RECURSO DE REVISÃO
FALTA DE CITAÇÃO
CITAÇÃO EDITAL
PRETERIÇÃO DE FORMALIDADES
REVELIA
INVENTÁRIO
Sumário


I. — O art. 696.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Civil distingue dois requisitos cumulativos para a procedência de um recurso extraordinário de revisão: em primeiro lugar, que a acção e/ou a execução tenha corrido à revelia e, em segundo lugar, que o réu não tenha sido citado ou, se o foi, que a citação tenha sido feita com preterição de formalidades legais.
II. — O recurso extraordinário de revisão de uma decisão proferida em processo de inventário não poderá proceder, desde que a falta de citação seja imputável ao interessado.

Texto Integral



ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I. — RELATÓRIO

 1. CC, maior, residente na Rua ….., interessada nos autos principais (processo de inventário), veio em 11 de Abril de 2019, interpor recurso extraordinário de revisão da sentença proferida em 14.07.2017, que homologou o mapa de partilhas e adjudicou aos interessados os respectivos quinhões. Demanda para o efeito AA e BB.

2. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:

1 - O processo principal correu à revelia da Recorrente e esta não teve no mesmo qualquer intervenção, até à interposição do presente recurso.

2 - A Recorrente foi citada editalmente.

3 - A citação edital foi indevidamente empregada, por não se verificar o respectivo pressuposto — a ausência da Recorrente em parte incerta — por não estar verificada a inviabilidade da forma de citação anteriormente ordenada — a citação por carta precatória dirigida ao Consulado de Portugal — e ainda por não ter sido ordenada a citação por carta rogatória, prevista na lei para a hipótese de inviabilidade da citação através do Consulado.

4 - A realização da citação edital violou, por conseguinte, o disposto no art. 239.° n.°s 3 e 4 do Código de Processo Civil, o que determina a falta de citação prevista no art. 188.° n.° 1 c) do mesmo diploma.

5 - Ainda que assim não se entenda, a citação edital não foi precedida das diligências impostas pelo art. 236.° n.° 1 do Código de Processo Civil, por remissão do art. 239.° n.° 4 do mesmo Código, o que determina a nulidade da citação efectuada, nos termos do art. 191.° n.° 1 do mesmo Código, devendo a arguição desta nulidade ser atendida, conforme dispõe o n.° 4 do mesmo preceito, em virtude de a falta cometida prejudicar a defesa da citada.

6 - As nulidades arguidas não foram sanadas, designadamente nos termos do art. 189.° do Código de Processo Civil.

7 - A sentença recorrida transitou em julgado há menos de cinco anos.

8 - A Recorrente teve conhecimento dos factos que constituem o fundamento do recurso há menos de sessenta dias.

9 - Devem, por conseguinte, ser julgados procedentes os fundamentos da revisão e, consequentemente, revogada a decisão recorrida e anulados os termos do processo posteriores à citação da Recorrente, ordenando-se que esta seja citada para a causa.

3. O recurso foi liminarmente admitido.

4. Os Recorridos AA e BB pronunciaram-se no sentido da improcedência do recurso.

5. Finalizaram a sua contra-alegação com as seguintes conclusões:

I. O presente recurso é destituído de fundamento.

II. E nele surgem confundidas as noções de mandato e de procuração miscigenadas como se a mesma realidade fossem. E não são.

III. O contrato de mandato forense constitui um contrato de mandato atípico com poderes de representação, que se rege em primeira linha pelo disposto nos artigos 97.o a 107.o do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA) aprovado pela Lei n.o 145/2015, de 09/09, tal como nas disposições correspondentes do referido Estatuto dantes aprovado, sucessivamente, pela Lei n.o 15/2005, de 26/01, e pelo Dec.-Lei n.o 84/84, de 16/03, aplicando-se ainda, a título subsidiário, o regime do contrato de mandato civil constante dos artigos 1157.o a 1184.o do CCiv..

IV. A procuração é um acto unilateral e pela sua outorga são conferidos poderes representativos ao Advogado, ficando a parte, a partir do momento em que a procuração com poderes forenses que outorgou é junta ao processo, aí representada, por quem, para o efeito, designou.

V. A distinção entre o mandato e a procuração é, pois, clara: enquanto aquele constitui um contrato de prestação de serviços destinado à prática de actos jurídicos, independentemente da representação, a procuração é um negócio jurídico através do qual se conferem poderes de representação, não carecendo da coexistência do mandato.

VI. Os mandatos não são, portanto e ao contrário do afirmado no recurso, conferidos por procuração, mas independentemente desta, que tem por efeito conferir poderes de representação às pessoas indicadas nesse acto jurídico unilateral.

VII. No caso concreto, a interessada CC outorgou procuração, conferindo (entre outros) poderes forenses aos Exmos. Advogados DD e EE.

VIII. E esse instrumento foi, como resulta de fls. 107 a 109 dos autos junto ao processo, passando a referida interessada a estar, para todos os efeitos, nele representada.

IX. Tendo a procuração aqui em causa sido outorgada a favor de dois Advogados, é indiscutível que ambos tinham, a partir do momento da junção aos autos desse instrumento, poderes de representação da interessada CC.

X. O que é válido independentemente das expressões usadas pela Exma. Advogada, Dra. EE no requerimento que apresentou nos autos em 22.01.2013.

XI. Note-se, aliás, que essa Senhora Advogada afirma que vem renunciar ao mandato, o que demonstra, desde logo, que o mandato (tal como os poderes de representação) também havia sido consigo firmado, porquanto não se renuncia ao que nunca se aceitou como estando na nossa esfera jurídica.

XII. A Recorrente esteve, portanto, sempre representada por Advogado nos autos principais até ao momento em que se tornou eficaz a renúncia apresentada pela Senhora Dra. EE.

XIII. Sendo que, como é sabido, nem sequer estamos perante processo em que seja obrigatória a constituição de mandatário, salvo quando se suscitem ou discutam questões de direito e em sede de recurso.

XIV. Diversamente do alegado pela Recorrente, o processo principal NUNCA tramitou à sua revelia.

XV. A interessada teve conhecimento do processo no próprio dia da instauração da acção (19.05.2010) e nele teve intervenção directa, pela primeira vez, em 07.02.2011, data na qual se deve, aliás, considerar citada.

XVI. A este requerimento é efectivamente junta cópia certificada de procuração outorgada em 26 de Novembro de 2009, no Consulado Geral de Portugal em …, na qual e quanto à morada da outorgante, apenas se diz ser residente em …., ….., sem indicação de qualquer endereço concreto.

XVII. Este requerimento é expressamente dirigido ao processo em causa, nele é explicitamente invocada a qualidade de Interessada no inventário e é apresentado após (e não antes, como, equivocadamente, se afirma no penúltimo parágrafo de fls. 2 do recurso) várias diligências para citação da ora Recorrente.

XVIII. E nele a interessada indica a morada onde pretendia ser citada, para onde foram dirigidas todas as posteriores comunicações e onde, não obstante, sempre se furtou a recebê-las.

XIX. O acto de junção de procuração constitui um acto de efectiva participação nos autos e a indicação da morada no requerimento que capeia esse instrumento confirmativo do mandato só se destina a sanar a evidente falta de indicação da morada da outorgante no texto da procuração e não a arguir qualquer falta ou nulidade da citação.

XX. Nulidades que, aliás, nunca ocorreram e que, mesmo que tivessem ocorrido, se mostrariam sanadas.

XXI. Sendo indiscutível que a citação tem por finalidade dar conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção e chamá-lo ao processo para se defender e que se emprega ainda para chamar, pela primeira vez, ao processo alguma pessoa interessada na causa (cfr. artigo 219o, no 1, Código de Processo Civil), no caso concreto, como supra se deixou alegado e demonstrado, a ora Recorrente demonstrou ter, pelo menos em 07.02.2011, conhecimento efectivo do processo.

XXII. E, portanto, a partir dessa data, estão cumpridas as finalidades da citação e assegurados todos os seus direitos de defesa. Tanto mais que nem nessa oportunidade nem posteriormente, arguiu qualquer falta ou irregularidade da citação.

XXIII. Razões pelas quais não se mostram verificados os invocados fundamentos para o presente recurso de revisão.

Não obstante, ainda que assim se não entenda e sem conceder,

XXIV. Na sequência do requerimento apresentado pela interessada, nessa expressa qualidade, em 07.02.2011, foi expedida, no dia 02 de Março de 2011 e em obediência ao preceituado no então artigo 247o, Código de Processo Civil, para a morada indicada pela própria citanda, a carta de citação que consta do processo com a referência …….

XXV. Carta que a interessada deixou devolver, não a tendo reclamado junto dos serviços postais, coisa que, aliás, reitera em todos os posteriores contactos.

XXVI. O que não significa que a interessada não foi citada ou que ocorreu nulidade da citação.

XXVII. Efectivamente, esta carta de citação só não foi recebida por facto imputável à própria destinatária.

XXVIII. Pretender prevalecer-se agora desse seu comportamento reiterada e conscientemente omissivo constitui acintosa violação do princípio da boa-fé, na vertente de lealdade processual e traduz manifesto abuso de direito (venire contra factum proprio).

XXIX. Tentar, como pretendeu no âmbito deste recurso, inverter o sentido do artigo 334.o, CCiv. (sem o citar) e pretender que se considere como lícita a sua actuação, insinuando esse mesmo comportamento de deslealdade à cabeça-de- casal e ao interessado BB, usando documentos com morada distinta da que indicou nos autos e afirmando que facilmente e até por email, poderia ser citada é, sem margem para dúvidas, violar de modo plúrimo, o princípio da boa-fé.

XXX. Pelo que, caso venha a ser entendido não dever ser tida a data de 07.02.2011 como a data de citação, o que se equaciona subsidiariamente e por cautela de patrocínio, sempre deverá a citação ter-se por efectuada na data em que foi disponibilizada, na morada indicada pela Interessada, a carta de citação que a própria, por omissão que lhe é exclusivamente imputável, não reclamou.

XXXI. Assim como negligenciou totalmente o teor do ofício consular datado de 14.03.2016, que lhe foi enviado, em correio registado, pelo Consulado Geral de Portugal em ….., não cumprindo, de forma consciente, o ónus de se deslocar aos serviços consulares ou, pelo menos, de estabelecer contacto telefónico para o número de telefone que aí também ia indicado.

XXXII. Fica, portanto, exuberantemente demonstrada não a falta ou a nulidade da citação da interessada e, muito menos, o seu desconhecimento da pendência destes autos, mas, bem ao contrário, o seu conhecimento da respectiva pendência e uma atitude conscientemente omissiva, só a si imputável e da qual, ilícita, porque abusivamente, se pretende agora aproveitar. O que não é admissível nem pode ser admitido.

6. O Ministério Público pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, sustentando nas suas conclusões:

1 - CC apresentou o requerimento que deu entrada em Juízo em 7.02.20111, referindo ser interessada nos autos de inventário e juntando procuração forense.

2 - Foi, pois, citada naquela data.

3 - Foram efectuadas as pertinentes diligências com vista ao apuramento da sua morada e expedidas comunicações para as moradas obtidas.

4 - A acção não correu à sua revelia, pelo que não se verifica o pressuposto do presente recurso de revisão, não havendo, pois, em consequência, lugar à revogação da decisão proferida, devendo ser mantida.

7. O Tribunal de 1.ª instância julgou o recurso improcedente.

8. Fundamentou a sua decisão em quatro argumentos:

I. — Em primeiro lugar, 

“… o presente inventário foi intentado pela viúva do pai da requerida, FF, que faleceu em 19.03.2009, tendo o inventário sido intentado em 20.05.2010. A recorrente foi indicada como herdeira de seu pai e interessada no inventário e, embora não tenha sido formalmente citada, por não ter sido encontrada na moradas que foram indicadas nos autos, veio a mesma, em 07.02.2011, juntar procuração a mandatar dois Advogados, procuração esta que expressamente mandata os Ilustres Advogados, a favor de quem foi outorgada, a representá-la em todos os actos relativos à partilha da herança do seu pai (fls. 107 a 109). Ficando assim regularizada a falta da sua citação”

II. — Em segundo lugar, “ainda assim, o Tribunal remeteu para a morada indicada para a interessada/recorrente carta a formalizar a citação, carta que a mesma não reclamou (fls. 115)”

III. — Em terceiro lugar, “e, ainda que desnecessariamente, por a recorrente estar já citada, foi a mesma citada editalmente, ou seja, a recorrente tem de considerar-se duplamente citada, tendo a sua defesa passado a ser efectuada pelo M. P., o que ocorreu a partir da data da citação edital e até ao término do processo, ou seja, a recorrente esteve sempre devidamente representada nos autos”.

IV. — Em quarto lugar, “a fls. 165/166 foi proferido despacho que deu como citada a recorrente na data em que juntou a procuração, despacho para o qual se remete”.

 9. Face aos quatro argumentos deduzidos, o Tribunal de 1.º instância concluiu que era manifesto que “no processo principal não exist[ia] qualquer acto que [pudesse] ser declarado nulo, nomeadamente não [era] nula a citação, não havendo, por conseguinte motivo para a revisão da sentença que homologou o mapa de partilhas e adjudicou aos interessados os respectivos quinhões”.

10. Inconformada, CC interpôs recurso de apelação.

11. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:

1 - As intervenções de Advogado nos autos em representação da Interessada, aqui Recorrente, e designadamente aquela que ocorreu com a junção de procuração forense, em 7-2-2011, não operaram a sanação da falta de citação prevista no artigo 189.º n.º 1 do Código de Processo Civil, por não constituírem intervenção efectiva no processo que permita tomar pleno conhecimento do seu conteúdo, ou, pelo menos, fazer presumir tal conhecimento.

2 - Acresce que a intervenção ocorrida em 7-2-2011 nunca teria a virtualidade de sanar irregularidades da citação edital só efectuada em 1-11-2013.

3 - Acresce ainda que a intervenção realizada pela segunda Mandatária designada pela procuração não integra sequer desempenho de mandato, por não ter sido emitida declaração, ainda que tácita, de vontade do mandatário designado a aceitá-lo, como é exigido pelo artigo 1157o do C. Civil.

4 - Quando foi requerida e ordenada a citação edital, a Interessada aqui Recorrente não fora ainda citada nem a falta desse acto fora sanada.

5 - Após a citação, a Interessada aqui Recorrente nunca esteve representada nos autos por Advogado.

6 - O despacho que deu a Interessada aqui Recorrente como citada na data em que foi junta aos autos a procuração por ela conferida, proferido na conferência de interessados, foi revogado pelo despacho de 16-4-2015, com o fundamento de que só por lapso foi proferido, pelo que não pode ser invocado nem atendido para justificar a asserção de que tal citação se deveria reputar suprida com a junção da dita procuração.

7 - A citação edital da Interessada aqui Recorrente foi ordenada depois de ter sido expedida carta Rogatória dirigida ao Consulado Geral de Portugal em ......, mas sem que previamente o Tribunal tivesse informação sobre o cumprimento desta precatória, designadamente no que toca á inviabilidade da prática do acto, o que configura incumprimento do disposto no artigo 239.º, 3 do Código de Processo Civil – anterior 247.º, 3 -.

8 - Por conseguinte a citação edital da Interessada aqui Recorrente foi indevidamente empregada, o que integra a nulidade da falta de citação prevista no artigo 188.º, 1, c) do Código de Processo Civil.

9 - Ainda que assim se não entendesse, a mesma citação edital teria sido ordenada e realizada sem a prévia averiguação da última residência da citanda em Portugal, imposta pelo artigo 239.º, 4 do Código de Processo Civil, bem como das diligências previstas no artigo 236.º, o que integra a nulidade da citação prevista no artigo 191.º do mesmo código, o que impediu a mesma citanda de tomar conhecimento da pendência do processo e de apresentar a sua defesa.

Terminou, dizendo que “[a] sentença recorrida violou as disposições referidas nas conclusões anteriores, pelo que deve ser revogada, observando-se o disposto no do artigo 701.º, 1, a) do Código de Processo Civil”.

12. AA e BB contra-alegaram.

13. Finalizaram a sua contra-alegação com as seguintes conclusões:

I. Diversamente do defendido pela recorrente, a sentença proferida nestes autos de revisão não merece censura e deve manter-se.

II. Compulsadas as conclusões que delimitam o objecto do recurso, são as seguintes as questões enunciadas pela recorrente:

i) Efeitos processuais da junção pela ora recorrente aos autos de inventário, em 07.02.2011, de procuração forense;

ii) Verificação, ou não, das nulidades processuais decorrentes das alegadas falta ou nulidade da citação da interessada CC.

Quanto à primeira questão:

III. No presente recurso continuam a surgir confundidas as noções de mandato e de procuração miscigenadas como se a mesma realidade fossem. E não são.

IV. O contrato de mandato forense constitui um contrato de mandato atípico com poderes de representação, que se rege em primeira linha pelo disposto nos artigos 97.o a 107.o do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA) aprovado pela Lei n.o 145/2015, de 09/09, tal como nas disposições correspondentes do referido Estatuto dantes aprovado, sucessivamente, pela Lei n.o 15/2005, de 26/01, e pelo Dec.-Lei n.o 84/84, de 16/03, aplicando-se ainda, a título subsidiário, o regime do contrato de mandato civil constante dos artigos 1157.o a 1184.o do CCiv..

V. A procuração é um acto unilateral e pela sua outorga são conferidos poderes representativos ao Advogado, ficando a parte, a partir do momento em que a procuração com poderes forenses que outorgou é junta ao processo, aí representada, por quem, para o efeito, designou.

VI. A distinção entre o mandato e a procuração é, pois, clara: enquanto aquele constitui um contrato de prestação de serviços destinado à prática de actos jurídicos, independentemente da representação, a procuração é um negócio jurídico através do qual se conferem poderes de representação, não carecendo da coexistência do mandato.

VII. Os mandatos não são, portanto e ao contrário do afirmado no recurso, conferidos por procuração, mas independentemente desta, que tem por efeito conferir poderes de representação às pessoas indicadas nesse acto jurídico unilateral.

VIII. No caso concreto, a interessada CC outorgou procuração, conferindo (entre outros) poderes forenses aos Exmos. Advogados DD e EE.

IX. E esse instrumento foi, como resulta de fls. 107 a 109 dos autos de inventário junto ao processo, passando a referida interessada a estar, para todos os efeitos, nele representada.

X. Tendo a procuração aqui em causa sido outorgada a favor de dois Advogados, é indiscutível que ambos tinham, a partir do momento da junção aos autos desse instrumento, poderes de representação da interessada CC, sendo aliás, ambos, sócios da mesma sociedade de advogados, coisa que também resulta do referido instrumento de procuração.

XI. O que é válido independentemente das expressões usadas pela Exma. Advogada, Dra. EE no requerimento que apresentou nos autos em 22.01.2013.

XII. Note-se, aliás, que essa Senhora Advogada afirma que vem renunciar ao mandato, o que demonstra, desde logo, que o mandato (tal como os poderes de representação) também havia sido consigo firmado, porquanto não se renuncia ao que nunca se aceitou como estando na nossa esfera jurídica.

XIII. A Recorrente esteve, portanto, sempre representada por Advogado nos autos principais até ao momento em que se tornou eficaz a renúncia apresentada pela Senhora Dra. EE.

XIV. Sendo que, como é sabido, nem sequer estamos perante processo em que seja obrigatória a constituição de mandatário, salvo quando se suscitem ou discutam questões de direito e em sede de recurso

XV. Diversamente do alegado pela Recorrente, o processo principal NUNCA tramitou à sua revelia.

Quanto à segunda questão:

XVI. A interessada teve conhecimento do processo no próprio dia da instauração da acção (19.05.2010) e nele teve intervenção directa, pela primeira vez, em 07.02.2011, data na qual deve, aliás, considerar-se citada.

XVII. Neste requerimento vem colmatar-se a falta de indicação da morada de CC na procuração que com o mesmo é junta, pois, nesse instrumento, apenas se diz ser a outorgante residente em ......, …., sem indicação de qualquer endereço concreto.

XVIII. Este requerimento é expressamente dirigido ao processo em causa; nele é explicitamente invocada a qualidade de Interessada no inventário e é apresentado após (e não antes, como, equivocadamente, afirmava no penúltimo parágrafo de fls. 2 da petição do recurso de revisão) várias diligências para citação da ora Recorrente, concretamente: i) a expedição de uma primeira carta de citação enviada em 24 de Setembro de 2010 para a morada da citanda em Portugal e da devolução da mesma aos autos em 11 de Outubro seguinte; ii) diligências para citação desenvolvidas pela Senhora Solicitadora GG, nomeada para o efeito pelo tribunal, as quais se revelaram infrutíferas.

XIX. É, por isso, falso o afirmado no presente recurso em sentido diverso, designadamente, o vertido na 9a conclusão.

XX. No referido requerimento de 07.02.2011, a interessada indica a morada onde pretendia ser citada, para onde foram dirigidas todas as posteriores comunicações e onde, não obstante, sempre se furtou a recebê-las.

XXI. O acto de junção de procuração constitui um acto de efectiva participação nos autos e a indicação da morada no requerimento que capeia esse instrumento confirmativo do mandato, reitere-se, só se destina a sanar a evidente falta de indicação da morada da outorgante no texto da procuração e não a arguir qualquer falta ou nulidade da citação.

XXII. Nulidades que, aliás, nunca ocorreram e que, mesmo que tivessem ocorrido, se mostrariam sanadas.

XXIII. A citação tem por finalidade dar conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção e chamá-lo ao processo para se defender, empregando-se também para chamar, pela primeira vez, ao processo alguma pessoa interessada na causa (cfr. artigo 219o, no 1, Código de Processo Civil).

XXIV. No caso concreto, como supra se deixou alegado e demonstrado e está declarado na sentença, a ora Recorrente demonstrou ter, pelo menos em 07.02.2011, conhecimento efectivo do processo.

XXV. E, portanto, a partir dessa data, estão cumpridas as finalidades da citação e assegurados todos os seus direitos de defesa. Tanto mais que nem nessa oportunidade nem posteriormente, arguiu qualquer falta ou irregularidade da citação, a não ser no recurso de revisão e nos improcedentes termos conhecidos.

XXVI. Razões pelas quais não se mostram verificados os invocados fundamentos para a pretendida revisão. Como, bem, ficou decidido pelo tribunal a quo.

XXVII. É, da mesma forma, completamente abusiva a narrativa que a recorrente verte de fls. 10 a fls. 12 e condensa na conclusão 6a.

XXVIII. Porquanto, do histórico dos autos que supra se deixou referido e pode ser comprovado, resulta, de forma clara, que a revogação a que se refere o despacho de fls. 165 apenas tem por objecto a matéria relativa à renúncia ao mandato apresentada pela Senhora Dra. Ivone e não a matéria relativa à citação da interessada CC.

Não obstante, ainda que assim se não entenda e sem conceder,

XXIX. Na sequência do requerimento apresentado pela interessada, nessa expressa qualidade, em 07.02.2011, foi expedida, no dia 02 de Março de 2011 e em obediência ao preceituado no então artigo 247o, Código de Processo Civil, para a morada indicada pela própria citanda, a carta de citação que consta do processo com a referência …….

XXX. Carta que a interessada deixou devolver, não a tendo reclamado junto dos serviços postais.

XXXI. O que não significa que a interessada não foi citada ou que ocorreu nulidade da citação.

XXXII. Efectivamente, esta carta de citação só não foi recebida por facto imputável à própria destinatária.

XXXIII. Pretender prevalecer-se agora desse seu comportamento reiterada e conscientemente omissivo constitui acintosa violação do princípio da boa-fé, na vertente de lealdade processual e traduz manifesto abuso de direito (venire contra factum proprio).

XXXIV. Tentar, como pretendeu no âmbito do recurso de revisão, inverter o sentido do artigo 334.o, CCiv. (sem o citar) e pretender que se considere como lícita a sua actuação, insinuando esse mesmo comportamento de deslealdade à cabeça-de-casal e ao interessado BB, usando documentos com morada distinta da que indicou nos autos e afirmando que facilmente e, pasme-se, até por email, poderia ser citada é, sem margem para dúvidas, violar de modo plúrimo, o princípio da boa-fé.

XXXV. O que não pode aceitar-se, devendo ser, como nos autos principais já foi, reconhecida a regular citação da interessada CC, na sua própria pessoa e com inteira obediência ao disposto no artigo 239o, no 2, Código de Processo Civil, para a morada que indicou. Reconhecimento que a sentença ora recorrida fundadamente reitera.

XXXVI. A recorrente negligenciou totalmente o teor do ofício consular datado de 14.03.2016, que lhe foi enviado, em correio registado, pelo Consulado Geral de Portugal em ......, não cumprindo, de forma consciente, o ónus de se deslocar aos serviços consulares ou, pelo menos, de estabelecer contacto telefónico para o número de telefone que aí também ia indicado.

XXXVII. Fica, portanto, exuberantemente demonstrada não a falta ou a nulidade da citação da interessada e, muito menos, o seu desconhecimento da pendência destes autos, mas, bem ao contrário, o seu conhecimento da respectiva pendência e uma atitude conscientemente omissiva, só a si imputável e da qual, ilícita, porque abusivamente, se pretende agora aproveitar. O que não é admissível nem pode ser admitido.

14. O Exmo. Senhor Juiz Desembargador Relator proferiu decisão singular, em que decidiu dar provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida — e, em conferência, o Tribunal da Relação …. confirmou a decisão singular reclamada.

15. Inconformados, AA e BB interpuseram recurso de revista.

16. Finalizaram a sua alegação com as seguintes conclusões:

I. O presente recurso é interposto do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação … na sequência da reclamação para a conferência apresentada pelos aqui recorrentes nos termos do artigo 652o, no 3, do Código de Processo Civil, no qual se decide “julgar procedente a apelação e por isso revogar a sentença recorrida, dando provimento ao recurso.”

II. A decisão recorrida revoga, pois, a decisão do recurso extraordinário de revisão interposto pela interessada CC, prolatada pelo Tribunal Judicial da Comarca de …. – Juízo Local Cível de ….. – Juiz …..

III. O Acórdão recorrido padece de vários vícios e, por isso, não podem os recorrentes com ele conformar-se:

QUANTO À VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 607, NoS 2 E 3 E 701.º, No 1, ALÍNEA C), DO Código de Processo Civil. NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA (ARTIGO 615o, No 1, ALÍNEA D), DO Código de Processo Civil.

IV. Ao receber no seu seio a integralidade da decisão singular que lhe antecedeu também o Acórdão ora impugnado identifica duas, assim ditas, questões a decidir: 1a – saber quais os factos a ter em conta; 2a – decidir o mérito da causa.

V. Sucede que, quer à luz de um conceito geral, num quadro meramente dogmático, quer no recorte do caso concreto, à luz do recurso apresentado e das conclusões que delimitam o objecto do recurso que decidiu, não podem os recorrentes reconhecer neste enunciado tais “questões” a decidir.

VI. É que, sem perder de vista que são as conclusões que delimitam o objecto dos recursos e que neste recurso não era impugnada matéria de facto, saber quais os factos a ter em conta não configura, com toda a certeza, uma questão a resolver. E, naturalmente, “decidir o mérito da causa” também não configura uma questão a decidir, mas um dever funcional do tribunal ad quem ou, de outro prisma, o resultado que provirá do conhecimento que o Tribunal efectuar de todas as questões de que deva conhecer para alcançar tal desiderato.

VII. Portanto, na decisão ora recorrida (tal como na douta decisão singular que a antecedeu), perdeu-se o recorte da citação que da sua pena começou por sair - Questões não são os argumentos nem as motivações; são as concretas controvérsias centrais a dirimir, na expressão usada no atrás referido ponto II de fls. 23 /24 – e, em vez de se identificarem controvérsias, delimitam-se não questões. E, por consequência, viola-se o preceituado no no 2 do artigo 607o, do Código de Processo Civil.

VIII. Materialmente o Acórdão do qual se recorre faz sua a decisão singular que julga procedente o recurso extraordinário de revisão interposto por CC, por, se bem se percebe à face da respectiva fundamentação (que não do inciso decisório), considerar ter-se verificado, na tramitação dos autos de inventário na primeira instância: i) Falta de citação da requerida CC, por não concretização da citação pessoal, vício que se considera não ter sido sanado com a junção do requerimento e da procuração, em 7 de Fevereiro de 2011 e ii) Falta de citação da requerida CC, por indevido emprego da citação edital, sendo nulo tudo o que se processou no processo de inventário posteriormente ao momento em que a citação foi feita editalmente.

IX. A declaração de voto lavrada pela Exma. Senhora Desembargadora HH e cujo teor atrás se deixou recordado, evidencia, ela própria, salvo o muito e devido respeito, não só a dificilmente apreensível estrutura da decisão, como a omissão de que padece a sua parte decisória, em clara violação do disposto no artigo 607.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

X. Com efeito, o Acórdão remete integralmente para a decisão singular anteriormente proferida, sendo que a parte decisória desta, recebida naquele qua tale, se cinge ao seguinte: «Pelo que fica exposto, decido julgar procedente a apelação e por isso revogar a sentença recorrida, dando provimento ao recurso.»

XI. Estamos, assim, diante de afirmação tautológica, por inutilmente repetir a procedência que se entendeu (do ponto de vista dos aqui recorrentes, mal) conceder à apelação, sem daí se extrair quaisquer consequências nem nada se ordenar à primeira instância. O que consubstancia violação do disposto no artigo 701.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, disposição legal à qual o Acórdão não deu cumprimento e nem sequer cita, mostrando-se a sua parte decisória amputada de parte essencial dos seus termos, o que se traduz em omissão de pronúncia geradora da respectiva nulidade.

XII. Acresce que, se vem dar-se provimento a um recurso de revisão cujo alegado fundamento se tem por alicerçado no disposto no artigo 696o, alínea e), subalínea i) [processo tramitado à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu por falta de citação ou nulidade da citação feita] não se percebe que citação há-de servir de termo a quo para a anulação do processado.

XIII. O que o tribunal deveria ter delimitado e não delimitou. E que, aliás, foi considerado determinante pelo legislador na alínea c) do no 1 do artigo 701o, já atrás recordado e não é indiferente para o cumprimento de essenciais princípios processuais, designadamente o do máximo aproveitamento dos actos, traduzido no artigo 130o, do Código de Processo Civil na sua vertente de proibição da prática de actos inúteis.

XIV. Termos em que estamos perante o vício de omissão de pronúncia, uma vez que o Tribunal não se pronunciou sobre questões sobre as quais deveria pronunciar-se, o que determina, igualmente, a nulidade do Acórdão – cfr. artigo 615o, no 1, alínea d), 1a parte – que aqui expressamente se argúi.

XV. Por outro lado, como bem se salienta na referida declaração de voto, “Quando a procuração outorgada pela interessada CC foi junta aos autos, as diligências para a citação estavam em curso, pelo que arguir então a nulidade da citação ou a falta de citação não fazia sentido.”

XVI. Daqui se extrai o bem fundado da decisão da primeira instância e de quanto os ora recorrentes têm vindo a alegar desde a contestação que apresentaram no recurso extraordinário de revisão: o requerimento apresentado pela interessada CC em 7 de Fevereiro de 2011, através do qual é junta por esta aos autos a procuração forense que outorgara aos Senhores Drs. DD e EE jamais pode ser lido como arguição de nulidade ou falta de citação, mas sim como efectiva, relevante e espontânea intervenção nos autos, na expressamente invocada qualidade de interessada no inventário, através de um requerimento que demonstra o conhecimento da pendência do processo e do seu objecto, mostrando estarem, a partir desse momento, integralmente cumpridas as finalidades da citação que, por isso mesmo, jamais poderá ser considerada inexistente ou nula.

XVII. E, assim. Reiterado fica que as questões a decidir, desde logo à face do recurso interposto pela interessada CC, continuam a ser as seguintes: i) Efeitos processuais da junção aos autos, em 07.02.2011, pela ora recorrida, na qualidade de interessada no inventário, de procuração forense e ii) Verificação, ou não, das nulidades processuais decorrentes das alegadas falta ou nulidade da citação da interessada CC.

QUANTO AOS EFEITOS PROCESSUAIS DA JUNÇÃO, EM 07.02.2011, PELA ORA RECORRIDA, NA QUALIDADE DE INTERESSADA DE PROCURAÇÃO FORENSE AO PROCESSO DE INVENTÁRIO. O MANDATO FORENSE E A PROCURAÇÃO - EM ESPECIAL, O CASO DOS AUTOS.

XVIII. No Acórdão ora objecto de recurso continuam a surgir confundidas as noções de mandato e de procuração miscigenadas como se a mesma realidade fossem. E não são.

XIX. O contrato de mandato forense constitui um contrato de mandato atípico com poderes de representação, que se rege em primeira linha pelo disposto nos artigos 97.o a 107.o do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA) aprovado pela Lei n.o 145/2015, de 09/09, tal como nas disposições correspondentes do referido Estatuto dantes aprovado, sucessivamente, pela Lei n.o 15/2005, de 26/01, e pelo Dec.-Lei n.o 84/84, de 16/03, aplicando-se ainda, a título subsidiário, o regime do contrato de mandato civil constante dos artigos 1157.o a 1184.o do CCiv..

XX. A procuração é um acto unilateral e pela sua outorga são conferidos poderes representativos ao Advogado, ficando a parte, a partir do momento em que a procuração com poderes forenses que outorgou é junta ao processo, aí representada, por quem, para o efeito, designou.

XXI. A distinção entre o mandato e a procuração é, pois, clara: enquanto aquele constitui um contrato de prestação de serviços destinado à prática de actos jurídicos, independentemente da representação, a procuração é um negócio jurídico através do qual se conferem poderes de representação, não carecendo da coexistência do mandato.

XXII. Os mandatos não são, portanto, e ao contrário do afirmado no recurso e aproveitado pelo Acórdão recorrido, conferidos por procuração, mas independentemente desta, que tem por efeito conferir poderes de representação às pessoas indicadas nesse acto jurídico unilateral.

XXIII. No caso concreto, a interessada CC outorgou procuração, conferindo (entre outros) poderes forenses aos Exmos. Advogados DD e EE. E esse instrumento foi, como resulta de fls. 107 a 109 dos autos de inventário, junto ao processo, passando a referida interessada a estar, para todos os efeitos, nele representada.

XXIV. É, aliás, por isso que no regime da revelia, o legislador faz funcionar a cominação da revelia em relação a réu que tenha junto procuração a mandatário judicial e não conteste (cfr. artigo 567o, Código de Processo Civil); e é também por isso que o artigo 696o, alínea e), do Código de Processo Civil exige que estejamos diante de revelia por falta absoluta de intervenção do réu.

XXV. Só estamos diante de revelia por falta absoluta de intervenção do réu (ou do interessado em contradizer) quando este, além de não deduzir qualquer oposição, não constituir mandatário nem intervier de qualquer forma no processo (cfr. artigo 566o, do Código de Processo Civil). E não foi isto que aconteceu no caso concreto, como, aliás, ressalta de fls. 36 do Acórdão recorrido.

XXVI. Um sujeito processual que passou a estar representado na acção jamais pode ser tido como em situação de revelia absoluta.

XXVII. Tendo a procuração em causa sido outorgada a favor de dois Advogados, é indiscutível que ambos tinham, a partir do momento da junção aos autos desse instrumento, poderes de representação da interessada CC, sendo aliás, ambos, sócios da mesma sociedade de advogados, coisa que também resulta do referido instrumento de procuração.

XXVIII. Tais poderes de representação existem, pois, desde a data da outorga da procuração e produzem efeitos no âmbito do processo de inventário desde a data da junção desse instrumento aos autos, isto é, desde 07.02.2011. Asserção que é válida independentemente das expressões posteriormente usadas pela Exma. Advogada, Dra. EE no requerimento que apresentou nos autos em 22.01.2013.

XXIX. A interessada CC esteve, pois, sempre, representada por Advogado nestes autos até ao momento em que se tornou eficaz a renúncia (naturalmente a mandato valida e eficazmente conferido e voluntariamente comprovado no processo) apresentada pela Senhora Dra. EE.

XXX. Portanto, diversamente do decidido no Acórdão de que se recorre (v.g. no parágrafo 5o, de fls 41 do pdf respectivo), o processo NUNCA tramitou à revelia da interessada (leia-se, à luz de uma revelia absoluta da mesma, única que legalmente é merecedora da cominação aplicada no Acórdão recorrido).

XXXI. Decisão que, assim, viola o disposto nos artigos 566o e 696o, no 1, alínea e), do Código de Processo Civil.

QUANTO À NÃO VERIFICAÇÃO DAS NULIDADES PROCESSUAIS DECORRENTES DAS ALEGADAS FALTA OU NULIDADE DA CITAÇÃO DA INTERESSADA CC.

XXXII. A interessada teve conhecimento do processo no próprio dia da instauração da acção (19.05.2010) e nele teve intervenção directa, pela primeira vez, em 07.02.2011, data na qual deve, aliás, considerar-se citada.

XXXIII. Neste requerimento vem colmatar-se a falta de indicação da morada de CC na procuração que com o mesmo é junta, pois, nesse instrumento, apenas se diz ser a outorgante residente em ......, ….., sem indicação de qualquer endereço concreto.

XXXIV. É indiscutível que, à face de procuração com o teor da supra transcrita nunca podia ter sido sequer equacionado que os mandatários aos quais assim foram conferidos poderes de representação pudessem receber citações. Coisa, aliás, jamais tentada no histórico dos autos consultado pelo Exmo. Relator e várias vezes repetido na decisão singular e mantido no Acórdão que a acolhe e que ora se impugna.

XXXV. Pelo que as referências a tal feitas – a despropósito – no Acórdão recorrido (v.g. no antepenúltimo parágrafo de fls 36 do respectivo pdf) se traduzem numa não questão.

XXXVI. Este requerimento é expressamente dirigido ao processo em causa; nele é explicitamente invocada a qualidade de Interessada no inventário e é apresentado após (e não antes, como, equivocadamente, afirmava no penúltimo parágrafo de fls. 2 da petição do recurso de revisão) várias diligências para citação da ora Recorrente, concretamente: i) a expedição de uma primeira carta de citação enviada em 24 de Setembro de 2010 para a morada da citanda em Portugal e da devolução da mesma aos autos em 11 de Outubro seguinte; ii) diligências para citação desenvolvidas pela Senhora Solicitadora GG, nomeada para o efeito pelo tribunal, as quais se revelaram infrutíferas.

XXXVII. Como se viu, o Acórdão recorrido não deixa de reconhecer que, com a junção da referida procuração, a interessada CC Passou assim a estar representada na acção de inventário.

XXXVIII. Mas, na decisão recorrida, é completamente olvidado que no referido requerimento de 07.02.2011, a interessada indica a morada onde pretendia ser citada, para onde foram dirigidas todas as posteriores comunicações e onde, não obstante, sempre se furtou a recebê-las.

XXXIX. O acto de junção de procuração constitui um acto de efectiva e voluntária intervenção nos autos e a indicação da morada no requerimento que capeia esse instrumento confirmativo do mandato, reitere-se, só se destina a sanar a evidente falta de indicação da morada da outorgante no texto da procuração e não a arguir qualquer falta ou nulidade da citação.

XL. Nulidades que, aliás, nunca ocorreram e que, mesmo que tivessem ocorrido, se mostrariam sanadas.

XLI. A citação tem por finalidade dar conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção e chamá-lo ao processo para se defender, empregando-se também para chamar, pela primeira vez, ao processo alguma pessoa interessada na causa (cfr. artigo 219o, no 1, Código de Processo Civil).

XLII. No caso concreto, como supra se deixou alegado e demonstrado e está declarado na sentença da primeira instância, CC demonstrou ter, pelo menos em 07.02.2011, conhecimento efectivo do processo.

XLIII. E, portanto, a partir dessa data, estão cumpridas as finalidades da citação e assegurados todos os seus direitos de defesa. Tanto mais que nem nessa oportunidade nem posteriormente, arguiu qualquer falta ou irregularidade da citação, a não ser no recurso de revisão e nos improcedentes termos conhecidos.

XLIV. Razões pelas quais não se mostram verificados os invocados fundamentos para a pretendida revisão. Como, bem, ficou decidido pelo tribunal a quo.

XLV. Ao contrário do que se dizia na decisão singular e se repete no Acórdão recorrido, não se trata de aferir se a interessada CC sabia, ou não, quando outorgou a procuração em causa da pendência destes autos de inventário.

XLVI. Outorgou-a em Novembro de 2009 porque foi nessa altura que se iniciaram os contactos entre os Advogados dos interessados; e o seu Mandatário sempre manteve contactos com os Advogados da cabeça-de-casal e do interessado BB. Factualidade que a interessada, ora recorrida, não pode desconhecer. Assim como está comprovado documentalmente que o seu Mandatário foi previamente informado da instauração do processo.

XLVII. Igualmente ininteligível, sem base legal e até contra as mais basilares regras de experiência, é a consequência que parece querer extrair-se no Acórdão recorrido do facto de a procuração outorgada por CC aos Exmos. Senhores Drs. DD e EE ter data anterior à da instauração do inventário (cfr. fls. 40 do Acórdão).

XLVIII. Outrossim, a Interessada CC não alegou, e muito menos provou, que os seus mandatários constituídos não lhe tivessem dado conhecimento da forma como a usaram para a fazer intervir no processo de inventário em 7 de fevereiro de 2011, nem veio, nos termos do artigo 46.º, do Código de Processo Civil retirar que, naquele dia e por seu intermédio, se declarou interessada no inventário, o que apenas permite concluir que teve, como era suposto, conhecimento de que – através dos seus mandatários constituídos – juntou procuração ao processo de inventário em 7 de fevereiro de 2011.

XLIX. Não podendo, ainda, esquecer-se que o mandato forense, enquanto mandato típico, tem regras próprias que permitem asseverar (ao menos face à total inexistência de qualquer alegação em contrário) que a interessada CC teve prévio conhecimento da sua intervenção processual em 7 de fevereiro de 2011, entre as quais as plasmadas nos artigos 98o, no 1 e 100, no 1, do EOA, que o Acórdão recorrido ignorou completamente.

L. Recorde-se, a este propósito, que os documentos que o Exmo. Relator usou, na decisão singular e no Acórdão aqui recorrido, para afirmar que BB conhecia o endereço de correio electrónico da irmã (e que, recorde-se, estão juntos ao requerimento inicial do recurso de revisão como Docs. nos 1 e 2) demonstram que os contactos sobre a partilha deveriam passar a ser efectuados com os advogados aí indicados são anteriores à outorga da dita procuração, ou seja, demonstram que CC constituiu, nessa sequência e ainda em 2009, os seus próprios advogados que passaram a representá-la, desde logo no âmbito de diligências anteriores à instauração do inventário e que, naturalmente, não poderão deixar de lhe ter dado a conhecer a pendência do processo, coisa que, ademais, foi, como antes se referiu e está documentalmente provado, comunicado, via fax, ao Sr. Dr. DD.

LI. Isto é, o Acórdão não analisou criticamente as provas essenciais, nem tão pouco teve em conta as regras típicas do mandato forense, para a apreciação das questões a resolver, omitindo-se a apreciação de elemento de prova documental e a imperativa compatibilização dele com a demais prova. O que, para além de violar o disposto nos artigos 98o, no 1 e 100o, no 1, do EOA, viola, do mesmo passo, o disposto no no 4 do artigo 607o, do Código de Processo Civil e determina a respectiva nulidade (cfr. artigo 615o, no 1, alínea b), do Código de Processo Civil).

LII. E é por tudo isto que, ao longo do processo não se insinuou, antes se afirmou, com absoluto respeito pela verdade, que CC conhecia a existência do processo. O que aqui continua a reiterar-se e, inclusivamente, decorre do presumível – e nunca impugnado – cumprimento dos deveres profissionais por parte dos seus Advogados constituídos.

LIII. Razões pelas quais, ao invés do vertido na decisão recorrida, não se mostram verificados os invocados fundamentos para o recurso de revisão. E que, outrossim, tornam inconcebível a afirmação constante do penúltimo parágrafo de fls. 40 do pdf do Acórdão (“A representação da ora Recorrente pelos Senhores Advogados constantes da procuração aludida durou pouco e nenhuns efeitos práticos teve. Um dos Senhores Advogados faleceu e quanto ao outro foi deferida a renúncia ao mandato apresentada.”)

LIV. Desde logo, a renúncia é acto unilateral receptício e não tem de ser “deferida”, o que, outrossim, decorre expressamente, como é sabido, do disposto no artigo 47o, no 2, do Código de Processo Civil.

LV. Por outro lado, pela outorga da procuração - que é, igualmente, como já recordado, acto unilateral – são conferidos poderes representativos ao Advogado, ficando a parte, a partir do momento em que a procuração com poderes forenses que outorgou é junta ao processo, aí representada, por quem, para o efeito, designou.

LVI. Se os mandatários, em face das várias notificações que o tribunal lhes dirige, tomam, ou não, posição processual em exercício desse mandato, é coisa que não cabe ao Tribunal “controlar”.

LVII. Aliás, no segundo parágrafo do requerimento apresentado pela Exma. Senhora Dra. EE, mandatária constituída de CC, em 22.01.2013 e registado no Citius com a referência …., a mesma afirma que não tem possibilidade de contactar a mandatária. O que, não tendo sido sequer considerado no Acórdão recorrido é, no entanto, bem revelador do mal fundado da decisão recorrida.

LVIII. É que, sendo tão fácil contactar CC como o Acórdão e o recurso sobre que versa querem fazer parecer, é no mínimo estranho que nem a sua advogada o conseguisse fazer. Ela que não poderia deixar de ter acesso ao processo aberto no escritório, à morada indicada por CC nos autos e, com toda a certeza, também ao seu email. E que sempre teria interesse em informar a mandante do óbito do seu sócio e colega de escritório, independentemente de ter, ou não, condições ou interesse em continuar a assegurar o patrocínio que assumira.

LIX. Tudo isto continuou a ser desconsiderado no Acórdão recorrido. E tudo isto é mais do que suficiente para se mostrar provado que a interessada sempre se furtou, por todas as vias, à apresentação de qualquer razão que pudesse explicar o facto de não levantar a correspondência que lhe foi sucessivamente enviada para a morada que transmitiu aos autos.

LX. E, portanto, sempre se reitera, só por culpa sua CC não recebeu a carta de citação, apesar de dirigida à morada por si indicada. O que é bastante para se afastar o mal alegado vício de falta de citação (cfr. artigo 188o, alínea e), do NCódigo de Processo Civil, correspondente ao artigo 195o, alínea e) do anterior Código de Processo Civil).

EM CONCRETO, QUANTO AO DESPACHO DE 16.04.2015

LXI. Como resulta, objectivamente, do histórico dos autos que acima se recordou e aqui se considera reproduzido, a revogação a que se refere o despacho de fls. 165 apenas tem por objecto a matéria relativa à renúncia ao mandato apresentada pela Senhora Dra. EE e não a matéria relativa à citação da interessada CC.

LXII. Efectivamente, alertada pela secretaria, a Mma Juiz constatou que no despacho de fls. 165 desconsiderara o despacho que antes havia sido proferido julgando válida a renúncia ao mandato apresentada pela Senhora Dra. EE e só em virtude dessa desconsideração tinha dispensado a presença da Digna Magistrada do Ministério Público.

LXIII. Alertada para esse lapso, apressou-se a corrigi-lo, mandando, aliás, notificar a Digna Magistrada do MP do teor da acta da conferência de interessados, a fim de a mesma dizer se concorda com o aí decidido ou se, pelo contrário, considera que deve repetir-se a diligência. Acrescentando que, caso concorde, fica desde já notificada para, querendo, apresentar forma à partilha, em dez dias.

LXIV. É, pois, completamente abusiva a narrativa que a recorrente verte de fls. 10 a fls 12 e condensa na conclusão 6a a propósito destes despachos e que a decisão recorrida acriticamente aproveita, incorrendo em erro manifesto na apreciação da matéria de facto.

Não obstante, ainda que assim se não entendesse e sem conceder,

QUANTO AO DESPACHO DE 17.01.2013

LXV. Demonstram, ainda, os autos que na sequência do requerimento apresentado pela interessada em 07.02.2011, foi expedida, no dia 02 de Março de 2011 e em obediência ao preceituado no então artigo 247o, Código de Processo Civil, para a morada indicada pela própria citanda, a carta de citação que consta do processo com a referência 8107473 e cuja cópia se juntou à resposta ao recurso de revisão como Doc. no 3.

LXVI. Facto que, foi totalmente omitido no recurso de revisão e na apelação cuja decisão aqui se imugna, mas que os autos indiscutivelmente confirmam. Só que, aquilo que a própria interessada dizia ser o caminho para uma fácil e essencial regular citação (cfr. requerimento de 07.02.2011) veio a revelar-se infrutífero, pois a interessada CC deixou devolver a carta, que chega aos autos a 25.08.2011 com a menção “unclaimed”, ou seja, não reclamada.

LXVII. Mas, como bem decidiu a primeira instância, isto não pode significar que a interessada não foi citada ou que ocorreu nulidade da citação.

LXVIII. É que, desde logo, foram desenvolvidas inúmeras diligências tendentes à citação da interessada CC, das quais esta teve, manifestamente, conhecimento e que, inclusivamente, determinaram que juntasse aos autos procuração forense e indicasse a morada na qual queria ser citada (recorde-se, como, aliás, se faz na declaração de voto já supra transcrita, que estavam em curso as diligências de citação, quando é junto aos autos o requerimento de 7.Fev.2011).

LXIX. Para além disso, a citação foi repetida, para a morada indicada pela própria citanda (não é de mais repetir-se) e se dela não tomou a interessada conhecimento, tal fica a dever-se, exclusivamente, a facto que lhe é imputável.

LXX. O que, por si só, constitui impedimento à procedência da revisão – cfr. artigo 696o, alínea e), subalínea ii), a contrario sensu. Preceito que a decisão ora recorrida também viola.

LXXI. Decisão que igualmente não se pronuncia, devendo fazê-lo, sobre o comportamento reiterada e conscientemente omissivo de CC, que constitui acintosa violação do princípio da boa-fé, na vertente de lealdade processual e traduz manifesto abuso de direito (venire contra factum proprio).

LXXII. Mais: tentar, como pretendeu no âmbito do recurso de revisão, inverter o sentido do artigo 334.o, CCiv. (sem o citar) e pretender que se considere como lícita a sua actuação, insinuando esse mesmo comportamento de deslealdade à cabeça-de-casal e ao interessado BB, usando documentos com morada distinta da que indicou nos autos e afirmando que facilmente e, pasme-se, até por email, poderia ser citada é, sem margem para dúvidas, violar de modo plúrimo, o princípio da boa-fé.

LXXIII. O Acórdão recorrido omitiu, pois, também aqui, pronúncia sobre questão que lhe competia conhecer, violando, de um passo o disposto no artigo 334o, do CCiv. e incorrendo, reiteradamente, no fundamento gerador da sua nulidade, ínsito na alínea d) do artigo 615o, do Código de Processo Civil.

LXXIV. Não se olvida que o Tribunal, por manifesto excesso de cautela, em 17.01.2013, proferiu o despacho com a referência ….., no qual se determina o cumprimento do disposto no artigo 247o, no 3, Código de Processo Civil. Em execução do qual, no dia 19 do mesmo mês, é enviado ofício (com a referência …..) para o Consulado Português na ….. para citação da interessada CC.

LXXV. Portanto, ao contrário do que se dizia na petição do recurso de revisão e se manteve na apelação cuja decisão aqui se impugna, fazendo-se aí (propositada?) confusão entre estas diligências e as desenvolvidas em 2015 para notificação da interessada da acta de conferência de interessados e para vir aos autos entregar procuração a favor de quem a possa representar a fim de que, posteriormente, lhe possam ser entregues os bens que lhe foram adjudicados, também foi dado cumprimento o disposto no artigo 239o (então 247o), no 3, Código de Processo Civil.

LXXVI. O que também torna incompreensível quanto se possa querer significar com o que vem afirmado no último parágrafo de fls. 41 do pdf da decisão ora recorrida [«Como se disse omitiram-se diligências junto das autoridades portuguesas na …. para saber da concreta localização da citanda. Mas essas diligências eram possíveis e dariam frutos. A prova é que quando se fizeram para a designação do curador, soube-se do concreto paradeiro da citanda na …….»]

LXXVII. Pois o que consta da factualidade elencada é que, em 2015, foi dirigida a CC a notificação da acta de conferência de interessados e para vir aos autos entregar procuração a favor de quem a possa representar a fim de que, posteriormente, lhe possam ser entregues os bens que lhe foram adjudicados, por via do Consulado Geral de Portugal em ......, que certificou nos autos ter notificado a interessada através de ofício consular datado de 14.03.2016, enviado por correio registado, para a morada que esse Consulado informou os autos ser, nessa altura, a da destinatária [……].

LXXVIII. Mais certifica o Consulado que, nesse ofício, informava dever CC comparecer naqueles Serviços e que esta nunca compareceu.

LXXIX. Esta certidão consular não está impugnada, fazendo, por isso, prova dos factos que narra e comprova e que constituem reforçado alicerce da sentença proferida pelo Tribunal de …, apesar de a recorrente os ter eliminado das alegações da apelação, para desviar atenções.

LXXX. Pelo que seria ónus da interessada demonstrar que não recebeu essa notificação ou, pelo menos, alegar algum facto que pudesse indiciar que a não tinha recebido, coisa que nunca faz, chegando mesmo a admitir que o recebeu ao afirmar que “mesmo que tivesse recebido o ofício que lhe foi remetido pelo Consulado, não teria ficado a conhecer a existência deste processo, pois não compareceu no Consulado”.

LXXXI. Isto é, não obstante ter recebido o ofício consular (o que, indiscutivelmente, admite), CC também não o cumpriu. O que, naturalmente, a dar frutos são os da confirmação de que a interessada CC só tinha mesmo interesse em não aparecer, não obstante as várias moradas que ia dando nos vários locais e pelas mais distintas vias. Com consequências que só sobre si podem recair. E não os frutos aos quais a decisão recorrida, por reporte a momentos temporalmente tão distintos como 2011 (a data em que é junta aos autos a procuração) e 2015 (a data em que lhe é dirigida a notificação da acta da conferência de interessados) parece pretender referir-se.

LXXXII. Foi, ademais, a falta de cumprimento do ónus que sobre si impendia que veio a determinar a nomeação de curador que prestou compromisso de honra no dia 12.12.2016, como resulta do auto da mesma data constante do processo.

LXXXIII. Em resumo, a decisão de que se recorre, incorre em erros materiais que se refletem na sua própria inteligibilidade e mostra-se nula porque viola o disposto nos artigos 566o; 567o; 607o, nos 2, 3 e 4; 696o, alínea e) e subalíneas i) e ii), conjugado com o artigo 188o, no 1, alínea e);701o, no 1, alínea c), todos do Código de Processo Civil e, bem assim, o disposto nos artigos 98o, no 1 e 100o, no 1, do EOA.

Termos em que, concedendo provimento ao presente recurso, com a consequente revogação da decisão recorrida e confirmação do bem decidido pela primeira instância, farão Vossas Excelências, Senhores Conselheiros, a costumada Justiça!

17. A Recorrida CC contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.

18. Como o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cf. arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608.º, n.º 2, por remissão do art. 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), as questões a decidir, in casu, são as seguintes:

I. — se o acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia pelo facto de no relatório se ter enunciado as questões a decidir em termos genéricos, em violação do art. 607.º, n.º 2, do Código de Processo Civil;

II. — se o acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia pelo facto de na fundamentação não se ter apreciado e decidido a questão do abuso de direito da interessada CC;

III. — se o acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia pelo facto de no dispositivo não se ter especificado as consequências do art. 701.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil;

IV. — se o acórdão recorrido é nulo por falta de fundamentação ou por contradição entre os fundamentos e a decisão;

V. — se a interessada CC foi citada para a acção e, no caso de resposta afirmativa, se a citação observou as formalidades prescritas na lei;

VI. — no caso de resposta afirmativa, se a acção correu à revelia, por falta absoluta de intervenção da interessada CC.

II. — FUNDAMENTAÇÃO

    OS FACTOS

19. O acórdão recorrido deu como provados os factos seguintes:

1 - Com a ref …. efectivamente AA intentou em 19 de Maio de 2010 acção especial de inventário para pôr termo à comunhão hereditária por óbito de FF, falecido em 19 de Março de 2009, no Tribunal Judicial da Comarca de ….., nos termos das disposições conjugadas dos artigos 1326o e ss do Código de Processo Civil (na redacção introduzida pelo DL 227/94, de 8-9 e que vigoravam antes da entrada em vigor da Lei no 23/2013, de 5 de Março) e 2102o, 2, a) do CC.

FF faleceu no estado de casado com a Requerente do inventário. Deixou como únicos herdeiros a viúva, Requerente e dois filhos – BB e CC, Requeridos no inventário, esta última dada como residente em …. ...... ......

O falecido deixou testamento pelo qual dispôs a favor da Requerente do inventário a sua quota disponível.

Termina designadamente pela efectivação das “citações devidas”.

Juntou documentos e procuração.

2 - Ref …. – Foi a Requerente do inventário, AA nomeada cabeça de casal.

Prestou juramento e declarações iniciais o cabeça-de-casal a 9 de Julho de 2010.

Manteve a morada da Requerida e interessada CC em ...... …...

A Requerente do Inventário vem em 25 de Agosto de 2010 informar que a Requerida e Interessada CC é casada no regime de separação de bens, e tem domicílio em Portugal na Rua …., em …... Junta relação de bens e documentos.

3 - Foi ordenada a citação e notificação dos Requeridos, interessados directos na partilha, nos termos e para os efeitos dos artigos 1341.º, 1342.º e 1348.º do Código de Processo Civil, por douto despacho de 23 de Setembro de 2010.

Ordenou-se assim a citação, por carta registada com a/r, de cada um dos Requeridos na qualidade de interessado para os termos do inventário, podendo no prazo de 30 dias contados da data da assinatura do a/r, querendo, deduzir oposição ao inventário, impugnar a legitimidade dos interessados citados ou alegar a existência de outros, impugnar a competência do cabeça de casal ou as indicações constantes das suas declarações.

A carta com vista a citar a CC foi endereçada para a Rua …., em …..

4- CC vem juntar requerimento em 7 de Fevereiro de 2011, subscrito por Advogado, no caso o Sr. Dr. DD.

O requerimento da Interessada CC tem o seguinte teor:

CC, interessada no inventário à margem identificado, vem juntar procuração a favor do seu advogado e ainda dizer o seguinte:

O cabeça de casa sabe perfeitamente que a requerente se encontra domiciliada na ….., bem como o domicílio da citanda que, todavia, não forneceu ao tribunal, como devia, para uma fácil e regular citação da requerente. Assim, a morada da requerente é:

Nome

……

……

…….

Junta procuração forense passada a favor do referido Advogado e ainda da Sra. Dra. EE, outorgada no Cartório Notarial do Consulado Geral de Portugal em ......, em 26 de Novembro de 2009.

Nela a Requerente identifica-se como viúva de II […]

5- A Senhora Agente de Execução vem dar conhecimento que obteve informação a 9 de Fevereiro de 2011 em como CC já não reside na Rua ….., em ….., pelo menos há um ano. A fracção está arrendada a 3os, e o proprietário/senhorio é JJ e reside no ……...

Justifica assim a impossibilidade de aí proceder à citação da CC.

6- A 3 de Março de 2011 tentou-se a citação da CC por carta registada com a/r na morada

…..

…..

…...

A secção reclama junto dos CTT o a/r.

A citação não se mostra efectuada.

7 - A Requerente do inventário requer a citação edital da CC.

Requerimento de 31 de Agosto de 2011.

Na sequência prolata-se o seguinte despacho:

Fls. 115 e 117:

Antes de mais, tendo a interessada CC constituído mandatário no âmbito dos presentes autos, o que demonstra ter conhecimento dos mesmos, notifique este último do teor de fls. 115, onde consta a menção “unclaimed” bem como para, no prazo de 10 (dez) dias, esclarecer o que tiver por conveniente.

Na sequência enviou-se carta para o endereço profissional do Sr. Dr. DD.

8 - Em 26 de Outubro de 2011 a cabeça-de-casal vem requerer como segue:

AA, Requerente nos autos supra identificados em que são requeridos CC E OUTRO, tendo sido notificada do teor do douto despacho de fls. (...), bem como verificado no pela consulta da movimentação processual no programa Citius, a devolução da carta expedida para o M.I. mandatário da requerida, vem muito respeitosamente, informar V. Exa. que teve conhecimento, pela análise do Boletim da Ordem dos Advogados Portugueses que o Ex.mo Colega Dr. DD faleceu no passado dia 10 de Fevereiro de 2011 (Cfr. Cópia que ora se junta como Doc. n.o 1), pelo que reitera o pedido de citação edital da requerida.

Insistiu a cabeça-de-casal por requerimento de 11 de Junho de 2012.

9 - Obteve-se a confirmação do domicílio profissional actualizado da Sra. Dra. EE – cfr. of. datado de 13-7-2012 emanado da O.A..

A fls. 144 veio esta Il. Ad. renunciar ao mandato.

10 - Insistiu a cabeça-de-casal pela citação edital da Interessada CC por requerimento de 24 de Outubro de 2012.

12 - Na sequência prolata-se em 23 de Novembro de 2011 douto despacho com o seguinte teor:

Não obstante ser compreensível o alegado a fls. 136, o certo é que só poderá ser ordenada a citação edital da interessada CC após a realização das diligências a que alude o artigo 244.o do Código de Processo Civil.

Assim sendo:

- Cumpra a secção o disposto no já citado artigo 244.o do Código de Processo Civil;

- Cumpra o ordenado a fls. 127 por via postal simples;

- Notifique o interessado BB para, no prazo de 10 (dez) dias, vir aos autos informar qual a morada actual da sua irmã CC.

13 - Por douto despacho de 17 de Janeiro de 2013 ordenou-se a citação da Interessada CC nos termos do disposto no artigo 247o, 3 do Código de Processo Civil.

Emitiu-se carta precatória ao Consulado de Portugal em .......

14 - A citação frustrou-se e insistiu a cabeça-de-casal pela citação edital da Interessada CC por requerimento de 19 de Julho de 2013.

15 - Por douto despacho de 23 de Setembro de 2013 ordenou-se a citação edital da Interessada CC.

Na sequência afixou-se edital à porta da morada da Rua ….., em …….

Deu-se cumprimento ao disposto no artigo 21o do Código de Processo Civil.

16 - A Sra. Dra. EE vem informar nos autos que não tem possibilidade de contactar a mandante e que o mandato foi celebrado entre a ora Recorrente e o Sr. Dr. DD, e não com ela. Solicita e renúncia ao mandato.

Proferiu-se douto despacho de 11-12-2014 com o seguinte teor:

Julgo válida a renúncia ao mandato efectuada a fls. 144. Notifique.

Para se proceder à Conferência de Interessados designo o próximo dia 16.01.2015, pelas 11h 30mn.

17 - Realizou-se a conferência de interessados a 16 de Janeiro de 2015.

Consta da respectiva acta um trecho com o douto despacho seguinte:

Atendendo a que a Interessada CC juntou a fls. 109 uma Procuração a mandatar dois advogados, Procuração essa que se refere expressamente a este Processo é manifesto que a mesma teve conhecimento do Processo e por conseguinte deve considerar-se citada quando juntou a Procuração ou seja, em 07/02/2011 e não na data em que foi indevidamente citada editalmente.

No decurso da Acção faleceu um dos advogados mandatados (O Sr. Dr. DD) porém a Interessada continuou a ser representada pela Sra. Dra. EE.

Não obstante aquela Ilustre advogada ter apresentado renúncia ao mandato até à presente data não foi possível proceder à notificação da mandante nem daquela Ilustre mandatária para requerer aquilo que tivesse por conveniente. Assim sendo, a Interessada CC continua a ser representada por aquela Ilustre mandatária.

As notificações têm sido remetidas para a morada indicada pela Interessada (vide fls. 107) termos em que a considero notificada para a presente diligência.


*

Em face do Despacho que antecede, a Digna Magistrada do Ministério Público retirou-se da presente diligência.

Da acta consta ainda que:

No que se refere ao Passivo apenas a verba No 1 do mesmo pode ser considerada como Passivo do Inventário pelo que as verbas 2 a 21 serão retiradas da relação de bens devendo a Cabeça de Casal, caso entenda, requerer a prestação de contas a fim de ver ressarcidos tais valores.

As partes aqui presentes referem que pretendem adjudicar os bens por lotes sendo adjudicados à Cabeça de Casal, AA as verbas No 1, No 3, e de No 12 a No 20 do Activo.

Ao Interessado BB é adjudicada a verba No 2 do Activo.

As verbas No 4 e No 5 do Activo ficam em compropriedade pelos Interessados presentes.

O quinhão da Interessada CC será integrado pelo valor em dinheiro que corresponde à sua quota na herança.

O valor dos saldos constantes das contas bancárias (verbas No 6 a No 11 do Activo) será distribuído na proporção das quotas de todos os Interessados.

Os Interessados presentes reconhecem o Passivo constante da verba No 1, uma vez que as restantes verbas do Passivo foram eliminadas.

18 - Em 16 de Abril de 2015 foi prolatado douto despacho a dar sem efeito o referido no ponto 17 – 1a parte. Assim:

Atendendo ao despacho de fls. 163 o primeiro despacho da acta de fls.165 e seguintes, só por lapso foi proferido.

Por a Digna Magistrada do Ministério Público (que representava a interessada ausente) se ter retirado, na sequência de tal despacho, notifique-a do teor da referida acta, a fim de a mesma dizer se concorda com o aí decidido ou se, pelo contrário, considera que deve repetir-se a diligência.

Caso concorde, fica desde já notificada para, querendo, apresentar forma à partilha, em dez dias. Notifique.

19 – Foi dada forma à partilha.

20 – A 14-05-2015 foi proferido o seguinte despacho:

Atendendo a que não é, actualmente, conhecido o paradeiro interessada CC, notifique o Ministério Público para, em dez dias, indicar pessoa idónea para ser nomeada curadora da interessada ausente – arto 1329o no1 do Código de Processo Civil de 1961. D.N.

21 - A 15-05-2015 promoveu o Ministério Público - no que foi diferido - se notifique o interessado BB para o mesmo vir aos autos, em 10 dias, indicar o nome de pessoa idónea que possa ser nomeado curador especial da interessada sua irmã, CC.

Mais pr. se oficie ao Consulado Português em ...... (cf. Fls. 109) para, por e-mail, nos informar da residência da interessada CC na .....

22 - O Interessado BB vem informar a 8 de Junho de 2016 nada saber de sua irmã CC.

23 - Em 1-07-2015 promoveu o Ministério Público - no que foi deferido – nos termos do Art.º 1329º, n.º 2 do Código de Processo Civil o ausente em parte incerta, como é actualmente o caso da interessada CC, deve ser representado por curador especial, pelo que se deverá continuar a efectuar diligências no sentido de se nomear tal curador.

Assim sendo, pr. se requisite certidão de nascimento da interessada CC bem como pr. se solicite à entidade competente o envio de cópia do seu último pedido de passaporte.

Mais pr. se insista junto do Consulado de Portugal em ...... pelo envio da informação solicitada.

24 - Veio devolvida carta dirigida à CC na ....., com a menção de desconhecida na morada indicada.

Juntaram-se os elementos do pedido do passaporte da CC.

Diligenciou-se para saber do paradeiro da CC junto do Consulado de Portugal em .......

25 - A 17 de Julho de 2015 o Consulado informa:

Com referência o Processo acima mencionado, venho por este meio informar que o actual domicílio de CC é:

……

…….

…..

…..

Tel: …….

26 - A 10 de Setembro de 2015 a cabeça-de-casal entende que agora se sabe da morada da Interessada CC, por via da informação do Consulado, opinando, sem prejuízo de outras notificações, ser de manter o Ministério Público a representar tal interessada.

27 - Em 17-09-2015 o Ministério Público promove – no que foi deferido -

Com referência à morada e n.o de telefone constante de fls. 209, pr. se solicite ao Consulado Geral de Portugal em ...... que proceda à notificação de CC, notificando-a, igualmente, para vir aos autos entregar procuração a favor de quem a possa aqui representar, a fim de que, posteriormente, lhe possam ser entregues os bens que lhe forem adjudicados.

28 - Foi enviada carta precatória ao Consulado para notificar a CC, residente em ….. - Tel: …..

- Da acta de conferência de interessados cuja cópia se junta.

- Para vir aos autos entregar procuração a favor de quem a possa representar, a fim de que, posteriormente, lhe possam ser entregues os bens que lhe forem adjudicados.

29 - A 12-05-2016 despacha-se assim:

Nos presentes autos não está em causa a citação da requerida CC, nem a sua representação para os autos, uma vez que a mesma foi citada editalmente e se mostra representada para os autos pelo Ministério Público.

Aquilo que aqui está em causa é a nomeação de uma curadora à ausente, a fim de se responsabilizar pela guarda do valor da herança que deve ser depositado a favor da ausente (como a lei exige) e para indicar tal pessoa foram notificados os demais interessados no inventário (seus familiares) que alegam desconhecer quem possa ser nomeado curador.

Perante isto tentou-se mais uma vez, através do Consulado Português de ......, encontrar a ausente o que até agora se revelou não ser possível.

Assim sendo, vão os autos com vista ao Ministério Público a fim de promover o que tiver por conveniente, uma vez que aquilo que o Tribunal mais quer é que o processo possa seguir os seus termos normais e se possa proceder à partilha, sendo certo que compete também às partes (em especial à cabeça de casal) esforçar-se por encontrar um familiar seu e da interessada ausente para que possa ser nomeado curador desta última.

30 - A 30 de Maio de 2016 a cabeça-de-casal vem propor que o curador da CC seja o seu irmão.

31- A 03-06-2016 proferiu-se o seguinte douto despacho:

Uma vez que BB é co-interessado no inventário indefiro a requerida nomeação do mesmo como curador provisório da sua irmã CC. Notifique.

Como resulta de fls. 30 o interessado BB é casado no regime de separação de bens com LL, que por tal razão não é interessada no inventário. Assim sendo e na falta de outro familiar que possa ser nomeado curador provisório da interessada CC, nomeio-lhe curadora provisória a sua cunhada LL.

32 - A cabeça-de-casal mostra-se desagradada com a decisão invocando que o Interessado BB já está divorciado da nomeada há quase 3 anos.

33 - O Sr. Juiz mantém a nomeação.

34 - O Ministério Público promove a substituição da nomeada.

A cabeça-de-casal informa desconhecer outro familiar vivo do Inventariado.

O Ministério Público promove que a cabeça-de-casal indique pessoa não familiar que possa ser nomeada.

Defere-se à promoção.

É indicada MM.

Vem a ser esta a nomeada.

Presta compromisso de honra a 12 de Dezembro de 2016.

35 - A 16 de Janeiro de 2017 foi dada forma à partilha. Elaborou-se o mapa informativo de partilha. Elaborou-se o mapa definitivo da partilha. Visto e rubricado, foi posto em reclamação. Cfr. artigo 1379o do Código de Processo Civil de 1961 aplicável ao inventário. Houve uma rectificação.

36 - Em 14 de Julho de 2017 proferiu-se douta sentença que homologou o mapa de partilhas e adjudicou aos interessados os respectivos quinhões. O processo foi à conta. Foram pagas as custas. Teve vistos em correição.

Os autos foram arquivados.

37 - Em 2 de Abril de 2019 a Interessada CC, declarando-se residente na Rua …. em …., constitui Il. Mandatário, junta procuração forense datada de 26 de Março de 2019, e solicita a consulta do processo.

38- O processo de inventário é requisitado ao arquivo e em 26 de Agosto de 2019 é-lhe apenso o recurso de revisão – apenso A.

O DIREITO

 20. A primeira questão consiste em determinar se o acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia pelo facto de no relatório se ter enunciado as questões a decidir em termos genéricos, em violação do art. 607.º, n.º 2, do Código de Processo Civil

 21. Os Recorrentes AA e BB alegam que 

IV. Ao receber no seu seio a integralidade da decisão singular que lhe antecedeu também o Acórdão ora impugnado identifica duas, assim ditas, questões a decidir: 1a – saber quais os factos a ter em conta; 2a – decidir o mérito da causa.

V. Sucede que, quer à luz de um conceito geral, num quadro meramente dogmático, quer no recorte do caso concreto, à luz do recurso apresentado e das conclusões que delimitam o objecto do recurso que decidiu, não podem os recorrentes reconhecer neste enunciado tais “questões” a decidir.

VI. É que, sem perder de vista que são as conclusões que delimitam o objecto dos recursos e que neste recurso não era impugnada matéria de facto, saber quais os factos a ter em conta não configura, com toda a certeza, uma questão a resolver. E, naturalmente, “decidir o mérito da causa” também não configura uma questão a decidir, mas um dever funcional do tribunal ad quem ou, de outro prisma, o resultado que provirá do conhecimento que o Tribunal efectuar de todas as questões de que deva conhecer para alcançar tal desiderato.

VII. Portanto, na decisão ora recorrida (tal como na douta decisão singular que a antecedeu), perdeu-se o recorte da citação que da sua pena começou por sair - Questões não são os argumentos nem as motivações; são as concretas controvérsias centrais a dirimir, na expressão usada no atrás referido ponto II de fls. 23 /24 – e, em vez de se identificarem controvérsias, delimitam-se não questões. E, por consequência, viola-se o preceituado no no 2 do artigo 607o, do Código de Processo Civil.

 22. O art. 607.º, n.º 2, do Código de Processo Civil é do seguinte teor:

2 - A sentença começa por identificar as partes e o objeto do litígio, enunciando, de seguida, as questões que ao tribunal cumpre solucionar.

23. Ora, o acórdão recorrido, ao enunciar as questões a decidir, diz tão-só o seguinte:

“as questões que se colocam ao julgador através desta apelação são as seguintes:

1ª – saber quais os factos a ter em conta;´

2ª – decidir do mérito da causa”.

24. Os termos genéricos em que as questões a decidir foram enunciadas não cumprem a determinação do art. 607.º, n.º 2, do Código de Processo Civil; não obstante, o não cumprimento, na modalidade de cumprimento defeituoso da determinação do art. 607.º, n.º 2, não é causa de nulidade por omissão de pronúncia.

25. O Supremo Tribunal de Justiça tem considerado, constantemente, que a nulidade por omissão de pronúncia “apenas se verifica quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre as ‘questões’ pelas partes submetidas ao seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente, como tais se considerando as pretensões formuladas por aquelas, mas não os argumentos invocados, nem a mera qualificação jurídica oferecida pelos litigantes” [1].

26. Ora, ainda que os termos genéricos em que as questões a decidir foram enunciadas não cumpram a determinação do art. 607.º, n.º 2, as questões forram apreciadas e decididas.

 27. Em resposta à primeira questão, dir-se-á que o acórdão recorrido não é nulo pelo facto de, no relatório, se ter enunciado as questões a decidir em termos genéricos, em violação do art. 607.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.

 28. A segunda questão consiste em determinar se o acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia pelo facto de na fundamentação não se ter apreciado e decidido a questão do abuso de direito da interessada CC.

 29. Os Recorrentes AA e BB alegam que

LXV. Demonstram, ainda, os autos que na sequência do requerimento apresentado pela interessada em 07.02.2011, foi expedida, no dia 02 de Março de 2011 e em obediência ao preceituado no então artigo 247o, Código de Processo Civil, para a morada indicada pela própria citanda, a carta de citação que consta do processo com a referência …. e cuja cópia se juntou à resposta ao recurso de revisão como Doc. no 3.

LXVI. Facto que, foi totalmente omitido no recurso de revisão e na apelação cuja decisão aqui se im[p]ugna, mas que os autos indiscutivelmente confirmam. Só que, aquilo que a própria interessada dizia ser o caminho para uma fácil e essencial regular citação (cfr. requerimento de 07.02.2011) veio a revelar-se infrutífero, pois a interessada CC deixou devolver a carta, que chega aos autos a 25.08.2011 com a menção “unclaimed”, ou seja, não reclamada.

LXVII. Mas, como bem decidiu a primeira instância, isto não pode significar que a interessada não foi citada ou que ocorreu nulidade da citação.

LXVIII. É que, desde logo, foram desenvolvidas inúmeras diligências tendentes à citação da interessada CC, das quais esta teve, manifestamente, conhecimento e que, inclusivamente, determinaram que juntasse aos autos procuração forense e indicasse a morada na qual queria ser citada (recorde-se, como, aliás, se faz na declaração de voto já supra transcrita, que estavam em curso as diligências de citação, quando é junto aos autos o requerimento de 7.Fev.2011).

LXIX. Para além disso, a citação foi repetida, para a morada indicada pela própria citanda (não é de mais repetir-se) e se dela não tomou a interessada conhecimento, tal fica a dever-se, exclusivamente, a facto que lhe é imputável.

LXX. O que, por si só, constitui impedimento à procedência da revisão – cfr. artigo 696o, alínea e), subalínea ii), a contrario sensu. Preceito que a decisão ora recorrida também viola.

LXXI. Decisão que igualmente não se pronuncia, devendo fazê-lo, sobre o comportamento reiterada e conscientemente omissivo de CC, que constitui acintosa violação do princípio da boa-fé, na vertente de lealdade processual e traduz manifesto abuso de direito (venire contra factum proprio).

LXXII. Mais: tentar, como pretendeu no âmbito do recurso de revisão, inverter o sentido do artigo 334.o, CCiv. (sem o citar) e pretender que se considere como lícita a sua actuação, insinuando esse mesmo comportamento de deslealdade à cabeça-de-casal e ao interessado BB, usando documentos com morada distinta da que indicou nos autos e afirmando que facilmente e, pasme-se, até por email, poderia ser citada é, sem margem para dúvidas, violar de modo plúrimo, o princípio da boa-fé.

LXXIII. O Acórdão recorrido omitiu, pois, também aqui, pronúncia sobre questão que lhe competia conhecer, violando, de um passo o disposto no artigo 334º, do CCiv. e incorrendo, reiteradamente, no fundamento gerador da sua nulidade, ínsito na alínea d) do artigo 615.º, do Código de Processo Civil.

30. O STJ tem considerado constantemente que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cf. arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608.º, n.º 2, por remissão do art. 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).

31. As questões suscitadas nas conclusões da alegação do recorrente são questões que o tribunal deve apreciar, no sentido do art. 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil; a omissão de pronúncia sobre as questões suscitadas nas conclusões da alegação do recorrente é causa de nulidade do acórdão recorrido; em regra, as questões suscitadas nas conclusões da contra-alegação dos recorridos não são em regra questões que o tribunal deva apreciar; — logo, em regra, a omissão de pronúncia sobre as questões suscitadas nas conclusões da contra-alegação não é causa de nulidade do acórdão recorrido[2].

32. Exceptua-se os casos em que os recorridos tenham requerido a ampliação do objecto do recurso, nos termos do art. 636.º, n.º 1, do Código de Processo Civil:

“No caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação”.

33. Como se diz, p. ex., nos acórdãos do STJ de 4 de Junho 2019 — processo n.º 844/15.9T8FND.C1.S1 — ou de 3 de Novembro de 2020 — processo n.º 2490/18.6T8PNF.P2.S1 —,

I - O tribunal do recurso deve pronunciar-se sobre as questões (1) suscitadas nas conclusões, (2) na ampliação do recurso e (3) de conhecimento oficioso.

II - O acórdão do tribunal da Relação que não se pronuncia sobre as contra-alegações e parecer junto não é nulo por omissão de pronúncia – art. 615.º, n.º 1, al. d), do Código de Processo Civil[3].

III. — A nulidade por omissão de pronúncia pressupõe que o tribunal deixe de apreciar alguma questão submetida pelas partes à sua apreciação, a qual, em sede de recurso, se reconduz aos pontos essenciais do seu objecto, delimitado pelas conclusões do recorrente, sendo que as questões suscitadas nas contra-alegações só podem ser consideradas caso tenha havido ampliação do âmbito do recurso[4].

 34. Ora a questão do abuso do direito da interessada, então Recorrente, CC foi suscitada nas contra-alegações dos então Recorridos, AA e BB, e os então Recorridos não requereram que a ampliação do objecto do recurso.

 35. Em resposta à segunda questão, dir-se-á que o acórdão recorrido não é nulo por omissão de pronúncia pelo facto de na fundamentação não se ter apreciado e decidiu a questão do abuso de direito da interessada CC.

  36. A terceira questão consiste em determinar se o acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia pelo facto de no dispositivo não se ter especificado as consequências do art. 701.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil.

 37. Os Recorrentes AA e BB alegam que

VIII. Materialmente o Acórdão do qual se recorre faz sua a decisão singular que julga procedente o recurso extraordinário de revisão interposto por CC, por, se bem se percebe à face da respectiva fundamentação (que não do inciso decisório), considerar ter-se verificado, na tramitação dos autos de inventário na primeira instância: i) Falta de citação da requerida CC, por não concretização da citação pessoal, vício que se considera não ter sido sanado com a junção do requerimento e da procuração, em 7 de Fevereiro de 2011 e ii) Falta de citação da requerida CC, por indevido emprego da citação edital, sendo nulo tudo o que se processou no processo de inventário posteriormente ao momento em que a citação foi feita editalmente.

IX. A declaração de voto lavrada pela Exma. Senhora Desembargadora HH e cujo teor atrás se deixou recordado, evidencia, ela própria, salvo o muito e devido respeito, não só a dificilmente apreensível estrutura da decisão, como a omissão de que padece a sua parte decisória, em clara violação do disposto no artigo 607o, no 3, do Código de Processo Civil.

X. Com efeito, o Acórdão remete integralmente para a decisão singular anteriormente proferida, sendo que a parte decisória desta, recebida naquele qua tale, se cinge ao seguinte: «Pelo que fica exposto, decido julgar procedente a apelação e por isso revogar a sentença recorrida, dando provimento ao recurso.»

XI. Estamos, assim, diante de afirmação tautológica, por inutilmente repetir a procedência que se entendeu (do ponto de vista dos aqui recorrentes, mal) conceder à apelação, sem daí se extrair quaisquer consequências nem nada se ordenar à primeira instância. O que consubstancia violação do disposto no artigo 701o, no 1, alínea c), do Código de Processo Civil, disposição legal à qual o Acórdão não deu cumprimento e nem sequer cita, mostrando-se a sua parte decisória amputada de parte essencial dos seus termos, o que se traduz em omissão de pronúncia geradora da respectiva nulidade.

XII. Acresce que, se vem dar-se provimento a um recurso de revisão cujo alegado fundamento se tem por alicerçado no disposto no artigo 696o, alínea e), subalínea i) [processo tramitado à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu por falta de citação ou nulidade da citação feita] não se percebe que citação há-de servir de termo a quo para a anulação do processado.

XIII. O que o tribunal deveria ter delimitado e não delimitou. E que, aliás, foi considerado determinante pelo legislador na alínea c) do no 1 do artigo 701o, já atrás recordado e não é indiferente para o cumprimento de essenciais princípios processuais, designadamente o do máximo aproveitamento dos actos, traduzido no artigo 130o, do Código de Processo Civil na sua vertente de proibição da prática de actos inúteis.

XIV. Termos em que estamos perante o vício de omissão de pronúncia, uma vez que o Tribunal não se pronunciou sobre questões sobre as quais deveria pronunciar-se, o que determina, igualmente, a nulidade do Acórdão – cfr. artigo 615o, no 1, alínea d), 1a parte – que aqui expressamente se argúi.

38. O art. 696.º do Código de Processo Civil, na versão em vigor à data da interposição do recurso de revisão, determina:

  A decisão transitada em julgado só pode ser objeto de revisão quando:

a) Outra sentença transitada em julgado tenha dado como provado que a decisão resulta de crime praticado pelo juiz no exercício das suas funções;

b) Se verifique a falsidade de documento ou ato judicial, de depoimento ou das declarações de peritos ou árbitros, que possam, em qualquer dos casos, ter determinado a decisão a rever, não tendo a matéria sido objeto de discussão no processo em que foi proferida;

c) Se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida;

d) Se verifique nulidade ou anulabilidade de confissão, desistência ou transação em que a decisão se fundou;

e) Tendo corrido a ação e a execução à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu, se mostre que faltou a citação ou que é nula a citação feita;

f) Seja inconciliável com decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português;

g) O litígio assente sobre ato simulado das partes e o tribunal não tenha feito uso do poder que lhe confere o artigo 612.o, por se não ter apercebido da fraude [5].

 39. Ora a interessada CC, agora Recorrida, invocou a alínea e) — Tendo corrido a ação e a execução à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu, se mostre que faltou a citação ou que é nula a citação feita.

40. O art. 701.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil, na antiga versão (em vigor à data da interposição do recurso de revisão), determinava que “[n]os casos previstos nas alíneas a) a f) do artigo 696.º, se o fundamento da revisão for julgado procedente, é revogada a decisão recorrida, observando-se o seguinte:

a) No caso da alínea e) do artigo 696.o, anulam-se os termos do processo posteriores à citação do réu ou ao momento em que devia ser feita e ordena-se que o réu seja citado para a causa” e o art. 701.º, n.º 1, alínea c), na nova versão, determina que

“Nos casos previstos nas alíneas a) a f) do artigo 696.º, se o fundamento da revisão for julgado procedente, é revogada a decisão recorrida, observando-se o seguinte: (…)

c) No caso da subalínea i) da alínea e) do artigo 696.º, anulam-se os termos do processo posteriores à citação do réu ou ao momento em que devia ser feita e ordena-se que o réu seja citado para a causa”.

 41. O dispositivo da decisão singular proferida pelo Exmo. Senhor Juiz Desembargador Relator foi o seguinte:

Pelo que fica exposto, decido julgar procedente a apelação e por isso revogar a sentença recorrida, dando provimento ao recurso.

42. O dispositivo do acórdão de conferência, por que se confirmou a decisão singular proferida, esse, foi o seguinte:

Pelo que fica exposto, acorda-se neste Tribunal da Relação em julgar confirmada a decisão singular proferida, igualmente quanto a custas.

 43. Em nenhuma das duas decisões “[se anulam] os termos do processo posteriores à citação do réu ou ao momento em que devia ser feita e [se ordena] que o réu seja citado para a causa”.

44. O Supremo Tribunal de Justiça tem considerado constantemente que “[a] interpretação das sentenças obedece às regras da interpretação dos negócios jurídicos”; que, “[p]ara interpretarmos correctamente a parte decisória de uma sentença temos de analisar os seu antecedentes lógicos que a tornam possível e a pressupõem, dada a sua íntima interdependência”[6] —  e que, em consequência, a parte decisória de uma sentença tem de conjugar-se com os seus fundamentos[7].

  45. Como se diz, p. ex., nos acórdãos de 28 de Janeiro de 1997, de 5 de Novembro de 2009 ou de 5 de Janeiro de 2019, citando Carnelutti, a sentença não é “nem dispositivo sem motivos, nem motivos sem dispositivo, mas a fusão deste com aqueles”.

 46. O corolário lógico das regras sobre a interpretação das sentenças é o de que, “[p]ara determinar se existe omissão de pronúncia há que interpretar a sentença [— ou o acórdão —] na sua totalidade, articulando fundamentação e decisão”[8].

 47. Ora na fundamentação da decisão singular confirmada pelo acórdãos recorrido encontra-se a passagem seguinte:

“há assim falta de citação da Requerida CC no inventário, sendo nulo tudo o que se processou no processo de inventário posteriormente ao momento em que a citação foi feita editalmente. Procede irrefragavelmente o recurso de revisão”.

 48. Interpretando o acórdão na sua totalidade, articulando fundamentação e decisão, conclui-se que o acórdão recorrido anula os termos do processo posteriores ao momento em que a citação devia ser feita e ordena que o réu seja citado para a causa.

 49. Em resposta à terceira questão, dir-se-á que o acórdão recorrido não é nulo por omissão de pronúncia pelo facto de no dispositivo não se ter especificado as consequências do art. 701.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil.

 50. A quarta questão consiste em determinar se o acórdão recorrido é nulo por falta de fundamentação ou por contradição entre os fundamentos e a decisão.

 51. Os Recorrentes alegam que

XLVIII. … a Interessada CC não alegou, e muito menos provou, que os seus mandatários constituídos não lhe tivessem dado conhecimento da forma como a usaram para a fazer intervir no processo de inventário em 7 de fevereiro de 2011, nem veio, nos termos do artigo 46.º, do Código de Processo Civil retirar que, naquele dia e por seu intermédio, se declarou interessada no inventário, o que apenas permite concluir que teve, como era suposto, conhecimento de que – através dos seus mandatários constituídos – juntou procuração ao processo de inventário em 7 de fevereiro de 2011.

XLIX. Não podendo, ainda, esquecer-se que o mandato forense, enquanto mandato típico, tem regras próprias que permitem asseverar (ao menos face à total inexistência de qualquer alegação em contrário) que a interessada CC teve prévio conhecimento da sua intervenção processual em 7 de fevereiro de 2011, entre as quais as plasmadas nos artigos 98o, no 1 e 100, no 1, do EOA, que o Acórdão recorrido ignorou completamente.

L. Recorde-se, a este propósito, que os documentos que o Exmo. Relator usou, na decisão singular e no Acórdão aqui recorrido, para afirmar que BB conhecia o endereço de correio electrónico da irmã (e que, recorde-se, estão juntos ao requerimento inicial do recurso de revisão como Docs. nos 1 e 2) demonstram que os contactos sobre a partilha deveriam passar a ser efectuados com os advogados aí indicados são anteriores à outorga da dita procuração, ou seja, demonstram que CC constituiu, nessa sequência e ainda em 2009, os seus próprios advogados que passaram a representá-la, desde logo no âmbito de diligências anteriores à instauração do inventário e que, naturalmente, não poderão deixar de lhe ter dado a conhecer a pendência do processo, coisa que, ademais, foi, como antes se referiu e está documentalmente provado, comunicado, via fax, ao Sr. Dr. DD.

LI. Isto é, o Acórdão não analisou criticamente as provas essenciais, nem tão pouco teve em conta as regras típicas do mandato forense, para a apreciação das questões a resolver, omitindo-se a apreciação de elemento de prova documental e a imperativa compatibilização dele com a demais prova. O que, para além de violar o disposto nos artigos 98.º, n.º 1 e 100.º, no 1, do EOA, viola, do mesmo passo, o disposto no no 4 do artigo 607o, do Código de Processo Civil e determina a respectiva nulidade (cfr. artigo 615.º, no 1, alínea b), do Código de Processo Civil).

 42. Entrando na apreciação dos argumentos deduzidos, deve distinguir-se estritamente a alegação de que há erro na apreciação das provas e a alegação de que há uma contradição entre os fundamentos e a decisão ou uma falta de fundamentação relevante para efeitos do art. 615.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil.

  43. Os Recorrentes AA e BB imputam ao acórdão recorrido erro na apreciação das provas.

 44. Sustentam que os documentos que fizeram com que o Tribunal da Relação concluísse que BB conhecia o endereço de correio electrónico da irmã deveriam fazer com que o Tribunal da Relação concluísse que CC conhecia a pendência do processo de inventário.

 45. Em rigor, não imputam ao acórdão recorrido uma autêntica contradição entre os fundamentos e a decisão ou uma autêntica falta de fundamentação — não sustentam que o Tribunal da Relação se tenha contradito ou não tenha fundamentado a afirmação de que “BB conhecia o endereço de correio electrónico da irmã”.

 46. Evitando-se a confusão entre os dois conceitos, de erro na apreciação das provas e de falta de fundamentação, esclarecer-se-á que “[o] erro na apreciação das provas… não pode ser objeto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova”  — e que, no caso, não há ofensa nenhuma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova ou que fixe a força de determinado meio de prova.

  47. Em resposta à quarta questão, dir-se-á que o acórdão recorrido não é nulo por contradição entre os fundamentos e a decisão ou por falta de fundamentação.

  48. A quinta questão consiste em determinar se a interessada CC foi citada para a acção e, no caso de resposta afirmativa, se a citação observou as formalidades prescritas na lei.

  49. Em primeiro lugar, deve atender-se aos factos dados como provados sob os n.ºs 2, 3 e 4:

2. — [A] Requerente do inventário, AA, […] ve[io] em 25 de Agosto de 2010 informar que a Requerida e Interessada CC é casada no regime de separação de bens, e tem domicílio em Portugal na Rua …, em ……. […]

3. — Foi ordenada a citação e notificação dos Requeridos, interessados directos na partilha, nos termos e para os efeitos dos artigos 1341.º, 1342.º e 1348.º do Código de Processo Civil, por douto despacho de 23 de Setembro de 2010.

Ordenou-se assim a citação, por carta registada com a/r, de cada um dos Requeridos na qualidade de interessado para os termos do inventário, podendo no prazo de 30 dias contados da data da assinatura do a/r, querendo, deduzir oposição ao inventário, impugnar a legitimidade dos interessados citados ou alegar a existência de outros, impugnar a competência do cabeça de casal ou as indicações constantes das suas declarações.

A carta com vista a citar a CC foi endereçada para a Rua …., em …..

4. — CC ve[io] juntar requerimento em 7 de Fevereiro de 2011, subscrito por Advogado, no caso o Sr. Dr. DD.

O requerimento da Interessada CC t[inha] o seguinte teor:

CC, interessada no inventário à margem identificado, vem juntar procuração a favor do seu advogado e ainda dizer o seguinte:

O cabeça de casa sabe perfeitamente que a requerente se encontra domiciliada na ….., bem como o domicílio da citanda que, todavia, não forneceu ao tribunal, como devia, para uma fácil e regular citação da requerente. Assim, a morada da requerente é:

Nome

……

……

.......

Junt[ou] procuração forense passada a favor do referido Advogado e ainda da Sra. Dra. EE, outorgada no Cartório Notarial do Consulado Geral de Portugal em ......, em 26 de Novembro de 2009 […]

 50. Em segundo lugar, deve atender-se aos factos dados como provados sob o n.º 6:

6 - A 3 de Março de 2011 tentou-se a citação da CC por carta registada com a/r na morada

…….

…….

......

A secção reclama junto dos CTT o a/r.

A citação não se mostra efectuada.

 51. Em terceiro lugar, deve atender-se aos factos dados como provados sob os n.ºs 7, 8, 9, 10, 12, 13, 14 e 15:

7- A Requerente do inventário requer a citação edital da CC.

Requerimento de 31 de Agosto de 2011.

Na sequência prolata-se o seguinte despacho:

Fls. 115 e 117:

Antes de mais, tendo a interessada CC constituído mandatário no âmbito dos presentes autos, o que demonstra ter conhecimento dos mesmos, notifique este último do teor de fls. 115, onde consta a menção “unclaimed” bem como para, no prazo de 10 (dez) dias, esclarecer o que tiver por conveniente.

Na sequência enviou-se carta para o endereço profissional do Sr. Dr. DD.

8- Em 26 de Outubro de 2011 a cabeça-de-casal vem requerer como segue:

AA, Requerente nos autos supra identificados em que são requeridos CC E OUTRO, tendo sido notificada do teor do douto despacho de fls. (...), bem como verificado no pela consulta da movimentação processual no programa Citius, a devolução da carta expedida para o M.I. mandatário da requerida, vem muito respeitosamente, informar V. Exa. que teve conhecimento, pela análise do Boletim da Ordem dos Advogados Portugueses que o Ex.mo Colega Dr. DD faleceu no passado dia 10 de Fevereiro de 2011 (Cfr. Cópia que ora se junta como Doc. n.o 1), pelo que reitera o pedido de citação edital da requerida.

Insistiu a cabeça-de-casal por requerimento de 11 de Junho de 2012.

9- Obteve-se a conformação do domicílio profissional actualizado da Sra. Dra. EE – cfr. of. datado de 13-7-2012 emanado da O.A..

A fls. 144 veio esta Il. Ad. renunciar ao mandato.

10- Insistiu a cabeça-de-casal pela citação edital da Interessada CC por requerimento de 24 de Outubro de 2012.

12- Na sequência prolata-se em 23 de Novembro de 2011 douto despacho com o seguinte teor:

Não obstante ser compreensível o alegado a fls. 136, o certo é que só poderá ser ordenada a citação edital da interessada CC após a realização das diligências a que alude o artigo 244.o do Código de Processo Civil.

Assim sendo:

- Cumpra a secção o disposto no já citado artigo 244.o do Código de Processo Civil;

- Cumpra o ordenado a fls. 127 por via postal simples;

- Notifique o interessado BB para, no prazo de 10 (dez) dias, vir aos autos informar qual a morada actual da sua irmã CC.

13- Por douto despacho de 17 de Janeiro de 2013 ordenou-se a citação da Interessada CC nos termos do disposto no artigo 247o, 3 do Código de Processo Civil.

Emitiu-se carta precatória ao Consulado de Portugal em .......

14- A citação frustrou-se e insistiu a cabeça-de-casal pela citação edital da Interessada CC por requerimento de 19 de Julho de 2013.

15- Por douto despacho de 23 de Setembro de 2013 ordenou-se a citação edital da Interessada CC.

Na sequência afixou-se edital à porta da morada da Rua ….., em …….

Deu-se cumprimento ao disposto no artigo 21.º do Código de Processo Civil.

  51. Em relação aos factos dados como provados sob os n.ºs 2, 3 e 4 e aos factos dados como provados sob os n.ºs 12, 13, 14 e 15, há uma divergência fundamental entre as decisões das instâncias.

  52. Estando de acordo em que a interessada CC não foi citada através da carta registada com aviso de recepção enviada para a Rua …, em ….. — art. 188.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Civil —, o Tribunal de 1.ª instância e o Tribunal da Relação atribuíram efeitos diferenciados ao requerimento de 7 de Fevereiro de 2011:

I. — O Tribunal de 1.ª instância considerou que a junção de procuração forense tinha o efeito de regularizar a falta de citação, de acordo com o art. 189.º do Código de Processo Civil[9]:

“A recorrente foi indicada como herdeira de seu pai e interessada no inventário e, embora não tenha sido formalmente citada, por não ter sido encontrada nas moradas que foram indicadas nos autos, veio a mesma, em 07.02.2011, juntar procuração a mandatar dois Advogados, procuração esta que expressamente mandata os Ilustres Advogados, a favor de quem foi outorgada, a representá-la em todos os actos relativos à partilha da herança do seu pai (fls. 107 a 109). Ficando assim regularizada a falta da sua citação”

II. — O Tribunal da Relação considerou que não tinha tal efeito, por três razões.

 Em primeiro lugar, porque a procuração foi emitida em data anterior à da propositura da acção; em segundo lugar, porque a procuração não confere aos representantes poderes especiais para receberem a citação em processo de inventário intentado por terceiro; em terceiro lugar, porque o requerimento junto á procuração solicita que a representada seja citada no estrangeiro.

“Com a junção do requerimento e da procuração a 7 de Fevereiro de 2011 por parte da ora Recorrente não se pode dizer que a ora Recorrente se conforma com a falta de citação e que tem conhecimento dos termos do inventário, considerando sanada a falta.

Não se pode porque:

1 - a procuração junta não confere poderes especiais para os mandatários receberem a citação;

2 - a procuração data de momento anterior à propositura da acção, não sendo portanto possível à ora Recorrente ter conhecimento da acção quando emitiu a procuração;

3 - a ora Recorrente no requerimento que traz aos autos não aceita os termos da acção, e, antes pretende conhecer os mesmos, solicitando para tal a sua citação regular, informando residir no Estrangeiro – ..... […]”.

 Finalmente, nunca poderia aplicar-se o art. 189.º do Código de Processo Civil, porque a interessada teria arguido logo a falta da sua citação:

“Com a junção do requerimento e da procuração a 7 de Fevereiro de 2011 a ora Recorrente vem assinalar que não está citada, que se não reconhece desde já citada e requer a sua citação regular.

Tem de se concluir que arguiu logo a falta da sua citação”.

53. Entre os factos dados como provados sob os n.ºs 12, 13, 14 e 15, deve chamar-se a atenção para duas coisas:

 I. — em cumprimento do art. 247.º, n.º 3, do Código de Processo Civil de 1961, determinou-se a citação através do consulado e enviou-se carta precatória ao Consulado de Portugal em ...... (facto provado sob o n.º 13); II. — em cumprimento do art. 247.º, n.º 4, determinou-se a citação edital da interessada (facto provado sob o n.º 15).

 54. O art. 247.º do Código de Processo Civil de 1961, na versão em vigor à data dos factos dados como provados sob os n.ºs 2 e 3, é do seguinte teor:

1. — Quando o réu resida no estrangeiro, observar-se-á o que estiver estipulado nos tratados e convenções internacionais.

2. — Na falta de tratado ou convenção, a citação é feita por via postal, em carta registada com aviso de recepção, aplicando-se as determinações do regulamento local dos serviços postais.

3. — Se não for possível ou se frustrar a citação por via postal, proceder-se-á à citação por intermédio do consulado português mais próximo, se o réu for português; sendo estrangeiro, ou não sendo viável o recurso ao consulado, realizar-se-á a citação por carta rogatória, ouvido o autor.

4. — Estando o citando ausente em parte incerta, proceder-se-á à sua citação edital, averiguando-se previamente a última residência daquele em território português e procedendo-se às diligências a que se refere o artigo 244.º.

 55. O Tribunal de 1.ª instância considera que, “ainda que desnecessariamente, por a recorrente estar já citada, foi a mesma citada editalmente, ou seja, a recorrente tem de considerar-se duplamente citada, tendo a sua defesa passado a ser efectuada pelo M. P., o que ocorreu a partir da data da citação edital e até ao término do processo, ou seja, a recorrente esteve sempre devidamente representada nos autos”.

 56. O Tribunal da Relação considera que a citação edital não foi precedida das diligências previstas no art. 244.º do Código de Processo Civil de 1961 e que, em consequência, não foram observadas as formalidades prescritas na lei.

  57. O art. 244.º do Código de Processo Civil de 1961 era do seguinte teor:

1. — Quando seja impossível a realização da citação, por o citando estar ausente em parte incerta, a secretaria diligencia obter informação sobre o último paradeiro ou residência conhecida junto de quaisquer entidades ou serviços, designadamente, mediante prévio despacho judicial, nas bases de dados dos serviços de identificação civil, da segurança social, da Direcção-Geral dos Impostos e da Direcção-Geral de Viação e, quando o juiz o considere absolutamente indispensável para decidir da realização da citação edital, junto das autoridades policiais.

2. — Estão obrigados a fornecer prontamente ao tribunal os elementos de que dispuserem sobre a residência, o local de trabalho ou a sede dos citandos quaisquer serviços que tenham averbado tais dados.

3. — O disposto nos números anteriores é aplicável aos casos em que o autor tenha indicado o réu como ausente em parte incerta.

 58. O Tribunal da Relação considera que “[se omitiram] diligências junto das autoridades portuguesas na ..... para saber da concreta localização da citanda”, que as diligências eram possíveis e que a prova de que as diligências eram possíveis é o facto de que, “quando se fizeram para a designação do curador, [se soube] do concreto paradeiro da citanda na .....”; e que o interessado BB conhecia o endereço de correio electrónico da citanda, “tendo, porém, informado nada saber da irmã”.

  59. Em todo o caso, ainda que a junção da procuração forense não tenha o efeito de regularizar a falta de citação, deve considerar-se os factos dados como provados sob o n.º 6:

6 - A 3 de Março de 2011 tentou-se a citação da CC por carta registada com a/r na morada

……

…….

......

A secção reclama junto dos CTT o a/r.

A citação não se mostra efectuada.

 60. O sentido da fórmula “A citação não se mostra efectuada” resulta do facto dado como provado sob o n.º 7 — a carta não foi reclamada pela interessada CC.

 61. Os factos dados como provados sob os n.ºs 6 e 7 são claros no sentido de que a citação só se frustrou porque a interessada CC não reclamou a carta registada com aviso de recepção que lhe foi enviada, para o endereço que indicara.

 62. A intervenção no processo relevante para os fins do art. 189.º do Código de Processo Civil pressupõe o conhecimento ou a possibilidade de conhecimento da pendência do processo[10] —  e o requerimento de 7 de Fevereiro de 2011, ainda que não tenha o efeito de regularizar a falta de citação[11], tem seguramente o efeito de indiciar que a interessada CC ou, em todo o caso, o seu mandatário conhecia o processo.

 63. Face ao conhecimento, ou à possibilidade de conhecimento, da pendência do processo e ao teor do requerimento de 7 de Fevereiro de 2011, o comportamento da interessada configura-se como um comportamento abusivo — ainda que houvesse requerido, em 7 de Fevereiro de 2011, que a citação seja feita através de carta enviada para uma caixa postal, não reclamou a carta que lhe foi enviada. Ou bem que a interessada alegava e provava que só não reclamou a carta que lhe foi enviada por facto que não lhe era imputável, ou bem que não o alegava e provava — e, em consequência, o pedido de recurso de revisão conflituaria com o princípio da proibição do abuso do direito[12].

 64. Finalmente, ainda que se admitisse a conclusão do Tribunal da Relação de que faltou a citação, ou de que a citação feita foi nula, sempre deveria apreciar-se e decidir-se a sexta questão — se a acção correu à revelia, por falta absoluta de intervenção da interessada CC.

  65. O art. 696.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Civil distingue dois requisitos cumulativos:

“1.º Que tenha corrido à revelia a acção e a execução

2.º Que o réu não tenha sido citado ou, se o foi, que a citação tenha sido feita com preterição de formalidades legais”[13].

 66. O conceito de revelia relevante para efeitos do art. 696.º, n.º 1, do Código de Processo Civil designa a “falta absoluta de intervenção, por si ou por meio de representante, no processo em que foi proferida a sentença a rever”[14] — são casos de revelia, e só são casos de revelia, aqueles em que a parte não tenha intervindo de qualquer forma no processo[15]; em que a parte “não [tenha praticado] qualquer acto no processo, não [tenha] nele [tido] qualquer espécie de intervenção, não [tenha estado] presente nem se [tenha feito] representar”[16].

 67. Ora, o facto é que a interessada CC teve uma intervenção no processo — através do requerimento de 7 de Fevereiro de 2011 — e só não terá continuado a tê-la por razões que lhe são imputáveis — por não ter reclamado a carta que lhe foi enviada para o endereço indicado no requerimento de 7 de Fevereiro de 2011.

68. Em resposta à sexta questão, dir-se-á que a acção não correu à revelia, por não haver falta absoluta de intervenção da interessada CC.

III. — DECISÃO

  Face ao exposto, concede-se provimento ao recurso e revoga-se o acórdão recorrido, repristinando-se a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância.

   Custas pela Recorrida CC.


Lisboa, 8 de Abril de 2021


Nuno Manuel Pinto Oliveira (relator)

José Maria Ferreira Lopes

Manuel Pires Capelo

  Nos termos do art. 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, declaro que o presente acórdão tem o voto de conformidade dos Exmos. Senhores Conselheiros José Maria Ferreira Lopes e Manuel Pires Capelo.

______

[1] Cf. acórdão do STJ de 10 de Dezembro de 2020 — processo n.º n.º 12131/18.6T8LSB.L1.S1 —; em termos em tudo semelhantes, vide, p. ex., os acórdãos do STJ de 3 de Novembro de 2020 — processo n.º 2057/16.3T8PNF.P1.S1 —, de 2 de Dezembro de 2020 — processo n.º 240/19.9T8ALM.L1.S1 — ou de 10 de Dezembro de 2020 — processo n.º 189/14.1TBPTM.E1.S1.

[2] Cf. designadamente os acórdãos do STJ de 18 de Janeiro de 2011 — processo n.º 1947/05.3TBLSD.P1.S1 —, de 13 de Outubro de 2016 — processo n.º 967/14.1TBACB.C1.S1 —, de 4 de Junho 2019 — processo n.º 844/15.9T8FND.C1.S1 — ou de 3 de Novembro de 2020 — processo n.º 2490/18.6T8PNF.P2.S1.

[3] Expressão do acórdão do STJ de 4 de Junho 2019 — processo n.º 844/15.9T8FND.C1.S1.

[4] Expressão do acórdão do STJ de 3 de Novembro de 2020 — processo n.º 2490/18.6T8PNF.P2.S1

[5] A versão actualmente em vigor decorre da Lei n.º 117/2019, de 13 de Setembro, em que se alterou a redacção da alínea e) e em que se completou o conjunto dos fundamentos do recurso de revisão com a alínea h). Em primeiro lugar, alterou-se a redacção da alínea e), que passou a dizer que a sentença transitada em julgado pode ser objecto de revisão quando, “[t]endo corrido o processo à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu, se mostre que: i) Faltou a citação ou que é nula a citação feita; ii) O réu não teve conhecimento da citação por facto que não lhe é imputável; iii) O réu não pode apresentar a contestação por motivo de força maior”. Em segundo lugar, completou-se o conjunto dos fundamentos do recurso de revisão com a alínea h) — a sentença transitada em julgado pode ser objecto de revisão quando “[s]eja susceptível de originar a responsabilidade civil do Estado por danos emergentes do exercício da função jurisdicional, verificando-se o disposto no artigo seguinte”.

[6] Cf. acórdãos do STJ de 16 de Abril de 2002 — processo n.º 02B3349 — e de 17 de Fevereiro de 2003 — processo n.º 03B1993 —, cujo critério é adoptado, designadamente, pelos acórdãos do STJ de 5 de Março de 2009 — processo n.º 331/09 —, de 5 de Novembro de 2009 — processo n.º 4800/05.TBAMD-A.S1 —, de 3 de Fevereiro de 2011 — processo n.º 190-A/1999.E1.S1 —, de 26 de Abril de 2012 — processo n.º 289/10.7TBPTB.G1.S1 —, de 12 de Junho de 2012 — processo n.º 521-A/1999.L1.S1 —, de 13 de Fevereiro de 2014 — processo n.º 2081/09.2TBPDL.L1.S1 —, de 12 de Março de 2014 — processo n.º 177/03.3TTFAR.E1.S1 —, de 17 de Novembro de 2015 — processo n.º 34/12.2TBLMG.C1.S1 —, de 20 de Dezembro de 2017 — processo n.º 144/11.3TYLSB.L2.S2 —, de 4 de Outubro de 2018 — processo n.º 10758/01.4TVLSB-A.L1.S1 —, de 5 de Janeiro de 2019 — processo n.º 27881/15.0T8LSB-A.L1.A.S1 — ou de de 23 de Janeiro de 2019 — processo n.º 4568/13.3TTLSB.L2.S1.

[7] Cf. designadamente os acórdãos do STJ de 11 de Março de 1949, in: Boletim do Ministério da Justiça n.º 12 (Maio de 1949); de 16 de Abril de 2002 — processo n.º 02B3349 —; de 17 de Fevereiro de 2003 — processo n.º 03B1993 —; de de 5 de Novembro de 2009 — processo n.º 4800/05.TBAMD-A.S1 —; de 3 de Fevereiro de 2011 — processo n.º 190-A/1999.E1.S1 —; de 26 de Abril de 2012 — processo n.º 289/10.7TBPTB.G1.S1 —; de 12 de Junho de 2012 — processo n.º 521-A/1999.L1.S1 —; de 13 de Fevereiro de 2014 — processo n.º 2081/09.2TBPDL.L1.S1 —; de 12 de Março de 2014 — processo n.º 177/03.3TTFAR.E1.S1 —; de 17 de Novembro de 2015 — processo n.º 34/12.2TBLMG.C1.S1 —; de 24 de Novembro de 2015 — processo n.º 7368/10.9TBVNG-C.P2.S1 —; de 29 de Setembro de 2016 — processo n.º 17/13.5TBLSA.C1.S1 —; de 20 de Dezembro de 2017 — processo n.º 144/11.3TYLSB.L2.S2 —; de 4 de Outubro de 2018 — processo n.º 10758/01.4TVLSB-A.L1.S1 —; de 5 de Janeiro de 2019 — processo n.º 27881/15.0T8LSB-A.L1.A.S1 —; e de 23 de Janeiro de 2019 — processo n.º 4568/13.3TTLSB.L2.S1.

[8] Cf. acórdão do STJ de de 23 de Janeiro de 2019 — processo n.º 4568/13.3TTLSB.L2.S1.

[9] Cujo teor é o seguinte: “Se o réu ou o Ministério Público intervier no processo sem arguir logo a falta da sua citação, considera-se sanada a nulidade”.

[10] Cf. acórdãos do STJ de 4 de Novembro de 2004 — processo n.º 2419/04 —,  de 31 de Janeiro de 2006 — processo n.º 3851/05 —, de 4 de Outubro de 2010 — processo n.º 4501/08.4TBMAI-A.P1.S1 —, de 7 de Dezembro de 2016 — processo n.º 1605/04.6TCSNT-E.L1.S1 —e de 24 de Novembro de 2020 — processo n.º 2087/17.8T8OAZ-A.P1.S1.

[11] Sobre a interpretação do art. 189.º do Código de Processo Civil, vide por todos José Alberto dos Reis, anotação ao art. 196.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. I — Artigos 1.º a 406.º, Coimbra Editora, Coimbra, 1982 (reimpressão), pág. 313; José Alberto dos Reis, anotação aos arts. 193.º-208.º, in: Comentário ao Código de Processo Civil, vol. II — Artigos 138.º-263.º, Coimbra Editora, Coimbra, 1945, págs. 332-522 (445-447); José Lebre de Freitas / Isabel Alexandre, anotação ao art. 189.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. I — Artigos 1.º a 361.º, 4.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2018, págs. 389-390; ou António Santos Abrantes Geraldes / Paulo Pimenta / Luís Filipe Pires de Sousa,  anotação ao art. 189.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. I — Parte geral e processo de declaração (artigos 1.º a 702.º), Livraria Almedina, Coimbra, 2018, pág. 228.

[12] Em termos semelhantes, vide o acórdão do STJ de 9 de Novembro de 1995 — processo n.º 087774: “O emprego injustificado de citação edital pode fundamentar pedido de revisão da sentença proferida em acção ordinária que correu à revelia do réu, salvo havendo abuso de direito”.

[13] José Alberto dos Reis, anotação ao art. 771.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. VI — Artigos 721.º a 800.º, Coimbra Editora, Coimbra, 1985 (reimpressão), págs. 328-372 (362).

[14] José Alberto dos Reis, anotação ao art. 771.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. VI — Artigos 721.º a 800.º, cit., pág. 363.

[15] Cf. art. 565.º do Código de Processo Civil — sobre a revelia absoluta.

[16] José Alberto dos Reis, anotação ao art. 771.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. VI — Artigos 721.º a 800.º, cit., pág. 362.