CONFISSÃO
DIREITOS INDISPONÍVEIS
LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
ALIMENTOS
EX-CÔNJUGES
CESSAÇÃO DA PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS
NECESSIDADE
POSSIBILIDADE
Sumário

I) O reconhecimento judicial de factos não faz prova plena contra o confitente se recair sobre factos relativos a direitos indisponíveis, ficando sujeito à livre apreciação da prova pelo julgador.
II) A proibição da confissão sobre factos relativos a direitos indisponíveis não se estende a todos os factos alegados no âmbito de uma acção em que se discutam direitos daquele jaez, mas tão só aqueles em que a vontade das partes for ineficaz para produzir o efeito jurídico que pela acção se pretenda obter.
III) O direito a alimentos é indisponível no sentido de que não pode ser renunciado ou cedido, podendo, contudo, ser objecto de acordo quanto ao modo de eles serem prestados, quanto às necessidades a cobrir por eles ou quanto ao montante da prestação pecuniária a prestar pelo devedor de alimentos.
IV) O direito a alimentos entre ex-cônjuges tem carácter temporário e natureza subsidiária, depende apenas da verificação dos pressupostos gerais da necessidade e da possibilidade, sendo que o primeiro já não é aferido pelo estilo de vida dos cônjuges durante a relação matrimonial e deve cingir-se ao indispensável para o sustento, habitação e vestuário, podendo mesmo ser negado se razões manifestas de equidade o determinarem.
V) Peticionada a cessação dos alimentos através de alguma das vias processuais legalmente admissíveis, é sobre o obrigado que recai o ónus de alegar e de provar que, por virtude de circunstâncias supervenientes, não está em condições de continuar a prestar os alimentos acordados, ou que o alimentando não carece de continuar a recebê-los.

Texto Integral










Acordam os Juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra:


 I – Relatório

Requerente
A…
Requerida
F…
O Requerente, a 08.09.2020, pediu a cessação da obrigação alimentícia a favor da R., por falta de condições financeiras da sua parte para os suportar e por indignidade da Requerida para os receber.
Citada a requerida, contestou, pugnando pela improcedência do pedido.
Feito o julgamento, o Juízo de Competência Genérica de Oliveira do Hospital proferiu a seguinte decisão:
“Nos termos e com os fundamentos expostos, julga-se procedente a pretensão deduzida pelo Requerente, condenando-se a Requerida no pedido e declarando-se cessada a obrigação alimentícia do Requerente a favor da Requerida.
Custas a cargo da Requerida (art. 527º n.ºs 1 e 2, do CPC).
Valor: €12 000, 00 (art 298º nº 3 do CPC).
Registe e notifique”.
Não sanciona as partes como litigantes de má fé.

F…, não se conformando com tal decisão que declarou cessada a prestação de alimentos que o Requerente vinha prestando à Requerida, interpõe o seu recurso para este Tribunal, alinhavando, assim, as suas:
Conclusões:
(…)
2. Do objecto do recurso

Encontrando-se o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das ale­ga­ções da apelante, cumpre apreciar as seguintes questões:

1.Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.

Como é sabido, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova - consagrado no artigo 607.º nº 5 do CPC - que está deferido ao tribunal da 1ª instância, sendo que, na formação da convicção do julgador não intervêm apenas elementos racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação vídeo ou áudio, pois que a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação/transcrição.
A lei determina expressamente a exigência de objectivação, através da imposição da fundamentação da matéria de facto, devendo o tribunal analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador - artigo 607.º, nº 4 do CPC.
Todavia, na reapreciação dos meios de prova, o Tribunal da Relação procede a novo julgamento da matéria de facto impugnada, em busca da sua própria convicção, desta forma assegurando o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria, com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância.
Como se escreveu no acórdão da Relação de Lisboa de 21.12.2012 - Processo nº 5797/04.2TVLSB.L1-7, l1-7, www.dgsi.pt. -,“…a verdade judicial traduz-se na correspondência entre as afirmações de facto controvertidas, relevantes e pertinentes, aduzidas pelas partes no processo e a realidade empírica, extraprocessual, que tais afirmações contemplam, revelada pelos meios de prova produzidos, de forma a lograr uma decisão oportuna do litígio(...) Por isso mesmo, a “reconstrução” cognitiva da verdade, por via judicial, não tem, nem jamais poderia ter, a finalidade exclusiva de obter uma explicação exaustiva e porventura quase irrefragável do acontecido, como sucede, de certo modo, nos domínios da verdade história ou da verdade científica, muito menos pode repousar sobre uma crença inabalável na intuição pessoal e íntima do julgador. Diversamente, tem como objectivo conseguir uma compreensão altamente provável da realidade em causa, nos limites de tempo e condições humanamente possíveis, que satisfaça a resolução justa e legítima do caso.”
Quando o pedido de reapreciação da prova se baseie em elementos de características subjectivas – nomeadamente prova testemunhal -, a respectiva sindicação tem de ser exercida com o máximo cuidado e só deve o tribunal de 2.ª instância alterar os factos incorporados em registos fonográficos quando efectivamente se convença, com base em elementos lógicos ou objectivos e com uma margem de segurança muito elevada, que houve errada decisão na 1.ª instância, por ser ilógica a resposta dada em face dos depoimentos prestados ou por ser formal ou materialmente impossível, por não ter qualquer suporte para ela.
Os Juízes têm necessariamente de fazer uma análise crítica e integrada dos depoimentos com os documentos e outros meios de prova que lhes sejam oferecidos, por isso, quem invoca a violação do valor tabelado de um meio de prova tem de tornar claro o sentido da sua alegação, por referência aos elementos do processo.
O Tribunal de Oliveira do Hospital assentou, assim, a sua matéria de facto:

Mostram-se provados os seguintes factos (à exceção das alegações conclusivas ou de direito e repetidas):
1)
Requerente e Requerida casaram a 18 de dezembro de 1983, tendo o divórcio sido decretado em 27 de abril de 2007.
2)
Do casamento entre os agora Requerente e Requerida nasceram dois filhos, ora maiores, de nomes, R… e  F…
3)
A Requerida nasceu em 9 de abril de 1961.
4)
A Requerente possui o 12° ano de escolaridade.
5)
O Requerente nasceu a 5 de maio de 1963 e tem o 6.º ano de escolaridade.
6)
O Requerente foi admitido ao serviço do M…  a 01.06.1992.
7)
Na Tentativa de Conciliação, realizada a 27 de abril de 2017, ficou definido, no ponto 2.º do Acordo, que o Requerente se obrigaria “a pagar uma prestação mensal ao cônjuge mulher, no montante de €200,00 (duzentos euros)” a título de alimentos.
8) O Requerente pagou integralmente os alimentos a favor da Requerida até janeiro de 2019 e parcialmente até maio de 2019.
9)
Pré-existente ao divórcio, existia, continua a existir, e existirá nos próximos anos, um mútuo bancário pela aquisição da casa de morada de família.
10)
Naquele acordo, ambos os ex-cônjuges ficaram com o direito a habitar na casa de morada de família, até à sua partilha.
11)
À margem do acordo em tribunal, requerente e requerido acordaram em que cada um pagaria metade do mútuo bancário (o qual rondava, com seguro, os €220/mês), ou seja, €110,00/mensalmente.
12)
Durante os 21 meses subsequentes (até 1/2019, inclusive), o Requerente liquidou as duas obrigações (bancária e alimentícia).
13)
O Requerente, até janeiro de 2019, foi avisando a Requerida que não poderia o mesmo continuar a pagar sozinho o crédito bancário.
14)
Nos meses de fevereiro de 2019 a maio de 2019, o Requerente apenas conseguiu pagar parcialmente a pensão alimentícia tendo comunicado à Requerida que deixaria de a conseguir pagar a partir de junho de 2019 e que a mesma devia considerar como um encontro de contas o seu crédito no mútuo bancário por confronto com o seu débito na pensão alimentícia.
15)
O Requerente também exortou a Requerida a procurar emprego remunerado.
16)
O Requerente aufere de um salário ilíquido de €791,91 acrescido de €4,77/dia de subsídio de refeição por cada dia efetivamente trabalhado.
17)
O Requerente não possui qualquer outra fonte de rendimentos.
18)
O Requerente tem as seguintes despesas mensais:
a) €220,00 relativas ao mútuo bancário da C… (incluindo seguro de vida) das aqui partes, desde maio de 2017 até agosto de 2020, depositando esse valor a favor do credor hipotecário;
b) €275,00 da renda de casa onde habita o Requerente;
c) €74,46 dum empréstimo junto do Banco C…;
d) €30,00, em média, de EDP;
e) €12,50, em média, de abastecimento de água, saneamento e gestão de resíduos;
f) €18,50 de seguro automóvel;
19)
O Requerente, até ao ano de 2020, beneficiou, para o pagamento das referidas despesas e das do quotidiano, também do salário da sua ex-companheira, Sr.ª D.ª C…, que contribuía com o seu salário, correspondente ao ordenado mínimo nacional.
20)
A referida ex-companheira do Requerente faleceu em 2020 de doença oncológica.
21)
A Requerida intentou, a 19/10/2019, um requerimento executivo com vista a penhorar o seu salário, o que conseguiu, com fundamento no não pagamento da pensão alimentícia, no valor de €1.751,80.
22)
O Requerente soube disso através da sua entidade patronal, a qual lhe deu cópia do ofício recebido.
23)
O Requerente ficou surpreendido e, consequentemente, transtornado e vexado pelo sucedido.
24)
Tendo ido, “a correr” ao Tribunal, onde foi citado, a seu pedido, pessoalmente (sem ser convocado para o efeito), para apurar de toda a verdade, o que sucedeu com a Nota de Citação que recebeu a 13 de novembro de 2019.
25)
O Requerente pagou de maio de 2017 a outubro de 2019 (data da entrada do requerimento executivo) integralmente o mútuo bancário, ou seja, €220/mês.
26)
A Requerida amealhou o valor recebido no âmbito da execução de alimentos apensa aos autos principais.
27)
Desde 19.10.2019, o Requerente continuou a pagar o empréstimo bancário e, simultaneamente, através da penhora do seu vencimento, a pensão alimentícia.
28)
Entre o ano de 1979 e o mês de janeiro de 1994, a Requerida exerceu funções na sociedade comercial I…, com sede em …., dedicada à atividade de Confeções de Têxteis.
29)
Entre os anos de 2000 e 2001, exerceu funções na Instituição Particular de Solidariedade Social denominada A…, com sede em ….
30)
A Requerida deixou de trabalhar quando foi diagnosticado a F…, filho de ambos, para assegurar as necessidades de higiene, asseio, alimentação e cuidados de saúde do mesmo.
31)
Era a Requerida quem, a título principal, levava os filhos ao médico e reunia com os professores.
32)
O filho F… veio a falecer em 18 de abril de 2010.
33)
A Requerida encontra-se inscrita no Serviço de Emprego e Formação Profissional de A…, desde 06 de Julho de 2011, como candidata a emprego.
34)
A Requerente frequentou, até maio de 2018, um curso de formação, com direito a remuneração.
35)
A Requerida sofre de uma doença denominada de síndrome do ombro doloroso, acrescida das seguintes patologias: menopausa, Asma, Osteoartrose do Joelho, Pressão Arterial Elevada, sensação de Ansiedade, Nervosismo, Tensão e Obesidade.
36)
A Requerida aufere mensalmente o rendimento social de inserção no valor de 188,76 euros.
37)
A Requerida reside sozinha na casa de morada de família pagando todas as despesas inerentes à casa (luz, água), no valor mensal de 25,54 euros.
38)
Pelo menos desde fevereiro de 2019, inclusive, a Requerida nada paga para efeitos do crédito hipotecário relativo à ex-casa de morada de família.
39)
O Requerente é titular de dois veículos automóveis da marca Mercedes Benz, dos anos de 1990 e 1993.
40)
O Requerente paga as correspondentes apólices de seguro automóvel no valor global de 222,80 euros.
41)
O Requerente contraiu um crédito pessoal junto de uma entidade financeira denominada de «C…», no valor de 3.000,00 euros, a pagar em 48 prestações mensais, a coberto de um Contrato, celebrado entre as partes, em 14 de setembro de 2017, cuja prestação mensal ascende a cerca de €71,00 e destinou-se à aquisição do referido veículo de 1990, porque o Mercedes de 1993 tinha avariado.
42)
O Requerente outorgou procuração a favor de sociedade de advogados, para poder litigar nesta ação e no processo de inventário, com o n.º134/20.5T8OHP.
43)
O Requerente é jardineiro de profissão.
44)
Em 13 de Outubro de 2020 o crédito hipotecário em divida pelo Requerente e Requerida ao Banco pela aquisição da casa de morada de família cifra-se na quantia de 2.982.50 (dois mil novecentos e oitenta e dois euros e cinquenta cêntimos).
45)
O Requerente aceitou pagar pensão de alimentos de valor de 200 euros a favor da aqui requerida porque pretendia obter imediatamente o divórcio e foi-lhe transmitido por ocasião da tentativa de conciliação, designadamente, pelo lustre Mandatário da aqui Requerida que essa seria a forma de o conseguir, já que esta última não prescindia da fixação de pensão de alimentos a seu favor.
46)
O Requerente optou por deixar a casa de morada de família porque a Requerida, logo após o decretamento do divórcio, passou a vitimizar-se também no interior da mesma casa de morada de família, chegando ao ponto de retirar, sem o conhecimento e sem a autorização do aqui requerente, as roupas deste que se encontravam nos armários. Desta forma, o aqui requerente procurou precaver-se contra verosímeis encenações da parte da requerida, com imputação aquele por falsos atos de violência física ou psicológica sobre a mesma.
47)
A decisão do apoio judiciário no âmbito do processo de inventário para separação de meações, na sequência do divórcio entre Requerente e Requerida, é de pagamento faseado de taxa de justiça e demais encargos com o processo.
48)
O processo de inventário para partilha de bens por óbito dos pais (processo de inventário com o n.º1315/2015 que corre termos em Cartório Notarial de … da agora Requerida foi instaurado em 18 de março de 2015, do que o Requerente teve conhecimento.
49)
A Requerida não é cabeça de casal no processo de inventário para partilha de bens por óbito dos pais da agora Requerida, mas é-o no referido processo de inventário para separação de meações.
50)
A Requerida foi de férias ao Algarve entre os dias 3 e 7 de outubro de 2020, cujo custo ascendeu a quantia superior a €300, 00.
*
Factos não provados (além dos que estão prejudicados pelos provados e os que se suportam em alegações conclusivas ou de direito)
A)
O Requerente tem as seguintes despesas mensais:
- €10,00, em média, de telecomunicações;
- €225,00, em média, de despesas mensais consigo mesmo (á razão de €7,50/dia…), nomeadamente em 4 refeições por diárias, vestuário, gás, medicação.
B)
A penhora do vencimento do Requerente tornou-se pública no município de …. e, por causa da mesma, foi objeto de comentário entre os colegas do primeiro.
C)
Desde 18 de abril de 2010, a Requerida tem procurado trabalho.
D)
O Requerente já sabia, quando aceitou voluntariamente pagar à Requerida uma pensão de alimentos, a 27.04.2017, que a Requerida frequentava um curso de formação.
E)
A Requerida recebe por vezes a ajuda de terceiros (familiares, amigos e instituições).
F)
A Requerida foi ao Algarve entre 3 e 7 de outubro de 2020 por ter recebido ajuda financeira de terceiros.
G)
A Requerida tem suportado despesa com garrafa de gás, de seis em seis meses, no valor de 44 euros.
H)
A requerente tem suportado, na devida proporção, desde a data da propositura da ação de divórcio, 12 de março de 2017 até janeiro de 2019, o pagamento da prestação mensal do crédito hipotecário, correspondente à casa de morada de família, bem comum do casal, quer entregando em mão ao Requerente a quantia de 108, 87 euros, quer depositando diretamente na conta à ordem do dissolvido casal, com o n.º ….
I)
Em alimentação, higiene, vestuário, calçado e transportes, a requerida despende cerca de €250,00 por mês.
J)
A requerida despende mensalmente € 70,00, em média, para pagamento de despesas médicas e medicamentosas, na sequência do seu quadro clinico retratado no atestado de doença junto como documento n.º 4.
K)
A Requerida não tem outros proventos que não aqueles que provem do rendimento social de inserção.

A 1.ª instância motiva, assim, a fixação da sua matéria de facto:
 
Factos Provados:
1)
Cfr. a certidão do assento de casamento junta aos autos principais.
2)
Cfr. os documentos n.º 2 e 3 que acompanharam a acção de divórcio à data da sua entrada em juízo, em 12 de março de 2017.
3)
Cfr. a referida certidão do assento de casamento, em conjugação com as declarações de parte da Requerida.
4)
Não foi impugnado.
5)
Cfr. a referida certidão do assento de casamento, em conjugação com as declarações de parte do Requerente.
6)
Foi reconhecido na assentada.
7), 10)
Cfr. a refª eletrónica respetiva.
8), 9)
A Requerida reconheceu-o.
11)
O Requerente afirmou-o, o que se nos afigura razoável, considerando que persistia essa obrigação dos aqui Requerente e Requerida, como mutuários.
A requerida não o negou frontalmente, sendo, aliás, incoerente com a posição por si articulada – de que, não obstante, tal como sucedia desde março de 2017, já entregava ao Requerente os €108, 57 consistentes na sua parte no débito bancário.
12)
Requerente e requerida estiveram de acordo a tal respeito, sedo apenas impugnada a proveniência mensal dos €108, 57, correspondentes a metade da prestação.
13), 14)
Também nos convenceu o Requerente, considerando ter sido nessa altura que o mesmo deixou liquidar integralmente a pensão alimentícia, mantendo, porém, a prestação hipotecária.
Afigura-se-nos mais coerente, pois, caso contrário - não ter o Requerente vontade de cumprir -, este último não teria liquidado a pensão alimentícia durante o referido período, fazendo-o em simultâneo com a prestação bancária.
15)
O Requerente referiu-o, o que no contexto da referida convicção, nos faz sentido.
16)
Cfr. docs. n.ºs 1 a 3 (recibos de vencimentos), juntos com o requerimento inicial.
17)
O Requerente disse-o, o que foi confirmado peãs testemunhas A…, colega de trabalho do Requerente, e AS… e M… (pais do Requerente). Aliás, a Requerida não lhe apontou outra fonte de rendimento.
18)
a) Cfr. os docs. n.ºs 4 a 54 juntos com o requerimento inicial;
b) Cfr. os docs. n.ºs 55 a 59 juntos com o requerimento inicial;
c) Cfr. o doc. n.º 60 junto com o requerimento inicial;
d) Cfr. os docs. n.ºs 61 a 63 juntos com o requerimento inicial;
e) Cfr. os docs. n.ºs 64 a 67 juntos com o requerimento inicial;
f) Cfr. os docs. n.ºs 68 e 69 juntos com o requerimento inicial.
19), 20)
O Requerente referiu-o, o que foi confirmado pelos seus pais. Cfr., também, a declaração de IRS de 2019, apresentada conjuntamente pelo Requerente e pela sua companheira C….
21)
Cfr. a execução apensa.
22)
Cfr. o doc. n.º 70 junto com o requerimento inicial.
23)
O Requerente referiu-o, o que foi confirmado pelos referidos colega de trabalho e pais.
24)
Cfr. o doc. n.º 71 junto com o requerimento inicial.
25), 27)
O Requerente afirmou-o, o que não foi negado pela Requerida.
26)
Foi a própria Requerida a reconhecê-lo.
28), 29), 30), 31), 32)
A Requerida afirmou-o, o que não foi negado pelo Requerente, e confirmado pela testemunha MM… (amiga daquela desde crianças).
33)
Cfr. a declaração do respetivo serviço, que constitui o documento n.º 3, junto com a contestação da requerida.
34)
Não foi impugnado.
35)
Cfr. o atestado de doença redigido e subscrito pelo médico de família, que constitui o doc. n.º 4, junto com a contestação da Requerida.
36)
Cfr. a declaração do respetivo serviço, que constitui o doc. n.º 6, junto com a contestação da Requerida.
37)
Cfr. os documentos n.ºs 7 e 8, juntos com a contestação da Requerida.
Também as amigas da Requerida MM…, I… e F... o referiram.
38)
A própria o reconheceu.
39)
Cfr. os documentos n.ºs 11 e 12 juntos com a contestação da Requerida.
40)
Cfr. os documentos nºs 68 a 69 a) que acompanharam a p.i.
41)
Cfr. o documento nº 60 que acompanhou a p.i e o depoimento de parte.
42)
Assim consta de ambos os processos.
43)
O Requerente confirmou-o, bem assim o referido colega de trabalho.
44)
Cfr. o documento designado por n.º 14, junto com a contestação da Requerida.
45), 46)
O Requerente assim o disse.
47)
Assim consta no dito processo.
48)
O Requerente reconheceu-o.
49)
Assim consta de ambos os processos.
50)
A Requerida reconheceu-o.
*
Factos não provados:
A)
Não foi produzida prova concludente.
B)
A testemunha A…, sendo colega de trabalho do Requerente, não lhe deu, nem sentiu essa notoriedade.
C)
Nem as próprias amigas da Requerida e esta última o referiram, ficando-se pelo cenário previsível de não conseguir colocação profissional, devido á idade e à condição de saúde.
D)
Tal prova não foi feita. Nem se objete com o teor da petição inicial do divórcio, porquanto com o acordo em sede de tentativa de conciliação, nem sequer chegou o Requerente a recebê-la.
E)
As ditas amigas da Requerida referiram prestar-lhe ajuda, incluindo a irmã F…. Porém, não veio a ser apresentada prova mais concludente, sendo que foi a própria Requerida a reconhecer que tem amealhado o valor recebido no âmbito da execução de alimentos apensa aos autos principais.
F), G), I), J)
Não foi apresentada prova.
H)
O documento 9 reporta-se a um sms, cuja data se não percebe, em que a Requerida recrimina o Requerente por vir alegar que ela não tinha procedido ao pagamento da sua parte do crédito à habitação.
Por seu lado, o doc. 10 é uma certidão do registo automóvel.
Não descuramos que a Requerida solicitou que fosse o tribunal a pedir ao Banco extrato de março de 2017 a janeiro de 2019, tendo o tribunal indeferido o requerido, com o argumento da irrelevância respetiva para os efeitos pretendidos. Diferente será, porém, a situação em sede de inventário.
Com efeito, o requerimento de cessação data de setembro de 2020, sendo reconhecido pela Requerida que, pelo menos desde janeiro de 2019, inclusive, que nada paga para efeitos do crédito hipotecário.
K)
A própria Requerida, em declarações de parte, revelou que tem o valor recebido em sede de execução de alimentos amealhado.

Como sabemos, no processo civil moderno e como princípio geral, deverá sempre privilegiar-se a opção maximalista de recolha de todos as provas que se revelem pertinentes ao apuramento da realidade fáctica sob escrutínio. Por isso, ainda que estejam em causa direitos indisponíveis insusceptíveis de confissão, não se nos afigura justificável a proibição de um depoimento de parte que, sem prejuízo da evidente parcialidade, tem necessariamente um conhecimento directo dos factos essenciais em litígio – a prova por declarações de parte terá uma natureza essencialmente supletiva, isto é, será um meio ao qual as partes recorrerão nos casos em que, face à natureza pessoal dos factos a averiguar, pressintam que os outros meios probatórios usados não terão sido bastantes para assegurar o convencimento do juiz; colocando as declarações de parte em pé de igualdade com os demais meios de prova de livre apreciação, com base nos quais pode ser considerado provado o facto e necessidade do juiz expor os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção.
O juiz aprecia livremente todo esse manancial probatório, segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, sem prejuízo de considerar os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, bem como aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.
Será que a juiz da 1.ª instância o fez de acordo com a prova produzida nos autos?
Alega a apelante que, “O Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento a respeito dos pontos 4), 8), 9), 11), 12), 13), 14), 15), 16), 18) al. a), 20), 25), 26), 45), 46), 48) e 50) e alíneas C), E), H) e K) da decisão em recurso. Deve consequentemente ser modificada a decisão de facto recorrida, na parte relativa aos indicados pontos do elenco dos factos provados e as indicadas alíneas do elenco dos factos não provados, nos termos enunciados nestas alegações, e com o fundamento nos meios probatórios indicados (…) Esta postura processual do Requerente, salvo o devido respeito por opinião contrária, não deveria conduzir o Tribunal a julgar, no imediato, como provado a matéria de facto contante (…) atenta a natureza da obrigação em causa, obrigação de alimentos a ex-cônjuge, uma vez que o direito a alimentos é indisponível e irrenunciável - al. b) e 2008.º, n.º 1 do Código Civil.
Ora, nos termos do disposto no artigo 354° alínea b) do Código de Processo Civil (inadimissibilidade da confissão), "a confissão não faz prova contra o confitente (...) se recair sobre factos relativos a direitos indisponíveis".
A lei não admite a confissão quando estão em causa direitos indisponíveis, fá-lo coerentemente, pois se a parte não tem poder de disposição sobre o direito, por ser indisponível, então os factos que o suportam também estão subtraídos à disponibilidade da sua vontade, não podendo ser validamente alterados.
E sendo o direito a alimentos indisponível e irrenunciável as partes não podem confessar os factos relativos a esse direito, entendendo-se como tais os invocados pelo Requerente na petição inicial, como fundamentadores desse direito, e os articulados na contestação pela Requerida, em sede de oposição àqueles”.
No caso dos autos, não recaí assim sobre o Requerente o ónus de impugnação especificada dos factos alegados na contestação. Tal meio de prova é ineficaz para produzir confissão, já que esta nunca poderia ser valorada com os inerentes efeitos de irretratabilidade e força probatória plena, incorrendo a Exma. Juiz do Tribunal a quo em erro de julgamento de tais factos.
Em conclusão, e na falta de outros elementos probatórios que sustente a decisão do Julgador a quo, outra qualificação jurídica não merecia a matéria de facto impugnada do ponto 4) senão a de não provado, devendo, por isso, ser eliminado do elenco dos factos provados, porquanto tal meio de prova é ineficaz para produzir confissão, e consequentemente nunca poderia ser valorada pelo Tribunal Recorrido,  violando ao disposto nos artigos 354º, al. b) e 2008º nº1 C.Civ.”
Como sabemos, o reconhecimento judicial de factos, assumindo-se como meio de prova com força probatória vinculada, face ao que resulta da alínea b) do artigo 354.º do Código Civil, não faz prova plena contra o confitente se recair sobre factos relativos a direitos indisponíveis, sendo que, nestes casos, como resulta do artigo 361.º, do mesmo Código, vigora o princípio da livre apreciação da prova, ou seja aquele reconhecimento vale como elemento probatório que o tribunal apreciará livremente. Esse mesmo regime encontra-se estabelecido na lei processual civil, assim no artigo 574.º, n.º 2, do Código do Processo Civil, quando nesse se excepciona, a propósito do ónus de impugnação, excluindo-os da regra geral de que se consideram “admitidos por acordo os factos que não forem impugnados”, precisamente, também, se estiverem em causa factos em relação aos quais não seja admissível a respetiva confissão.
Da aplicação do indicado regime, a propósito da valoração de eventual declaração que se assuma como o reconhecimento de factos, teremos então de ter presente que, estando em causa factos relativos a direitos indisponíveis, como ocorre em matéria de acidentes de trabalho, divórcio, impugnação da paternidade, alimentos a menores, não estaremos então perante “confissão” sujeita à força probatória vinculada, estando antes, diversamente, sujeita à livre apreciação do julgador, em conjugação com a demais prova produzida.
Mas, a lei fala em factos relativos a direitos indisponíveis. Ou seja, o legislador não pretendeu estender a proibição total da confissão a todos os factos, alegados no âmbito de uma acção em que se discutam direitos indisponíveis, mas tão só aqueles em que a vontade das partes for ineficaz para produzir o efeito jurídico que pela acção se pretenda obter. A ideia do legislador foi evitar que nas relações subtraídas à disponibilidade das partes, estas pudessem conseguir indiretamente – ou até provocá-lo de modo não intencional – um efeito jurídico que não podiam produzir extrajudicialmente através de negócio jurídico (declaração de vontade) ao mesmo efeito destinado. Por isso, teve o cuidado de o dizer, no caso da revelia - art.º 485.º, al. c) - que os efeitos desta, por ausência de contestação, cominados pelo art.º 484.º do mesmo código, não operam: “Quando a vontade das partes for ineficaz para produzir o efeito jurídico que pela ação se pretende obter”.
Esmiuçando.
É verdade que segundo o n.º 1 do artigo 2008.º do Código Civil, o direito a alimentos é indisponível; mas é indisponível no sentido de que não pode ser renunciado ou cedido - Como refere Abel Delgado, in “Divórcio”, pág. 183, a indisponibilidade do direito a alimentos é compreensível, na medida em que os alimentos têm por fim a satisfação de necessidades irrenunciáveis. Mas, já não é indisponível no sentido de que não pode ser objecto de acordo quanto ao modo de eles serem prestados, quanto às necessidades a cobrir por eles ou quanto ao montante da prestação pecuniária a prestar pelo devedor de alimentos. Estes aspectos podem ser objecto de acordo entre os interessados, como o atestam por exemplo o n.º 1 do artigo 2005.º do CC  - na parte em que prevê acordo sobre o modo de prestar alimentos -, o artigo 2006.º do CC  - na parte em que prevê acordo sobre o momento a partir do qual são devidos os alimentos -, o n.º 3 do artigo 936.º do CPC - na parte em que prevê acordo sobre a cessação ou alteração dos alimentos -  e o n.º 1 do artigo 47.º do RGPTC  - aplicável ao processo de prestação de alimentos a filhos maiores ou emancipados por remissão do n.º 1 do artigo 989.º do CPC -  na parte em que se refere à hipótese de acordo dos interessados sobre a prestação de alimentos.
No caso em apreço, é a lei quem, não obstante a irrenunciabilidade do direito, deixa, expressamente, na disponibilidade da pessoa a renúncia a prestações vencidas e que, se assim o entender, não os pedir.
Não esquecer, também, que a Lei n.º 61/2008, de 31-10  veio introduzir alterações significativas no regime dos alimentos entre ex-cônjuges no seguimento de divórcio, tendo esse direito passado a ter cariz excepcional. Ao ter optado, claramente, por aderir ao princípio da auto-suficiência, o legislador passou a conferir ao direito a alimentos entre ex-cônjuges carácter temporário e natureza subsidiária, características estas que estão bem evidenciadas no art.º 2016.º do Código Civil.
Neste novo modelo – associado, em grande medida, ao divórcio desligado do conceito de culpa – o referido direito depende apenas da verificação dos pressupostos gerais da necessidade e da possibilidade enunciados no art.º 2004.º do Código Civil, sendo que o primeiro, como decorre expressamente do texto do n.º 3 do art.º 2016.º-A do Código Civil, já não é aferido pelo estilo de vida dos cônjuges durante a relação matrimonial e deve cingir-se ao indispensável para o sustento, habitação e vestuário,   não se verificando, contudo, se “razões manifestas de equidade” levarem a negá-lo.
E evidentemente, não obstante a natureza de tal direito, a própria lei também prevê que o obrigado a alimentos - a ex-cônjuge - se pode subtrair ao cumprimento da obrigação, contanto que prove que não é razoável exigir-lhe a continuação da contribuição; e/ou que face à sua situação económica, não lhe é permitido continuar a cumprir tal obrigação.
Por isso, como escreve o apelado “Em adicional, o reconhecimento do que a Recorrente fez com o dinheiro emergente da pensão de alimentos em nada tem a ver com a inalienabilidade ou irrenunciabilidade do Direito à Pensão de Alimentos; por outro lado, o que é que tem a ver a alegação/confissão de factos, que nada têm a ver com o direito a alimentos, com a indisponibilidade e irrenunciabilidade do Direito em si?
Ou seja, não obstante a indisponibilidade da obrigação de alimentos, a vontade da ré é eficaz para produzir o efeito jurídico que pela presente acção se pretende obter, por a relação jurídica não se encontrar subtraída à sua vontade, podendo o Tribunal considerar a aceitação de certos factos, quer da apelante quer do apelado e daí retirar a sua conclusão, no arrumar dos factos provados/não provados.
Avançando.
Vejamos se a apelante tem razão na sua observação da produção de prova, sendo que, em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela 1.ª instância, em observância dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte:
4) - a Requerente possui o 12° ano de escolaridade- a apelante assume o facto; 8) - O Requerente pagou integralmente os alimentos a favor da Requerida até janeiro de 2019 e parcialmente até maio de 2019  e 9) - Pré-existente ao divórcio, existia, continua a existir, e existirá nos próximos anos, um mútuo bancário pela aquisição da casa de morada de família  - a apelante aceita estes factos na sua oposição ao pedido do autor, sendo que estamos perante facto notório quanto às consequências futuras da celebração de um empréstimo bancário, ainda não pago na sua totalidade;  11) - À margem do acordo em tribunal, requerente e requerido acordaram em que cada um pagaria metade do mútuo bancário (o qual rondava, com seguro, os €220/mês), ou seja, €110,00/mensalmente - O Requerente afirmou-o, o que se nos afigura razoável, considerando que persistia essa obrigação dos aqui Requerente e Requerida, como mutuários. A requerida não o nega frontalmente, sendo, aliás, incoerente com a posição por si articulada – de que, não obstante, tal como sucedia desde março de 2017, já entregava ao Requerente os €108, 57 consistentes na sua parte no débito bancário. É incoerente que a apelante pretenda fazer, neste particular, a sua valoração contrária à da 1.ª instância, “…, mas, simultaneamente queira fazer crer o Tribunal que alega que pagou, durante 21 meses consecutivos, metade da prestação bancária mas que não houve um acordo nesse sentido…? (…) se os 2 ficaram com o direito a habitar na que era a Casa de Morada de Família, e que os 2 eram mutuários, a que princípio da experiência ou outros é que é necessário apelar para intuir e concluir que acordaram pagar, em partes iguais, o mútuo?”,  como bem escreve o apelado nas suas contra-alegações; 12) - Durante os 21 meses subsequentes (até 1/2019, inclusive), o Requerente liquidou as duas obrigações (bancária e alimentícia) – Como bem fundamenta, esta partícula factual, a senhora juiz da 1.ª instância, requerente e requerida estiveram de acordo a tal respeito, sedo apenas impugnada a proveniência mensal dos €108, 57, correspondentes a metade da prestação; , 13) - O Requerente, até janeiro de 2019, foi avisando a Requerida que não poderia o mesmo continuar a pagar sozinho o crédito bancário; 14) - Nos meses de fevereiro de 2019 a maio de 2019, o Requerente apenas conseguiu pagar parcialmente a pensão alimentícia tendo comunicado à Requerida que deixaria de a conseguir pagar a partir de junho de 2019 e que a mesma devia considerar como um encontro de contas o seu crédito no mútuo bancário por confronto com o seu débito na pensão alimentícia; Tal como à 1.ª instância, também nos convenceu o depoimento lógico e racional do apelado, considerando ter sido nessa altura que o mesmo deixou liquidar integralmente a pensão alimentícia, mantendo, porém, a prestação hipotecária. Afigura-se-nos mais coerente, pois, caso contrário - não ter o Requerente vontade de cumprir-, este último não teria liquidado a pensão alimentícia durante o referido período, fazendo-o em simultâneo com a prestação bancária; Mais, considerando os rendimentos mensais do apelado, cerca de €715/mensais, “…como é que podia não deixar de ir insistindo com esta para ela pagar a sua quota-parte, se só em renda da casa, prestação bancária e prestação de alimentos consumiam o seu vencimento líquido? Como é que se alimentava, vestia, suportava as despesas de saúde, combustível, seguro automóvel, telemóvel, luz, água, … etc.?.
15) - O Requerente também exortou a Requerida a procurar emprego remunerado; decorre das declarações do apelado e mostra-se plausível, razoável, até no seguimento dos anteriores factos provados; 16) - O Requerente aufere de um salário ilíquido de €791,91 acrescido de €4,77/dia de subsídio de refeição por cada dia efetivamente trabalhado – Os factos estão nos documentos n.ºs 1 a 3 (recibos de vencimentos), juntos com o requerimento inicial;  18) al. a) - O Requerente tem as seguintes despesas mensais:  €220,00 relativas ao mútuo bancário da C… (incluindo seguro de vida) das aqui partes, desde maio de 2017 até agosto de 2020, depositando esse valor a favor do credor hipotecário – Resulta dos documentos n.ºs 4 a 54 - mensais e sucessivos talões de depósito para pagamento do mútuo bancário - juntos com o requerimento inicial; 20) - A ex-companheira do Requerente faleceu em 2020 de doença oncológica – tratando-se de questão lateral, que rigorosamente não faz parte do “thema decidendum” e apenas vale para este processo, a prova da morte não necessita de ser feita por documento autêntico.
“Ora, o óbito duma pessoa, acrescido de ser numa localidade pequena, é do conhecimento geral. Consequentemente, a alegação por escrito, depoimento de parte do Recorrido    e as declarações de mais duas testemunhas (os seus pais), são o necessário e suficiente para que o Tribunal possa dar como provado o óbito com efeitos apenas para este processo”.
Como se escreveu no Acórdão do STJ de 12.01.2006 - conselheiro Oliveira Barros - in www.dgsi.pt, “aceite, embora, que o Direito é “uma ciência de rigor” (Heidegger), permanece exacto o ditado segundo o qual – summum jus, summa injuria – “boas são as leis, melhor o uso que delas se faz”.
25), O Requerente pagou de maio de 2017 a outubro de 2019 (data da entrada do requerimento executivo) integralmente o mútuo bancário, ou seja, €220/mês; 26) A Requerida amealhou o valor recebido no âmbito da execução de alimentos apensa aos autos principais -  O Requerente afirmou-o, o que não foi negado pela Requerida; a Requerida reconhece-o; 45) - O Requerente aceitou pagar pensão de alimentos de valor de 200 euros a favor da aqui requerida porque pretendia obter imediatamente o divórcio e foi-lhe transmitido por ocasião da tentativa de conciliação, designadamente, pelo lustre Mandatário da aqui Requerida que essa seria a forma de o conseguir, já que esta última não prescindia da fixação de pensão de alimentos a seu favor ; e 46) - O Requerente optou por deixar a casa de morada de família porque a Requerida, logo após o decretamento do divórcio, passou a vitimizar-se também no interior da mesma casa de morada de família, chegando ao ponto de retirar, sem o conhecimento e sem a autorização do aqui requerente, as roupas deste que se encontravam nos armários. Desta forma, o aqui requerente procurou precaver-se contra verosímeis encenações da parte da requerida, com imputação aquele por falsos atos de violência física ou psicológica sobre a mesma -.
A 1.ª instância deu estes factos como provados com as declarações do próprio requerente “O Requerente assim o disse”.  
É certo que, como princípio genérico, inscrevendo-se a atividade de valoração das declarações de parte no âmbito da livre apreciação da prova, compreende-se que se recuse ao depoimento não confessório força para, desacompanhado de qualquer outra prova, permitir a demonstração do facto favorável ao depoente. Mas a vida tem excepções, tal como nos casos em que, face à natureza pessoal dos factos a averiguar, seja a única forma processual de convencer o julgador. Aí, o juiz terá de ponderar a coerência das declarações de parte e a afirmação do detalhe. Acresce a isto, o facto de as declarações de parte serem confirmadas (ou não) por outros dados que, indiretamente, demonstrem a veracidade da declaração.
Escutado o seu depoimento, considerando que estas partículas factuais tiveram lugar na intimidade do lar conjugal, logo após o divórcio, parecem-nos críveis e verosímeis.
Por outro lado, seguindo o raciocínio do apelado, “como queria obter, o quanto antes, o Divórcio e não lhe foi explicado (nem teria de o ser por quem lá estava) que também poderia obter o divórcio sem ficar “amarrado” a uma pensão de alimentos, embora mais tarde e dependendo da prova produzida em futura Audiência de Julgamento, foi perante este cenário de conhecimento parcial da tramitação processual que o Recorrido fundou o seu raciocínio.
Ora, alicerçando a sua decisão em premissas erradas (porque não conhecia as possibilidades todas), é óbvio concluir que o Recorrido apenas aceitou pagar uma pensão de alimentos, a qual era insustentável, porque sopesou com maior valor a vantagem de se divorciar, imediatamente.
(…) Se de facto, houvesse um acordo prévio entre as partes, sobre todos os diversos acordos que a Lei impõe para um divórcio por mútuo consentimento, para que é que a Recorrente intentou a PI no Tribunal?
É óbvio que o Recorrido só foi confrontado no dia da tentativa de conciliação e teve de decidir, nesse instante, com a informação que lhe foi fornecida”.
 48) - O processo de inventário para partilha de bens por óbito dos pais (processo de inventário com o n. º1315/2015 que corre termos em Cartório Notarial de …), da agora Requerida foi instaurado em 18 de março de 2015, do que o Requerente teve conhecimento; A literalidade da frase (…) (processo de inventário com o n.º 1315/2015 que corre termos em Cartório Notarial de …) (…) leva a concluir que ainda não se procedeu à partilha.
  50) -  A Requerida foi de férias ao Algarve entre os dias 3 e 7 de outubro de 2020, cujo custo ascendeu a quantia superior a €300, 00 - A Requerida admitiu estes factos.
Dos factos não provados: alíneas C) - Desde 18 de abril de 2010, a Requerida tem procurado trabalho - Não foi produzida prova concludente.  No seu depoimento a apelante limitou-se a frases vagas e genéricas. Não foi capaz de identificar um único local aonde se tenha dirigido a perguntar por trabalho para si. Existem contradições várias nos depoimentos das testemunhas. Se esta declara que em dez anos apenas participou numa acção de formação já a testemunha  I… refere que “tirou cursos”.Já a sua irmã, F…, também, interessadamente, diz que a Recorrente tentou muita vez, mas não foi capaz de identificar nenhum local onde a irmã tenha ido perguntar por trabalho, em dez anos.
  E) - A Requerida recebe por vezes à ajuda de terceiros (familiares, amigos e instituições)  e K) - A Requerida não tem outros proventos que não aqueles que provem do rendimento social de inserção - Não foi produzida prova; A própria Requerida, em declarações de parte, revelou que tem o valor recebido em sede de execução de alimentos amealhado; H) - A requerente tem suportado, na devida proporção, desde a data da propositura da ação de divórcio, 12 de março de 2017 até janeiro de 2019, o pagamento da prestação mensal do crédito hipotecário, correspondente à casa de morada de família, bem comum do casal, quer entregando em mão ao Requerente a quantia de 108, 87 euros, quer depositando diretamente na conta à ordem do dissolvido casal, com o n.º …. -  O documento 9 reporta-se a um sms, cuja data se não percebe, em que a Requerida recrimina o Requerente por vir alegar que ela não tinha procedido ao pagamento da sua parte do crédito à habitação. Por seu lado, o doc. 10 é uma certidão do registo automóvel. Não descuramos que a Requerida solicitou que fosse o tribunal a pedir ao Banco extrato de março de 2017 a janeiro de 2019, tendo o tribunal indeferido o requerido, com o argumento da irrelevância respetiva para os efeitos pretendidos. Diferente será, porém, a situação em sede de inventário.
Com efeito, o requerimento de cessação data de setembro de 2020, sendo reconhecido pela Requerida que, pelo menos desde janeiro de 2019, inclusive, que nada paga para efeitos do crédito hipotecário.
Concluindo.
Como se pode ler, in “Impugnação”, in Estudos em Homenagem ao Prol Doutor José Lebre de Freitas, Vol. I. Coimbra, 2013, pág. 609 e 610/ - Ana Luísa Geraldes,  “Em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela 1.ª instância, em observância dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte(…) O que o controlo de facto em sede de recurso não pode fazer é, sem mais, e infundadamente, aniquilar a livre apreciação da prova do julgador construída dialeticamente na base dos referidos princípios da imediação e da oralidade”
Nestes termos, improcede, “in totum”, a impugnação da matéria de facto assente pelo Juízo de Competência Genérica de Oliveira do Hospital.
Avançando.
2.Dos alimentos entre ex-cônjuges
A Lei n.º 61/2008, de 31-10, veio introduzir alterações significativas no regime dos alimentos entre ex-cônjuges no seguimento de divórcio, tendo esse direito passado a ter cariz excepcional. Ao ter optado, claramente, por aderir ao princípio da auto-suficiência, o legislador passou a conferir ao direito a alimentos entre ex-cônjuges carácter temporário - visa apenas permitir a transição para a independência económica do ex-cônjuge que se encontra em situação de necessidade -, natureza subsidiária e de carácter reabilitador, características estas que estão bem evidenciadas no art.º 2016.º do Código Civil - será o diploma a citar sem menção de origem.
Neste novo modelo – associado, em grande medida, ao divórcio desligado do conceito de culpa – o referido direito depende apenas da verificação dos pressupostos gerais da necessidade e da possibilidade enunciados no art.º 2004.º, sendo que o primeiro, como decorre expressamente do texto do n.º 3 do art.º 2016.º-A, já não é aferido pelo estilo de vida dos cônjuges durante a relação matrimonial e deve cingir-se ao indispensável para o sustento, habitação e vestuário,   não se verificando, contudo, se “razões manifestas de equidade” levarem a negá-lo.
“Como consequência da adoção do sistema de divórcio constatação de ruptura, por via do que a nossa lei consagra atualmente o princípio da auto-suficiência, decorre o carácter temporário da obrigação a favor dos ex-cônjuges (cf. art. 2016º do C.Civil), isto é, a regra geral, em matéria de alimentos entre ex-cônjuges, depois do divórcio ou da separação judicial de pessoas e bens, é a de que cada cônjuge deve prover à sua subsistência, constituindo exceção o direito a alimentos, a que qualquer dos cônjuges tem direito independentemente do tipo de divórcio, sendo que, por razões manifestas de equidade, o direito a alimentos pode ser-lhe negado; Sendo fundada a dita obrigação num dever de solidariedade pós conjugal, a sua constituição depende da necessidade do credor e das possibilidades do devedor; de caráter essencialmente alimentar, a prestação fica sujeita a alterações nos termos do art. 2102º do mesmo C.Civil e cessa tão logo o titular do direito seja capaz de prover à sua subsistência ou o devedor fique sem recursos que lhe permitam continuar a suportá-la (cf. arts. 2012º e 2013º ainda do mesmo C.Civil). Assim, se no caso vertente, os factos permitem concluir que se havia verificado efetivamente uma alteração de circunstâncias, nada há que censurar à decisão que declarou cessada a prestação alimentar – Acórdão desta Relação de 19.12.2018-relator Luís Cravo, pesquisável in www.dgsi.pt .
E evidentemente, não obstante a natureza de tal direito, a própria lei também prevê que o obrigado a alimentos - a ex-cônjuge - se pode subtrair ao cumprimento da obrigação, contanto que prove que não é razoável exigir-lhe a continuação da contribuição; e/ou que face à sua situação económica, não lhe é permitido continuar a cumprir tal obrigação – neste particular, como defendeu o Acórdão do STJ de 20.11.2003 – pesquisado em www.dgsi.pt, “para se aquilatar da maior ou menor capacidade do devedor de alimentos terá de se tomar em linha de conta não só com os seus meios de rendimento como também com os encargos a que se encontre adstrito, para além daqueles que possam decorrer da própria prestação alimentícia a determinar. Mas tais encargos, obviamente, que carecem de ser hierarquizados de modo a que só sejam tomados em consideração os que se mostrem justificados pelas necessidades de uma condigna subsistência do prestador de alimentos, excluindo-se todos aqueles que promanem de uma obrigação que não possa, ou não deva prevalecer sobre a obrigação alimentar. É que se assim não fosse, bastaria ao devedor de alimentos assumir os encargos voluptuários e desnecessários que lhe aprouvesse para ficar desobrigado de prestar alimentos, o que a ética e o direito não aceitam”.
Pode ler-se no artigo 2003º nº 1 que, “Por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário”. Na vigência da sociedade conjugal – lê-se no artigo 2015º - (…) os cônjuges são reciprocamente obrigados à prestação de alimentos, nos termos do artigo 1675º”.
Por seu turno, o artigo 2004º refere que “os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los. Na fixação dos alimentos atender-se-á, outrossim, à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência.”
Quanto ao montante dos alimentos, devidos entre ex-cônjuges, rege o artigo 2016º-A: “Na fixação do montante dos alimentos deve o tribunal tomar em conta a duração do casamento, a colaboração prestada à economia do casal, a idade e estado de saúde dos cônjuges, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, o tempo que terão de dedicar, eventualmente, à criação de filhos comuns, os seus rendimentos e proventos, um novo casamento ou união de facto e, de modo geral, todas as circunstâncias que influam sobre as necessidades do cônjuge que recebe os alimentos e as possibilidades do que os presta.
Mais, a obrigação de prestar alimentos cessa, quando aquele que os presta não possa continuar a prestá-los ou aquele que os recebe deixe de precisar deles - artigo 2013º.
Estando em causa – como ora sucede - uma cessação da obrigação alimentar antes fixada, relevam, naturalmente, as alterações supervenientes relativamente à data em que a obrigação de alimentos foi fixada – 27 de Abril de 2017 -, seja quanto às necessidades do alimentando, seja quanto às possibilidades do obrigado, pois que quanto às condições existentes à data do acordo é de presumir que as partes as tiveram presentes e ponderaram quando o outorgaram.
Mais, tendo na tentativa de conciliação, realizada a 27 de abril de 2017, ficado definido, no ponto 2.º do Acordo, que o Requerente se obrigaria “a pagar uma prestação mensal ao cônjuge mulher, no montante de €200,00 (duzentos euros)” a título de alimentos, devidamente homologado pelo juiz, formou-se caso julgado. Ou seja, depois de homologado judicialmente os acordos, que permitiram a convolação da instância e que condena o apelado a pagar alimentos à ex-cônjuge, é esta decisão que vincula os intervenientes processuais para o futuro.
Por isso, a questão invocada pelo agora apelado – “Do ponto 45) resulta que “o Requerente aceitou pagar pensão de alimentos de valor de 200 euros a favor da aqui requerida porque pretendia obter imediatamente o divórcio e foi-lhe transmitido por ocasião da tentativa de conciliação, designadamente, pelo lustre Mandatário da aqui Requerida que essa seria a forma de o conseguir, já que esta última não prescindia da fixação de pensão de alimentos a seu favor” teria de ser alegada antes do trânsito da sentença homologatória, que produziu assim os correspondentes efeitos processuais e de direito substantivo, constituindo caso julgado material. Não o tendo feito, precludiu tal direito de o fazer nesta instância - Quando as partes chegam a um acordo, pondo fim ao litígio, a função do tribunal é apenas de fiscalização da validade e regularidade do acordo quanto ao objeto e partes nele intervenientes.
Desta forma, formulado pedido de cessação dos alimentos através de alguma das vias processuais legalmente admissíveis, é sobre o obrigado que recai o ónus de alegar e de provar que, por virtude “de circunstâncias supervenientes, não está em condições de continuar a prestar os alimentos acordados, ou que o alimentando não carece de continuar a recebê-los” - Acórdão da Relação do Porto de 24.01.2018, processo n.º 3435/05.9TBVNG-D.P1, www.dgsi.pt; Acórdão da mesma Relação de 15.04.2013, processo n.º 7367/06.5TBVNG-A.P1; Acórdão da Relação de Lisboa de 9.11.2017, processo n.º 2032/15.5T8BRR.L1-2; Acórdãos da Relação de Guimarães de 12.03.2020, processo n.º 1459/07.0TBBCL-C.G1 e de 9.03.2027, processo n.º 4992/15.7T8BRG.G1, todos em www.dgsi.pt.
No Acórdão desta Relação de 24.10.2027-relator Fontes Ramos, pode ler-se: ” A cessação da obrigação alimentar pode resultar, designadamente, da falta de recursos do devedor para cumprir (aquele que os presta não possa continuar a prestá-los) ou da circunstância de o credor já não necessitar dos alimentos (aquele que os recebe deixe de precisar deles) (art.º 2013º, n.º 1, al. b) do CC). No processo especial para a cessação dos alimentos a ex-cônjuge (art.º 936º do CPC) cabe ao requerente a prova de que se alteraram as suas possibilidades económicas ou as necessidades da requerida, ou que esta passou a estar em condições de prover ao seu sustento sem qualquer auxílio daquele”;
“Fundada tal obrigação num dever de solidariedade pós conjugal, a sua constituição depende da necessidade do credor e das possibilidades do devedor; de carácter essencialmente alimentar, a prestação fica sujeita a alterações nos termos do art.º 2102.º e cessa tão logo o titular do direito seja capaz de prover à sua subsistência ou o devedor fique sem recursos que lhe permitam continuar a suportá-la (cf. art.ºs 2012.º e 2013.º) – Acórdão desta Relação de 31.5.2015, relatora Maria Domingas Simões”- ambos pesquisados em www.dgsi.pt.
Mais, em matéria de alimentos entre ex-cônjuges depois do divórcio ou da separação judicial de pessoas e bens, impera a regra de que “cada cônjuge deve prover à sua subsistência”, devendo, nesse sentido, ter-se em conta de que se trata de um direito excepcional, tendencialmente transitório e de carácter reabilitador, e não um ‘seguro de vida’ para todo o sempre, por o casamento não poder criar uma expectativa jurídica de garantia de auto-suficiência sem limites após o divórcio, nem ser concebível a manutenção de um ‘status económico’ relativamente a uma relação jurídica já extinta – neste preciso sentido, o Acórdão do TRG de 14.1.2021, consultável em www.dgsi.pt .
Como escreve a 1.ª instância:
“Compreende-se perfeitamente que o montante da prestação alimentícia haja de ser produto de dois fatores; necessidade do credor; meios de que dispõe o devedor. Tomados em consideração estes dois fatores no momento em que o tribunal foi chamado a fixar a prestação, a sentença arbitrou certa quantia. Porém, passado algum tempo, as circunstâncias mudaram; aumentaram, por exemplo, as necessidades do credor ou diminuíram sensivelmente, os meios do devedor. Está alterada, portanto, a base de facto sobre que assentou a decisão judicial. É justo e razoável que se reveja o assunto, que se examine novamente o caso, e que se profira nova decisão adequada ao condicionalismo atual. É o que a lei substantiva expressamente autoriza (artº 2012º, do C.C.). Naturalmente, a lei encara ainda a hipótese de haver fundamento para a cessação dos alimentos. Causa geral: não poder o devedor continuar a prestá-los ou deixar o credor de precisar deles (artº 2013º, nº 1 b), do CC).
Em conformidade com estes textos da lei substantiva, a lei adjetiva permite a alteração do caso julgado material a fim de que a sentença se ajuste ao novo condicionalismo de facto que as circunstâncias criaram. Por conseguinte, como qualquer outra prestação duradoura dependente de circunstâncias especiais, a prestação alimentícia, uma vez fixada, não é imutável; desde que mudem as circunstâncias a que se atendeu para a fixação, a decisão pode ser alterada: pode a prestação ser modificada, para mais ou para menos, e pode até cessar. Quer dizer, ao caso julgado falta, nesta hipótese, a caraterística da estabilidade ou da imutabilidade.
Mas, note-se, um aspeto: a modificação da decisão proferida só é admissível em função de circunstâncias supervenientes ao seu trânsito em julgado, quer dizer, se tiver ocorrido uma alteração superveniente dos condicionalismos de fato em que ocorreu o proferimento daquela e que determinaram a condenação, e, de outro, que, enquanto não for substituído, o caso julgado anterior mantém intactas a sua autoridade e eficácia.
Ressalvam-se, por isso, os efeitos já produzidos pela decisão alterada, excluindo, consequentemente, a destruição retroativa, pelo novo caso julgado, dos efeitos produzidos pelo caso julgado anterior. A modificação só opera ex nunc e não ex tunc: a instabilidade do caso julgado não vai até ao ponto de prejudicar os efeitos que já tenha produzido a decisão anterior; esses efeitos subsistem: a nova decisão só exerce a sua eficácia para o futuro.
A modificação da decisão proferida só é admissível em função de circunstâncias supervenientes ao seu trânsito em julgado, quer dizer, se tiver ocorrido uma alteração superveniente dos condicionalismos de facto em que ocorreu o proferimento daquela e que determinaram a condenação.
Exige-se, pois, para autorizar o juiz a modificar o caso julgado material formado sobre a sentença que fixou a prestação alimentícia, uma alteração das circunstâncias por ele tomadas em conta no momento em que proferiu a condenação. Mas essa modificação superveniente há-se ser puramente objetiva ou pode sê-lo também meramente subjetiva?
A resposta exata ao quesito é esta: é indiferente a natureza objetiva ou puramente subjetiva da alteração das circunstâncias, dado que tanto autorizam a modificação as circunstâncias ocorridas posteriormente à decisão - como as anteriores mas que não tenham sido alegadas por ignorância ou outro motivo ponderoso. É a solução diretamente exposta na lei no tocante aos processos de jurisdição voluntária, mas que deve valer para todos os casos em que a lei admita a modificação da res judicata com fundamento na alteração das circunstâncias (artº 988º, nº 1, 2ª parte, do CPC). A sentença que fixou alimentos não pode ser prejudicada por factos que já se tenham produzido à data do encerramento da discussão; só o pode ser em consequência de factos supervenientes”.
O que nos dizem os autos:
Depois do acordo de 27 de abril de 2017 – feito no âmbito da acção de divórcio e devidamente homologado por sentença -, e como refere o Tribunal de Oliveira do Hospital, registam-se as seguintes alterações:
“1) Pelo menos desde fevereiro de 2019, inclusive, a Requerida continua a habitar a casa de morada de família (ex), sem liquidar a sua parte no crédito à habitação (€110, 00), sendo o Requerente sozinho a fazê-lo;
2) A Requerida recebe cerca de €189,00 de RSI mensal, sendo que se desconhece a remuneração do curso de formação à data do divórcio. Incumbia à Requerida o respetivo ónus da prova;
3) O Requerente teve que sair da ex-casa de morada de família (…);
4) Por conseguinte, o Requerente teve de arrendar uma casa, pela renda mensal de €275,00;
5) O Requerente, por força da avaria do automóvel, teve de adquirir outro, o que fez com recurso ao crédito;
6) Com o seu falecimento, o Requerente deixou de poder contar com o contributo para as despesas da sua ex-companheira.
Por seu lado, estamos perante uma Requerida que não exerce atividade remunerada há cerca de 20 anos, sendo certo que tem mais habilitações literárias que as do Requerente – 12º ano e 6º ano respetivamente.
Note-se, a este respeito, que o filho F… faleceu há mais de 10 anos.
Em terceiro lugar, quem carece de alimentos de outrem, não amealha, como a própria reconheceu ter feito, nem tem disponibilidade para férias, como sucedeu com a mesma recentemente. Não se desconsidera tratar-se de um direito, mas num contexto em que alegadamente depende de alimentos do ex-marido para subsistência, não poderá ser assim considerada um a escapadela dessa natureza.
Em quarto lugar, assumidamente, está pendente inventário por óbito dos pais da Requerida, além do inventário para separação de meações. Ora, as expetativas da Requerida deverão motivá-la para ser processualmente diligente.
O que acaba de ser dito mais não constitui que uma decorrência do princípio da autossuficiência do ex-cônjuge, no que à sua subsistência diz respeito, tão bem espelhado no art. 2016º do CC (…) Aliás, não deixa de constituir uma visão curiosa da Requerida que reside na ex-casa de morada de família e não contribui reconhecidamente para a liquidação do crédito hipotecário, pelo menos desde fevereiro de 2019 inclusive, a afirmação de que “o pagamento das prestações bancárias relativas à amortização do empréstimo que o casal contraiu para aquisição da casa de morada de família, trata-se de uma opção do Requerente no sentido da manutenção do património comum, o que será valorado aquando da partilha em sede de processo de inventário e não nesta ação”.
A questão que fica por responder prende-se com saber onde passaria a Requerida a residir, caso o credor avançasse com a realização coerciva do crédito hipotecário. Pelo que, salvo o devido respeito, a importância de tal liquidação não se fica por “nos termos do art.º 1689º, nº 3, do CC, as alegadas quantias que agora está a despender farão nascer na sua esfera jurídica um crédito a seu favor sobre a Requerida, relativamente aos montantes que, após a dissolução do casamento, despender para além da contribuição que lhe era exigível.”
Concordamos com as palavras da 1.ª instância.
Consideramos, ainda, que o Requerente aufere de um salário ilíquido de €791,91 acrescido de €4,77/dia de subsídio de refeição por cada dia efetivamente trabalhado - que não possui qualquer outra fonte de rendimentos - e que tem as seguintes despesas mensais: a) €220,00 relativas ao mútuo bancário da C… (incluindo seguro de vida) das aqui partes, desde maio de 2017 até agosto de 2020, depositando esse valor a favor do credor hipotecário; b) €275,00 da renda de casa onde habita o Requerente; c) €74,46 dum empréstimo junto do Banco C…; d) €30,00, em média, de EDP; e) €12,50, em média, de abastecimento de água, saneamento e gestão de resíduos; f) €18,50 de seguro automóvel;  e que, até ao ano de 2020, beneficiou, para o pagamento das referidas despesas e das do quotidiano, também do salário da sua ex-companheira - faleceu em 2020 de doença oncológica -, que contribuía com o seu salário, correspondente ao ordenado mínimo nacional.
Por isso, assente que o direito a alimentos não se funda na continuação das obrigações conjugais, de natureza económica – nas palavras do acórdão do STJ de 23.10.2012; proc.20/10.6TBTMR.C1.S1, “o casamento não cria uma expectativa jurídica de garantia da auto-suficiência, durante e após a dissolução do matrimónio, o que consubstanciaria um verdadeiro “seguro de vida”, por não ser concebível a manutenção de um “status económico” atinente a uma relação jurídica já extinta, sendo certo que cada cônjuge deve prover à sua subsistência, depois do divórcio” -, para além do divórcio e a determinação do montante dos alimentos reabilitadores norteia-se pela necessidade de atribuir, ao ex-cônjuge necessitado, os instrumentos necessários para superar os obstáculos existentes no mercado de trabalho, teremos de julgar improcedente a instância recursiva, mantendo-se a decisão que declarou cessada a obrigação alimentícia do Requerente a favor da Requerida.
 
Da litigância de má fé
Além de alegações “robustas”, não estamos perante lide temerária ou pretensão/defesa manifestamente inviáveis, constitutivas do abuso do direito de acção, por isso, não vislumbramos que as partes estejam a litigar com má-fé - A condenação como litigante de má fé consubstancia uma penalização das partes por terem assumido em juízo um comportamento violador do principio de colaboração entre todos os intervenientes processuais que deve pautar todo o desenrolar do processo – sobre o tema, ver ABRANTES GERALDES, Temas Judiciários, I, 1998, p. 317.  
Improcedem, assim, as conclusões da apelante mantendo-se o decidido pelo Juízo de Competência Genérica de Oliveira do Hospital.

(…)

3.Decisão
Na improcedência total do recurso, mantemos a decisão proferida pelo Juízo de Competência Genérica de Oliveira do Hospital.
As custas ficam a cargo da apelante.
Coimbra, 8 de Julho de 2021
(José Avelino Gonçalves - Relator)
(António Freitas Neto- 1.º adjunto)
(Paulo Brandão – 2.º adjunto)