Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
CONDOMÍNIO
DELIBERAÇÃO DA ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
PRAZO DE CADUCIDADE
Sumário
I - O condómino, perante uma deliberação inválida ou ineficaz, que não mereça a sua aprovação, pode exercer três faculdades, ou seja, exigir do administrador a convocação de uma assembleia extraordinária, no prazo de dez dias, sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem, no prazo de trinta dias, ou propor uma acção judicial de anulação da deliberação, no prazo de sessenta dias, a partir da data da deliberação primitiva. II - A caducidade do direito de propositura da acção de anulação de deliberação, ocorre, no prazo de vinte dias contado sobre a deliberação da assembleia extraordinária ou, no caso de a mesma não ter sido solicitada, no prazo de sessenta dias (art.º 1433.º, n.º 4, do Cód. Civil), indistintamente, quer para os condóminos presentes, quer para os ausentes, a partir da data da deliberação, e não da data da respectiva comunicação ao condómino não presente. III - Tendo o condómino, que não se conformou com alguma deliberação da assembleia de condóminos, e solicitou a realização de uma assembleia extraordinária tendente à revogação das deliberações produzidas na assembleia primitiva, visto desatendido o seu pedido pelo administrador do condomínio que não a convocou no prazo de vinte dias, devia aquele condómino ter interposto recurso desse acto do administrador para a assembleia de condóminos (cfr. 1438.º do CCivil) por forma a ver atendido o seu pedido, abrindo-se depois o prazo de 20 dias para impugnar judicialmente a deliberação que seja confirmatória da anterior. IV - Não o tendo feito e tendo já sido ultrapassado o prazo de 60 dias estatuído no artigo 1433.º, nº 4 caducou o direito de propor a acção de anulação da deliberação, pois que não se pode retirar que do acto omissivo da não convocação da assembleia geral extraordinária houve uma confirmação tácita da deliberação anterior, dispondo o condómino a partir desse momento do prazo de 20 dias para impugnar judicialmente essa confirmação tácita.
Texto Integral
Processo nº 18299/19.7T8PRT.P1-Apelação
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto-Juízo Local Cível do Porto-J6 Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Miguel Baldaia
2º Adjunto Des. Jorge Seabra
Sumário:
………………………………
………………………………
………………………………
*
I-RELATÓRIO
Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B…, residente em …, …, …, Londres, …, Reino Unido propôs a presente acção comum de declaração contra C…; - D…; - E…; - F…; - G…; - H…; - I…; - J…; - K…; - L…; - M…; - N…; - O…; - P…; - Q…; - S…; - T…; - U…; - V…; - W…; - X…; - Y…; - Z…; - AB…; - AC…, todos representados no processo por AD…, Ld.ª com sede na Rua B…, nº …, 1º, Loja .., Matosinhos, pedindo que seja decretada a anulação das deliberações da assembleia geral dos condóminos AE…, tomadas na reunião do dia 22 de Março de 2019 e documentadas na ata n.º 22.
Para tanto alega, além do mais e em síntese, que a fracção autónoma “A” pertence a vários condóminos em compropriedade, representando um determinado valor relativo e os correspondentes votos; devendo corresponder um sentido unitário de voto. Conclui que nenhum dos comproprietários da fracção “A” tinha legitimidade para, nessa qualidade, votar na assembleia, dado que nenhum deles estava mandatado para aí representar o universo de proprietários da fracção. Em consequência a assembleia estava legalmente impedida de deliberar por falta de quórum. Mesmo que assim não se entendesse, as deliberações não obtiveram o mínimo de votos favoráveis para obter vencimento; as deliberações são inválidas e de nenhum efeito jurídico.
*
Os réus apresentaram contestação invocando, além do mais: a caducidade da acção, alegando que o Autor recebeu a acta da assembleia a 12 de agosto de 2019 e a acção não foi intentada no prazo de 60 dias a partir da data da deliberação; que é objectivamente impossível os comproprietários da fracção “A” reunirem no sentido de elegerem um representante da referida fracção, até porque se desconhece o paradeiro de alguns desses comproprietários. Assim, decidiram distribuir a permilagem da fracção A por todos os condóminos comproprietários da mesma, de modo a que todos pudessem participar nas deliberações.
*
O autor respondeu pugnando pela improcedência da excepção invocada uma vez que a acção foi proposta no dia 13 de Setembro de 2019 tendo a carta, contendo a acta da assembleia, sido recebida apenas a 12/08/2019.
*
Por os autos conterem todos os elementos factuais, o tribunal recorrido proferiu decisão que, julgado procedente por provada a excepção da caducidade, absolveu os Réus do pedido contra eles formulado.
*
Não se conformando com o assim decidido veio o Autor interpor o presente recurso rematando a respectiva alegação com as seguintes conclusões:
………………………………
………………………………
………………………………
*
Não foram apresentadas contra-alegações.
*
Corridos os vistos legais cumpre decidir.
*
II- FUNDAMENTOS
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
*
No seguimento desta orientação é apenas uma a questão que importa apreciar e decidir: a)- saber se se verifica, ou não, a excepção de caducidade do direito do autor propor acção de anulação das deliberações tomadas na assembleia geral dos condóminos AE… em 22 de Março de 2019.
*
A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
É a seguinte a matéria de facto que vem dada como provado pelo tribunal recorrido:[1]
A) O prédio urbano denominado “AE…”, sito no ângulo formado pela rua …, n.ºs …, …, … e … e pela rua …, n.ºs .., .., .. e .., na freguesia …, município e cidade do Porto, inscrito na matriz predial urbana da dita freguesia sob o artigo 11143 e descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto com o n.º 301/19860708, em regime de propriedade horizontal, é constituído por cento e nove (109) fracções autónomas identificadas pelas letras “A” a “DR” (artigo 1.º da petição inicial-matéria aceite).
B) A fracção “A” situa-se na cave do edifício e é uma zona ampla destinada a garagem (artigo 2.º da petição inicial-matéria aceite).
C) Desde o dia 22 de maio de 2018 que o administrador do prédio é a AF…, a qual pertence à AD…, Ld.ª (artigo 3.º da petição inicial-matéria aceite).
D) O autor é dono e legítimo possuidor da fracção autónoma “CV” e comproprietário da fracção autónoma A com a quota-parte de um/cem avos, ambos do referido imóvel, tendo a seu favor as inscrições de propriedade G-3 e G-91, respectivamente, na Conservatória do Registo Predial do Porto (docs. 1 e 2) (artigo 4.º da petição inicial-matéria aceite).
E) A fracção “CV” tem o valor relativo de doze por mil (12‰) do valor total do prédio –permilagem, enquanto a fracção “A” tem o valor de 200 por mil (200 ‰) (artigo 5.º da petição inicial–matéria aceite).
F) Por sua vez os réus são proprietários e comproprietários de algumas das fracções autónomas do mesmo prédio da forma que se segue: a) O primeiro réu é proprietário da fracção “BL” com a permilagem de três (3‰); b) O segundo réu é proprietário da fracção “G “com a permilagem de três (3‰); c) O terceiro réu é proprietário da fracção “CA” com a permilagem de doze (12‰) e comproprietário da fracção A, com a quota de 1/200 (0,5/100); d) O quarto réu é proprietário da fracção “DE” com a permilagem de oito (8‰) e comproprietário da fracção A, com a quota de 1/100; e) O quinto réu é proprietário da fracção “DA”, com a permilagem de oito (8‰); f) O sexto réu é proprietário da fracção “CL” com a permilagem de quinze (15‰) e comproprietário da fracção “A”, com a quota de 1/100; g) O sétimo réu é proprietário da fracção “AJ” com a permilagem de oito (8‰); da fracção “AL” com a permilagem de cinco (5‰) e da fracção “AM” com a permilagem de cinco (5‰); h) O oitavo réu é comproprietário da fracção “A”, com a quota de 1/100; i) O nono réu é proprietário da fracção DF com a permilagem de catorze (14‰) e comproprietário da fracção “A” com a quota de 1/100. j) O décimo réu é proprietário da fracção “AA”, com a permilagem de três (3‰) e comproprietário da fracção A, com a quota de 1/100; k) O décimo primeiro réu é proprietário da fracção CB com a permilagem de catorze (14‰) e comproprietário da fracção A, com a quota de 1/100; l) O décimo segundo réu é comproprietário da fracção A, com a quota de 1/100; m) O décimo terceiro réu é proprietário da fracção BI com a permilagem de 4 (4‰); n) O décimo quarto réu é proprietário da fracção “CCJ”, com a permilagem de dezoito (18‰) e comproprietário da fracção A, com a quota de 1/100; o) O décimo quinto réu é proprietário da fracção DH com a permilagem de dezanove (19‰) e comproprietário da fracção A, com a quota de 2/100; p) O décimo sexto réu é proprietário da fracção DO, com a permilagem de dez (10‰) e comproprietário da fracção A com a quota de 2/100; q) O décimo sétimo réu é proprietário da fracção “BG” com a permilagem de cinco (5‰); r) O décimo oitavo réu é proprietário da fracção “DG” com a permilagem de dez (10‰) e comproprietário da fracção A, com a quota de 2/100; s) O décimo nono réu é proprietário da fracção “CS”, com a permilagem de quinze (15‰) e comproprietário da fracção “A” com a quota de 1/100; t) O vigésimo réu é proprietário da fracção “DQ” com a permilagem de catorze (14‰) e comproprietário da fracção A, com a quota de 1/100; u) O vigésimo primeiro réu é proprietário da fracção “AB” com a permilagem de quatro (4‰); v) O vigésimo segundo réu é proprietário da fracção “DN” com a permilagem de catorze (14‰) e comproprietário da fracção “A”, com a quota de 2/100; w) O vigésimo terceiro réu é proprietário da fracção “DI” com a permilagem de oito (8‰); x) O vigésimo quarto réu é proprietário da fracção “AE” com a permilagem de onze (11‰); y) O vigésimo quinto réu é proprietário da fracção “DJ” com a permilagem de catorze (14‰) e comproprietário da fracção “A”, com a quota de 2/100 (doc.s 2 e 3) (artigo 6.º da petição inicial; matéria aceite).
G) No dia 22 de Março de 2019, pelas 21 horas, em segunda convocação, realizou-se a assembleia de condóminos ordinária do prédio, convocada pelo administrador, com a seguinte ordem de trabalhos: Ponto 1–Análise, discussão e deliberação sobre o relatório de contas relativo ao período de exercício de 1-06-2018 a 31-12-2018; Ponto 2–Eleição da Administração do Condomínio para o exercício do ano de 2019; Ponto 3–Análise, discussão e deliberação do orçamento para o exercício de 2019; Ponto 4–Deliberação de cobrança judicial das contribuições e despesas com serviços de interesse comum em dívida ao condomínio; Ponto 5 – Deliberação para propositura de outras acções judiciais, designadamente, acção de prestação de contas contra a anterior administração; Ponto 6–Análise, discussão e deliberação de orçamentos para aprovação das seguintes intervenções e obras no edifício: a) Instalação de vídeo porteiro com e sem monitor, para as três entradas do edifício; b) Instalação dos aparelhos de ar condicionado com plano para o efeito; c) Elaboração do plano de segurança para o edifício, incluindo colocação de plantas com planos de fuga; d) Reparação da junta de dilatação do terraço/garagem; e) Reparação das fissuras que deram origem às infiltrações na fachada principal do edifício; f) Substituição das fixações dos tubos de queda de água na torre; g) Substituição das almofadas metálicas na caixilharia exterior dos escritórios; h) Reparação e substituição de degraus de escada e muretes no exterior do edifício; i) Reparação e substituição de tubos “guarda corpos” em terraços e varandas; j) Montagem de barra antipânico na porta de homem na garagem; k) Retirada das lajetas em toda a área envolvente do edifício, lavagem da zona, limpeza das caixas receptoras das águas pluviais, incluindo a tubagem de escoamento das águas pluviais na fachada principal do edifício; Ponto 7–Assuntos de interesse geral (doc. 3) (artigo 7.º da petição inicial–matéria aceite).
H) O autor não esteve presente, nem representado nessa assembleia de condóminos (doc. 3) (artigo 8.º da petição inicial–matéria aceite).
I) Após a Constituição da Mesa da assembleia, deu-se início à reunião com a presença de todos os réus por si ou representados (doc. 3–artigo 9.º da petição inicial–matéria aceite).
J) O presidente da mesa e os condóminos presentes ou representados consideraram que estava assegurado o valor de trezentos e nove por mil (309‰) do valor total do prédio – ou 30,9% como é escrito na ata e que a assembleia tinha quórum deliberativo (artigo 10.º da petição inicial; doc. 3–matéria aceite).
L) Para tanto, atribuíram uma determinada permilagem, ou seja, um determinado número de votos a cada um dos comproprietários da fracção autónoma A, que compareceram ou estiveram representados na assembleia, obtendo-se deste modo uma permilagem global de quarenta e quatro (44‰) para esses comproprietários, distribuída da seguinte forma: Para a ré E…–4 ‰ (quatro votos); Para a ré F… - 2‰ (dois votos); Para o réu H…-2‰ (dois votos); Para o réu J… Vieira-2‰ (dois votos); Para a ré K…-2‰ (dois votos); Para o réu L…-2‰ (dois votos); Para o réu M…-2‰ (dois votos); Para o réu N… - 2‰ (dois votos); Para a ré P…-2‰ (dois votos); Para a ré Q…-4‰ (quatro votos); Para a ré S…-4‰ (quatro votos); Para a ré U…-4‰ (quatro votos); Para a ré V…-2‰ (dois votos); Para a ré W…-2‰ (dois votos); Para a ré Y… -4‰ (quatro votos); Para o réu AC… - 4‰ (quatro votos); (artigo 11.º da petição inicial; doc. 3–matéria aceite).
M) Totalizando duzentos e oitenta e oito por mil (288%o ou 28% e não 30,9%, como consta da ata (artigo 12.º da petição inicial–matéria aceite).
N) Da ordem de trabalhos, a assembleia debateu e deliberou sobre os dois primeiros pontos - relatório de contas do exercício de 1-06-2018 a 31-12-2018 e eleição do administrador para o ano de 2019 (artigo 13.º da petição inicial–matéria aceite).
O) O relatório de contas elativo ao período de exercício de 1-06-2018 a 31-12-2018 apresentado pela empresa administradora do condomínio foi votado da seguinte forma: Abstiveram-se de votar os réus identificados em 2.º, 8.º, 15.º e 18.º, ou seja, os condóminos D…, J…, Q… e U…, respectivamente;
Votaram contra a aprovação do relatório de contas os réus identificados em 5.º, 6.º, 11.º, 12.º, 20.º e 22.º, ou seja, os condóminos G…, H…, M…, N…, W… e Y…, respectivamente; Votaram a favor da aprovação do relatório de contas os restantes réus, ou seja, os condóminos C…, E…, F…, K…, L…; O…, P…, S…; T…, V…, X…, Z…, AB… e AC… (artigo 14.º da petição inicial–matéria aceite).
P) Apesar desta votação a assembleia deliberou aprovar o referido relatório de contas por ter sido aprovado “pela maioria dos presentes” (artigo 15.º da petição inicial – matéria aceite).
Q) Sobre o ponto 2 da ordem de trabalhos–eleição do administrador do condomínio para o exercício do ano de 2019–a votação foi a seguinte: Votaram contra a eleição do administrador os réus identificados em 6.º, 12.º, 15.º, 20.º e 22.º, ou seja, H…, N…, Q…, W… e Y…, respectivamente: Abstiveram-se de votar os réus identificados em 2.°, 8.° e 11.°, ou seja, os condóminos D…, J… e M…, respectivamente; Votaram a favor da eleição do administrador os restantes réus, ou seja, os condóminos C…, E…, F…, G…, I…, K…, L…, O…, P…, S…, T…, U…, V…, X…, Z…, AB… e AC… (artigo 16.º da petição inicial–matéria aceite).
R) Apesar desta votação a assembleia deliberou aprovar a reeleição da AF…, como empresa administradora do condomínio para o ano de 2019, por ter sido eleita pela maioria dos presentes (artigo 17.º da petição inicial–matéria aceite).
S) O autor teve conhecimento das deliberações no dia 12 de agosto de 2019 (v. artigo 18.º da petição inicial e 6.º da contestação).
T) A administração de condomínio não convocou a solicitada assembleia extraordinária (facto admitido artigo 11.º da contestação).
U) Por carta registada a 13-09-2019, foi remetida a juízo a petição inicial (artigo 2.º da resposta, doc. 1–não impugnado).
*
Mostram-se, ainda, assentes, por acordo das partes e por documento os seguintes factos que se aditam, nos termos dos artigos 607.º, n.ºs 3 e 4, e 662.º, n.º 1, do CPCivil:
W)- No dia catorze de Agosto de dois mil e dezanove (14-08-2019), o A., através do seu representante, enviou ao legal representante da empresa administradora do condomínio uma carta registada, contendo um requerimento a exigir-lhe a convocação de uma assembleia de condóminos extraordinária, para revogação das deliberações (cópia da carta que se junta e se dá como reproduzida para os devidos efeitos legais- Doc. 5)
X)- Nesse mesmo dia, por correio electrónico, o A. deu conhecimento à empresa administradora da remessa dessa carta, anexando ao e-mail cópia do dito requerimento. (Doc. 6)
Y) Essa carta chegou ao seu destino no dia dezasseis (16) seguinte, tendo sido depositada na caixa do correio do destinatário, por volta das 14,44 horas desse dia (Doc. 7).
Z)- Na tarde do dia 27 de Março de 2019, o representante do autor recebeu um e-mail, enviado pela Senhora funcionária da empresa administradora do condomínio ("AF…"), do seguinte teor: “Boa tarde. Exmo. Sr., Segue em anexo, o aviso de cobrança. Atenciosamente, AH…” (Doc. n.° 2).
AA)- Como o autor e o seu representante desconheciam por completo o que ocorrera na convocada reunião da assembleia de condóminos do dia 22 de Março de 2019, designadamente se tinha sido aprovado ou não o orçamento para esse ano, no dia 2 de Abril de 2019, em resposta a esse e-mail, o representante do autor solicitou, por essa mesma via, que lhe fosse enviada uma cópia da acta da dita reunião (Doc. n.° 3).
BB)- Em resposta, nesse mesmo dia, pelas 14,20 horas, a Senhora funcionária da "AF…" informou, por e-mail, que a assembleia de condóminos estava suspensa e que a acta ainda não tinha sido redigida (Doc. n.° 3-verso).
CC)- Ainda nesse dia 2 de Abril, pelas 14,42 horas, também por e-mail, o sócio gerente da sociedade administradora do condomínio-Senhor AG…-veio dar conhecimento aos condóminos que a assembleia tinha ficado suspensa, após aprovação dos pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos, e que a continuação da mesma estava agendada para o dia 17 de Abril seguinte (Doc. n.° 4).
DD)- O autor, através do seu representante, no dia 4 de Abril de 2019, enviou ao referido AG… uma carta registada, na qual, além do mais, exigiu que lhe fosse disponibilizada, com a maior urgência, a acta da assembleia de condóminos realizada em 22 de Março de 2019, com as deliberações que aí tinham sido tomadas, para poder exercer os seus direitos na qualidade de condómino, justificando as razões de tal exigência e a urgência do pedido (Doc. n.° 5, que se junta e se dá por reproduzido para todos os efeitos legais).
EE)- Esta carta foi recebida pelo destinatário no dia seguinte ao do seu envio-05-04-2019 (Doc. n.° 6).
*
III. O DIREITO
Como supra se referiu é apenas uma a questão que importa apreciar e decidir: a)- saber se se verifica, ou não, a excepção de caducidade do direito do autor propor acção de anulação das deliberações tomadas na assembleia geral dos AE… em 22 de Março de 2019.
Como se evidencia da decisão recorrida aí se julgou procedente por provada a excepção de caducidade do direito de acção, por se ter considerado que à deliberação tomada na AG de na reunião do dia 22 de Março de 2019 se aplicava o disposto no n.º 4 do artigo 1433.º do Código Civil e que, consequentemente, deveria o Autor apelante ter proposto a acção de anulação da referida deliberação no prazo de 60 dias após a data da sua aprovação, o que não aconteceu por a acção ter dado entrada apenas em 13/09/2019.
Do assim decidido dissente o Autor recorrente por entender que dispunha do prazo de 20 dias para propor a acção, contados desde o termo do prazo imposto ao Administrador para convocar a assembleia geral extraordinária e que não ofez. Quid iuris?
Salvo o devido respeito por diferente opinião, não podemos sufragar o entendimento propugnado pelo Autor recorrente.
Analisando.
Preceitua artigo 1433.º do Código Civil sob a epígrafe “Impugnação das deliberações” na redacção que lhe foi dada pelo DL 267/94, de 25 de Outubro, que:
“1- As deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado. 2- No prazo de 10 dias contado da deliberação, para os condóminos presentes, ou contado da sua comunicação, para os condóminos ausentes, pode ser exigida ao administrador a convocação de uma assembleia extraordinária, a ter lugar no prazo de 20 dias, para revogação das deliberações inválidas ou ineficazes. 3- No prazo de 30 dias contado nos termos do número anterior, pode qualquer condómino sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem. 4- O direito de propor a acção de anulação caduca no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária ou, caso esta não tenha sido solicitada, no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação. 5- Pode também ser requerida a suspensão das deliberações nos termos da lei do processo. 6- A representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as acções compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito.”
Antes da referida alteração introduzida pelo citado DL, o n.º 2 do artigo 1433,º estatuía: “O direito de propor a acção caduca, quanto aos condóminos presentes, no prazo de vinte dias a contar da deliberação e, quanto aos proprietários ausentes, no mesmo prazo a contar da comunicação da deliberação”.
Ora, fazendo a concatenação das duas norma fácil é perceber que a nova lei, por um lado, alongou o prazo de caducidade para 60 dias, e, por outro, no que se refere ao início da sua contagem, fê-lo coincidir com a data da deliberação, sem qualquer distinção entre condóminos presentes e condóminos ausentes.
A questão que agora importa dilucidar é se a interpretação da actual norma do artigo 1433.º tem de ser articulada com o que preceitua o n.º 6 do artigo 1432.º do mesmo diploma que estatui que: “as deliberações têm de ser comunicadas a todos os condóminos ausentes, por carta registada com aviso de recepção, no prazo de 30 dias”.
Para Sandra Passinhas[2] a comunicação das deliberações é instrumental do exercício do direito de impugnação. Defende por isso que, no caso de não ter sido solicitada assembleia extraordinária, o prazo de 60 dias conta-se a partir da data da deliberação, para os condóminos presentes, e da data da sua comunicação, para os condóminos ausentes. A não comunicação ou a comunicação tardia não torna a deliberação inválida ou ineficaz; apenas faz adiar o termo do prazo para uma possível impugnação.[3]/[4]
Não aderimos, porém, a este entendimento.
E não aderimos porque ele não tem qualquer respaldo na redacção do artigo 1433.º dada pelo DL 267/94, de 25 de Outubro que, de forma deliberada, não quis manter a versão anterior quanto à forma de contagem dos prazos de caducidade do direito de acção.
Na verdade, se fosse para manter a mesma forma de contagem dos referidos prazos de caducidade, não se vê, então, porque não manter a mesma redacção do nº 2 do artigo 1433.º.
Dir-se-á: não se manteve a mesma redacção do preceito porque o entendimento que o prazo de 60 dias para propor a acção de anulação das deliberações para o condómino não presente a contar da comunicação da deliberação anulanda já decorre do nº 6 do artigo 1432.º e do artigo 329.º do Código Civil, segundo o qual o prazo de caducidade apenas pode começar a contar quando o direito puder ser legalmente exercido.
Não cremos, respeitando-se entendimento diverso, que assim seja.
A comunicação referida no citado artigo 1432.º, nº 6 tem relevância apenas para os casos de o impugnante optar pela convocação de uma assembleia extraordinária (nº 2 do artigo 1433.º), ou sujeição da deliberação a um centro de arbitragem (nº 3 do mesmo preceito), em que os prazos aí referidos se contam desde a data da comunicação da deliberação anulanda ao condómino não presente, ou seja, a comunicação imposta pelo artigo 1432.º, nº 6 apenas assume relevância nos dois referidos casos.
Todavia, a referida comunicação embora deva sempre ocorrer, ela já não assume relevo na contagem do prazo para a instauração da acção directa de impugnação, a qual está sujeita apenas à estatuição do nº 4 do mencionado artigo 1433.º.
E esta interpretação em nada colide com o artigo 329.º do CCivil, já que a lei fixou aqui outra data para o exercício da acção directa de impugnação da deliberação:
a)- 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária;
ou, caso esta não tenha sido solicitada
b)- 60 dias sobre a data da deliberação.
E contra isso não se argumente que outra solução impede o condómino ausente de saber qual a deliberação tomada, ou mesmo se alguma foi tomada, pois que bastaria ao administrador nunca lho dizer, ou comunicar-lha expirados os 60 dias do prazo para a acção de anulação.
É que o direito do condómino ausente não fica sem tutela jurídica, e, mesmo judicial, quando já tenha decorrido o referido prazo de 60 dias, após a data de deliberação anulanda sem que ele tenha tomado conhecimento da mesma por ainda não lhe ter sido comunicada.
Na verdade, só após a referida comunicação da deliberação que se pretende impugnar é que se abre o prazo de 20 dias para o condómino exigir ao administrador a convocação de uma assembleia extraordinária ou, querendo optar pela via alternativa, o prazo de 30 dias para sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem, sendo que, no caso de optar pela primeira via sempre a deliberação aí tomada e confirmatória da anterior pode ser anulada por via judicial, e, optando pelo recurso a um centro de arbitragem, a decisão arbitral terá, sem mais, a força e produzirá os efeitos de uma decisão judicial (artigo 42.º, n.º 7, da Lei n.º 63/2011, de 14/12).
Portanto, a caducidade do direito de propositura da acção de anulação de deliberação, ocorre, no prazo de vinte dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária ou, no caso de a mesma não ter sido solicitada, no prazo de sessenta dias (art.º 1433.º, n.º 4, do Cód. Civil), indistintamente, quer para os condóminos presentes, quer para os ausentes, a partir da data da deliberação, e não da data da respectiva comunicação ao condómino não presente.[5]
Evidentemente que se poderá obtemperar com a falta de coerência interna do sistema face ao tratamento diferenciado de condóminos presentes e ausentes, quanto ao início da contagem do prazo de 60 dias para a propositura da acção de anulação da deliberação, tendo particularmente em conta a obrigatoriedade de comunicação das deliberações aos que não estiverem presentes na assembleia.
Repare-se, porém, que ao condómino que opta por não estar presente na assembleia deliberativa de forma voluntária ou mesmo por impossibilidade, a lei terá querido impor-lhe, sem o dizer, um ónus na recolha da informação sobre se a assembleia de condóminos ocorreu e quais as deliberações tomadas para, se o desejar, poder impugná-las no prazo de 60 dias estabelecido na lei, ou seja, haverá aqui um dever adstringente imposto ao condómino não presente que o põe em paridade com condómino presente no que respeita ao prazo de impugnação judicial das deliberações tomadas em assembleia, por forma a impedir ou protelar a validade ou eficácia de deliberações que foram tomadas.
E o que acontece se o condómino solicitou a realização da assembleia geral extraordinária e ela não ocorre por culpa exclusiva do administrador?
Diz o recorrente que nessa situação começa a correr o prazo de 20 dias para propor a acção contados desde o termo do prazo imposto ao Administrador para convocar a assembleia geral extraordinária.
Não se pode, salvo o devido respeito, sufragar este entendimento.
Perante a não convocação por parte do administrador da assembleia geral extraordinária, o Autor recorrente teria de ter recorrido desse acto para a assembleia de condóminos, ao abrigo do estatuído no artigo 1438.° do CCivil.
E contra isso não se argumente com as dificuldades logísticas ou de quórum deliberativo como o faz o recorrente, pois que esse é o procedimento que consta da lei para tais situações.
O que não pode é, a pretexto dessas alegadas dificuldades, o recorrente querer contornar o texto da lei e pretender que, nesse caso, o prazo de 20 dias para a impugnação da deliberação se conta a partir do termo do prazo imposto ao Administrador para convocar a assembleia geral extraordinária, ficcionando-se que, por omissão e tacitamente, a assembleia extraordinária manteve a deliberação impugnada.
Mas não é assim, esse prazo de 20 dias conta-se a partir da data da deliberação da assembleia extraordinária que manteve a deliberação (sendo revogatória não há fundamento para a intervenção judicial, como é evidente), não se podendo concluir que existe formação de acto tácito confirmatório da deliberação no caso de o administrador não convocar a assembleia geral extraordinária.
Com efeito a lei não prevê aqui a formação de qualquer acto tácito no sentido propugnado pelo recorrente, antes pressupõe a existência de uma deliberação, tomada em assembleia geral extraordinária convocada para o efeito, confirmatória ou revogatória de deliberação anterior.
Evidentemente que, para o caso de o administrador não convocar a assembleia geral extraordinária e o condómino recorra desse acto, o referido prazo conta-se a partir do momento em que seja também confirmada a deliberação anulanda em assembleia geral extraordinária convocada para esse feito e por decorrência do referido recurso.
*
Aqui chegados e não tendo o Autor recorrente optado pelo recurso do acto omissivo da não convocação por parte do administrador da assembleia geral extraordinária, torna-se evidente que, quando intentou a presente acção, há muito de havia decorrido o prazo de 60 dias sobre a data da deliberação verificando-se, como se decidiu, a caducidade da acção.
*
Improcedem, assim, as conclusões XIV a XXV formuladas pelo recorrente e, com elas, o respectivo recurso.
*
IV-DECISÃO Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta improcedente por não provada e consequentemente confirmar a decisão recorrida.
*
Custas pelo Autor apelante (artigo 527.º nº 1 do C.P.Civil).
*
Porto, 23 de Novembro de 2020.
Manuel Domingos Fernandes
Miguel Baldaia de Morais
Jorge Seabra
____________ [1] Já com as correcções solicitadas pelo Autor recorrente, as quais podem ser feitas por esta Relação por se tratarem de simples inexactidões (cfr. artigo 614.º do CPCivil). [2] In A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Industrial”, 2ª edição, página 249. [3] Idem, nota 641, página 259. [4] In Propriedade Horizontal”, 2ª edição, páginas 186/187 e, entre outros, o acórdão do STJ de 21/01/2003, in www.dgsi.pt. [5] Neste sentido cfr. entre outros, os mais recentes, Ac. do STJ de 19/06/2019 e da Relação de Lisboa de 14/05/2020 amos em www.dgsi.pt.