente, a respectiva estrutura e organização – cf. Ana Perestrelo de Oliveira, in Código das Sociedades Comerciais Anotado, 3ª Edição Revista e Atualizada, Coordenação António Menezes Cordeiro, pág. 1558.
Assim, mesmo na presença de uma influência dominante[7], em que existe o poder de influenciar a gestão da sociedade dominada, através, designadamente, do poder de escolher os administradores, esta subsiste formalmente como pessoa jurídica distinta da sociedade dominante.
Com efeito, como refere Patrícia Alexandra Santos Bernardes, “os elementos básicos e definidores do conceito de grupos societários são essencialmente dois: a “independência jurídica” e a “unidade de direção económica”. O primeiro porque, apesar da sua integração numa unidade económica e a sua subordinação a interesses externos, as sociedades agrupadas mantêm sempre a sua personalidade jurídica própria e distinta; e o segundo porquanto, de um ponto de vista material, a sociedade agrupada encontra-se sempre dependente da estratégia e interesse económico definido pela sociedade-mãe, a líder do grupo societário” – cf. Grupos Societários: Critérios Atributivos de Responsabilidade Penal à Sociedade-Dominante e/ou à Sociedade-Dominada, Fevereiro 2017, acessível em https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/32570/1/ulfd134569_tese.pdf.
Assim, as sociedades de grupo, mesmo em domínio total, mantêm autonomia jurídica, não atribuindo a lei personalidade jurídica ao grupo de sociedades, separada e autónoma das sociedades componentes, como sujeito de direito (“personificação do grupo”), “pois o que o caracteriza, enquanto forma de organização de um conjunto de empresas, é precisamente “a unidade económica do todo e a pluralidade jurídica das partes”, e o grupo de sociedades, seja vertical, horizontal ou diversificado, não é reconduzível a uma empresa (em sentido objectivo ou subjectivo), postergando se a concepção de unidade empresarial” – cf. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 9-07-2010, processo n.º 213/10.7T2AVR-A.C1; no mesmo sentido, acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 2-07-2002, processo n.º 0220802 e de 29-09-2011, processo n.º 10231/10.0TBVNG.P1 e do Tribunal da Relação de Guimarães de 2-03-2017, processo n.º 589/13.4TBBCL.G1 –“O poder da sociedade dominante de dar instruções vinculantes à sociedade dominada não elimina a personalidade, capacidade e a autonomia orgânica e funcional da sociedade dominada que continua a manter os seus órgãos próprios - assembleia geral, conselho de administração, conselho fiscal, etc.”.
Atente-se, aliás, contrariamente ao que ora vem sustentar o próprio autor/recorrente, que este, na sua resposta à excepção de ilegitimidade passiva deduzida pela ré, sustentou a personalidade jurídica e a autonomia das duas entidades aqui em presença, constituindo cada uma um centro de autónomo de imputação de condutas (cf. artigo 18º da resposta com a Ref. Elect. 25037920).
Acresce que, em conformidade com o que resulta do art.º 504º do CSC (aplicável às sociedades em relação de domínio ex vi art.º 491º), não existe um poder de representação das sociedades subordinadas por parte dos administradores da sociedade directora, sendo que aquelas continuam a ser representadas pelo respectivo órgão de administração, não sendo admissível uma autorização da sociedade subordinada á sociedade directora para esta agir em vez daquela ou uma transferência dos poderes de representação para a sociedade-mãe, o que violaria a obrigação de exercício pessoal do cargo que recai sobre os administradores – cf. Ana Perestrelo de Oliveira, op. cit., pág. 1665.
Resulta do exposto que, in casu, a representação da associação ré em juízo caberá à direcção, em conformidade com o estatuído nos seus estatutos, ou a quem por ela for designado.
Não havendo notícia, nem estando demonstrado que a testemunha Maria..... pertença à direcção da ré ou que por esta tenha sido designada para a representar, seguro é que não pode depor como parte na presente acção.
Improcede, deste modo, nesta parte, a apelação.
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Da inabilidade da testemunha Ana Maria ..... .
Relativamente a esta testemunha invoca o recorrente que, como resulta da procuração forense junta aos autos, Ana Maria .....figura entre as três pessoas que representam a ré, sendo vogal da direcção e membro da comissão executiva; mais refere que de acordo com os estatutos da ré compete à direcção representar a associação em juízo e fora dele, sendo que esta se obriga pela assinatura conjunta de dois membros da comissão executiva, assim como pela assinatura de um único mandatário com poderes bastantes, pelo que, independentemente de poder ou não obrigar a associação por si só, tem poderes para representar a sociedade e, como tal, não podia ter prestado o seu testemunho porque poderia depor com parte na acção.
Nas suas contra-alegações a recorrida confirmou que a direcção da recorrida é composta por sete elementos, dos quais três compõem a sua comissão executiva, sendo, de entre eles, a testemunha Ana....., mas sustenta que tal não impede que esta possa depor como testemunha, pois que quem neste processo representa a recorrida é exclusivamente o presidente da direcção, José...., conforme poderes que lhe foram conferidos para o efeito, tal como sucedeu naquele outro processo invocado pela recorrente, com a agora testemunha Ana Maria..... .
Aquando da identificação da testemunha Ana Maria..... esta identificou-se e referiu ser vogal da comissão executiva da ré desde Novembro de2018, tendo, então, sido deduzida pelo autor a impugnação quanto à admissão do seu depoimento, referindo que aquela pertence a um dos órgãos sociais do I....., pelo que a testemunha não pode depor nessa qualidade.
A ré confirmou que a testemunha é efetivamente um dos membros da comissão executiva que tomou posse após a destituição do autor, mas vem prestar declarações enquanto testemunha, com conhecimento dos factos, pois que nesta acção, quem representa a ré e quem vem prestar declarações de parte é o presidente da comissão executiva.
O depoimento de parte constitui um meio processual cujo objectivo principal é o de provocar e obter de alguma das partes a confissão judicial - cf. art. 352º do Código Civil e art. 452º, n.º 1 do CPC.
A confissão é o “reconhecimento da realidade dum facto (passado, ou presente duradoiro) desfavorável ao declarante, isto é, dum facto constitutivo dum seu dever ou sujeição, extintivo ou impeditivo dum seu direito ou modificativo duma situação jurídica em sentido contrário ao seu interesse, ou, ao invés, a negação da realidade dum facto favorável ao declarante, isto é, dum facto constitutivo dum seu direito, extintivo ou impeditivo dum seu dever ou sujeição ou modificativo duma situação jurídica no sentido do seu interesse” – cf. José Lebre de Freitas, Código Civil Anotado, Volume I, 2ª Edição Revista e Actualizada, Ana Prata (Coord.), pág. 471.
O depoimento de parte pode ser exigido aos representantes das pessoas colectivas ou sociedades, só tendo, porém, o valor de confissão nos precisos termos em que podem obrigar os seus representados – art.º 453º, n.º 2 do CPC.
Isto é assim, porque podendo produzir-se através da confissão um efeito indirecto semelhante ao de um negócio jurídico dispositivo do direito a que o facto confessado se reporta, aquela está vedada a quem não possa, por incapacidade ou falta do respectivo poder, dispor desse direito.
Como se referiu acima, é no momento da prestação do depoimento que se há-de averiguar se a testemunha padece de alguma inabilidade legal para esse efeito.
Como tem sido uniformemente entendido, o princípio geral deve ser o de que todas as pessoas devem ser admitidas a depor com vista a, com o seu depoimento, auxiliarem a descoberta da verdade.
Nos termos do art. 496º do CPC estão impedidos de depor como testemunhas o que na causa possam depor como partes, ou seja, estão impedidos, por inabilidade legal, as partes, os seus representantes legais, bem como quem dispuser de poderes para confessar na acção.
Parte, para todos os efeitos processuais, nomeadamente no atinente a inabilidade para depor como testemunha, é quem requer e contra quem é requerida a providência judiciária objecto da acção. Se o depoente tem a posição de parte, é nessa qualidade que deve prestar o seu depoimento; se não tem essa posição, então pode depor como testemunha. A circunstância de uma pessoa ter interesse directo na causa constitui apenas um factor que o juiz deverá ponderar para avaliar a força probatória do depoimento, mas não é fundamento de inabilidade – cf. José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume IV (Reimpressão), Coimbra 1987, pág. 348.
No caso da associação ré, a direcção tem poderes de representação, em juízo e fora dele, sendo que se obriga com a assinatura conjunta de dois membros da comissão executiva ou com a assinatura de um único mandatário com poderes bastantes, atribuições que são exercidas pela comissão executiva, conforme resulta aceite pelas partes na causa e, bem assim, do conteúdo do Artigo Décimo Sétimo, Um, alínea a), Dois e Três dos estatutos.
A recorrida convoca para sustentar a admissão do depoimento desta testemunha a circunstância de os poderes para obrigar a associação terem sido conferidos, para efeitos de prestação de depoimento de parte nesta acção, exclusivamente ao presidente da direcção, ou seja, apenas o legal representante, actual presidente da direcção, José Luís....., foi designado para a representar em juízo, tendo prestado declarações de parte (na sessão de 8 de Setembro de 2021 - cf. Ref. Elect. 408274681 dos autos principais), o que significa que não podia a testemunha Ana Maria....., ainda que vogal da direcção e elemento da comissão executiva (e, como tal, elemento integrante da direcção que em termos genéricos representa a ré) ser considerada inábil para depor nessa qualidade, posto que não podia depor como parte.
Na verdade, não obstante a associação ré seja uma pessoa colectiva dirigida por uma direcção plural, o depoimento de parte deve ser prestado por quem, de entre os seus diversos representantes legais, tenha efectivo conhecimento pessoal ou directo dos factos, competindo à administração da pessoa colectiva, no caso à direcção da ré, indicar quem o deve prestar – cf. no sentido de que só a administração tem competência legal para indicar a pessoa que deve representar a pessoa colectiva para efeitos de prestação de depoimento de parte, porquanto o depoimento não é do representante mas da pessoa colectiva, J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, op. cit., pág. 288; acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12-09-2007, processo n.º 07S923; do Tribunal da Relação de Évora de 14-06-2012, processo n.º 294/08.3TBFAR-B.E1; do Tribunal da Relação do Porto de 18-05-2009, processo n.º 75/08.4TVPRT-A.P1.
Mas importa ainda atentar na distinção entre o depoimento de parte e a confissão: o primeiro é apenas o meio processual de provar a segunda. Sucede que pode existir depoimento sem haver confissão, assim como pode haver reconhecimento da realidade de factos desfavoráveis ao depoente e favoráveis à parte contrária, a que não possa atribuir-se eficácia confessória específica, sobremaneira se o depoente não tiver a necessária capacidade jurídica para dispor do correspondente direito – cf. J. Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, Volume III, 3ª Edição revista e Actualizada, Lisboa 2001, pág. 111.
Assim, o depoimento de parte deve ser definido em função de dois aspectos distintos, mas complementares: um, é aferido pela posição relativamente ao litígio objeto do processo; o outro, pelo fim que se visa atingir com a diligência instrutória. Como se refere no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28-02-2012, processo n.º 211/09.3TBLHN-N.L1-7, em relação ao primeiro, o depoimento só pode ser prestado por quem, sendo contendor no conflito de interesses em causa, como tal se encontra no processo, exercendo os seus direitos processuais na defesa dos seus interesses e, em relação ao segundo, o depoimento só pode ser prestado por quem possa dispor do interesse em litígio, sendo que a razão de ser da inabilidade para depor como testemunha de quem pode depor como parte se justifica pela suspeição que se presume relativamente a quem depõe sobre factos que lhe interessam, ou seja, por quem seja um dos titulares do conflito de interesses.
Ora, a testemunha Ana Maria....., enquanto vogal da direcção da associação ré e elemento integrante da comissão executiva, é estatutariamente representante legal da associação e detém poderes para obrigar a sociedade, ainda que necessariamente em conjunto com outro elemento da direcção, pelo que, enquanto representante legal da associação não pode depor como testemunha, porque é parte, e isto independentemente de obrigar ou não sozinha a ré ou de lhe não terem sido conferidos poderes, no caso concreto, para esse efeito.
Neste ponto, aquilo que é relevante com vista à sua admissão a depor como testemunha é que a vogal representa a associação e pode obrigá-la, pelo que é parte, independentemente de o fazer apenas juntamente com outro elemento da direcção; o saber se obriga ou não sozinha a ré interessa, não para o efeito de a admitir a depor como testemunha, mas para saber se pode ou não confessar, desacompanhada de outro elemento da direcção; não é por, neste caso, não poder obrigar a associação que Ana Maria..... deixa de revestir a qualidade processual de parte.
É este o sentido que parece haver que retirar-se do facto de a inabilidade legal afectar as partes, os seus representantes legais, bem como quem dispuser de poderes para confessar na acção. Como referem A. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “se […] a pessoa indicada puder depor como parte não deverá ser admitida prestar depoimento testemunhal. Assim, não pode ser inquirido como testemunha quem, à data da inquirição, for administrador de sociedade anónima (art. 408º, n.º 1, do CSC) ou gerente da sociedade por quotas que seja parte (art. 260º do CSC), assim como aquele que tenha procuração de pessoa singular ou coletiva para a representar em juízo, incluindo poderes para confessar.” – cf. Código de Processo Civil Anotado, Vol. I – parte Geral e Processo de Declaração, 2018, pág. 553; em idêntico sentido, cf. J. Lebre de Freitas e Isabela Alexandre, op. cit., pág. 357 – “[…] se o pacto social proibir ao gerente a confissão judicial, ele não deixa de poder depor como parte, embora não produzindo confissão com força probatória plena (art. 453-2), e, portanto, não pode ser ouvido como testemunha”; cf. neste sentido, acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 5-05-1992, processo n.º 081627; e do Tribunal da Relação de Guimarães de 6-11-2014, processo n.º 26/14.7TBPRG-A.G1 e de 21-05-2009, processo n.º 1402/08.0TBGMR.
Ademais, a não se entender deste modo, estar-se-ia a permitir que os fins visados pela lei com o estabelecimento da inabilidade legal dos representantes legais da parte para depor como testemunha fossem facilmente defraudados, posto que bastaria à pessoa colectiva conceder poderes a um terceiro para a obrigar em juízo, viabilizando desse modo o depoimento como testemunha de quem não perdeu a qualidade de legal representante, não detendo, apenas, naquele caso concreto, poderes para confessar a acção.
Aliás, essa incongruência é manifesta quando se constata, como bem aponta o recorrente, que a testemunha Ana Maria..... foi uma das pessoas físicas que, em representação da associação, subscreveu a procuração forense junta aos autos – cf. requerimento de 17-03-2020, com a Ref. Elect. 25858785 dos autos principais.
Assim, ao ter-se admitido um elemento da direcção, legal representante da associação, a depor como testemunha, praticou-se um acto não permitido por lei, o que constitui nulidade que influi necessariamente no exame da causa – cf. J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, op. cit., pág. 358.
Importa, assim, declarar a nulidade do acto consistente na audição como testemunha da legal representante da ré e, consequentemente de todos os actos subsequentes que dele dependam absolutamente e, em concreto, da sentença que haja sido proferida e que tenha atendido ao depoimento ora declarado nulo (sem prejuízo de subsistirem todos os demais actos de produção de prova não afectados pela nulidade ora decretada).
***
3.2.1.- B– Recurso incidente sobre o despacho de indeferimento do depoimento de parte do legal representante da ré
O autor/apelante não se conforma com o despacho proferido em 16 de Junho de 2021 que não admitiu o depoimento de parte do legal representante da ré por ele requerido no final da sua petição inicial, apresentando os seguintes argumentos:
– O autor alterou o rol de testemunhas, em 27 de Outubro de 2020, nos termos do art. 589º, n.º 2 do CPC, não tendo alterado o requerimento probatório, nos termos do n.º 1 dessa norma legal, pelo que aquela alteração não “revogou” o requerimento probatório constante dos articulados, que se manteve e com ele a pretensão do depoimento de parte do legal representante da ré, do qual o recorrente em momento algum prescindiu;
– O entendimento do tribunal recorrido, de que está precludido o direito à produção dessa prova porque a nulidade não foi arguida no prazo de dez dias viola o princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva e constitui uma restrição injustificada do direito à prova, porquanto o processo civil tem uma natureza inquisitória (cf. art.º 411º do CPC), daí que a omissão de despacho sobre um requerimento probatório deva poder ser sanada até ao final da audiência de julgamento; mais refere que não está legalmente fixado o momento em que a prova deve ser admitida, pelo que não é possível saber quando termina o prazo de dez dias referido no art.º 149º do CPC para a arguição da nulidade, sendo que apenas quando foi notificado da decisão proferida em 16 de Junho de 2021 tomou conhecimento da nulidade do despacho de 29 de Outubro de 2021.
Recordem-se os factos que relevam para a apreciação do presente recurso:
– Na sua petição inicial o autor apresentou o seguinte requerimento de prova:
“Prova:
A)–Testemunhas:
1)-Álvaro....., a notificar na Ordem dos E...., Avª. ..... ..... ....., N.º .....-D, .....-.... - L______;
2)-Gonçalo....., a notificar na Altice, Avª..... ..... ..... ....., Nº..., .....-.... - L_____;
3)-José....., a notificar nos CTT, Avª..... D. ..... ..., L...- ... ... ..., .....-... - L_____;
4)-Luís....., a notificar na Rua Nº..., ....., .....-... - L_____;
5)-Márcio....., a notificar na Rua ..... ..... ....., Nº..., r/c ... ..., .... -P_____.
6)-Pedro....., a notificar no M..... A..... C.....,-....-... - M_____-N_____.
7)-Tarcísio....., a notificar no M.....-BCP, Avª. ... ..... ..... (T_____ P_____), E____.Nº..., .....-... - P_____ S_____.
B)–Requer a prestação de Depoimento de Parte pela Ré, aos factos alegados nos artigos 1 a 117 e 122 a 150 do presente articulado;
C)–Requer a prestação de Declarações de Parte do A., aos 3 a 117,122 a 150, 165, 169, 170 e 179 deste articulado.
D)–Requer a notificação da Ré para juntar aos autos:
1)-Acta da Assembleia-geral realizada em14/11/ 2012;
2)-Acta da Assembleia-geral realizada em 04/04/2013;
3)-Acta da Assembleia-geral realizada em 18/04/2013;
4)-Acta da Assembleia-geral realizada em 05/01/2017;
5)-Acta da Assembleia-geral realizada em 03/05/2017
6)-Acta da Assembleia-geral realizada em 14/06/2018
7)-Acta da Assembleia-geral realizada em 24/10/2018
8)-Acta da Assembleia-geral realizada em 08/11/2018
9)-Acta da Direcção realizada em 24/04/2018.”
– Em 15 de Outubro de 2020 teve lugar a realização da audiência prévia, no contexto da qual, após fixação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova, foram apreciados os requerimentos de prova indicados pelas partes nos seus articulados, sendo proferido o seguinte despacho: III - Admitem-se os róis de fls. 24 (7) e de fls. 50 verso e 51 (10).”
– Nessa altura, os ilustres mandatários das partes requereram o prazo de dez dias para reorganizarem os meios de prova, o que foi deferido;
– Nessa sequência, o autor apresentou o requerimento de 27 de Outubro de 2020, com o seguinte teor:
“A , A. nos autos do processo à margem identificado, em que é Ré a Associação I...../I..... Executivo Education, vem indicar o rol de testemunhas, nos termos do art.º 598.º, nº2 do C.P.C.:
1-Paulo....., Professor ....., a notificar na Av.ª ..... ....., em ....-... L_____; pontos 1, 2, 11 a 13, 15 a 17 e 21 a 28 dos temas da prova;
2-Luís....., Professor ....., a notificar na Rua ..., Nº...., em ....-... L_____; pontos 4, 7 a 10 e 12 a 20 dos temas da prova;
3-Rogério....., Professor ....., a notificar na Praceta ..... ....., Nº..., em .....-... - C_____; pontos, 2, 7, 9, 11, 15 a 20 e 26 a 28;
4-Márcio....., Professor ....., a notificar na Rua Professor ..... ....., Nº..., r/c ..., em ....-... - P_____; pontos 1, 2, 7, 11 a 14 e 18 a 28 dos temas da prova;
5-Maria....., a notificar na Rua ..... ....., Nº..., ...º esq., em .....-... - L_____; pontos 3 a 6, 9 e 10 dos temas da prova;
6-Pedro....., Diretor ....., a notificar no ..... ..... ....., em ....-... M_____-N____; pontos 3, 4 e 14 dos temas da prova;
7-José....., Farmacêutico, a notificar na Rua ..... ....., Nº..., ...º dto., em ....-... - L_____; pontos 1 e 25 dos temas da prova;
8-Dr. Custódio....., Médico ....., a notificar na ..... ..... ....., Nº..., em ....-... - L_____; ponto 10 dos temas da prova.”;
–Em 29 de Outubro de 2020 foi proferido despacho que se pronunciou sobre os requerimentos de 26 e 27 de Outubro de 2020, nos seguintes termos: “II – Admitem-se os róis e as declarações de parte do legal representante da R.”;
–Em 8 de Junho de 2021 o autor dirigiu aos autos um requerimento em que alerta para o facto de, certamente por lapso, o despacho de 29 de Outubro de 2020 não se ter pronunciado sobre as requeridas declarações de parte do autor e depoimento de parte do legal representante da ré;
– Em 16 de Junho de 2021 o tribunal recorrido proferiu o despacho ora sob recurso.
O requerimento probatório deve ser apresentado com os articulados respectivos, tal como resulta do disposto nos art.ºs 552º, n.º 2, primeira parte e 572º, d), primeira parte do CPC e tem que ver com a prova constituenda, ou seja, aquela que será produzida durante a instrução da causa.
Este é um ónus que incide sobre a parte, pois ultrapassado esse momento apenas lhe será permitido fazer alterações aos requerimentos probatórios apresentados, desde que o réu não seja revel.
A lei admite a alteração do requerimento probatório em duas situações:
1)–Exercício do contraditório pela parte contrária (o réu contestou, caso em que o autor pode alterar o requerimento probatório na réplica, se a ela houver lugar, ou no prazo de dez dias a contar da notificação da contestação – cf. art.º 552º, n.º 2, segunda parte do CPC; o autor apresentou réplica à reconvenção do réu, sendo este admitido a alterar o seu requerimento probatório – cf. art. 572º, d), segunda parte do CPC);
2)– Realização de audiência prévia (cf. art.º 598º, n.º 1 do CPC) – cf. Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume II, pág.141.
A possibilidade de alteração do requerimento probatório pode ocorrer tanto por substituição ou ampliação da prova constituenda oferecida nos articulados, ou seja, a alteração pode assumir a mais diversa natureza, desde a ampliação do rol de testemunhas até à apresentação de diferente meio de prova, considerando que a mera apresentação de um documento para efeitos probatórios compreende um requerimento implícito de admissão como meio de prova, tanto bastando para que a parte fique habilitada a alterar tal requerimento ulteriormente, nos momentos admitidos – cf. António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, op. cit., pág. 704; acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 18-06-2020, processo n.º 934/19.9T8VCT.G1 e de 18-03-2021, processo n.º 2154/18.0T8BCL-A.G1; do Tribunal da Relação de Lisboa de 30-04-2019, processo n.º 704/18.1T8AGH-A.L1-7 e de 12-09-2019, processo n.º 4794/17.6T8SNT-A.L1-8; do Tribunal da Relação do Porto de 7-11-2019, processo n.º 3338/17.4T8AVR-A.P1; e ainda, no sentido de que a interpretação mais correcta da norma do art. 598º, n.º 1 do CPC é a de que a alteração não tem necessariamente de se traduzir numa substituição ou modificação do que antes foi requerido, podendo consistir num mero aditamento ao requerimento probatório deduzido no articulado, cf. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23-03-2017, processo n.º 425-16.0YIPRT-A.L1-6; em sentido diverso, pugnando por uma interpretação mais restritiva do art.º 598º, n.º 1 do CPC, referindo que a prova documental está sujeita a um regime particular quanto ao seu momento de apresentação (o dos art.ºs 423º a 425º do CPC), pelo que não deve ser abrangida pela previsão daquela norma, cf. J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, op. cit., Volume 2º, 3ª edição, pág. 645.
Para além das situações descritas, tem sido entendido que, não havendo audiência prévia, ainda assim as partes poderão alterar o requerimento probatório no prazo geral de dez dias contados da notificação do despacho previsto no art.º 596º do CPC, pois que não se justifica que o direito das partes à alteração do requerimento resulte precludido pela dispensa da audiência prévia – cf. neste sentido, J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, op. cit., pág. 644; cf. acórdãos do Tribunal da Relação de Évora de 24-10-2019, processo n.º 2457/18.4T8PTM-A.E1 e do Tribunal da Relação de Coimbra de 15-01-2019, processo n.º 1178/16.7T8CLD.C1; em sentido contrário, não admitindo a notificação das partes para esse efeito, mas aceitando que tal possa suceder ao abrigo de despacho de adequação processual, Rui Pinto, op. cit., pág. 145; neste sentido, acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 24-10-2019, processo n.º 2457/18.4T8PTM-A.E1.
Pressupondo que tenha sido inserido algum rol de testemunhas no requerimento probatório, apresentado ou posteriormente alterado, o n.º 2 do art.º 598º do CPC admite ainda o aditamento ou alteração do rol até 20 dias antes da audiência final, sendo conferida à parte contrária a possibilidade de fazer uso dessa mesma faculdade, no prazo de cinco dias[8], para além da possibilidade de substituição de testemunhas, prevista no art. 508º, n.º 1 daquele diploma legal.
Atente-se que uma coisa é alterar o requerimento probatório, que pode abranger, entre o mais, prova pericial, documental, testemunhal, e, outra coisa, bem mais limitada, é alterar ou aditar o rol de testemunhas, que é apenas um dos segmentos do requerimento probatório. E os tempos de apresentação desses pedidos são também eles diferentes, pois que o n.º 2 do art.º 598º do CPC permite que até uma data muito próxima da audiência final, as partes substituam testemunhas constantes do rol que apresentaram no momento próprio ou aditem testemunhas a esse mesmo rol, sem que se lhes exija qualquer justificação para a substituição ou para o aditamento – cf. acórdão do Tribunal da relação de Lisboa de 30-04-2019, processo n.º 704/18.1T8AGH-A.L1-7 acima mencionado.
Note-se que, como alertam J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, embora a lei não o estabeleça, designadamente no elenco dos actos a praticar no decurso da audiência prévia (cf. art.º 591º, n.º 1 do CPC), o momento adequado para o juiz admitir ou rejeitar os meios de prova constituendos propostos pelas partes será, precisamente, no decurso daquela audiência, necessariamente antes de proceder, juntamente com estas, à programação da audiência final – cf. op. cit., pág. 645.
Na situação em apreço, as partes propuseram os seus meios de prova aquando da apresentação dos respectivos articulados, indicando prova documental, prova testemunhal e, no caso do autor/recorrente, prova por depoimento de parte e por declarações de parte.
No decurso da audiência prévia a senhora juíza a quo, uma vez fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, emitiu despacho a admitir os róis de testemunhas já apresentados e convidou as partes a, querendo, alterarem os seus requerimentos probatórios.
Nessa sequência, solicitaram as partes a concessão de um prazo de dez dias para o efeito de reorganização dos meios de prova, o que lhes foi deferido.
Ainda que nenhuma norma legal tenha sido convocada para justificar a concessão de prazo para proceder à alteração dos requerimentos probatórios – que, em conformidade com os trâmites processuais normais deveria ter lugar no decurso da audiência prévia (cf. art. 598º, n.º 1 do CPC) -, não se pode deixar de admitir que possa o juiz determinar essa concessão de prazo para efeitos de eventual reorganização dos requerimentos probatórios, fazendo-o ao abrigo de despacho de adequação processual (cf. art. 547º do CPC).
Assim, os requerimentos probatórios poderiam ser alterados pelas partes no prazo de dez dias que lhes foi concedido, prazo esse que terminaria no dia 26 de Outubro de 2020.
Sucede que o autor veio apresentar, em 27 de Outubro de 2020, um requerimento que incidiu apenas sobre o rol de testemunhas, alterando-o e ampliando-o, fazendo-o ao abrigo do disposto no n.º 2 do art. 598º do CPC, ou seja, da norma que lhe permite alterar ou aditar o rol de testemunhas até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final.
Conforme acima se referiu, uma coisa é alterar o requerimento probatório ao abrigo do disposto no art. 598º, n.º 1 do CPC e coisa distinta é a alteração do rol de testemunhas que, qua tale, pode ocorrer até vinte dias antes da data da audiência final.
Ora, no seu requerimento de 27 de Outubro de 2020 o apelante não veio introduzir alteração ou modificação dos demais meios de prova que indicou na petição inicial, cingindo-o apenas à alteração do rol de testemunhas então apresentado, referindo expressamente que o fazia à luz do estatuído no n.º 2 do art. 598º do CPC[9]. Logo, perante o conteúdo de tal requerimento e nada tendo a parte referido quanto aos meios de prova anteriormente propostos no seu articulado, não poderia o tribunal recorrido concluir que a parte pretendia modificar todo o seu requerimento probatório, prescindindo de tudo quanto requerera inicialmente para além da prova testemunhal.
O apelante apresentou o novo rol e nada disse quanto ao depoimento de parte, porquanto nada quis dizer, sendo de depreender, à luz da norma que o próprio convocou, que visou apenas alterar o rol de testemunhas, mantendo incólume a prova constituenda por si anteriormente proposta (prova documental, por depoimento de parte e por declarações de parte).
Assim, não tem razão a senhora juíza a quo quando refere que tendo reorganizado o rol de testemunhas e nada tendo dito quanto aos demais meios de prova solicitados, o autor “deixou cair” os demais pedidos de produção de prova.
Ao ter concedido prazo para a reorganização dos requerimentos probatórios, esgotado tal prazo, incumbia ao tribunal recorrido pronunciar-se sobre a totalidade dos meios de prova propostos pelas partes, sejam os iniciais, sejam os posteriormente introduzidos nos autos, ao abrigo da possibilidade de reformulação do requerimento probatório.
Não tendo o requerimento probatório apresentado pelo autor na petição inicial sido objecto de alteração, para além da modificação do rol de testemunhas, importava que o tribunal se pronunciasse sobre toda a prova requerida naquele articulado, o que não fez aquando do despacho proferido em 29 de Outubro de 2020.
Procedendo esta primeira parte da argumentação do recorrente, importa agora aferir se deveria a 1ª instância, na sequência do requerimento do autor de 8 de Junho de 2020, ter apreciado a admissibilidade do depoimento de parte requerido.
O Tribunal recorrido considerou que mesmo que fosse de admitir que ocorreu omissão por não ter decidido o pedido de prestação de depoimento de parte, o despacho através do qual se pronunciou sobre os meios de prova foi proferido em 29 de Outubro de 2020, pelo que o prazo de dez dias para arguir eventual nulidade, nos termos dos art.ºs 199º e 149º, n.º 1 do CPC, já havia transcorrido por inteiro, resultando precludida essa possibilidade.
O apelante sustenta que, mantendo-se o seu requerimento quanto ao depoimento de parte do legal representante da ré, o despacho proferido em 29 de Outubro de 2020 é nulo por omissão de pronúncia, sendo que a nulidade não pode ser considerada como sanada, sob pena de se transferir para a parte as consequências de um erro da responsabilidade do tribunal, com violação do princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, na vertente do direito à prova, sendo a interpretação do tribunal violadora do princípio da proporcionalidade, devendo aceitar-se que a omissão de despacho sobre um requerimento probatório possa ser suscitada até ao final da audiência de julgamento; mais argumenta que apenas tomou conhecimento da nulidade do despacho de 29 de Outubro de 2020 quando foi notificado da decisão proferida em 16 de Junho de 2020.
Tendo-se concluído que a apresentação pelo autor do requerimento de 27 de Outubro de 2020, mediante o qual requereu a alteração do seu rol de testemunhas, nenhum reflexo teve sobre o requerimento probatório que havia aduzido na sua petição inicial, nem dele resultou a renúncia a qualquer dos meios de prova inicialmente propostos, não sobram dúvidas que o tribunal recorrido estava obrigado a emitir pronúncia sobre o requerimento probatório incluído naquele articulado, em toda a sua extensão.
Sucede que, conforme se afere do relatório supra, aquando da pronúncia sobre os requerimentos probatórios, decorrido que estava o prazo concedido para que as partes os reorganizassem, assim o entendendo, o tribunal recorrido apenas se pronunciou sobre os requerimentos apresentados em 26 e 27 de Outubro de 2020 e nada disse quanto à pretensão do apelante de obter o depoimento de parte do legal representante da ré e prestar declarações de parte.
Conforme acima se deixou consignado, tendo concedido prazo para a reformulação dos requerimentos probatórios, era nesse momento, decorrido tal prazo e antes de agendar a audiência final e fixar a respectiva programação, que incumbia proferir decisão sobre a admissão ou não admissão dos meios de prova propostos.
Na verdade, o tribunal recorrido cumpriu esse acto da tramitação processual e proferiu despacho em 29 de Outubro de 2020 em que admitiu os róis e as declarações de parte do legal representante da ré, mas nada disse quanto aos demais meios de prova propostos pelo autor/recorrente.
O apelante foi notificado desse despacho em 30 de Outubro de 2020 (cf. Ref. Elect. 400100843).
Não obstante tal notificação, apenas por requerimento de 8 de Junho de 2021, o recorrente veio aos autos alertar o tribunal para a circunstância de não ter sido proferido despacho quanto às requeridas declarações de parte por banda do próprio e depoimento de parte do legal representante da ré, reiterando o seu interesse na produção desses meios de prova.
Confrontado com esse requerimento, o tribunal a quo proferiu o despacho ora colocado em crise, entendendo que, a ter existido omissão de pronúncia, esta não fora arguida tempestivamente, convocando as normas aplicáveis às nulidades processuais.
É sabido que a nulidade processual consiste num desvio ao formalismo processual prescrito na lei.
Além das nulidades típicas previstas nos art.ºs 186º, 187º, 191º, 193º e 194º do CPC, outras irregularidades que se constatem na tramitação processual só constituirão nulidade se a lei assim o determinar ou quando o vício possa influir no exame ou decisão da causa, ou seja, quando se repercutem na sua instrução, discussão ou julgamento ou, em processo executivo, na realização da penhora, venda ou pagamento – cf. A. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, op. cit., pág. 235; José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, op. cit., Volume 1º, 3ª Edição, pág. 381.
Trata-se das nulidades secundárias, inominadas ou atípicas que podem emergir da prática de um acto que a lei não admita, da omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva ou da prática de um acto admitido ou a sua omissão em violação da sequência processual fixada pelo juiz ao abrigo do disposto no art. 547º do CPC – cf. art. 195º, n.º 1 do CPC.
A nulidade do acto processual repercute-se nos actos subsequentes da sequência que dele dependam absolutamente. “Assim, sempre que a prática de um ato da sequência pressuponha a prática de um ato anterior, a invalidade deste tem como efeito, indirecto mas necessário, a invalidade do primeiro, se entretanto tiver sido praticado, pelo que a invalidade do ato processual é mais uma invalidade do ato enquanto elemento da sequência do que do ato em si mesmo considerado” – cf. J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, op. cit., pág. 381.
Por sua vez, como já acima se deu nota, a validade das decisões judiciais pode estar afectada por erro de julgamento dos factos e do direito ou podem ser nulas por violação das regras da sua elaboração e estruturação ou das que delimitam o respectivo conteúdo e limites.
O Prof. Miguel Teixeira de Sousa explica em que consiste uma nulidade processual para a distinguir das nulidades da sentença, o que faz nos seguintes termos e de modo cristalino:
“Todo o processo comporta um procedimento, ou seja, um conjunto de actos do tribunal e das partes. Cada um destes actos pode ser visto por duas ópticas distintas:
-- Como trâmite, isto é, como acto pertencente a uma tramitação processual;
-- Como acto do tribunal ou da parte, ou seja, como expressão de uma decisão do tribunal ou de uma posição da parte.
No acto perspectivado como trâmite, considera-se não só a pertença do acto a uma certa tramitação processual, como o momento em que o acto deve ou pode ser praticado nesta tramitação. Em contrapartida, no acto perspectivado como expressão de uma decisão do tribunal ou de uma posição da parte, o que se considera é o conteúdo que o acto tem de ter ou não pode ter.
Do disposto no art. 195.º, n.º 1, CPC decorre que se verifica uma nulidade processual quando seja praticado um acto não previsto na tramitação legal ou judicialmente definida ou quando seja omitido um acto que é imposto por essa tramitação.
Isto demonstra que a nulidade processual se refere ao acto como trâmite, e não ao acto como expressão da decisão do tribunal ou da posição da parte. O acto até pode ter um conteúdo totalmente legal, mas se for praticado pelo tribunal ou pela parte numa tramitação que o não comporta ou fora do momento fixado nesta tramitação, o tribunal ou a parte comete uma nulidade processual. Em suma: a nulidade processual tem a ver com o acto como trâmite de uma tramitação processual, não com o conteúdo do acto praticado pelo tribunal ou pela parte.
É, aliás, fácil comprovar, em função do direito positivo, o que acaba de se afirmar:
-- A única nulidade processual nominada que decorre do conteúdo do acto é a ineptidão da petição inicial (cf. art. 186.º); mas não é certamente por acaso que esta nulidade é também a única que constitui uma excepção dilatória (cf. art. 186.º, n.º 1, 278.º, n.º 1, al. b), e 577.º, al, b), CPC);
-- As nulidades da sentença e dos acórdãos decorrem do conteúdo destes actos do tribunal, dado que estas decisões não têm o conteúdo que deviam ter ou têm um conteúdo que não podem ter (cf. art. 615.º, 666.º, n.º 1, e 685.º CPC); também não é por acaso que estas nulidades não são reconduzidas às nulidades processuais reguladas nos art.ºs 186.º a 202.º CPC.”[10]
A arguição da nulidade processual deve ter lugar na própria instância em que é cometida e no prazo geral do art. 149º, n.º 1 do CPC.
É sabido que “a arguição da nulidade só é admissível quando a infracção processual não está ao abrigo de qualquer despacho judicial; se há um despacho a ordenar ou a autorizar a prática ou a omissão do acto ou da formalidade, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade que se tenha cometido, não é a arguição ou reclamação por nulidade, é a impugnação do respectivo despacho pela interposição do recurso competente.” – cf. José Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 2º, Coimbra 1945, pág. 507.
Em idêntico sentido pronuncia-se Artur Anselmo de Castro, in Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, 1982, pág. 134:
“Tradicionalmente entende-se que a arguição da nulidade só é admissível quando a infracção processual não está, ainda que indirecta ou implicitamente, coberta por um qualquer despacho judicial; se há um despacho que pressuponha o acto viciado, diz-se, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade cometida, não é a arguição ou reclamação por nulidade, mas a impugnação do respectivo despacho pela interposição do competente recurso, conforme a máxima tradicional – das nulidades reclama-se, dos despachos recorre-se. A reacção contra a ilegalidade volver-se-á então contra o próprio despacho do juiz; ora, o meio idóneo para atacar ou impugnar despachos ilegais é a interposição do respectivo recurso […]”
No caso em apreço, o recorrente insurge-se contra a decisão proferida em 16 de Junho de 2021 em que o tribunal recorrido considerou que estava precludida a possibilidade de suscitar a nulidade decorrente da omissão de pronúncia, sendo certo que aquele coloca em crise não só o conteúdo do despacho de 16 de Junho de 2021, mas também o do despacho de 29 de Outubro de 2020, que se pronunciou sobre a admissão dos meios de prova e que ora apoda de nulo por omissão de pronúncia.
Na verdade, a falta de pronúncia por parte do tribunal sobre a admissibilidade ou não dos meios de prova apresentados pelas partes constitui omissão de um acto, que se traduz numa irregularidade que interfere directamente sobre a instrução da causa, sendo assim susceptível de influir no exame ou na decisão do litígio, pelo que constitui uma nulidade secundária, tal como previsto no art. 195º, n.º 1 do CPC – cf. neste sentido, acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte de 28-04-2016, processo n.º 551/15.2BEVIS; do Tribunal Central Administrativo Sul de 9-06-2018, processo n.º 1428/09.6BESNT; do Tribunal da Relação de Guimarães de 5-04-2018, processo n.º 1856/12.0TJVNF-C.G1.
Todavia, no caso em apreço não se está perante uma omissão do acto, ou seja, o tribunal recorrido não deixou de proferir despacho sobre a admissão ou não dos requerimentos probatórios apresentados pelas partes, pois que o proferiu em 29 de Outubro de 2020. Com efeito, o que está em causa é o conteúdo do acto enquanto expressão de uma decisão do tribunal, isto é, o acto/decisão sobre a admissão dos meios de prova.
No que à omissão de pronúncia diz respeito, tem-se entendido que o dever de decidir tem por referência as questões suscitadas e bem assim as de conhecimento oficioso, mas tal não exige que se apreciem todos os argumentos.
Assim, o que está em causa, verdadeiramente, na impugnação do recorrente é a omissão de pronúncia que o conteúdo do despacho proferido em 29 de Outubro de 2020 evidencia, porquanto, não obstante ter admitido os róis de testemunhas e declarações de parte da ré, o tribunal recorrido não se pronunciou sobre todo o requerimento probatório do autor, e, por essa via, tal despacho é nulo.
Como tal, porque o que estava em causa era o conteúdo da decisão e não a omissão de acto processual como trâmite, impunha-se ao autor recorrer desse despacho e suscitar a apontada nulidade no próprio recurso, atenta a circunstância de se tratar de uma decisão passível de recurso autónomo, dispondo aquele para o efeito do prazo de 15 dias a contar da respectiva notificação (ou seja, até 17 de Novembro de 2020) – cf. art.ºs 613º, n.º 3, 615º, n.ºs 1, d) e 4, 629º, n.º 1, 638º, n.º 1 e 644º, n.º 2, d) do CPC.
Decorrido tal prazo, o autor não recorreu do despacho e apenas suscitou a apontada omissão em requerimento de 8 de Junho de 2021, logo, em momento muito posterior.
Assim, ainda que não seja aplicável o prazo de dez dias invocado pelo tribunal recorrido, por não estar em causa a arguição de uma nulidade processual, nos termos do art. 195º do CPC, certo é que o prazo para interpor recurso relativamente ao despacho proferido em 29 de Outubro de 2020 transcorreu sem que o autor o tivesse impugnado, pelo que aquele se consolidou, assumindo carácter definitivo.
Sustenta ainda o recorrente que esta conclusão viola o direito à prova enquanto vertente do princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, de tal modo que os aspectos de ordem formal quanto ao cumprimento dos ónus impostos às partes devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
O art. 20º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa garante que “A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.”
Sobre o direito de acesso aos tribunais e os ónus que a lei faz recair sobre as partes, o acórdão n.º 96/2016, de 4-02-2016 do Tribunal Constitucional, publicado no Diário da República n.º 123/2016, Série II de 2016-06-29 discorre do seguinte modo:
“A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem entendido que o direito de acesso aos tribunais ou à tutela jurisdicional implica a garantia de uma proteção jurisdicional eficaz ou de uma tutela judicial efetiva, cujo âmbito normativo abrange nomeadamente: (a) o direito de ação, no sentido do direito subjetivo de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional; (b) o direito ao processo, traduzido na abertura de um processo após a apresentação daquela pretensão, com o consequente dever de o órgão jurisdicional sobre ela se pronunciar mediante decisão fundamentada; (c) o direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas, no sentido de a decisão haver de ser proferida dentro dos prazos preestabelecidos, ou, no caso de estes não estarem fixados na lei, dentro de um lapso temporal proporcional e adequado à complexidade da causa; (d) o direito a um processo justo baseado nos princípios da prioridade e da sumariedade, no caso daqueles direitos cujo exercício pode ser aniquilado pela falta de medidas de defesa expeditas (veja-se, neste sentido, entre outros, o Acórdão n.º 440/94, acessível na internet em www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/, assim como os restantes acórdãos adiante referidos sem outra menção expressa).
Como resulta também da vasta jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre esta matéria, o direito de ação ou direito de agir em juízo, efetivado através de um processo equitativo, entendido num sentido amplo, significa não apenas que o processo deverá ser justo na sua conformação legislativa, mas também que deverá ser um processo informado pelos princípios materiais da justiça nos vários momentos processuais, de modo a que seja adequado a uma tutela judicial efetiva.
Neste mesmo sentido, a doutrina e a jurisprudência têm procurado densificar o princípio do processo equitativo através de outros princípios: (1) direito à igualdade de armas ou direito à igualdade de posições no processo, com proibição de todas as discriminações ou diferenças de tratamento arbitrárias; (2) o direito de defesa e o direito ao contraditório traduzido fundamentalmente na possibilidade de cada uma das partes invocar as razões de facto e de direito, oferecer provas, controlar as provas da outra parte, pronunciar-se sobre o valor e resultado destas provas; (3) direito a prazos razoáveis de ação ou de recurso, proibindo-se prazos de caducidade exíguos do direito de ação ou de recurso; (4) direito à fundamentação das decisões; (5) direito à decisão em tempo razoável; (6) direito ao conhecimento dos dados processuais; (7) direito à prova, isto é, à apresentação de provas destinadas a demonstrar e provar os factos alegados em juízo; (8) direito a um processo orientado para a justiça material sem demasiadas peias formalísticas. (Cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, 4.ª Edição Revista, Coimbra Editora, 2007, págs. 415 e 416).
Por outro lado, conforme tem sido entendimento do Tribunal Constitucional, se é certo que a exigência de um processo equitativo não afasta a liberdade de conformação do legislador na concreta modelação do processo, impõe, contudo, no seu núcleo essencial, que os regimes adjetivos proporcionem aos interessados meios efetivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, bem como uma efetiva igualdade de armas entre as partes no processo, não estando o legislador autorizado a criar obstáculos que dificultem ou prejudiquem, arbitrariamente ou de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva.
A questão em causa nos autos enquadra-se num conjunto vasto de casos, que o Tribunal já foi chamado a apreciar, em que é imposto um ónus processual às partes (neste caso, a junção, em determinado prazo, do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça) e em que a lei prevê uma determinada cominação ou consequência processual para o incumprimento de tal ónus (no caso concreto, a omissão de cumprimento do aludido ónus é havida como desistência do pedido de pagamento de rendas, encargos ou despesas, não prosseguindo o BNA com os trâmites necessários à execução para pagamento de quantia certa).
Ora, a respeito das exigências decorrentes da garantia constitucional de acesso ao direito e à justiça, quando estejam em causa normas que impõem ónus processuais, o Tribunal tem afirmado que tal garantia não afasta a liberdade de conformação do legislador na concreta estruturação do processo, não sendo incompatível com a imposição de ónus processuais às partes (cf., neste sentido, entre outros, por exemplo, os Acórdãos n.os 122/02 e 46/05).
No entanto, com também tem sido salientado pelo Tribunal, a ampla liberdade do legislador no que respeita ao estabelecimento de ónus que incidem sobre as partes e à definição das cominações e preclusões que resultam do seu incumprimento está sujeita a limites, uma vez que os regimes processuais em causa não podem revelar-se funcionalmente inadequados aos fins do processo (isto é, traduzindo-se numa exigência puramente formal e arbitrária, destituída de qualquer sentido útil e razoável) e têm de se mostrar conformes com o princípio da proporcionalidade. Ou seja, os ónus impostos não poderão, por força dos artigos 13.º e 18.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição, impossibilitar ou dificultar, de forma arbitrária ou excessiva, a atuação procedimental das partes, nem as cominações ou preclusões previstas, por irremediáveis ou insupríveis, poderão revelar-se totalmente desproporcionadas face à gravidade e relevância, para os fins do processo, da falta cometida, colocando assim em causa o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva […]
O Tribunal Constitucional, procurando densificar, na sua jurisprudência, o juízo de proporcionalidade a ter em conta quando esteja em questão a imposição de ónus às partes, tem reconduzido tal juízo à consideração de três vetores essenciais:
- a justificação da exigência processual em causa;
- a maior ou menor onerosidade na sua satisfação por parte do interessado;
- e a gravidade das consequências ligadas ao incumprimento dos ónus (cf., neste sentido, os Acórdãos n.ºs 197/07, 277/07 e 332/07).”
Sendo este o enquadramento a atender, considerando os dados factuais e a tramitação processual que releva para a apreciação desta questão, não se pode deixar de considerar que o recorrente teve todas as oportunidades para exercer o seu direito à produção de prova, para propor os meios de prova que entendesse adequados e até para os alterar, sendo que ambas as partes beneficiaram ao longo do processo de idênticas oportunidades.
Se é certo que o despacho que se pronunciou sobre a admissão das provas requeridas omitiu na sua apreciação um dos meios de prova requeridos pelo recorrente, não deixa de se ter de atentar também que perante a notificação desse despacho, onde expressamente se apreciou os requerimentos probatórios, o autor nada fez em devido tempo. Apenas na véspera do início da audiência final constatou essa omissão e só então visou alcançar a pronúncia do tribunal recorrido em falta, quando o meio processual que a lei lhe conferia para o efeito era a interposição de recurso daquele despacho e a invocação da sua nulidade no próprio recurso.
Como decorre da posição do Tribunal Constitucional supra mencionada, a Constituição concede ao legislador ampla liberdade quanto à conformação do processo e ao estabelecimento de ónus que incidem sobre as partes e respectivas cominações e preclusões, posto que não se revelem inadequados aos fins do processo e sejam conformes ao princípio da proporcionalidade.
A garantia constitucional de exigência de um processo equitativo que decorre do artigo 20º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa impõe que as normas processuais confiram aos interessados meios efectivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos e paridade entre as partes, ou seja, um processo equitativo demanda a efectividade do direito de defesa, bem como o assegurar dos princípios do contraditório e da igualdade de armas, de tal modo que “consagrando a Constituição o direito a um processo equitativo, determinados vícios processuais traduzem violações de direitos fundamentais “ – cf. Rui Medeiros, in Constituição da República Portuguesa Anotada, Jorge Miranda e Rui Medeiros, Volume I, 2ª edição revista, pág. 323.
Aquilo que se pretende com o princípio da contraditoriedade é garantir a participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, em condições de igualdade, podendo influenciar em termos de factos, provas, questões de direito que tenham que ver com o objecto da causa e em qualquer fase do processo.
No que diz respeito à prova, o princípio do contraditório exige: que às partes seja facultada, em igualdade, a proposição de todos os meios probatórios potencialmente relevantes para o apuramento da realidade dos factos da causa; que lhes seja autorizado fazê-lo até ao momento em que melhor possam decidir da sua conveniência; que a produção ou admissão da prova tenha lugar com audiência contraditória de ambas as partes; que estas possam pronunciar-se sobre a apreciação das provas produzidas por si, pelo adversário e pelo tribunal – cf. J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, op. cit., pág. 8.
Ora, face à inércia da parte em impugnar um despacho que se mostrava afectado do vício da omissão de pronúncia, não se pode considerar que a consideração do carácter definitivo desse despacho contra o qual aquela não se insurgiu em devido tempo, coloque em crise seja a igualdade das partes e a sua paridade no iter processual, seja o direito à prova, que apenas não teve lugar face à falta de actuação tempestiva do interessado na sua produção, não se afigurando desproporcional a assunção desse carácter definitivo de um despacho proferido no momento processual próprio, notificado às partes e, enfim, transitado em julgado..
Porque se trata de decisão judicial que incide sobre a relação processual, tal decisão, não tendo sido objecto de recurso, adquiriu força obrigatória dentro deste processo, constituindo caso julgado formal, em virtude do seu trânsito em julgado – cf. art.º 620.º do CPC.
Improcede, assim, o presente recurso, devendo manter-se inalterada a decisão proferida em 16 de Junho de 2021 que considerou precludida a possibilidade de pronúncia sobre a admissão do depoimento de parte, ainda que com fundamento não inteiramente coincidente.
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Das Custas
De acordo com o disposto no art. 527º, n.º 1 do CPC, a decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito. O n.º 2 acrescenta que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
Nos termos do art. 1º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais, considera-se processo autónomo para efeitos de custas, cada recurso, desde que origine tributação própria.
Uma vez que o apelante logrou alcançar parcialmente a modificação do decidido no âmbito do recurso atinente aos incidentes de inabilidade das testemunhas, as custas processuais (na vertente de custas de parte) ficam a cargo do apelante e da apelada, na proporção de metade.
Quanto ao recurso relativo à questão de não pronúncia sobre o requerido depoimento departe do legal representante da ré, porque improcede, as custas processuais (na vertente de custas de parte), ficam a cargo do apelante.
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IV–DECISÃO
Pelo exposto, acordam as juízas desta 7.ª Secção do Tribunal de Relação de Lisboa, em:
a.–julgar parcialmente procedente a apelação atinente aos despachos de indeferimento da declaração de inabilidade das testemunhas e declarar a nulidade do acto consistente na audição como testemunha da legal representante da ré, Ana..... e, consequentemente de todos os actos subsequentes que dele dependam absolutamente e, em concreto, da sentença que haja sido proferida e que tenha atendido ao depoimento ora declarado nulo (sem prejuízo de subsistirem todos os demais actos de produção de prova não afectados pela nulidade ora decretada);
b.–julgar improcedente a apelação atinente ao despacho de indeferimento do depoimento de parte do legal representante da ré, mantendo a decisão recorrida
As custas relativas ao primeiro recurso ficam a cargo do apelante e da apelada, na proporção de metade.
As custas relativas ao segundo recurso ficam a cargo do apelante.
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Lisboa, 26 de Outubro de 2021[11]
Micaela Marisa da Silva Sousa
Cristina Silva Maximiano
Amélia Alves Ribeiro
[1]Adiante designado pela sigla CPC.
[2]Adiante designado pela sigla RCP.
[3]Acessível na Base de Dados do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I. P. em www.dgsi.pt, onde se encontram disponíveis todos os arestos adiante mencionados sem indicação de origem.
[4]Adiante designado pela sigla CSC.
[5]Em conformidade, aliás, com disposto no art.º 15º, n.º 1 do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior que prevê: “As instituições de ensino superior públicas, por si ou por intermédio das suas unidades orgânicas, podem, nos termos dos seus estatutos, designadamente através de receitas próprias, criar livremente, por si ou em conjunto com outras entidades, públicas ou privadas, fazer parte de, ou incorporar no seu âmbito, entidades subsidiárias de direito privado, como fundações, associações e sociedades, destinadas a coadjuvá-las no estrito desempenho dos seus fins.
[6]Ainda que, como refere Ana Perestrelo de Oliveira, in Código das Sociedades Comerciais Anotado, 3ª Edição Revista e Atualizada, Coordenação António Menezes Cordeiro, pág. 1553, fosse mais correcta a solução de proteger a sociedade participada ou dominada, independentemente do tipo adoptado, devendo o regime legal aplicar- se a qualquer sociedade ou pessoa colectiva ou até a pessoa singular capaz de exercer influência determinante noutra sociedade, solução, porém, que não está consagrada, propondo que a lacuna seja preenchida através do desenvolvimento dos deveres que vinculam o sócio perante a sociedade.
[7]Definida como a “suscetibilidade ou potencialidade de uma sociedade (dita dominante) impor, com intensidade variável, decisões ou comportamentos a outra sociedade (dominada); traduz um poder direcional sobre a sociedade dominada […] a suscetibilidade de exercício de uma direção unitária das sociedades controladas […] – cf. Ana Perestrelo de Oliveira, op. cit., pág. 1574.
[8]Não interessando, neste caso, determinar se a data que releva é a data em que efectivamente se realiza a audiência final (cf. neste sentido, J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, op. cit., pág. 675; Rui Pinto, op. cit., pág. 142) ou a data designada pelo juiz para a audiência final (cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, op. cit., pág. 705).
[9]Quiçá por então estar já precludido o prazo para a alteração do requerimento probatório, nos termos do n.º 1 do art. 598ºdo CPC.
[10]- O que é uma nulidade processual? in Blog do IPPC, 18-04-2018, disponível em https://blogippc.blogspot.com/search?q=nulidade+processual.
[11]Acórdão assinado digitalmente – cf. certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.