DESPEDIMENTO
JUSTA CAUSA
Sumário


1. O diretor de uma agência bancária que no local de trabalho, à frente de  trabalhadoras suas subordinadas, referiu-se ao Diretor Comercial, seu superior hierárquico, como «Aquele boi grande e gordo», e que na mesma ocasião aproximou-se de uma dessas trabalhadoras, colocou as suas mãos na cabeça desta e direcionou-a para junto do seu rosto, como se tivesse a intenção de lhe dizer um segredo, aproximou a boca do ouvido daquela e, mantendo o tom de voz elevado, disse-lhe: «Estás armada em grande vaca?», assumiu um comportamento  intolerável ofensivo da  dignidade de qualquer ser humano de acordo com o nosso padrão de civilização.
2. Os factos descritos violam, gravemente,  o dever de respeito consagrado no art.º 128.º,  n.º 1, alínea a) do Código do Trabalho, bem como o Código Geral de Conduta, estabelecido pela R., pelo que este comportamento assumiu uma gravidade tal que quebrou a relação de confiança que preside ao contrato de trabalho, não sendo exigível a um empregador razoável a manutenção desse contrato que deve assentar numa base de confiança recíproca entre as partes.

Chambel Mourisco (relator)

Texto Integral


Processo n.º 3213/18.5T8VNG.P1.S1 (Revista) - 4ª Secção

            CM/PF/JF

           Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:



                                                           I

 

 1. AA intentou ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, contra Banco Santander Totta, S.A., requerendo que seja declarada a ilicitude ou irregularidade do despedimento, com as legais consequências.

A R. apresentou articulado a motivar o despedimento alegando que no dia 20 de novembro de 2017, na presença de outros funcionários da agência da qual era o diretor, o A. teceu comentários depreciativos e ofensivos relativamente a um seu superior hierárquico, após o que faltou ao respeito a uma sua subordinada, à qual, depois de a agarrar, dirigiu comentários inapropriados. Que tais comportamentos violam o código de conduta da empregadora e acarretaram a perda de confiança da mesma no trabalhador e, em consequência, a eventual reintegração do trabalhador se afigura altamente nociva e prejudicial.

Concluiu, pedindo que deverá considerar-se válido e lícito o despedimento do A., devendo, em consequência, a ação ser julgada totalmente improcedente.

Caso assim não se entenda e o A. opte pela reintegração, que seja julgada procedente a oposição à reintegração deduzida, com as legais consequências.

2. O A. contestou, por exceção e impugnação e deduziu reconvenção, nos termos que constam a fls. 184 e ss., invocando a ilicitude do procedimento disciplinar, por falta de delegação do poder disciplinar, o que conduz à inexistência da nota de culpa.

Impugnou parcialmente os fatos alegados pela empregadora, defendendo que os atos por ele praticados não são suscetíveis de consubstanciar justa causa para o despedimento e pugnou pela inadmissibilidade do pedido de exclusão da reintegração formulado por aquela.

Alegou, em síntese, que sofreu danos não patrimoniais em consequência do despedimento e que a empregadora deduziu pretensão cuja falta de fundamento não ignorava.

Termina pedindo que deverá:

a) Ser declarado inválido o processo disciplinar e, por isso, ilícito o respetivo despedimento. Caso assim não se entenda,

b) Ser declarado ilícito o despedimento por inexistência de justa causa e, em consequência, ser o Trabalhador reintegrado no seu posto de trabalho, com a retribuição e categoria profissional que detinha à data do despedimento;

c) Ser ainda a R. condenada a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à decisão final do processo que vier a ser proferida, retribuição essa a fixar mediante os recibos de vencimento que a empregadora vier a juntar aos autos, mas que, em momento algum, poderá ser inferior ao montante de 6 401,53€.

Em reconvenção, deve a R. ser condenada:

d) a pagar-lhe uma indemnização, por danos não patrimoniais, equivalente à quantia de  € 20 000,00;

e) ser a R. condenada como  litigante de má fé e, consequentemente, ao pagamento de € 10 000,00, a título de indemnização ao A. pelos prejuízos causados com a presente demanda,

Em via alternativa, caso venha a proceder o pedido de oposição à reintegração – o que não se concede, deve-se:

f) condenar a R. a pagar-lhe uma indemnização igual a 60 dias de retribuição por cada ano de antiguidade, dada a manifesta ausência de justa causa para despedimento que a R. não ignora;

g) condenar a R. a pagar ao A. as contribuições pagas em nome deste e ao longo da relação de trabalho, para o plano complementar de pensão previsto no artigo 93º do acordo coletivo de trabalho, sendo que, caso a R. não comunique tal quantia aos autos com demonstração documental, deve o tribunal fixar em montante igual a 3% de todas as retribuições que o A. auferiu ao serviço da R., desde a admissão até à data do despedimento.

3. Respondeu a Ré/empregadora, nos termos que constam a fls. 224 e ss., refutando o padecimento de qualquer vício ou invalidade do procedimento disciplinar e impugnando a totalidade dos factos da reconvenção.

Termina pedindo que deve:

a) ser julgada improcedente a exceção arguida pelo A. e, em consequência, ser confirmada a licitude do seu despedimento;

b) ser julgado improcedente, por não provado, o pedido reconvencional deduzido pelo A., com as legais consequências;

c) ser julgado improcedente, por não provado e infundado, o pedido de condenação do R. como litigante de má-fé, absolvendo-o do pedido de pagamento de multa e/ou indemnização.

No mais, concluindo como no articulado motivador do despedimento.

4. Realizou-se a audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que decidiu:

“Nestes termos e com tais fundamentos, julgo a presente ação parcialmente procedente, em consequência do que:

a) Declaro ilícito o despedimento do Trabalhador;

b) Condeno a Empregadora a:

1) Reintegrar o Trabalhador no seu posto de trabalho, com a retribuição e categoria profissional que detinha à data do despedimento;

2) Pagar ao Trabalhador todas as retribuições que este deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da presente sentença (designadamente 2 142,23 €/mês, a título de retribuição base; 9,17 €/dia, a título de subsídio de almoço; 1 082,67 €/mês, a título de isenção de horário de trabalho; 207,10€/mês, a título de diuturnidades; 620,71 €/mês, a título de complemento; 758,67 €/mês, a título de compensação por afetação ao regime geral da Segurança Social; bem como as quantias que se vierem a determinar em sede de incidente de liquidação posterior, relativas ao valor de utilização para fins pessoais do veículo automóvel; e ao valor do seguro de saúde); deduzidas do montante global que o mesmo venha a entretanto a receber, a título de subsídio de desemprego;

c) Restituir à Segurança Social a quantia global que esta Entidade vier a pagar ao Trabalhador, a título de subsídio de desemprego.

5. Inconformada a R. interpôs recurso de apelação, tendo o A., nas suas alegações de resposta, requerido a ampliação do recurso interposto e, ainda, interposto recurso subordinado.

6. No Tribunal da Relação o coletivo dos Juízes decidiu, por maioria, julgar:

- O Recurso da Empregadora, totalmente improcedente.

- Improcedente o objeto da requerida ampliação do âmbito do recurso suscitada pelo Autor.

- O Recurso subordinado do A./trabalhador totalmente improcedente.

7. Inconformada com esta decisão,  a R. interpôs recurso de revista, tendo formulado as seguintes conclusões:

«A. Vem o presente recurso interposto do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, que julgou improcedente o recurso interposto pelo R., e ora recorrente, tendo mantido, na íntegra, a sentença proferida pelo Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia, J1, que julgou a ação parcialmente procedente, tendo declarado a ilicitude do despedimento do A., por justa causa.

O R., ora Recorrente, não se conforma com tal decisão, porquanto se encontra seguro que o despedimento do A., ora Recorrido, reveste plena licitude, por se encontrar suportado numa efetiva justa causa subjetiva, razão pela qual interpõe o presente recurso de revista, ao abrigo do art.º 671.º, n.º 1, do CPC.

Apesar de o acórdão recorrido ter confirmado a decisão proferida pelo tribunal de primeira instância, foi proferido voto de vencido por uma das Exmas. Senhoras Desembargadoras, pelo que não se verifica a dupla conforme impeditiva da admissibilidade do recurso de revista a que alude o n.º 3 do artigo 671.º, do CPC.

B. Tanto o tribunal de primeira instância, como o Tribunal da Relação do Porto não têm quaisquer dúvidas em afirmar que o A. adotou uma conduta ilícita, assente na violação do dever jus laboral de respeito, a qual configura uma infração disciplinar, que recorde-se, assenta na prática dos factos que se resumem de seguida (i) no dia 20 de novembro de2017, após a reunião semanal da equipa do Balcão de Gaia/ Câmara, a trabalhadora BB- subordinada hierárquica do A. -, cruzou-se com o trabalhador CC(que desconhecia e que à data se encontrava afeto a um outro balcão do R.); (ii) CC ter-se-ia dirigido ao Balcão de Gaia / Câmara para se encontrar com o Diretor Comercial, DD, facto que não era naquele momento do conhecimento da dita BB; (iii) DD era, à data dos factos, Diretor Comercial do R. e superior hierárquico do A.; (iv) simultaneamente, o A. e as trabalhadoras EE, EE e GG encontravam-se no interior do gabinete de EE, onde a referida BB se dirigiu; (v) quando chegou ao gabinete de EE, BB questionou os colegas sobre se a presença de CC no Balcão, para reunir com o Diretor Comercial, estaria relacionada com a sua substituição, tanto mais que, no início de setembro de 2017, a mesma havia manifestado junto daquele Diretor Comercial a sua vontade de sair da área comercial; (vi) na sequência, o A. dirigiu-se a BB e, num tom de voz mais elevado do que aquele que estaria a utilizar, disse-lhe: “Disseste bem. Está à espera do Sr.DD. Sabes quem é o DD? Aquele boi grande e gordo? Estás a vê-lo aqui?”; (vii) BB, na resposta, disse ao A.: “Sabes aquela expressão de que o corno é sempre o último a saber? Eu só quero perceber se a vinda do Colega CC está relacionada comigo ou não”; (viii) após, o A. aproximou-se de BB, colocou as suas mãos na cabeça desta, direcionou a cabeça daquela para o seu rosto, como se lhe quisesse contar um segredo, aproximou a sua boca do ouvido de BB e, mantendo o referido tom de voz elevado, perguntou-lhe: “Estás armada em grande vaca?”; (ix) após ouvirem as palavras proferidas pelo A., BB e EE começaram a chorar.

Apesar de as instâncias não terem dúvidas em afirmar que o A. e ora Recorrido adotou um “comportamento culposo”, que revestiu “um carácter grave e ilícito”, pelo que “constitui ilícito disciplinar”, ambas consideraram que o R. e ora Recorrido deveria ter aplicado uma sanção disciplinar conservatória da relação laboral, entendimento que merece a nossa mais veemente rejeição porquanto, salvo melhor opinião, o A. e ora Recorrido adotou um comportamento inaceitável que, como bem salienta se destaca no voto de vencido que acompanha o acórdão recorrido, não é “permitido nem tolerado no trabalho, como refere o ponto 6 do Código Geral de Conduta, (em especial para os que, como ele, desempenham funções de Direção e que o mesmo conhecia)”, configurando justa causa de despedimento, conforme infra melhor se explanará.

C. Pese embora as instâncias afirmem que existem circunstâncias que atenuam a gravidade da conduta adotada pelo A. e ora Recorrido, o certo é que, tanto a sentença do tribunal de primeira instância, como o acórdão recorrido, assentam os seus argumentos não em factos / acontecimentos concretos da vida real dados por provados in casu, mas em conclusões que, como se refere no voto de vencido emitido, “não decorrem da factualidade provada, não se encontram demonstradas, presumindo e decidindo de modo que não podemos partilhar”, aí se acrescentando que, “Nada se apurou que justificasse ou atenue a gravidade daquele comportamento desrespeitoso e ofensivo em relação a outros trabalhadores da empregadora”.

A primeira das referidas “circunstâncias atenuantes” identificadas tanto na sentença emitida pelo Juízo do Trabalho de …, como no acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, reconduz-se ao alegado contexto de perturbação emocional em que ocorreram os eventos de 20/11/2017, designadamente o facto de ter sido conhecida, nessa manhã, a “notícia” da transferência da trabalhadora EE para outro balcão.

Note-se que, apesar de, no acórdão recorrido, se mencionar, que duas funcionárias se terão abraçado após as afirmações proferidas pelo A. e ora Recorrido, o certo é que tal factualidade não consta do elenco dos factos dados por provados nos presentes autos, tendo apenas se provado in casu que, após ter adotado as condutas descritas nos pontos 40 a 44 do elenco dos factos provados, o A. e ora Recorrido abraçou BB, não se tendo provado que esta retribuiu o referido abraço ou se teve qualquer outra reação.

D. Retornando ao alegado contexto de perturbação emocional em que os factos ocorreram, o mesmo não se afigura minimamente apto a minorar a gravidade do comportamento do A. e ora Recorrido desde logo porquanto, na vida quotidiana, máxime num empregador com a dimensão do R., situações que podem gerar transtorno ou comoção emocional sucedem amiúde, cabendo a quem ocupa posições de chefia e liderança não contribuir para que esse tipo de situações afetem o normal desenvolvimento da atividade e, mais ainda, dar o exemplo no que à correção e compostura diz respeito.

Com efeito, não se justifica que, de cada vez que um diretor de balcão do R. e ora Recorrente, recebesse a notícia de que um elemento da sua equipa iria ser transferido para outro local de trabalho, desatasse a insultar superiores e subordinados hierárquicos ou a colocar as mãos na cabeça de uma inferior hierárquica, segredando-lhe insultos ao ouvido.

Como muito pertinentemente se frisa no voto de vencido emitido, “não é compreensível que a consternação e tristeza causada pela “notícia” de transferência de uma funcionária para outra agência, seja adequada a gerar transtornos de modo a terem-se comportamentos injuriosos e agressivos em relação a outros colaboradores, particularmente, praticados pelo A., trabalhador com especial dever de no âmbito da sua atividade, devido às funções que desempenha, assegurar que tal não ocorra”.

E. No que tange à questão verbalizada por BB(Vide facto provado n.º 39), a mesma foi colocada no momento e perante o interlocutor corretos, dado que aquela havia sido, naquele momento, confrontada com a existência de mais um trabalhador na agência, pelo que seria legítimo, tendo em conta o enquadramento fáctico dos autos10, que quisesse saber se o colega CC a viria substituir, tanto mais que tal substituição implicaria, como é lógico e evidente, a sua transferência para outro balcão do R., pelo que a inquietação de BB resulta claramente justificada.

Termos em que, não poderá desvalorizar-se a conduta dolosa do A. e ora Recorrido com base no alegado ambiente de consternação e/ou de tristeza com que aquele se depararia no momento da prática dos factos, pois, como bem se salienta no voto de vencido que acompanha o acórdão recorrido, “nada se apurou que permita afirmar qualquer valor atenuativo, da responsabilidade do A., reflexo do transtorno sentido com a informação recebida no início da manhã em que ocorreram os factos, relativa à transferência da trabalhadora a que se alude no facto 30”, entendimento que se mostra consonante com a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, em particular com o decidido no seu acórdão de 10/12/2009 (processo n.º 08S3695), disponível em www.dgsi.pt.11

F. No que tange ao uso de expressão vernacular por parte de BB(“Sabes aquela expressão de que o corno é sempre o último a saber?12”), ainda que a mesma não se revele adequada a um contexto laboral, importa notar que, como o Juízo do Trabalho de …, nesse particular, bem ponderou, a expressão utilizada por BB se referia a ela própria, que seria, potencialmente, a última a saber da sua eventual transferência para outro balcão da instituição, pelo que jamais se revelaria apta a ofender o A. e ora Recorrido, contrariamente ao que sucedeu com a expressão utilizada por este último relativamente à dita BB.

Por outro lado, o facto provado 49 evidencia que, não foi a expressão utilizada por BB que levou o A. e ora Recorrido a apelidar a colega de “grande vaca”; na verdade, é o próprio A. que, junto da referida colega, admitiu que lhe dirigiu tal epíteto porquanto havia chamado “boi” ao diretor comercial.

G. Ainda que BB tivesse ofendido o A. e ora Recorrido, no que não se concede, o animus retorquendi, ou seja, o espírito de devolver a ofensa, é feito com diferente grau ofensivo, e jamais seria apto a excluir a ilicitude, ou, muito menos, a culpa do A. e ora Recorrido, que agiu livre e voluntariamente, tendo plena consciência que as expressões que dirigiu, quer ao Diretor Comercial, quer à sua subordinada hierárquica, eram aptas a ofender a honra e consideração dos visados, estando, de idêntica sorte, plenamente ciente que a conduta por si adotada era diametralmente oposta ao que lhe era imposto pelo Código de Conduta vigente no R. e ora Recorrente, normativo interno que tinha, ademais, obrigação de fazer cumprir junto da sua equipa de trabalho.

H. Acresce que, a gravidade de uma e outra expressões – a proferida pelo A. e a proferida por BB– não é sequer comparável, como também não se poderá comparar a posição que cada um ocupava na estrutura do R. e ora Recorrente – BB desempenhava as funções de “Gestora Select” (vide facto provado n.º 28), enquanto que o A. e ora Recorrido era o diretor do balcão de Gaia Câmara, detendo, pois, um cargo de significativa proeminência, responsabilidade e especial confiança, que não resiste a um comportamento grosseiro e de frontal desrespeito perante um superior e uma inferior hierárquica.

Sendo o carácter das relações entre partes um dos mais relevantes elementos a incluir na ponderação da justa causa, conforme prescreve o art.º 351.º, n.º 3, do Código do Trabalho, a violação flagrante do Código de Conduta por um diretor de balcão, que é responsável por liderar uma equipa de trabalho e de assegurar que a mesma se rege pelos ditames inscritos em tal normativo interno, não pode deixar de revestir uma extraordinária gravidade, assim se evidenciando que o comportamento que o A. e ora Recorrido adotou a 20/11/2017 configura justa causa de despedimento.

I. Também a circunstância de o A. e ora Recorrido não ter tido a intenção de ofender o seu superior hierárquico e/ou de lhe ter pedido posteriormente desculpas pessoalmente, as quais foram aceites, não minoram a gravidade do seu comportamento, porquanto, como muito pertinentemente se frisa no voto de vencido que acompanha o acórdão ora em crise, o pedido de desculpas que o A. e ora Recorrido dirigiu ao Diretor Comercial, atenta a forma como foi por este aceite, afigura-se irrelevante, dado que DD logo lhe transmitiu que a sua conduta era inadmissível (cfr. ponto 62 dos factos provados).

Na verdade, tal pedido de desculpas apenas evidencia, como se frisa no voto de vencido apresentado, que o A. e ora Recorrido tinha plena consciência que a conduta que adotou lhe estava expressamente vedada, pelo que o mesmo “não assume qualquer valor atenuativo da gravidade da sua conduta a nível profissional como, desde logo, lhe foi dito pelo superior hierárquico que, pessoalmente, as aceitou. Até porque, atenta a posição hierárquica do A. e como decorre do referido Código Geral de Conduta, ele era um dos sujeitos, do mesmo, que deveria utilizar todos os meios ao seu alcance para assegurar que atos como os que protagonizou, não ocorressem. Além de que, não é despiciendo lembrar que “as desculpas não se pedem evitam-se”.

Acresce que, como certeiramente se exarou no referido voto de vencido, “as “desculpas” que o DD aceitou do trabalhador, outra abrangência não podem ter que não seja, em relação ao que lhe foi transmitido pelo trabalhador de “que não teve intenção de o ofender”

a ele, enquanto pessoa, porque quanto ao mais, enquanto profissional e especialmente, ao relevo que a situação teve dentro da empregadora, o DD não só lhe transmitiu que não era admissível que o mesmo se referisse a ele nos moldes em que o fez, muito menos em frente à sua equipa de trabalho, como o comunicou a um membro da Comissão Nacional de Trabalhadores da Empregadora, na concretização da sua comunicada e afirmada intenção ir tomar diligências e de não branquear a situação e de a comunicar superiormente”.

J. Quanto ao alegado pedido de desculpas apresentado a BB(Vd.facto provado 49), importa salientar que aquele se limitou a justificar à colega que a apelidou de “vaca” porquanto tinha chamado “boi” ao Diretor Comercial, o que evidencia que o A. e ora Recorrido não apresentou um pedido de desculpas, no verdadeiro sentido da expressão, tendo, outrossim, se limitado a aduzir uma razão para o indecoroso comportamento adotado.

Acresce que, não resultou demonstrado nos autos que BB tenha aceitado as “desculpas” do A. e ora Recorrido, o que, como se frisa no voto de vencido que acompanha o acórdão recorrido, “não se estranha, já que, sempre com o devido respeito, o que no facto 49 se mostra referido como pedido de desculpa pelo sucedido, não é outra coisa do que reiterar o desrespeito antes cometido. Pois, é óbvio que pedir desculpa pelo sucedido e referir “que a tinha apelidado de “vaca” porquanto tinha chamado “boi” ao diretor comercial”, jamais pode ser interpretado e sentido como um pedido de desculpas. Tanto que não se conhece qualquer reação, da mesma, a esse pedido de “desculpas”.

K. Ademais, e ainda que as “consequências” do comportamento culposo do trabalhador não impliquem necessariamente um prejuízo patrimonial para o empregador, os mesmos sempre poderão acarretar um dano “organizacional”, que, in casu, o A. e ora Recorrido gerou na esfera do R. e ora Recorrente ao faltar ao respeito ao seu superior hierárquico e ao agredir verbalmente / intimidar uma inferior hierárquica - o que fez perante os demais membros do balcão de Gaia Câmara.

Importa reter que, ao instituir a proibição ínsita no ponto 6 do seu Código de Conduta, o R. e ora Recorrente não pretende acautelar interesses patrimoniais diretos, mas antes projetar, interna e externamente, que o quadro de gestão da instituição se pauta por padrões e regras de respeito pelo próximo e de sã convivência no local de trabalho, o que, na convicção do R. e ora Recorrente se revela de fulcral importância para a sua produtividade, para a consecução dos objetivos traçados pela sua Administração e, em última ratio, para sua permanência no mercado numa ótica de longo prazo.

Por conseguinte, a adoção de comportamentos inequivocamente desrespeitadores do disposto em tal normativo interno é apta a pôr em causa a imagem de que a instituição pretende gozar perante a sociedade, o mercado e a comunidade onde desenvolve os seus negócios, no qual se inclui o núcleo de clientes, fornecedores e trabalhadores, tendo o A. e ora Recorrido lhe infligido, com o seu comportamento, um relevantíssimo dano organizacional.

L. Com o seu comportamento desrespeitoso e afrontador de um normativo interno que bem sabia ser considerado importante pela instituição, o A. e ora Recorrido aviltou e desprezou a relevância e obrigatoriedade do Código de Conduta, passando à organização e, em particular, à sua equipa de trabalho a - errónea - ideia que essas regras não serão para ser levadas a sério, constituindo mera letra morta.

Não se poderá olvidar que, a violação flagrante do Código de Conduta por um diretor de balcão é apta a pôr em causa a credibilidade e eficácia desse normativo, dado que os trabalhadores que detêm tal cargo, como era o caso do A. e ora Recorrido, não podem ignorar que a sua conduta e o seu exemplo são referências para toda a sua equipa de trabalho, estando, portanto, o mesmo obrigado não apenas a cumprir, mas também a fazer cumprir por todos os seus subordinados, as instruções e ordens constantes do referido normativo interno.

Dúvidas não subsistem, pois, que, o comportamento do A. configura uma grave violação dos deveres de respeito e de obediência, previstos no art.º 128.º, n.º 1, als. a) e e), do Cód. do Trabalho, sendo que as circunstâncias em que o comportamento ilícito ocorreu, o quadro de gestão do R. e ora Recorrente no que ao cumprimento do Código de Conduta diz respeito e a posição hierárquica do A. e ora Recorrido geraram uma impossibilidade prática e imediata de subsistência da relação laboral, não sendo exigível ao Empregador que mantenha ao seu serviço o Trabalhador, assim se justificando a aplicação da sanção de despedimento, sem compensação ou indemnização, e não uma sanção disciplinar conservatória do vínculo laboral.

M. Ter-se-á, igualmente, de relevar a intensidade do animus difamandi e injuriandi por parte do A. e ora Recorrido, o qual tinha plena consciência que, as expressões que dirigiu ao Diretor Comercial e a BB, descritas nos factos provados n.ºs 39 a 45, no contexto em que foram proferidas, eram aptas a lesar a honra e consideração dos visados.

Como se frisa no voto de vencido que acompanha o acórdão ora em crise, a intensidade do referido animus “tem a ver com o facto de o episódio ter determinado que as duas funcionárias tivessem chorado e ainda o facto de o ocorrido ter sido alvo de conversas fora do local de trabalho.”

Note-se que, o A. e ora Recorrido encontrava-se no seu local e em pleno período normal de trabalho e rodeado por grande parte dos membros da equipa de trabalho do balcão de Gaia Câmara, de que era diretor, e não num contexto pessoal, caso em que as expressões por si proferidas poderiam, eventualmente, ser proferidas e / ou compreendidas.

N. Ainda que os visados não se tivessem sentido atingidos na sua honra e consideração, conclusão que a matéria de facto nem sequer permite extrair, ou que o A. e ora Recorrido não pretendesse ofender ninguém, no que igualmente não se concede, não se pode exigir ao Empregador a manutenção de uma relação laboral com um trabalhador, com responsabilidades de chefia, que desrespeita e ofende os seus subordinados, que intimida fisicamente uma subordinada hierárquica e viola as regras constantes do Código de Conduta vigente na instituição porquanto, como pertinentemente se exarou no voto de vencido que acompanha a decisão de que ora se recorre, “a empregadora não tem a certeza de que o Trabalhador, futuramente, não destabilize as relações entre ele e os seus subordinados e entre ele e os superiores, do modo como o fez, até porque já não era a primeira vez”.

O. Contrariamente ao que exarou no acórdão de que se recorre, as expressões usadas pelo A. e ora Recorrido, perdoe-se-nos a expressão, “encaixam que nem uma luva” no disposto no artigo 6.º do Código de Conduta do R. e ora Recorrente, desde logo porquanto os epítetos que aquele dirigiu ao Diretor Comercial e à sua inferior hierárquica evidenciam uma falta de respeito e da consideração devida aos mesmos.

Como se tal não bastasse, o A. ainda intimidou fisicamente uma inferior hierárquica, dado que não se limitou a perguntar a BB, de uma ponta para a outra do gabinete de EE, local em que se encontravam, se a mesma estava “armada em grande vaca”; Ao invés, o A. e ora Recorrido aproximou-se de BB, colocou as suas mãos na cabeça desta, direcionando-a para junto do seu rosto, como se tivesse a intenção de lhe segredar algo, após o que aproximou a sua boca do ouvido da colega, para então lhe perguntar se estava armada em grande vaca.

Tal forma de agir ter-se-á de qualificar como um comportamento intimidatório adotado por um superior perante uma inferior hierárquica, conduta que se encontra expressamente vedada a qualquer trabalhador do R. e ora Recorrente e que agrava, de sobremaneira, o comportamento tido pelo A. e ora Recorrido no referido dia 20 de novembro de 2017, justificando a aplicação, pelo R. e ora Recorrente, da sanção disciplinar expulsória.

P. A conclusão aduzida na decisão recorrida, de que os “três trabalhadores envolvidos souberam ultrapassar o incidente ocorrido, mantendo o normal relacionamento pessoal e profissional” é manifestamente exacerbada e desprovida de fundamento, desde logo relativamente à trabalhadora BB, dado que não resultou provado que aquela tenha aceite o “pedido de desculpas” que o A. e ora Recorrido lhe apresentou, tendo, outrossim, resultado demonstrado que, no almoço entre colegas realizado no dia seguinte, 21/11/2017, em que a BB esteve presente, esta não se riu quando os colegas comentaram o episódio ocorrido na véspera (Vide factos provados n.º 52 a 54).

Também o facto de o Diretor Comercial não ter manifestado qualquer oposição, designadamente quando questionado telefonicamente pelo A., a que este assistisse a um jogo de futebol no mesmo camarote do Estádio do Dragão (a convite de um cliente do Recorrente), não permite extrair a conclusão de que a relação pessoal /ou profissional entre ambos não sofreu qualquer alteração em função do episódio ocorrido a 20/11/2017, quando nem sequer se provou se ambos se relacionaram ou conversaram entre si no âmbito de tal jogo ou não.

Termos em que, a circunstância de o A. e ora Recorrido e o Diretor Comercial terem, a 6/12/2017, assistido a um jogo de futebol no mesmo camarote de um estádio de futebol, é manifestamente insuficiente para conduzir à conclusão que a relação entre ambos não foi abalada pelo comportamento tido pelo A. e ora Recorrido.

Q. Também a antiguidade do A. e ora Recorrido, de 26 anos, e/ou os resultados das suas avaliações de desempenho dos últimos 7 anos, não são aptas a minorar a gravidade dos atos por aquele praticados, mormente porquanto a jurisprudência vem pacificamente entendendo que, ao invés de atenuar a gravidade do ilícito praticado, a antiguidade do trabalhador tem a virtualidade de a agravar dado que esse longo passado é suscetível de gerar no espírito do empregador a forte expectativa de que o trabalhador, que sempre adotou comportamentos orientados por padrões de normalidade nas relações laborais, tinha um dever acrescido de pautar a sua conduta por esses mesmos padrões.

Neste mesmo sentido confira-se o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 17/5/2018, documento sob o n.º … e, bem assim, o acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 6 de junho de 2013, proferido no âmbito do processo n.º 90/11.0TTFAR.E1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt .

R. Já as circunstâncias agravantes do comportamento do A. encerram elevada censurabilidade relevando, de sobremaneira, a circunstância de os factos praticados pelo A. e ora Recorrido terem sido presenciados e conhecidos pelos trabalhadores do balcão de Gaia Câmara no dia 20/11/2017 e, de idêntica sorte, serem cognoscíveis por outros trabalhadores do R. e ora Recorrente, na medida em que, como se salienta no voto de vencido apresentado, “sendo a situação conhecível pelos restantes trabalhadores da empregadora/recorrente (os que se encontravam presentes e os que vieram a saber, posteriormente), ficaria a impressão nos mesmos que as injúrias e ofensas entre eles, ou dirigidas a superiores hierárquicos, eram toleradas, pese embora, o Código Geral de Conduta existente, com as inerentes e graves consequências ao nível da organização da empresa”.

Neste exato sentido, confira-se o referido no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10/9/2018, proferido no proc. n.º 2673/15.0T8MAI.P1, in www.dgsi.pt, no qual se tecem as seguintes considerações, que são transponíveis, mutatis mutandis, para a situação concreta que se discute nos presentes autos: “Desde logo porque, sendo a situação conhecível pelos restantes trabalhadores da recorrida (conforme facto provado 12), ficaria a impressão nos mesmos que as injúrias entre eles, ou dirigidas a superiores hierárquicos, eram toleradas, com as inerentes e graves consequências ao nível da organização da empresa.” (sublinhados nossos)

S. Assinale-se igualmente que o A. e ora Recorrido, no ano anterior ao da prática dos factos em apreciação nestes autos, foi disciplinarmente sancionado por força de uma violação do dever de respeito, sendo incompreensível, à luz do padrão do bonus pater familiae, que, volvidos escassos meses, volte a incorrer no mesmo tipo de comportamento, não se podendo, pois, admitir o regresso à organização de um trabalhador, Diretor de um balcão da instituição e líder de uma equipa de trabalho, que trata da forma como a que está provada nos autos os seus superiores e subordinados hierárquicos.

Nestes termos, não será despicienda, ou passível de ser atenuada, a existência deste concreto antecedente disciplinar no exercício de prognose que obrigatoriamente se impõe ao empregador, assim se concluindo que, na situação sub iudice, quanto mais não seja por força da existência deste recente e idêntico antecedente disciplinar, deparamo-nos perante uma situação de impossibilidade prática da subsistência da relação laboral, pois, como se salienta no voto de vencido que acompanha o acórdão recorrido, atentas as funções que o A. e ora Recorrido desempenhava, de diretor do balcão de Gaia Câmara, “a confiança da R., em si, tem de ser plena e total, especialmente sem receio dele ter comportamentos como o que teve, que geram, inevitavelmente, a quebra da confiança que tem de existir, em relações desta natureza, sempre, o que, no caso do A., já nem era a 1ª vez e por factos com enquadramento jurídico idêntico, como decorre do facto 69”.

T. O Tribunal a quo não valorou corretamente o circunstancialismo que precedeu o insulto que o A. e ora Recorrido dirigiu a BB, designadamente o facto de aquele se ter aproximado desta última, ter colocado as mãos na sua cabeça, direcionando-a para junto da sua cara, e aproximado a sua boca do ouvido daquela para lhe perguntar, em frente aos demais, se estava “armada em grande vaca?”.

Ainda que, pelo menos no período imediatamente ao que atualmente vivemos, de pandemia motivada pela doença Covid-19, aquilo que era considerado uma distância pessoal sensata das outras pessoas variasse de local para local e de pessoa para pessoa, é de meridiano bom senso que o A. e ora Recorrido mantivesse uma distância socialmente adequada da colega, o que deveria fazer a todo o tempo e, em particular, no momento em que a decidiu insultar.

Não o fazendo, e ao colocar as suas mãos na cabeça da colega, como o fez, para, afinal, a insultar, é evidente que o A. e ora Recorrido colocou a sua inferior hierárquica numa posição de extremo desconforto, razão pela qual a mesma começou imediatamente a chorar.

O A. e ora Recorrido agiu de forma consciente e deliberada, tendo adotado uma conduta especialmente desvaliosa para com uma inferior hierárquica, desde logo porquanto o mesmo não foi previamente insultado, nem provocado pela sua colega de trabalho, não se podendo tolerar - pelo menos o R. não o admite, nem nunca o admitirá na sua organização - que uma chefia agarre, sem autorização prévia, na cabeça de uma sua inferior hierárquica e a puxe para junto da sua boca, como se lhe fosse segredar algo, para, afinal, lhe segredar um insulto - escutado pelos demais colegas presentes -, o que configura uma gravíssima violação dos seus deveres de respeito, urbanidade e probidade, previstos no art.º 128.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho.

U. Pode exigir-se ao R. e ora Recorrente que, face a estas ações do A. e ora Recorrido, mantenha em vigor a relação laboral? Em nosso entender, a resposta não poderá deixar de ser negativa, desde logo porquanto a posição hierárquica que o A. detinha no R., de diretor de balcão, implicava a sua sujeição a um dever acrescido de adotar uma conduta diametralmente oposta à que veio a praticar, pelo que não se concebe como se pode alcançar outra conclusão que não a de que, in casu, encontra-se preenchido o conceito de justa causa despedimento.

Como bem se destaca no voto de vencido que acompanha o acórdão recorrido, “atenta a posição hierárquica do A. e como decorre do referido Código Geral de Conduta, ele era um dos sujeitos, do mesmo, que deveria utilizar todos os meios ao seu alcance para assegurar que atos como os que protagonizou, não ocorressem.”

Em síntese, a associação de ilícitos disciplinares graves e culposos, como os praticados pelo A. e ora Recorrido, a uma posição hierárquica de responsabilidade, como aquela que era detida pelo mesmo, é, por si só, apta a determinar uma irreversível quebra de confiança no trabalhador e, portanto, tornar inviável a continuação da relação laboral, já que não será razoavelmente exigível ao empregador a sua manutenção.

V. Face ao acima exposto, impõe-se concluir que, a manutenção do A. e ora Recorrido ao serviço do Banco R. seria apta a ferir, de forma exagerada e violenta, a liberdade psicológica do empregador médio, consubstanciando a continuidade do vínculo uma insuportável e injusta imposição ao empregador, entendimento que se mostra consonante com a jurisprudência dos tribunais superiores, podendo conferir-se, por todos, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 11/10/2017, proferido no âmbito do processo n.º 2982/16.1T8BRR.L1-4, bem como o acórdãode10/12/2015, do Supremo Tribunal de Justiça, no qual se confirmou a decisão do Tribunal da Relação que havia considerado lícito o despedimento de um trabalhador que, numa reunião de trabalho, perante diversos trabalhadores, seus subordinados, proferiu as expressões “filho da puta” e “cabrão” visando o Administrador do pelouro.

Termos em que, ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo fez uma incorreta interpretação e violou o disposto nos artºs 128.º, n.º 1, alíneas a), e), e f), 351.º, nºs. 1.º e 3, 357.º, n.º 4, e 381.º, al. b), todos do Cód. do Trabalho, o que expressamente se invoca para todos os devidos efeitos legais.

W. Tendo o despedimento do A. sido declaro ilícito, consideraram as instâncias que aquele teria direito, atento o disposto no art.º 390.º, n,º 1, do Cód. do Trabalho, a receber as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da respetiva decisão judicial, tendo-se considerado, na decisão recorrida, que o valor do uso da viatura que lhe tinha sido atribuída pelo R. faz parte integrante da sua retribuição, e, bem assim, que o valor mensal correspondente ao prémio de seguro “de saúde” pago pelo R. constitui retribuição em espécie do A.

Sem conceder quanto a todo o acima exposto relativamente à licitude do despedimento do A., sempre se dirá que o R. não se conforma com tais decisões, na medida em que os supra referidos benefícios atribuídos ao A. não configuram retribuição em sentido próprio, tendo o acórdão recorrido efetuado uma incorreta aplicação e/ou interpretação das normas jurídicas aplicáveis.

X. No que tange à viatura, resultou provado nos autos, tão somente, que o A. a utilizava tanto para fins profissionais, como para fins pessoais (Cfr. ponto 82 do elenco dos  factos provados), não tendo o A. alegado, nem tão pouco provado, por exemplo, que era o R. que suportava as despesas inerentes à utilização do automóvel que lhe foi atribuído, designadamente portagens, seguro, manutenção, inspeção periódica, etc., ou que o combustível utilizado pelo A. nas suas deslocações pessoais era suportado pelo R., circunstâncias que a jurisprudência tem reputado como relevantes para se poder concluir que a atribuição de uma viatura a um trabalhador configura retribuição

Dito de outro modo, o facto de ter (apenas) resultado provado nos autos que o A. poderia utilizar a viatura que lhe foi atribuída pelo R. para fins pessoais é insuficiente para que daí se possa extrair a conclusão que a utilização da viatura tivesse cariz retributivo, isto é, que consistisse numa contrapartida da prestação laboral, sendo tão ou mais plausível que a utilização pessoal do referido automóvel resultasse de uma mera liberalidade por parte do R., que, como tal, poderia ser retirada a todo o tempo, não constituindo, por isso, uma componente da retribuição do A., podendo conferir-se, neste sentido, os acórdãos desse Excelso Tribunal proferidos no âmbito dos processos n.º 08S1031 e 373/10.7TTPRT.P1.S1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.

Desta forma, ao considerar que a remuneração do A. compreende o valor da utilização, para fins pessoais, do veículo automóvel que lhe foi atribuído pelo R., o Tribunal da Relação do Porto violou/interpretou incorretamente o disposto no artigo 249.º do Código do Trabalho, devendo a decisão de que ora se recorre ser substituída por outra, que considere que a utilização do mencionado veículo pelo A. para fins pessoais não era uma contrapartida do trabalho por si prestado, antes configurando um benefício atribuído pelo R., a título de mera liberalidade.

Y. Identicamente sem conceder quanto ao supra alegado e objeto das presentes Conclusões, mal andou também o acórdão recorrido ao considerar que o valor mensal correspondente ao correspondente prémio do seguro pago pelo R. constitui retribuição em espécie do A., na medida em que este não alegou, nem demonstrou em juízo, desde quando é que vinha beneficiando do seguro complementar de assistência hospitalar, se o respetivo prémio era pago de forma regular e periódica pelo R., não tendo, igualmente, feito qualquer alusão aos termos e/ou o contexto em que tal benefício lhe foi atribuído, sendo a decisão sobre a matéria de facto totalmente omissa quanto a estes aspetos.

Não tendo tais factos sido alegados/provados pelo A., impõe-se concluir que não nos deparamos perante um “direito adquirido” daquele, antes configurando o seguro em questão um benefício livremente atribuído pelo R. aos seus trabalhadores, que não assume juridicamente carácter contratual-laboral e, muito menos, reveste a natureza de contrapartida ou correspetivo da prestação de trabalho, que é característica essencial da retribuição.

Aliás, a própria designação e consubstanciação do benefício sob a forma de seguro complementar de assistência hospitalar evidencia que não estamos perante uma atribuição patrimonial que seja contrapartida da prestação profissional, mas sim perante um benefício social, concedido pelo empregador numa lógica assistencialista, com vista a dotar o trabalhador de uma proteção adicional caso o mesmo necessite de assistência hospitalar.

Termos em que, ao considerar que o valor mensal correspondente ao prémio de seguro pago pela Empregadora constitui retribuição em espécie do A., o Tribunal de segunda instância violou e/ou aplicou incorretamente ao caso dos autos o disposto no art.º 249.º, n.º s 1 e 2 do Cód. do Trabalho, devendo, por essa razão, tal decisão ser revogada pelo Excelso Tribunal ad quem, o que expressamente se requer.»

8. O A. contra-alegou, tendo suscitado a questão da inadmissibilidade do recurso, na parte referente à fixação da retribuição, por entender que nessa parte existe dupla conforme, defendendo, quanto ao mais, a improcedência do recurso, sustentando a inexistência de justa causa para o despedimento.

9. Foi proferido despacho pelo relator  a não admitir o recurso de revista na parte referente à questão da fixação da retribuição do trabalhador, com o fundamento na existência de dupla conforme sobre tal segmento, atento o disposto no art.º 671.º, n.º 3, do CPC.

10. Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que deve ser negada a revista e confirmado o acórdão recorrido.

11. Atento o referido em 9., das questões suscitadas pela recorrente, nas suas conclusões, subsiste apenas a questão de saber se existe ou não justa causa para o despedimento do A.

                                                           II

A) Fundamentação de facto:

«1) A Empregadora é uma instituição financeira que dispõe, para o exercício da respetiva atividade, de várias agências bancárias em Portugal. (artigo 13.º do articulado de motivação do despedimento)

2) A Empregadora resultou da incorporação no “Crédito Predial Português, SA”, por fusão, dos bancos “Banco Totta & Açores, SA” e “Santander Portugal, SA”, em outubro de 2004. (artigo 46º da resposta à contestação)

3) O Trabalhador foi admitido ao serviço do “Banco Totta & Açores” no dia 01 de maio de 1991. (artigo 25.º da resposta à contestação)

4) O Trabalhador exerceu funções para a Empregadora desde outubro de 2004 até 12 de abril de 2018, com antiguidade reportada a 01 de maio de 1991. (artigo 1.º do articulado de motivação do despedimento)

5) Em abril de 2018 o Trabalhador detinha a categoria profissional de “gerente” e exercia para a Empregadora as funções de diretor de balcão na agência desta de “Gaia Câmara”. (artigo 2.º do articulado de motivação do despedimento)

6) Vigora na Empregadora um “Código Geral de Conduta”, no qual se encontram refletidas as normas e os padrões de comportamento ético pelos quais a mesma rege a sua atividade e que deverão ser observados por todos os trabalhadores. (artigo 15.º do articulado de motivação do despedimento)

7) O ponto 6. do referido “Código Geral de Conduta”, sob a epígrafe de “Respeito para com as pessoas”, dispõe que:

O assédio, o abuso, a intimidação, a falta de respeito e consideração ou qualquer outro tipo de agressão física ou verbal são inaceitáveis e não permitidas nem toleradas no trabalho.”. (artigo 16º do articulado de motivação do despedimento)

8) O aludido documento está disponível para consulta tanto na “intranet”, como no sítio de “internet” da Empregadora; sendo, por isso, conhecido por todos os trabalhadores da mesma, os quais estão conscientes da obrigação do respetivo cumprimento. (artigos 17.º e 18.º do articulado de motivação do despedimento)

9) No dia 30 de novembro de 2017 um membro da Comissão Nacional de Trabalhadores da Empregadora, HH, comunicou telefonicamente à Diretora Coordenadora de Recursos Humanos da mesma que nos dias anteriores teria ocorrido um incidente na agência de “Gaia/Câmara”, em que teria havido intervenção do respetivo diretor de balcão. (artigo 19º do articulado de motivação do despedimento)

10) Na sequência de tal comunicação, nesse mesmo dia realizou-se uma reunião, na qual estiveram presentes: II, diretora coordenadora da “Direção de Coordenação de Recursos Humanos” da Empregadora; JJ, diretor coordenador da “Direção de Coordenação de Assuntos Jurídicos e Secretaria” da mesma; e LL, HH, MM e NN, todos elementos da Comissão Nacional de Trabalhadores do banco. (artigo 20º do articulado de motivação do despedimento)

11) Na referida reunião, o HH relatou aos demais presentes ter recebido a informação de que, no dia 20 de novembro de 2017, pelas 17:00 horas, o diretor do balcão de “Gaia/Câmara” teria agredido física e verbalmente a trabalhadora BB. (artigo 21º do articulado de motivação do despedimento)

12) No dia 30 de novembro de 2017, após a reunião mencionada em 11), OO, funcionária do “Departamento de Gestão Administrativa/Direção de Coordenação de Recursos Humanos” da Empregadora, remeteu a PP, funcionário do Gabinete de Inspeções da mesma, um e-mail, junto a fls. 65 verso e cujo teor aqui dou por integralmente reproduzido, através do qual, entre outras coisas, lhe comunicou que:

(…) Assunto: Balcão – VNG Gaia Câmara

(…) Conforme falamos vimos informar que RH teve hoje conhecimento que no passado dia 20 de novembro terá existido uma agressão física a uma colaboradora por parte do DB. (…)”. (artigo 22º do articulado de motivação do despedimento) (Eliminada, expressão sublinhada)

13) Na sequência do recebimento do referido e-mail, no dia 04 de dezembro de 2017 o Gabinete de Inspeções da Empregadora iniciou um processo de averiguações relativo aos factos ocorridos no dia 20 de novembro de 2017, no Balcão de “Gaia-Câmara”. (artigo 22.º do articulado de motivação do despedimento)

14) Tal processo de averiguações terminou com a elaboração de um relatório, datado de 14 de dezembro de 2017, no qual, entre outras coisas, foi proposta a avaliação disciplinar da atuação do Trabalhador. (artigo 22.º do articulado de motivação do despedimento)

15) A competência para a instauração de procedimentos disciplinares aos trabalhadores da Empregadora cabe à Comissão Executiva desta. (artigo 12.º da resposta à contestação)

16) No dia 03 de janeiro de 2018 um membro da Comissão Executiva da Empregadora manuscreveu num documento, junto a fls. 32 verso dos autos e cujo teor aqui dou por integralmente reproduzido, os seguintes dizeres:

(…) A comissão executiva, em sua reunião de hoje, dia 3/1/2018, decidiu instaurar processo disciplinar com intenção de despedimento com justa causa e suspensão de prestação de trabalho, ao colaborador AA, delegando na DCRH a escolha do respetivo instrutor.”. (artigo 11º da resposta à contestação) (Eliminada, expressão sublinhada)

17) No documento mencionado em 16) não consta a identificação do subscritor do mesmo nem as funções por ele exercidas. (artigo 14º da contestação)

18) No dia 03 de janeiro de 2018, a diretora coordenadora da “Direção de Coordenação de Recursos Humanos” da Empregadora apôs a sua assinatura num documento, junto a fls. 35 verso dos autos e cujo teor aqui dou por integralmente reproduzido, denominado “Auto de Nomeação de Instrutores”, através do qual, entre outras coisas, declarou que:

(…) Banco Santander Totta, SA (…) nomeia como Instrutores do procedimento disciplinar com vista ao despedimento instaurado ao trabalhador AA os Senhores Drs.QQ , RR, SS e TT, Advogados (…)”. (artigos 13º e 14º da resposta à contestação) (Eliminada, expressão sublinhada)

19) No documento mencionado em 18) não consta a identificação da subscritora do mesmo nem as funções por ela exercidas. (artigos 9º a 13º da contestação)

20) No dia 04 de janeiro de 2018 os instrutores nomeados remeteram ao Trabalhador, através de carta registada com aviso de receção, um documento, junto de fls. 35 a 38 verso dos autos e cujo teor aqui dou por integralmente reproduzido, denominado “NOTA DE CULPA”, através do qual, entre coisas, lhe comunicaram que:

(…) 13. No início de setembro de 2017 a trabalhadora BB manifestou junto do Trabalhador-Arguido e do Diretor Comercial da Direção Comercial de Particulares e Negócios Norte 2, Sr. DD, que era sua intenção sair da área comercial porquanto não estava a conseguir alcançar os objetivos comerciais fixados pelo Banco R. para os Gestores Select, função que a referida trabalhadora vinha desempenhando ultimamente.

14. Na tarde do dia 20 de novembro de 2017, no decurso da reunião semanal da equipa do balcão de Gaia/Câmara, na qual se encontravam presentes todos os trabalhadores afetos ao referido balcão, após o flash semanal o Trabalhador-Arguido informou os presentes que o Diretor Comercial, Sr. DD, iria deslocar-se à agência nesse mesmo dia, após o término da referida reunião.

15. Após sair da sala de reuniões, que se situa no piso inferior do balcão de Gaia / Câmara, a trabalhadora BB regressou ao seu posto de trabalho, localizado no piso superior, tendo, no trajeto, se cruzado com o colega CC, que não integrava a equipa do balcão de Gaia / Câmara, mas que aí se havia deslocado para se encontrar com o Diretor Comercial, Sr. DD.

16. Por se ter apercebido que um grupo de colegas estava no gabinete da gestora de negócios EE, a trabalhadora BB deslocou-se ao referido gabinete e perguntou aos colegas aí presentes – EE, FF, GG e o Trabalhador-Arguido - se o colega CC vinha efetivamente encontrar-se com o Diretor Comercial e se a razão da sua deslocação ao balcão de Gaia/Câmara nesse dia se prendia com a sua possível substituição.

17. Na sequência, o Trabalhador-Arguido dirigiu-se à trabalhadora BB e, em voz alta, referiu-lhe o seguinte:

“Disseste bem. [CC] Está à espera do Sr. DD. Sabes quem é o Sr. DD? Aquele boi grande e gordo? Estás a vê-lo aqui?”

18. Em resposta, a trabalhadora BB referiu o seguinte ao Trabalhador-Arguido:

“Sabes aquela expressão de que o corno é sempre o último a saber? Eu só quero perceber se a vinda do colega CC cá está relacionada comigo ou não.”

19. Após, o Trabalhador-Arguido aproximou-se da trabalhadora BB, colocou as suas mãos na cabeça daquela e direcionou-a para junto do seu rosto, como se tivesse a intenção de lhe dizer um segredo.

20. Quando a trabalhadora BB se encontrava próxima do seu rosto, o Trabalhador-Arguido disse-lhe, em tom de voz elevado, o seguinte:

“Estás armada em grande vaca?”

21. Após, o Trabalhador-Arguido referiu a BB e aos demais colegas presentes que CC vinha substituir a trabalhadora EE, tendo, na sequência, abraçado a trabalhadora BB.

22. Após ouvir as palavras proferidas pelo Trabalhador-Arguido, acima mencionadas, a trabalhadora BB e, bem assim, a trabalhadora EE, começaram a chorar.

23. A trabalhadora BB regressou ao seu posto de trabalho, tendo os demais colegas também abandonado o gabinete da trabalhadora EE.

24. Alguns minutos depois, o Trabalhador-Arguido dirigiu-se ao posto de trabalho de BB, tendo-lhe pedido desculpa pelo sucedido e referido que a tinha apelidado de “vaca” porquanto tinha “chamado boi ao outro”, designadamente ao Diretor Comercial.

(…)

30. Por decisão do Diretor Comercial tomada após o sucedido, a trabalhadora BB passou a prestar a sua atividade profissional no balcão de Vila Nova de Gaia / Alto das Torres, o que ocorreu a partir de 27 de novembro de 2017.

31. Em outubro de 2016, na sequência de processo disciplinar instaurado ao Trabalhador-Arguido, o BST determinou àquele a aplicação de uma sanção disciplinar de perda de 2 (dois) dias úteis de férias, fundamentada na violação do dever jus laboral de respeitar e tratar o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as pessoas que se relacionem com a empresa com urbanidade e probidade, previsto no artigo 128.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho (…).

(…)

Em síntese (…) conclui-se que os mencionados comportamentos do Trabalhador-Arguido (…) são aptos a tornar imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho, consubstanciando justa causa de despedimento (…).

(…)

O Trabalhador-Arguido poderá, querendo, apresentar a sua defesa no prazo de 15 dias úteis (…) e, bem assim, consultar os presentes autos de procedimento disciplinar. (…)”. (artigos 6º e 7º do articulado de motivação do despedimento) (Eliminada, expressão sublinhada)

21) No dia 24 de janeiro de 2018 o Trabalhador apresentou a sua resposta à nota de culpa, nos exatos termos constantes do documento junto de fls. 97 verso a 106 verso dos autos e cujo teor aqui dou por integralmente reproduzido, aí tendo, entre outras coisas, declarado que:

(…) 1. Anexa à nota de culpa vem um auto de nomeação de instrutores.

2. Desse auto consta que o Banco Santander Totta, S.A. confere aos ilustres advogados ali identificados, os poderes para “assinar e remeter a nota de culpa”.

3. Tal documento está assinado por alguém que não está identificado e que o fará em nome do referido Banco (…).

Ora,

4. Desde logo desconhece-se de quem é a assinatura que está no referido documento.

Aliás,

5. O alegado ou alegada assinante que rubrica em nome da arguente, não está sequer identificado. No mesmo sentido,

6. Desconhece-se também qual o cargo que o assinante do documento ocupa, bem como, os poderes que detém para vincular a arguente a tal documento.

7. Consultado o processo disciplinar, constata-se que essa identificação também não consta, bem como não consta qualquer documento assinado pela administração do banco ou outrem, a determinar a instauração do processo disciplinar bem como delegar esse mesmo poder.

8. Nessa medida, impugna, pois, o arguido tal assinatura que desconhece de quem seja, bem como os poderes de quem assina.

Por outro lado,

9. O poder para assinar a nota de culpa é detido apenas e só pela entidade patronal.

10. Tal poder (…) pode, naturalmente, ser delegado. Contudo,

11. Essa mesma delegação deve ser expressa no processo e, mais do que isso, vincular a entidade patronal (…).

Significa isto que,

12. Além de desconhecer o autor da assinatura do documento bem como os poderes que tal assinante detém, refuta o arguido que o banco se vincule – no que à delegação do poder disciplinar diz respeito - pela assinatura de uma só pessoa.

Assim sendo e pelo que vem dito,

13. Não está, pois, demonstrado nos autos, em qualquer um dos seus documentos, que a nota de culpa foi assinada por quem tinha poderes para tal. Nesta medida,

14. Tal situação equivale à inexistência de nota de culpa, na medida em que a mesma foi assinada por quem não tinha poderes para tal.

15. Por conseguinte, a inexistência da nota de culpa reconduz-nos à invalidade do processo disciplinar, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 382.º do CT.

16. Invalidade essa que aqui se argui para todos os efeitos legais e que deve determinar o arquivamento do processo disciplinar.

(…)

Das testemunhas cuja audição se requer:

(…)”. (artigo 8.º do articulado de motivação do despedimento) (Eliminada, expressão sublinhada)

22) Os instrutores do procedimento disciplinar procederam à inquirição das testemunhas arroladas pelo Trabalhador na resposta à nota de culpa. (artigo 8.º do articulado de motivação do despedimento)

23) A questão da invalidade do procedimento disciplinar invocada pelo Trabalhador na resposta à nota de culpa, foi apreciada pelos instrutores do procedimento disciplinar nos termos constantes do capítulo VIII do “Relatório Final dos Instrutores (Proposta de Decisão Final)”, junto a fls. 130 verso e seguintes dos autos. (artigos 17º e 18º da contestação)

24) No dia 28 de fevereiro de 2012 os instrutores do procedimento disciplinar subscreveram um documento, junto de fls. 130 verso a 137 dos autos e cujo teor aqui dou por integralmente reproduzido, denominado “RELATÓRIO FINAL DE INSTRUTORES (PROPOSTA DE DECISÃO FINAL)”, através do qual, entre outras coisas, declararam que:

(…) VIII

Na Resposta à Nota de Culpa o Trabalhador-Arguido suscitou uma questão prévia, relacionada com a delegação do poder disciplinar, pelo que cumpre, desde logo, tomar posição sobre a mesma.

(…)

No caso em apreço, resulta do documento constante de fls. 4 e seguintes do procedimento disciplinar que foi a Comissão Executiva do BST quem decidiu instaurar um processo disciplinar ao Trabalhador-Arguido e que conferiu poderes à Direção de Coordenação de Recursos Humanos para nomear o instrutor do processo disciplinar.

(…)

IX

(…) considera-se provada a seguinte matéria constante da Nota de Culpa:

(…)

13. No início de setembro de 2017 a trabalhadora BB manifestou junto do Trabalhador-Arguido e do Diretor Comercial da Direção Comercial de Particulares e Negócios Norte 2, Sr. DD, que era sua intenção sair da área comercial porquanto não estava a conseguir alcançar os objetivos comerciais fixados pelo Banco R. para os Gestores Select.

14. Na tarde do dia 20 de novembro de 2017, no decurso da reunião semanal da equipa do balcão de Gaia/Câmara, na qual se encontravam presentes todos os trabalhadores afetos ao referido balcão, após o flash semanal o Trabalhador-Arguido informou os presentes que o Diretor Comercial, Sr. DD, iria deslocar-se à agência nesse mesmo dia, após o término da referida reunião.

15. Após sair da sala de reuniões, que se situa no piso inferior do balcão de Gaia / Câmara, a trabalhadora BB regressou ao seu posto de trabalho, localizado no piso superior, tendo, no trajeto, se cruzado com o colega CC, que não integrava a equipa do balcão de Gaia / Câmara, mas que aí se havia deslocado para se encontrar com o Diretor Comercial, Sr. DD.

16. Por se ter apercebido que um grupo de colegas estava no gabinete da gestora de negócios EE, a trabalhadora BB deslocou-se ao referido gabinete e perguntou aos colegas aí presentes – EE, FF, GG e o Trabalhador-Arguido - se o colega CC vinha efetivamente encontrar-se com o Diretor Comercial e se a razão da sua deslocação ao balcão de Gaia / Câmara nesse dia se prendia com a sua possível substituição.

17. Na sequência, o Trabalhador-Arguido dirigiu-se à trabalhadora BB e, em voz alta, referiu-lhe o seguinte:

“Disseste bem. [CC] Está à espera do Sr. DD. Sabes quem é o Sr. DD? Aquele boi grande e gordo? Estás a vê-lo aqui?”

18. Em resposta, a trabalhadora BB referiu o seguinte ao Trabalhador-Arguido:

“Sabes aquela expressão de que o corno é sempre o último a saber? Eu só quero perceber se a vinda do colega CC cá está relacionada comigo ou não.”

19. Após, o Trabalhador-Arguido aproximou-se da trabalhadora BB, colocou as suas mãos na cabeça daquela e direcionou-a para junto do seu rosto, como se tivesse a intenção de lhe dizer um segredo.

20. Quando a trabalhadora BB se encontrava próxima do seu rosto, o Trabalhador-Arguido disse-lhe, em tom de voz elevado, o seguinte:

“Estás armada em grande vaca?”

21. Após, o Trabalhador-Arguido referiu a BB e aos demais colegas presentes que CC vinha substituir a trabalhadora EE, tendo, na sequência, abraçado a trabalhadora BB.

22. Após ouvir as palavras proferidas pelo Trabalhador-Arguido, acima mencionadas, a trabalhadora BB e, bem assim, a trabalhadora EE, começaram a chorar.

23. A trabalhadora BB regressou ao seu posto de trabalho, tendo os demais colegas também abandonado o gabinete da trabalhadora EE.

24. Alguns minutos depois, o Trabalhador-Arguido dirigiu-se ao posto de trabalho de BB, tendo-lhe pedido desculpa pelo sucedido e referido que a tinha apelidado de “vaca” porquanto tinha “chamado boi ao outro”, designadamente ao Diretor Comercial.

(…)

30. Por decisão do Diretor Comercial tomada após o sucedido, a trabalhadora BB passou a prestar a sua atividade profissional no balcão de Vila Nova de Gaia / Alto das Torres, o que ocorreu a partir de 27 de novembro de 2017.

31. Em outubro de 2016, na sequência de processo disciplinar instaurado ao Trabalhador-Arguido, o BST determinou àquele a aplicação de uma sanção disciplinar de perda de 2 (dois) dias úteis de férias, fundamentada na violação do dever jus laboral de respeitar e tratar o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as pessoas que se relacionem com a empresa com urbanidade e probidade, previsto no artigo 128.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho.

(…)

Nestes termos (…) os instrutores propõem a aplicação ao Trabalhador-Arguido da sanção disciplinar de despedimento sem indemnização ou compensação (…).

(…)”. (artigo 9º do articulado de motivação do despedimento) (Eliminada, expressão sublinhada)

25) A Comissão Nacional de Trabalhadores da Empregadora emitiu um parecer, junto de fls. 140 verso a fls. 141 verso e cujo teor aqui dou por integralmente reproduzido, datado de 21 de março de 2018, no qual, entre outras coisas, consignou que:

(…) CONCLUSÕES:

A) Resultou provado que o trabalhador arguido (…) teve as seguintes atitudes perante a trabalhadora, sua subordinada, BB: colocou as suas mãos na cabeça da colega, direcionou para si a cabeça dela e gritou-lhe ao ouvido a seguinte frase – “Estás armada em grande vaca”.

B) Estas atitudes de desrespeito das regras básicas de urbanidade, do devido comportamento no local de trabalho e pela colega são inadmissíveis, especialmente para um superior hierárquico na sua relação com um subordinado.

C) Estas atitudes não podem ser permitidas, merecem sanção prevista no ACT, e quem as pratica não está em condições de dirigir equipas, devendo o seu desempenho enquanto trabalhador do BST ser realizado noutro contexto.

D) Contudo, apesar do comportamento do trabalhador arguido merecer ser sancionado, consideramos que não se verificam os pressupostos para o despedimento por justa causa. (…)”. (artigo 10º do articulado de motivação do despedimento) (Eliminada, expressão sublinhada)

26) No dia 11 de abril de 2018 a Comissão Executiva da Empregadora proferiu decisão final do procedimento disciplinar, junta a fls. 142 e 143 dos autos e cujo teor aqui dou por integralmente reproduzido, na qual, entre outras coisas, consignou que:

(…) concorda com os fundamentos e proposta de sanção disciplinar recomendada pelos instrutores, tudo nos termos do relatório final elaborado pelos mesmos, que aqui se dá por integralmente reproduzido.

(…)

Nestes termos, a Comissão Executiva decidiu aplicar ao Trabalhador-Arguido a sanção de despedimento com justa causa. (…)”. (artigo 11º do articulado de motivação do despedimento) (Eliminada, expressão sublinhada)

27) Tal decisão foi notificada ao Trabalhador no dia 12 de abril de 2018. (artigo 12º do articulado de motivação do despedimento)

28) No início de setembro de 2017 a trabalhadora BB manifestou junto do Trabalhador e do diretor comercial da “Direção Comercial de Particulares e Negócios Norte 2” da Empregadora, DD, que era sua intenção sair da área comercial, quer porque não estava a conseguir alcançar os objetivos comerciais fixados pelo Banco para os “Gestores Select”; quer porque sentia incapacidade para lidar com a pressão comercial e, essencialmente, porque tinha receio de colocar alguns produtos que o banco tem em carteira, nomeadamente de risco. (artigo 23º do articulado de motivação do despedimento e artigo 46º da contestação)

29) Quando a BB comunicou ao Trabalhador o mencionado em 28), este agradeceu àquela pela sua honestidade. (artigo 49.º da contestação)

30) No início da manhã do dia 20 de novembro de 2017, o Trabalhador e a trabalhadora EE foram informados de que esta última iria ser transferida do balcão de “Gaia Câmara”. (artigo 24.º do articulado de motivação do despedimento)

31) O mencionado em 30) deixou o Trabalhador, a referida EE e a trabalhadora FF, subdiretora do identificado balcão, transtornados com a situação. (artigo 24.º do articulado de motivação do despedimento)

32) Na tarde desse dia 20 de novembro de 2017 decorreu a reunião semanal da equipa do balcão de “Gaia Câmara”, na qual estiveram presentes todos os trabalhadores afetos ao mesmo. (artigo 25.º do articulado de motivação do despedimento)

33) No decurso dessa reunião, e após o “flash” semanal, o Trabalhador informou os presentes que o diretor comercial, DD, iria deslocar-se à agência nesse mesmo dia, após o término da referida reunião. (artigo 25.º do articulado de motivação do despedimento)

34) Após sair da sala de reuniões, que se situa no piso inferior da agência de “Gaia Câmara”, a trabalhadora BB regressou ao seu posto de trabalho, localizado no piso superior da mesma. (artigo 26.º do articulado de motivação do despedimento)

35) Ao efetuar o referido trajeto, a BB cruzou-se com o colega CC, o qual não integrava a equipa do balcão de “Gaia Câmara”, mas que aí se havia deslocado com o intuito de se encontrar com o diretor comercial, DD. (artigo 26.º do articulado de motivação do despedimento)

36) Apercebendo-se que um grupo de colegas se encontrava no gabinete de EE, a BB deslocou-se ao mesmo. (artigo 27.º do articulado de motivação do despedimento)

37) No momento em que a BB entrou no referido gabinete, cerca das 17:00 horas, a EE, o Trabalhador, a EE e a GG conversavam sobre a saída de EE do balcão de “Gaia Câmara”, comentando com tristeza tal situação. (artigo 27.º do articulado de motivação do despedimento e artigos 52.º a 54.º da contestação)

38) A GG apenas havia entrado no gabinete da EE alguns momentos antes da BB. (artigos 52.º a 54.º da contestação)

39) A BB entrou no gabinete e perguntou aos colegas presentes, identificados em 37), se a presença do CC no balcão, com o objetivo de reunir com o diretor comercial, estava relacionada com a sua substituição. (artigo 28.º do articulado de motivação do despedimento)

40) Na sequência, o Trabalhador dirigiu-se à BB e, num tom de voz mais elevado do que aquele que estava a utilizar na conversa mencionada em 37), disse-lhe:

- “Disseste bem. Está à espera do Sr. DD. Sabes quem é o DD? Aquele boi grande e gordo? Estás a vê-lo aqui?”. (artigo 29.º do articulado de motivação do despedimento)

41) Em resposta, a BB disse ao Trabalhador:

- “Sabes aquela expressão de que o corno é sempre o último a saber? Eu só quero perceber se a vinda do colega CC cá está relacionada comigo ou não!”. (artigo 30.º do articulado de motivação do despedimento)

42) Após, o Trabalhador aproximou-se da BB, colocou as suas mãos na cabeça desta e direcionou-a para junto do seu rosto, como se tivesse a intenção de lhe dizer um segredo. (artigo 31.º do articulado de motivação do despedimento)

43) O Trabalhador aproximou a boca do ouvido da BB e, mantendo o tom de voz referido em 40), disse-lhe:

- “Estás armada em grande vaca?”. (artigo 32.º do articulado de motivação do despedimento)

44) De seguida, o Trabalhador referiu à BB e aos demais colegas presentes que o CC vinha substituir a trabalhadora EE. (artigo 33.º do articulado de motivação do despedimento)

45) Na sequência do mencionado em 44), o Trabalhador abraçou a BB. (artigo 33.º do articulado de motivação do despedimento)

46) O Trabalhador não magoou fisicamente a BB, nem teve intenção de o fazer. (artigo 62.º da contestação)

47) Após ouvir as palavras proferidas pelo Trabalhador, a BB e a EE começaram a chorar. (artigo 34.º do articulado de motivação do despedimento)

48) A BB regressou ao seu posto de trabalho, tendo os demais colegas também abandonado o gabinete da EE. (artigo 35.º do articulado de motivação do despedimento)

49) Alguns minutos depois, o Trabalhador dirigiu-se ao posto de trabalho da BB, tendo-lhe pedido desculpa pelo sucedido e referido que a tinha apelidado de “vaca” porquanto tinha chamado “boi” ao diretor comercial. (artigo 36.º do articulado de motivação do despedimento)

50) Na tarde desse dia 20 de novembro de 2017, o diretor comercial, DD, deslocou-se ao balcão de “Gaia Câmara”. (artigo 37.º do articulado de motivação do despedimento)

51) Nessa ocasião, a BB não comunicou ao DD o que havia sucedido após o término da reunião semanal de equipa. (artigo 37.º do articulado de motivação do despedimento)

52) No dia 21 de novembro de 2017 a BB, a EE, a EE e a GG almoçaram com os colegas YYY e UU. (artigo 71.º da contestação)

53) No decurso desse almoço foi comentado o episódio ocorrido no dia anterior, tendo a EE afirmado ao YYY e ao UU que o Trabalhador não havia tido a intenção de ofender a BB. (artigos 71.º e 72.º da contestação)

54) Nessa altura, a situação foi objeto de riso por parte da EE e do UU. (artigo 73º da contestação)

55) O episódio ocorrido no dia 20 de novembro de 2017 chegou ao conhecimento de VV, colega da BB. (artigo 38.º do articulado de motivação do despedimento)

56) No dia 23 de novembro de 2017 o VV reportou o episódio pessoalmente ao diretor comercial, DD. (artigo 38.º do articulado de motivação do despedimento)

57) Aquando do mencionado em 56), o DD disse ao VV que não iria branquear a situação e que iria comunicar superiormente a mesma. (artigo 41.º do articulado de motivação do despedimento)

58) No final da tarde do dia 23 de novembro de 2017, o DD telefonou à EE, a qual confirmou os factos que haviam sido relatados àquele pelo VV. (artigo 39.º do articulado de motivação do despedimento)

59) No dia 24 de novembro de 2017 a BB reuniu com o DD, tendo confirmado perante este os factos que haviam sido anteriormente relatados ao mesmo pelo VV e corroborados pela EE. (artigo 40.º do articulado de motivação do despedimento)

60) Aquando do mencionado em 59), o DD disse à BB que iria tomar diligências. (artigo 41º do articulado de motivação do despedimento)

61) O Trabalhador pediu desculpas ao DD pelo sucedido, tendo-lhe transmitido que não teve intenção de o ofender. (artigo 42.º do articulado de motivação do despedimento e artigos 80.º e 82.º da contestação)

62) O DD aceitou tal pedido de desculpas; mas transmitiu simultaneamente ao Trabalhador que não era admissível que o mesmo se referisse ao próprio nos moldes em que o fez, muito menos em frente à sua equipa de trabalho. (artigo 42.º do articulado de motivação do despedimento)

63) O DD ficou convencido de que o Trabalhador, ao proferir a afirmação mencionada em 40) não teve intenção de o ofender. (artigos 80.º a 82.º da contestação)

64) A partir do dia 27 de novembro de 2017, e na sequência de decisão tomada pelo DD após o sucedido em 20 de novembro, a BB passou a prestar a sua atividade profissional no balcão de “…”. (artigo 44.º do articulado de motivação do despedimento)

65) No dia 27 de novembro de 2017 a EE remeteu um e-mail a todos os funcionários da agência de “Gaia Câmara”, entre os quais ao Trabalhador, convidando-os para um jantar de despedida da mesma e da BB que iria ter lugar no dia 30 de novembro de 2017. (artigo 75.º da contestação)

66) O Trabalhador não foi ao referido jantar. (artigo 76.º da contestação)

67) No dia 06 de dezembro de 2017 o Trabalhador e o DD assistiram num camarote do Estádio do Dragão ao jogo de futebol entre o F.C. Porto e o Mónaco, a convite de um cliente da Empregadora, proprietário da sociedade imobiliária “Chave Nova”. (artigo 83.º da contestação)

68) Na sequência do referido convite, o Trabalhador telefonou ao DD para lhe perguntar se tinha alguma objeção à sua presença, ao que o mesmo respondeu que não. (artigos 84.º e 85.º da contestação)

69) Em outubro de 2016, na sequência de processo disciplinar instaurado ao Trabalhador, a Empregadora determinou a aplicação àquele de uma sanção disciplinar de perda de dois dias úteis de férias, fundamentada na violação do dever de respeitar e tratar o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as pessoas que se relacionem com a empresa com urbanidade e probidade, previsto no artigo 128.º, n.º 1, alínea a) do Código do Trabalho. (artigo 45.º do articulado de motivação do despedimento)

70) Nos anos de 2010 e 2011 o Trabalhador foi avaliado pela Empregadora com a menção “rendimento excecional”. (artigo 36.º e 37.º da contestação)

71) Nos anos de 2012 a 2016 o Trabalhador foi avaliado pela Empregadora com a menção “excede significativamente”. (artigos 36.º e 37.º da contestação)

72) Na avaliação relativa ao ano de 2016, o avaliador descreveu o Trabalhador como “excelente na liderança do negócio, equipa (…)”. (artigo 38.º da contestação)

73) Todas as avaliações mencionadas em 70) e em 71) foram aprovadas pelo diretor coordenador da Empregadora, XX, o qual foi chefe do Trabalhador durante mais de oito anos. (artigo 39.º da contestação)

74) O trabalhador com a categoria profissional de “gerente” não participa nas reuniões da administração nem tem voz ativa nas decisões do banco. (artigos 169.º e 170.º da contestação)

75) A Empregadora tem diversos trabalhadores com a categoria profissional de “gerente” não gerem nenhum balcão nem têm qualquer equipa a seu cargo, antes exercendo funções noutras áreas, designadamente e só na área do Porto:

a) Área de risco:

- ZZ;

b) Recursos humanos:

- AAA;

c) Área de preço:

- BBB;

d) Apoio à direção de particulares:

- CCC;

e) Apoio à direção comercial:

- DDD;

f) Área de fundos/seguros:

- EEE;

- FFF;

- GGG;

- HHH;

g) Gestores de seguimento:

- III. (artigos 173.º e 174.º da contestação)

76) No ano de 2018 o Trabalhador auferia mensalmente as seguintes quantias ilíquidas:

- 2 142,23€, a título de retribuição base;

- 9,17€/dia, a título de subsídio de almoço;

- 1 082,67€, a título de isenção de horário de trabalho;

- 207,10€, a título de diuturnidades;

- 620,71€, a título de complemento;

-758,67€, a título de compensação por afetação ao regime geral da Segurança Social. (artigo 222º da contestação)

77) A Empregadora atribuiu ao Trabalhador um cartão de crédito, denominado “Corporate”, com um “plafond” anual de 1 800,00 € (artigos 225.º, 226.º e 227.º da contestação)

78) O cartão de crédito mencionado em 77) foi atribuído ao Trabalhador para pagamento das despesas que este tivesse de suportar no âmbito das funções profissionais por ele exercidas. (artigos 20.º e 21.º da resposta à contestação)

79) O Trabalhador dispunha de um veículo automóvel que lhe estava atribuído pela Empregadora, pelo menos desde agosto de 2010. (artigos 232.º e 260.º da contestação)

80) Aquando do despedimento, o veículo automóvel que estava atribuído ao Trabalhador era de marca “….”, de 5 portas, com matrícula --QJ--. (artigo 234.º da contestação)

81) A viatura mencionada em 80) custou à Empregadora 15 658,93€. (artigo 32.º da resposta à contestação)

82) O Trabalhador utilizava a viatura mencionada em 80) tanto para fins profissionais como para fins pessoais. (artigo 234.º da contestação)

83) No dia 02 de fevereiro de 2018, a Empregadora deu ordens ao Trabalhador para este proceder à restituição do veículo automóvel que lhe estava atribuído. (artigo 259.º da contestação)

84) O Trabalhador, como todos os funcionários bancários, era beneficiário dos “Serviços de Assistência Médico-Social” (SAMS), em decorrência do que tinha direito a receber assistência médico-social, a prestar pelos médicos/entidades contratadas pelo referido “SAMS”. (artigo 242.º da contestação e artigo 24.º da resposta à contestação)

85) Por força do mencionado em 84), a Empregadora efetua uma contribuição obrigatória para o “SAMS”, nos termos definidos no Acordo Coletivo de Trabalho para o sector bancário. (artigo 40.º da resposta à contestação)

86) Por força do mencionado em 3), o Trabalhador encontrava-se integrado no internamente denominado por “Protocolo CUF”, que permitia aos trabalhadores do “Banco Totta & Açores” acederem ao Hospital da “CUF”, em Lisboa, com condições financeiras privilegiadas face ao público em geral. (artigo 25.º da resposta à contestação)

87) Após a integração do “Banco Totta & Açores” na Empregadora, e com vista à uniformização dos benefícios atribuídos a todos os seus trabalhadores, esta remeteu uma comunicação aos funcionários que provinham daquela, solicitando-lhes que optassem, de forma expressa, entre continuarem a beneficiar do “Protocolo CUF” ou passarem a beneficiar de um seguro de saúde, com indicação de que, em caso de ausência de resposta, manter-se-iam as condições vigentes àquela data. (artigo 26º da resposta à contestação)

88) Após a remessa da comunicação mencionada em 86), a Empregadora manteve o Trabalhador integrado no “Protocolo CUF”. (artigo 27.º da resposta à contestação)

89) Para além de ser beneficiário do “SAMS” e de estar integrado no “Protocolo CUF”, o Trabalhador beneficiava ainda de um seguro complementar de assistência hospitalar, celebrado entre a "Generali - Companhia de Seguros, SpA" e a Empregadora, ao abrigo do qual poderia beneficiar de uma compartição de 90% das despesas com intervenções cirúrgicas; cirurgias em regime ambulatório; e internamento. (artigo 28.º da resposta à contestação)

90) A Empregadora suspendeu preventivamente o Trabalhador no dia 07 de dezembro de 2017. (artigo 254.º da contestação)

91) Em consequência do mencionado em 90), o Trabalhador sentiu-se humilhado e envergonhado junto dos seus familiares, amigos e clientes. (artigo 256.º da contestação)

92) Ainda em consequência do mencionado em 90), o Trabalhador sentiu-se também vexado na sua dignidade pessoal e profissional, perante colegas e clientes do banco, o que foi notado por estes. (artigos 257.º e 258.º da contestação)

93) O Trabalhador encontra-se a auferir subsídio de desemprego desde 23 de abril de 2018, no valor mensal de1 072,20 €. (artigo 122.º do articulado de motivação do despedimento).»

B) Fundamentação de Direito:

Como já se referiu, o objeto do presente recurso de revista consiste em saber se a factualidade dada como provada integra ou não justa causa de despedimento.

O Tribunal da Relação manteve a sentença da 1.ª instância no sentido da inexistência de justa causa, declarando o despedimento ilícito.

No acórdão recorrido foi dado relevo aos seguintes factos:

«Em concreto, resulta da factualidade provada (itens 1º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º dos factos provados) que:

- A Entidade empregadora, é uma instituição financeira que dispõe de várias agências bancárias em Portugal.

- O Trabalhador exerceu funções para a Empregadora, desde outubro de 2004 até 12 de abril de 2018, com antiguidade reportada a 01 de maio de 1991, altura em que detinha a categoria profissional de “gerente” e exercia as funções de diretor de balcão na agência de “Gaia Câmara”.

- Na Empregadora vigora um “Código Geral de Conduta”, no qual se encontram refletidas as normas e os padrões de comportamento ético pelos quais a mesma rege a sua atividade e que deverão ser observados por todos os trabalhadores. No ponto 6 do referido “Código Geral de Conduta”, sob a epígrafe de “Respeito para com as pessoas”, dispõe que: “O assédio, o abuso, a intimidação, a falta de respeito e consideração ou qualquer outro tipo de agressão física ou verbal são inaceitáveis e não permitidas nem toleradas no trabalho.”. Documento que está disponível para consulta tanto na “intranet”, como no sítio de “internet” da Empregadora; sendo, por isso, conhecido por todos os trabalhadores da mesma, os quais estão conscientes da obrigação do respetivo cumprimento.

Mais se provou nos itens 30º, 31º, 32º, 34º, 35º, 36º, 37º, 39º, 40º, 41º, 42º, 43º, 44º, 45º, 47º, 48º e 49º dos factos provados que:

- O Trabalhador exercia as suas funções, de diretor de balcão, na referida agência de “Gaia Câmara”, quando na tarde do dia 20 de novembro de 2017 decorreu a reunião semanal da equipa do balcão de “Gaia Câmara”, na qual estiveram presentes todos os trabalhadores afetos ao mesmo. No decurso dessa reunião, e após o “flash” semanal, o Trabalhador informou os presentes que o diretor comercial, DD, iria deslocar-se à agência nesse mesmo dia, após o término da referida reunião.

- Após sair da sala de reuniões, que se situa no piso inferior da agência de “Gaia Câmara”, a Trabalhadora BB regressou ao seu posto de trabalho, localizado no piso superior da mesma. Ao efetuar o referido trajeto, a BB cruzou-se com o colega CC, o qual não integrava a equipa do balcão de “Gaia Câmara”, mas que aí se havia deslocado com o intuito de se encontrar com o diretor comercial, DD. Apercebendo-se que um grupo de colegas se encontrava no gabinete de EE, a BB deslocou-se ao mesmo.

- No momento em que a BB entrou no referido gabinete, cerca das 17:00 horas, a EE, o Trabalhador, a EE e a GG conversavam sobre a saída de EE do balcão de “Gaia Câmara”, comentando com tristeza tal situação de que, o Trabalhador e a trabalhadora EE foram informados, no início dessa manhã do dia 20, de que esta última iria ser transferida do balcão de “Gaia Câmara”. O que deixou o Trabalhador, a referida EE e a trabalhadora FF, subdiretora do identificado balcão, transtornados com a situação.

- A BB entrou no gabinete e perguntou aos colegas presentes, identificados em 37), se a presença do CC no balcão, com o objetivo de reunir com o diretor comercial, estava relacionada com a sua substituição.

- Na sequência, o Trabalhador dirigiu-se à BB e, num tom de voz mais elevado do que aquele que estava a utilizar na conversa mencionada no item 37º, disse-lhe: - “Disseste bem. Está à espera do Sr. CC. Sabes quem é o CC? Aquele boi grande e gordo? Estás a vê-lo aqui?”.

Em resposta, a BB disse ao Trabalhador: - “Sabes aquela expressão de que o corno é sempre o último a saber? Eu só quero perceber se a vinda do colega CC cá está relacionada comigo ou não!”.

Após, o Trabalhador aproximou-se da BB, colocou as suas mãos na cabeça desta e direcionou-a para junto do seu rosto, como se tivesse a intenção de lhe dizer um segredo. O Trabalhador aproximou a boca do ouvido da BB e, mantendo o tom de voz mais elevado, disse-lhe: - “Estás armada em grande vaca?”.

De seguida, o Trabalhador referiu à BB e aos demais colegas presentes que o CC vinha substituir a trabalhadora EE e na sequência disso, o Trabalhador abraçou a BB. Após ouvir as palavras proferidas pelo Trabalhador, a BB e a EE começaram a chorar.

A BB regressou ao seu posto de trabalho, tendo os demais colegas também abandonado o gabinete da EE. Alguns minutos depois, o Trabalhador dirigiu-se ao posto de trabalho da BB, tendo-lhe pedido desculpa pelo sucedido e referido que a tinha apelidado de “vaca” porquanto tinha chamado “boi” ao diretor comercial”.»

Perante estes factos, que considerou relevantes, o Tribunal recorrido fez a seguinte análise:

«A leitura que fazemos perante os factos que foram imputados ao Trabalhador no processo disciplinar e que resultaram assentes na factualidade que se deixou evidenciada, traduzem um comportamento culposo do mesmo, o qual revestiu um carácter grave e ilícito.

Acresce que atentas as funções que exercia, o Trabalhador estava obrigado a um dever acrescido de não adotar comportamentos, da natureza dos que se apuraram, quer em relação a um superior hierárquico quer a uma funcionária sua subordinada, nas circunstâncias em que o fez.

Ou seja, existiu um comportamento que constitui ilícito disciplinar.

De resto, o primeiro requisito citado foi considerado verificado na sentença que nesta parte não foi posta em causa, como resulta do que da mesma se deixou transcrito.

Assim, a questão a conhecer aqui, no âmbito do recurso da Empregadora, é a da existência do nexo causal, tendo em vista apurar-se se o comportamento do Trabalhador, pela sua gravidade e consequências, tornou imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho. 

A nossa resposta é no sentido de não estarmos perante uma situação de impossibilidade prática da subsistência da relação laboral.

Não deixamos de ponderar aquelas que são as circunstâncias agravantes do comportamento do Trabalhador, ponderadas na sentença recorrida, supra transcritas.

Ou seja, por especial decorrência da natureza das funções de chefia por ele exercidas, o Trabalhador estava obrigado a um dever acrescido de não ter adotado a prática dos comportamentos que levou a cabo no dia 20 de novembro de 2017.

Consideramos no que concerne especialmente à primeira afirmação do Trabalhador ser de atender ainda que a mesma tenha sido proferida, não só na ausência do seu superior hierárquico, como ainda na presença de vários dos funcionários da agência.

Por último, o Trabalhador tinha já nessa data antecedentes disciplinares, uma vez que em outubro de 2016 havia sido punido com a sanção disciplinar de perda de dois dias úteis de férias. Sanção essa que (embora o tribunal desconheça os factos concretos que estivarem na origem da respetiva aplicação) teve igualmente por base a violação do dever previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 128.º do Código do Trabalho.

Porém, entendemos ser preponderante atentar aqui, desde logo quanto à primeira afirmação, relativa ao Superior hierárquico do Trabalhador, não ter este tido intenção de ofender o seu superior hierárquico ter este pedido desculpas ao primeiro, atitude que traduz não só a consciência por parte do Trabalhador do desacerto do comportamento em causa mas é também suscetível, aferimos nós, de redimir aquele do que aconteceu no dia 20 de novembro de 2017. 

Aliás, tais desculpas foram então aceites, aceitação que expressamente foi verbalizada pelo mesmo Superior hierárquico do Trabalhador e nada ficou provado que permita considerar que tal afirmação não fosse verdadeira, isto independentemente de posteriormente ter sido efetuada superiormente a participação do ocorrido.

Como igualmente nada se provou que ulteriormente e em consequência de tal comportamento do Trabalhador a relação com aquele superior hierárquico tenha de alguma forma ficado melindrada.

E relativamente à segunda afirmação dirigida à inferior hierárquica, desde logo não pode aqui deixar de ser considerado que esta usou antes uma linguagem cujo patamar de inadequação foi outrossim manifesto. E se tal não justifica que o Trabalhador a acompanhasse nesse despropósito – desde logo dadas as funções de chefia que exercia -, não nos parece face ao circunstancialismo provado que se deixou evidenciado que o comportamento daquela tenha sido estranho ao do Trabalhador.

O mesmo sucede com o próprio contexto em que ambas as afirmações foram proferidas - a circunstância de ter sido conhecida nessa manhã a “notícia” da transferência da trabalhadora EE para outro balcão -, como comprova a reação imediata das duas funcionárias que se abraçaram após as afirmações do Trabalhador.

E também àquela o Trabalhador apresentou desculpas, tendo o feito de imediato, o que não é de ignorar, independentemente de não se conhecer qualquer reação da mesma a esse pedido de desculpas.

Não isoladamente mas em conjunto, temos que tais bem denominadas de atenuantes pelo Tribunal a quo são aqui decisivas na avaliação que importa efetuar.

Não temos como relevante o facto de ter a situação sido conhecida por outros  trabalhadores da Entidade empregadora (os que se encontravam presentes e os que vieram a saber, posteriormente). Consideramos tal natural desde logo pelo despropósito da conduta do Trabalhador. Tal como não aferimos que para aqueles, se este não fosse despedido, resultaria a impressão nos mesmos que as injúrias e ofensas entre eles, ou dirigidas a superiores hierárquicos, eram toleradas.

Nada ficou provada no sentido de ter o comportamento do Trabalhador desestabilizado as relações entre ele e os seus subordinados e entre ele e os seus superiores hierárquicos e, muito menos, entre ele e a Administração da ré.

Na verdade, embora o comportamento do Autor tenha ocorrido no local e tempo de trabalho, as expressões por ele usadas não se integram em nenhuma das situações previstas no ponto 6 do referido Código Geral de Conduta - "O assédio, o abuso, a intimidação, a falta de respeito e consideração ou qualquer outro tipo de agressão física ou verbal são inaceitáveis e não permitidas nem toleradas no trabalho” (cf. ponto 6 da nota de culpa) – no sentido de que nenhum dos dois trabalhadores envolvidos manifestou, perante o superior hierárquico com poder disciplinar ou membro da Administração, ter-se sentido ofendido, na sua honra e consideração, pelo comportamento do Autor.

A Ré nada provou nesse sentido.

Deste modo, não pode agora a ré assumir uma ofensa que não lhe foi dirigida e que não se provou ter existido na pessoa dos dois trabalhadores em causa, para justificar a impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho com o autor, quando resulta da factualidade provada que os três trabalhadores envolvidos souberam ultrapassar o incidente ocorrido, mantendo o normal relacionamento pessoal e profissional.

De resto, não pode outrossim ignorar-se como se refere na sentença recorrida que   “(…) o Trabalhador exercia funções para a Empregadora desde Maio de 1991, ou seja, há mais de 26 anos; sendo que nos últimos sete anos (de 2010 a 2016) havia sido objeto de avaliações de excelência por parte do Banco. Aliás, não deixa de ser significativo que no ano de 2016, e não obstante a sanção disciplinar que então lhe foi aplicada, o avaliador tenha mencionado que o Trabalhador era excelente na liderança do negócio e na gestão da equipa”, isto relativamente ao comportamento já anteriormente assumido não ter comprometido o desempenho do Trabalhador, como igualmente a confiança integral assim outrora mantida ou ressurgida no mesmo – justificativa de uma avaliação de excelência - não dever ser agora ignorada pela Entidade empregadora relativamente à susceptibilidade de o Trabalhador não voltar pautar o seu comportamento pelos valores que aquela pretende sejam seguidos, em termos de relacionamento interpessoal.

Por último valem aqui as considerações feitas na sentença recorrida a propósito da aplicação de uma sanção menos grave e não extintiva do vínculo laboral, as quais acompanhamos, nada tendo a acrescentar às mesmas.

Improcede assim a Apelação da Entidade empregadora, considerando nós que o despedimento é ilícito, ao abrigo do disposto no artigo 381º b) do Código do Trabalho.» (fim da transcrição parcial do Acórdão do Tribunal da Relação)

                                                           *

Vejamos então se devem proceder as conclusões da recorrente no sentido de ser revogado o acórdão recorrido.

A Constituição da República Portuguesa, no seu art.º 53.º, garante aos trabalhadores a segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos.

O art.º 351.º, do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12/2, sob a epígrafe «Noção de justa causa de despedimento» estatui que «Constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho».

  O art.º 126.º, do mesmo diploma legal, estatui que as partes numa relação laboral devem pautar a sua conduta com observância pelo princípio da boa-fé, referindo:

1 - O empregador e o trabalhador devem proceder de boa-fé no exercício dos seus direitos e no cumprimento das respetivas obrigações.

2 - Na execução do contrato de trabalho, as partes devem colaborar na obtenção da maior produtividade, bem como na promoção humana, profissional e social do trabalhador.

Por seu turno, o art.º 128.º, do Código do Trabalho, sob a epígrafe “Deveres do Trabalhador” dispõe:

1 - Sem prejuízo de outras obrigações, o trabalhador deve:

a) Respeitar e tratar o empregador, os seus superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as pessoas que se relacionem com a empresa, com urbanidade e probidade.

Como refere António Monteiro Fernandes (Direito do Trabalho, 19.ª edição, Almedina, Coimbra, pp. 337 e 338) a propósito do conteúdo do dever de respeito, urbanidade e probidade «Na sua raiz, trata-se de um dever de mera convivência social, postulando um comportamento adequado à manutenção de relações pessoais equilibradas e de qualidade, num qualquer âmbito comunitário. Enquanto obrigação fundada no contrato de trabalho, tem o sentido de prevenir dificuldades no funcionamento da organização ou defeitos no cumprimento das prestações de trabalho. Trata-se, pois, de uma obrigação ainda funcionalizada à boa execução do contrato de trabalho.

É inviável definir com precisão o conteúdo deste dever. Na jurisprudência, encontram-se aplicações tão diversas como a respeitante ao chefe que despreza o direito de descanso dos subordinados e a do trabalhador que faz referências pessoais desprimorosas ao administrador da empresa. De certo modo, pode considerar-se o dever de respeito e urbanidade como uma situação subjetiva de natureza residual, destinada a funcionar como válvula de segurança do sistema de deveres contratuais acessórios do trabalhador, tendo em vista prevenir qualquer comportamento eticamente censurável que ameace a funcionalidade da prestação de trabalho ou a normalidade da vida da organização. Por isso, ele toma em conta todo o tipo de interações em que o trabalhador pode envolver-se no ambiente de trabalho: com o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e até quaisquer pessoas que se relacionem com a empresa.»

O conceito de justa causa integra, segundo o entendimento generalizado tanto na doutrina, como na jurisprudência, três elementos: a) um elemento subjetivo, traduzido num comportamento culposo do trabalhador, por ação ou omissão; b) um elemento objetivo, traduzido na impossibilidade da subsistência da relação de trabalho; c) o nexo de causalidade entre aquele comportamento e esta impossibilidade.

O referido conceito carece, em concreto, de ser preenchido com valorações. Esses valores derivam da própria norma e da ordem jurídica em geral. O legislador, no n.º 2, do art.º 351.º, do Código do Trabalho, complementou o conceito com uma enumeração de comportamentos suscetíveis de integrarem justa causa de despedimento.

De qualquer forma, verificado qualquer desses comportamentos, que constam na enumeração exemplificativa, haverá sempre que apreciá-los à luz do conceito de justa causa, para determinar se a sua gravidade e consequências são de molde a inviabilizar a continuação da relação laboral.

Apesar de a lei não fazer referência expressa ao conceito de ilicitude o mesmo está subjacente à noção legal, pois só é possível falar de culpa após um juízo prévio de ilicitude.

Nesta linha, António Menezes Cordeiro (Manual de Direito do Trabalho, Almedina, Coimbra, pág. 821), citando fonte jurisprudencial, que subscreve, refere que a justa causa postula sempre uma infração, ou seja, uma violação, por ação ou por omissão, de deveres legais ou contratuais.

Assim, decompondo a noção legal de justa causa, temos sempre um comportamento ilícito, censurável em termos de culpa e com consequências gravosas na relação laboral de forma a inviabilizar a mesma.

O art.º 351.º, n.º 3, do Código do Trabalho estabelece que «Na apreciação da justa causa, deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao caráter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes».

Por seu turno, o artigo 330.º, n.º 1, do Código do Trabalho, com a epígrafe «Critério de decisão e aplicação de sanção disciplinar» introduz o conceito de proporcionalidade ao estatuir que a sanção disciplinar deve ser proporcional à gravidade da infração e à culpabilidade do infrator.

A ponderação da proporcionalidade permite-nos ainda determinar a razoabilidade da decisão perante os interesses em litígio.

No caso concreto dos autos, retira-se da matéria de facto provada que o empregador pretendeu dar um especial relevo ao dever de respeito no local de trabalho, pois vigorava no empregador um Código Geral de Conduta, no qual se encontram refletidas as normas e os padrões de comportamento ético pelos quais a mesma rege a sua atividade e que deverão ser observados por todos os trabalhadores.

O ponto 6. do referido Código Geral de Conduta, sob a epígrafe de Respeito para com as pessoas”, dispõe que:

O assédio, o abuso, a intimidação, a falta de respeito e consideração ou qualquer outro tipo de agressão física ou verbal são inaceitáveis e não permitidas nem toleradas no trabalho.

Este documento está disponível para consulta tanto na intranet, como no sítio de internet do empregador,  sendo conhecido por todos os trabalhadores do mesmo, os quais estão conscientes da obrigação do respetivo cumprimento.

Na verdade, compreende-se esta especial preocupação do empregador, pois é uma instituição financeira que dispõe, para o exercício da respetiva atividade, de várias agências bancárias em Portugal, necessitando de transmitir aos seus clientes uma imagem de grande  seriedade de forma a poder desenvolver o seu negócio numa área em que predomina uma grande concorrência.

A factualidade descrita sequencialmente nos pontos 30 a 49 dos factos provados, nomeadamente nos pontos 40, 41, 42 e 43, demonstram que o A. trabalhador, Diretor de uma agência,  violou o dever de respeito em relação ao Diretor Comercial DD, seu superior hierárquico, e  em relação à Gestora Select BB, sua inferior hierárquica.

Eis o teor desses factos:

40) Na sequência, o Trabalhador dirigiu-se à BB e, num tom de voz mais elevado do que aquele que estava a utilizar na conversa mencionada em 37), disse-lhe:

- “Disseste bem. Está à espera do Sr. CC. Sabes quem é o CC? Aquele boi grande e gordo? Estás a vê-lo aqui?”.

41) Em resposta, a BB disse ao Trabalhador:

- “Sabes aquela expressão de que o corno é sempre o último a saber? Eu só quero perceber se a vinda do colega CC cá está relacionada comigo ou não!”.

42) Após, o Trabalhador aproximou-se da BB, colocou as suas mãos na cabeça desta e direcionou-a para junto do seu rosto, como se tivesse a intenção de lhe dizer um segredo.

43) O Trabalhador aproximou a boca do ouvido da BB e, mantendo o tom de voz referido em 40), disse-lhe:

- “Estás armada em grande vaca?”.

Estes factos ocorreram no dia 20 de novembro de 2017, num gabinete de trabalho da agência,  na presença de EE, FF e GG, todas trabalhadoras subordinadas hierarquicamente ao A.

No dia 21 de novembro de 2017 a BB, a EE, a EE e a GG almoçaram com os colegas JJJ e UU. No decurso desse almoço foi comentado o episódio ocorrido no dia anterior, tendo a EE afirmado ao JJJ e ao UU que o A. não havia tido a intenção de ofender a BB.  Nessa altura, a situação foi objeto de riso por parte da EE e do UU. O episódio ocorrido no dia 20 de novembro de 2017 chegou ao conhecimento de VV, colega da BB.

O Diretor Comercial DD veio a tomar conhecimento dos factos no dia 23 de novembro de 2017, através do trabalhador VV, tendo na altura dito  que não iria branquear a situação e que iria comunicar superiormente a mesma.

Os factos imputados ao A. enquadram-se na sua esfera profissional pelo que não existem dúvidas acerca da legitimidade da intervenção do empregador no sentido de acautelar os seus interesses, independentemente da posição que tenham tomado os trabalhadores DD e BB.

É legítimo que o empregador não tolere a ocorrência de tais factos no local de trabalho, mesmo que os visados não se sintam melindrados, pois o empregador tem o direito de estabelecer e exigir o cumprimento de um código de conduta desde que este não contrarie os direitos e garantias dos trabalhadores.

O facto descrito no ponto 40 em que o A. se refere ao Diretor Comercial DD, seu superior hierárquico, como «Aquele boi grande e gordo» é muito desrespeitoso, e de grande gravidade, pois o A. era o diretor da agência e proferiu tais palavras à frente das trabalhadoras suas subordinadas.

O facto descrito no ponto 42,  em que o A. aproximou-se da BB, colocou as suas mãos na cabeça desta e direcionou-a para junto do seu rosto, como se tivesse a intenção de lhe dizer um segredo, aproximou a boca do ouvido daquela e, mantendo o tom de voz elevado, disse-lhe: «Estás armada em grande vaca?», é intolerável e ofende a dignidade de qualquer ser humano de acordo com o nosso padrão de civilização.

Os visados poderiam até ter aceitado as desculpas, mas o ato fica e os seus efeitos irão perdurar na memória, e acabarão por ter sempre repercussões prejudiciais no seio da organização empresarial.

No caso concreto, é absolutamente legítimo que o empregador esperasse que o A., Diretor de uma agência, com a antiguidade que tinha, admitido no setor bancário em 1991, e com boa avaliação de desempenho, fosse o primeiro a cumprir e fazer cumprir pelos trabalhadores seus subordinados o Código Geral de Conduta, velando pelo cumprimento do dever de respeito, pilar da harmonia de qualquer ambiente de trabalho.

Em outubro de 2016, na sequência de processo disciplinar instaurado ao Trabalhador, a Empregadora determinou a aplicação àquele de uma sanção disciplinar de perda de dois dias úteis de férias, fundamentada na violação do dever de respeitar e tratar o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as pessoas que se relacionem com a empresa com urbanidade e probidade, previsto no artigo 128.º, n.º 1, alínea a) do Código do Trabalho.

Decorrido pouco mais de um ano, o A. ao praticar os factos descritos violou gravemente dever de respeito consagrado no art.º 128.º,  n.º 1, alínea a) do Código do Trabalho, bem como o Código Geral de Conduta, estabelecido pela R., pelo que o seu comportamento assumiu uma gravidade tal que quebrou a relação de confiança que preside ao contrato de trabalho, não sendo exigível a um empregador razoável a manutenção desse contrato que deve assentar numa base de confiança recíproca entre as partes.

A sanção disciplinar aplicada pelo empregador ao trabalhador  de despedimento com justa causa é adequada e proporcional à conduta assumida por este último.

                                                            III

            Decisão:

           Face ao exposto, acorda-se em conceder a revista, revogando-se o acórdão recorrido que confirmou, com um voto de vencido, a sentença da 1.ª instância, e consequentemente declara-se que o despedimento do A. promovido pela R. é lícito.

Custas nas instâncias e no STJ a cargo do Autor.

Anexa-se sumário do acórdão.

Lisboa, 28 de outubro de 2020.

Nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 20/2020, de 1 de maio, declaro que os Exmos. Juízes Conselheiros adjuntos Maria Paula  Moreira Sá Fernandes e José António Santos Feteira votaram em conformidade.

Chambel Mourisco (relator)