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DIRECTIVA COMUNITÁRIA
COBRANÇA DE CRÉDITOS
PRIMADO DO DIREITO EUROPEU
Sumário
I - A nulidade da sentença por falta de fundamentação, só existe, se for absoluta e impossibilitar o exercício do direito de recurso. II - O Decreto-Lei n.º 263/12 de 20 de Dezembro transpôs para ordem nacional a Diretiva 2008/55/CE do Conselho, de 26 de Maio de 2008, relativa à Assistência Mútua em Matéria de Cobrança de Créditos de um Estado Membro. III - Nos termos desse diploma as questões relativas à existência, exigibilidade e limites da obrigação fiscal devem ser objecto de impugnação no Estado onde esta teve origem. IV - O Estado português e os seus tribunais são, por isso, incompetentes, para analisar se decorreu ou não o prazo de prescrição desse crédito. V - Essa interpretação é a que tem sido efectuada pelo Tribunal de Justiça da UE, a qual é vinculativa para os tribunais nacionais por força do primado do direito comunitário.
Texto Integral
Processo n.º 14/14.3T8STS-F.P1
Sumário:
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1. Relatório
Os presentes autos de reclamação, verificação e graduação de créditos foram instaurados por apenso aos autos de insolvência relativos a B…, nos quais foi proferida sentença de declaração de insolvência, transitada em julgado.
A Sr.ª Administradora da Insolvência juntou aos autos a lista de credores reconhecidos e não reconhecidos, mediante requerimento apresentado em 25-11-2014, nos termos do disposto no artigo 129º do CIRE.
A insolvente apresentou, ao abrigo do disposto no art. 130º do CIRE, impugnação do crédito reclamado pela Fazenda Nacional, defendendo que este seja eliminado da lista dos créditos reconhecidos, conforme requerimento de 10-12-2014, o qual se dá por integralmente reproduzido.
O Ministério Público, em representação da Fazenda Nacional, respondeu à referida impugnação, nos termos do requerimento de 07-06-2015, concluindo pela improcedência da mesma.
Cumprido o disposto no art. 131.º do CIRE, a Srª. Administradora da Insolvência apresentou resposta à reclamação apresentada, através do requerimento junto em 05/06/2015, defendendo que o crédito da Fazenda Nacional deverá ser reconhecido nos termos da lista que juntou.
Saneada a causa foi proferida decisão que indeferiu o requerido pela insolvente.
Inconformada veio a insolvente interpor RECURSO DE APELAÇÃO nos termos do disposto nos artigos 14.º e 42.º do CIRE e artigo 638.º, n.º 1 e 639.º e segs. do Código de Processo Civil, visando a apreciação da sentença na parte que lhe é desfavorável, ou seja, na parte da sentença que reconheceu e verificou o crédito reclamado pela Fazenda Nacional que do ofício da AT não tenha indicação de se encontrar prescrito.
2. Para tal apresentou as seguintes CONCLUSÕES:
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2.2. O MP respondeu nos seguintes termos:
I. Ao contrário do alegado pela recorrente, o crédito reconhecido e graduado na sentença ora recorrida não é diferente do que constitui o objecto da reclamação de créditos e foi objecto de impugnação.
II. E estão cumpridos, na reclamação de créditos, os requisitos exigidos pelo artigo 128.º do CIRE.
III. Com efeito, na reclamação de créditos oportunamente remetida à Exm.ª Sr.ª Administradora de Insolvência está suficientemente explicitado o objecto e montantes parcelares e total do pedido.
IV. Para além disso, a própria certidão fiscal que serve de base à reclamação do crédito identifica claramente o tributo, a data de vencimento, o período de tributação, a quantia exequenda, os juros de mora e a quantia total em dívida.
V. Ora, compaginando a certidão fiscal e o documento que é apresentado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, datado de 24 de Outubro de 2018, e baseado na informação prestada pelo Estado da Dinamarca, não pode deixar-se de concluir que o crédito reclamado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, reconhecido pela Exm.ª Sr.ª Administradora de Insolvência e reconhecido e graduado na sentença ora recorrida se trata do mesmo crédito.
VI. No que concerne à invocada insuficiência do título executivo, o mesmo está actualmente documentado não apenas na certidão fiscal mas inclusiva e exaustivamente no processo executivo fiscal que, na íntegra, constitui o apenso A destes autos.
VII. Com excepção dos créditos cuja prescrição o Estado da Dinamarca reconheceu, os restantes créditos reclamados e que a sentença reconheceu não estão prescritos, sendo legalmente exigíveis.
VIII. De resto, as questões de deficiência do título executivo e demais suscitadas na impugnação – e agora em sede de recurso - já o foram em sede de jurisdição administrativa e fiscal, tendo merecido do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto decisão no sentido da incompetência para as conhecer (que, aliás, se dá aqui por reproduzida).
IX. Para além de que, conforme se refere na sentença ora recorrida, de harmonia com o artigo 15.º, n.º 1 da Diretiva 2008/55/CE do Conselho, de 26 de Maio de 2008, relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos respeitantes a certas quotizações, direitos, impostos e outras medidas, “as questões respeitantes à prescrição serão reguladas exclusivamente pelas normas jurídicas em vigor no Estado-Membro onde a autoridade requerente tem a sua sede.”
X. Seguindo de perto a sentença ora recorrida, «tendo as autoridades do Estado requerente (Dinamarca) prestado a informação que, de acordo com as regras em vigor nesse país, correspondem aos créditos fiscais que subsistem em dívida pela insolvente, apenas cabe a Portugal dar execução à pretensão daquele Estado-Membro, no qual se consolidou a obrigação tributária da insolvente nos presentes autos e relativamente à qual a mesma invoca a prescrição dos respetivos créditos fiscais, sem que no entanto haja invocado qualquer regra daquele Estado que conduza ao pretendido efeito».
XI. Não se verificando, assim, as circunstâncias previstas no n.º 1, nem a excepção consagrada no n.º 2, ambos do Decreto-Lei n.º 263/12 de 20 de Dezembro.
XII. Por último, não se alcança do alegado em que consiste a invocada contradição entre os factos provados (2.º e 3.º).
XIII. Com efeito e para além da asserção de que esta contradição se trata apenas da repetição do argumento invocado em primeiro lugar no seu recurso, impõe dizer-se que tais factos não são contraditórios nos seus termos, mas antes complementares entre si.
XIV. Conforme resulta, aliás, da mera compaginação dos documentos que serviram de base à convicção que subjaz necessariamente aos factos provados.
XV. Pelo exposto, somos de entendimento de que a decisão ora recorrida nenhuma censura merece, encontrando-se perfeitamente justificada e correcta face aos pressupostos de direito e de facto em que se baseou.
XVI. Não assiste, pelo exposto, qualquer razão à ora recorrente.
3. As questões a decidir são as seguintes:
1. Da nulidade da decisão por omissão de pronuncia quanto à insuficiência do título executivo de acordo com as exigências do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 263/2012, de 20 de Dezembro, da verificação dos requisitos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 263/2012, de 20/12;
2. Da alegada contradição entre os factos provados
3. Da falta de correspondência entre a dívida reclamada e a constante do documento em que a sentença se suportou – ofício da AT de 24-10-2018.
4. Por fim, se tal for necessário, apreciar se o crédito em causa pode ou não ser verificado e graduado.
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4.Das questões prévias.
O tribunal a quo consignou no despacho de forma singela o seguinte: “Nas respetivas alegações de recurso, invoca a recorrente B… a existência de nulidades da decisão recorrida. Salvo o devido respeito por opinião contrária, não se vislumbra que a decisão recorrida enferme das nulidades assinaladas pela recorrente”.
Ora, quanto à falta de fundamentação é pacífico entre nós que este vicio só existe quando a mesma for total ou absoluta. Sendo que o tribunal está obrigado a apreciar a pretensão da parte mas não todos os argumentos invocados pela mesma[1]. Logo, nos termos do art.615º, nº11, al.b), do CPC não ocorreu essa nulidade, tanto mais que a mesma deve ser interpretada, sob o prisma material, de garantia do exercício do direito de recurso, que neste caso foi totalmente realizado. Ou seja, se a parte leu, entendeu e recorreu da decisão é seguro que esta cumpriu a sua função e por isso não pode ser considerada nula.
Da contradição dos factos provados nº2 e 3.
Conforme salienta o MP na sua resposta não se vislumbra qualquer contradição entre os factos provados nºs 2 e 3. Basta dizer que apesar de incidirem sobre o mesmo crédito dizem respeito a realidades diferentes, sendo até que o facto nº 3 deriva do impulso processual da apelante. Logo não são contraditórios.
Acresce que a contradição não integra em rigor uma causa de nulidade da sentença, mas quando muito um erro de julgamento não integrável no art. 615º, do CPC.
Improcedem, pois, as duas questões prévias suscitadas.
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Da eventual nulidade derivada da utilização de elementos diferentes dos alegados pela Sra. Administradora.
Entre nós vigora o principio do dispositivo temperado pelo dever de oficiosidade, nos termos do qual (art. 5º, do CPC), o tribunal, além dos factos articulados pelas partes, deve ainda considerar:
a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa;
b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar;
c) Os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.[2]
Ora, essa norma legitima de forma mais do que suficiente a informação do Estado Dinamarquês que, recorde-se, foi solicitada após requerimento da própria apelante e consiste num esclarecimento do verdadeiro credor reclamante que é apenas representado pelo Estado Português, no mecanismo de assistência mútua em matéria de cobrança de créditos respeitantes a impostos.
Logo improcede a nulidade invocada.
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4. Motivação de facto A) Factos provados
1. Por sentença proferida em 16-09-2014 e transitada em julgado em 07-10-2014, foi declarada a insolvência de B….
2. Nos presentes autos de reclamação de créditos, a Sr.ª Administradora da Insolvência reconheceu os créditos da Fazenda Nacional, pelo valor de € 29.180,49, de natureza comum.
3. Dá-se por integralmente reproduzido o ofício da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) datado de 24-10-2018, incluindo os documentos que o acompanham. Oficiosamente e por constarem da tramitação processual considera-se ainda provado que:
4. O crédito objecto deste recurso foi objecto de um pedido de assistência interministerial proveniente da Dinamarca nos termos do qual o oficio que foi junto aos autos de reclamação de créditos, em 30.3.2017.
5. Após requerimento da insolvente foram pedidos esclarecimentos ao Estado Dinamarquês conforme oficio referido em 3)
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5. Motivação jurídica
Basicamente pretende a apelante que:
a) não existem os elementos do título executivo;
b) a verificação dos créditos põe em causa a sua recuperação económica, e
c) os créditos invocados estarão prescritos e, portanto, não podem ser verificados.
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As duas primeiras questões são simples de decidir.
O art. 25º regula as condições e elementos do título executivo [3].
A identificação da “data da constituição/origem/exigência da dívida” é feita de forma sumária e esse requisito formal visa apenas que o devedor possa identificar o crédito fiscal e querendo o vá impugnar no local próprio. In casu, conforme resulta dos factos provados essa exigência está mais do que preenchida e os elementos de identificação são suficientes para esse fim e por isso, está verificado o requisito formal exigido pelo artigo 25.º do DL 263/2012.
2. Quanto à segunda questão
Diremos apenas que, de facto, dispõe o art.10º, nº1, desse diploma que: “1 - As autoridades nacionais a que se refere o artigo 5.º não estão obrigadas a prestar a assistência à cobrança ou a adotar medidas cautelares a pedido das autoridades competentes de outros Estado-Membros, nos termos previstos na alínea c) do artigo 7.º, quando o devedor, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil e esteja abrangido por processo especial de recuperação, de natureza judicial ou extrajudicial, que, nos termos da legislação nacional, obste à prossecução de ações de cobrança contra aquele devedor”.
Ora, ao que parece a apelante está submetida a uma insolvência a qual visa, precisamente liquidar de forma universal o seu património para satisfazer todos os seus credores (art. 1º, nº1, do CIRE). Logo, se algo é certo nestes autos, é que apelante não está em “recuperação”.
Improcede, pois, esta questão.
3. Da apreciação dos limites, valores e decorrência do prazo de prescrição do crédito reclamado.
Essa questão terá de ser solucionada através da aplicação nestes autos do Decreto-Lei n.º 263/2012 que transpôs a Diretiva n.º 2010/24/UE, do Conselho, de 16 de março de 2010, relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos respeitantes a impostos, direitos e outras medidas.
Ora, o art. 11 desse diploma é claro ao dispor que:
“1 - As questões relativas aos prazos de prescrição são reguladas exclusivamente pelas disposições legislativas em vigor no Estado-Membro da autoridade requerente. 2 - Os atos de cobrança efetuados pela autoridade requerida, ou em seu nome, dando seguimento a um pedido de assistência, que tenham por efeito suspender, interromper ou prorrogar o prazo de prescrição nos termos da legislação em vigor no Estado-Membro requerido produzem o mesmo efeito no Estado-Membro requerente, desde que esteja previsto o efeito correspondente nas disposições legislativas em vigor neste último Estado. 3 - Quando a suspensão, interrupção ou prorrogação do prazo de prescrição não for possível nos termos das disposições legislativas em vigor no Estado-Membro requerido, os atos de cobrança de créditos efetuados pela autoridade requerida, ou em seu nome, dando seguimento a um pedido de assistência e que, se fossem efetuados pela autoridade requerente ou em seu nome no Estado-Membro requerente, teriam por efeito suspender, interromper ou prorrogar o prazo de prescrição nos termos das disposições legislativas em vigor no Estado-Membro requerente são consideradas, para esse efeito, como tendo sido praticadas neste último Estado. 4 - O disposto nos números anteriores não prejudica o direito de as autoridades competentes no Estado-Membro requerente tomarem medidas destinadas a suspender, interromper ou prorrogar o prazo de prescrição nos termos das disposições legislativas em vigor nesse Estado-Membro. 5 - A autoridade requerente e a autoridade requerida informam-se mutuamente de qualquer medida que interrompa, suspenda ou prorrogue o prazo de prescrição do crédito que tenha sido objeto de um pedido de cobrança ou de medidas cautelares, ou que possa produzir esse efeito”.
Depois, o art. 30 estabelece que: 1 - Cabe às autoridades nacionais a que se refere o artigo 5.º, de acordo com as competências legalmente definidas, a resolução de litígios relativos: a) Ao crédito, ao título executivo inicial e ao título executivo uniforme, nas situações previstas nos artigos 24.º e 25.º; b) À validade de uma notificação efetuada por uma autoridade nacional, ao abrigo do disposto no artigo 21.º; c) Aos procedimentos de execução da cobrança e de adoção de medidas cautelares efetuados pelas autoridades nacionais, ao abrigo do disposto nos artigos 23.º e 26.º 2 - Sendo apresentada por uma parte interessada, no decurso dos procedimentos de cobrança ou adoção de medidas cautelares solicitados às autoridades nacionais a que se refere o artigo 5.º, uma contestação do crédito, do título executivo inicial do Estado-Membro requerente ou do respetivo título executivo uniforme, aquelas informam a parte interessada em causa de que a ação deve ser por esta instaurada perante a instância competente do Estado-Membro requerente, nos termos das disposições legislativas em vigor nesse Estado. (…) (sublinhados nossos)
Ou seja, dessas normas decorre claramente que a competência nacional é limitada e diz respeito apenas, em regra, a questões formais relativas ao titulo executivo e que, pelo contrário, todas as questões suscitadas pela apelante devem ser apreciadas pela lei do Estado da Dinamarca e nas autoridades competentes desse país.
Note-se aliás que essa é uma posição pacífica e que já foi várias vezes apreciada entre nós.
Assim o Ac do STA de 7.1.2015, processo nº 01570/13[4], esclareceu que: “o TAF de Viseu apenas é competente para apreciar a questão da ilegitimidade substantiva do oponente que a configurou na petição inicial com fundamentos próprios cuja bondade importa apreciar sendo que no mais esgrime fundamentos de oposição cuja apreciação implica a análise de normas substantivas do ordenamento jurídico Alemão (caso da prescrição da dívida exequenda e da caducidade do direito à liquidação dos tributos que se pretendem cobrar através dos tribunais portugueses) ou invoca irregularidades da notificação da liquidação cujos termos não constam dos autos, pelo que nesta parte é incompetente o mesmo TAF para o seu conhecimento”.
Deste modo as questões colocadas pela apelante nas suas restantes alegações devem ser processualizadas não em Portugal, mas no país onde a dívida fiscal teve origem.
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3.2. Da aplicação do direito Europeu
A mesma solução seria encontrada, pela simples aplicação dos princípios de Direito Europeu através do princípio do primado do Direito Europeu.
Este é um princípio fundamental do direito europeu que foi afirmado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia[5] e que decorre do art. 8º da CRP.
Ora, a diretiva referida protege o credor e desenvolve mecanismos de assistência mútua à cobrança de créditos sem estarem excutidos todos os meios procedimentais e processuais tributários no Estado-Membro requerente.
Por causa disso, o TJUE no caso Milan Kyrian- Processo C-233/08 - de 14 de Janeiro de 2010 decidiu que: “No âmbito da assistência mútua instituída nos termos da Diretiva 76/308, conforme alterada pela Diretiva 2001/44, o destinatário de um título executivo deve, para poder invocar os seus direitos, receber a notificação deste título numa língua oficial do Estado-Membro onde a autoridade requerida tem a sua sede. Com o objetivo de garantir o respeito deste direito, cabe ao juiz nacional aplicar o seu direito nacional assegurando a plena eficácia do direito comunitário”.
O Ac do mesmo tribunal (Primeira Secção) de 14 de Janeiro de 2010 (pedido de decisão prejudicial do Nejvyšší správní soud - República Checa) - Milan Kyrian / Celní úřad Tábor (Processo C-233/08)[6], acentuou que “os órgãos jurisdicionais do Estado-Membro onde a autoridade requerida tem a sua sede não têm, em princípio, competência para verificar o carácter executório do título que permite a cobrança. Em contrapartida, na hipótese de ser interposto num órgão jurisdicional deste Estado-Membro um recurso contra a validade ou a regularidade das medidas de execução, como a notificação do título executivo, este órgão jurisdicional tem o poder de verificar se essas medidas foram regularmente efetuadas em conformidade com as disposições legislativas e regulamentares do referido Estado-Membro.”
Ou seja, a jurisprudência comunitária reafirma, também, que as questões suscitadas pela apelante não fazem parte da competência dos tribunais nacionais.
E que, recorde-se o objetivo da diretiva é precisamente suprimir obstáculos ao funcionamento do Mercado Comum que decorrem da dificuldade relacionada com a cobrança transfronteiriça de créditos, visando também impedir a realização de operações fraudulentas[7].
3.3. Conclusão
Podemos, portanto, concluir que a autoridade nacional pode e deve verificar apenas a existência de qualquer uma das circunstâncias que permitem a dispensa das obrigações, nos termos do disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei n. 263/2012. Não existindo os mesmos terá o órgão nacional de proceder à cobrança do crédito constante do título executivo que lhe é apresentado pelo Estado requerente.
Nestes termos a intervenção da CIAMMCC é um mero acto de verificação dos requisitos legalmente previstos para o efeito, que não permite sequer a apreciação da questão da prescrição ou não dos créditos dados à execução.
Improcedem, pois, as restantes conclusões aduzidas pela apelante.
6. Deliberação
Pelo exposto, este tribunal julga o presente recurso integralmente improcedente e por via disso confirma a decisão proferida no apenso de verificação e graduação de créditos.
Custas a cargo da apelante porque decaiu totalmente.
Porto em 11.3.2021
Paulo Duarte Teixeira
Amaral Ferreira
Deolinda Varão
______________ [1] Miguel Teixeira de Sousa, in Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, 1997, págs. 220 e 221.esclarece “... o tribunal não tem de se pronunciar sobre todas as considerações, razões ou argumentos apresentados pelas partes, desde que não deixe de apreciar os problemas fundamentais e necessários à decisão da causa. Nos mesmos termos Lebre de Freitas, et all in, Código de Processo Civil Anotado, 2.º, 2.ª edição, pág. 704 considera que “o tribunal (…) não (tem) de “considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito (artigo 511-1) as partes tenham deduzido…”. [2] No processo de insolvência, existe até um dever de oficiosidade acrescido já que o art. 11 do CIRE dispõe que “No processo de insolvência, embargos e incidente de qualificação de insolvência, a decisão do juiz pode ser fundada em factos que não tenham sido alegados pelas partes.”cfr. Decisão sumária da RC de 6.7.2014, nº 262/12.0T2AVR-K.C1 (Henrique Antunes). [3] Esta artigo dispõe que: 1 - Para efeitos do disposto na presente secção, os pedidos de cobrança de créditos devem ser acompanhados de um título executivo uniforme. 2 - O título executivo uniforme reflete o conteúdo essencial do título executivo inicial, não estando sujeito a nenhum ato de reconhecimento, completamento ou substituição no Estado-Membro requerido. 3 - O título executivo uniforme contem, pelo menos, os seguintes elementos: a) Informações relevantes para a identificação do título executivo inicial, com a descrição do crédito, da sua natureza, do período por ele abrangido e de todas as datas relevantes para o processo de execução, bem como o montante desse crédito e os seus diferentes componentes, designadamente, a parte referente a capital e juros vencidos; b) Nome e outros dados relevantes para a identificação do devedor; c) Nome, endereço e outros contactos da entidade responsável pela liquidação do crédito e, caso seja diferente, da entidade onde podem ser obtidas informações complementares sobre o crédito a cobrar ou sobre as possibilidades de contestação da obrigação de pagamento. 4 - Para além do título executivo uniforme, o pedido de cobrança pode ser acompanhado de outros documentos respeitantes ao crédito emitidos pela autoridade requerente. [4] Nos mesmos termos o Ac do STA de 19/01/2011, no processo 01043/10146; o Ac do TA SUL de 18.4.2018, processo nº 838/17.0BELRS ambos em www.dgsi.pt. [5] Caso Costa/Enel, procº 6/64 e acórdão de 5 de fevereiro de 1963, (caso Van Gend & Loos, procº 26/62). [6] Acedido em Fevereiro 2021, em língua portuguesa, e disponível em http://curia.europa.eu/juris/ document/document.jsf;jsessionid=9ea7d2dc30dd96492e512b9b422ba38efbd43f003897.e34K axiLc3qMb40Rch0SaxqTbxb0?text=&docid=83897&pageIndex=0&doclang=PT&mode=lst&dir =&occ=first &part =1&cid=364652. [7] Acs do TJUE de 7 de setembro de 2006, N. C-470/04; de 9 de novembro de 2006, Turpeinen, C-520/04, §C520/04; e de 30 de janeiro de 2007, Comissão vs Dinamarca, C-150/04